Edição 318 - Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA

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5 DE MARÇO DE 2024

ANO XXXIV Nº318 GRATUITO PERIÓDICO

DIRETORA ANA FILIPA PAZ

EDITORAS EXECUTIVAS DANIELA FAZENDEIRO E CLARA NETO

somos as mulheres guerrilheiras as mulheres

fomos escravas meigas como os homens nos quiseram

fomos sementeiras como os homens nos fizeram

mas em nós tudo mudou e agora não já lutamos com as nossas mãos

recusamos o repouso do guerreiro construiremos o mundo por inteiro

32.260 dias até à primeira mulher presidente da AAC e 10.228 desde a última

“Sofri misoginia”, revela antiga vice-presidente da DG/AAC. Falta de participação de mulheres em posições hierarquicamente elevadas preocupa segunda dirigente da Casa.

- POR SOLANGE FRANCISCO E LILIANA MARTINS -

Em 136 anos de existência, a Associação Académica de Coimbra (AAC) viu apenas três mulheres chegarem à sua presidência. Conscientes desta realidade, Mariana Rodrigues e Ana Paula Barros, antigas dirigentes, e Sofia Duarte, atual vice-presidente da Direção-Geral da AAC (DG/AAC), refletem sobre a escassez de representatividade e de liderança feminina nos órgãos gerentes da academia coimbrã.

“As mulheres são tão capazes como os homens”

Clara Crabbé Rocha foi a primeira mulher eleita presidente da Casa, em 1976, 89 anos após a sua fundação. Com uma liderança de curta duração, a ex-presidente demitiu-se do cargo ao fim de poucos meses por considerar que uma medida aprovada em Assembleia Magna não correspondia aos desejos da maioria dos estudantes. Em causa esteve uma moção aprovada graças à União de Estudantes Comunistas que tinha em vista o apoio ao Movimento Popular de Libertação de Angola. Mais tarde, acabou por ser convidada a integrar a lista de deputados da Assembleia da República pelo Partido Socialista, mas a carreira como professora universitária impossibilitou-a de desempenhar essas funções.

Doze anos depois, Ana Paula Barros deu continuidade ao legado de liderança feminina deixado na academia por Clara Rocha e assumiu a presidência da DG/AAC em 1988. Na altura, apoiada pelo projeto da Juventude Social Democrata, era a única mulher a candidatar-se ao cargo. Não esquece que “o maior medo era se a Casa estaria preparada para que uma mulher fosse sua presidente”.

A ex-dirigente refere ter sido bem aceite pela comunidade académica. Enquanto exerceu o seu mandato, acreditava que “as mulheres eram iguais aos homens e que tinham as mesmas oportunidades”, uma realidade que percebeu não ser verdadeira quando entrou para o mercado de trabalho. Ainda assim, defende que a igualdade “mais crucial” é entre o género feminino e o masculino, e que “todas as igualdades vão ser precárias” se esta não for atingida.

A antiga estudante sublinha a necessidade de haver mulheres em posições hierárquicas mais elevadas. “Acho que as mulheres são tão capazes como os homens e têm um tipo de governação diferente e muito necessário”, explicita. Para Ana Paula Barros, “a liderança precisa de ser exercida por pessoas diferentes para não ser viciante”. A ex-presidente, que hoje trabalha como jurista em Macau, relembra a altura em que presidiu a AAC como uma “experiência extraordinária”. Destaca ainda que “com 23 anos tinha a responsabilidade de ter 68 funcionários a quem tinha de pagar ordenados”.

Ana Paula Barros recorda que, enquanto dirigente, ajudou a preparar a lei que deu à Rádio Universidade de Coimbra a possibilidade de se candidatar e ter uma frequência de rádio. Relembra ainda que a autonomia das universidades foi aprovada durante as suas funções na DG/AAC.

A jurista realça que está fora de Portugal há quase seis anos e que já não convive com a realidade política do país e ainda menos com a da academia. Por isso, quando questionada sobre a escassez de representatividade e liderança feminina na AAC, declarou: “o que me parece é que, se uma mulher pode fugir de um confronto, não entra num”. Contudo, sublinha que esta falta de participação feminina “não é positiva”. Ana Paula Barros está convencida que se o trabalho for bem feito, uma mulher candidata à presidência da DG/AAC tem tanta facilidade em vencer como um homem. “Nada se faz sem trabalho e é preciso uma equipa muito boa”, enfatiza.

Zita Henriques foi, até à data, a última presidente mulher da Casa e, por imprevistos pessoais, não lhe foi possível dar entrevista ao Jornal Universitário de Coimbra - A Cabra. Em 1995 teve o seu primeiro mandato preenchido por uma luta interna contra a propina e a favor da melhoria da qualidade do Ensino Superior (ES), da política educativa e do aumento da Ação Social. A terceira líder feminina da DG/AAC licenciou-se em Engenharia Química e trabalhou como assessora do presidente do Conselho de Avaliação. Mais tarde, foi diretora executiva da Fundação das Universidades Portuguesas. Desempenhou também a função de adjunta do ministro da Educação, assessora da reitora da Universidade de Aveiro e vereadora da Câmara Municipal de Penacova.

“Existe misoginia internalizada nas estruturas do ES”

Mariana Rodrigues estudou Direito na Universidade de Coimbra (UC) e, atualmente, trabalha como jurista em Lisboa. O seu percurso universitário ficou marcado pelo mandato que exerceu, entre 2017 e 2018, enquanto vice-presidente da DG/AAC, ao lado do então presidente Alexandre Amado. Em 2018 encabeçou a Lista P - “Atitude Preto no Branco”, candidata à presidência da DG/AAC, mas os estudantes deram a vitória a Daniel Azenha, um dos seus adversários.

A antiga vice-presidente recorda algumas situações de discriminação que viveu aquando da corrida eleitoral. “Sofri misoginia, não dos meus opositores, mas de estudantes e de pessoas com alguma responsabilidade nas estruturas da Casa”, conta. Mariana Rodrigues acredita que “existe misoginia internalizada nas estruturas do ES” e acrescenta que “Coimbra é, por si, uma cidade conservadora”, referindo-se à AAC como uma “instituição eminentemente patriarcal”.

“Desde comentários pequenos, mandar-me sorrir ou dizer em debates que eu era bruta em vez de assertiva, foram coisas que eu vivi”, confessa a antiga vice-presidente. Nunca desistiu, mas percebe que nem todas estejam dispostas a colocar-se numa posição de representação estudantil “com receio dos ataques que podem sofrer por racismo ou LGBTfobia”, além da misoginia.

Quanto às razões que podem justificar a escassa representação feminina na liderança do órgão executivo da AAC, Mariana Rodrigues destaca o “viés de género” e a pressão social. Considera que é necessário dedicar muito tempo às estruturas da Casa, o que pode implicar o atraso de um ano na conclusão do curso. Assim, devido à pressão para entrar no mercado de trabalho e constituir família colocada nas mulheres pela sociedade, estas tendem a não participar tanto em atividades extracurriculares. Além disso, a antiga vice-presidente culpa as disparidades socioeconómicas. “Só garantindo um ES universal, gratuito e democrático é que conseguimos assegurar que existe representação na presidência da DG/AAC”, conclui. A ex-estudante tem memória de ver muitos colegas a não conseguirem entrar no ES por incapacidade financeira. Por isto, fez “tudo o que podia para democratizar o setor”. A sua passagem pela DG/AAC “vai ficar para sempre [consigo] e não vai haver outra experiência tão gratificante como essa”.

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- Com
ENSINO SUPERIOR
colaboração de Matilde Mendes -

“Os votantes não veem nas mulheres a garra que é necessária”

Sofia Duarte estuda na Faculdade de Direito da UC e é vice-presidente da atual DG/AAC. A integrante do projeto vencedor das eleições de novembro de 2023, a Lista P - “Por Ti, Pela Académica”, assume funções ao lado do presidente Renato Daniel. O seu percurso no associativismo inclui também uma passagem pelo Núcleo de Estudantes de Direito da AAC.

A vice-presidente, que encara a Académica como um “espelho da sociedade”, reconhece que o facto de apenas três mulheres terem alcançado a presidência do órgão executivo da Casa é “chocante” e um “problema estrutural”. Sofia Duarte defende ainda que se vive, nos dias de hoje, um cenário de “descredibilização e desacreditação” da mulher em papéis de liderança. “Por não ser algo incutido desde cedo, as mulheres acabam por não se obser -

A par deste panorama, a estudante realça que, “muitas vezes, as mulheres são vistas como o género mais frágil que, numa situação de pressão, vai fraquejar”. Sofia Duarte acredita que, como consequência desta visão, “acaba por ser mais confortável para um homem apresentar a sua candidatura”. Ainda assim, a dirigente menciona ter atingido “um grau de maturidade emocional” que lhe permite lidar com esse tipo de preconceito.

A vice-presidente considera que “um homem tem muito mais ferramentas e está muito mais camuflado porque a sociedade já o assume como líder”, ao contrário das mulheres. A seu ver, numa eleição disputada, “uma mulher absorve coisas que ninguém devia ter de absorver”. Ademais, reflete sobre a diferença de expectativas do eleitorado face ao desempenho de

dirigentes femininas em comparação a líderes masculinos. “Quando uma mulher falha, é muito mais fácil descredibilizar o seu trabalho”, defende Sofia Duarte. A confiança acaba por ser “naturalmente posta num homem, porque os votantes não veem nas mulheres a garra que é necessária”, constata.

Sobre a facilidade de uma mulher conseguir vencer uma eleição disputada, a vice-presidente sublinha o impacto da conotação sexual. Na sua opinião, “a sexualidade, quase quantificada dentro da mulher, é um entrave muito grande”. À semelhança de Mariana Rodrigues, acredita que a Casa não está preparada para uma mulher presidente. Para Sofia Duarte, a maior problemática é a falta de candidaturas por parte de mulheres como cabeças de lista, porque o problema “não é o facto de ir e perder, é a falta de posicionamento”.

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ENSINO SUPERIOR

ENGENDER ambiciona colmatar ausência de questões feministas no ES

Coordenadora acredita que entendimento dos EMGF fornece “ferramentas para lidar com situações em que indivíduos possam estar a ser explorados, minimizados, desvalorizados e desrespeitados”. Iniciativa pensa que inclusão de questões de género é possível em todas as áreas.

OENGENDER, que teve início a 25 de março de 2021, pretende perceber a forma como os Estudos sobre as Mulheres, de Género e Feministas (EMGF) estão enquadrados nos currículos e nas práticas pedagógicas das Instituições de Ensino Superior (IES) públicas e privadas. De acordo com a coordenadora, Virgínia Ferreira, a iniciativa surgiu após a equipa perceber que a maioria das unidades curriculares lecionadas nas IES não mencionam questões de género e, por isso, os alunos não têm formação específica na área. Com o terceiro aniversário do projeto a aproximar-se, o grupo defende que as questões de género estão “muito ausentes” no ES.

Nesse sentido, a também socióloga e docente aposentada da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, pensa que “o que poderia ser um bom nível [de integração dos EMGF] está longe de ser alcançado”. O facto de as bibliografias das unidades curriculares serem compostas na sua maioria por autores masculinos foi outra conclusão do ENGENDER. Nessa linha de raciocínio, Virgínia Ferreira defende que “a pouca visibilidade” que as mulheres têm enquanto autoras e cientistas “cria o estereótipo de que a ciência é uma coisa de homens”. A seu ver, a inclusão de questões de género é possível em todas as áreas, “desde as artes e humanidades, passando pelas ciências sociais e exatas, até às engenharias”.

No sentido de compreender a dimensão real da integração dos EMGF, a equipa realizou investigações nas quais aplicaram diversos métodos científicos, como estudos bibliométricos, entrevistas e grupos de foco com estudantes e docen -

tes. Além disso, foram levadas a cabo pesquisas nas principais bases de dados – a Scopus e a Web of Science – e foram organizados ‘workshops’ e seminários.

Após um levantamento dos autores mais estudados, o ENGENDER constatou que este padrão ocorre até em unidades curriculares que têm como foco os EMGF. Virgínia Ferreira dá como exemplo Bourdieu, autor muito citado na Sociologia, cuja obra “A dominação masculina”, publicada nos finais dos anos 90 do século passado, não contém qualquer referência a estudos anteriores feitos nesta área. A socióloga revela que, no sentido de incluir mais obras escritas por mulheres, alguns docentes decidiram rever as bibliografias das suas disciplinas, para que a contribuição feminina nas áreas científicas não fosse esquecida.

Para Virgínia Ferreira, esta área de estudos é de extrema importância, porque permite compreender “a normalidade atribuída ao género”, a sua influência na trajetória de vida de cada um e de que modo o género pode constituir um desafio no futuro, a nível pessoal e profissional. Pelo contrário, o desconhecimento pode levar as pessoas a serem “mais facilmente manipuladas e menos conscientes do tipo de relações sociais em que estão envolvidas”, explica. Ademais, o ENGENDER pretende alertar as IES para a importância do “acesso a um conhecimento sistematizado, fundamentado e rigoroso” para “as pessoas perceberem o que está em causa”. Segundo a coordenadora, o enten-

dimento dos EMGF fornece “ferramentas para lidar com situações em que os indivíduos possam estar a ser explorados, minimizados, desvalorizados e desrespeitados”.

Virgínia Ferreira aponta que 80% das disciplinas que abordam os EMGF são facultativas e quem opta por elas “são pessoas que já têm algum conhecimento e que o querem aprofundar”. Deste modo, um dos objetivos do ENGENDER é a integração, em todos os cursos do ES, de uma unidade curricular obrigatória onde são trabalhados estes temas. O processo de integração dos EMGF já tem vindo a realizar-se em algumas IES, na medida em que existem quatro mestrados e três doutoramentos a nível nacional. Alguns exemplos são o Doutoramento em Estudos Feministas na UC e o Doutoramento em Estudos de Género na Universidade de Lisboa.

