EURP 2012 (1) Jan-Mar

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ISSN 2175-2338

www.eurp.edu.br

Volume 3 n. 4 – Out/Dez 2011


Expediente ISSN 2175-2338

Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives - EURP

Publicação oficial da EURP Escola de Ultra-Sonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto

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Professores Adilson Cunha Ferreira Fernando Marum Mauad Francisco Mauad Filho Jorge Garcia Procópio de Freitas Carlos César Montesino Nogueira Gerson Claudio Crott

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EURP Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Editor Científico Wellington de Paula Martins Editor Executivo Francisco Mauad Filho

Conselho Editorial Adilson Cunha Ferreira

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Procópio de Freitas

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João Francisco Jordão

Secretária Executiva Priscila Gauna

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SUMÁRIO EURP v. 4, n. 1, p 01-43

ISSN 2175-2338

Jan-Mar 2012

Avaliação diagnóstica da síndrome coronariana aguda

01

Diagnostic evaluation of acute coronary syndrome Ricardo Nogueira de Paiva

Insuficiência mitral

08

Mitral Insufficiency Paulo Casimirov Banof , Márcia Elisa Moro, Cláudia Moro Sandmann

Obstrução intestinal pré-natal: correlação com a avaliação pós-natal

14

Prenatal bowel obstruction: correlation with postnatal evaluation Nuno Ricardo Gonçalves Baptista Pereira, Patrícia João Moreira Horta Oliveira, Miguel Pedro da Rocha Branco, Joaquim José Rocha Costa Simões de Sá , Raquel Maria Pereira Ortins Pina, Eulália Maria Bento Galhano, José Agostinho Valentim Barros de Mesquita

Avaliação ultrassonográfica das massas anexiais

22

Ultrasound evaluation of adnexal masses Valéria Cristina Nascimento Silva, Francisco Mauad Filho

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Ultrassonografia na gestação complicada por diabetes

27

mellitus Ultrasonography in pregnancy complicated by diabetes mellitus Wilson Ayach

Avaliação ecocardiográfica do prolapso valvar mitral

32

Echocardiographic evaluation of mitral valve prolapse Gisele Oliveira Ribeiro Gomes

Ultrassonografia e o câncer da tireóide

35

Ultrasonography and thyroid cancer Antonio José Ribeiro Filho

Acompanhamento ultrassonográfico de mioma uterino durante a gestação

41

Ultrasonography follow-up of uterine leiomyoma during pregnancy Rebeca Saliba Ferreira Bortone

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Artigo de Revisão

Avaliação diagnóstica da síndrome coronariana aguda Diagnostic evaluation of acute coronary syndrome Ricardo Nogueira de Paiva 1

Na síndrome coronariana aguda a qualidade do tratamento depende diretamente da precocidade do diagnóstico, já que a extensão da lesão miocárdica é tempo dependente. A síndrome é representada pelo infarto do miocárdio com elevação do segmento ST, infarto do miocárdio sem elevação do segmento ST e angina instável. Pacientes de alto risco com diagnóstico de infarto do miocárdio são encaminhados para angiografia coronária e terapia de reperfusão. Pacientes com angina instável são encaminhados para terapia intensiva e, após se estabilizarem, vão para angiografia coronária programada. Pacientes de moderado a baixo risco, estáveis, sem alterações isquêmicas ao eletrocardiograma e sem alterações dos marcadores de lesão miocárdica, são avaliados para detecção de doença arterial coronária (DAC) através da ergometria, quando possível, ou através de métodos de imagem não invasivos como a ecocardiografia, a cintilografia miocárdica, a angiotomografia coronária e a ressonância magnética. A ecocardiografia é um método de imagem não invasivo, presente em boa parte das salas de emergência e fornece dados importantes para diagnóstico da DAC através da análise das alterações segmentares do ventrículo esquerdo. Palavras-chave: Dor no Peito; Angina Pectoris; Infarto do Miocárdio; Ecocardiografia.

Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP)

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Recebido em 07/11/2011, aceito para publicação em 07/01/2012. Correspondências para Ricardo Nogueira de Paiva. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: paivarn@yahoo.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

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Abstract Acute coronary syndrome's treatment quality depends directly on early diagnosis; since the extent of myocardial damage is time-dependent. The syndrome is represented by myocardial infarction with ST segment elevation, myocardial infarction without ST segment elevation, and unstable angina. High-risk patients with a diagnosis of myocardial infarction are referred for coronary angiography and reperfusion therapy. Patients with unstable angina are referred for intensive care and, after stabilizing, to scheduled coronary angiography. Patients with moderate to low risk, stable, without ischemic changes on electrocardiogram and no changes in markers of myocardial injury, are evaluated for detection of coronary artery disease (CAD) by exercise testing, when possible, or through non-invasive imaging methods such as echocardiography, myocardial scintigraphy, coronary angiography and magnetic resonance imaging. Echocardiography is a noninvasive imaging method, present in most emergency rooms and provides important data for diagnosis of CAD by analysis of left ventricular segmental changes Keywords: Chest Pain; Angina Pectoris; Myocardial Infarction; Echocardiography.

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Paiva - Síndrome coronariana aguda Introdução A síndrome coronariana aguda compreende o infarto do miocárdio (com supra ST e sem supra ST) e angina instável, condições clínicas graves, que necessitam de um diagnóstico precoce já que aqueles pacientes considerados de alto risco necessitam, num curto período de tempo, do restabelecimento da circulação coronariana, através ou da angioplastia primária, ou terapia fibrinolítica, ou mesmo de um tratamento clínico mais agressivo 1. Anualmente, nos Estados Unidos, mais de 6 milhões de pacientes são atendidos nas salas de emergência com quadro de dor torácica sugestivo de síndrome coronariana aguda e mais de 40% destes atendimentos geram admissão hospitalar 2; 3. Porém, grande parte destes pacientes não tem doença arterial coronariana 4; 5. Apesar de todo avanço dos recursos diagnósticos, de 2% a 8% dos pacientes são liberados de forma inadequada aumentando a morbimortalidade da doença arterial coronariana 6. Os pacientes que são atendidos nas unidades de dor torácica e salas de emergência são estratificados para alto, moderado e baixo risco para doença arterial coronariana (DAC). Para esta estratificação, o médico conta com a história clínica, exame físico, o eletrocardiograma, os marcadores bioquímicos de lesão miocárdica, a radiografia de tórax, a ergometria, a ecocardiografia, a cintilografia miocárdica, a angiotomografia de coronárias e a ressonância magnética cardíaca. A ecocardiografia é um método extremamente importante na síndrome coronariana aguda, por ser um método não invasivo, presente nas salas de emergência, baixo custo e decisivo no diagnóstico diferencial. Através da ecocardiografia avalia-se a função ventricular global, sistólica e diastólica, detecta-se de forma muito precoce as alterações de contratilidade e espessamento miocárdio decorrente da isquemia miocárdica. Quadro clínico Apesar de todo o avanço tecnológico no diagnóstico da síndrome coronariana aguda, a história clínica é de suma importância, inclusive na estratificação de risco dos pacientes. A dor torácica na síndrome coronariana aguda se manifesta mais como desconforto e está presente em 75 a 80% dos casos, e é referida como Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

aperto, peso, queimação, opressão, sufocação, dor ou pressão. Apresenta localização variada, desde retroesternal, precordial até mandibular, ombros e epigástrico com irradiação para MMSS (mais freqüente MSE). Acompanhada frequentemente com náuseas, vômitos, sudorese, dispnéia, astenia, até síncopes 7. Na abordagem, é importante definir quando iniciou exatamente o sintoma para caracterizar o tempo de evolução da provável lesão miocárdica. O local de início da dor, a duração, a irradiação, os fatores de alívio ou agravantes 7. A busca de fatores precipitantes é importante como esforço físico, estresse emocional, o uso de drogas como cocaína. A avaliação deverá ser rápida com uma história dirigida para que as medidas de emergência sejam imediatamente implementadas. Condições clínicas que significam gravidade devem ser prontamente identificadas através do exame físico, como instabilidade hemodinâmica, cianose e arritmias. Eletrocardiograma O ECG deve ser realizado dentro dos primeiros minutos do atendimento na sala de emergência e poderá ser realizado com intervalos de 15 minutos dependendo das alterações apresentadas no curso da avaliação 8. As alterações isquêmicas miocárdicas podem se apresentar de forma dinâmica ao longo do tempo, surgindo mudanças do padrão eletrocardiográfico. O ECG tem uma série de limitações, especialmente no quadro de angina instável. Alterações isquêmicas se apresentam inicialmente em 20 a 30% dos pacientes com infarto agudo do miocárdio, sendo que, 5 a 10% apresentam ECG normais 9; 10. Pacientes que apresentam ao ECG um supradesnivelamento do segmento ST em duas ou mais derivações devem ser considerados para cineangiocoronariografia e provável angioplastia primária ou tratamento trombolítico. A depressão do segmento ST está associada a um risco alto de infarto do miocárdio (IAM sem supra desnivelamento ST), maior que a inversão da onda T que também está relacionada a isquemia miocárdica. A presença de onda Q se refere a provável infarto antigo ou até mesmo recente em evolução. EURP 2012; 4(1): 01-07


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Paiva - Síndrome coronariana aguda Os pacientes podem ser alocados em quatro grupos 11: •

Grupo I: pacientes com história e quadro clínico compatível com SCA e evidência de elevação segmento ST. Grupo II: pacientes com história e quadro clínico sugestivo SCA, sem elevação do segmento ST, porém de alto risco, devido às alterações isquêmicas ao ECG, instabilidade hemodinâmica. Grupo III: pacientes que apresentam sintomas que justifiquem a avaliação, porém sem evidências objetivas de síndrome coronariana aguda, ECG inicial inalterado. Grupo IV: pacientes com evidência clínica de sintoma de dor torácica de causa não cardíaca e ECG normal.

Pacientes do grupo I devem ser considerados para imediata terapia de reperfusão (trombolítico ou angioplastia primária). Pacientes do grupo II, na ausência de contraindicações, devem receber tratamento antiplaquetário, antitrombótico e toda a medicação adjuvante do tratamento da síndrome coronariana aguda, sendo que aqueles com sintomas em curso, alterações persistentes ao ECG, ou instabilidade hemodinâmica, devem ser avaliados para angiografia coronária. Os pacientes do grupo III representam um grande número de pacientes que procuram as emergências sem alterações eletrocardiográficas, porém com sintomas que justificam o seguimento de toda propedêutica para a exclusão da isquemia miocárdica. Os pacientes do grupo IV deverão ser liberados para futura avaliação ambulatorial. Marcadores de lesão miocárdica Ainda não dispomos de um marcador de lesão miocárdica ideal para todas as situações. Diante disso, deve se utilizar ao menos dois marcadores distintos para o diagnóstico de eventos isquêmicos miocárdicos. A creatinoquinase constitui um dímero composto de subunidades (M e B). A forma MB compõe 20 a 30% do miocárdio e é usada como importante marcador para identificar os pacientes com infarto do miocárdio 12.

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As recomendações atuais indicam as troponinas como biomarcador preferencial ou padrão para o infarto do miocárdio porque tanto a troponina I quanto a troponina T não são detectadas no sangue de pessoas saudáveis. Dessa forma, recomenda-se 11: 1. Todos os pacientes com suspeita clínica de síndrome coronariana aguda devem ser mensurados os marcadores de necrose miocárdica, obtidos na admissão para a sala de emergência e repetidos pelo menos uma vez nas seis horas seguintes; 2. Devem ser dosados pelo menos dois tipos de marcadores, atualmente preferencialmente CKMB (dosada pela sua massa) e troponina (determinada pelo quantitativo imunoenzimático). Nos pacientes com dor torácica que apresentam ao ECG um supradesnivelamento do segmento ST a coleta de marcadores de necrose miocárdica é dispensável no que tange à decisão terapêutica. Diagnóstico diferencial A importância do conhecimento das várias patologias que cursam com dor torácica se reverte também da gravidade e da necessidade de um diagnóstico precoce. Podemos relacionar as seguintes patologias mais freqüentes que cursam com dor torácica 7: • Pericardites, valvopatias, cardiomiopatia hipertrófica. • Aneurisma dissecante de aorta. • Tromboembolismo pulmonar, pneumotórax, pneumonias, pleurites. • Gastrointestinais: gastrites, úlcera péptica, refluxo gastroesofágico, espasmo de esôfago, pancreatite. • Músculo-esqueléticas: costocondrite, fratura de arcos costais, herpes zooster. • Transtornos psiquiátricos: depressão, síndrome do pânico, ansiedade. A ecocardiografia detecta de forma conclusiva a presença de derrame pericárdico, as alterações valvares (adquiridas e congênitas), as hipertrofias ventriculares, condições freqüentes no diagnóstico diferencial. A avaliação das doenças da aorta, que podem se associar a outras condições (insuficiência aórtica, disfunção ventricular esquerda, derrame pericárdico) inicialmente é feita com a ecocardiograEURP 2012; 4(1): 01-07


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Paiva - Síndrome coronariana aguda fia transtorácica e completada com o recurso transesofágico que fornece imagens de alta definição possibilitando uma avaliação abrangente da aorta torácica. A identificação de sobrecarga de câmaras direitas e sinais de hipertensão arterial pulmonar pela ecocardiografia faz deste método um aliado no diagnóstico do tromboembolismo pulmonar. Radiografia de tórax Exame rápido de custo baixo de grande importância na análise das complicações na evolução da síndrome coronariana aguda como a congestão pulmonar e sinais indiretos de possíveis valvopatias. Importante no diagnóstico diferencial como o aneurisma de aorta, embolia pulmonar, pneumotórax, pneumonia, derrame pleural, fratura de arcos costais 1. Teste ergométrico É um método amplamente disponível, de baixo custo e que tem por objetivo submeter o paciente a estresse físico programado, identificando alterações isquêmicas pela análise do segmento ST 13. O método é contra-indicado em pacientes com limitações físicas (ortopédicas, insuficiência vascular periférica e déficits neurológicos), aqueles que fizeram uso de medicações que prejudiquem sua eficácia, como betabloqueadores, digoxina e também pacientes com alterações eletrocardiográficas que impossibilitem a análise de isquemia miocárdica como bloqueio de ramo esquerdo, sobrecarga ventricular esquerda. Indicado em pacientes com baixo e risco intermediário, além da análise de isquemia miocárdica, avalia também o grau de capacidade física, onde os pacientes que atingem mais de 10 mets no esforço têm uma baixa probabilidade para DAC 14. Embora a sensibilidade do teste ergométrico para detecção de DAC seja menor que os métodos de imagem, ele apresenta um custo benefício considerável. Estudos realizados em 317 pacientes após 12 horas de observação, sem alterações eletrocardiográficas e dos marcadores de lesão miocárdicas, o valor preditivo negativo foi de 98% com uma economia de 567 dólares por paciente em comparação com aqueles internados para tratamento habitual 15.

