Habitação Indígena no Brasil e a norma de Desempenho

RELATÓRIO FINAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA

CAMPUS SÃO PAULO

HABITAÇÃO INDÍGENA NO BRASIL: MAPEAMENTO DAS TIPOLOGIAS JÁ ESTUDADAS E CORRELAÇÃO COM ZONAS CLIMÁTICAS E TRONCOS CULTURAIS

ALUNA: ANA CAROLINA CABRAL CARNEIRO ORIENTADOR: JOÃO FERNANDO BLASI DE TOLEDO PIZA

NOVEMBRO DE 2017.

RESUMO

A arquitetura vernácula é aquela que se utiliza dos materiais disponíveis localmente e de estratégias para driblar o clima local de modo a garantir o conforto de seus usuários. Atualmente o modo de pensar a arquitetura é tão globalizado e industrializado que aos poucos está se perdendo as características arquitetônicas regionais, e nem sempre esse novo modo de construir é adequado ao local devido a fatores climáticos, de materiais, etc. A proposta dessa pesquisa é analisar as construções indígenas brasileiras da perspectiva do conforto, da eficiência energética e de sua relação com o entorno, para dar bases a pesquisas voltadas à inovação no modo de construir atual.

Palavras-chave: Arquitetura vernácula, conforto térmico, indígenas.

ABSTRACT The vernacular architecture is one that uses locally available materials and strategies to circumvent the local climate in order to guarantee the comfort of its users. Nowadays the way of thinking architecture is so globalized and industrialized that little by little the regional architectural characteristics are being lost, and this new way of building is not always adequate to the place due to climatic factors, materials, etc. The purpose of this research is to analyze the Brazilian indigenous constructions from the perspective of comfort, energy efficiency and their relationship with the environment, to provide a basis for research aimed at innovation in the current way of building.

Keywords: Vernacular architecture, thermal comfort, indigenous peoples.

SUMÁRIO CAPÍTULO 1

8

1.

8

INTRODUÇÃO

CAPÍTULO 2

9

1.

9

CONCEITOS FUNDAMENTAIS DE CONFORTO AMBIENTAL

1.1. Estudo climático 2. ARQUITETURA BIOCLIMÁTICA

9 11

2.1. Olgyay e a Arquitetura Bioclimática 2.2. Baruchi Givoni 2.3. Divisões bioclimáticas 3. ZONEAMENTO BIOCLIMÁTICO BRASILEIRO - NBR 15220 (ABNT, 2003)

11 12 14 14

4.

17

CONFORTO TÉRMICO

CAPÍTULO 3

19

1.

A ARQUITETURA E AS CONSTRUÇÕES INDÍGENAS

19

2.

OS GRUPOS INDÍGENAS NO BRASIL

20

3.

ARQUITETURA INDÍGENA

21

3.1. LEVANTAMENTOS DE DADOS DE TRIBOS: CAPÍTULO 4

23 39

1.

39

A HABITAÇÃO KAINGANG

CAPÍTULO 5

47

CONCLUSÕES E SUGESTÕES

47

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

49

LISTA DE FIGURAS Figura 1: Carta Psicrométrica para a cidade de São Luís - MA. Fonte: LAMPERTS, Roberto.12 Figura 2: Zoneamento Bioclimático Brasileiro. Fonte: NBR 15220-3 15 Figura 3: Tronco Macro-Jê. Fonte: RODRIGUES, Ayron.

20 Figura 4: Tronco Tupi. Fonte: RODRIGUES, Ayron.

21 Figura 5: Grupos indígenas estudas por Johann van Lengen. Fonte: Arquitetura dos índios da Amazônia 22 Figura 6 - Aldeia Porquinhos. Fonte: Siqueira, Jaime (1993) 24 Figura 7 - Carta Psicrométrica de Barra do Corda, MA. Fonte: Climate Consultant - UCLA 24 Figura 8 - Carta Psicrométrica de Três Lagos, MS. Fonte: Climate Consultant – UCLA 26 Figura 9 - Carta Psicrométrica de Vilhena, RO. Fonte: Climate Consultant – UCLA 27 Figura 10 - Carta Psicrométrica de Barcelos, AM. Fonte: Climate Consultant – UCLA 29 Figura 11 - Carta Psicrométrica de Caxias, MA. Fonte: Climate Consultant – UCLA 30 Figura 12 - Carta Psicrométrica de Araguatins, TO. Fonte: Climate Consultant – UCLA 32 Figura 13 - Carta Psicrométrica de Querência, MT. Fonte: Climate Consultant – UCLA 33 Figura 14 - Carta Psicrométrica de Gaúcha do Norte, MT.Fonte:Climate Consultant-UCLA 34 Figura 15 - Carta Psicrométrica de Cacoal, RO. Fonte: Climate Consultant – UCLA 36 Figura 16 - Carta Psicrométrica de Rancharia, SP. Fonte: Climate Consultant – UCLA 38 Figura 17 - Carta Psicrométrica de Nova Tebas, PR. Fonte: Climate Consultant – UCLA 38 Figura 18 - Carta Psicrométrica de Xanxeré, SC, MA. Fonte: Climate Consultant – UCLA 39 Figura 19 - Carta Psicrométrica de Passo Fundo, RS, MA. Fonte: Climate Consultant - UCLA39 Figura 20 - Carta Psicrométrica de Indaial, SC. Fonte: Climate Consultant – UCLA 40

LISTA DE TABELAS Tabela 1: Sugestões para as zonas apresentadas na carta psicrométrica 13 Tabela 2: Orientações construtivas de acordo com a NBR 15220-3.

15 Tabela 3: Ficha Catalográfica.

22 Tabela 4 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Timbiras24 Tabela 5 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Xavantes 26 Tabela 6 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Nambikwara 27 Tabela 7 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Yanomami 29 Tabela 8 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Timbiras da Aldeia do Ponto 30 Tabela 9 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Krahó 32 Tabela 10 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Kaiapós 33 Tabela 11 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Kamaiurá 34 Tabela 12 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Cinta Largas 36 Tabela 13 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Xokleng 40 Tabela 14 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Bororó 41 Tabela 15 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Kaingangs 43

LISTA DE ABREVIATURAS ABNT: Associação Brasileira de Normas Técnicas LabEEE: Laboratório de Eficiência Energética em Edificações IBUSP: Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo INMET: Instituto Nacional de Meteorologia UCLA: Universidade da Califórnia

CAPÍTULO 1 1. INTRODUÇÃO Com tantos avanços tecnológicos próprios do nosso século, o conhecimento de culturas tradicionais vem se perdendo. O modo de construir tradicional é associado aos conceitos de “arquitetura vernacular” e de “arquitetura popular” e dizem respeito ao modo como cada sociedade lida com a intersecção da necessidade de habitar um espaço, as dificuldades climáticas e os materiais disponíveis. A arquitetura vernácula indígena brasileira é aquela produzida pelos diversos grupos índios antes do contato com o homem branco e sua cultura.

Vemos o modo de construir tradicional se repetir a milhares de anos de maneira satisfatória, enquanto que, atualmente, mesmo com todo o avanço tecnológico agregado à construção civil, se constroem edificações sem conforto para os usuários ou que não estão de acordo com o clima ao qual estão inseridos e, portanto, consomem mais energia do que seria necessário.

Essa pesquisa surgiu com o objetivo de analisar as habitações indígenas sob a perspectiva da NBR 15220-3 (2003), para comprovar se as mesmas respondem satisfatoriamente aos quesitos de conforto exigidos para edificações brasileiras.

8

CAPÍTULO 2 1. CONCEITOS AMBIENTAL

FUNDAMENTAIS

DE

CONFORTO

O projeto de pesquisa desenvolvido tem como objetivo analisar as técnicas construtivas utilizadas pela população indígena a partir das condições climáticas locais e dos materiais disponíveis in natura.