O financiamento para este trabalho, sob a alçada do Centro de Estudos Sociais da UC, partiu da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), que permitiu o prolongamento do projeto até 24 de junho de 2024, embora a data de conclusão prevista fosse 24 de março do mesmo ano. Com a aproximação da conclusão do ENGENDER, a equipa pretende continuar a produzir e publicar artigos, que, segundo a coordenadora, têm obtido boas avaliações. Nos próximos três meses, o grupo vai gravar vídeos, que vão estar disponíveis no site do CES, e organizar um seminário final. Além disso, estão a trabalhar na produção de ferramentas que contribuam para a capacitação dos docentes na integração das perspetivas de género no ES, como um manual orientador e ações de formação para docentes.

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Por Mafalda Adão ENSINO SUPERIOR

Um pequeno pedaço de tecido, um grande passo para as mulheres

Do hábito talar à capa e batina, tradição tenta espelhar sociedade. Membros da comunidade académica consideram que discussão sobre inclusão de calças na capa e batina feminina não está terminada.

- POR FRANCISCA COSTA E JÉSSICA SOARES -

No século XVI, quando surge o traje académico em Coimbra, este espelhava diferenças entre classes sociais e tinha uma forte ligação à religião, daí a sua designação antiga “hábito talar”, explica Disa Palma, proponente da moção de 2021 pela possibilidade de uso de calças na capa e batina feminina. Por sua vez, o traje feminino tem origem no tailleur (fato saia e casaco). “Nos anos 40 era impensável uma mulher vestir calças”, defende a alumni da Universidade de Coimbra (UC). A remoção do colete, imposta pelo Magnum Consilium Veteranorum (MCV), em 2007, foi a mais recente alteração ao traje feminino.

Disa Palma aponta que, aquando da apresentação da proposta, os proponentes aperceberam-se que “o que a Comissão Permanente do Conselho de Veteranos colocou em cima da mesa estabelecia a opção de colocar saia no traje masculino e calças no feminino”, uma contraproposta que não ia ao encontro da moção inicial. A alumni garante que os proponentes foram “sempre a favor de retirar o género da capa e batina”. Contudo, conta que a proposta foi elaborada de modo a que não tivessem tudo contra eles, porque sabiam que estavam perante um público “mais conservador”. Sublinha ainda que, além do uso do argumento da descaracterização da capa e batina, foram proferidas frases como: "o que um homem gosta é de um rabo de saia".

A antiga estudante recorda, ainda, ouvir, em plenário do MCV, comentários “desinformados”, como: "se as raparigas podem vestir calças, os rapazes podem vestir calções”, o que aconteceu no século XVIII. A proposta de Disa Palma não foi a única na missão de incluir calças na capa e batina feminina. Existem registos de uma moção elaborada nos anos 90 que não teve sucesso, porque “quem tem o poder de decisão” argumentou que “há coisas mais prioritárias”, salienta a alumni. Sobre esta questão, alerta que “daqui a 40 anos vai haver outro tema prioritário”, que vai atrasar a discussão.

Miguel Vitorino, proponente da mesma moção, reforça que se pretendia, também, neutralizar o traje casaco e saia, tornando a capa e batina num “porto seguro para uma pessoa não-binária, uma vez que não seria obrigada a estabelecer-se num dos pólos”. Denuncia, ainda, o que considera ser uma falta de preparação de quem pertence ao MCV: “não sabiam

que uma mulher para usar calças tem de usar a capa e batina masculina, porque é considerada a neutra”.

Dentro da Secção de Fado da Associação Académica de Coimbra (SF/AAC), “seccionistas feministas propuseram o uso de calças com a capa e batina e essa proposta foi chumbada em plenário”, refere o presidente do organismo, Diogo Ferreira. Apesar disso, argumenta que a SF/AAC “não vê a tradição como algo intransigível”, pelo que "tem interesse numa discussão aberta sobre a temática com outros organismos da Casa”. Admite a possibilidade da SF/AAC se coligar a movimentos que promovam a mudança, que “mas não vai criá-los”. Defende ainda que “os estudantes devem fazer o que faz sentido para eles, sem desrespeitar o que foi feito pelos anteriores”.

Joana Carvalho, estudante da UC que usa calças com a capa e batina feminina, acredita que “o academismo português nasceu e cresceu em Coimbra, sendo importante que a AAC acompanhe a evolução dos tempos”. Para a também seccionista, o objetivo é aproximar comunidades e religiões, mostrando que a tradição e a academia são para todos. “Com a semente deixada por outros colegas, tenho intenções de trazer o debate de novo”, revela. Considera ainda que, de acordo com relatos de pessoas que estiveram presentes na discussão da pro -

posta, em 2021, o cenário foi “desastroso e um atropelo democrático enorme”. Ainda assim espera que, quando o tema voltar a surgir, este possa ter “uma melhor recetividade”.

Quando questionado sobre o seu parecer relativamente à última moção apresentada, o MCV argumenta que “a retirada do ex libris do modelo feminino - a saia - desvirtua e apaga a história da capa e batina feminina”. Dado que, quando surgiu, o uso da saia teve por objetivo “efetivar um choque na sociedade da altura”, explica. Apresenta a questão como um “valor basilar do uso da capa e batina” e salienta que a proposta “entra em conflito com outros trâmites presentes na praxe académica coimbrã, nomeadamente na identificação e separação de sexos para efeitos de mobilização de caloiros”. Deliberado por maioria, o MCV determinou que “existem dois modelos tradicionalmente reconhecidos na praxe, um com batina e calça e outro de casaco e saia”. Sendo assim, “qualquer estudante pode escolher entre um dos modelos”. No entanto, “qualquer variação não passa de uma veleidade pessoal”, de acordo com o novo Código de Praxe. O MCV adverte que “não se prevê num futuro próximo uma nova revisão” devido à edição recente deste código finalizada em 2022.

05 5 de março de 2024
ENSINO SUPERIOR
Por Francisca Costa

Leonor Teles: Balada de uma realizadora em trânsito

Artista expõe adversidades correntes na produção cinematográfica em Portugal. “No meio de um mundo tão desigual, descaracterizado e fortemente centrado no capitalismo, cultura tem um papel fundamental”, expressa.

- POR IRIS JESUS -

Oque te fez seguir cinema?

Quando estava no secundário gostava muito de fotografia. Nesse período, percebi que queria seguir a área e comecei a investigar cursos em zonas próximas. Foi assim que encontrei o curso de cinema na Escola Superior de Teatro e Cinema, onde me podia formar em Imagem. Foi durante o primeiro ano que percebi que queria mesmo trabalhar na área.

Sentes que as tuas expectativas face à produção cinematográfica em Portugal mudaram desde o início do teu percurso académico?

Sim. Não diria que as expectativas se alteraram devido à produção em si, acho que se deve muito mais ao funcionamento sistémico do país. Quando comecei a trabalhar tinha uma ideia mais esperançosa e idealista relativamente ao que era fazer Cinema. É bom que os apoios tenham aumentado e que haja mais pessoas a fazer filmes. No entanto, não sinto que exista um público que consuma cinema português, os filmes saem e é muito difícil mantê-los em exibição. Os exibidores não estão interessados nas obras e os públicos não se educam para consumir o nosso cinema, por isso, os números que se fazem são baixos. Acho que é preciso repensar o modo de distribuição, é bastante triste trabalhar durante anos num filme que é exibido durante apenas duas semanas.

Numa entrevista para a Rádio Comercial, disseste que as pessoas devem cultivar o seu gosto apostando na educação para a Cultura. Como é que te instruíste para a arte produzida no nosso país?

Eu leio muito, vejo muitos filmes, vou à Cinemateca. Estou em Lisboa, que tem uma oferta cultural bastante mais elevada do que o resto do país, isso faz alguma diferença. Também troco muitas sugestões de filmes com colegas, assim como falo e leio sobre eles. É muito importante ir ao cinema, se é o meu trabalho, tenho de o fazer.

Disseste na mesma entrevista que, há oito anos, quando venceste o Urso de Ouro do Berlinale, o momento de maior felicidade foi quando soubeste

que o filme tinha sido selecionado para o festival. O que é que essa nomeação significou para ti?

Foi o início de tudo. De repente, faço um filme que é posto no mapa. Depois de estar selecionado no Berlinale, entrou em circulação e, sem essa seleção, isso não seria possível. O filme viajou internacionalmente, o que não costuma acontecer com obras do cinema português, ainda mais se estivermos a falar de uma curtametragem. O caminho destas produções começa e acaba em Portugal.

Como vês o facto de apenas em dois debates eleitorais para as Legislativas ter sido mencionado o setor da Cultura?

Vejo isso como um sintoma da falta de valorização da Cultura no nosso país. A Cultura é o que permite sonhar, arriscar, adquirir conhecimento e aceder a outras realidades. No meio de um mundo tão desigual, descaracterizado e fortemente centrado no capitalismo, a Cultura tem um papel fundamental. Tudo isto espelha bem a ideia geral que as pessoas têm da arte e do seu papel na entidade do povo.

Uma das reivindicações partidárias mais discutidas é a atribuição de 1% do Orçamento de Estado para financiamento cultural. Subscreves esta medida?

Seria bom, mas acho que também é necessário apostar na formação de público para as artes. Nas escolas já existe o Plano Nacional de Cinema, mas devia-se apostar em torná-lo mais acessível, levar os alunos ao cinema em vez de ser o cinema a ir às escolas. Fomentar, ainda, a ida aos teatros e às exposições.

O teu novo filme, Baan, fala sobre o fenómeno da gentrificação em Lisboa. Em várias entrevistas contas que, durante as filmagens, ficaste sem casa. Este acontecimento refletiu-se no pendor político da longa-metragem?

Não. O filme por si só já considerava o panorama social, porque é algo que eu vi a acontecer. No entanto, é uma situação que vejo com ironia: estava a gravar um filme sobre pessoas que ficam sem casa e, de repente, fico sem casa.

Em 2019 lançaste a curta-metragem “Cães que Ladram aos Pássaros”, num projeto que te junta a duas realizadoras, Sofia Bost e Mariana Gaivão. Como surgiu a ideia de colaborarem as três?

Eu e a Sofia estamos associadas à mesma produtora, que já tinha algum interesse em lançar as curtas-metragens em conjunto. Na altura, fizemos o convite à Mariana porque considerámos que o seu projeto fazia sentido dentro da abordagem que queríamos seguir. Assim, conseguimos organizar um programa dedicado ao trabalho de três realizadoras.

O que é que consideras que pode reforçar o cinema feminino em Portugal?

Acho que o cinema feminino tem de ser reforçado no geral, a maneira de o fazer tem de mudar. Se pensarmos na minha profissão, vemos muito poucas mulheres como diretoras de fotografia. Acho que, mais do que contar histórias sobre a mulher, devemos perceber a pouca quantidade de cinema que é feito por mulheres. Este é um tema que deve ser discutido na política e abranger toda a comunidade, é imperativo que as pessoas comecem a refletir sobre o mundo em que estão inseridas. É muito importante que se fomentem espaços de diálogo para que se reflita sobre estas questões

Dirias que o apagamento de vozes femininas no cinema português é um problema que provém da falta de realizadoras em Portugal?

Não acho que seja essa a questão, acho que já há muitas mulheres realizadoras. No entanto, não devemos ter apenas isso em consideração. Os filmes são feitos por todo um coletivo de pessoas e é a isso que me refiro quando digo que as equipas são constituídas maioritariamente por homens. Acho que é necessário torná-las mais diversificadas.

Quando venceste o prémio de “Melhor Fotografia” no Festival Caminhos do Cinema Português, deixaste uma mensagem sobre a falta de mulheres e de minorias nas direções de fotografia de filmes em Portugal. Consideras que estas carreiras possam não

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CULTURA

ser apetecíveis a essas camadas da sociedade?

Não, acho que há falta de oportunidades. Em primeiro lugar, porque o cinema não é o meio mais fácil em termos de acessibilidade e empregabilidade. Em segundo lugar, porque não há oportunidades para pessoas novas, oriundas de estratos sociais distintos.

O teu novo filme explora a sexualidade como algo fluído. Na tua opinião, já vivemos numa realidade em que mulheres têm a liberdade para explorar livremente a sua sexualidade?

Acho que as gerações que aí vêm estão muito mais livres, ao contrário das mais velhas, que estão agora a perceber que há formas de se relacionar diferentes das tradicionais. A sexualidade é algo que depende do crescimento individual de cada um, bem como do lugar onde se nasce. A sua exploração só é possível quando se está num sítio seguro, onde se tem acesso a referências e se fala abertamente sobre o

assunto. Antigamente, os únicos modelos de relação que tínhamos eram os que víamos em casa e isso está a mudar radicalmente. As gerações que aí vêm já têm outra mentalidade.

Em entrevista à RUC mencionaste duas realizadoras de que gostas bastante, a Lucrecia Martel e a Andrea Arnold. O que é que te apaixona no cinema destas mulheres?

A Martel tem uma forma de pensar o cinema inigualável, ela pensa os filmes a partir do som e isso é atípico. Tem um trabalho muito interessante e eu gosto dos universos femininos que ela cria, que mantêm sempre cargas dramáticas muito potentes. No caso da Andrea Arnold, gosto do facto de ela se focar em histórias de personagens femininas e de ter filmes com uma estética muito forte, com temas muito atuais. Por isso mesmo, acho que seria de extrema relevância que essas obras chegassem até nós e fossem mais acessíveis.

Num artigo recente do jornal PÚBLICO sobre as disparidades de género no cinema e na televisão em Portugal consta que, do total de mulheres trabalhadoras na área, "41.6% foram vítimas de discriminação de género, 37,6% sofreram assédio no local de trabalho e/ou no desempenho de funções, 7,5% foram vítimas de xenofobia e 1,4% de racismo". Como encaras estes dados?

São percentagens horríveis. Acho que essas questões recaem na responsabilidade de cada produtora. É necessário que as pessoas que estão no poder, que reúnem as equipas e que fazem as escolhas, tenham em mente estes dados. O que nós queremos são ‘sets’ e locais de trabalho seguros e, talvez pelo facto de o meio ser tão pequeno, as pessoas têm medo de perder o seu trabalho. Nestes ambientes, as pessoas nem sempre estão protegidas a trabalhar.