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Ecocardiografia Na síndrome coronariana aguda a alteração segmentar pode ser detectada muito precocemente pela ecocardiografia. É importante assinalar a precocidade com que se sucedem as alterações da contratilidade e espessamento miocárdio, como resposta à isquemia. A partir da isquemia miocárdica, existe uma cascata de eventos, onde a disfunção diastólica e alterações segmentares de contração são precoces e antecedem, inclusive, as alterações clínicas e eletrocardiográficas. A conseqüência imediata da isquemia miocárdica é uma diminuição ou abolição da contração miocárdica avaliada na ecocardiografia pelo grau de espessamento sistólico. A ausência de espessamento é denominada acinesia e sua diminuição, hipocinesia. Discinesia é o movimento do segmento comprometido em sentido expansivo durante a sístole, habitualmente acompanhado de adelgaçamento sistólico. Para o estudo da arquitetura miocárdica, o ecocardiograma é o melhor método: o músculo normal terá um aspecto ecogênico normal, com contratilidade e espessamento normais. O aspecto do endocárdio e sua trabeculação também são normais. Se existe fibrose, o território enfermo se encontrará adelgaçado, com ecogenicidade aumentada, perda da trabeculação, acinesia e falta de espessamento. Nos casos de hibernação e músculo atordoado, existirão alterações de contratilidade e espessamento, porém não haverá ecogenicidade aumentada e a espessura da parede ventricular estará conservada. A análise segmentar do coração deve ser sistemática e a mais completa possível. Todas as janelas disponíveis e planos tomográficos devem ser empregados para conseguir uma visão completa de todos os segmentos do ventrículo esquerdo. A evolução tecnológica, ao incorporar a melhoria das imagens com harmônicas no doppler tecidual e suas variáveis: tissue tracking (TT), strain rate (SR), strain miocárdio (SM) e emprego de agentes de contraste ultrassônicos tem produzido um notável avanço na qualidade dos estudos ecocardiográficos, melhorando sua sensibilidade e especificidade e valor preditivo 16. A principal aplicação clínica do strain rate (SR) é a doença arterial coronária e suas técnicas representam um importante índice de contratilidade segmentar, e vão desempenhar função decisiva na ecocardioEURP 2012; 4(1): 01-07


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Paiva - Síndrome coronariana aguda grafia, não só na quantificação da função sistólica regional, mas também na disfunção diastólica e detecção de miocárdio viável 17. A avaliação da contratilidade miocárdica pode ser feita das duas maneiras: sob a forma de uma medida (strain rate - SR) ou de uma percentagem (strain - SM). No território alterado pela oclusão de uma artéria coronária, pode-se encontrar: necrose, infarto transmural, infarto não transmural, músculo atordoado, músculo hibernado, músculo protegido por colaterais. As novas aplicações de SR e SM, em conjunto com estudo da resposta a doses baixas de dobutamina, permitem em muitos casos discriminar qual é a situação anatomofisiológica predominante. A ecocardiografia sob estresse pela dobutamina – atropina é um método para avaliação não invasiva de pacientes com doença arterial coronariana (DAC) suspeita ou conhecida. Novos avanços tecnológicos como Doppler tecidual, a imagem em segunda harmônica e o uso de agentes de contraste, juntamente com o desenvolvimento de imagem digital tem tornado a ecocardiografia sob estresse em um método de alta reprodutibilidade para avaliação da DAC. Kontos et al., em 141 pacientes com diagnóstico de infarto do miocárdio no serviço de emergência, realizaram estudos de perfusão miocárdica com medicina nuclear (tecnésio – 99m) e de contratilidade com a ecocardiografia bidimensional. A sensibilidade para diagnóstico de infarto do miocárdio foi de 91% para a ecocardiografia e de 89% para a cintilografia. A função sistólica ventricular esquerda se correlacionou muito bem com ambos os métodos. Quando o estudo ecocardiográfico é realizado durante o episódio de dor precordial, a ausência de alterações contrácteis é evidência de que não existe isquemia miocárdica 7. A American College of Cardiology, a American Heart Association e a American Society of Echocardiography recomendam o emprego da ecocardiografia em pacientes com dor torácica nas seguintes circunstâncias: 1. Diagnóstico da doença cardíaca de base, em pacientes com dor torácica e evidência clínica de doenças valvares, pericárdicas e miocárdicas. 2. Avaliação da dor torácica em pacientes com suspeita de isquemia miocárdica aguda,

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quando o ECG basal e outros marcadores de laboratório não são diagnósticos. 3. Avaliação de dor torácica em pacientes com suspeita de dissecção aórtica. 4. Avaliação de pacientes com dor precordial e instabilidade hemodinâmica, que não respondem às medidas terapêuticas simples. Cintilografia de perfusão miocárdica/SPECT As anormalidades de perfusão regional sugerem evento isquêmico miocárdico e surgem mais precocemente quando comparados a alterações de contratilidade segmentar. Perfusão normal está associada a baixo risco clínico de DAC, diminuindo o tempo de observação e as internações na sala de emergência 18. O defeito de perfusão indica isquemia aguda, infarto agudo ou infarto antigo, requerendo avaliação com os biomarcadores cardíacos. O emprego da cintilografia miocárdica é limitado pelo custo elevado, pela demora na sua realização e baixa disponibilidade na sala de emergência. Angiotomografia de coronárias- CTA Diferente de outras técnicas de imagem, a CTA fornece a imagem da anatomia coronária e isto tornou-se viável com o advento da TC Multislice. Apresenta uma especificidade alta e valor preditivo negativo muito alto para a exclusão de DAC, embora o valor preditivo positivo não tem sido tão alto 19. Poucos estudos existem de análise da CTA em pacientes de baixo risco na sala de emergência. Em estudo recente 368 pacientes com dor torácica aguda foram submetidos a CTA e 31 (8%) apresentavam síndrome coronariana aguda 20. A sensibilidade e o valor preditivo negativo da CTA para síndrome coronariana aguda foram 100% para ausência de DAC e 77% e 98%, respectivamente, para estenose coronária significativa 21. O método não deve ser empregado em pacientes com arritmias, com insuficiência renal, pacientes que tem contra indicações ao uso de betabloqueador, e alérgicos ao contraste. Recentemente, novas gerações de tomógrafos obtêm-se o recurso de imagens que englobam a avaliação das coronárias, aorta e artérias pulmonares, importante para diagnóstico de dissecção aórtica e embolia pulmonar 22.

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Paiva - Síndrome coronariana aguda Maiores estudos são necessários para validação do uso do método em larga escala, limitado pelo alto custo e a necessidade de profissionais habilitados. Ressonância magnética cardíaca-RMC O método tem uma qualidade de imagem superior à maioria dos outros métodos de imagem não invasivos, permitindo avaliação de perfusão, função e anormalidades valvulares durante uma sessão única de imagem, porém quanto às artérias coronárias é inferior à angiotomografia. (CTA) 23. Em estudo prospectivo de 161 pacientes, a RMC apresentou sensibilidade e especificidade para identificação de síndrome coronariana aguda em 84% e 85%, respectivamente. Utilizando RMC de estresse para a avaliação, outro estudo encontrou uma sensibilidade e especificidade para identificação de DAC de 96% e 83% respectivamente 24. As limitações desta técnica são, principalmente, o custo alto, a disponibilidade dos equipamentos e o elevado nível de especialização exigido de técnicos e médicos na interpretação do método. Considerações finais O atendimento nas unidades de dor torácica ou salas de emergências aos pacientes com suspeita clínica de síndrome coronariana aguda deve ser feito de forma rápida, eficiente e integrada, seguindo protocolos bem estruturados para um diagnóstico preciso, gerando menores custos com baixa margem de erros. Na avaliação inicial, baseado na história clínica, exame físico, eletrocardiografia e análise dos marcadores de lesão miocárdica, os pacientes são estratificados em alto, moderado e baixo risco para DAC. No grupo de pacientes de alto risco com diagnóstico de infarto agudo do miocárdio são encaminhados para angiografia coronária e terapia de reperfusão. Neste grupo ainda os pacientes com angina instável são encaminhados para unidade de terapia intensiva e se estabilizados são encaminhados para angiografia coronária programada. No grupo de pacientes de moderado e baixo risco, se, na evolução encontram-se estáveis são encaminhados para propedêutica na busca da presença da DAC, através de métodos disponíveis na instituição e de acordo com cada caso, como ergometria, ecocardiografia, cintilografia Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

miocárdica, angiotomografia coronária e ressonância magnética cardíaca. A ecocardiografia em foco é um método bastante interessante, presente em grande número de instituições, relativamente de baixo custo, fornecendo dados objetivos e conclusivos da presença da isquemia e necrose miocárdica, através das alterações segmentares. Avaliando a função sistólica e diastólica, e as complicações imediatas dos eventos agudos, bem como no diagnóstico diferencial das doenças envolvidas na dor torácica. Referências

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Artigo de Revisão

Insuficiência mitral Mitral Insufficiency Paulo Casimirov Banof 1 , Márcia Elisa Moro2, Cláudia Moro Sandmann3

O estudo clínico e fisiopatológico das enfermidades que comprometem o funcionamento mecânico da válvula mitral é complementada com estudo de imagem através do ecocardiograma transtorácico. Mesmo apresentando limitações na quantificação da gravidade nas modalidades da insuficiência mitral, estenose e análise das próteses nesta posição, fator essencial na tomada de decisões clínicas a respeito de intervenção cirúrgica ou procedimento percutâneo. Objetivo deste trabalho é revisar a literatura a respeito da avaliação ecocardiográfica bidimensional da insuficiência mitral. Palavras-chave: Insuficiência da Valva Mitral; Coração; Ecocardiografia.

Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2 Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) 3 Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE - MARECHAL CANDIDO RONDON) 1

Recebido em 07/11/2011, aceito para publicação em 10/01/2012. Correspondências para Paulo Casimirov Banof. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: paulobanof@hotmail.com Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

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Abstract The study of clinical and pathophysiologic disorders that compromise the mechanical mitral valve is complemented with imaging study using transthoracic echocardiography. Despite presenting limitations in quantifying the severity in terms of mitral stenosis, and analysis of the prosthesis in this position, an essential factor in making clinical decisions about surgical intervention or percutaneous procedure. The purpose of this paper is to review the literature on the two-dimensional echocardiographic evaluation of mitral regurgitation. Keywords: Mitral Valve Insufficiency; Echocardiography; Heart.

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Banof et al. - Insuficiência mitral Introdução O ecocardiograma é a modalidade de escolha para a investigação, diagnóstico e o acompanhamento da insuficiência mitral, da função cardíaca global. Tem papel primordial no diagnóstico da insuficiência mitral e determinar sua etiologia com seu possível tratamento, bem como quantificar o grau de insuficiência 1. É de extrema importância determinar através de um exame de imagem o mais cedo possível alterações que levam ao comprometimento do funcionamento valvar mitral, seja em crianças, adulto jovem ou idosos 1. Apesar de todos esforços em criar um instrumento biológico ou mecânico que pudesse substituir a valva mitral nativa, nos deparamos com obstáculos ainda não solucionados, como a deterioração da valva biológica por calcificação e a rotura nas próteses biológicas e o tromboembolismo nas valvas mecânicas 1. O presente estudo visa revisar as técnicas ecocardiográficas que possam contribuir para detecção dos pacientes portadores de regurgitação valvar mitral. Anatomia O aparelho da valva mitral envolve a cúspide anterior da valva mitral; átrio esquerdo; cúspides comissurais da valva mitral; nódulos fibrosos (de Albini); cúspide posterior da valva mitral, face ventricular músculo papilar anterior (seccionado); músculo papilar posterior; músculo papilar ante-

rior (seccionado). As alterações presentes em qualquer dessas estruturas e na geometria ventricular, na dinâmica de contração das fibras miocárdicas levam ao comprometimento do correto funcionamento da estruturas da válvula mitral no qual ocorre à má coaptação dos folhetos mitrais 1. Etiologia A insuficiência mitral é a segunda causa mais freqüente de valvulopatias, ficando atrás apenas da estenose aórtica 1. A insuficiência mitral é classificada de acordo com sua etiologia em primária ou orgânica, no qual a disfunção do aparato valvar é a causa primária da insuficiência mitral, como exemplo a calcificação e retração das cúspides, rotura das cordoalhas tendíneas, alterações na elasticidade da válvula, fusão das comissuras. Entre as principais etiologias orgânicas destacamse a valvulopatia reumática e a degeneração mixomatosa associada ao Prolápso da válvula mitral (PVM) univalvular ou bivalvular. Causas secundárias ou funcionais, onde o aparato valvar é estruturalmente normal, porém alterações a nível do anel mitral e da geometria do ventrículo esquerdo como na miocardiopatia dilatada culminam na disfunção da valva. A isquemia da parede miocárdica ou dos músculos papilares, diretamente ocasionam insuficiência mitral. A tabela 1 resume os principais mecanismos com seus respectivos diagnósticos 2.

Tabela 1. Causas de Insuficiência Mitral. Adaptado Solomon et al., 2007 3. Tipo de insuficiência

Mecanismo

Diagnóstico

Aguda

Estrutural

Cordas tendíneas rotas

Infecciosa

Endocardite bacteriana

Crônica

Degenerativa/estrutural

Disfunção e/ou ruptura de músculo papilar isquêmico Degeneração mixomatosa dos folhetos (Prolápso valva Mitral)

Disfunção de músculo papilar e/ou ruptura com folheto frouxo Vazamento paravalvar após substituição por valva protética Calcificação anular mitral

Isquêmica e funcional Infecciosa

Inflamatória

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Transtornos do colágeno (Sd.Marfan e Ehlers-Danlos)

Cardiomiopatia dilatada com dilatação do anel mitral e amarra-

ção apical

Endocardite bacteriana (em valvas cardíacas normais e protéticas)

Transtornos do tecido conjuntivo, como, por exemplo, lúpus eri-

tematoso sistêmico, esclerodermia.

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Banof et al. - Insuficiência mitral

Outras causas destacam-se doença cardíaca reumática, endocardite infecciosa, e causas menos comuns incluem o trauma, síndrome hipereosinofílica, uso de algumas drogas, síndrome carcinóide, as doenças vasculares do colágeno 1. Durante a diástole, os folhetos mixomatosos podem ser medidos. Folhetos espessados com mais de 5mm sustentam o diagnóstico de prolápso válvula mitral clássico. Prolápso bivalvular é facilmente visualizado no corte apical quatro câmaras. Entretanto, o perfil da valva mitral é normalmente exagerado nesta vista – e pode levar ao excesso de diagnóstico de prolápso de valva mitral. Regurgitação mitral grave estava presente 1. Regurgitação mitral em cardiomiopatia isquêmica. Isto resulta em amarração (“formação de tenda”) dos folhetos da valva mitral durante a sístole ventricular, coaptação prejudicada dos folhetos e regurgitação mitral . “Formação de tenda” descreve o fechamento da valva mitral dentro da cavidade ventricular em vez de ao nível do plano do anel mitral. A morfologia dos folhetos da valva é normal, mas a dilatação ventricular leva ao desvio lateral dos músculos papilares. Isto causa má coaptação dos folhetos, que tipicamente é simétrica, e o jato de regurgitação mitral isquêmica é dirigido centralmente. Na cardiomiopatia isquêmica dilatada, os três principais contribuintes impedem a coaptação normal dos folhetos e regurgitação mitral funcional. Os folhetos da mitral são morfológicamente normais.

Na face atrial próximo ao orifício regurgitante da valva mitral observamos a aceleração do fluxo proximal juntamente a uma área de superfície de isovelocidade proximal (PISA), no qual é multiplicada pela velocidade do aliasing e de forma quantitativa nos fornece o volume regurgitante. Já o ponto de maior estreitamento do jato regurgitante é chamado de vena contracta, no qual inicia logo após o jato regurgitante e o seu diâmetro reflete a área do orifício regurgitante 4. O fluxo de sangue regurgitante (jato de alta velocidade) proveniente do ventrículo esquerdo à medida que entra no átrio esquerdo, perde a característica de fluxo laminar e torna-se turbulento, originando múltiplas velocidades e direções. Fatores fisiológicos, anatômicos e técnicos podem fazer com que o tamanho do jato regurgitante torne-se pouco útil na quantificação da gravidade da insuficiência mitral (Tabela 2). “A complacência, o tamanho do átrio esquerdo e a força motriz produzida pela válvula mitral sobre o fluxo de sangue através da válvula mitral insuficiente, afetam a direção e a forma do jato regurgitante” 4.