1.1. Estudo climático Para melhor compreensão do trabalho é necessário ter conhecimento de algumas definições básicas e de como elas influenciam o projeto de pesquisa, tais quais:

1.1.1.Clima

É o conjunto das condições atmosféricas de determinado local em um considerável período de tempo, ou seja, para determinar o clima usa-se a maior quantidade de informações disponíveis possível. O tempo, por sua vez, diz respeito apenas às condições atmosféricas momentâneas. As variáveis climatológicas que mais interessam para esse estudo são: • Temperatura: é a principal variável de conforto térmico, estimulando reações no corpo humano. A temperatura do ar também é chamada de temperatura de bulbo seco. A diferença de temperatura em diferentes pontos do ambiente provoca a circulação do ar através da convecção. A convecção ocorre quando a parte mais quente se torna mais leve e sobe, enquanto a mais fria desce.

9

• Umidade Relativa: relacionada com a quantidade de vapor d'água contida no ar úmido em relação à quantidade de ar contido no ar saturado (mais água que o máximo confortável) para uma determinada condição de temperatura e pressão. Quanto maior a umidade relativa, mais difícil é para o corpo perder calor por transpiração.

• Insolação: é o percentual de energia solar que atinge uma unidade de área; possui relação direta com a temperatura. Quanto maior a insolação de determinada região, maior a sua temperatura.

• Velocidade do ar: em ambientes internos com ou sem a ação direta dos ventos, devido a diferença de temperaturas ou processos mecânicos como, por exemplo, o ventilador.

Seu maior feito para o conforto é elevar a taxa de evaporação na pele de uma pessoa, contribuindo assim para o conforto térmico.

• Índices pluviométricos: resultado da somatória da quantidade de precipitação de água (líquida ou sólida) em determinado local por determinado período de tempo. É um índice dado em milímetros. Dependendo do quanto chove em determinado local e em quais meses mais chove, as estratégias para conforto precisam ser pensadas mais cuidadosamente. Por exemplo, em determinado local só chove no mês de janeiro e chove muito, enquanto que nos outros meses é extremamente quente, neste caso, é necessário pensar modos de proteger a edificação do calor excessivo e do mês de chuva.

1.1.2.Climatologia

A climatologia subdivide o estudo do clima em três áreas: • Macroclima: também chamada de clima regional, é definida a partir de dados de vários postos meteorológicos espalhados em uma grande área e definido pela média entre eles de modo a caracterizar toda a região.

• Mesoclima: diz respeito a uma porção de área menor do que a do macroclima; • Microclima: é o clima mais próximo do nível das edificações.

Como exemplo, podemos dizer que no Estado de São Paulo há um macroclina, na cidade de São Paulo um mesoclima e no centro de São Paulo um microclima.

Segundo o LabEEE, no macroclima, são levantadas as características climáticas de uma região em estações meteorológicas que posteriormente serão reunidas em arquivos climáticos correspondendo a períodos de 30 anos. O período é composto dos dados médios e extremos

10

mensais de temperatura, umidade, precipitação, nebulosidade, horas de sol, entre outros. Por ser mais abrangente, trabalhamos nesta pesquisa com os dados fornecidos pelo macroclima.

2. ARQUITETURA BIOCLIMÁTICA A bioclimatologia é responsável pelo estudo da relação entre o clima e a distribuição dos indivíduos na Terra nos fornecendo parâmetros para o estudo de construções vernáculas e para a arquitetura bioclimática, quando Olgyay (1963) criou a expressão “projeto bioclimático” visando a adequação da arquitetura ao clima local.

A arquitetura bioclimática busca otimizar as relações entre as condicionantes naturais, a redução de impactos ambientais, o conforto ambiental e a redução do consumo energético. Para isso, na década de 1960, Olgyay (1963) desenvolveu a carta bioclimática, com o objetivo de determinar estratégias de adaptação da arquitetura ao clima. No Brasil, é utilizada a carta bioclimática adaptada baseada nos estudos de Givoni (1973) na década de 1990.

2.1. Olgyay e a Arquitetura Bioclimática Victor Olgyay (⭒1910-✝1970), professor da Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Princeton, é considerado pioneiro em estudos sobre arquitetura bioclimática e, junto com seu irmão, Alador Olgyay, desenvolveu estudos sobre a arquitetura integrada com o meio ambiente local. Seus estudos também são chamados de arquitetura bioclimática. Em 1963, Victor Olgyay elabora, em seu livro “Design with climate”, um diagrama denominado carta bioclimática, onde as características climáticas e as necessidades dos usuários são as condicionantes para as soluções de arquitetura. O intervalo entre as variações das condicionantes onde o conforto térmico é experimentado é chamado de “zona de conforto”. O conforto nos trópicos fica em entre 23,2ºC e 26,7ºC, com umidade relativa entre 30% e 70%.

Segundo Olgyay, as condições de conforto podem ser criadas manipulando-se os espaços do edifício, os materiais utilizados na fachada e no interior, os elementos de fachada, como varandas, por exemplo, e ainda a forma, a orientação solar e a relação com o entorno. Para tanto, deve ser feito o estudo do clima da região e do local antes do início do projeto, pois o arquiteto interfere diretamente no microclima, maximizando os aspectos positivos e neutralizando os negativos, propiciando o conforto dos usuários do espaço. Os elementos que

11

mais interferem no conforto ou desconforto relativo ao clima, são sol, temperatura, umidade, precipitação, nuvens e ventos (apud MASCARELLO, 2005).

Olgyay fornece as seguintes indicações para as regiões do globo, de acordo com seu respectivo clima, como mostrado abaixo: • Quente-seco: edificações compactas, com poucas aberturas, paredes espessas e pátio interno. Uso da água para umidificar e produzir evaporação, protegendo do calor durante o dia e do frio à noite e também da radiação direta do sol.

• Quente-úmido: construções retangulares no eixo leste-oeste.

• Frios: necessário conservar o calor nas edificações, o que pode ser feito através de edificações compactas e com pequenas aberturas.

• Temperado: os elementos de arquitetura devem ser sistemas flexíveis, adaptados às variações climáticas. As formas alongadas no eixo leste-oeste são as mais recomendadas.

A ação dos ventos é uma condicionante que dever ser considerada em todos os tipos de climas pois prejudica a sensação térmica em climas frios e a melhora em climas quentes.

(OLGYAY, 1998, apud MASCARELLO, 2005).

2.2. Baruchi Givoni Baruchi Givoni é um arquiteto israelense e, atualmente, um dos especialistas mais reconhecidos do mundo na arquitetura bioclimática, desde a publicação do seu livro “Man, Climate and Architecture” de 1969. Avança nos estudos de Olgyay, sintetizando um climograma em um diagrama psicrométrico onde é possível determinar as zonas bioclimáticas para o verão e o inverno, propondo estratégias para se atingir o conforto.

A carta psicrométrica é uma relação entre a temperatura de bulbo seco e a razão de umidade.

12

Figura 1: Carta Psicrométrica para a cidade de São Luís - MA. Fonte: LAMBERTS, Roberto.

Na carta, os pontos vermelhos representam cada hora do ano e cada número diz respeito à uma estratégia a ser tomada, como vemos a seguir:

Tabela 1: Sugestões para as zonas apresentadas na carta psicrométrica

Nº Estratégia

1

Sugestões

Zona de conforto Ventilação cruzada, ventilação da cobertura e ventilação do piso

2

3

Ventilação

sob a edificação

Resfriamento

Vegetação, fontes d'água ou outros recursos que resultem na

evaporativo

evaporação da água diretamente no ambiente que se deseja resfriar

Massa 4

5

térmica

Materiais e técnicas com o objetivo de diminuir a temperatura

para resfriamento

interior com relação a exterior.

Resfriamento

Ar condicionado. É usado quando as estratégias anteriores não

artificial

surtem efeito

Umidificação do 6

ar

Necessário colocar água no ambiente

7

Inércia térmica

Aquecimento solar passivo e isolamento térmico

Aquecimento

Poucas aberturas, superfícies envidraçadas voltadas para a

solar passivo

fachada

8

Aquecimento 9

artificial

É usado quando o aquecimento solar passivo não é suficiente

Fonte: LAMBERTS, Roberto.