07 5 de março de 2024 CULTURA

Então mas agora as mulheres já cantam o Fado?

Interesse e participação feminina no Fado de Coimbra é cada vez maior e tem-se revelado “um enorme sucesso”, segundo ex-presidente da SF/AAC. No entanto, escritor da Balada da Despedida do 5º Ano Jurídico de 1988/1989 teme perda da singularidade do género musical através da “descaracterização” causada por essa inclusão.

Écada vez mais notória a presença feminina, com um papel ativo, no Fado e na Canção de Coimbra. Sem medo de represálias ou de contestação por parte de um público “mais aberto e tolerante”, João Afonso Sousa, ex-presidente da Secção de Fado da Associação Académica de Coimbra (SF/AAC), vê “com orgulho” esta evolução para o paradigma atual. Para Jorge Cravo, professor de interpretação da Canção de Coimbra na mesma estrutura, estas são mulheres “seduzidas” pela guitarra e pela sonoridade coimbrã. Muito mais do que uma “revolução de género”, o que as move é o “respeito e interesse pelo estudo da Canção de Coimbra”. No entanto, estes passos têm de ser dados com “muito cuidado” e apenas na direção do “fortalecimento do género musical”. Quem o explica é João Paulo Sousa, um dos escritores da Balada da Despedida do 5º Ano Jurídico de 1988/1989. Embora defenda que à mulher não deve ser vedado, de forma alguma, o acesso ao estudo e ao exercício do Fado e da Canção de Coimbra, o mesmo teme “a perda da sua singularidade”, ou até a sua “prática pública com fins meramente comerciais”.

Elas gostam de Fado, sequer?

Beatriz Villar, nome artístico de Beatriz Dias, revela o seu gosto em cantar, adquirido aos 11 anos. Com essa idade entrou no coro e, apesar de ter ingressado num curso de teatro em Coimbra, a possibilidade de transmitir as suas mensagens e emoções através da sua voz, levaram-na a perseguir outra vocação.

Concorrente da edição de 2022 do programa televisivo Got Talent Portugal, Beatriz desdobra que, no seu primeiro ano do Ensino Superior, se “perdeu de amores” por Coimbra e pela sua musicalidade tradicional, a qual carrega para todas as suas atuações. Desde então que estuda, de modo “diário e afincado”, a métrica e a pronúncia de autores como Luiz Goes e Zeca Afonso.

Outra mulher que hoje se dedica ao estudo e à prática do género musical é Constança Peixoto, estudante da Licenciatura em Matemática na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Apesar de já conhecer diversos temas, a sua motivação apenas surgiu ao ouvir uma amiga sua a cantá-los. Hoje, alegra-se em saber que o seu “passo em frente” já motivou uma outra colega, “detentora de uma voz incrível”, a tomar a mesma iniciativa. Constança Peixoto está convicta de que, desta partilha de experiências e da “postura igualitária” da SF/AAC, vão surgir novas intérpretes que “nem sabiam que lhes era possível cantar Fado”. Tal como Beatriz Villar, também a estudante toma Luiz Goes como a sua maior inspiração.

“Tem de ser mantido todo o rigor técnico e histórico, não apenas para mostrarem os Louboutins vermelhos e o vestido Versace.”

E têm voz para isso?

Edmundo Bettencourt, reconhecido cantor e intérprete da Canção de Coimbra, é relembrado pelo seu notável timbre agudo. Por essa razão, na opinião de João Afonso Sousa, as mulheres podem cantar e explorar as suas obras, sem alterações de tom. Já para o seu pai, João Paulo Sousa, a inclusão da mulher no género musical suscita um “problema complicado”.

A alteração da tonalidade “normal” da guitarra para a afinação de Coimbra não foi causada apenas “pela busca de outra morfologia e sonoridade do instrumento”, mas também de forma a “tornar os acompanhamentos mais confortáveis em função do tipo de cantor, por norma, homem”, assegura o guitarrista. A voz feminina, reitera, tem “características muito diferentes”, o que vai importar toda uma “mudança significativa no ambiente sonoro e nos arranjos já formulados”.

Porém, na perspetiva de Jorge Cravo, o brilho do género musical vem “da interpretação” e não da sua tonalidade. “Despido da técnica”, o canto de Coimbra é “frio e vazio”, por muito “melhor ou afinada” que seja a voz, realça. Quando os seus alunos lhe indicam temas que tencionam aprender, ouve com eles a respetiva gravação original, para que “a essência da matriz coimbrã” não se perca com a interpretação do aprendiz, seja este homem ou mulher. Grande parte das mulheres interessadas não são desprovidas de experiência musical. Tal como Beatriz Villar, também Constança Peixoto teve a sua formação num conservatório. Os ensinamentos retidos dessa fase da sua vida “criaram as bases necessárias” para começar a cantar e a interpretar a Canção de Coimbra, explica. Em adição, toma as aulas do seu professor, Jorge Cravo, como fundamentais para a constante evolução da sua técnica.

Afinal, o que é isso de “matriz coimbrã”?

As aulas de Jorge Cravo seguem um conceito diferente do habitual. Como não se assevera um professor de canto, “mas sim de interpretação”, o mesmo esclarece que a “essência da matriz coimbrã se encontra bem assente” nos registos originais. “É por aí que se tem de pegar”. A própria sonoridade dos temas de Coimbra, em relação aos de Lisboa, difere na “forma de cantar”, no tipo de acompanhamento da viola e até na “suspensão das notas mais agudas”, algo que tenta sempre transmitir aos seus alunos.

Porém, para João Paulo Sousa, essa “essência” presente nesses temas que, “de forma tradicional e histórica”, eram cantados por homens, é fundamental para que o género musical se mantenha “único e autónomo”. A “alteração abrupta” da sonoridade vocal constitui um fenómeno que pode levar a que se percam “os sinais distintivos” que permitem individualizar o Fado de Coimbra, “que sempre foi inconfundível”, receia.

5 de março de 2024 08
REPORTAGEM
Por Frederico Cardoso

As raízes da exclusividade masculina no canto deste género musical, segundo o guitarrista, remontam para a segunda metade do século XIX. No contexto académico, “as mulheres existiam num número muito reduzido”, o que não favorecia a sua participação. “Não deveria ter sido assim, mas a verdade é que foi”. Dado esse fator, considera que a identidade do Fado de Coimbra se define, hoje, “por esse aspeto etnográfico, que deve continuar a ser respeitado”.

E a Secção de Fado, o que vai fazer?

No passado ano letivo, a última noite da Queima das Fitas de Coimbra (QF) foi presenteada com uma “novidade inédita”, relembra João Afonso Sousa. Pela primeira vez, no Parque da Canção, aquando da atuação do Grupo de Fados e Guitarradas da SF/AAC, também algumas mulheres subiram a palco para cantar, algo “nunca antes feito”. Não como um “prémio ou consolação”, mas por demonstrarem ter a qualidade necessária para atuar pela SF/AAC, o que, para o seu ex-presidente, “é a única coisa que importa”.

Apenas o futuro “vai ditar o rumo e a proporção deste movimento”, indica João Afonso Sousa. A estrutura que presidiu não se posiciona contra qualquer indivíduo que por ela queira cantar, desde que “garanta a qualidade que sempre foi exigida”, prossegue. Quanto a eventuais grupos de Fado e da Canção de Coimbra formados, de modo exclusivo, por mulheres, estes vão ser submetidos “aos habituais processos de ingresso na secção”.

A postura da SF/AAC de facultar, a qualquer um, o acesso à aprendizagem e à prática, é “muito vantajosa”, divulga o antigo seccionista João Paulo Sousa. No entanto, duvida que “apenas por ser feita esta inclusão da voz feminina” se esteja “a beneficiar ou a promover” o Fado e a Canção de Coimbra. Acima de tudo, alerta que não se pode permitir uma “apropriação indevida do género musical através dessa descaracterização”.

Mas lembraram-se agora, foi?

Nos anos 90 já tinham surgido algumas atuações de grupos compostos apenas por mulheres a tocar temas de Zeca Afonso, recorda Jorge Cravo. Estes foram bem recebidos, em-

bora não entenda “a quebra” em continuar com essas tentativas. João Afonso Sousa menciona, com “algum desagrado”, que a população de Coimbra sempre se mostrou “muito reticente” a novas experiências. Nessa mesma década, exemplifica, a meio de uma Serenata Monumental, foram proferidas algumas palavras ao microfone, ato que, na altura, foi considerado “escandaloso”, pois nestas ocasiões apenas se tocava e cantava

inspiração e uma força” para outras mulheres. Com lotações esgotadas por onde passa, clarifica que não o faz para “provar um ponto”, mas por si própria, e que vê uma “enorme” aceitação por parte “de todas as faixas etárias”.

O ex-dirigente da SF/AAC garante que, à semelhança da última noite da passada QF, as atividades que foram organizadas nesse ano letivo, com mulheres a cantar, “foram todas um sucesso”. As pessoas “expandiram os seus ho -

“A verdadeira essência da matriz coimbrã encontra-se na interpretação dos temas e não no género de quem os canta.”

A verdade é que, para João Paulo Sousa, “o eco” destas várias tentativas não foi suficiente para a sua aceitação. “Foram ideias que não pegaram, discos esporádicos, pelas quais o público nunca manifestou interesse”. Embora se mostre recetivo “ao que possa vir a acontecer”, não acredita que esta manifestação no feminino vá tornar o género musical “mais popular” ou que aumente o seu público. No final de contas, “pertence apenas a quem ouve e a quem pratica a justificação da mudança de paradigma”, afirma.

O furor da voz de Beatriz Villar na aclamada competição a que concorreu no ano transato, a cantar temas desta natureza, é, para si, “um sinal de mudança dos tempos”. Ainda assim, o que mais a satisfaz, para lá de todos os “elogios recebidos”, é a sensação de poder ser “uma

rizontes e, hoje em dia, já querem ouvir” mais interpretações na voz feminina, esclarece João Afonso Sousa.

Não se vai arruinar o futuro do Fado de Coimbra?

Não obstante a sua perspetiva, João Paulo Sousa salienta que vê, com “muito bons olhos”, a “enorme quantidade” de pessoas a tocar e a cantar. “Venha o que vier”, ressalva que “tem de ser mantido todo o rigor técnico e histórico”, de forma a não incutir nas pessoas uma “ideia errada” sobre o que é o Fado de Coimbra. A sobrevivência da singularidade do género musical vai estar em risco se, além do antes dito, as intérpretes “se apresentarem em público apenas para mostrar os Louboutins vermelhos e o vestido Versace”, avisa.

Jorge Cravo sublinha que “cabe-lhes a elas decidir o rumo e a proporção deste movimento, desde que não se desvie da matriz coimbrã”. Para Constança Peixoto e Beatriz Villar, passo a passo se começa a traçar o caminho para que seja possível à mulher “cantar e tocar em Serenatas Monumentais”, tal como defende João Afonso Sousa. Apesar da escassez de novos temas originais, alude ainda que o Fado de Coimbra se mantém vivo, não pelo género do seu intérprete, mas sim pelas “notas de esperança” transmitidas através do sentimento.

09 5 de março de 2024
REPORTAGEM

XXVI Semana Cultural da UC: unir

as vozes da liberdade

Delfim Leão considera que iniciativa tem potencial para “reforçar ou alterar decisões de voto” em época de eleições legislativas. Vice-reitor apela a maior investimento estatal na Cultura.

- POR AFONSO VASCONCELOS -

Entre os dias 1 e 15 de março decorre a XXVI Semana Cultural da Universidade de Coimbra (UC), que conta com mais de 50 atividades por entre diversas vertentes artísticas. Com base no tema “Voz”, estão previstos espetáculos de música, teatro, cinema e dança, exposições e até mesmo eventos dirigidos aos mais novos.

Segundo o vice-reitor para a Cultura, Comunicação e Ciência Aberta da UC, Delfim Leão, o projeto procura “mobilizar a cidade” a partir da presença multipolar em vários espaços e “aproximar as pessoas através da Cultura”. Além disso, pretende promover uma “reflexão alargada sobre a temática da voz, interligada com a celebração dos 50 anos do 25 de abril”.

A apresentação do evento decorreu em conferência de imprensa na manhã do dia 23 de fevereiro, no Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UC. Delfim Leão destacou a “valente carga simbólica” deste espaço para a Revolução dos Cravos e fez uma síntese do programa. Das 58 iniciativas, 41 são atividades performativas e as restantes são debates que procuram “expandir a reflexão à volta do fenómeno artístico”. Desta forma, compõem um cartaz “mais completo em relação a anos anteriores”, declara o vice-reitor.

Apesar de a Semana Cultural da UC ser promovida pela Universidade, Delfim Leão sublinha que a iniciativa não se restringe à instituição. “O projeto convoca toda a academia a associar-se, pelo que a cidade é um palco”, realça. A promoção da permeabilidade entre Coimbra e a UC é uma das “causas nobres do evento”, pois “a cidade não existe sem os estudantes”, que representam um “grande peso na sua atividade cultural”, ressalva. No que toca à importância das entidades artísticas envolvidas, o vice-reitor garante que “cada uma espelha a sua própria sensibilidade”, pelo que todas foram submetidas a um processo de seleção independente da sua tipologia.

O dirigente da UC destacou a importância da expressão artística: “a Cultura é comum a todos, apesar dos nossos interesses”. Assim, apela a um maior apoio financeiro por parte do Estado à arte, pois acredita que “mais recursos vão atrair mais artistas” e, por consequência, uma maior diversidade de obras.

Em relação ao impacto social do evento, Delfim Leão aponta a “partilha das vivências dos que presenciaram a Revolução com os que apenas a estudaram”, caso dos universitários de hoje. “Podem estudar e celebrar o 25 de abril, mas não o sentiram, pois já cresceram em democracia”, destaca, lembrando a importância destes diálogos intergeracionais.

