4 minute read

Bruno Cortez Celli Vidas Secas: Cidade Grande

Bruno Cortez Celli

Vidas Secas: Cidade Grande

Advertisement

Enquanto a família caminhava à procura de algum sinal de vida que não fossem as aves fugindo da seca, a cabeça de Fabiano não parava de pensar: Para qual cidade vamos? Será que vou conseguir trabalhar e ter um salário? Os meninos vão ficar bem? Onde vamos nos acomodar?

Sinha Vitória, vendo o desespero de Fabiano, colocou a mão em seu ombro e fez um olhar de que tudo ficaria bem pois não era a primeira vez que fugiam da seca. Mas ainda inconformado e preocupado Fabiano perguntou-lhe:

– Pra onde vamos?

– Estava pensando em São Paulo ou o Rio de Janeiro, disse Sinha Vitória – somente conhecia essas duas cidades grandes.

No bar já comentaram sobre São Paulo, vamos pra lá, rebateu Fabiano.

Depois de uns 20 minutos, começaram a ficar esfomeados pois fazia horas que a família não comia, Sinha Vitória percebeu o mais velho puxar sua mão e então viu-o apontando para um carro que aparentemente também estava fugindo da seca. Fabiano vendo a situação e querendo se livrar daquele sol ardente, levantou seu braço e começou a gritar o mais alto que sua voz atingia, então o carro parou do lado dele e o homem de dentro do automóvel perguntou para onde a família estava indo.

– Vamos para São Paulo - disse Sinhá Vitória.

– Querem uma carona? Estou indo para uma cidade perto de lá - pergunta o moço.

Sinha Vitória olhou para Fabiano para ver se concordava com a ideia e mesmo que o homem estivesse desconfiado, ele subiu no carro, pois sem a Baleia para caçar alguns coelhos no caminho não aguentavam ficar sem comer.

Durante o percurso, o motorista sabendo que a família estava em condição precária, ofereceu algumas maçãs que tinha guardado para o caminho. E os meninos com dor no estômago pegaram a fruta sem hesitar, enquanto os dois pais, mesmo que quisessem recusar, não resistiram e devoraram as frutas, agradecendo-o. O percurso seguia tranquilo e quieto até que o motorista mencionou o seu irmão, que tinha um boteco no bairro Alto da Lapa. Ouvindo isso Fabiano falou pela primeira vez desde que estavam andando:

– Acha que consigo trabalhar lá?

– Acho que sim, não precisa de muito para conseguir trabalhar num boteco - responde o motorista.

Ouvindo isso, Fabiano deu um sorriso, pois começou a achar que a frase dita por Sinha Vitória iria se concretizar. Ao chegar na grande cidade a família ficou muito impressionada com tudo: havia grandes prédios, muitos carros e diversos tipos de pessoas. Ansiosos, os quatro começaram a sair do automóvel

até que o motorista disse:

– Esperem! Vocês não vão me pagar?

Fabiano, zangado e com medo de perder seus únicos vinte reais respondeu:

– Você não falou nada sobre pagar.

– Bom, eu lhes dei comida e um lugar onde trabalhar, espero pelo menos uns trinta reais

O homem da família olhou para Sinhá Vitória, e ela com raiva de tudo pegou do bolso do marido os vinte reais e entregou-os para o motorista:

– Só temos isso.

Ao saírem do carro com pouca esperança, viram o homem continuar seu caminho. Ficaram soltos na maior cidade do Brasil sem um centavo no bolso. Sinha Vitória, com o pouco conhecimento que tinha, conseguiu ler o nome do boteco que o homem havia dito. Eles entraram e viram poucos clientes sentados nas mesas. Um homem recebeu-os na porta:

– Olá, imagino que meu irmão tenha contado a vocês sobre mim, estou disposto a dar um bom salário que conseguirá manter sua família em ordem. Além disso, eu tenho um quarto para vocês no andar de cima.

Sinha Vitória e Fabiano começaram a trabalhar servindo pratos e cozinhando, enquanto os meninos lavavam a louça. Mas quando Fabiano foi ver que era somente um salário de 200 reais, teve que pedir um dinheiro antecipado ao patrão para que ele mandasse os filhos irem vender doces no farol, porque com aquele dinheiro não iria conseguir pagar todas as despesas da família.

Mesmo que tivessem que trabalhar por muito tempo e ainda dormir em um quarto pequeno para quatro pessoas, eles aguentaram firmes pois era melhor que a vida lá no nordeste. Essa estratégia durou duas semanas, pois como os meninos tinham que trabalhar muito e descansar pouco, um dia acabaram esquecendo de lavar os pratos e foram dormir direto. Então eles foram acordados com um grito do patrão saindo da cozinha, assim a família saiu correndo para ver o que era, e quando chegaram viram a cozinha cheia de baratas nos pratos, e os meninos lembraram-se do que fizeram e começaram a ficar com medo do pai. Como o patrão estava tendo um dia ruim e sabia que no final do mês não ia conseguir pagar Fabiano, decidiu demitir todos e mandá-los para a rua sem nenhum dinheiro.

Quando foram pra rua Fabiano pensou em bater nas crianças mas percebeu que isso não era culpa deles e que o errado era esse governo e o patrão. Com toda a raiva acumulada ele decide fazer algo que nunca achou que teria que fazer: furtar alguém!

Assim a família vai andando até encontrar um alvo fácil, acham um homem que mexia no celular e que estava com a mochila aberta. Fabiano então compartilha a ideia com Sinha Vitória e manda o menino mais velho (o mais habilidoso entre os irmãos) tentar furtar a carteira do alvo, a criança chega lá sem saber o que estava acontecendo de verdade e rouba a carteira do homem sem ele perceber. Com o dinheiro que tinham agora, tentariam comprar balas e as venderiam no sinal, enquanto ficavam em barracas perto da região do Ceasa, sendo essa, infelizmente, a nova vida deles.