13

2.3. Divisões bioclimáticas Como a nossa área de estudo é o Brasil, um vasto território com diferentes climas, precisamos escolher uma divisão bioclimática para dar base ao trabalho. Algumas das divisões disponíveis são: a classificação de Köppen, de maior divulgação no Brasil, menos descritiva e mais abrangente. A classificação de Gaussen, mais minuciosa sobre as condições climáticas existentes ao longo do país e que utiliza os dados de temperatura e chuva mensal, e também o Zoneamento Bioclimático Brasileiro, de acordo com NBR 15220-3, que divide o país em oito zonas climáticas e define as estratégias de conforto ambiental que devem ser utilizadas em cada uma. Para dar suporte ao trabalho foi escolhida a NBR 15220-3 que leva em conta estudos bioclimáticos utilizando cartas psicrométricas e estabelecendo estratégias de acordo com o local.

3. ZONEAMENTO BIOCLIMÁTICO BRASILEIRO - NBR 15220 (ABNT, 2003) A NBR 15220 (ABNT, 2003) surgiu a partir dos esforços do Grupo de Conforto Ambiental e Eficiência Energética da ANTAC em 1988. O objetivo desse grupo era criar uma normalização específica nesta área. Desde então, surgiram diversas propostas com diferentes abrangências e pressupostos. A comissão de Estudos sobre Desempenho Térmico e Eficiência Energética de Edificações, vinculada ao Comitê Brasileiro de Construção Civil surgiu para unificar as propostas que estavam surgindo e oficializar o processo.

A base de dados da NBR foi feita dividindo-se o território brasileiro em 6500 células, caracterizadas pela posição geográfica, médias mensais de temperaturas máximas e mínimas e das umidades relativas do ar. Para 330 células havia dados climáticos medidos disponíveis, as demais foram estimadas por meio de interpolação. A classificação do clima de cada célula foi feita através da aplicação de uma carta bioclimática adaptada a partir daquela sugerida por Givoni (1992). Depois, para cada célula, foram identificadas as zonas bioclimáticas, agrupando em conjuntos as células iguais. Por fim, foram elaboradas recomendações construtivas para cada zona, com o objetivo de proporcionar condições mínimas de conforto térmico aos usuários.

14

As adaptações à Carta Bioclimática de Givoni não foram feitas com a finalidade de questioná-la, mas sim de considerar as experiências acadêmicas dos profissionais envolvidos e levar em conta alguns aspectos da cultura construtiva de cada região. Segundo o Grupo de Conforto Ambiental e Eficiência Energética da ANTAC as alterações foram feitas porque “A aplicação da Carta Bioclimática original resultou em um zoneamento no qual climas admitidos como distintos foram agrupados em uma mesma zona e climas semelhantes em zonas diferentes. Para tornar o método mais sensível à realidade climática brasileira.” (RORIZ, 1999)

Figura 2: Zoneamento Bioclimático Brasileiro. Fonte: NBR 15220-3

Os parâmetros considerados para a formulação das diretrizes construtivas para cada zona, foram: • Tamanho das aberturas para ventilação; • Proteção das aberturas; • Vedações externas (tipo de parede externa e tipo de cobertura); e • Estratégias de condicionamento térmico passivo.

15

Tabela 2: Orientações construtivas de acordo com a NBR 15220-3.

Zonas

Orientações Construtivas Aberturas para

Sombreamento

Vedações

ventilação

das aberturas

externas

Notas

Parede: Permitir Z1

Médias

leve; O aquecimento passivo

sol Cobertura:

durante o inverno isolada

Permitir Médias

sol Cobertura:

laje Verão:

ventilação

leve

refletora;

Médias

Verão:

sol Cobertura:

durante o inverno isolada

ventilação

leve cruzada.

Inverno:

Aquecimento solar Verão:

Resfriamento

evaporativo Parede:

Z4

Médias

Cobertura:

aberturas

isolada

refletora;

Z5

Médias

Pesada; térmica

Sombrear

Pare:

Sombrear

Cobertura

aberturas

isolada

no

cruzada

Parede:

Z3

suficiente

leve;

durante o inverno isolada

Permitir

é

inverno

Parede:

Z2

laje não

e

massa para

Leve resfriamento; Ventilação Seletiva leve Verão:

ventilação

cruzada;

Inverno:

leve vedações

internas

pesadas

16

Verão:

Resfriamento

evaporativo Parede:

Z6

Médias

e

massa

Pesada; térmica

Sombrear

Cobertura:

aberturas

isolada

para

Leve resfriamento; Ventilação Seletiva Verão:

Resfriamento

evaporativo

e

massa

térmica

Z7

Pequenas

Sombrear

Parede:

aberturas

Cobertura: Pesada Seletiva

para

Pesada; resfriamento; Ventilação

Parede:

leve

refletora;

Z8

Grandes

Sombrear

Cobertura:

aberturas

refletora

leve Verão:

Ventilação

Cruzada Permanente

Fonte: NBR 15220-3

4. CONFORTO TÉRMICO O conforto térmico é a expressão da satisfação do homem em relação ao ambiente térmico que o circunda. Para isso é necessário que haja um balanço térmico estável, de forma que não haja diferenças entre o calor produzido pelo corpo e o calor perdido para o ambiente. Depende de fatores físicos, fisiológicos e psicológicos.

O estudo do conforto térmico permite analisar e estabelecer as melhores condições para um ambiente térmico adequado às condições de atividade e ocupação humana. O estudo deve ser baseado na satisfação ou bem-estar do ser humano com o ambiente térmico, na produtividade humana e na conservação de energia.

Considerando que todos os seres humanos não são iguais e que sentir-se confortável é relativo de pessoa para pessoa, o ideal é buscar a satisfação de um grupo de pessoas, ou seja, criar condições onde o maior número de pessoas se sinta confortável.

17

4.1.ADAPTAÇÕES

O corpo humano é um sistema termodinâmico com temperatura em torno de 37ºC, em constante relação com o ambiente que o circunda. O objetivo desse sistema é encontrar o balanço térmico. Dessa forma, existe uma constante troca de energia em forma de calor, entre o corpo e o meio. A sensação de conforto está intrinsecamente relacionada ao esforço que esse sistema faz para encontrar o balanço térmico. Os constantes esforços de equilíbrio solicitados pelo sistema são chamados de “mecanismos de termo-regulação”. A pele é o órgão termoregulador do organismo, sua temperatura é regulada através do fluxo sanguíneo.

A temperatura do ambiente incita duas reações principais ao corpo: 1. reação ao calor: as altas temperaturas exigem maiores esforços do sistema para a eliminação do calor excedente, em resposta, a vasodilatação aumenta o volume do sangue, acelerando o ritmo cardíaco e provocando a transpiração. O calor excedente será dissipado através de mecanismos de trocas térmicas entre o corpo e o ambiente, podendo ser: a. trocas secas: • condução • convecção • radiação O calor perdido através de trocas secas é chamado de calor sensível. b. trocas úmidas: • evaporação O calor perdido através das trocas úmidas é chamado de calor latente e ocorre, no ser humano, através do suor e da respiração.

2. reação ao frio: em um processo inverso, a necessidade de calor, provoca a vasoconstrição, que irá diminuir o volume do sangue e o ritmo cardíaco, fazendo com que o corpo produza arrepios e tirite, gerando assim atividade e, por consequência, calor.

A adaptação ao clima local pode ocorrer através de duas formas: fisiológica ou cultural.

(BARGHINI, 2016) I. adaptação fisiológica: • aclimatação: processo de adaptação do corpo ao meio ambiente que ocorre durante um curto período de tempo e não é genético; II. adaptação cultural: • vestimenta: representa uma barreira entre o corpo e o meio físico, evitando trocas de calor por convecção; 18

• redes; • fogo, etc.

CAPÍTULO 3 1. A ARQUITETURA E AS CONSTRUÇÕES INDÍGENAS A arquitetura adequada ao clima local é aquela que ameniza as condições de desconforto, ou seja, por mais que o clima esteja rigoroso, a edificação deve ser capaz de manter, na medida do possível, o conforto dos usuários em seu interior.

