Contraponto - Edição 138

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Obrigado pela rosa Por Ramon Baratella

“Obrigado pela rosa”, “Obrigado pelo milho”, são frases aleatórias que aparecem de repente em meu celular, não faço ideia de onde surgiram ou de onde vem e por qual motivo todos em minha volta estão falando sobre. Em um dia específico na faculdade, vou andando até minha sala de aula, localizada no terceiro andar, comento com meus amigos sobre as famigeradas “Lives Npc”, ao contrário do que muitos pensam, essa não é uma trend recente. Para os desavisados de plantão ou para os que vivem debaixo de uma pedra, “NPC” nada mais é que uma sigla para “Non Playable Character”, aqueles personagens que não possuem função alguma no game, mas estão ali só para repetir uma frase e preencher espaço na tela, praticante figurantes de uma novela das nove. Um bom exemplo dessas figurinhas são os fantasmas do clássico Pac-man, você não brinca com eles, estão apenas habitando a interface do jogo de forma aleatória. Esperando a professora iniciar a aula, me viro aos meus colegas e faço a seguinte pergunta: “Amigos, vocês já leram algo sobre essas lives?”, a resposta foi “sim” e meu amigo comenta sobre elas estarem ligadas a um lugar de fetiche, mas nós só estamos falando sobre garotas se vestindo de animaizinhos meigos que podem ser manipuladas por qualquer um atrás de tela de vidro do celular, né? “Hmm Jefferson caminhões” ou “Quero cuzcuz”, acho que este foi meu primeiro contato com essas bizarrices, obviamente viralizou no lar dos memes, também conhecido como o falecido Twitter, o atual X. Com os olhos da mídia voltados para isto, cada declaração me faz perceber que estamos vivendo uma espécie de “Black Mirror”, e não é que isso daria um ótimo episódio. Em uma entrevista ao The New York Times, a criadora de conteúdo PinkyDoll – uma das primeiras a aderir essa trend por lá – contou que juntou por volta de 3 mil dólares apenas soltando seu bordão diversas vezes. Então quer dizer que eu posso comandar os movimentos de uma pessoa por simplesmente clicar em qualquer coisa e assim gerar uma frase da personagem? Uau! Isso sim que é poder. Até então, ninguém sabia que esses “programas” de movimentos repetidos, “bugadas” robóticas e características específicas poderiam gerar lucro, quando essa informação fura a bolha, obviamente foi uma explosão de diversas pessoas tentando ganhar alguma quantia com esta exposição. O debate estava no cardápio, escolher problematizar este assunto ou levar apenas como um “meme”. Vasculhando mais a fundo você percebe os mais variados personagens que foram “criados”, alguns mantêm o clássico estilo de videogames japoneses e outros simplesmente zoam a situação, como uma enfermeira exausta com suas olheiras marcadas agradecendo pelo café. Não vou mentir, estar no último ano da faculdade e com o pé na vida adulta, me fez repensar inúmeras vezes em largar tudo e simplesmente me vestir de coelho do Animal Crossing, será que me daria uma renda extra? Caso queira saber do meu paradeiro, descobri que o Tiktok está reduzindo a monetização das lives e infelizmente terei que entregar meu tcc até o fim do ano.

Novembro/Dezembro 2023

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