O vice-reitor reforça que a influência da iniciativa se estende à ideia coletiva de democracia, que “deve ser posta em causa e não interiorizada como um dado adquirido”. Assim, invoca um “sentimento de vigilância” e de “preservação dos aspetos essenciais conquistados com a Revolução”. Assume ainda que, em época de eleições legislativas, a XXVI Semana Cultural da UC pode “reforçar ou alterar decisões de voto” por ter o poder de “interpelar os intervenientes dentro das propostas artísticas e reflexões levadas a cabo”.

A promoção da permeabilidade entre Coimbra e a UC é uma das “causas nobres do evento”, pois “a cidade não existe sem os estudantes”, que representam um “grande peso na sua atividade cultural”, ressalva.

Segundo Delfim Leão, a “forte presença feminina nas várias propostas apresentadas” é também uma temática conducente do evento, uma vez que se aproxima o Dia da Mulher, a 8 de março. Por isso, chama a atenção para a exposição “50 anos de Ciência no Feminino: A Voz das Mulheres na UC” e para o concerto ‘Baixa, Rasa, Riba!’, que encerra a semana com canções tradicionais da polifonia feminina popular.

A emancipação da mulher no meio universitário, na opinião do vice-reitor, é “acompanhada por estes 50 anos de Revolução”, pelo que, atualmente, admite existir “uma percentagem maioritária feminina no tecido académico”. Nesse sentido, o dirigente revela que essa presença “se projeta em todo o tipo de iniciativas”.

O vice-reitor incentiva à participação por parte dos estudantes na XXVI Semana Cultural da UC, ao ressalvar o “grande esforço feito pela instituição para financiar as atividades”. Desta forma, sublinha a “versatilidade de propostas artísticas” programadas ao longo dos quinze dias. Apela ainda à “sensibilidade pela mensagem do evento, norteada pelo tema da Voz” e ressalva a importância de os jovens da academia “assegurarem a permanência dos ideais de abril” através da sua palavra.

5 de março de 2024 010
CULTURA

Projeto de futebol feminino da AAC em situação frágil

Presidente da SFutebol/AAC considera necessário melhorar condição da equipa feminina. Atletas pedem maior apoio da direção.

- POR PEDRO CRUZ E INÊS REIS -

Aequipa feminina da Secção de Futebol da Associação Académica de Coimbra (SFutebol/AAC) conta, na época de 2023/2024, com uma taxa de derrotas de 87%.

Em 15 jogos, divididos entre o Campeonato Nacional Feminino III Divisão, Taça de Futebol Feminino e Taça de Promoção Feminino, a equipa soma uma vitória, um empate e 13 derrotas. Tanto o treinador, Jorge Gonçalves, como as atletas, consideram que os resultados não correspondem às expectativas devido a problemas como o elevado número de lesões.

O início da equipa feminina e a sua valorização

A história da SFutebol/AAC começou em 1887. Em 2020 foi inscrita a primeira equipa feminina nas provas nacionais federadas para competir na III Divisão. Jorge Gonçalves, que se considera “amante da Académica”, defende que a representação feminina no desporto e na SFutebol/ AAC é “uma questão de equidade, não de igualdade”. Nesse sentido, ressalta que a Académica “fez o que devia ter feito” ao criar este grupo. Acrescenta que, apesar de o futebol feminino ter evoluído, é necessário continuar a lutar pela conquista de espaço, porque ainda se regista uma diferença de apoio entre categorias.

Para as jogadoras, a existência de uma equipa onde possam praticar a modalidade é fundamental, sobretudo porque sentem que o futebol feminino não é tão valorizado quanto o masculino. A capitã, Alícia Pina, diz sentir-se integrada na sociedade graças ao desporto. Por sua vez, as suas colegas Maria Carlos e Leonor Rodrigues veem-no como uma forma de escapar à rotina. Catarina Santos, membro da equipa desde a sua criação, evidencia que muitos consideram esta categoria como “demasiado amadora”. A avançada Laura Pereira sente que, apesar do aumento da visibilidade, ainda há muito trabalho a fazer.

As estudantes admitem que não estão no mesmo patamar que a equipa masculina. No entanto, realçam não terem as mesmas condições, o que pode justificar os resultados menos positivos. Alícia Pina considera que a equipa consegue fazer muito com o pouco que tem e apela a um maior apoio por parte da direção. Leonor Rodrigues categoriza a falta de comunicação e de empatia dos dirigentes como “inadmissível”,sublinhando a ausência dos superiores nas atividades da equipa.

Reavaliação do futuro

O presidente da SFutebol/AAC, Filipe Preces, esclarece que no fim da época vai ser feita uma ponderação entre custos e receitas, a fim de autorizar a manutenção da atividade de cada equipa. O dirigente realça que uma das principais dificuldades do plantel feminino, desde a sua criação, é o facto de muitos patrocínios acabarem por não se concretizar. O treinador também aponta este aspeto como uma dificuldade: “sabemos que os patrocinadores não estão mentalizados para o futebol feminino, pois há uma discrepância neste sentido”.

Apesar de caracterizar a realidade do futebol feminino como “exigente a nível financeiro”, o presidente deseja “manter a equipa de um ponto de vista efetivo”. Nesse sentido, Filipe Preces assegura que é necessário procurar meios para melhorar a condição do grupo e cumprir os objetivos financeiros e competitivos. Para “não degradar a imagem da Académica”, o dirigente admite a possibilidade de ter uma equipa feminina “com configuração lúdica”.

O treinador teme o encerramento da equipa devido ao desempenho desportivo e ao estado financeiro. Este cenário situação constituiria, nas palavras de Jorge Gonçalves, uma “regressão prejudicial para a AAC”. Acrescenta ainda que esta ação iria criar uma “lacuna muito grave na história da Académica”. Algumas atletas apontam que receberam a informação por intermédio do treinador e confessam que não foi bem vista.

As jogadoras consideram que são julgadas muito depressa e que a equipa está sob uma grande pressão por parte da coordenação, o que também afeta a obtenção de melhores resultados. Mesmo ao encarar o potencial encerramento da equipa como uma possibilidade, Leonor Rodrigues partilha que o bom ambiente do balneário mantém as jogadoras motivadas e que prevalece a “paixão pelo futebol”. Jorge Gonçalves partilha a ambição de que a sua equipa seja “um sustento de equidade no futebol feminino no futuro”.

011 5 de março de 2024
Por Inês Reis DESPORTO

O ciclo entre “o medo e a esperança” da

Dados da APAV espelham mulheres como principais vítimas de violên cia doméstica em Coimbra. Há cir cunstâncias que dificultam in tervenção da associação, sendo necessária ajuda de outras ins tituições, por sua vez, limita da por compassos de espera.

Em 2023, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) registou 93 254 atendimentos. Estes são mais 9932 que em 2022 e mais 26 846 quando comparados aos dados de 2020. Em Coimbra, foram assinalados 1306 crimes, entre outras formas de violência. Destes, 82,4% são crimes de violência doméstica, como confirmam as estatísticas da Câmara Municipal de Coimbra (CMC). Num crime que vê o seu número de vítimas a aumentar a nível nacional, “76 a 80% das pessoas que entraram em contacto com a APAV são do sexo feminino”, revela Natália Cardoso, jurista e gestora do gabinete da associação de Coimbra.

Os números de há dois anos são os mais recentes descritores da evolução da violência doméstica na cidade. A vereadora pela Ação Social da

CMC, Ana Cortez Vaz, esclarece que, apesar de ainda serem considerados dados anteriores, no primeiro semestre de 2023 já são conhecidos 93 processos. Dos processos referidos, “77% são relativos a agressões a mulheres” e “86% dos agressores são do sexo masculino”, sublinha a edil. No entanto, explica que a situação em Coimbra está “mais ou menos estável”.

“A violência pode ser psicológica ou sexual, não precisa de ser física”, clarifica Natália Cardoso. A jurista assume que, por norma, “quando há violência física, há psicológica”. Sobre esta última, sublinha que é “mais difícil de identificar e que requer uma maior consciencialização da vítima”. Por sua vez, Ana Cortez Vaz, exalta que “a relação de proximidade, afetiva ou familiar, entre o agressor e a vítima” reforça a dificuldade de mentalização.

Além de uma maioria feminina, 48,7% dos casos nacionais ocorrem em residência comum, segundo os dados da APAV de 2023. A pesquisa revelou, então, que 92% dos episódios criminosos ocorrem no “local onde as pessoas se deviam sentir mais seguras e confortáveis”, aponta a vereadora. Sobre o perfil das vítimas, Natália Cardoso explica que tendem a ser “mulheres casadas, em união de facto ou que se separaram há pouco tempo e sofrem de violência física e psicológica por parte dos seus companheiros”.

Segundo a gestora, o contexto social no qual a vítima cresce é um fator que influencia a maneira como vai interpretar uma realidade abusiva, pois “os comportamentos de violência estão normalizados” nesses ambientes. Além disso, “tentar que as vítimas percebam o mais rapidamente possível o que está a acontecer” é uma das tarefas da APAV. Uma intervenção desde cedo é um passo para a consciencialização das injuriadas de modo a detetarem um “comportamento padrão”. Contudo, Natália Cardoso admite que tal “nem sempre se consegue, porque as pessoas mudam e os traços podem não ser visíveis”.

A jurista acredita que há uma série de ativismos que consciencializam as pessoas a pedir ajuda, mas realça alguns entraves enfrentados. “Há uma manipulação pela pessoa agressora, que acrescenta culpa à vítima”, esclarece. Já Ana Cortez Vaz salienta a vulnerabilidade social e económica das lesadas que, muitas vezes, “por falta de recursos financeiros, continuam a submeter-se à violência”. Realça que essa dependência financeira, além de constranger a denúncia, faz com que recaia sobre a vítima “não só ultrapassar todo o trauma, mas também adaptar-se a novos territórios, vidas e dinâmicas”. Acrescenta que muitas delas se fazem acompanhar dos filhos.

5 de março de 2024 012 CENTRAL

A sociedade e a cultura também são fatores destacados. “As vítimas do sexo feminino têm enraizada a ideia de que o amor cura tudo”, reflete a coordenadora da APAV. Elucida que a fase de ataque violento é seguida de um momento de pacificação, o que acarreta “um ciclo entre o medo e a esperança, e enfraquece a perceção completa da vítima”. Sobre o meio social, Ana Cortez Vaz segue a mesma ideia: “ainda vivemos numa sociedade masculinizada e, talvez isso, dificulte a descida destes números”.

A coordenadora da APAV constatou que “as situações são mais complexas” e que a violência doméstica é uma problemática no meio de “muitos casos associados”. Esta teia de circunstâncias dificulta a intervenção da associação, visto que implica “trabalhar a situação por vários prismas”. O serviço de outras instituições, como de apoio psicológico, passa a ser necessário, o que implica “algum compasso de espera”, devido a limitações de recursos humanos.

Natália Cardoso considera que os jovens já têm “um posicionamento mais crítico” em relação aos problemas associados à violência doméstica. No entanto, acredita que existem “muitos estudantes nestas circunstâncias que não procuram ajuda”. Aponta que os alunos deslocados, que não conhecem os meios de apoio, “são mais suscetíveis a estas situações”.

O contacto com a APAV pode ser feito por chamada telefónica local, e-mail, ou através de uma linha nacional. O acompanhamento pode ser realizado por videochamada, nos casos em que a pessoa afetada não possa dirigir-se ao gabinete. A associação presta apoio jurídico, social e psicológico a “todas as pessoas que sejam vítimas de um crime”, não apenas em caso de violência doméstica, relembra a coordenadora.

A primeira abordagem é realizada por voluntários que dão algumas informações e ajudam a preencher qualquer requerimento necessário. Nesta fase, a APAV procura perceber qual é a situação de crime em que a vítima se encontra para, depois, ser encaminhada para serviços mais especializados ou a outras instituições.

O contacto é anónimo e não é necessário que a vítima tenha denunciado o caso às autoridades. Caso queira avançar com o processo-crime, a associação também procura informar a denunciante acerca dos seus direitos e facilitar

Dados Concelhios - Coimbra (2022)

Ligação entre denunciados(as) e as Vítimas de violência doméstica

Fonte: APAV – Estatísticas 2022 – Gabinete de Apoio à Vítima Coimbra

a mediação com os vários serviços de justiça. Apenas se for evidente que existe perigo de vida, pode haver a necessidade de “abrir uma exceção à confidencialidade”, assume Natália Cardoso. A sinalização de casos de violência doméstica à associação também pode ser feita por outras pessoas que tenham conhecimento das agressões.

Parte do trabalho da APAV concentra-se em dar resposta às “carências sociais que decorrem da prática do crime”, como a necessidade de cuidados psicológicos ou de alimentação, ilustra a responsável. A associação avalia ainda a existência de crianças, idosos ou outras pessoas vulneráveis envolvidas. No caso dos mais novos, o caso pode ser apresentado à Comissão de Proteção de Crianças e Jovens. No entanto, os mecanismos da instituição não contemplam

nenhuma medida de proteção para idosos ou pessoas com algum tipo de incapactidade. Ou seja, pode ter de se entrar em contacto com uma entidade de extração social.

Ana Cortez Vaz informa que o papel da autarquia é encaminhar as vítimas às instituições competentes. Indica que existe um centro de acolhimento de emergência noturno direcionado a pessoas em situação de sem-abrigo, que também está aberto a quem necessitar. Estão, ainda, a ser promovidos dois centros de acolhimento temporários, em Taveiro e Souselas. No seio da Associação Académica de Coimbra (AAC), foi criada uma unidade de apoio à vítima que permite marcar consultas com médicos do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra ou com profissionais voluntários. Sofia Duarte, vice-presidente da Direção-Geral da AAC, esclarece que tem de ser a vítima a fazer a marcação, mas que apenas os médicos têm acesso aos respetivos dados. As competências deste serviço estendem-se entre a violência no namoro, sexual ou doméstica e a casos de perseguição. Neste momento, a APAV ainda não tem “números fiáveis” que possa fornecer em relação aos casos reportados de violência doméstica em Coimbra no início de 2024, clarifica Natália Cardoso. Considera que os últimos anos têm sido marcados por oscilações, mas acredita que, em comparação a 2022, a quantidade de novos processos vai diminuir. Já o número de atendimentos “aumentou substancialmente”, acrescenta. Por outro lado, Ana Cortez Vaz declara que a diminuição destes números é um processo contínuo e complicado, mas “é para isso que se trabalha”.