O conhecimento das variáveis climáticas e das exigências humanas, assim como dos materiais disponíveis fornece a informação necessária para o estudo das construções vernáculas, que são aquelas elaboradas pela população nativa da região com os materiais disponíveis no meio e que atendem à necessidade daquela população. A carta psicrométrica é de grande importância nesse estudo por se tratar de um diagrama que registra as variáveis ambientais que influenciam na troca de calor entre o corpo e o meio ambiente.

As construções indígenas se inserem no contexto da arquitetura vernácula e, no Brasil, devido ao extenso território no sentido norte-sul, há uma diversidade de soluções encontradas.

Devido às diferenças de latitudes, há uma grande quantidade de climas, determinando diferentes técnicas construtivas adaptadas a cada local (DIAMOND, 1997). Segundo Pasquale Petrone em “Aldeamentos Paulistas”, também não se pode desconsiderar que os conquistadores, ao chegarem a um novo mundo, do qual desconheciam os modos de sobrevivência, se utilizaram de conhecimentos indígenas até estarem adaptados.

Os dados sobre os modos de construir de povos antigos advêm de evidências materiais. No caso das populações autóctones brasileiras o estudo se torna um pouco mais complexo já que

19

muitas construções eram feitas com materiais orgânicos que não resistem à passagem do tempo.

Dessa forma, analisamos o modo de construir de determinados grupos da maneira mais tradicional em que foram encontrados excluindo-se soluções trazidas pelos colonizadores e com o auxílio de estudos de arqueologia.

2. OS GRUPOS INDÍGENAS NO BRASIL No Brasil, uma tribo indígena é reconhecida pela língua que fala. As línguas semelhantes são agrupadas em famílias, e as famílias em troncos. Há dois grandes troncos – Tupi e MacroJê. A classificação das línguas em famílias e troncos foi feita pelo professor Ayron Dall’Igna Rodrigues no livro “Línguas brasileiras – para o conhecimento das línguas indígenas”. E são elas:

Figura 3: Tronco Macro-Jê. Fonte: RODRIGUES, 1986.

20

Figura 4: Tronco Tupi. Fonte: RODRIGUES, 1986.

3. ARQUITETURA INDÍGENA Devido à diversidade de tipologias encontradas no Brasil, optamos por fazer um panorama geral sobre o Brasil utilizando como base o livro “Arquitetura dos índios da Amazônia” de Johann Van Legen e os estudos do professor Alessandro Barghini (IBUSP), cruzando as informações de ambos e selecionando as mais relevantes para a pesquisa. Johann Van Lengen estuda as tipologias da imagem abaixo como mais marcantes no território e o professor Barghini acrescenta os Timbira, Wajãpi, Xavantes e Yawalapiti. Optamos por estudar as tribos que possuem maior quantidade de material coletado sobre o seu modo de construir.

21

Figura 5: Grupos indígenas estudas por Johann van Lengen. Fonte: Arquitetura dos índios da Amazônia

Definimos que, para cada tribo estudada, deveria se poder preencher, no mínimo, os seguintes itens da Ficha Catalográfica: Tabela 3: Ficha Catalográfica.

Estrutura

Grupo

Localização

Zona

Principais

Características

Bioclimática

Materiais

Marcantes

Fonte: Autora Para cruzar os dados climáticos com as tribos, foi elaborado um mapa (APÊNDICE A) com o posicionamento aproximado de cada grupo indígena e as estações climáticas, disponibilizadas pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET). A partir da determinação da estação meteorológica mais próxima da tribo era gerada a carta psicrométrica com o auxílio do software desenvolvido pela Universidade da Califórnia (UCLA) – Climate Consultant.

Inicialmente foi feito o levantamento das tribos mais relevantes e os aspectos necessários para, futuramente, dar continuidade à pesquisa, como mostrado abaixo. Por fim, elaboramos uma análise detalhada de uma das tribos, como exemplo de aplicação do método. A numeração de cada tribo corresponde à sua posição no mapa (APÊNDICE A).

22

3.1. LEVANTAMENTOS DE DADOS DE TRIBOS: [1] Aldeia Porquinhos – Timbira (Jê) Localização: Maranhão Zona Bioclimática: Z7 e Z8 Tipo: Permanente Principais Materiais: Barro e folhas de palmeira.

Características marcantes: Taipa

Figura 7 - Carta Psicrométrica de Barra do Corda, MA. Fonte: Climate Consultant – UCLA Tabela 4 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Timbiras

Verão

Aberturas

Tamanho das Aberturas

7

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas para ventilação; Sombreamento das aberturas

Pequenas: Sombrear aberturas

Pesada

Pesada

8

Ventilação cruzada permanente

Sombreamento das aberturas

Grandes: Sombrear aberturas

Leve Refletor a

Leve refletora

Invern Zona o

Parede

Cobertur a

23

[2] Xavante (Jê) Localização: Mato Grosso Zona Bioclimática: Z5, Z6, Z7 e Z8 Tipo: Permanente Principais Materiais: Folhas de palmeira e de taquara.

Características marcantes: Aldeia em meia lua. As casas possuem todas a mesma altura e uma área entre 20 a 30m².

Figura 8 - Carta Psicrométrica de Três Lagos, MS. Fonte: Climate Consultant – UCLA

Tabela 5 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Xavantes

Zon a

Inverno

5

Vedações internas pesadas (inércia térmica)

Verão

Ventilação cruzada

Aberturas¹

Tamanh o das Parede Abertura s

Aberturas para Médias: ventilação; Leve Sombrear Sombreamento refletora aberturas das aberturas

Cobertur a

Leve isolada

24

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas para Médias: ventilação; Sombrear Sombreamento aberturas das aberturas

Pesada

Leve isolada

7

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas para Pequenas: ventilação; Sombrear Sombreamento aberturas das aberturas

Pesada

Pesada

8

Ventilação cruzada permanente

Vedações internas pesadas (inércia térmica)

6

Grandes: Leve Sombreamento Sombrear Refletor das aberturas aberturas a

Leve refletora

[3] Nambikwara Localização: Mato Grosso e Rondônia Zona Bioclimática: Z5, Z6, Z7 e Z8 Tipo: Permanente/ Temporária Principais Materiais: Palha e Taquara Características marcantes: As aldeias são geralmente conhecidas como aldeia dos mortos porque os mortos são enterrados no pátio central. São encontrados 3 tipos de habitações: •

Cônicas;

•

Grandes e compridas;

•

Pequenas e semi-esféricas.

25

Figura 9 - Carta Psicrométrica de Vilhena, RO. Fonte: Climate Consultant – UCLA Tabela 6 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Nambikwara

Verão

Aberturas

Tamanho das Aberturas

Parede

Cobertur a

5

Vedações internas pesadas (inércia térmica)

Ventilação cruzada

Aberturas para ventilação; Sombreamento das aberturas

Médias: Sombrear aberturas

Leve refletora

Leve isolada

6

Vedações internas pesadas (inércia térmica)

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas para ventilação; Sombreamento das aberturas

Médias: Sombrear aberturas

Pesada

Leve isolada

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas para ventilação; Sombreamento das aberturas

Pequenas: Sombrear aberturas

Pesada

Pesada

Zon a

Inverno

7

26

Ventilação cruzada permanente

8

Sombreamento das aberturas

Grandes: Sombrear aberturas

Leve Refletor a

Leve refletora

[4] - Yanomami Localização: Amazônia/ Venezuela Zona Bioclimática: Z8 Tipo: Permanente/ Shabono Principais Materiais: Pínulas de folhas de palmeira. Cipós. Barrotes. Folhas de bananeira.

Características marcantes: Casa queimada a cada 2 anos. Aldeia- Casa. Forma poligonal com cada lado correspondendo a uma família. Casa para 50-200 pessoas. Abertura central para entrada de sol. Cada moradia Yanomami é uma seção do Shabono – toda a aldeia dentro de uma única construção.

