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Introdução Introdução

Ao fazer uma rápida pesquisa a respeito da violência contra mulher no Distrito Federal, percebe-se que a mulher não está segura nem dentro da própria residência nem fora dela. Como é possível garantir o mínimo de segurança à mulher, se dentro da própria casa ela já sofre com os abusos? Vivemos com medo em todos os lugares, ficamos refém do medo. Pensando nas raízes dos problemas de desigualdade que enfrentamos, acredito que quando a mulher se sentir segura para ir e vir, teremos uma sociedade equitativa e, assim, os erros do passado poderão ser corrigidos.

Mas, enquanto isso não é possível, o presente trabalho propõe, a partir destas questões levantadas, formas para que a cidade seja mais segura para as mulheres, principalmente no quesito da mobilidade urbana. Utilizando as ferramentas que o planejamento e desenho urbanos fornecem para tornar a cidade mais acessível à mulher. Como objeto de estudo empírico propõese intervenções urbanas com foco em gênero em uma área de Região Administrativa (RA) Santa Maria/DF. Justifica-se pela sua condição periférica, na qual as experiências cotidianas das mulheres são marcadas por um sobreposição de opressões.

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Com efeito, as mulheres em condição periférica estão submetidas à uma sobreposição de opressões, na medida em que que além das rotinas múltiplas, típicas do cotidiano de qualquer mulher, se sobrepõe às vulnerabilidades espaciais - falta de autonomia financeira

(muitas mulheres precisam abandonar o trabalho para cuidar dos filhos), sujeição a trabalhos de baixa remuneração, mais horas gastas no transporte coletivo, sobretudo para acessar os locais mais qualificados de trabalho e educação que ainda estão nas áreas centrais, maior tempo gasto com as atividades domésticas (não podem se dar ao luxo de pagar por esses serviços), falta de tempo ou recursos para buscar atividades de lazer. Assim, em algumas situações dadas pela orientação sexual (lésbicas/bissexuais), raça (negras) e classe social (pobres), pode-se falar de uma sobreposição de opressões.

É sabido que as regiões mais periféricas do Distrito Federal possuem uma população que depende mais dos serviços de transporte público, seja pelo custo ou seja pela rapidez (pensando nos corredores exclusivos) dos mesmos. Segundo dados do Plano de Desenvolvimento do Transporte Público sobre Trilhos do Distrito Federal (PDTT/DF)(2018), quanto menor a renda domiciliar maior, a porcentagem de pessoas que utilizam o transporte público coletivo, somando-se a isso, tem-se o fato de a renda per capita de Santa Maria - estimada em R$ 990,85 (CODEPLAN, 2018) - ser uma das menores do conjunto metropolitano, conforme dados do site Brasília

Metropolitana1 (tabela 1), tomados como base o ano de 2018, quando o valor de referência do salário mínimo era de R$ 954.

Tendo o contexto socioeconômico da cidade e a questão da mulher da periferia, faz se necessário pensar em medidas que deem oportunidades a essas mulheres, para que elas possam conquistar a cidade da mesma forma que o homem o faz. Além disso, a cidade faz fronteira com outros dois municípios de Goiás - Novo Gama e

1 O site do governo utiliza os dados da Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (PDAD) 2018 e a partir disto criaram-se as estatísticas. No decorrer da diplomação ainda pretende-se destrinchar os dados referentes a Santa Maria.

Valparaíso - o primeiro com condições socioeconômicas piores que RA e o segundo com uma condição semelhante. Essa interação pode ser percebida pela Figura 01. Assim, se espera que as contribuições dadas neste trabalho de alguma forma também possam alcançar as necessidades desta população, que, por vezes, é abandonada pelo próprio Estado de Goiás quanto pelo Distrito Federal.

Minha vivência como mulher, é uma pequena fatia das percepções das mulheres do Distrito Federal e Entorno, visto que esta Metrópole abriga uma diversidade de crenças, raças/cores, idades, rendas, cada uma com a sua individualidade. Mas, ao sair de casa acredito que algumas perguntas passam pelas nossas cabeças, pelo menos na minha - Por onde eu vou? Por aquele caminho que eu sei que vai estar movimentado ou aquele que parece um beco, mas tem sombra? Qual roupa eu posso vestir? Qual bolsa é mais segura? Talvez, a minha noção de segurança seja igual ao da maioria das pessoas, entretanto, seria uma inverdade dizer que eu tenho menos preocupações ao andar na rua do que um homem.