013 5 de março de 2024 CENTRAL

O estigma da infertilidade

Idade avançada nas mulheres constitui principal entrave para engravidar. Docente da FMUC reforça importância da consciencialização e prevenção para combater atrasos no diagnóstico.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), um em cada seis casais é afetado pela infertilidade. Por este motivo, é considerada, pela instituição, um problema de saúde pública. Nas mulheres, “o diagnóstico tem aumentado ao longo do tempo e afeta-as a nível físico e mental”, explica Teresa Almeida Santos, professora na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC). As causas podem ser apenas femininas, masculinas ou de ambos os sexos. Porém, o mito acerca de a fertilidade ser um problema associado, na maioria das vezes, à mulher prevalece. Em 10% das situações a origem é desconhecida, “o que reflete a falta de investigação na área”, acrescenta. Para Teresa Almeida Santos, também coordenadora científica da clínica privada Eugin, a prevenção é um fator essencial. Segundo a médica, é necessário fomentar a literacia da população, especialmente dos jovens, de modo a aumentar a probabilidade de se realizar um diagnóstico precoce. Refere ainda que há um atraso significativo em alguns diagnósticos, como é o caso da endometriose, “uma das causas mais comuns da infertilidade feminina em idade reprodutiva”, que “demora cerca de oito anos a detetar”. O desconhecimento resulta na desvalorização de certos sintomas, como é o caso de dores fortes durante o período menstrual e em relações íntimas. Sublinha que existe também uma desconsideração pelo desconforto da mulher por parte dos próprios médicos.

A docente reconheceu, durante os anos de prática medicinal, que os casais procuram ajuda cada vez mais cedo. Informa que, quando co -

meçou a exercer medicina de fertilidade, havia casais que apenas recorriam aos serviços após oito anos a tentar engravidar. Contudo, esta situação é rara na atualidade devido a uma maior literacia. Ainda assim, Teresa Almeida Santos partilha que os mitos relacionados à fertilidade são muitas vezes adquiridos através das redes sociais. “É necessário dizer aos profissionais de saúde que devem informar sobre infertilidade e não somente sobre contraceção em consultas de planeamento familiar”, reitera.

Segundo a profissional, a doação de óvulos apresenta-se como o último recurso para casais em que as mulheres já não apresentam reserva ovárica. Para Ana Paula Sousa, investigadora do Centro de Neurociências e Biologia Celular da UC, a maior parte das mulheres que doam ovócitos fazem-no por razões “puramente altruístas”. Contudo, atesta que “uma pequena porção o realiza pela compensação financeira”, equivalente a 1018 euros.

O procedimento médico para a doação de óvulos requer uma sedação e uma intervenção cirúrgica. Ana Paula Sousa acredita que é um processo relativamente seguro. Ainda assim, explica que, em raros casos, pode resultar em internamento devido a uma reação denominada “hiperestimulação ovárica”. Para João RamalhoSantos, antigo professor do Departamento de Ciências da Vida da UC, a hiperestimulação ovárica “já não se apresenta como um risco”. Apesar disso, “deve haver um cuidado rigoroso” para mulheres que têm síndrome de ovário poliquístico, de forma a prevenir um agravamento da estimulação, acrescenta.

Teresa Almeida Santos enuncia que há falta de dadores de ovócitos e, sobretudo, de esperma. “Há mulheres solteiras e casais de mulheres que pretendem engravidar e são necessários dadores de esperma que se voluntariem”, declara. Os homens, tal como as mulheres, passam por uma avaliação genética e da sua função reprodutiva.

Comparado ao processo de doação por parte da mulher, a masculina é simples e passa somente pela colheita de esperma, que resulta numa compensação de 509 euros, válida a nível nacional. Após uma avaliação da qualidade espermática, “metade dos candidatos a dadores são recusados, já que não cumprem os valores mínimos de espermatozoides requeridos”, explica a coordenadora.

“Os parâmetros espermáticos médios são 50% inferiores daquilo que eram há 50 anos”, clarifica Teresa Almeida Santos. Elabora que, além de comportamentos nocivos, como o consumo generalizado de álcool e de drogas, as influências ambientais e os tóxicos contidos nos alimentos são das principais razões que justificam estes dados. Já na mulher, a idade é o principal fator para o sucesso de uma gravidez, explicita a docente.

“A fertilidade diminui de forma assustadora a partir dos 35 anos, mas começa a decrescer a partir dos 25, pico da idade fértil”, elucida a coordenadora. Existe uma tendência para descredibilizar esta situação, mas isto é “o pior que se pode fazer”, defende. Teresa Almeida Santos apela a um cuidado precoce, de forma a combater um atraso no diagnóstico e permitir o tratamento atempado.

5 de março de 2024 014 CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Por Sofia Ramos

Cancro da mama: do diagnóstico à luta

Dirigente da LPCC ilustra importância de dar atenção a lado emocional de doentes oncológicos. Rastreio e mamografia de rotina possibilitam deteção precoce.

- POR DÉBORA BORGES -

De acordo com a Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC), o cancro da mama é a doença oncológica mais comum nas mulheres. Contudo, pode também afetar o género masculino. Segundo o presidente da direção do Núcleo Regional do Centro da LPCC, Vítor Rodrigues, é importante “fazer uma mamografia de rastreio, mesmo não apresentando qualquer sinal ou sintoma”. Realça ainda a necessidade de estar "alerta aos sintomas clássicos”: a tumoração, retração da pele/mamilo ou alguma mudança de forma da mama. Partilha que “a maioria das situações do cancro da mama detetam-se através da mamografia de rastreio ou de rotina”.

Segundo Vítor Rodrigues, é “cada vez menos frequente encontrar nódulos”, devido à deteção precoce com o rastreio. Sublinha que “os nódulos que ultimamente surgiram caracterizam-se como benignos”. No que diz respeito à

faixa etária mais jovem, o presidente salienta que são “muito poucos casos” e que, os que existem, “por norma, tratam-se de situações de hereditariedade e genética”.

A altura do diagnóstico é um processo “extremamente doloroso e o tratamento refletese num período emocionalmente brutal”, frisa o dirigente. O stress é um problema que surge nesta fase, uma vez que “a vida normal passa por uma altura disruptiva”, declara. Em relação aos efeitos de tratamentos como a mastectomia, a tumorectomia e a quimioterapia, estes afetam “a autoimagem da mulher” e, sobretudo, o seu estado emocional.

Vítor Rodrigues garante que “todo o doente oncológico conta com apoios sociais, financeiros e emocionais”. Através da emissão de um atestado multiusos, o paciente obtém um conjunto de benefícios, nomeadamente a diminuição do IRS e a isenção do Imposto de

Circulação. A nível social, os apoios da LPCC englobam “movimentos de auto e entreajuda, bem como ajudas para cabeleiras, soutiens e próteses provisórias”, revela. Além disso, a instituição oferece “serviços de psicooncologia ao doente e à sua família”. Sublinha ainda que “o apoio aos familiares é fundamental”, uma vez que passam também por “momentos muito difíceis” que, por vezes, “a sociedade esquece”. A LPCC desenvolve programas de sensibilização, nomeadamente caminhadas, que são uma maneira de “olhar sempre pelo lado positivo e não pelo lado negativo” e de incentivar a que “recorram cada vez mais cedo aos cuidados de saúde”, informa Vítor Rodrigues. Relembra ainda que “é necessário apoiar no momento de doença ativa” e, posteriormente, ter “forças para reassegurar o seu lugar normal e habitual na sociedade”.

A voz das mulheres nos media

Falta de mulheres em cargos de chefia ainda se faz sentir, considera jornalista na Rádio Renascença. Docente da FLUC defende que OCS não devem estar “apenas dependentes de uma perspetiva masculina”.

- POR ANA CARDOSO E EDUARDO NEVES -

As questões de género são um tema que tem vindo a ganhar relevância ao longo dos anos. Desde a década de 70 que os media têm um “grande poder de influência na maneira como a sociedade pensa”, explica Rita Basílio, investigadora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (UC). Desta maneira, a também docente relembra o peso que estes meios têm no que toca à sinalização de problemas sociais como a desigualdade de género. Por outro lado, verificam-se várias disparidades entre mulheres e homens, como constata a diretora do Notícias de Gouveia (NG), Liliana Carona.

Rita Basílio salienta a importância de os media integrarem as visões das mulheres e “não estarem apenas dependentes de uma perspetiva masculina”. Nesse sentido, urge para um escrutínio das informações apresentadas nos Órgãos de Comunicação Social (OCS)

e evidencia o peso que “evitar a tendência em se recorrer a fontes masculinas" pode ter. Ao abordar temáticas feministas, os media contribuem para que as problemáticas sejam sinalizadas e combatidas, conclui a docente.

Quanto à presença feminina nos OCS, a investigadora menciona que “as redações estão muito feminizadas”. Liliana Carona explica que esta realidade se reflete desde a formação dos profissionais. Contudo, face a este cenário, ambas apontam que existe uma falta de representatividade feminina em posições de chefia. Segundo a também jornalista da Rádio Renascença, um dos motivos é a maternidade: “a mulher acaba por deixar cair esses cargos porque não se sente apoiada nas suas opções de vida”.

Para Liliana Carona, a “ideia conservadora da mulher jornalista” é uma “herança anterior ao 25 de abril” que ainda paira. Há a visão pré-

concebida de que estas profissionais “não são capazes de ir para determinado sítio a partir de certa hora” ou que “não conseguem realizar as tarefas como um homem”, declara. A diretora defende que, para combater esta questão, é importante existir equilíbrio e diversidade dentro das redações, bem como introduzir esses temas no ensino.

Como docente da Faculdade de Letras da UC, Rita Basílio assegura que, apesar de não haver unidades curriculares direcionadas para as questões de género, há “uma parte do corpo docente que se preocupa” com elas. O objetivo é realçar a persistência das desigualdades para que os alunos estejam “preparados para lidar com isso”. A professora defende, então, um jornalismo “responsável e inclusivo, independentemente do género”.

015 5 de março de 2024
CIÊNCIA E TECNOLOGIA
O que os jovens partidários esperam para o futuro do país?

Habitação, Emigração, Educação, Ambiente, Economia, Direitos Humanos e participação jovem na política foram principais tópicos discutidos. Juventudes apresentam perspetivas sobre “bolhas ideológicas” na vida partidária.

- POR JOANA ALMEIDA, GUILHERME BORGES E CLARA NETO -

De modo a compreender o lugar dos jovens no futuro do país, o Jornal A CABRA conversou com os representantes de cada grupo jovem dos partidos com assento parlamentar. Foram entrevistados Inês Guerreiro (Juventude Comunista Portuguesa - JCP), Mariana Rodrigues (Bloco de Esquerda - BE), Bruno Pedrosa (LIVRE), Daniel Azenha (Juventude Socialista - JS), Carolina Rojais (Juventude Social Democrata - JSD), Emanuel Candeias (Pessoas-Animais-Natureza - PAN), Celso Monteiro (Iniciativa Liberal - IL) e João Antunes (CHEGA).

Pertencer a juventudes partidárias: os dois lados da moeda

Daniel Azenha, da JS, acredita ser importante para os jovens compreender o que é feito pelos partidos e a função destes para a democracia. Para isso, defende como essencial a capacidade de “nos inserirmos” na atividade política. Para Inês Guerreiro, pertencer à JCP permitelhe partilhar com outras pessoas a vontade de lutar “contra injustiças”. Carolina Rojais valoriza o espaço que a JSD proporciona para os jovens apresentarem as suas ideias e “sentirem que a sua voz é ouvida”. Emanuel Candeias, do PAN, defende que as juventudes partidárias são meios essenciais para “estabelecer uma ponte de compreensão intergeracional”. Por sua vez, João Antunes, do CHEGA, acusa as principais juventudes de serem, “fundamentalmente, máquinas de criação política e elevação individual”. Contudo, descreve a própria estrutura como “um local onde os jovens podem trocar ideias em prol do país e não de si próprios”. Por outro lado, o LIVRE, o BE e a IL não têm juventudes partidárias. Bruno Pedrosa considera que “criar uma estrutura à parte, só para os jovens, não faz sentido”, ao indicar que no LIVRE “todas as vozes são ouvidas por igual”.

Segundo Mariana Rodrigues, “deve haver distinção entre as reivindicações dos jovens e as de outras faixas etárias", contudo não devem haver separações dentro do partido. Nesse sentido, Celso Monteiro acredita que estas estruturas “são uma forma de distinguir a ‘mesa dos pequenos’, onde os jovens não têm impacto direto nas políticas do partido, da ‘mesa dos grandes’, onde se sentam aqueles que já estão na Assembleia da República (AR)”.

Relação entre juventudes e partidos

Todos os núcleos partidários juvenis de Coimbra referem que a sua relação com os partidos é de cooperação. Mariana Rodrigues, Inês Guerreiro e Bruno Pedrosa asseguram que, nos seus partidos, os jovens são colocados em pé de igualdade na discussão política. Daniel Azenha explica que a JS tem assento na Comissão Política Federativa e faz parte dos órgãos do PS, pertencendo “às listas, não só nas Legislativas, como nas Autárquicas”. A JSD possui uma estrutura autónoma, mas estabelece “uma estreita colaboração com o partido”, declara Carolina Rojais. Nessa lógica, João Antunes enfatiza a união nacional que existe entre o CHEGA e a sua juventude, “ao contrário do que se possa pensar”. Emanuel Candeias e Celso Monteiro sublinham o valor da autonomia nas juventudes para fazerem chegar as suas ideias aos órgãos nacionais.

Os jovens interessam-se pela política?