Figura 10 - Carta Psicrométrica de Barcelos, AM. Fonte: Climate Consultant – UCLA

27

Tabela 7 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Yanomami

Zon a

Inverno

Verão

Ventilação cruzada permanente

8

Aberturas

Tamanh o das Parede Abertura s

Grandes: Leve Sombreamento Sombrear Refletor das aberturas aberturas a

Cobertur a

Leve refletora

[5] Aldeia do Ponto – Timbira (Jê) Localização: Maranhão Zona Bioclimática: Z7 e Z8 Tipo: Permanente Principais Materiais: Folha de babaçu ou anajá na cobertura. Folhas de palmeira nas cumeeiras.

Características marcantes: Separação entre teto e parede. O fechamento pode ser: completo, menos frontal ou apenas no quarto de reclusão.

Figura 11 - Carta Psicrométrica de Caxias, MA. Fonte: Climate Consultant - UCLA

28

Tabela 8 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Timbiras da Aldeia do Ponto

Verão

Aberturas

Tamanho das Aberturas

7

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas para ventilação; Sombreamento das aberturas

Pequenas: Sombrear aberturas

Pesada

Pesada

8

Ventilação cruzada permanente

Sombreamento das aberturas

Grandes: Sombrear aberturas

Leve Refletor a

Leve refletora

Invern Zona o

Parede

Cobertur a

Choça – Timbira (Jê) Localização: Sem localização fixa. Utilizado como forma de acampamento pelas mulheres timbiras em excursão fora da tribo.

Tipo: Provisória Principais Materiais: Folhas de palmeira.

Características marcantes: Circular, feita com oito ou mais galhos de árvores finos fincados no chão. Verga-se os galhos de modo a convergir para o centro. Os galhos são, por fim, entrelaçados e cobertos com folhas de palmeira. Se bem executado, é completamente impermeável à água.

[6] Grupo Meridional e Setentrional – Krahó (Jê) Localização: Maranhão, Pará e Tocantins Zona Bioclimática: Z7 e Z8 Tipo: Permanente Principais Materiais: Folhas de buriti ou de piaçava. Estacas de madeira formam as paredes.

Embira para amarrar as estacas.

Características marcantes: Nome da tribo é o nome do lugar onde a tribo foi edificada, dessa forma uma mesma tribo pode ter vários nomes. As casas são dispostas em círculos e algumas

29

possuem influência dos sertanejos da região. Não possuem janelas. O barro não esconde completamente o esqueleto da edificação. Sem divisões interna.

Figura 12 - Carta Psicrométrica de Araguatins, TO. Fonte: Climate Consultant – UCLA Tabela 9 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Krahó

Verão

Aberturas

Tamanho das Aberturas

7

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas para ventilação; Sombreamento das aberturas

Pequenas: Sombrear aberturas

Pesada

Pesada

8

Ventilação cruzada permanente

Sombreamento das aberturas

Grandes: Sombrear aberturas

Leve Refletor a

Leve refletora

Invern Zona o

Parede

Cobertur a

[7] Kaiapó (Jê) Localização: Mato Grosso do Sul e sul do Pará 30

Zona Bioclimática: Z5, Z7 e Z8 Tipo: Permanente e temporária Principais Materiais: Cipós, madeiras, fibras e folhas de palmeiras Características marcantes: Aldeia se estrutura em volta de um grande pátio onde fica a casa dos homens.

Figura 13 - Carta Psicrométrica de Querência, MT. Fonte: Climate Consultant – UCLA Tabela 10 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Kaiapós

Zon a

5

Inverno

Vedações internas pesadas (inércia térmica)

Verão

Ventilação cruzada

Aberturas

Tamanh o das Parede Abertura s

Aberturas para ventilação; Médias: Sombreamento Sombrear Leve das aberturas aberturas refletora

Cobertur a

Leve isolada

31

7

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

8

Ventilação cruzada permanente

Aberturas para ventilação; Pequenas: Sombreamento Sombrear das aberturas aberturas

Pesada

Grandes: Leve Sombreamento Sombrear Refletor das aberturas aberturas a

Pesada

Leve refletora

[8] Kamaiurá (Tupi-Guarani) Localização: Mato Grosso Zona Bioclimática: Z5, Z6, Z7 e Z8 Tipo: Permanente Principais Materiais: Sapê, taquara e folhas de palmeira.

Características marcantes: Aldeias Circulares. As casas possuem teto arredondado até o chão. Casa das flautas (para rituais) se localiza no centro da aldeia.

Figura 14 - Carta Psicrométrica de Gaúcha do Norte, MT. Fonte: Climate Consultant – UCLA

32

Tabela 11 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Kamaiurá

Zon a

Inverno

Verão

Vedações internas pesadas (inércia térmica)

Ventilação cruzada

Vedações internas pesadas (inércia térmica)

Aberturas

Tamanh o das Parede Abertura s

Cobertur a

Aberturas para ventilação; Médias: Sombreamento Sombrear Leve das aberturas aberturas refletora

Leve isolada

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas para ventilação; Médias: Sombreamento Sombrear das aberturas aberturas

Pesada

Leve isolada

7

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas para ventilação; Pequenas: Sombreamento Sombrear das aberturas aberturas

Pesada

Pesada

8

Ventilação cruzada permanente

5

6

Grandes: Leve Sombreamento Sombrear Refletor das aberturas aberturas a

Leve refletora

[9] Cinta-largas – Mondé (Tupi) Localização: Mato Grosso e Rondônia 33

Zona Bioclimática: Z5, Z6, Z7 e Z8 Tipo: Permanente Principais Materiais: Folhas de babaçu, palhas de açaí, paxiúba, madeira, barro.

Características marcantes: Constroem as casas em áreas de fortes ventos.

Figura 15 - Carta Psicrométrica de Cacoal, RO. Fonte: Climate Consultant - UCLA Tabela 12 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Cinta Largas

Zon a

5

6

Inverno

Verão

Vedações internas pesadas (inércia térmica)

Ventilação cruzada

Vedações internas pesadas (inércia térmica)

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

Aberturas

Tamanh o das Parede Abertura s

Cobertur a

Aberturas para ventilação; Médias: Sombreamento Sombrear Leve das aberturas aberturas refletora

Leve isolada

Aberturas para ventilação; Médias: Sombreamento Sombrear das aberturas aberturas

Leve isolada

Pesada

34

7

Resfriamento evaporativo e Massa térmica para resfriamento; Ventilação seletiva

8

Ventilação cruzada permanente

Aberturas para ventilação; Pequenas: Sombreamento Sombrear das aberturas aberturas

Pesada

Grandes: Leve Sombreamento Sombrear Refletor das aberturas aberturas a

Pesada

Leve refletora

[10] Kaingang (Jê) Localização: Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo Zona Bioclimática: Z1, Z2, Z3 e Z5 Tipo: Permanente, Temporária e subterrânea Principais Materiais: Permanentes: Folhas de coqueiro, sapé, taquaruçu. Vergônteas.

Temporárias: Folhas de palmeira e varas, folhas de coqueiro.

Subterrânea: terra, folhas e varas Características marcantes: Permanentes: Seção Ogival Temporárias: Com uma água ou duas e com uma inclinação de 45º. Orientadas contra o vento dominante.

Figura 16 - Carta Psicrométrica de Rancharia, SP. Fonte: Climate Consultant – UCLA

35

Figura 17 - Carta Psicrométrica de Nova Tebas, PR. Fonte: Climate Consultant – UCLA

Figura 18 - Carta Psicrométrica de Xanxeré, SC, MA. Fonte: Climate Consultant - UCLA

36

Figura 19 - Carta Psicrométrica de Passo Fundo, RS, MA. Fonte: Climate Consultant - UCLA [11] Kaingang/ Xokleng (Jê) Localização: Santa Catarina, Rio Grande do Sul Zona Bioclimática: Z1, Z2 e Z3 Tipo: Subterrâneas permanentes Principais Materiais: Coberturas de folhas sustentadas por madeira.