Fisiopatologia A dinâmica dos fluidos de uma valva estenótica é muito semelhante à dinâmica dos fluídos de uma valva insuficiente, no qual pode apresentar: “Fluxo turbulento a jusante; Área de convergência do fluxo proximal; Jato regurgitante de alta velocidade; Aumento do volume de fluxo anterógrado; Área do orifício regurgitante” 4. O orifício regurgitante nada mais é que um jato laminar de alta velocidade e a equação de Bernoulli simplificada: ∆P = 4v², determina a velocidade instantânea desse jato(v) relacionada com a diferença de pressão instantânea (∆P). O registro desse jato de alta velocidade com o Doppler contínuo permite avaliar ao longo do tempo a diferença de pressão entre o ventrículo esquerdo e o átrio esquerdo 4.

Influência da parede

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Tabela 2. Fatores que afetam tamanho e formato do jato regurgitante. Adaptado de Otto et al., 20044. Fisiológicos

Volume regurgitante Pressão motriz

Tamanho e formato do orifício regurgitante

Restrição da câmara receptora Tempo relativo ao ciclo cardíaco

Influência de jatos ou correntes de fluxo coexistentes Técnicos

Ganho do ultra-som

Frequência de repetição de pulsos Frequência do transdutor Frame rate

Plano de imagem Profundidade

Força do sinal Jatos regurgitantes excêntricos se caracterizam por margear a parede atrial esquerda, e exibir EURP 2012; 4(1): 08-13


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Banof et al. - Insuficiência mitral uma área de jato menor ao mapeamento de fluxo em cores bidimensional, e um volume menor no tridimensional, devido à soma do volume adjacente em apenas um lado do jato regurgitante. Ao contrário do que acontece com os jatos centrais em que a soma do volume adjacente ocorre em ambos lados do jato. O jato regurgitante pode ser direcionado às paredes adjacentes se este apresenta concomitante a presença do jato regurgitante aórtico 4. Quadro Clínico A insuficiência mitral impõe ao ventrículo esquerdo uma sobrecarga de volume, o que leva ao aumento das pressões no interior do átrio esquerdo e capilar pulmonar, causando sintomas mais comuns como dispnéia e fadiga. Quando a insuficiência mitral se impõe de forma crônica no qual o átrio esquerdo pode adaptar-se ao volume regurgitante tornando-se complacente, pode ser assintomática por longos períodos, mesmo na presença de grande dilatação do ventrículo esquerdo e também da disfunção do mesmo. Ao contrário, a instalação aguda na maioria das vezes é sintomática devido a não complacência da cavidade atrial esquerda em relação ao grande volume regurgitante do ventrículo esquerdo, em geral manifestando-se com edema agudo de pulmões 5.

A dilatação atrial esquerda acompanha de alterações elétricas e anatômicas na qual propiciam o aparecimento da Fibrilação atrial elevando o risco de fenômenos tromboembólicos sistêmicos. Sintomas como dor torácica atípica e palpitações são freqüentes. Em estágios avançados evolui para sintomas de insuficiência cardíaca direita, com edema de membros inferiores, ascite e também associação com hipertensão pulmonar 5. Diagnóstico O ecocardiograma com Doppler o exame fundamental para avaliação da gravidade da disfunção valvar e identificação da etiologia (Tabela 3). A insuficiência valvar pode ser observada através do mapeamento de fluxo em cores, ou mapeamento de fluxo pelo Doppler contínuo. As evidências detectadas através da ecocardiografia 2 D são apenas indiretas na determinação acerca da anatomia valvar, da dilatação e a função da câmara. Evidências de uma valva mitral anatomicamente anormal acompanhada de dilatação de câmaras esquerdas, sugerem insuficiência mitral, porém é necessário o mapeamento Doppler para confirmar ou excluir o diagnóstico.

Tabela 3. Parâmetros ecográficos quantitativos para classificação da gravidade da insuficiência mitral (IM). Adaptado de Nicolau, et al. 2010 5. Gravidade Leve

Moderada Grave

Grau Angiográfico

Fração regurgitante(%)

EROA (mm²)

Largura da Vena Contracta*(cm)

1

< 30

< 20

< 0,3

2e3 4

30 – 50 >50

20 – 40 >40

0,3 - 0,5 > 0,5

EROA: sigla em inglês para área do orifício regurgitante efetivo. *Largura máxima, medida de múltiplos ângulos, da porção mais estreita do jato regurgitante.

O mapeamento através do Doppler detecta a insuficiência através da turbulência do fluxo a jusante ao orifício regurgitante. Seguindo a técnica adequada e os parâmetros do instrumento estão adequadamente corrigidos a sensibilidade e a especificidade encontra-se entre 90 e 99% respectivamente. Tanto que se detecta uma insuficiência que não é percebida pela ausculta cardíaca e se confirma com angiografia num segundo momento na maioria dos casos 3. O Doppler contínuo analisa através do orifício regurgitante o jato de Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

alta velocidade, através da largura do feixe melhor visualizado através da abordagem apical quatro câmaras. A insuficiência mitral encontrada em indivíduos normais, chamado de fisiológico, é detectada em uma grande porcentagem de exames. Caracteriza-se por ser espacialmente restrita a área imediatamente ao fechamento da valva, de curta duração e pequeno volume regurgitante. Esse pequeno grau de insuficiência é normal é sem repercussão clínica. EURP 2012; 4(1): 08-13


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Banof et al. - Insuficiência mitral Medidas semiquantitativas são utilizadas para classificar a insuficiência mitral como discreta, moderada e importante usando a área do jato em cores, largura da vena contracta, PHT, fluxo reverso distal. Medidas quantitativas como volume regurgitante, fração regurgitante e área do orifício regurgitante. O volume regurgitante é o volume de fluxo retrógrado através da valva, no qual pode ser estimado através do método de PISA, do fluxo volumétrico através de uma valva insuficiente e uma valva competente, do volume de ejeção total do VE calculado pelo modo bidimensional menos o volume ejetado anterógrado calculado pelo Doppler 1. A fração regurgitante (FR) é FR= VR/VOL total A área do orifício regurgitante (AOR) é calculada, utilizando a equação da continuidade, através do volume regurgitante e da integral tempo velocidade do jato regurgitante (ITVJR). VR = AOR X ITVJR AOR = VR/ITVJR VR em cm³, ITV JR em cm e AOR em cm² A vena contracta nada mais é do que o diâmetro do orifício da insuficiência refletido no diâmetro mais estreito da corrente do fluxo, com vantagens de não sofrer alterações provenientes do fluxo e da pressão direcional e tão pouco é afetada pelos parâmetros do aparelho 1. Para se obter a melhor resolução espacial devemos utilizar um corte em uma profundidade mínima, setor estreito, em modo zoom e perpendicular à largura do jato. A ao vena contracta na regurgitação mitral é fácil e rápido de se estimar nas janelas-padrão, avalia o tamanho do defeito, bom estimativa de regurgitação branda e grave, não é influenciada pela presença de regurgitação aórtica 1. A convergência de fluxo proximal é demonstrada pela dinâmica dos fluídos dentro de um espaço que convergem para uma saída estreita ou orifício em áreas de isovelocidade aproximadamente concêntricas. À medida área de superfície de isovelocidade proximal revela que o fluxo regurgitante converge para o orifício regurgitante mitral, a área de convergência proximal, o tamanho e a velocidade da área ou hemisfério mais Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

interno podem ser medidos (SCOTT; SOLOMON, 2008, p. 270). O método da área de superfície de isovelocidade proximal mostra os fluídos dentro de um espaço limitado aceleram-se na direção de uma saída ou orifício em isovelocidades constantes. Ecocardiografia A ecocardiografia através do mapeamento de fluxo em cores da área do jato, e avaliar a gravidade da regurgitação no interior da câmara receptora. Pelo menos dois cortes devem ser utilizados para avaliar o tamanho do jato de fluxo turbulento, no qual proporciona um índice qualitativo da gravidade classificado em uma escala: 1) regurgitação discreta; 2) regurgitação moderada; 3) regurgitação moderada a grave. O jato da regurgitação mitral pode ser visto pela janela apical de quatro câmaras. O Doppler a cores permite visualização espacial do fluxo sanguíneo dentro do coração, exibindo as velocidades do fluxo sanguíneo em termos de faixas de cor. Rotina do exame ecográfico Após a preparação do equipamento e do paciente, iniciamos o exame abordando a janela paraesternal esquerda a partir desta, é obtido o corte paraesternal de eixo longo. O exame segue para a posição apical, no qual se avalia através do Doppler de fluxo em cores da valva mitral em relação a regurgitação, seguido Doppler pulsado para as veias pulmonares comumente para a veia pulmonar superior direita 3. O fluxo de entrada no ventrículo esquerdo corresponde ao fluxo mitral, no qual através do Doppler pulsado ao nível das extremidades das vávulas da mitral é usado para determinar a integral tempo/velocidade. Seguido Doppler contínuo através da válvula mitral. Na projeção apical de duas câmaras, com Doppler de fluxo é avaliada a regurgitação mitral. Considerações finais A cardiologia faz uso da ecocardiografia como uma das principais ferramentas para avaliação não invasiva do sistema cardiovascular, e um dos mais importantes exames complementares de apoio à clínica cardiológica. Acompanhando a evolução e das novas descobertas disponibilizadas pela tecnologia, tornou-se um método indispensável para avaliação da fisiologia e anatomia cardíacas. EURP 2012; 4(1): 08-13


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Banof et al. - Insuficiência mitral Ao lado dos sinais vitais, o exame clínico, a radiografia tórax, o eletrocardiograma, a ecocardiografia pelas suas característica de baixo custo, ausência de efeitos colaterais, portabilidade, tornaram o exame complementar de imagem ecocardiográfica insubstituível, tanto no ambulatório ao lado do leito, quanto na emergência. Capacidade de guiar decisões, disponibilizar resultados em tempo real, custo-benefício, assegurarão que a ecocardiografia permanecerá como primeira escolha na modalidade de imagem cardiovascular.

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Referências

1. OTTO CM, BONOW RO. Braunwald - Tratado de Doenças Cardiovasculares: Elsevier; 2009. 2. PEDROTTI CHS, SAMPAIO RO. Condutas práticas em cardiologia: Insuficiência mitral. In: Manole, ed. São Paulo; 2010:226. 3. SOLOMON SD. Ecocardiografia manual prático. Rio de Janeiro; 2010. 4. OTTO CM. Fundamentos de ecocardiografia clínica. 3 ed: Elsevier; 2004. 5. NICOLAU JC. Condutas práticas em cardiologia. 1 ed. São Paulo: Manole; 2010.

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Artigo Original

Obstrução intestinal pré-natal: correlação com a avaliação pós-natal Prenatal bowel obstruction: correlation with postnatal evaluation Nuno Ricardo Gonçalves Baptista Pereira1, Patrícia João Moreira Horta Oliveira2, Miguel Pedro da Rocha Branco1, Joaquim José Rocha Costa Simões de Sá3 , Raquel Maria Pereira Ortins Pina4, Eulália Maria Bento Galhano1, José Agostinho Valentim Barros de Mesquita1 O principal objetivo deste estudo é caracterizar os achados distintivos do diagnóstico sonográfico da obstrução intestinal fetal e estabelecer a sua correlação com os achados em pós-natal e resultados neonatais. Métodos: Estudo retrospectivo com análise dos 13 casos consecutivos com diagnóstico pré-natal de obstrução intestinal fetal, referenciados ao Centro de Diagnóstico Pré-Natal, entre Janeiro de 2004 e Julho de 2011. Avaliaram-se os achados na ultrasonografia pré-natal e analisou-se a sua correlação com os achados em pós-natal. A análise estatística foi efetuada com o Statistical Package for the Social Sciences 16.0. Resultados: Os achados ultrassonográficos sugestivos de processo obstrutivo mais frequentes foram: alças dilatadas (11; 84,6%), líquido amniótico aumentado (5; 38,5%), imagem eco negativa em forma de ferradura/“U” (2; 15,4%) e sinal de “dupla bolha” (1; 7,7%). Em 4 (30,8%) casos surgiram sinais sugestivos de peritonite meconial. A atresia intestinal representou a principal etiologia de obstrução. Em 10 casos resultou um nascido-vivo. Todos os recém-nascidos necessitaram de cirurgia. Em 3 casos o casal solicitou interrupção médica da gestação. Conclusões: Este estudo reforça a importância do diagnóstico pré-natal de obstrução intestinal permitindo a pesquisa da etiologia subjacente bem como das possíveis condições associadas melhorando o aconselhamento do casal e possibilitando o encaminhamento para centro de cuidados terciário com planejamento do nascimento. Palavras-chave: Obstrução intestinal; Feto; Diagnóstico pré-natal: Ultrassonografia. 1Maternidade

Bissaya-Barreto, Coimbra, Portugal. de Cirurgia Pediátrica e Queimados Dr. Matos Coimbra – Hospital Pediátrico Carmona da Mota, Coimbra, Portugal. 3Serviço de Genética Médica – Centro Hospitalar de Coimbra, Portugal. 4Serviço de Anatomia Patológica – Centro Hospitalar de Coimbra, Portugal. 2Serviço

Recebido em 29/11/2012, aceito para publicação em 16/01/2012. Correspondências para Nuno Ricardo Gonçalves Baptista Pereira. Avenida Dr. Armando Gonçalves, 15, apto. 207 CEP 3000-059 – Coimbra, Portugal E-mail: nunobaptistapereira@gmail.com ou nunobaptistapereira@hotmail.com

Abstract This study main goal was to characterize ultrasound findings in fetus with bowel obstruction and it’s correlation with postnatal evaluation and neonatal outcomes. Methods: Retrospective analysis of 13 consecutive cases with prenatal diagnosis of fetal bowel obstruction, referred to the Prenatal Diagnosis Center, in the period of January 2004 to July 2011. We correlated the prenatal ultrasound findings with the postnatal evaluation. Statistical analysis was performed using Statistical Package for the Social Sciences 16.0. Results: The most frequent ultrasound findings suggestive of bowel obstruction were: dilated bowel loops (11; 84,6%), increased amniotic fluid (5, 38,5%), horse-shoe/ “U” shaped anechoic structure (2; 15,4%) and “double bubble” sign (1; 7,7%). In 4 (30,8%) cases there were signs suggestive of meconium peritonitis. Intestinal atresia was the main cause of obstruction. In 10 cases a child was born. Surgery was required in all these cases. In 3 cases the couple chose for termination of pregnancy. Conclusions: This study strengthens the importance of prenatal diagnosis of bowel obstruction allowing diagnostic workup and detection of associated conditions improving counselling and making feasible for a planned delivery in a tertiary referral center. Keywords: Bowel obstruction; Fetus; Prenatal diagnosis; Ultrasonography.