Ademais acredito que, por anos, nossas cidades foram desenhadas e planejadas por homens. Brasília é um exemplo desse planejamento a cidade foi concebida de forma hostil ao pedestre, em especial as mulheres a cidade é cortada por vias rápidas, nas quais caso você, pedestre e ciclista, queira atravessar a via, terá que ser por um “túnel” (Figura 02). Atribuindo esta lógica à mulher, aquela que não tiver veículo particular, terá de conviver com essas armadilhas, seja por passagens subterrâneas ou por passarelas aéreas, porque na cidade moderna carro não pode parar.

Para que erros como este não voltem a ocorrer é preciso haver pluralidade na governança, seja de gênero, raça/cor ou orientação sexual, uma vez que diversos olhares sobre a cidade trazem as particularidades e dificuldades de cada grupo social, assim, seja capaz de tornar o acesso à cidade mais democrático. A participação feminina nas tomadas de decisões do Estado ainda é ínfima, apenas em 2019 é criada a secretaria da mulher no Distrito Federal. E, segundo o ranking do Word Economic Forum, no documento Global Gender Gap Report (2020), o índice de empoderamento político do Brasil está na 104º posição entre 152 países, tendo apenas 15% das mulheres no Parlamento e 9,1% de mulheres ministras.

Entende-se que não é apenas papel da arquitetura e do urbanismo tornar as cidades mais seguras para as mulheres, é necessária uma mudança na estrutura da sociedade. Pois, medidas que segregam as mulheres acabam por “normalizar” o comportamento inadequado dos homens. Mas, nós não podemos esperar que eles mudem, nós precisamos ter direito à cidade hoje. Assim, entendo que é pela mobilidade urbana, por um planejamento e desenho urbanos que levem em consideração as especificidades de gênero, por medidas que democratizem o acesso à cidade, teremos oportunidades mais justas. Sabendo do papel da cidade nas lutas sociais, projetando os anseios da sua comunidade, as mulheres têm desempenhado um papel importante, na medida em que elas lutam pelos direitos das minorias, pelo acesso à habitação, pelo acesso à equipamentos urbanos para a comunidade. As demandas da mulher são para a pequena escala - daí a sua pertinência como agente de luta micropolítica.

Desta forma, o trabalho parte do seguinte questionamento: i) como fazer espaços urbanos mais qualitativos a partir e para a percepção da mulher?

Advoga-se que as mulheres são corpos sensíveis no espaço, não apenas porque são mais vulneráveis à utilização deste, de tal modo que um espaço qualitativo para a mulher acaba sendo qualitativo para outros estratos, e também porque portam demandas - por habitação, por equipamentos coletivos, por transporte coletivo, por melhoria dos bairros - que não são apenas para elas, mas para todos. Para desempenhar os múltiplos papéis que lhe são conferidos - manter a casa, levar filhos na escola, acompanhar pais e familiares em tratamentos de saúde, estudar, trabalhar, etc. - acabam por depender mais da mobilidade intraurbana e inter-urbana do que os homens.

Dentro deste recorte temático, a proposta de trabalho é, em uma frente, buscar diretrizes de uso do solo que possibilite, um espaço melhor adaptado às exigências das mulheres e, em outra frente, buscar o desenho dos espaços livres, com foco na mobilidade adaptada às especificidades de gênero e na qualificação de Santa Maria, na região que é compreendida pelas quadras 100, 200 a 207, 301 a 307, pertencentes aos bairros, que se caracterizam como uma das partes mais vulneráveis da cidade. Conforme a área delimitada pela imagem de satélite da Figura 01.

Pretende-se que os espaços sejam desenhados por e para as mulheres, foi realizada uma mesa de conversa virtual na qual se identificou os principais pontos a serem trabalhados em Santa Maria, um dos pontos abordados foi a falta de equipamentos no bairro do Porto Rico, a falta de creches públicas, o gargalo dos passageiros que desembarcam do BRT e precisam ser distribuidos pela cidade, um comércio que atendam suas necessidades e o desenvolvimento do pólo JK, para a formação de empregos na região.

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