Características marcantes: Casas circulares escavadas na terra ou em pedras basálticas.

Tradição Taquara-Itararé.

Figura 20 - Carta Psicrométrica de Indaial, SC. Fonte: Climate Consultant - UCLA 37

Tabela 13 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Xokleng

Verão

Aberturas

Tamanh o das Parede e Abertur Cobertura as

Zona

Inverno

1

Aquecime-nto solar da edificação; Vedações internas pesadas (inércia térmica)

Médias: Aberturas para Permitir ventilação; o Sol Sombreamento durante o das aberturas inverno

2

Aquecimento solar da edificação; Ventilação Vedações cruzada internas pesadas (inércia térmica)

3

Aquecimento solar da edificação; Ventilação Vedações cruzada internas pesadas (inércia térmica)

Notas

Leve E Leve e Isolada

O condicionamento passivo será insuficiente durante o período mais frio do ano

Médias: Aberturas para Permitir ventilação; o Sol Sombreamento durante o das aberturas inverno

Leve E Leve e Isolada

O condicionamento passivo será insuficiente durante o período mais frio do ano

Médias: Aberturas para Permitir ventilação; o Sol Sombreamento durante o das aberturas inverno

Leve Refletora E Leve isolada

Como não havia tempo hábil para elaborar análises para todas as tribos aqui listadas, foi feito um quadro resumo cruzando os biomas e a principal característica das tipologias indígenas em biomas brasileiros. Esse quadro resumo foi baseado nos estudos do Professor Alessandro Barghini e se encontra no apêndice B deste trabalho.

38

CAPÍTULO 4 Como resultado da pesquisa, produzimos a análise abaixo acerca dos índios Kaingangs, listado como um dos grupos de interesse desta pesquisa, devido a sua atual relevância arqueológica.

1. A HABITAÇÃO KAINGANG No Brasil, a separação entre as tribos indígenas é feita através de classificação linguística.

Os índios conhecidos como “Kaingangs” falam a língua “Kaingang” e se encontram dentro do tronco linguístico “Macro-Jê”. Pertencendo à família “Jê”, a língua Kaingang se subdivide em outros quatro dialetos, são eles: Kaingang do Paraná, Kaingang Central, Kaingang do Sudoeste e Kaingang do Sudeste.

Os falantes do Kaingang se distribuem ao longo de uma faixa que vai do norte do Rio Grande do Sul, cortando Santa Catarina e Paraná, o sudoeste do Vale do Paranapanema e chegando, por fim, ao sudeste do Mato Grosso do Sul. Essa população não é necessariamente encontrada nesses pontos atualmente, mas são descritas pela literatura especializada como tendo vivido ao longo desse caminho.

Por se distribuir em diferentes latitudes, esse grupo indígena tem contato com diferentes climas, que demandam diferentes técnicas construtivas. Para determinar a faixa de conforto térmico das construções em sua localização, utilizamos como suporte o software Climate Consultant da UCLA. Para isso, recorremos aos dados colhidos em estações meteorológicas espalhadas por todo o Brasil que geram um arquivo do tipo EPW, compatível com o software, permitindo assim que ele possa fazer uma análise adequada da região.

Com o software pudemos ver que essas regiões se encontram confortáveis durante um período de 17 a 23% do ano.

Para se atingir o objetivo desta pesquisa, que é a análise do ponto de vista do conforto ambiental, confrontamos os dados colhidos das habitações Kaingang com o que a Norma de Desempenho 39

Térmico de edificações, parte 3: Zoneamento Bioclimático Brasileiro (NBR15220-3) solicita para as diferentes zonas bioclimáticas. A faixa correspondente à ocupação do território pelos índios Kaingang se encontra nas zonas bioclimáticas 1, 2, 3 e 5 e podem ser sintetizadas da seguinte maneira: Tabela 15 - Sugestões da Norma NBR 15220-3 para as zonas onde se encontram os Kaingangs

As habitações podem ser classificadas como temporárias ou permanentes dependendo do critério adotado. Para esse estudo de caso adotamos que uma habitação é permanente se a intenção é viver ali por mais de um mês. De uma maneira geral, a literatura descreve 3 tipos principais de casas Kaingangs, são elas: a palhoça, a casa subterrânea e a casa temporária.

Os índios Kaingang se distinguem dos outros grupos Jês quanto ao posicionamento em relação à água. De maneira geral, os Jês preferem se assentar próximos a grandes rios inundáveis, enquanto que os Kaingang preferem estar em pontos mais altos, livres de alagamento, mas com uma fonte de água próxima. Isso se dá devido à uma lenda Kaingang que diz que, em tempos remotos, houve um grande dilúvio que dizimou toda a população da tribo, restando apenas um homem – Kanhru/ Kairucrê - com poderes. Esse homem criou seu irmão Kamé, também com poderes, e juntos reconstruíram a tribo, dando origem aos dois clãs Kaingang existentes até hoje e que levam os nomes dos irmãos.

Muitos aspectos da cultura Kaingang foram perdidos no contato com o imigrante europeu, porém, alguns aspectos permaneceram, que são eles: 

A organização espacial e os sítios escolhidos para construção dos assentamentos e moradias estão geralmente localizados em platôs que formam os interflúvios dos grandes rios do planalto meridional;

40



Aldeias construídas próximas a pequenos arroios e cursos menores dos rios locais (chamados de lajeados);



Mobilidade espacial dentro de territórios bem delimitados;



Agricultura de subsistência, com o pinhão como principal alimento.

Mesmo com as mudanças nos padrões construtivos e arquitetônicos, essas duas características se mantém nesse grupo. Atualmente, os estudos mais consistentes sobre o modo de viver Kaingang são desenvolvidos pela arqueologia: “Acreditamos que entre a tradição Taquara e o índios Kaingang apenas temos uma diferença na nomeação por parte de arqueólogos e etnógrafos, pois estamos tratando com o mesmo grupo humano que teve sua difusão pelo Planalto Meridional, adaptando-se a ele e criando todo um sistema cultural que lhe serviu ao longo de sua expansão e fixação nas áreas pertencentes à região sul do atual Estado Nacional. Temos também que considerar que pelo fato de começar a entrar em contato, ainda que de forma esporádica com o homem branco, que estaria iniciando a ocupação do território indígena, algumas expressões da sua cultura começam a mudar.

No decorrer da pesquisa, percebemos que os traços culturais dessas populações ainda se mantêm, mas sob outras formas. Se os Kaingang não mais constroem estruturas subterrâneas é porque aprenderam a fazer suas habitações de outras maneiras e com outros formatos, utilizando igualmente outras ferramentas. Os motivos para que isso tenha acontecido podem estar ligados a vários fatores como: a diminuição do território devido à penetração nas áreas nativas pelo homem branco, com a implantação de novos núcleos populacionais e exploração do antigo território indígena através da derrubada da mata, para a abertura de estradas, o plantio em larga escala e o pastoreio, fazendo com que aos poucos os remanescentes nativos sejam levados a outras áreas e lá adotem os costumes do homem branco, entre eles a construção de casas de madeira com formato retangular, o uso de roupa e muitos outros aspectos verificados nos estudos etnográficos já produzidos e que alteraram os elementos de cultura. (Zuch-Dias, p.186-7)

Tipologia 1 - Casas Subterrâneas São encontradas em terras altas, geralmente frias, de chuvas abundantes e associadas com matas de Araucaria angustifólia.

41

Sistematicamente descrita pela arqueologia na chamada tradição taquara que é a denominação arqueológica dos mais de 3.500 sítios arqueológicos (entre os quais se encontram casas semi e subterrâneas, montículos e grutas funerárias). Os dados coletados pela arqueologia apontam uma sociedade horticultora e ceramista de matriz Jê que emigrou do Planalto Central para o sul do Brasil. O uso de casas subterrâneas se trata de uma adaptação ambiental visando a proteção ao frio e aos fortes ventos da região. Os últimos registros de ocupação desse tipo de habitação datam do século XIX, período marcado pelo contato desses indígenas com o europeu.