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Pereira et al. - Obstrução intestinal pré-natal Introdução Os primeiros detalhes do desenvolvimento gastrointestinal podem ser identificados através da ultra-sonografia a partir da sétima semana de gestação (1). Desta forma a avaliação do trato gastrointestinal e diagnóstico de anomalias do seu desenvolvimento é possível desde fases precoces da gestação. A obstrução intestinal pode ocorrer em diversas localizações e, na sua gênese, podemos encontrar lesões intrínsecas ou extrínsecas. As lesões intrínsecas dividem-se em atresia ou estenose 2. A obstrução duodenal ocorre em 1:2500-10000 partos e é responsável por parte dos casos de obstrução do trato intestinal 3. Vinte a 30% dos casos de obstrução a este nível devem-se à presença de pâncreas anular ou mal rotação do intestino delgado enquanto que os restantes casos têm subjacente a presença de bandas fibrosas e a atresia duodenal 4. A atresia duodenal resulta da falha na vacuolização do lúmen duodenal, na 11ª semana de gestação, conduzindo a estenose ou atresia. Tem uma incidência de 1:5000 nascimentos e tem ocorrência habitualmente esporádica, tendo sido descritos casos com transmissão autossômica recessiva. Numa série de 503 casos foram identificados 13 casos com irmãos afetados 5. Em 50% dos casos existem anomalias associadas incluindo trissomia 21 em cerca de 40% destes 2, 6. A obstrução a nível do intestino delgado ou do intestino grosso tem uma incidência de 1:2000 nascimentos. Em metade dos casos ocorre obstrução do intestino delgado e nos restantes 50% existe atresia anorretal. São condições habitualmente de ocorrência esporádica, no entanto encontramse casos familiares descritos em situações isoladas ou de atresia intestinal múltipla. É rara a associação com outras anomalias ou aneuploidias uma vez que a gênese da atresia intestinal tem por base fenômenos de isquemia 2, 6, 7. Os locais mais frequentes de obstrução do intestino delgado são: 36% no ileo distal, 31% no jejuno proximal, 20% no jejuno distal e 13% no ileo proximal 4. Em 510% dos casos as obstruções são múltiplas 2, 6, 8. A este nível anatômico, entre as causas extrínsecas encontramos: bridas peritoneais, mal rotação com volvo, ileo meconial (devido a fibrose cística em mais de 90% das situações) 9 e doença de Hirschprung (agangliose). No diagnóstico diferencial devem considerar-se: anomalias do trato renal, Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

quistos mesentéricos, quistos de duplicação e quistos do ovário 2, 6. A atresia anorretal resulta da divisão anormal da cloaca na 9ª semana de gestação, e o seu diagnóstico pré-natal (DPN) é difícil 2, 4. Em alguns casos de obstrução intestinal ocorre perfuração intestinal intra-uterina, originando uma peritonite química denominada peritonite meconial. Esta entidade tem uma incidência de 1:3000 nascimentos. A maioria (65%) dos casos ocorre associado a estenose ou atresia intestinal e ileo meconial, contudo também pode ocorrer em consequência de volvo intestinal ou divertículo de Meckel 2, 6. A doença de Hirschprung tem incidência de 1:3000 nascimentos e caracteriza-se pela ausência de gânglios do sistema nervoso parassimpático na parede de segmentos do cólon. Pensa-se que na sua gênese exista uma anomalia na migração dos neuroblastos da crista neural para os segmentos intestinais, entre a 6ª e 12ª semanas de gestação, ou degenerescência dos neuroblastos migrados. A agangliose tem habitualmente caráter esporádico mas 5% dos casos são familiares. Alguns casos associam-se a trissomia 21 2, 10. Pelo exposto, o DPN de obstrução intestinal assume particular relevância uma vez que permite pesquisar a etiologia subjacente, bem como as possíveis condições associadas, e estabelecer o prognóstico. Estes fatores potenciam o aconselhamento do casal e possibilitam o encaminhamento para um centro de cuidados terciário com diminuição da morbimortalidade, uma vez que permite instituir a terapêutica precocemente (na sua maioria cirúrgica) reduzindo a taxa de complicações. O principal objetivo deste estudo é caracterizar os achados distintivos do diagnóstico sonográfico da obstrução intestinal fetal e estabelecer a sua correlação com os achados em pós-natal e resultados neonatais. Métodos Procedeu-se à análise retrospectiva dos 13 casos consecutivos com DPN de obstrução intestinal fetal, referenciados ao Centro de Diagnóstico PréNatal (CDPN), entre Janeiro de 2004 e Julho de 2011. A pesquisa dos casos foi efetuada com consulta da base de dados do programa Astraia. Caracterizou-se a população em estudo relativamente à idade, raça, gesta, paridade, antecedentes pessoais e familiares e local de vigilância da gravidez. Foram ainda avaliados o número de EURP 2012; 4(1): 14-21


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Pereira et al. - Obstrução intestinal pré-natal fetos, sexo fetal, idade gestacional da suspeita de obstrução intestinal, características dos achados ultrassonográficos, anomalias associadas, estudos complementares efetuados, atitudes clínicas, idade gestacional do parto, via de parto, vitalidade ao nascer e peso do recém-nascido. Nos casos em que o casal solicitou interrupção médica da gestação (IMG) analisaram-se os achados da fetologia. Correlacionaram-se os achados em pré e pósnatal. Considerou-se prematuridade idade gestacional inferior a 37 semanas completas; restrição de crescimento intra-uterino (RCIU) quando o peso foi inferior ao percentil 10 para a idade gestacional; a vitalidade ao nascer foi avaliada pelo índice de Apgar ao 1º, 5º e 10º minuto, e foram considerados alterados índices inferiores a 7 ao 5º minuto. As atresias intestinais foram classificadas de acordo com os seguintes tipos: Tipo I- presença

de membrana ou diafragma constituído por mucosa e submucosa; Tipo II- dois segmentos em fundo de saco unidos por um cordão fibroso; Tipo IIIa- semelhante ao tipo II mas com brecha no mesentério; Tipo IIIb- presença de “apple-peel” (ausência da artéria mesentérica superior para além do ramo cólico médio, com redução significativa do comprimento intestinal e defeito largo no mesentério; o intestino delgado distal assume configuração helicoidal circundando o único vaso perfusor); Tipo IV- presença de múltiplas atresias 7. Foi efetuada a análise estatística descritiva com o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 16.0 com determinação da média, desvio-padrão, valor mínimo e máximo das variáveis numéricas. Nas variáveis categóricas utilizou-se o teste de proporção simples com cálculo das frequências.

Tabela 1. Correlação entre a localização da obstrução suspeitada na avaliação pré-natal e verificada em pós-natal Pré-natal

Pós-natal

Duodeno

Intestino delgado

Duodeno

Duodeno +

Intestino delgado

1

Intestino delgado + Cólon Cólon

1

Total

2

Indeterminado

Íleo

1

1

Jejuno-ileal + Cólon

Cólon

Total

1 1

3

3

3

1

1

6

7

1

2

13

1

1

2

Valor preditivo positivo de 100% para obstrução no intestino delgado Valor preditivo positivo de 22,2% para obstrução no cólon Resultados A idade média das gestantes foi 29,5±5,6 (2341) anos, e todas eram de raça caucasiana. Cinco (38,5%) casos eram relativos a uma primeira gestação, Gesta 2 em 5 (38,5%) casos, e Gesta ≥3 em 3 (23,1%) casos. Relativamente à paridade, 6 (46,2%) eram nulíparas, Para 1 em 6 (46,2%) casos e Para 2 em 1 (7,7%) caso. Dos antecedentes pessoais das gestantes há apenas a salientar um dos casos com antecedentes de obstrução intestinal fetal em gravidez anterior (caso 12); 2 abortos espontâneos precoces (caso 6); outra com diagnóstico de heterozigótica para a mutação 20210 da protrombina (caso 9); e um caso, em que na seExperts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

quência de estudo citogenético do casal por 2 abortos espontâneos, tinha sido detectado no homem a t(8;21)(p23.1;q11.2) com risco calculado de anomalia cromossômica desequilibrada na descendência avaliado em 13,6% (caso 13). O caso 8 tinha uma sobrinha, com cardiopatia e fenda palatina, falecida com 1 ano de idade. A história pessoal das gestantes não revelou exposição a agentes potencialmente teratogênicos em nenhum dos casos. Cinco (38,5%) casos eram provenientes de outras consultas da nossa instituição, 2 (15,4%) foram referenciados por outro hospital e 6 (46,1%) casos eram vigiados em clínica privada. O Caso EURP 2012; 4(1): 14-21


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Pereira et al. - Obstrução intestinal pré-natal 11 tinha sido orientado para o CDPN às 12,3 semanas de gestação por rastreio combinado do primeiro trimestre positivo para trissomia 18. Em todos os casos tratava-se de gravidez única e a suspeita de obstrução intestinal fetal ocorreu em média às 24,7±6,8 (11,9–34) semanas de gestação. Foi realizado diagnóstico invasivo com amniocentese, para estudo citogenético, em 9 (69,2%) casos e nenhum deles revelou alterações do cariótipo. Em dois casos foi realizado cariótipo após o nascimento, que não revelou alterações. Quatro (30,8%) fetos eram do sexo masculino e 9 (69,2%) do sexo feminino (relação 1:2,25). O estudo da fibrose cística foi efetuado em 4 (30,8%) casos tendo revelado homozigota para delta F-508 no caso 1. Os principais achados ultrassonográficos sugestivos de processo obstrutivo foram: alças dilatadas (11; 84,6%), líquido amniótico aumentado (5; 38,5%), imagem eco negativa em forma de ferradura/“U” (2; 15,4%) e sinal de “dupla bolha” (1; 7,7%). Estes achados estão ilustrados na figura 1. Em 4 (30,8%) casos surgiram sinais sugestivos de peritonite meconial/ perfuração caracterizados principalmente pela presença de áreas hiperecogênicas abdominais e, num deles com ascite concomitante e outro com formação de pseudocisto meconial. Relativamente à localização da obstrução, a ultra-sonografia sugeria o cólon isoladamente em 6 casos (46,1%), cólon e intestino delgado em 3 (23,1%) casos, intestino delgado isoladamente num (7,7%) caso, duodeno noutro (7,7%) caso e indeterminado em 2 (15,4%) casos. Na avaliação pós-natal verificou-se que as obstruções se localizavam principalmente a nível do íleo (7; 53,8%); duodeno (2; 15,4%); cólon isoladamente (2; 15,4%); duodeno e intestino delgado (1; 7,7%); e jejuno-ileal e cólon (1; 7,7%). A correlação entre a localização da obstrução suspeitada em pré-natal e a verificada em pós-natal encontrase na tabela 1. Em 4 (30,8%) casos foi diagnosticado peritonite meconial, um dos quais sem suspeita pré-natal. A atresia intestinal representou a principal etiologia de obstrução estando presente em 10 (76,9%) casos. Num destes casos (caso 3) foi ainda diagnosticado mal rotação com volvo concomitante. Outro caso (caso 7) apresentava malformação anorretal complexa com “Pouch-colon” (cólon encurtado e dilatado, tipo bolsão) e presença de cloaca, ou seja, com comprometimento geniturinária concomitante. Em metade dos casos de atresia estas eram do tipo IV. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Nos restantes casos a obstrução ficou a deverse a: ileo meconial (caso 1), doença de Hirschprung (caso 2) e pâncreas anular (caso 9). A figura 2 ilustra os achados pré-operatórios num caso de atresia ileal e num caso de ileo meconial. A avaliação pré-natal detectou anomalias associadas em apenas um (7,7%) caso (caso 13). Em 10 (76,9%) casos resultou um nascido-vivo, com parto por via vaginal em 5 casos e por cesárea nos restantes. O parto ocorreu em média às 35,3±3,4 (28,6-39,4) semanas de gestação. Os achados ecográficos, citogenética, resultados relevantes de outros estudos realizados, idade gestacional do parto, co-existência de restrição de crescimento intra-uterino, e evolução pós-natal especificando o tipo de cirurgia realizada, achados operatórios e diagnóstico final destes casos encontram-se resumidos na tabela 2. No caso 4 a suspeita de obstrução intestinal ocorreu às 23,4 semanas de gestação contudo foi referenciado ao CDPN apenas às 36,3 semanas de idade gestacional. Seis casos (casos: 3, 5, 7, 8, 9 e 10) associaramse a prematuridade tendo sido efetuada corticoterapia para maturação pulmonar fetal em 3 deles. Todos os recém nascidos (RN) tinham Apgar ao 5º minuto superior a 7, e pesavam em média 2616,9±913,7 (1180-4060) gramas incluindo 3 casos de RCIU. Todos os RN necessitaram de admissão em unidade de cuidados intensivos de recémnascidos (UCIRN). À exceção do caso 2, todos os RN foram submetidos a cirurgia entre o 1º e o 3º dia de vida. Dois dos casos necessitaram de reintervenção cirúrgica. No caso 2, o RN apresentou quadro de vômitos biliares com radiografia do abdômen a revelar níveis hidro-aéreos no primeiro dia de vida mas o quadro resolveu com terapêutica médica. Por manter quadro de constipação e distensão abdominal, foi submetido a biopsias de aspiração retal no 2º mês de vida tendo sido diagnosticado doença de Hirschprung. Posteriormente foi submetido a correção cirúrgica com operação de Duhamel. Em 3 (23,1%) casos o casal solicitou interrupção médica da gestação (IMG) que foi realizada em média às 24,5±8,11 (16,9-33) semanas de gestação. As características destes casos encontramse resumidas na tabela 3. O caso 11 e 12 referem-se apenas a uma paciente que durante o período de estudo teve duas gestações com feto afetado por obstrução intestinal. EURP 2012; 4(1): 14-21


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Pereira et al. - Obstrução intestinal pré-natal A fetologia permitiu identificar malformações associadas em todos os casos submetidos a IMG. O caso 11 apresentava atresia da via biliar principal e vesícula biliar bem como duplicação do intestino delgado. O caso 12 apresentava hipertelo-

rismo e pé boto bilateral. No caso 13 co-existia malformação do sistema nervoso central (SNC), já suspeitada na avaliação pré-natal.

Figura 1.( a) alças intestinais dilatadas às 36 semanas de gestação - caso 1; (b) sinal de “dupla-bolha” às 34 semanas de gestação - caso 9; (c) e (d) imagem eco negativa em forma de ferradura/”U” descrita às 16 semanas de gestação (c) caso 11, (d) caso 12.

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Pereira et al. - Obstrução intestinal pré-natal

Figura 2. Achados peri-operatórios num caso de atresia ileal (caso 8; à esquerda) e num caso de ileo meconial (caso 1; à direita).