De acordo com a IL, o BE e a JSD, existe um desinteresse na vida partidária e não na política. Mariana Rodrigues presume que isto acontece pois “os jovens sentem que deixaram de ser ouvidos e tidos em conta”. Contudo, Carolina Rojais reforça que “os jovens se movem, cada vez mais, por causas, o que mostra que continuam interessados na política”.

Pelo contrário, Emanuel Candeias diz que o desinteresse dos jovens na política “é claro”, o que se traduz na elevada abstenção. Bruno Pedrosa admite que pode haver uma apatia geral, mas garante que o LIVRE “tenta estar próximo da juventude”. João Antunes julga que este problema “era maior há uns anos”, pelo que, agora, os jovens têm vontade de se mover “dos partidos principais, como o PS e o PSD, para novas forças de mudança”. Já a JCP e a JS consideram que não existe uma redução do entusiasmo por parte dos jovens na vida política, uma vez que continuam ativos.

Para o PAN, a solução para a falta de interesse pode passar por um envolvimento desde cedo na política, através da inserção de literacia política no ensino. Mariana Rodrigues entende que a resposta está numa alteração estrutural da visão partidária sobre os jovens, que sente ser “infantilizada”.

E os políticos, interessam-se pelos jovens? Apesar de reconhecer que ainda há um caminho a ser feito, Carolina Rojais defende que a voz dos jovens já é mais considerada pelos políticos, como diz acontecer com as listas do PSD Coimbra. Daniel Azenha partilha da mesma opinião, pelo que também os encara como políticos e reconhece a sua posição na AR. João Antunes confia que o CHEGA “tem feito um excelente trabalho” nesse sentido, ao servir-se do exemplo da deputada Rita Matias.

Noutro ponto de vista, Celso Monteiro crê que “90% dos políticos não se interessam pelos jovens”, apontando que “a idade avançada dos políticos reduz a sua ligação com estes”. Para Inês Guerreiro, “os últimos governos e a direita não têm mostrado muito interesse em ouvir os jovens, caso contrário, incluíam-nos nas suas políticas”. Já Emanuel Candeias julga que há um interesse que acaba por diminuir pois “não

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é estimulado”.

Negando que essa ideia se aplica à realidade bloquista, Mariana Rodrigues reitera que “existe uma tentativa de remeter as questões dos jovens para segundo plano”. Bruno Pedrosa critica a média de idade na AR, que ilustra “uma falta de representatividade jovem”.

Medidas que “caem no esquecimento”

A JSD e o PAN destacam a ciência como um dos temas mais esquecidos no panorama político nacional. “Temos imensa qualidade nos quadros de investigação científica que formamos que não são devidamente valorizados pelo regime das bolsas”, situação que Carolina Rojais quer colmatar com as propostas da Aliança Democrática. O BE, a JS, o PAN e o LIVRE argumentam que a cultura é outro tema que deve ser mais discutido. Nesse sentido, Daniel Azenha propõe: “temos de garantir que o setor alcança a capacidade financeira para se desenvolver”.

Bruno Pedrosa sente que tem sido pouco debatida a necessidade de “uma transição ecológica”. Emanuel Candeias defende a promoção de uma “economia verde”, pois há partidos que “ainda negam a crise climática”. Em concordância, Mariana Rodrigues propõe a “transição para uma economia de alto valor acrescentado que tenha em conta a sustentabilidade ambiental”. Daniel Azenha acredita que o combate à crise climática deve ser uma missão de “todos os partidos”. O BE, o PAN e o LIVRE salientam, ainda, que a luta contra o racismo, xenofobia, violência de género e discriminação em todas as suas formas precisa de ser mais discutida. Além disso, Emanuel Candeias destaca a falta de uma conversa mais abrangente sobre pessoas com deficiência.

Uma das grandes bandeiras da IL é a “reforma eleitoral”, dado que, em 2022, “cerca de 700 mil votos foram para o lixo", refere Celso Monteiro. Já João Antunes desenha um paralelismo entre “a imigração descontrolada” e a “falta de segurança no país”. Inês Guerreiro sente que se devem criar espaços “onde as pessoas possam debater e participar” no processo de transformação política.

O mito das bolhas ideológicas

De acordo com os representantes do BE, do PAN e do CHEGA, as juventudes incentivam bolhas ideológicas. Mariana Rodrigues acredita que “as juventudes partidárias só discutem certos temas e não estão envolvidos na vida político-partidária do país”. Emanuel Candeias

refere que é através do encontro com as pessoas que “passamos a conhecer os seus problemas e conseguimos sair dessa bolha”. Já João Antunes admite que “é melhor isso do que não haver ideais comuns que nos guiem”.

Por outro lado, a JS, o LIVRE, a JCP e a IL não veem esta visão refletida nos seus partidos, considerando que há abertura para novas ideias. Inês Guerreiro reconhece que posições firmes dentro do partido são uma forma de evitar a neutralidade. Embora veja que a JSD é definida por ações pautadas, Carolina Rojais pensa que a sua juventude é aberta a novas sugestões.

Como combater a “fuga” dos jovens

Segundo o PAN, “o mal não é a emigração em si, pois um jovem pode querer ir para outro país, o mal é ser obrigado a isso”. Mariana Rodrigues acredita que os baixos salários são um dos principais motivos para “50% dos jovens” ponderarem sair de Portugal. Para o BE, a JS e a JCP, a questão salarial deve ser revista, propondo um aumento destas remunerações para fixar os jovens. Estes “não se reveem na forma como o mercado está e em como o rendimento não é suficiente para as despesas básicas”, aponta Carolina Rojais. Daniel Azenha acredita num “choque salarial” em detrimento de um “choque fiscal” no setor financeiro, defendido pelo CHEGA, que propõe uma “diminuição forte da carga fiscal”.

A JS e o BE apostam na resolução da crise habitacional e na melhoria do acesso à educação para evitar que os jovens abandonem o país. Daniel Azenha sublinha a necessidade de foco no setor laboral, enquanto Bruno Pedrosa propõe a semana de quatro dias de trabalho. Para a IL, os problemas “não se resolvem aos gritos nem com populismos ou demagogias”, apelando a uma maior participação jovem como resolução a esta problemática.

O que anseias para a próxima legislatura?

Inês Guerreiro: “o aumento dos salários, o combate à precariedade, a defesa da contratação coletiva e dos direitos dos jovens trabalhadores. Também o direito à habitação, o controlo das rendas e dos despejos e a responsabilização da banca pelo aumento das taxas de juro. Um maior investimento e menores barreiras de acesso ao Ensino Superior (ES) para combater as desigualdades. Defesa e preservação do ambiente, através do direito à mobilidade e do desenvolvimento da ferrovia e trans -

portes públicos”.

Mariana Rodrigues: “os jovens têm pressa de ter autonomia fora da casa dos pais e acesso à habitação. Têm pressa de estudar sem que as propinas os empatem num ES democrático. Querem uma vida digna, com direitos plenos e salários assegurados ao fim do mês que não sirvam apenas para pagar a renda. Querem viver sem o tormento da misoginia, do racismo, da LGBTfobia. Querem um planeta habitável que não seja um caixote de lixo público dos produtores nem uma mina descartável do capital. É necessário garantir a manutenção dos direitos que fomos adquirindo, democratizar e descolonizar o ensino. Sem discutir estes temas e ter um plano coeso que atue já no dia 11 de Março vai ser muito difícil fixar jovens em Portugal e garantir que seja um país com futuro”.

Bruno Pedrosa: “mais participação, vontade de transformar e oportunidades. A proposta da herança social, que consiste em criar uma conta poupança à nascença, por volta dos cinco mil euros, através de um imposto sobre as grandes fortunas, acima de um milhão de euros”.

Daniel Azenha: “um grande compromisso. Acima de tudo, temos de cumprir o nosso plano - um ambicioso Orçamento de Estadoque prova a nossa prioridade: os jovens”.

Carolina Rojais: “que seja um país onde os jovens, ao entrarem no mercado de trabalho, consigam ter uma menor carga fiscal, maiores rendimentos e melhores condições na garantia de habitação própria. Que consigam ter acesso a serviços básicos como a saúde”.

Emanuel Candeias: “que os jovens tenham mais habitação e melhor acesso a residências em Coimbra. Temos de aumentar este número e devemos valorizar as repúblicas, características da nossa cidade. É importante preservá-las”.

Celso Monteiro: “não consigo viver num país em que se diz que está tudo bem, quando vemos tantos jovens a emigrar. Espero que haja uma diminuição do imposto sobre as empresas que, desta forma, vão querer pagar melhor”.

João Antunes: “que ganhe a verdadeira direita. Os jovens têm de ser vistos como pessoas que têm algo a dar a Portugal e o país precisa de mudanças profundas para retribuir aos jovens”.

- Com colaboração de Raquel Chaves e Raquel LucasFotografias por Joana Almeida, Guiherme Borges, Raquel Chaves, Clara Neto e Luísa Rodrigues

017 5 de março de 2024 CIDADE

Pressionadas até à exaustão: o burnout no feminino

Relatos de Isabela Silva (nome fictício), Ariana Rodrigues e Joana Alves mostram impacto da síndrome de burnout nas estudantes do Ensino Superior. Maior exigência profissional, assédio moral e expectativas sociais apontados como fatores de agravamento da doença.

Orelatório Women in the Workplace de 2021, realizado pela empresa de consultoria McKinsey em conjunto com a organização Lean In, revelou que 42% das mulheres entrevistadas sofriam ou já sofreram sintomas de burnout, em comparação com 35% dos homens. Este é apenas um dos estudos que evidenciam que as mulheres são mais suscetíveis a sofrerem com a síndrome de burnout do que os homens. Quais são os motivos para esta discrepância?

Anabela Vitorino Costa, psicóloga clínica, acredita que a realidade atual do mercado laboral é a culpada. A seu ver, as mulheres são mais suscetíveis de sofrer episódios de burnout devido a três fatores principais. A exigência acrescida que sentem para alcançarem o mesmo lugar na hierarquia profissional que um colega do sexo masculino, o assédio moral e a expetativa imposta pela sociedade que a mulher deve equilibrar todas as áreas da sua vida. Contudo, lembra que a última questão referida não é considerada quando se realiza o diagnóstico da doença.

A Organização Mundial da Saúde define o burnout como uma síndrome resultante de stress crónico causado pelo trabalho que não foi gerido com sucesso. A doença, incluída na lista internacional de doenças ocupacionais a 27 de maio de 2019, possui três dimensões: sentimentos de exaustão, sentimentos de negativismo ou cinismo na relação com o trabalho e sensação de ineficácia e falta de realização pessoal.

Esgotadas

Isabela Silva (nome fictício), Joana Alves e Ariana Rodrigues são três jovens mulheres marcadas por esta síndrome. O cansaço físico e mental extremo e a ansiedade constante foram os principais sintomas que assombraram as suas rotinas durante meses. Sintomas que Anabela Vitorino Costa refere serem comuns em pessoas esgotadas.

Ariana Rodrigues, licenciada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC), apercebeu-se que estava a

passar por um episódio de burnout em fevereiro de 2023. Após meses ininterruptos de estudo para os exames, começou a sentir os efeitos do esgotamento no corpo e na mente. O cansaço veio acompanhado de dores corporais e de cabeça, aliado à ansiedade que a impedia de dormir.

Para Joana Alves, estudante na Faculdade de Letras da UC, a exaustão que sentia deixou de ser suportável em julho de 2022. Um semestre repleto de nove unidades curriculares por realizar, a pressão para completar a licenciatura e um estado mental já deteriorado levaram-na ao seu limite. A ansiedade constante e o cansaço extremo deixaram-na num estado vulnerável em que não conseguia sequer lidar com o pensamento de estudar.

Isabela Silva, estudante conimbricense na Universidade do Minho, foi diagnosticada com síndrome de burnout no início de 2023. Apesar de ter sido a própria a mencionar a doença à sua psicóloga, descartou a hipótese porque tinha uma ideia pré-concebida que não se aplicava a como se sentia no seu dia a dia. Sentia-se “bem e realizada”, além de ter muita energia, mas sentia também imenso cansaço, algo que a jovem não sabia que podia coexistir. Segundo a sua psicóloga, o burnout de Isabela Silva é acompanhado de um elevado grau de satisfação profissional e académica.

“Sinto-me cansada, mas não consigo parar”

Anabela Vitorino Costa declara que as consequências desta doença são muito impactantes nos indivíduos. “Numa primeira fase a pessoa não atende aos sintomas e continua a trabalhar até ficar esgotada”, menciona. Quando falamos de mulheres, a psicóloga acredita que as consequências são ainda mais nefastas na relação consigo mesmas e com os que as rodeiam. “Põe em causa a sua relação com a família, com o meio profissional, afeta a sua autoestima e a sua capacidade de lidar com tarefas diárias”, reitera.

Ariana Rodrigues garante que o esgotamento a levou ao seu limite máximo, deixou-a “apática

e mal-humorada”, e, no pior momento, fez com que se isolasse durante um mês. “Não aguentava mais, precisava de ajuda”, são as palavras que a jovem usa para retratar o momento em que redefiniu a sua saúde mental como prioridade. No entanto, esclarece que receber acompanhamento psicológico não está ao alcance de todos, pois requer “uma boa situação financeira”. Optou pelas consultas de psicologia cedidas pela UC, mas a longa lista de espera deixou-a igualmente desamparada. O que restou foi o apoio incondicional dos amigos e familiares.

“Foi falhanço, atrás de falhanço”, é a descrição que Joana Alves faz sobre o período do seu esgotamento. O cansaço obrigava-a a dormir muitas horas, mas não acordava descansada. O stress e a pressão que sentia fizeram com que adotasse comportamentos de autossabotagem, como faltar às aulas ou refugiar-se na comida para ignorar a situação em que estava. Durante o auge da doença, a jovem pensava que nunca iria conseguir recuperar o seu bem-estar mental. Embora já fosse acompanhada por uma psicóloga, não mencionou a possibilidade de burnout durante as consultas, porque, segundo a própria, só se apercebeu da gravidade da situação meses depois. Assim como Ariana Rodrigues, foi muito apoiada por familiares e pelo namorado.

