A CONDENAÇÃO DE BALTASAR GARZÓN

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A CONDENAÇÃO DE BALTASAR GARZÓN

- Arguido em três processos distintos, Baltasar Garzón (BG), o conhecido juiz de instrução do país vizinho, acaba de ser condenado pelo Tribunal Supremo de Espanha por delito de prevaricação, no primeiro desses processos (sentença de 9 Fev. 2012). Falemos do caso, que é importante – muito importante – deixando a deslado a pessoa, com seus dares e tomares, seus ires e vires, da justiça para a política, da política para a justiça, sempre na crista da onda mediática, tudo fazendo na aparência por merecer a coima de ‘super-juiz’ (seja lá isso o que for...), atribuída pelos meios ignaros. Deixemos a pessoa, foquemos o facto, a acção da pessoa, em si mesma. O que estava em julgamento? Pois, muito simples, o caso de um processo em que o ora arguido ordenou escutas e gravação de comunicações dos réus ali detidos com os seus respectivos defensores, à margem da lei positiva. O que o tribunal do julgamento considerou provado, integrando o referido delito (art. 446.º, C.Penal, visando o juiz ou magistrado que profira, conscientemente, sentença ou decisão injusta). Certo? Ou errado?

- Ouço, de um lado, a concordar com a decisão: - Numa sociedade democrática, julgar implica estrita obediência à lei e à Constituição; implica não escutar à margem da lei, ainda que os escutados ou os seus mandantes possam ser pessoas desagradáveis ou até repugnantes; implica não avançar com processos por crimes prescritos e/ou amnistiados, por muito hediondos que fossem, como efectivamente foram. Implica ser juiz e não historiador e menos ainda justiceiro. Respeitar a lei e a Constituição pressupõe também, por vezes, não "aparecer", negar o vedetismo, não ser "super", nem querer sê-lo. A decisão condenatória o que traduz é a afirmação destes postulados, sem medo perante as turbas que confundem a justiça com a política. E ouço, do lado oposto: - A escuta autorizada pelo juiz foi pedida pela polícia, avalizada pelo MP, além de prorrogada por outro juiz que recebeu o processo, mas só BG é sancionado. A conduta de BG é a mesma de outros juízes em outros processos, que todavia nunca foram responsabilizados. A matéria das escutas é duvidosa em Espanha, do ponto de vista legal, tendo o juiz no caso optado por uma das interpretações admissíveis da lei aplicável. O principal responsável da trama de corrupção, apanhado no processo da escuta, ainda não foi julgado, mas foi-o o juiz que pôs a trama à mostra, no referido processo. Aliás, todas as provas requeridas pelo arguido BG foram sistematicamente rejeitadas pelos sete juízes do julgamento, todos conhecidos como conservadores. A mera existência de três processos em simultâneo, movidos a BG (além do presente, um processo por perseguição de crimes da Guerra Civil, apesar da prescrição e da amnistia, e outro por receber uma bolsa do Banco Santander, investigado em processo que dirigiu), denota uma sanha incompatível com a intenção singela de aplicar a lei e realizar a justiça.


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