Discussão Os avanços tecnológicos e melhor preparação dos executantes tem promovido uma crescente acuidade da ultra-sonografia no diagnóstico de malformações fetais. A detecção pré-natal de obstrução intestinal é um desses exemplos. Tipicamente o seu diagnóstico assenta na presença de dilatação dos órgãos proximais à dilatação bem como na eventual existência de polihidrâmnios 4. Este é por exemplo o caso da obstrução duodenal, na qual o característico sinal de “duplabolha”, que representa a dilatação do estômago e duodeno separados pelo piloro, é muitas vezes acompanhado de polihidrâmnios 2, 4, 6, 8, 9, 10. No entanto em situações de obstrução mais distal os achados no exame ultrassonográfico podem ser mais subtis consistindo apenas na dilatação de uma alça intestinal isolada sem alterações no volume de líquido amniótico ou com aumento em idade gestacional mais avançada 9. No presente estudo o diagnóstico ocorreu em média às 24,7±6,8 semanas de gestação, o que está de acordo com o descrito pela maioria dos autores, que afirmam que geralmente o diagnóstico é realizado após as 25 semanas de gestação 2, 6, 9. No entanto salientamos que em 7 (53,8%) casos (casos: 1, 4, 8, 9, 11, 12 e 13) o diagnóstico foi suspeitado antes das 24 semanas de gestação. O achado mais comum no exame ultrassonográfico foi a presença de alças dilatadas (84,6%), este fato é consistente com o nível das obstruções uma vez Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

que, à exceção de 2 casos, todos apresentavam obstrução distal ao duodeno. Em dois casos (casos 11 e 12) com atresia duodenal, ambos relacionados com a mesma gestante, foi descrita uma estrutura eco negativa em forma de ferradura/”U” cerca das 16 semanas de gestação. Em ambos os casos existiam malformações gastrointestinais associadas (duplicação do intestino delgado no caso 11; e outras atresias intestinais no caso 12) impossibilitando estabelecer uma relação de causalidade entre a existência desta estrutura e a presença de atresia duodenal. O único caso com descrição do sinal de “dupla-bolha” associou-se à presença de pâncreas anular, um dos diagnósticos diferenciais na obstrução duodenal amplamente referido na literatura 2, 4, 6, 8, 9. Relativamente ao volume de líquido amniótico, este apresentou aumento em 5 (38,5%) casos, um deles associado a obstrução duodenal e os restantes a nível do jejuno e íleo. Segundo Paladini et al na atresia anorretal o volume de líquido amniótico permanece inalterado, ou pode mesmo apresentar-se diminuído se a atresia anorretal estiver associada a fístula reto-vesical 9. Esta observação foi confirmada num dos casos do estudo em que uma malformação anorretal (“Pouchcolon” e cloaca) se associou a anâmnios. A determinação correta do nível da obstrução (delgado, cólon) na avaliação ultrassonográfica pré-natal revelou-se difícil, com apenas 2 (casos: 6 e 7) dos 9 casos (casos: 1, 3, 4, 6, 7, 8, 10, 11 e 13) EURP 2012; 4(1): 14-21


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Pereira et al. - Obstrução intestinal pré-natal sugestivos de envolvimento do cólon a serem confirmados na avaliação pós-natal conferindo um valor preditivo positivo de apenas 22,2%. No entanto todos os casos (casos: 3, 4, 10 e 12) que sugeriam um possível envolvimento do intestino delgado foram confirmados na avaliação pósnatal conferindo valor preditivo positivo de 100%, ainda que em 3 (75%) fosse sugerido envolvimento concomitante do cólon que não foi confirmado na avaliação pós-natal. Estes dados são compatíveis com o estudo de Corteville et al que revelou valor preditivo positivo de 18,3% na detecção ultrassonográfica de obstrução a nível do cólon, e sensibilidade de 100% com valor preditivo positivo de 72,7% na obstrução do intestino delgado 11. Já a presença do sinal de “duplabolha” revelou-se específico de obstrução a nível duodenal (caso 9). Dos 4 casos (casos: 5, 8, 10 e 11) com aspectos sugestivos de peritonite meconial/ perfuração pré-natal, 3 (casos: 5, 8 e 11) foram confirmados, no entanto existiu um caso com diagnóstico pósnatal que não tinha sido suspeitado em pré-natal. Desta forma, neste estudo a ultra-sonografia revelou sensibilidade de 75% e especificidade de 88,9%, com valor preditivo positivo de 75% e valor preditivo negativo de 88,9% para este diagnóstico. Estes dados são comparáveis aos de Kuroda et al que em 7 casos com suspeita pré-natal de peritonite meconial, esta foi confirmada em 6 conferindo valor preditivo positivo de 85,7% 12. Dos casos de peritonite meconial confirmados na avaliação pós-natal salienta-se a associação com obstrução ileal confirmando observações de outros autores que referem a maior tendência para perfuração neste local, em contraste com as obstruções do jejuno, que tendem mais a dilatar 9. Nenhum dos casos de peritonite meconial se associou à presença de fibrose cística, contrastando com incidência de 8-40% descrita na literatura 13. Relativamente às malformações associadas, estas tinham sido diagnosticadas em pré-natal apenas num caso (7,7%). No entanto a avaliação pósnatal revelou malformações associadas em 4 (30,8%) casos. Num RN do sexo feminino (caso 7), foi diagnosticada malformação anorretal complexa com “Pouch-colon” e cloaca associando desta forma malformação do sistema geniturinário. Paladini et al descrevem anomalias associadas em 70-90% dos casos de atresia anorretal, afetando sobretudo o sistema geniturinário à semelhança do caso descrito 9. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Os outros casos com anomalias associadas foram aqueles submetidos a IMG. Um dos casos (caso 11) apresentou atresia da via biliar principal e vesícula biliar, e duplicação intestinal associadas a atresia duodenal. No caso 12 o feto tinha hipertelorismo, pé boto bilateral e outras atresias intestinais em associação com atresia duodenal. Diversos autores descrevem prevalência de malformações associadas em 40-50% das situações de atresia duodenal 2, 6, 7, 8, 9. Entre essas anomalias encontram-se aquelas relacionadas com os sistemas gastrointestinal, esquelético (anomalias vertebrais e das costelas, agenesia do sacro, anomalias do rádio e pé boto), cardíacas e renais. A atresia biliar e agenesia da vesícula biliar tem sido descrita associada à atresia duodenal, em particular nos casos de atresia dupla 7. A ocorrência de 2 gestações com feto afetado com atresia duodenal, na mesma paciente (caso 11 e 12), levanta a hipótese de síndrome genético, no entanto não foram encontradas alterações associadas enquadráveis em síndromes, como por exemplo o de Feingold 14, 15, 16. No caso 13 o feto apresentava atresia ileal tipo IV associada a malformação do SNC. Este tipo de associação é rara, uma vez que a maioria das atresias intestinais não se associa a malformações major 2, 9, 10. Os 10 casos que resultaram em nascido-vivo necessitaram de intervenção cirúrgica para correção da causa de obstrução. Na maioria (80%) existia uma anomalia anatômica, enquanto que num caso se tratava de obstrução mecânica intraluminal pela presença de ileo meconial e noutro existia um segmento de cólon agangliónico causando obstrução funcional 8. O DPN de fibrose cística no caso 1 possibilitou que, perante o quadro de ileo meconial não complicado, fosse instituída terapêutica médica com clister de gastrografina precocemente, que no entanto não foi suficiente para a resolução do quadro oclusivo sendo então encaminhado para terapêutica cirúrgica. De salientar o caráter transitório das alterações ultrassonográficas no caso 2, traduzindo a dificuldade no DPN na maioria de casos de doença de Hirschprung. Segundo Shawis et al, a taxa de sobrevivência após a correção cirúrgica é de 85-90% 8. Esta taxa depende sobretudo da idade gestacional no parto, malformações associadas, local da obstrução e tipo de atresias (pior nos tipos IIIb e IV) 2, 8 ,9. No nosso estudo a sobrevivência após a cirurgia foi EURP 2012; 4(1): 14-21


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Pereira et al. - Obstrução intestinal pré-natal de 100%, apesar da existência de 2 casos nascidos antes das 32 semanas de gestação, 3 casos com peritonite meconial e 4 casos com atresia tipo IIIb/ IV. Este estudo reforça a importância do DPN de obstrução intestinal permitindo realizar a investigação etiológica e adequar a vigilância da gestação com controlo ultrassonográfico mais frequente pesquisando sinais de complicações como a peritonite meconial. O diagnóstico antecipado destas situações possibilita ainda, melhor aconselhamento do casal com envolvimento da equipa cirúrgica, e o planejamento do nascimento num centro de cuidados terciário com otimização do desfecho perinatal. Referências

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Artigo de Revisão

Avaliação ultrassonográfica das massas anexiais Ultrasound evaluation of adnexal masses Valéria Cristina Nascimento Silva1, Francisco Mauad Filho1

A ultrassonografia continua a ser a principal modalidade de imagem usada para identificar e caracterizar massas anexiais. A classificação das neoplasias de ovário está baseada em características histológicas. A predição de malignidade através das características ultrassonográficas incluem a presença de componente sólido (particularmente se houver fluxo visível nele na avaliação Doppler), septos espessos e ascite. Várias outras características clínicas de menor utilidade tem sido associadas com malignidade, que incluem o tamanho da massa, espessura da parede e características da avaliação Doppler através do mapeamento de fluxo e caracterização das formas de onda. O seguimento com avaliações seguidas de imagem é apropriado em muitos casos, quando as descobertas com o exame inicial sugerem doença benigna, quando o diagnóstico é incerto, ou quando há fortes razões para se evitar cirurgia. Para a avaliação complementar de uma massa anexial, outros estudos de imagem podem ser utilizados, como a ressonância magnética e a tomografia computadorizada. Palavras-chave: Anexos Uterinos; Doenças dos Anexos, Medição de Risco; Ultrassonografia.

Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP)

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Recebido em 15/12/2011, aceito para publicação em 20/01/2012. Correspondências para Valéria Cristina Nascimento Silva. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: vcnsilva@hotmail.com Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract Ultrasound remains the primary imaging modality used to identify and characterize adnexal masses. The classification of ovarian neoplasms is based on histological features. The prediction of malignancy using the ultrasound characteristics include the presence of the solid component (particularly if it visible in the flow Doppler evaluation), thickened septa and ascites. Various other features of less clinical utility has been associated with malignancies, including the size of the mass, wall thickness and characteristics of the Doppler evaluation by mapping and characterization of the flow waveforms. The follow-up evaluations followed with imaging is appropriate in many cases, when the findings with the initial examination suggest benign disease, when the diagnosis is uncertain, or when there are strong reasons to avoid surgery. For further evaluation of an adnexal mass, other imaging studies can be used as magnetic resonance imaging and computed tomography. Keywords: Adnexa Uteri; Adnexal Diseases; Risk Assessment; Ultrasonography.

Introdução Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

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Silva & Mauad - Massas anexiais A ultrassonografia (US) continua a ser a principal modalidade de imagem usada para identificar e caracterizar massas anexiais 1. Embora a avaliação é muitas vezes destinada a distinguir massas benignas de malignas, a maioria das massas anexiais são benignas e cerca de 90% das massas anexiais podem ser devidamente caracterizadas com base em suas características US 2. O risco de uma mulher desenvolver uma neoplasia de ovário é de 1 em 71 2. Ao determinar o risco de malignidade para uma massa anexial devem ser considerados os fatores que não são achados de imagem. Estes incluem idade do paciente, estado menopausal, história pessoal ou familiar de câncer de mama ou câncer de ovário, e nivel de CA-125 no soro 2. A idade é um fator importante na determinação da probabilidade de câncer, com taxas que aumentam à medida que avança a idade. Multiparidade e idade precoce no primeiro parto diminui o risco e história pessoal ou familiar de câncer de mama ou câncer de ovário aumenta o risco 3, 4. O prognóstico do câncer de ovário é associado com os estágios avançados da doença no momento do diagnóstico . A experiência coletiva de muitos centros em todo o mundo proporcionou uma riqueza de informações que permite a caracterização precisa de cerca de 90% das massas anexiais com base em suas características US 5. Abordagem da massa anexial Embora muitos médicos estejam compreensivelmente preocupados com a falha para detectar um tumor maligno de ovário, é importante perceber que a maioria das massas anexiais, particularmente em mulheres na menopausa, é benigna. Desde o advento da avaliação ultrassonográfica da pelve feminina, as características do ovário normal e anormal foram extensivamente estudadas e os estudos também investigaram o papel da ultrassonografia como parte de protocolos de triagem para detecção de câncer de ovário. Com a ultrassonografia transvaginal ha uma melhor visualização do ovário normal, sua função e tambem dos tumores ovarianos, e muito trabalho tem sido feito para definir e padronizar as características do tumor de ovário. O uso da análise Doppler para mapeamento de fluxo e caracterização das formas de onda tem sido utiliExperts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

zado para avaliar neovascularização das neoplasias de ovário, muitas vezes combinados com outros marcadores ultrassonográficos. Adequada caracterização de uma massa anexial é importante tanto para determinar quais pacientes precisam de cirurgia e para ajudar a definir o tipo de cirurgia e se a cirurgia com sub-especialista é necessária. Várias abordagens para se caracterizar massas anexiais foram utilizadas, das quais, a abordagem subjetiva demonstrou ser superior aos outros métodos, com uma sensibilidade de 88% a 100% e especificidade de 62% a 96% para predizer malignidade 2. Um objetivo importante da avaliação de ovário por ultrassom é para determinar as diferenças entre os achados fisiológicos normais, inflamatórios, alterações benignas e câncer ovariano. Características US de massas enexiais A classificação das neoplasias de ovário está baseada em características histológicas e, em geral, as características ultrassonográficas que indicam malignidade incluem um componente sólido (particularmente se houver fluxo visível nele na avaliação Doppler), septos espessos e ascite 6. Componente sólido A demonstração ao US de um componente sólido dentro de uma massa cística (Figura 1) é o mais importante preditor de malignidade, e inversamente, malignidade é improvável na ausência de um componente sólido 2. Terminologias para descrever o componente sólido variam e também inclui projeção papilar, excrescência, vegetação e nódulos. Apesar de um componente sólido dentro de uma massa cística ser geralmente um indicador confiável de neoplasia, armadilhas podem ocasionalmente levar a problemas de diagnóstico. Sabendo disso, seguimento com US e Doppler para avaliar fluxos deverão elucidar se a etiologia da massa é benigna ou maligna 3. Septos Septos em uma massa ovariana cística são fortes evidências de uma neoplasia 3 e são mais propensos a indicar malignidade se eles são maiores que 2-3 mm de espessura ou ter fluxo detectável à US com Doppler. Há também armadilhas relacionadas aos septos e que também deverão ser diferenciadas no seguimento com US.