Embora possua diagnóstico, Isabela Silva não se sente restringida pelo mesmo, pois afirma não estar incapaz de desempenhar as tarefas a que se propõe. Na sua ótica, a maior parte das pessoas sofre episódios de burnout devido a fatores externos, como as vidas atarefadas e stressantes que caracterizam as sociedades modernas. No seu caso, sente-se a maior responsável por acreditar que se colocou nas situações que a levaram a ter um esgotamento: o trabalho, o curso de inglês e a licenciatura na universidade. “Sinto-me cansada, mas não consigo parar”, acrescenta. “Houve uma altura em que dormia 12 a 16 horas seguidas”, partilha a estudante.

Tanto para Ariana Rodrigues como para Joana Alves, o esgotamento teve como consequência a incapacidade de completar as uni-

5 de março de 2024 018 REPORTAGEM

dades curriculares em que estavam inscritas. “Recuperar de um estado de burnout e voltar à rotina é complicado”, confessa a antiga estudante da FDUC. Critica ainda a UC por não ser capaz de proporcionar serviços de saúde mental que consigam satisfazer as necessidades dos seus estudantes. Contudo, a jovem acredita que o burnout lhe proporcionou “uma lição de vida” sobre como encarar as tarefas com mais calma e priorizar-se. Neste momento, anseia por ver o que o futuro lhe reserva.

Falta de consciencialização em torno da doença

Joana Alves vê o esgotamento como o momento de uma mudança radical na sua vida, pois levou-a a permanecer na cidade dos estudantes mais um ano e a entrar no mercado de trabalho pela primeira vez. Decidiu adotar hábitos de gratidão para contrariar o espaço mental negativo em que vivia. “Escrever as partes boas do meu dia fez-me começar a apreciar as coisas que me deixam feliz”, assevera.

O diagnóstico de Isabela Silva permitiu-lhe assumir uma maior conscientização quanto aos comportamentos que a esgotavam, sobre a necessidade de estabelecer limites e a importância do descanso. Admite que estas tarefas, por vezes, revelam-se difíceis, mas esforça-se para pôr o seu bem-estar mental em primeiro

lugar. Atualmente, a jovem acredita que o burnout não a afeta tanto, mas ainda sente “o reverso da moeda”, em particular, quando sente culpa por querer cumprir os seus objetivos e o desgaste não a deixa.

As três jovens acreditam que existe uma falta de consciencialização e discussão em torno da doença, o que leva as pessoas a acreditarem que só afeta “quem não quer trabalhar e é preguiçoso” ou a ignorarem os sinais de que estão a sofrer um esgotamento. “A mentalidade de uma pessoa matar-se a trabalhar é um motivo de orgulho para as gerações mais velhas”, reforça Joana. A estudante sente que a credibilidade do cansaço e a estabilidade mental das gerações mais novas é olhada de lado.

“A saúde mental não é só um jargão político” Anabela Vitorino Costa considera que os últimos anos, em particular desde a pandemia de Covid-19 que assolou o mundo, foram cruciais para o maior conhecimento desta doença por parte da população, fenómeno que acredita ter sido impulsionado pelos órgãos de comunicação social. A psicóloga clínica defende que a prevenção tem de começar nas organizações, que devem assumir a promoção do bem-estar. “Não é assim tão difícil perceber como as pessoas se estão a sentir no seu local de trabalho”, reforça.

A resistência em aceitar um diagnóstico de

burnout é comum, segundo Anabela Vitorino Costa. Tal deve-se ao facto de serem “pessoas com elevado nível de desempenho nas suas profissões” e, quando começam a experienciar “sintomas de incapacidade e aversão” ao seu trabalho, não conseguem lidar com a possibilidade de um esgotamento. Explica que os indivíduos estão a ocupar cada vez mais horas do seu dia no trabalho e que o equilíbrio entre a vida familiar e a profissional é fundamental para prevenir um esgotamento. “O tratamento passa por ajudar a pessoa a tomar consciência e a aceitar o que está a sentir, com o objetivo de recuperar a autoconfiança e o bem-estar”, assevera.

A dificuldade de acesso a cuidados de saúde criticada por Ariana Rodrigues, é um fator que Anabela Vitorino Costa acredita que pode afastar a procura por um diagnóstico e acompanhamento psicológico. “A saúde mental não é só um jargão político, é preciso promovê-la efetivamente para que os profissionais e os estudantes se sintam felizes nas atividades que realizam”, proclama a psicóloga clínica. Numa nota final, Joana Alves quer dar esperança às companheiras impactadas por esta doença: “a negatividade leva-nos a aceitar a exaustão e o mau estado de saúde mental, mas mais cedo ou mais tarde as coisas vão melhorar”.

019 5 de março de 2024
REPORTAGEM

CARTAS À DIRETORA

‘Xora diretora,

Se podemos demonstrar a rutura da sociedade entre papéis de raça, classe e género, então qual será o papel da mulher? É em resposta a esta pergunta, que a história carrega feminicídios, violência de género e a misoginia estrutural da sociedade, tudo isto opressões incitadas pelo simples ódio à mulher, pela mesma ser uma mulher.

Como Simone de Beauvoir já disse: “Ninguém nasce mulher, torna-se mulher” (citação retirada de “O Segundo Sexo”). A ideia geral de ser uma mulher não surge apenas da construção social de género que nós presenciamos diariamente, mas sim da nossa resposta a este papel social, da nossa luta contra a misoginia, machismo, transfobia e aos estereótipos que perpetuam e legitimam a violência de género.

Quando nos debruçamos sobre o feminismo, as preocupações principais não são piadas misóginas como as feitas sobre o filme “Barbie” nos Óscares. Nós atentamos, ou pelo menos devemos atentar, às 133 mulheres que são vítimas de homicídio cometido pelo parceiro ou familiar diariamente (dados publicados pela ONU), ao nosso país, com os maiores números de violência doméstica na UE, e à violência sexual que afeta cerca de 94% das mulheres em conflitos armados. São nestes casos que também devemos dar atenção às pautas raciais e pautas da comunidade LGBTQIAP+, uma vez que a objetificação em prática machista tem uma abordagem diferente para mulheres negras, muçulmanas, brancas, indígenas e transexuais.

E ainda perante todo o nosso passado histórico, haverá sempre um homem que, a meio de publicações do Facebook e comentários soltos em rodas de conversa, ainda diz: “Mas, então, porque não existe o dia dos homens? Merecemos o mesmo tanto!”. E já respondendo à pergunta, mesmo que ignorante e imbecil. Não, não merecem.

Isto é, feminismo não se trata de uma competição com homens por quem mais merece regalias ou privilégios, mas sim uma guerra para assegurar os direitos humanos. É neste conflito que, tudo o que ameaça a organização estrutural racista e misógina em que vivemos, se pode considerar como luta de género. Informação e estudo é luta, reflexões são luta e a difusão de vivência é luta.

‘Xora diretora,

No início de fevereiro descobrimos que para aceder aos pisos superiores da AAC o nosso nome terá de estar numa lista. Isto, durante o período noturno e de forma a controlar um desgoverno que impera na Académica entre a meia-noite e o nascer do sol. Apenas quem está na lista tem o privilégio de usufruir de quatro pisos de um dos edifícios mais emblemáticos de Coimbra.

Antes de continuar, devo dizer que era preciso estar desligado da realidade para não reconhecer que existem problemas com o livre acesso ao edifício. Para não correr o risco de parecer hipócrita, confirmo que este que vos escreve pode ser encontrado neste espaço, entre a meia-noite e o nascer do sol.

Ainda assim, deixar a análise por aqui parece-me ingénuo.

1. Devemos primeiro compreender que esta não é uma questão nova, quem frequenta o edifício sabe. É uma discussão que leva décadas. Um debate que já assistiu a medidas como esta e a vários avanços e recuos. No entanto, esta discussão intensificou-se durante a pandemia. Nesse período bizarro tivemos seguranças privados a criar, pela sua própria iniciativa, listas que ditavam quem tinha direito a entrar no edifício (não apenas a subir aos pisos superiores). Nesse mesmo período assistimos a estudantes verem o seu acesso ao edifício negado, vimos violência por parte de alguns destes seguranças para com seccionistas, estudantes a serem retirados das suas

salas à força (por iniciativa dos seguranças, sem ordens da Administração) e vimos crescer este fetiche securitário em torno do edifício da AAC. Em grande parte, fruto do clima vivido na altura, que era propício a tudo isto.

2. Hoje temos um problema com a segurança dos estudantes que se divertem/trabalham no edifício e sobretudo com a sua manutenção (Jardins inclusive). Mas falar deste problema sem falar dos moldes em que funciona o Bar da AAC seria ignorar o elefante que divide a sala connosco. Irei dispensar-me de uma análise histórica rigorosa, relembro apenas que este modo de operação é relativamente recente. Sempre houve diversão noturna na Académica e sempre haverá. No entanto, aquilo que temos hoje é uma discoteca privada a funcionar no Piso 0. Para muitos é a única realidade que conhecem. Albergar uma discoteca tem custos. Tem o custo da deterioração do espaço onde ela está, a deterioração do espaço envolvente (Jardins e restante Edifício) e a necessidade de garantir a segurança dos clientes, como em qualquer outro bar. Ao trazer um negócio como este para a nossa casa, importámos tudo isto (deterioração do espaço e insegurança).

3. Não foi a troco de nada. A renda paga pelo Bar é importante para a saúde financeira da AAC. Parece-me, no entanto, que a troca estabelecida entre as duas entidades não pode ser vista como uma mera concessão de espaço.

Neste momento a AAC já cedeu mais que apenas uma sala. Hoje sabemos que a livre circulação no edifício (a sede de uma associação que se orgulha em dizer que tem um edifico aberto todo o ano, 24/7) tem um preço. O preço da renda pago por um negócio privado. Mesmo que crie constrangimentos aos estudantes.

4. Cabe então aos dirigentes fazer esta ponderação. Estamos dispostos a entregar a fiscalização de entradas e saídas a seguranças privados? Quem são estas pessoas que têm na mão a lista de quem pode entrar no Edifício Sede da AAC? Trata-se de uma concessão ou de uma capitulação a interesses financeiros? Será que a lista vai ser respeitada por todos? Um seccionista não pode levar quem entender à sua secção, à hora que desejar? Se não, porquê? O bem-estar do edifício e dos seccionistas vale menos que a renda? Dos vários modelos de funcionamento que o Bar já teve, este é o melhor para a AAC? Vale a pena gerir as consequências invés de lidar com a causa?

Digo isto com plena consciência de que este não é um problema simples. Também sei que iniciativas idênticas a esta foram morrendo ao longo dos anos. Algumas à nascença, outras ainda jovens. Ainda assim, fica a dúvida: Afinal entre Bar, Segurança e os Estudantes, quem é o senhorio?

5 de março de 2024 020
- BÁRBARA NEVES
- BRUNO LOPES OLIVEIRA SOLTAS

CABRA DA PESTE

CRÓNICAS DO TRODA

Como é que é FAMS?

Já há algum tempo que não vos comunicávamos, porém ouvimos dizer que era para comemorar o Dia da Mulher com A CABRA.

Tentámos entrar em contacto com as Mondeguinas (tuna feminina associada da APAV), mas elas estavam mais ocupadas a arranjar uma maneira da boicotar o arraial de tunas femininas da DG. Também tentámos falar com a linha de denúncias da AAC, mas o número do Troda estava bloqueado. Ainda pensámos em ligar para o SOS Estudante, mas achámos melhor não (anda aí uma conversa que esta só serve para “xular” e enganar a malta).

Acabámos, portanto, nós a escrever este grande artigo. Vamos falar sobre variados assuntos como, as mulheres na academia, as mulheres no tacho da academia e noutros tachos e ainda como fazerem as vossas namoradas felizes.

Sobre a mulher na academia, há muito a dizer. Começando pela utilização das calças na capa e batina e acabando na representação femini-

na na mesa da Magna, contudo, ao final do dia na AAC são sempre os Boys a vestir as calças. E como somos um grupo com piada, e as mulheres no Fado, o que acham? Mais um funeral? Já não chegava os “Última luz – Fado, Funerais e companhia LDA”?

Ainda sobre as mulheres no tacho dentro e fora da AAC, gostávamos de dizer que somos um grupo que aprecia e apoia muito a amizade e, como tal, queremos dar os parabéns à Ana Cavilhas (antiga Presidente da FAP) e ao Caseiro por terem feito as pazes e estarem a apoiar o mesmo projeto político. Viva a amizade!

Agora o que realmente importa, como fazerem as vossas namoradas ou amantes felizes. Bem, desde logo não enamorem as meninas de Direito, o Troda ouviu dizer que por lá as orais estão para acabar. No entanto, se tiverem um cartão de crédito ou de débito podem sempre aproveitar as promoções das floristas, que inflacionam os preços na semana anterior, para dar aquela rosa cansada às vossas concubinas. Ainda, têm sempre a opção de jantar do Dia da Mulher onde elas comem sempre sem sujar

prato e, também, a opção Tezenis e companhia para celebrar o empoderamento feminino da melhor maneira. Ou então, esperem até dia 21 de Março para levarem as vossas queridas a passear a Lisboa, já que a AAC vai pagar os transportes. Quem não gosta de uma viagem suada, da capital até Lisboa?

Com esta nos despedimos. Já sabem que os nossos ensaios são às Terças e Quintas às 21h30 na Tó Nogueira, debaixo da sala de Estudo da AAC. Se alguma menina estiver interessada em pertencer à Orxestra Pitagórica está mais que convidada, pois, somos um grupo misto e a favor da igualdade, e por isso temos sempre uma fralda para usarem como a nossa caloirada. Beijinhos molhados e feliz dia do cartão de crédito.

P.S. Queremos deixar um agradecimento especial aos nossos amigos da FAN-Farra por nos terem alugado o serviço de net e computador por apenas 250€. Só assim foi possível entregar estes Lusíadas a tempo do impresso.