Os sítios arqueológicos identificados à tradição Taquara são de cinco tipos principais e possuem associação direta com os assentamentos humanos.

Constituem-se de: casas subterrâneas, predominante nas regiões mais altas do planalto; casas semi-subterrâneas, variação do primeiro tipo, porém de ocorrência nas encostas (ambas possuíam cobertura de palhas com esteio central); sítios superficiais lito-cerâmicos, indicando possíveis aldeamentos; montículos funerários (...) e, por fim, grutas funerárias, nas quais eram lançados os corpos dos mortos comuns. (Sandoval, p.49-50) Podemos caracterizar a ocupação do planalto como uma adaptação a um ambiente rico em pinhão, por grupos baseados na organização tribal, especializados na coleta e utilização do pinhão e muito possivelmente, complementada com uma horticultura realizada principalmente na várzea dos rios. Possuíam casas subterrâneas. Produziam uma cerâmica de pequenas dimensões e alguns artefatos líticos indispensáveis para o tratamento da madeira. Sepultavam seus mortos em abrigos e os indivíduos mais destacados em montículos. (Beber, p.28) A datação provável das habitações subterrâneas indica que tenham predominado na região dos séculos IV ao XVII, quando são já referidos por cronistas e etnógrafos, novos registros de habitações, desta vez, grandes casas de palha, à semelhança daquelas dos seus parentes centrais e setentrionais. A reocupação destas casas era frequente, e datações de objetos encontrados no seu interior sugerem que foram utilizadas em diversos períodos diferentes, com intervalos que chegavam a mais de 100 anos. (Zuch-Dias, p.186) 99% dos sítios com casas subterrâneas estão situados a partir dos 400m de altitude, concentrando-se em sua esmagadora maioria (89,4%) entre os 700 e 1200m (Beber, p.198)

Quanto às dimensões, variam de 2 até 20m de diâmetro, com predominância de casas no intervalo de 5 a 10m. A profundidade das casas varia entorno de 1 a 2m, e o teto é possivelmente formado por um esteio central e coberto por palhas, porém, são apenas hipóteses ainda. A maior

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parte das casas é circular, casas elipsoides ou alongadas frequentemente são descritas como galerias de acesso.

Tipologia 2 - Palhoça A palhoça é um tipo de habitação permanente, acima do solo, e usada principalmente durante o verão. Após o século XIX passa a ser a construção predominante. As descrições encontradas sobre ela foram as seguintes: À medida que o ambiente se modifica em função da menor altitude, configurando uma nova composição florística, especialmente na encosta do planalto, onde a temperatura torna-se mais amena e o frio deixa de ser tão intenso, os grupos portadores da tradição Taquara adotam um tipo de assentamento sem os típicos pisos rebaixados, mas formando aldeias de grandes dimensões, nos quais são feitas cabanas, que foram identificadas pelos acúmulos dos fragmentos de cerâmica, além de suas fogueiras e artefatos líticos. (Beber, p.251) Passam a ser mais registradas pela literatura a partir do século XIX, quando a habitação subterrânea é deixada de lado. Apresentam planta baixa retangular, com telhado de duas águas, totalmente edificada em palha. Uma das primeiras descrições de uma grande casa Kaingang é feita em São Jerônimo, pelo alemão Franz Keller em seu relatório para o governo imperial em 1867.

“Os ranchos deles, cobertos de folhas de palmeira, apresentam na secção uma forma ogival mais pontuda, isto é, são mais altos em proporção da largura do que os dos Cayoás.O chão batido tem um declive suave dos dois lados para o centro, em conformidade com a inclinação necessária para as camas, representadas por imensos pedaços de casca grossa de um pau, e tão lisas que parecem tapetes de caoutchouc ou gutta-percha. A rede do Guarani e do Cayoá é-lhes desconhecida.

No meio das duas fileiras de camas fica uma passagem livre, onde cada família faz o fogo para o preparo das comidas” (Keller, 1974:).

Na mesma época há a descrição do viajante inglês Thomas Bigg-Wither sobre os Kaingangs que habitam o alto Ivaí: “Guiados pelo próprio cacique, visitamos todas as palhoças, em número de quatro.

Essas palhoças eram retangulares no plano, embora fossem de tamanhos diferentes, todas de largura e altura uniformes, sendo a largura de 15 pés. A maneira de construir era peculiar e de difícil descrição. A armação consistia de vergônteas verdes, com um comprimento de 16 a 18 pés, enfiadas no chão num espaço de 2 pés entre uma e outra, em duas linhas paralelas, com uma distância de 15 pés. Estas vergônteas, nas palhoças prontas, eram curvadas em direção uma da outra, até que as pontas se encontrassem. Nesta posição eram amarradas a um pau que servia de

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cumieira, colocado em cima, ao comprido. Havia outros paus, servindo de sarrafos, amarrados, horizontalmente sobre as vergônteas curvadas. A coberta era de folhas de palmeira, que vinham desde a cumieira até o solo. As duas extremidades da palhoça eram tapadas com uma armação de varas de bambu, também cobertas de folhas de palmeira. A diferença estava em que, enquanto os lados eram curvos e formavam o telhado e a estrutura principal da palhoça, as extremidades eram de paredes retas, sem serem absolutamente necessárias como sustentáculo do resto da estrutura. Havia em cada lado uma abertura estreita para entrada e saída, coberta de folhas de palmeira, de maneira tal que, ao entrar ou sair uma pessoa, a única coisa a fazer era puxá-las para um lado”.

“Essa é a palhoça comum de todos os índios da tribo dos Coroados, quer selvagens ou mansos. Encontramos palhoças exatamente iguais a essas habitadas pelos Coroados selvagens que vivem em Corredeira do Ferro e, então, quando, dois anos mais tarde, visitei mais outras tabas de índios do Rio Tibagi, achei que os ranchos não eram diferentes dos de Colônia Teresa” “A disposição interna era muito simples. Dos dois lados havia carreiras de folhas secas de palmeiras. Estas eram as camas dos índios, que dormem dez ou doze juntos em um rancho, com a cabeça voltada para o lado e os pés virados para o meio da palhoça. No centro havia uma passagem de cerca de 2 pés e 6 polegadas de largura e, ao longo da mesma, ardia uma fogueira ou mais” (Bigg-Wither, [1878] 1974).

Na segunda metade do século XIX, Reinhold Hensel visitou o toldo de Caseros no Rio Grande do Sul e fez a seguinte descrição: “As suas choças são montadas sobremaneira elegante e asseadamente e se distinguem com vantagem das dos brasileiros mais pobres. Como base da construção servem dois troncos fracos, cuja extremidade superior está bifurcada.

Conforme o comprimento da choça, eles são enterrados pela extremidade inferior.

Sobre as forcas é colocada uma barra a qual assim forma a cumieira da choça. Ao longo dessa linha central estão, do lado, duas estacas, uma na frente, outra atrás, fincadas no chão, estando também bifurcadas em cima, porém só atingem a altura de 2 - 3 pés. Sobre elas também estão barras que suportam a borda inferior do telhado. Sobre este andaime então é colocado o vigamento ou taipa, muito semelhante ao de nossas casas. O telhado é formado de capim seco, comprido e é bem idêntico aos telhados de capim comprido, assim como se encontra em nosso país [nota: na Alemanha] no campo. As paredes laterais baixas da casa e a cumieira bastante alta se compõe de sarrafos semelhantes aos do telhado; em cima também são cobertos daquele capim pelo exterior. A porta se encontra numa das fachadas” (Hensel 1928:70-71).

44

A descrição feita por Hensel é ligeiramente distinta de todas as outras encontradas para o mesmo período.