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Silva & Mauad - Massas anexiais Ascite Ascite, um indicador indireto de malignidade, ocorre quando um tumor peritoneal se espalha e pode permitir a visão de implantes peritoneais. Embora uma pequena quantidade de líquido em fundo de saco posterior é normal em mulheres na menopausa, um aumento do risco de malignidade foi relatado quando se mede mais de 15 mm de dimensão antero-posterior 7. Fluido ascítico ecogênico pode ocorrer com malignidade, mas também pode ocorrer com doença benigna como hemoperitônio de uma ruptura de cisto ou gravidez ectópica. Outras características do US Várias outras características clínicas de menor utilidade tem sido associadas com malignidade, que incluem o tamanho da massa, espessura da parede e características no US com Doppler. Massas maiores são muitas vezes consideradas mais suspeitas de malignidade; no entanto, o preditor mais confiável de malignidade está baseado mais nas características morfológicas que no tamanho 8). A parede espessada do cisto tem sido descrita como característica de malignidade, mas tem utilidade limitada, uma vez que também pode ser visto em muitas lesões benignas. Tamanho O grande tamanho de uma massa ovariana, que tenha outras caracteristicas semelhantes, tem sido considerado um fator significativo na predição de câncer de ovário. Um estudo em mulheres na pós-menopausa descobriu que os tumores superiores a 10 cm foram mais propensos a serem associados com malignidade 9 o que foi confirmado em outros estudos e as maiores massas foram associadas a um aumento da probabilidade de câncer de ovário 4. Avaliação Doppler O Doppler pode ser a chave na distinção entre massas benignas e malignas porque as características vasculares dentro de uma neoplasia maligna muitas vezes são diferentes das de um tumor benigno. Lesões malignas costumam produzir um aumento significativo no fluxo do Doppler, sinais secundários para angiogênese 2. O Grupo IOTA sugeriu o uso de tal avaliação subjetiva semiquantitativa do fluxo para descrever as características vasculares das massas de ovário 10. NeoplaExperts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

sias malignas frequentemente apresentam maior sinal de fluxo, não só na periferia da massa, como visto em lesões benignas, mas também nas regiões centrais da massa, incluindo dentro de septações e áreas sólidas do tumor. A neovascularização dentro de neoplasias malignas tem baixo fluxo de impedância (índice de pulsatilidade < 1,0 e resistência < 0,4), tempo máximo de velocidade média alta > 15 cm/s e ausência de uma incisura diastólica em tais massas 4. A presença de fluxo aumenta a preocupação de malignidade, embora muitas neoplasias benignas também tem fluxo detectável. Se não houver fluxo detectável em uma área de aparência sólida, particularmente em uma mulher na prémenopausa, deve-se considerar a possibilidade de coágulo em vez de um componente sólido de verdade 11. Ultrassom com Doppler colorido é melhor utilizado em uma modalidade qualitativa para procurar fluxo dentro de um componente sólido ou septo 12. Avaliação das massas anexiais para identificar malignidade Num grande número de estudos de US de neoplasias ovarianas houve o reconhecimento e a criação de padrões ultrassonográficos para prever a morfologia do tumor, como definido na escala de Sassone et al. 13 e refinada pelo International Ovarian Tumor Analysis (IOTA) Group 10. Tais padrões ultrassonográficos incluem as composições cística e sólida do tumor bem como a presença e o tipo de septações e papilas. Um objetivo importante da análise das massas de ovário e massas anexiais é uma tentativa de identificar entidades não-neoplásicas, tais como cistos funcionais, doenças inflamatórias e tubárias ou endometriose. Estas entidades não neoplásicas são geralmente menores em tamanho e podem exibir aparências ultrassonográficas clássicas que são referidos como patognomônicos 10, 13. No entanto, cada uma dessas entidades pode ter aparências que imitam processos neoplásicos também. Uma neoplasia benigna com aparência clássica mais comum do ovário é o tumor dermóide [figura 3], que devido sua aparência sólida e ecogênica 10, 13 pode ser erroneamente classificado como tumor suspeito de malignidade como na escala de Sassone et al. EURP 2012; 4(1): 22-26


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Silva & Mauad - Massas anexiais Há uma qualificação e quantificação do tumor se a massa ovariana ou de anexo não se adaptar a qualquer destas descrições clássicas e recentemente, membros do Grupo IOTA 14, tem utilizado esta escala de reconhecimento de padrões qualitativa, junto com outras características ultrassonográficas e clínicas, para diferenciar entre tumores benignos e malignos, em subgrupos específicos. Sassone et al. 13 desenvolveu uma escala para tais características morfológicas do ovário, incluindo a estrutura da parede interior, espessura da parede, a presença de septos e ecogenicidade da massa, e foram capazes de distinguir massas benignas de malignas com especificidade de 83%, sensibilidade de 100%, e o valor preditivo positivo e negativo de 37% e 100%, respectivamente. Esse conceito de padrão, reconhecido desde então, tem sido repetidamente confirmado, ao estabelecer que a avaliação subjetiva de escala de cinza e as características de ultrassom com Doppler é um excelente método para discriminar entre massas pélvicas benignas e malignas 4. Em um grande estudo multicêntrico, o reconhecimento de padrões foi superior ao do soro CA-125 no diagnóstico de massas anexiais benignas e malignas . Mais recentemente, com base no conceito de reconhecimento de padrões, sistemas de pontuação foram desenvolvidos para discriminar de forma mais precisa entre neoplasias benignas e malignas. Em 1999, Twickler et al. 4 incorporou a idade do paciente, volume ovariano, Doppler, velocimetria e localização de vasos, e predominância ecogênica da massa (sugestivo de dermóide) com a escala de morfologia de Sassone et al. para calcular o índice do tumor de ovário, uma probabilidade calculada de malignidade com base na ponderação de cada um dos parâmetros listados. Uma investigação está também em curso no que diz respeito ao uso da ultrassonografia na triagem de câncer de ovário. As considerações importantes destes modelos incluem o tamanho, aparência, características de fluxo ao Doppler colorido e valorização das aparências clássicas benignas, tais como dos tumores dermóides. Seguimento pela ultrassonografia O seguimento com US é apropriado em muitos casos, quando as descobertas com o Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

exame inicial US sugere doença benigna, quando o diagnóstico é incerto, ou quando há fortes razões para evitar cirurgia. Em mulheres prémenopausadas, muitas massas são cistos funcionais que vão se resolver espontaneamente em várias semanas. Isso muitas vezes pede um seguimento com US por cerca de 6 semanas após o exame inicial 3, 15. Mulheres pós-menopausadas com um cisto ovariano simples com menos de 1 cm podem deixar de fazer seguimento com US 1. Na pósmenopausa mulheres com um cisto simples de ovário maior que 1 cm, mas menor de 5 cm, geralmente pode ser seguido com o US; embora seja ideal, o intervalo de seguimento é incerto. Com curto intervalo de seguimento com US, um crescimento lento pode ocorrer com uma neoplasia benigna como um cistoadenoma seroso e pode não ser visto 3. Desempenho dos US em cerca de 6 meses parece razoável para o exame inicial de acompanhamento US 3, com os intervalos de seguimento ajustado com base no grau de mudança. Se a etiologia de uma massa é incerta, mas sua aparência não é suspeita de malignidade, o seguimento US também é razoável. Por exemplo, se uma massa é provavelmente um cisto hemorrágico, mas também tem características atípicas, um seguimento com US realizado em 6 semanas é razoável. Esta é a quantidade de tempo que permite a resolução da maioria dos cistos e deve ser feita em um período diferente do ciclo menstrual de modo que se aparecer qualquer novo cisto esperamos que tenha uma aparência diferente. Exame US seriado também pode ser indicado para seguir o curso de uma lesão benigna previamente caracterizada como nos casos de dermóides, endometrioma, hidrossalpinge ou um cisto de inclusão peritoneal. Modalidades alternativas de imagem Para melhor avaliar uma massa anexial, estudos de imagem adicionais podem ser recomendados. A ressonância magnética, desde que bem executada para caracterizar massas anexiais é a modalidade mais frequentemente usada para avaliar mais massas anexiais ainda consideradas indeterminadas no US 7. TC pode ser capaz de caracterizar massas anexiais como benignas ou malignas , mas tem um papel pequeno na rotina de detecção ou caracteEURP 2012; 4(1): 22-26


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Silva & Mauad - Massas anexiais rização de massas anexiais e normalmente não pode ser tão específica quanto ao tipo de massa benigna da maneira que o US pode. Sendo assim, a TC deve geralmente ser reservada para avaliar a disseminação da malignidade ovariana e pode ser usada em casos selecionados de suspeita de abscesso tubo ovariano, uma vez que é superior ao US para revelar mudanças inflamatórias contínuas e envolvimento dos órgãos adjacentes 16, 17. Considerações finais O US é instrumento imprescindível devido sua alta sensibilidade e especificidade quando associado ao Doppler, possibilitando a caracterização do tumor maligno e diagnóstico diferencial com processos benignos. Método não invasivo, rápido, inócuo, reprodutível e eficaz, que direciona a conduta e o acompanhamento clínico. A maioria das massas anexiais é benigna e pode ser reconhecida baseada em características ultrassonográficas. Muitas vezes, porém, na US o aparecimento de uma massa ovariana não é patognomônico e nesses casos indeterminados, há de se estabelecer modelos de análises baseados em outras características que também contribuem para definir o risco de malignidade e incluem questões clinicas, como idade e histórico de câncer. Assim, um modelo com vários parâmetros para a avaliação do risco é apropriado e o modelo ideal para que seja aceito de modo universal por radiologistas, ginecologistas e oncologistas, de fácil aplicação e com interpretações claras do risco relativo, ainda deve ser desenvolvido e que deverá ser estabelecido concretamente no futuro. Referências

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Artigo de Revisão

Ultrassonografia na gestação complicada por diabetes mellitus Ultrasonography in pregnancy complicated by diabetes mellitus Wilson Ayach 1

A ultrassonografia é método propedêutico fundamental na obstetrícia moderna. Permite a avaliação qualitativa do concepto e seus anexos e da biometria embrionária e fetal. Os parâmetros ecográficos têm permitido o cálculo da idade gestacional, avaliação do crescimento fetal, diagnóstico e tratamento de másformações, avaliação da vitalidade e maturidade fetal. Na gestação complicada pelo diabetes mellitus, fatores que alteram o crescimento fetal como a hipertensão arterial e a hiperglicemia materna podem estar presentes. Os dados da biometria fetal podem ser utilizados para cálculo da idade gestacional e sua mensuração seriada deve ser utilizada para avaliar o crescimento fetal. A avaliação quantitativa e qualitativa da biometria e morfologia fetal pela ecografia constitui-se, em instrumento valioso na assistência pré-natal em especial no diagnóstico dos desvios do crescimento fetal, avaliação da maturidade e vitalidade fetal, na gestação complicada pelo diabetes mellitus. Palavras-chave: Diabetes Mellitus; Ultrassonografia; Biometria; Desenvolvimento Embrionário e Fetal.

Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP)

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Recebido em 26/09/2011, aceito para publicação em 20/01/2012. Correspondências para Wilson Ayach. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wilsonayach@uol.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract Ultrasound is essential investigative method in modern obstetrics. Enables qualitative assessment of the fetus and its appendices and embryonic and fetal biometry. The ultrasound parameters have permitted the calculation of gestational age, fetal growth assessment, diagnosis and treatment of malformations, assessment of fetal maturity and vitality. In pregnancy complicated by diabetes mellitus, factors that affect fetal growth as maternal hypertension and hyperglycemia may be present. The data of fetal biometry can be used to calculate the gestational age and its serial measurement should be used to assess fetal growth. The quantitative and qualitative assessment of fetal biometry and morphology by ultrasound is constituted in useful tool in prenatal diagnosis in particular the deviations of fetal growth, maturation and fetal, in pregnancy complicated by diabetes mellitus. Keywords: Diabetes Mellitus; Ultrasonography; Biometry; Embryonic and Fetal Development.

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Ayach - Gestação complicada por diabetes mellitus Introdução A ultrassonografia é método propedêutico fundamental na obstetrícia moderna. Permite a avaliação qualitativa do concepto e seus anexos e da biometria embrionária e fetal. Os parâmetros ecográficos têm permitido o cálculo da idade gestacional, avaliação do crescimento fetal, diagnóstico e tratamento de más-formações, avaliação da vitalidade e maturidade fetal 1. O crescimento fetal é o resultado do potencial genético, da oferta de nutrientes e oxigênio e da regulação endócrina. Estes fatores determinam a trajetória do crescimento intra-uterino. A biometria embrionária e fetal tem sido utilizadas para determinar a idade gestacional, por isso fatores que influenciam no crescimento fetal como hiperglicemia e hipertensão arterial poderiam dificultar a interpretação dos dados. Ultrassonografia de primeiro trimestre da gestação A ultrassonografia do primeiro trimestre da gestação tem por finalidade avaliar o útero, o saco gestacional e marcadores embrionários, que são utilizados para o cálculo da idade gestacional e rastreamento de anomalias cromossômicas. Os principais marcadores do primeiro trimestre são o diâmetro do saco gestacional (SG), a presença, a característica e o diâmetro da vesícula vitelínica (VV), a presença e o número de embriões, o comprimento crânio-nádegas (CCN), a medida da translucência nucal (TN), a presença e comprimento dos ossos nasais (ON) e a doplervelocimetria do ducto venoso (DV). A presença de fatores que interferem no crescimento embrionário, como hipertensão arterial sistêmica e hiperglicemia poderiam alterar as dimensões e características destes marcadores e, conseqüentemente, reduzir a precisão do cálculo da idade gestacional 2. Deste modo a correlação direta entre a biometria do embrião e seus anexos e a idade gestacional precisa ser realizada de modo criterioso, para reduzir os erros de cálculo do tempo de gestação conseqüentes aos desvios de crescimento promovidos pelo estado hemodinâmico e metabólico materno. É fundamental, portanto, comparar a biometria embrionária em gestantes diabéticas e não diabéticas. Saco Gestacional O saco gestacional pode ser visualizado pela ultrassonografia transvaginal a partir da quarta Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

semana de gestação, quando mede cerca de cinco milímetros. O diâmetro do SG correlaciona-se com o prognóstico do desenvolvimento embrionário e pode ser utilizado para o cálculo da idade gestacional 3. Análise prospectiva comparando o diâmetro do SG e o prognóstico da gestação demonstrou que medidas menores que o quinto e maiores que o 90º percentil relacionam-se a maior prevalência de aborto espontâneo 4. Por outro lado, não há até o momento, estudo clínico comparativo do diâmetro do SG em gestantes diabéticas e não diabéticas. Vesícula vitelínica A avaliação qualitativa e quantitativa de vesícula vitelínica é utilizada para predição do prognóstico da gestação. A medida da vesícula vitelínica correlaciona-se com a idade gestacional. O diâmetro médio da Vesícula Vitelínica (VV) é significativamente maior em gestantes com diabetes mellitus tipo 1 em comparação com gestantes não diabéticas 5. Dentre as gestantes diabéticas, a VV é maior nas gestantes com hemoglobina glicosilada igual ou superior a 6g% 5. A avaliação tridimensional também demonstrou diâmetros da VV maiores em gestantes portadoras do diabetes mellitus tipo 1 6, 7. Estes achados sugerem que o meio metabólico influencia o crescimento fetal desde o início da gestação e, por isso, em gestações de mulheres diabéticas com data da última menstruação incerta o cálculo da idade gestacional deve ser feita de modo criterioso. O volume da VV quando menor que o quinto e/ou maior que o 90º percentil relaciona-se a maior prevalência de aborto espontâneo 4, 8. Além disso, o meio interno da vesícula vitelínica é diferente nas mulheres diabéticas. Schoenfeld et al. encontraram diâmtero médio da vesícula vitelínica 1,2 mm maior e níveis de prostaglandinas significativamente menores em gestantes diabéticas do tipo 1 quando comparadas a vesículas vitelínicas de embriões de gestantes não diabéticas, o que pode explicar a maior prevalência de más-formações fetais nas gestações complicadas por esta doença 9. Translucência Nucal A medida da translucência nucal (TN) tem sido utilizada como marcador de doenças genéticas, de cromossomopatias e cardiopatias. A medida da TN em fetos sem cromossomopatias demonstrou que os fetos de mães diabéticas gestaEURP 2012; 4(1): 27-31


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Ayach - Gestação complicada por diabetes mellitus cionais e pré-gestacionais têm TN mais espessa quando comparados aos fetos de gestantes não diabéticas 10. Kelekci et al. 11 observaram que TN com dimensão acima do 95º percentil relaciona-se com desenvolvimento de diabete gestacional e macrossomia fetal 11, o que não foi confirmado por Luchi et al. 12, que demonstram não haver diferença na medida da TN em gestantes que desenvolveram e que não desenvolveram diabete gestaciona 12l. A medida da TN também não se correlaciona com o tempo de evolução do diabetes mellitus prévio à gestação, dose de insulina e hemoglobina glicosilada e com o perfil glicêmico diário 13. Comprimento crânio-nádegas Uma das principais medidas realizadas na ultrassonografia do primeiro trimestre da gestação é a mensuração do comprimento crânio-nádegas (CCN). O CCN é o parâmetro da biometria embrionária que apresenta maior correlação com a idade gestacional, por ser pouco influenciado por fatores que interferem no crescimento embrionário e fetal como hipertensão arterial e hiperglicemia e por isso tem sido utilizado para datar a gestação e corrigir eventuais erros que a data da última menstruação poderia produzir. Entretanto, El Daouk et al. 14encontraram CCN, mensurado entre 12 e 13 semanas de gestação por ocasião da medida de TN, significativamente maior nos fetos que nasceram grandes para idade gestacional (62,7 ± 6,0 mm) em comparação aos fetos pequenos para idade gestacional (58,8 ± 6,9mm) ao nascimento. Como o estudo foi realizado em gestantes sem complicações, não se pode inferir sobre a etiologia desta diferença, mas demonstra que o CCN é influenciado por fatores constitucionais que determinarão o tamanho e peso ao nascimento. O CCN maior que o esperado para idade gestacional entre 11 e 13 semanas relaciona-se a macrossomia fetal 15. Uma alternativa à medida do CCN é a medida do volume embrionário pela ultrassonografia tridimensional 16 não encontraram diferença no volume embrionário em gestações únicas e duplas e demonstraram boa correlação entre o volume fetal e a idade gestacional. Não há até o momento, estudos sobre o volume embrionário em gestações complicadas pelo diabetes mellitus.