021 5 de março de 2024
SOLTAS

Em democracia,

a igualdade será para todas ou não será para nenhuma

- POR SECÇÃO DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS DA ASOCIAÇÃO ACADÉMICA DE COIMBRA -

Esta semana é comemorado o Dia da Mulher, a 8 de março, como em todos os outros anos. Porém, agora, estas comemorações têm outro peso. Portugal atravessa um período eleitoral que, pela primeira vez desde 1974, coloca grandes questões sobre a ascensão abrupta de forças antidemocráticas, que põem exatamente em causa direitos que vimos ser conquistados pelas mulheres e pelos movimentos feministas.

Nos 50 anos do 25 de abril, ou seja, nos 50 anos de democracia plena em Portugal, é importante perceber que o progresso feminista, mesmo que atrasado relativamente ao resto da Europa, teve o seu grande início. Foi nesta metade de século que o país garantiu melhores direitos reprodutivos, laborais e de segurança, bem como uma melhor posição de representativi-

dade em cargos de chefia, políticos e na cultura. Não será, no entanto, o paraíso na terra, considerando que os movimentos feministas são tão ou mais populares e relevantes hoje do que eram há 50 anos. Se, por um lado, se lutou a ferros por um avanço na proteção estatal e na lei, na prática existe um claro desfalque, nomeadamente nas áreas da justiça e da saúde. Como resultado, hoje observamos bem de perto o que algumas forças políticas parecem querer fazer na lei e na prática em relação às lutas feministas e aos direitos das mulheres.

Com a maturidade crescente da nossa democracia, o presente exige um novo alargar das lutas e das exigências, não uma repetição das lutas do passado. Este nosso presente é marcado pela era do feminismo interseccional, que mostra as várias vertentes da opressão do pa-

triarcado, que mostra que a luta pela igualdade não é só uma luta pelas mulheres cisgénero, mas também para mulheres trans, as mulheres não brancas, as mulheres queer, as mulheres não europeias. É uma luta por todas.

Hoje, temos presente que o desafio é garantir o respeito por todas e todes na sua forma de ser, disputando os conceitos de papéis de género atribuídos quase como que biologicamente, numa tentativa vil de nos categorizar a todes, conformando-nos numa sociedade ainda muito marcada pela discriminação, opressão e, consequentemente, violência sobre as mulheres, a população queer e as pessoas trans. A luta feminista não pode recuar a sua luta para recuperar os 50 anos passados. Tem que impor, agora, uma discussão alargada, mais inclusiva e mais preparada para os próximos 50 anos.

SECÇÃO FILATÉLICA

Abela Inês de Castro, amante de D. Pedro I, foi executada a mando de D. Afonso VI. Os encontros entre os amantes realizavam-se em Santa Clara-a-Velha, perto da Quinta das Lágrimas.

A 7 de janeiro de 1355, o rei D. Afonso IV cede às pressões dos fidalgos da corte, seus conselheiros, e, aproveitando a ausência do seu filho, enviou a Coimbra Pêro Coelho, Álvaro Gonçalves e Diogo Lopes Pacheco para matarem D. Inês de Castro, o grande amor de D. Pedro I. Segundo a lenda, as lágrimas derramadas por Inês teriam criado a Fonte dos Amores na Quinta das Lágrimas, e algumas algas aver -

melhadas que ali crescem seriam o seu sangue derramado. De acordo com os especialistas, os laivos de sangue do "colo da garça", que se vislumbram nos líquenes que atapetam a pedra do fundo, tomaram a cor devido à presença de uma alga, a Hildenbranthia Rosea.

O príncipe, mal subiu ao trono, logo tratou de capturar o trio de assassinos, refugiados em Castela. Apenas dois foram encontrados e tiveram uma morte horrível.

D. Pedro I mandou construir, no Mosteiro de Alcobaça, túmulos para si e para D. Inês de Castro, frente a frente, conduzindo os seus restos mortais do Convento de Santa Clara àque -

ÉXÉTEGUES DA ISABEL

Sorrateiramente aliviase numa reentrância junto à Câmara Municipal.

#hávidasnestacidade

Ou muito me engano ou já estou a circular num dos novos mini-autocarros dos SMTUC. Como disse alguém: "parece pequenino, mas é grande".

#hávidanestesmtuc

le Mosteiro, exigindo que todas as classes lhe prestassem homenagem. A transladação fezse num cortejo fúnebre que ficaria na memória das populações.

Em 2002, os CTT – Correios de Portugal lançaram uma emissão filatélica dedicada ao Património da Humanidade da UNESCO, com desenho de José Brandão e Paulo Falardo, com 8 valores. Um dos selos de 70 cêntimos, retratando o topo do túmulo de Inês de Castro, teve uma tiragem de 350 mil exemplares. A emissão filatélica dedicou selos ainda ao Mosteiro dos Jerónimos, ao Centro Histórico de Guimarães e ao Alto Douro Vinhateiro.

Alguém reclama pelo tempo de espera no Centro de Saúde. Resposta de uma utente..."agora até no particular se espera e é a pagar!".

#hávidasnestacidade

Por aqui, nos Jardins da AAC, é a música popular espanhola que se ouve. Na baixa da cidade são os turistas espanhóis que passeiam.

#hávidasnestacidade

5 de março de 2024 022
SOLTAS

Entre discussões e referendosa História do aborto em Portugal

- POR RITA SOUSA - ARQUIVO DA SECÇÃO DE JORNALISMO DA ASSOCIAÇÃO ACADÉMICA DE COIMBRA -

OArquivo da Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra (quase a prever a polémica que se instalaria nestes dias) recupera a história, registada no Jornal A CABRA, da conquista daquele que é para muitas um direito: a despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG). A partir dos anos 80, iniciaram-se sucessivos debates, na Assembleia da República (AR), sobre este assunto que fragmentava a sociedade. A primeira legislação surgiu em 1984. Nela foi estabelecida a sua descriminalização — deixou de ser um delito, constituindo, não obstante, uma contraordenação, podendo ser punível com coima ou com penas de prisão até 3 anos, para a pessoa que conscientemente abortasse e para quem realizasse o aborto, bem como penas entre 2 a 8 anos para quem forçasse outrem a abortar. Posteriormente, em 1997, foram feitas novas alterações, ao acrescentar exceções.

O 1.º referendo — “Concorda com a descriminalização da IVG, nas primeiras 10 semanas, em estabelecimentos de saúde legalmente autorizados?” —, ocorreu em 1998, com quase 69% de

abstenções e 50.9% votos contra. Por um lado, a favor, estava o BE, o PCP e o PS, bem como associações (como a Não te prives) com argumentos assentes na recomendação favorável do Parlamento Europeu pela descriminalização do aborto, e na constatação de que a criminalização induzia apenas à prática clandestina (em condições perigosas) da IVG, colocando em perigo principalmente as mulheres mais desfavorecidas. Ainda se defendeu que o direito de escolha não devia ser punido pelo Estado, com referência a algumas das razões que levam alguém a recorrer à IVG, como condições precárias e ambiente de violência. No outro lado, encontram-se a Igreja, partidos como o CDS-PP ou o PSD, e associações como a Associação de Defesa e Apoio da Vida que afirmam que a descriminalização do aborto não resolve as dificuldades apontadas. Além disso, advogam que este consiste na “destruição do embrião por razões de conveniência” e uma desvalorização da vida. Contudo, há um argumento comum entre algumas vozes: a necessidade de educação sexual e planeamento familiar.

Ao longo dos anos, discutiu-se a realização de novos referendos. Em 2004, João Mota Amaral, presidente da AR na altura, apesar das 120 mil assinaturas entregues e da clara vontade dos portugueses de terem um novo referendo, comprovada também pela sondagem da TSF e do DN, com 71% a favor dos inquiridos, remeteu a decisão para o final do mandato. Finalmente, em 2007, ganhou o “sim” e, atualmente, é possível realizar um aborto legal e seguro.

Todavia, a IVG discute-se cada vez mais, pois, presentemente, vários hospitais, devido à objeção de consciência, têm falta de médicos que realizam o procedimento e, consequentemente, não oferecem esta alternativa. Contudo, também nem sempre encaminham para onde exista, violando a lei para garantir acessibilidade. Porém, Portugal não foi o único a discutir a IVG recentemente: a França tornou-se na primeira nação a consagrar o direito da IVG na Constituição. Já o estado do Alabama considerou que os embriões congelados para tratamento de fertilidade in vitro são crianças, parando estes tratamentos. Que caminho escolherá Portugal?

OBITUÁRIO

- POR CABRA COVEIRA -

Abaixo o taxo viva o taraxo

Três antigos tachistas e um liberal fracassado entram num bar. It’s a crossover episode. Tvacas, metam os olhos nisto. A nova temporada da Casa dos Degredos Júnior promete. So you agree, o tacho existe? Eu sabia que devia ter aceitado aquele convite em 2018 para ser o 14º suplente do peloyro de ligação à cidade. Resta-me tentar o student hub. Se o John Lenine fosse vivo acabava com os bezerros políticos. Ou como o Kurt Kokaine, sem miolos.

Enfim, AD ser BElo ILogo se vê. PS: Canja laranja e arco ires sem sal.

Genocídio? Never heard of hit

A raminhas não dizia que queria ouvir o pessoal? COLEGAS!!!!! Parem com as bombas não consigo ouvir os meus COLEGAS!

Oh, Renato. Aprovamos. LEISRAEL e ORDEM na sala! Começamos pelo quimporta: Académica X Benfica. Ainda faltam 6 pontos até chegarmos às criancinhas. Elas que esperem. Temos relatórios queimados para aprovar. Podemos fazer pausa pó nite?

Têm que ser os repúblicos sem teto a puxar merdas fora da DGlândia. Quando lhes interessa. Milagres acontecem, até tivemos taxistas e comunas a votar em bloco. Nesta terra de paz, já temos um Míssel, só nos faltam outros assuntos: vão pó car*#$%.

023 5 de março de 2024
SOLTAS

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Editorial

Marias que nunca foram só três

- POR ANA FILIPA PAZ -

No ano em que se celebram 50 anos do 25 de abril, celebram-se também 50 anos do Movimento de Libertação das Mulheres (MLM), grupo feminista criado no momento que seguiu a leitura da setença de absolvição das “três Marias”, doze dias depois da Revolução. Maria Teresa da Horta, Maria Isabel Barreno e Maria Velho da Costa foram as três escritoras que deram autoria ao livro Novas Cartas Portuguesas, berço de contestação e denúncia das condições repressivas em que viviam as Mulheres em Portugal durante o Estado Novo. As duas primeiras fundaram o MLM, e trouxeram para a rua, em cartazes e manifestações carregadas de símbolos patriarcais, as vozes ensurdecidas de todas as suas companheiras. Jornalistas, poetisas, artistas, Mulheres do seu século ! Mulheres de todos os tempos, que sempre existiram, mas poucas foram vistas.

Com esta edição procurámos recuperar algumas das bandeiras que serviam este movimento: discutir igualdade de género não é um tema de agora, não é uma luta perdida e muito menos um assunto resolvido. Discutir igualdade de oportunidades, de lugar no espaço público, de reconhecimento das diferenças de cada género, não pode ser um assunto apenas de mesa de jantar. A primeira página desta edição é inspirada no cartaz do MLM, que me emocionou por isso mesmo: a figura feminina está representada como uma força que não tem género. Uma luta que diz respeito a todos. Uma luta que quer, acima de tudo, uma sociedade Igual, Livre e Segura.

Este ano os cravos que levantamos são também em homenagem a estas Mulheres. E a todas que, oprimidas, continuam a plantar as sementes da mudança.

FICHA TÉCNICA

Jornal Universitário de Coimbra - A CABRA

Depósito Legal nº478319/20

Registo ICS nº116759

Propriedade Associação Académica de Coimbra

Morada Secção de Jornalismo

Rua Padre António Vieira, 1

3000-315 Coimbra

Diretora Ana Filipa Paz

Equipa Editorial Daniela Fazendeiro & Alexandra Guimarães (Ensino Superior), Raquel Lucas & Sofia Moreira (Cultura), Larissa Britto e Fábio Torres (Desporto), Ana Cardoso & Eduardo Neves & Sofia Ramos (Ciência & Tecnologia), Clara Neto & Luísa Rodrigues (Cidade), Sofia Ramos (Fotografia)

Colaborou nesta edição Mafalda Adão, Joana Almeida, Débora Borges, Guilherme Borges, Ana Cardoso, Frederico Cardoso, Raquel Chaves, Francisca Costa, Pedro Cruz, Daniela Fazendeiro, Bruna Fontaine, Solange Francisco, Iris Jesus, Raquel Lucas, Camila Luís, Luísa Malva, Liliana Martins, Matilde Mendes, Bárbara Monteiro, Clara Neto, Eduardo Neves, Inês Reis, Jéssica Soares, Afonso de Vasconcelos, Leonor Viegas

Conselho de Redação Luís Almeida, Francisco Barata, Tomás Barros, Joana Carvalho, Carina Costa, Inês Duarte, Filipe Furtado, Leonor Garrido, Hugo Guímaro, Luísa Mendonça, Margarida Mota, Bruno Oliveira, João Diogo Pimentel, Paulo Sérgio Santos, Pedro Emauz Silva

Fotografia e Ilustração Mafalda Adão, Joana Almeida, Guilherme Borges, Frederico Cardoso, Raquel Chaves, Francisca Costa, Daniela Fazendeiro, Bruna Fontaine, Raquel Lucas, Clara Neto, Duarte Nunes, Daniel Oliveira, Sofia Ramos, Inês Reis, Luísa Rodrigues, Jay

Paginação Luís Almeida, Lunna Santana, Fábio Torres e Lucas Yamamoto

Impressão FIG - Indústrias Gráficas, S.A.

Telf.239 499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: fig@fig.pt Produção Secção de Jornalismo da Associação

Académica de Coimbra

Tiragem 2000

A primeira página da Edição Especial do Dia da Mulher é inspirada neste cartaz do Movimento de Libertação das Mulheres, criado a 7 de maio de 1974, por Maria Teresa da Horta e Maria Isabel Barreno.

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