No século XX, Gustav von Koenigswald descreve da seguinte forma uma casa comunal no Paraná: “Assim que escolheram o lugar abrem uma clareira grande e aproveitam os troncos finos das árvores e palmeiras para construir seus ranchos compridos que servem para acolher diversas famílias. "As paredes geralmente possuem 5 m. de largura e conforme o número de moradores (até 80 pessoas), 10 a 15 m., e até 30 m. e mais de comprimento, em ângulos retos. Os ranchos são construídos com troncos e estacas de madeira que são amarrados entre si firmemente com cipós. Os dois lados pela largura sustentam um telhado baixo formado por vigamento e folhas de palmeira e cuja parte maior não ultrapassa 5 metros. Menos freqüentemente são cobertos de capim e taquaras. “O interior das cabanas forma um único compartimento, não existindo paredes internas e repartições. Pelo meio, na direção do comprimento, estende-se um largo corredor, um pouco mais baixo, tendo nos dois extremos uma porta estreita que conduz à saída. As camas das famílias se estendem a pequena distância nos dois lados do corredor no qual sempre, até durante toda a noite, um fogo é conservado.” (Koenigswald, 1903)

Tipologia 3 – Casas Temporárias É um tipo de habitação temporária que, durante muito tempo, a literatura aceitou como a habitação padrão dos índios Kaingang, o que foi uma forma de inferiorizar esse povo durante o período da pacificação, até que, na década de 1960/70, a arqueologia veio mostrar que existem outras tipologias com outras funções.

“Eles fincam no chão, oblíqua e paralelamente entre si, duas ou três varas. Depois eles cortam uma palmeira nos arredores e trazem as folhas dessa palmeira. Eles empregam essas folhas à guisa de cobertura e as preparam da seguinte maneira: seguram as folhas das palmeiras pelo pedúnculo no alto e, dirigindo-se para sua extremidade, vão rasgando as tiras das folhas à direita e à esquerda, com o polegar.

As tiras pendem, assim, livremente retidas pelas fibras do pedúnculo. Segurando-se a folha horizontalmente, as tiras caem e formam uma dupla cortina espessa.

“As folhas assim preparadas são dispostas horizontalmente, do lado exterior, sobre as duas peças fixadas na terra obliquamente, começando por baixo. As folhas são atadas às varas com a ajuda das tiras rasgadas, sem fazer nó, introduzindo as extremidades rasgadas numa fenda qualquer. A folha superior recobre ligeiramente a precedente, como as telhas. Às vezes a cabana é sustentada por uma estaca fincada

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do lado oposto, ou então se constrói, do outro lado, um outro telhado, de menor dimensão que o primeiro, obtendo assim uma cobertura de dois lados.

“Uma série de habitações semelhantes formam uma espécie de corredor, mas cada proprietário tem a sua própria” (Maniser 1930:766-767).

O inspetor do SPI em São Paulo também descreve esse tipo de habitação no momento em que está ocorrendo a “pacificação” dos Kaingang: “Os Caingangue constroem suas casas, segundo dois tipos: o primeiro, de uma só água, o segundo de duas. Sobre varas fincadas no chão com uma inclinação de 45 graus, mais ou menos, e apoiadas no terço inferior sobre uma viga horizontal amarram-se outras, também horizontais, com cipó, destinadas a representarem o papel de ripas, e nelas se fixam folhas de coqueiro; tem-se assim uma casa de primeiro tipo, a qual fica completamente desabrigada pela frente e pelos flancos.

“O outro tipo contrói-se fechando a frente do anterior, por uma outra coberta feita segundo o mesmo processo; uma dessas duas cobertas, porém, excede superiormente a outra, a fim de obviar ao inconveniente da construção não possuir cumieira; os flancos ficam geralmente abertos, mas às vezes coloca-se em um deles uma terceira tapagem.

“Sob a influência do que observam no nosso acampamento, já começaram eles a modificar as suas construções, adotando esteios e cumieiras; mas as paredes continuam a ser supridas pelo prolongamento das coberturas até ao solo.

“Em viagens ou expedições, para caçadas ou outros fins, os Caingangue nunca pernoitam sem antes construírem alguns abrigos rapidamente feitos, segundo o primeiro tipo” (Barbosa 1947).

46

CAPÍTULO 5

CONCLUSÕES E SUGESTÕES Pudemos aprender com a pesquisa qual a combinação entre forma, materiais locais, aberturas escolhida por cada grupo indígena de modo a encontrar o melhor equilíbrio entre conforto, facilidade de construção, adequação ao território e identidade cultural Percebe-se também que as características climáticas são particulares a uma determinada posição geográfica (podendo ser alterada apenas em parte pelo impacto do ser humano no uso e ocupação do território) e é muito vantajoso energeticamente se utilizar estratégias adequadas e materiais locais, considerando-se também que vivenciamos tempos de mudanças climáticas e consumo energético excessivo.

Quanto à análise que fizemos, pudemos perceber que as influências do homem branco no modo de viver Kaingang acarretaram em mudanças substanciais no modo de construir desse povo. Até o período em que a interação entre eles se torna mais frequente, há o uso das três tipologias construtivas concomitantemente, respeitando a localização, o clima e a população a ser atendida. Verifica-se uma grande mobilidade dentro do território, assim como a escolha de sítios específicos respeitando a cultura desse povo. Com o contato com o homem branco, a tipologia subterrânea é perdida em detrimento daquelas acima do solo que, com o tempo, também são modificadas para se adequar ao modelo europeu, a partir de políticas indigenistas implantadas no final do século XIX e início do século XX. Para nossa pesquisa apenas interessa as técnicas construtivas originais, sem a influência do imigrante.

Quando confrontadas com a Norma de Desempenho Térmico de edificações, parte 3: Zoneamento Bioclimático Brasileiro e diretrizes construtivas para habitações unifamiliares de interesse social, percebe-se que modo de construir Kaingang é adequado e responde de maneira satisfatória às diretrizes dadas, visto que: 

A ventilação cruzada é dada pelas portas em cada extremidade;



Sombreamento de aberturas não é necessário devido a ausência de aberturas além das portas; 47



Paredes externas e coberturas em palha permitem uma elevada taxa de renovação do ar;



Inércia térmica garantida pelo solo nas habitações subterrâneas utilizadas em época de frio.

De uma maneira geral, o trabalho atingiu as expectativas esperadas sem grandes dificuldades, sendo um primeiro passo para futuras pesquisas nessa área.

48

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15220: desempenho térmico de edificações – Parte 2: métodos de cálculo da transmitância térmica, da capacidade térmica, do atraso térmico e do fator solar de elementos e componentes de edificações. Rio de Janeiro, 2005.

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51

APÊNDICE A:ESTAÇÕES METEOROLÓGICAS MAIS PRÓXIMAS ÀS TRIBOS ESTUDADAS

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Fontes: Mapa base: IBGE, Diretoria de Geociências, Coordenação de Recursos Naturais e Estudos Ambientais, Cadastro de Terras Indígenas 2009; e Fundação Nacional do índio - Funai.

Notas: 1. Informações até dezembro de 2009.

2. Localização Face à escala empregada, alguns indicativos de Parques Terrasdisponível Indígenasem: não aparecem em função uperposição d estimada das tribos comnúmeros base no site “Povos Indígenas noeBrasil” https://pib.socioambiental.org.

3. Dados das estações meteorológicas em: http://www.inmet.gov.br/portal/index.php?r=estacoes/estacoesautomaticas, acesso em 10/08/2017.

52

APÊNDICE B: QUADRO RESUMO BIOMAS

ZONAS BIOCLIMÁTICAS (NBR 15220-3)

Z1

Z2

Z3

Z4

Z5

Z6

Z7

AM7 XINGUANA

AM5

Z8 AM8 1- Tukano, 2 - Ianomami, Tupis, 3- Apiácas, Nambiquaras, 4- Timbiras

AMAZÔNIA

XINGUANA

MA1 - Kaingang/Xokleng

MA2 KAINGANG

MATA ATLÂNTICA

MA3 KAINGANG e TUPIS (1PARAKANA)

CAATINGA

CE2 -1-Xavante 2- Tapirape

CE3

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MA5 KAINGANG

MA6 GUARANIS

MA8 - Tupis (Assurini)

CA5

CA6

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CA8

CE5

CE6

CE7

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PL5 GUATÓS

PL6

CERRADO

PL8

PANTANAL

PAMPA

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