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Ultrassonografia obstétrica no segundo e terceiro trimestres O crescimento fetal é influenciado pela glicemia materna e fetal. As possíveis interferências da glicemia materna no crescimento embrionário alteram os parâmetros da biometria e podem dificultar a sua relação com a idade gestacional calculada pela última menstruação. Mulder et al. 17 observaram padrões distintos de crescimento de acordo com níveis de glicemia e hemoglobina glicosilada. Há maior prevalência de macrossomia quando há níveis elevados destes marcadores. Apesar destas peculiaridades, a ultrassonografia tem papel relevante na monitorização do crescimento fetal em gestantes diabéticas. A mensuração da biometria fetal de cada segmento corporal, periodicamente, pode contribuir para o diagnóstico de desvios de crescimento fetal e para o aprimoramento do tratamento do diabete na gestação. No segundo e terceiro trimestres da gestação, os parâmetros da biometria fetal podem ser divididos didaticamente em pólo cefálico, tronco e ossos longos. No pólo cefálico, destacam-se os diâmetros bi-parietal e occipito-frontal, a circunferência craniana, o índice cefálico e a medida do cerebelo. No tórax, a área cardíaca, a relação entre as áreas cardíaca e torácica, a ecogenicidade pulmonar são os mais relevantes. No abdome, merecem destaque os diâmetros antero-posterior e transverso e a circunferência abdominal. Por fim, adquirem importância a medida da diáfise de ossos longos, dentre os quais, destacamos úmero, rádio, ulna, fêmur, tíbia e fíbula. A avaliação ecográfica dos anexos fetais como espessura placentária e área de secção do cordão umbilical também podem ser utilizada. Fetos com tamanho maior do que o esperado no segundo trimestre da gestação tem maior risco de macrossomia. Thorsell et al. demonstraram que a biometria fetal uma semana maior que o esperado para a idade gestacional aumenta em 59% o risco do feto nascer com peso igual ou superior a 4000g 2. O diâmetro biparietal, circunferência abdominal, peso fetal estimado e peso ao nascimento não se correlacionam com níveis séricos maternos de lipídios 18. O diâmetro biparietal e o peso ao nascimento são maiores nas gestantes com maior resistência à insulina e menor reserva de células beta-pancreáticas medidas pelos índices HOMAIR e HOMA-B19. EURP 2012; 4(1): 27-31


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Ayach - Gestação complicada por diabetes mellitus A área de secção transversal do cordão umbilical é significativamente maior nos fetos macrossômicos filhos de mulheres diabéticas em comparação aos filhos de mães não diabéticas e apresenta boa correlação com peso ao nascimento 20. Wong et al. 21 observaram que o diâmetro biparietal, circunferência abdominal e comprimento do fêmur são maiores nos fetos de gestantes diabéticas tipo 1 e 2 e dentre estas, são maiores naquelas com hemoglobina glicosilada elevada, demonstrando a influência da hiperglicemia materna no crescimento fetal. Avaliação do crescimento fetal A biometria fetal permite, também, o diagnóstico do crescimento fetal e sua classificação em simétrico e assimétrico. A discordância entre os parâmetros caracteriza o crescimento fetal assimétrico. Dentre estes, destaca-se a medida da circunferência abdominal (CA), que quando maior que o esperado para idade gestacional permite o diagnóstico do crescimento fetal acelerado e, conseqüentemente, de fetos grandes para idade gestacional. Medida da CA acima do 90º percentil associado aos demais parâmetros da biometria compatíveis com a idade gestacional caracterizam fetos grandes para idade gestacional assimétricos 1. Por outro lado, a medida da circunferência abdominal (CA) menor que o nonagésimo percentil em dois exames sucessivos relaciona-se com fetos com peso adequado para idade gestacional ao nascimento 22. A CA medida pela ultrassonografia entre 37 e 42 semanas é mais sensível do que a medida da altura uterina para o rastreamento do peso do recém-nascido, quando avaliada uma semana antes do parto 23. A comparação entre os níveis séricos maternos de adipponectina, leptina e insulina de jejum e índice HOMA-IR e a medida do DBP, circunferências, cefálica e abdominal e pesos estimados e ao nascimento não demonstrou influencia destas substâncias no crescimento fetal, o que se deve provavelmente a maior influencia da glicemia, insulina e fatores de crescimento fetais no próprio crescimento 24. Medida do Líquido Amniótico A mensuração do líquido amniótico para cálculo do índice do líquido amniótico (ILA) tem sido bastante utilizada na assistência pré-natal. Apesar de confirmar uma associação entre diabeExperts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

tes tipo I da gravidez com o volume de líquido amniótico, nos estudos mais recentes ainda não há clareza sobre qual dos parâmetros metabólicos, materno ou fetal, estariam relacionados com o ILA. Gestantes diabéticas tipo I apresentam maiores ILA e níveis séricos de glicose e hemoglobina glicosilada na mãe e feto em comparação a gestantes não diabéticas 25. Entretanto, estudos recentes não demonstram correlação entre a média glicêmica e o ILA, em gestantes diabéticas tipo I e II 26. Em mulheres com diabete gestacional, há correlação entre o nível de glicose do liquido amniótico, o ILA e o peso do recém nascido 27. Considerações Finais Deste modo, a ultrassonografia de segundo e terceiro trimestres deveria ser utilizada para cálculo da idade gestacionais somente quando medidas mais eficientes e precisas como o CCN não estiverem disponíveis. A biometria fetal isolada na segunda metade da gestação em gestantes diabéticas pode induzir erros de cálculo da idade gestacional e, por isso, deve ser usada com parcimônia. A biometria fetal seriada no segundo e terceiro trimestres da gestação permitem, por sua vez, acompanhar o crescimento fetal e o diagnóstico mais precoce dos desvios do crescimento. Além disso, a medida do ILA permite inferir sobre o controle metabólico materno e fetal e, conseqüentemente, sobre o crescimento fetal. É, assim, ferramenta de grande utilidade na assistência pré-natal da mulher diabética. Referências

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EURP 2012; 4(1): 27-31


Artigo de Revisão

Avaliação ecocardiográfica do prolapso valvar mitral Echocardiographic evaluation of mitral valve prolapse Gisele Oliveira Ribeiro Gomes 1

O Prolapso da valva mitral é caracterizado por alterações degenerativas do tecido valvar. A valva apresenta-se espessada, com os folhetos redundantes e alongados. O quadro clínico é bastante variável, podendo ser caracterizado por sintomas inespecíficos como dor toracica atípica, arritmias, tonturas, fadiga entre outras, ou mesmo pacientes assintomáticos. Diversos critérios foram propostos para o diagnóstico ecocardiográfico do prolapso da valvar mitral. No início com o modo M, o bidimensional e atualmente, porém ainda pouco utilizado pelo alto custo, o modo 3D. O objetivo deste trabalho é, através de uma revisão bibliográfica, determinar os critérios ecocardiográficos mais utilizados para o diagnóstico do prolapso valvar mitral. Palavras-chave: Ecocardiografia; Valva Mitral; Prolapso das Valvas Cardíacas.

Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP)

1

Recebido em 19/01/2012, aceito para publicação em 25/02/2012. Correspondências para Gisele Oliveira Ribeiro Gomes. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: giribeiro@cardiol.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract The mitral valve prolapse is characterized by degenerative changes of the valve tissue. The valve has thickened, with elongated and redundant leaflets. The clinical presentation is highly variable and can be characterized by nonspecific symptoms such as atypical chest pain, arrhythmia, dizziness, fatigue, among others, or even asymptomatic patients. Several criteria have been proposed for the echocardiographic diagnosis of mitral valve prolapse. At the beginning with M mode, and currently the two-dimensional, but still little used by the high cost, the 3D mode. The objective of this work is, through a literature review to determine the most commonly used echocardiographic criteria for diagnosis of mitral valve prolapse. Keywords: Echocardiography; Mitral Valve; Heart Valve Prolapse.

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EURP 2012; 4(1): 32-34


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Gomes - Prolapso valvar mitral Introdução O prolapso da valva mitral é uma entidade clínica/ecocardiográfica reconhecida a mais ou menos 50 anos. Foi descrita pela primeira vez em 1963 por John B. Barlow. Clinicamente é caracterizada por um click sistólico acompanhado ou não de sopro. Tal patologia era erroneamente atribuído à cardiopatia reumática. Inicialmente o prolapso mitral apresentava-se com a patologia valvar mais frequente, atingindo cerca de 17% da população assintomática; com a análise ecocardiográfica, mais recentemente, essa porcentagem encontra-se em torno de 3% 1. Com o advento da ecocardiografia, especialmente o bidimensional, foi possível estabelecer melhor a avaliação anatômica e funcional da valva mitral. Ecocardiograficamente é definido como o abaulamento de estruturas da valva mitral para o interior do átrio esquerdo durante a sístole ventricular 1, 2. Deve-se lembrar que diferentes cortes avaliam porções distintas da valva e que o diagnóstico do prolapso pode ser realizado em um determinado corte e não seja visualizado em outros. Anatomia O funcionamento adequado da valva mitral depende de todas as estruturas que formam o complexo valvar que são: os folhetos, o anel, as cordoalhas tendíneas, os músculos papilares, o átrio e o ventrículo esquerdo. Anatomicamente a valva mitral é composta por dois folhetos: • O folheto anterior, aórtico ou septal apresenta uma pequena área de inserção no anel mitral (cerca de 1/3 da extensão do anel) e uma ampla extensão. • O folheto posterior ou mural tem característica oposta: com ampla área de inserção anular (2/3 do anel mitral) e pequena extensão, fazendo com que tal folheto apresente uma amplitude de movimento bem menor quando comparado ao folheto anterior. Pela classificação de Carpentier de 1983 3 os folhetos da valva mitral anterior e posterior se dividem respectivamente em 3 segmentos cada um (A1, A2, A3 e P1, P2, P3) que se correlacionam anatomicamente entre si. Nao é raro encontrar variações anatômicas desse padrão, no entanto, isso nao se traduz em anomalias valvares 1. Os Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

dois folhetos se separam por duas comissuras: póstero-medial e anterolateral. O sistema de sustentação valvar é constituido pelas cordas tendíneas e os músculos papilares. Os folhetos são sustentados pelas cordas tendíneas que são conectadas à face ventricular dos folhetos e ligadas a dois grupos de músculos papilares situados bem a baixo das comissuras. Um fator relevante para a avaliaçao do Prolapso Mitral é a chamada zona de coaptação, que é a linha do fechamento valvar, o local onde os folhetos se encontram quando a valva se fecha. Aspecto também importante é o anel mitral: uma estrutura rígida, fibrosa, com as bordas situadas em diferentes níveis craniocaudais; estrutura assimétrica e não plana 4. Etiologia O prolapso Mitral pode ser 1: 1. Primário: quando é a principal anomalia da valva, ou 2. Secundário: quando se relaciona a outras disfunções cardiovasculares, neurohormonais ou reumáticas. O prolapso dito primário ou idiopático se apresenta na maioria dos casos com alterações anátomo funcionais e alterações degenerativas que afetam o tecido ocorrendo acometimento mixomatoso da valva. Apresenta maior incidência familiar devido a transmissão autossômica dominante. Os folhetos encontram-se espessados, redundantes, com saliências (domos) que se projetam em direção ao átrio esquerdo durante a sístole ventricular. As cordoalhas são longas, podendo estar espessadas ou delgadas, sendo a ruptura uma complicação frequente. Os portadores do prolapso valvar mitral, são na grande maioria das vezes asssintomáticos. Quando apresentam sintomas, esses são bastante diversos e inespecíficos, tais como, dor precordial, fadiga, palpitações, dispnéia, entre outros. A evolução dos pacientes com prolapso mitral é na maioria das vezes benigna, mas podem ocorrer complicações graves (insuficiência mitral, acidentes cérebro- vasculares, arritmias graves e até morte súbita) 1. Diagnóstico Vários critérios foram propostos para o diagnóstico do prolapso valvar mitral. Inicialmente era utilizado o Modo M, no qual se observava a redundância das cúspides, o espessamento dos EURP 2012; 4(1): 32-34


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Gomes - Prolapso valvar mitral folhetos e o movimento mesotelesistólico posterior da valva. 4. Atualmente, o mais amplamente utilizado é a ecocardiografia bidimensional 4. Diversos cortes são utilizados para análise dos componentes da valva mitral 2. No corte apical quatro câmaras, são observadas, com mais facilidade, projeções que simulam alterações e, portanto a avaliação deve ser mais criteriosa nesta incidência. Nos cortes longitudinais (tanto longitudinal paraesternal como longitudinal apical) tais alterações são menos comuns; desta maneira, os cortes longitudinais são considerados mais específicos para o diagnóstico do Prolapso Valvar Mitral 1, 4. Define-se o diagnóstico de prolapso mitral no corte apical quatro câmaras, o movimento superior, de um ou mais componentes valvares, com medida superior a 5 (cinco) mm, com relação ao plano do anel mitral; desde que a borda de coaptação das cúspides esteja também deslocada no mesmo sentido e localizada, pelo menos, ao nível do plano anular 1, 2, 5. Considera-se anormal os deslocamentos sistólicos posteriores dos componentes valvares, com relação ao plano do anel valvar mitral, maiores que 2 (dois) mm nos cortes longitudinais 1, 5.

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Considerações finais O exame ecocardiográfico é considerado padrão ouro para o diagnóstico do prolapso valvar mitral, e é correto dizer que o diagnóstico de prolapso valvar mitral pode ser realizado em qualquer corte ecocardiográfico (longitudinal paraesternal, longitudinal apical, quatro câmaras, etc.) 1, 2, 4. É importante também não se esquecer de que a patologia é também clínica, que há uma incidência familiar aumentada da doença mixomatosa mitral e a ecocardiografia deve ser associada às evidências clínicas da Síndrome de Barlow. Faz-se necessário lembrar ainda de que em virtude do anel mitral ser uma estrutura complexa e tridimensional e da valva mitral ser composta por diversos segmentos o diagnóstico de prolapso da valva mitral dependerá do corte ecocardiográfico no qual se observa a porção anatômica valvar envolvida no processo da patologia e que isso ocorre de uma maneira assimétrica 1, 4. Referências

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Artigo de Revisão

Ultrassonografia e o câncer da tireóide Ultrasonography and thyroid cancer Antonio José Ribeiro Filho 1

Esta revisão descreve as características ecográficas dos nódulos da tireóide e o risco de câncer da tireóide. Os fatores predisponentes à formação de nódulos e suas diferentes formas de se apresentarem à ultrassonografia, são vistas com ênfase. A ultrassonografia é fácil de executar, disponível para a população brasileira, não envolve radiação ionizante e é facilmente combinado com citologia aspirativa com agulha fina (PAAF). Desta forma, a ultrassonografia de alta resolução aliada ao Doppler colorido, torna-se um modelo satisfatório para avaliação das características específicas e da natureza dos nódulos, enquanto a PAAF ajuda na precisão do diagnóstico. Este trabalho discute o papel da ultrassonografia no diagnóstico diferencial dos nódulos suspeitos e a indicação da realização de PAAF. Palavras-chave: Glândula Tireóide; Nódulo da Glândula Tireóide; Diagnóstico diferencial; Ultrassonografia.

Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP)

1

Recebido em 14/02/2012, aceito para publicação em 25/02/2012. Correspondências para Antonio José Ribeiro Filho. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: fertily@oi.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract This review describes the sonographic features of thyroid nodules and thyroid cancer risk. Factors predisposing to the formation of nodules and their different ways of presenting themselves to the ultrasound, are viewed with emphasis. Ultrasound is easy to implement, available for the Brazilian population, involves no ionizing radiation and is easily combined with fine needle aspiration cytology (FNAC). Thus, high resolution ultrasound combined with color Doppler is a suitable model for evaluation of the specific characteristics and nature of the nodules as FNAC help the accuracy of diagnosis. This paper discusses the role of ultrasonography in the differential diagnosis of suspicious nodules and the indication of performing FNAC. Keywords: Thyroid Gland; Thyroid Nodule; Diagnosis, Differential; Ultrasonography.

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Ribeiro Filho - Câncer da tireóide Introdução Muitas doenças da tireóide podem se apresentar clinicamente com um ou mais nódulos tireoidianos. A detecção de nódulos tornou-se mais comum com o uso generalizado da ultrassonografia e apesar de representarem problemas clínicos comuns e controversos, este método é o principal suporte para detectar e estabelecer o diagnóstico diferencial de nódulos, bem como servir de guia para a punção aspirativa com agulha fina (PAAF). Estima-se que cerca de 10% dos adultos possuem nódulos da tireóide palpáveis 1. Estudos epidemiológicos estimam que a incidência de nódulos da tireóide varie de 6,5% em estudos de exame físico e de pelo menos 50% dos estudos patológicos 2, com as mulheres sendo mais frequentemente afetadas que os homens. A ultrassonografia é muito mais sensível do que a palpação detectando nódulos em cerca de 41% da população e 48% de nódulos adicionais 3. Apesar de a doença tireoidiana nodular ser relativamente comum, o câncer tireoidiano é raro e representa menos de 2,5% de todas as neoplasias malignas 4. A American Cancer Society estimou mais de 37.000 novos casos de câncer da tireóide nos Estados Unidos em 2009 e a estimativa de óbitos por câncer de tireóide foi de apenas 0,2% do total 5. A exposição à radiação ionizante (importante fator de risco para carcinoma), deficiência de iodo, tireoidites, múltiplas síndromes neoplásicas endócrinas e hiperplasia benigna são as principais causas de formação nodular, aumentando o risco de câncer da tireóde 4 Novas tecnologias associadas à ultrassonografia aumentaram a sensibilidade na detecção do câncer da tireóide. Ainda que a maioria esmagadora dos nódulos tireoidianos seja benigna, o desafio clínico é distinguir os poucos nódulos malignos significativos dos muitos benignos e, assim, identificar os pacientes em que a excisão cirúrgica é realmente indicada, desta forma, estudos ecográficos de imagem e citologia de agulha fina (PAAF), são as principais ferramentas utilizadas pelo clínico 6. História clínica Pacientes com nódulo na tireóide deve ser avaliado com história clínica e exame físico completo. Elementos importantes da história clínica do paciente que aumentam a probabilidade de malignidade como radiação, síndromes genéticas, sexo masculino e achado ecográfico de um nódulo Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

hipoecóico deve levar a PAAF, mesmo na ausência de outras características importantes 4. Assim como, História de um parente de primeiro grau com câncer de tireóide deve ser cuidadosamente avaliada, principalmente ao considerar a ocorrência de câncer de tireóide familiar não medular. Câncer da tireóide A incidência do câncer da tireóide é baixa e, mesmo surgindo, é considerada indolente 4. Dados do programa do Instituto Nacional do câncer (SEER) dos Estados Unidos revelaram que em 20 anos a taxa de sobrevivência foi de 99% para pacientes com precoce diagnóstico e tratamento para carcinoma papilífero. Aqueles que não trataram imediatamente em 20 anos, a taxa de sobrevida foi de 97% 7. Os achados da literatura levam a uma seria reflexão, por parte dos especialistas, quais nódulos de fato devem ser observados ou abordados cirurgicamente. Discutiremos os achados ecográficos determinantes para esta orientação. Estudos de imagem Imagens nodulares da tireóide podem ser visibilizados pela TC (tomografia computadorizada) e por estudos de medicina nuclear 4. Todavia, a ultrassonografia com o uso de transdutores lineares de alta frequência (7,5 a 16 MHz) é hoje o método de imagem de escolha para avaliação dos nódulos da tireóide 6, muito precisa e sensível para detectar nódulos, dimensioná-los com precisão, identificar suas características, pode avaliar alterações parenquimatosas difusas, ausente de radiação ionizante, baixo custo, não invasivo, muito embora limitado em diferenciar tumores benignos e maligno. O estudo Power Doppler e Doppler colorido têm sido amplamente estudados como importantes coadjuvantes no diagnóstico de nódulo suspeito. Vários estudos mostraram que nódulos neoplásicos (adenomas e carcinomas) contêm sinais importantes de fluxo interno, por outro lado, nódulos císticos colóides são praticamente desprovidos de fluxo 8. No entanto, vários estudos têm demonstrado que índice de resistência (IR) e velocidade sistólica máxima (MSV) não devem ser usados como parâmetros únicos para diferenciar nódulo benigno de maligno 9.

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Ribeiro Filho - Câncer da tireóide Características ultrassonográficas dos nódulos tireoidianos A nomenclatura nódulo é usada para descrever uma condição patológica da glândula tireóide tanto para cistos quanto para massas sólidas. Os achados mais comuns são nódulos completamente císticos, podendo estes possuir colóides internos ou sangue, passando a se chamarem de cistos colóides e hemorrágicos respectivamente 4. A maioria dos nódulos sólidos da tireóide são benignos, chamados de adenomatóides, mas outros nódulos sólidos também poderão ser encontrados em Tireoidite de Hashimoto, os chamados hiperplásicos 10. Nódulos sólidos neoplásicos incluem adenomas foliculares benigno, carcinoma folicular, adenomas de células hurthle, carcinomas de células Hurthle, carcinoma papilar, carcinoma medular, carcinoma anaplásico, linfomas primário da tireóide e doença metastática 2. Durante o exame, o ultrassonografista deve descrever a posição de cada nódulo, suas medidas (longitudinal, ântero-posterior e transversal), ecotextura (sólido, misto ou cístico), ecogenicidade (anecóicas, isoecóicas, hipoecóicas e hiperecóicos), características das margens e presença de halo periférico, presença de calcificações internas (micro ou macro calcificações) e presença de linfonodos cervical. O achado de múltiplos nódulos deve ser visto com cautela, onde todos os nódulos devem ser avaliados quanto suas características benignas ou malignas 11. Tamanho do nódulo A literatura recomenda PAAF em todos os nódulos sólidos maiores que 1 cm 2. Nódulos menores de 1 cm podem ser acompanhados anualmente e ainda que tamanho não seja critério para benigno ou maligno, porém determina para decisão de biópsia. A ultrassonografia entra como uma grande aliada a PAAF em abordar nódulos não palpáveis e está associada a uma menor taxa de resultados falso-negativos 12. A PAAF está indicada também para situações de crescimento do nódulo, invasão extra capsular e presença de linfonodos cervicais suspeitos. Pacientes com história familiar de carcinoma medular ou paciente do sexo masculino também deve levar a PAAF. Principais características na abordagem dos nódulos A aparência e o tamanho do nódulo são as duas principais características para decidir se deve Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

ser aspirado por agulha fina e o nódulo puramente cístico é o único achado considerado benigno 4. Ainda que não haja nenhuma característica totalmente sensível e específica para o câncer 13, a combinação de vários fatores dentro de um padrão estabelecido será fundamental para triagem destes nódulos 14. Para os nódulos benignos, existem cinco modelos que tem sido demonstrado com alta especificidade 15 e para os nódulos suspeitos abordaremos os padrões ecográficos preocupantes que sugerem biópsia. Padrões associados à benignidade 1. Nódulos císticos com ou sem foco ecogênico interno Nódulos fluidos com menos de 10 mm, solitários ou múltiplos, são considerados benignos e acredita-se serem oriundos de hiperplasia nodular da tireóide levando a cistos colóides 14. Dentro destes cistos observamos pequenos focos ecogênicos formando reverberação posterior, conhecidos como cauda de cometa. 2. Padrão em favo de mel O padrão de favo de mel aparece como inúmeros cistos separados por finas septações 14 e não é considerado neoplásico. Utilizando transdutores de alta freqüência é possível observar, na imagem de favo de mel, focos ecogênicos internos e a maioria são avascular ou pobremente vascular 15. Estes focos ecogênicos não devem ser confundidos com micro calcificações, pois apenas correspondem a conexões das paredes finas dos cistos. Em um estudo, o aspecto morfológico de favo de mel foi 100% específico para hiperplasia nodular benigna 16. Em outro estudo, todos os 210 nódulos com o aspecto de favo de mel foram benignos e 196 dos 210 nódulos foram lidos como cisto colóide à luz da histopatologia 15. 3. Inúmeras pequenas nodulações Grande número de pequenos nódulos hipoecóicos em todos os lobos, separados por traves ecogênicas, é outro padrão de benignidade 14, sendo múltiplos folículos linfóides com envolvimento fibrótico. Segunda a literatura, este achado tem 95% de valor preditivo positivo para tireoidite de Hashimoto 17 e outros como hiperplasia nodular e adenomas folicular. Porém, 16% dos maiores nódulos são malignos, usualmente carcinoma papilífero e raramente linfoma. Sendo, portan-

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Ribeiro Filho - Câncer da tireóide to, uma incidência maior do que a população geral, devendo ser biopsiados 10. 4. Marcadamente hipercóico Um nódulo hiperecogênico ao ultrasom é considerado 100% específico para benignidade 15. Segundo vários autores, embora raros nódulos malignos serem hiperecóicos, este achado ecográfico deve pensar em benignidade. Este padrão pode ser um nódulo colóide ou tireoidite nodular focal de Hashimoto. Padrões ultrassonográficos suspeitos de malignidade 1. Nódulos sólidos hipoecóicos com discretos focos ecogênicos Mesmo sendo a ultrassonografia o método de escolha para o estudo de imagem para os nódulos tireoidianos, não se permite caracterizar um nódulo com aspecto maligno. Todavia, os achados ecográficos de hipoecogenicidade, predomínio de vascularização central à periférica, micro calcificações, margens irregulares e ausência de halo são aspectos que têm sido sistematicamente associados com malignidade. É consenso na literatura que nódulo hipoecóico com presença de micro calcificações está intimamente relacionado ao carcinoma papilífero 14. Comparando com os demais nódulos da glândula, é sabido que em 86 a 90% do carcinoma papilífero estes nódulos são hipoecóicos 18. Outros estudos mostraram que esta afirmação foi contundente para pequenos tumores de 8 a 15 mm, demonstrando que 87% desses tumores foram hipoecóicos 11. Ainda que hipoecogenicidade isoladamente não seja específico, pois um grande número de nódulos benignos têm aparência semelhante, a combinação com outra característica que tenha alta especificidade trará um alto padrão para PAAF. Especificidade de micro calcificações para malignidade é de 93 a 97% 11. A sensibilidade é menor, apenas em 42% dos carcinomas papilíferos que contem micro calcificações 18, porém o valor preditivo positivo para micro calcificações tem sido demonstrado em 70 a 71% 19. Durante a realização da ultrassonografia, micro calcificações não são visualizadas, porém ocorrendo agrupamento com sombra acústica posterior poderão ser vistos.

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2. Nódulos sólidos hipoecóicos com grosseira calcificação central O padrão ecográfico de hipoecogenicidade associado a grosseira calcificação central, deve recomendar biópsia aspirativa com agulha fina (PAAF). Embora este achado possa ser visto em nódulos císticos em observação, este padrão deve-se pensar em carcinoma papilífero ou medular 14. A grande maioria deste padrão ecográfico é carcinoma papilífero, levando em consideração a raridade do medular (3-5%). Recomenda-se o cuidado de avaliar ambos os lobos a busca de nódulos multicêntricos, diante do achado de calcificação grosseira central. Assim como, deve existir igual preocupação para carcinoma medular diante de um nódulo em sexo masculino. Portanto, a PAAF está recomendada diante de nódulo hipoecóico com calcificação grosseira central. 3. Nódulo sólido homogêneo ovalado com cápsula fina Estes nódulos sólidos se apresentam com ecotextura homogênea, são ovais e com fina cápsula. Tais lesões ainda podem ser isoecóicos, hipoecoicas ou hiperecoicas 14, sendo portanto difícil definir benignidade e malignidade. A literatura descreve hipoecogenicidade, halo e um maior tamanho do nódulo favoráveis a carcinoma folicular 20. No entanto, tais características ainda faltam especificidade e, portanto, a PAAF deve ser recomendada. A literatura é clara na indicação de lobectomia ou tireoidectomia diante de um diagnóstico citológico de lesão folicular, todavia, a mesma é insuficiente para excluir invasão vascular ou capsular, sendo estes o fator diferenciador entre adenoma folicular e carcinoma folicular (folicular, variante folicular e carcinoma papilífero). do

4. Sombra refratária nas bordas de um nódulo sóli-

A sombra refratária ocorre no momento de dois tecidos com diferentes sons de propagação de velocidades ao ângulo oblíquo a onda sonora. Uma sombra refratária na borda de um nódulo aumenta a possibilidade de ser maligno. Outros autores descrevem a falta de especificidade para este achado, bem como, aumento da vascularização central ou periférica, margens irregulares e presença ou não de halo pode ser visto em nódulos benignos ou malignos 4. EURP 2012; 4(1): 35-40


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Ribeiro Filho - Câncer da tireóide Recomendações das sociedades Diversas sociedades têm descrito diretrizes para orientar quando realizar biópsia de nódulo suspeito de tireóide. As recomendações são baseadas em diferentes posições conforme investigações científicas 1. O tamanho do nódulo e suas características são os pilares para estas orienta-

ções. As recomendações da Associação Americana de Tireóide (ATA) e da Sociedade de radiologistas em ultrassonografia (SUR) estão resumidas na tabela 1.

Tabela 1. Diretrizes para recomendações de punção aspirativa por agulha fina(PAAF) de nódulo da tireóide, critérios para biópsia segundo a Associação Americana de Tireóide (ATA) e Sociedade de Radiologistas em Ultrassonogafia (SUR). Tamanho (mm) Recomendação ATA Recomendação SUR 5-10 10-15 15-20

>20

PAAF se fatores de risco clínico e fatores sus- Nenhuma recomendação

peitos ultrassonográficos

PAAF se nódulo contém micro calcificações Fortemente considerar PAAF se nódulo contém

ou são sólidos

micro calcificações

PAAF se nódulo contém micro calcificações, é Fortemente considerar PAAF se nódulos conter

sólido ou é tanto sólido e cístico com fatores micro calcificações ou é sólido com calcificações suspeitos

grosseiras

para o puramente cístico

micro calcificações, é sólida com calcificações

PAAF para todos os nódulos com exceção Fortemente considerar PAAF se nódulo contém

grosseiras, tanto é sólido e cístico ou é cístico com nódulo mural ou substancial crescimento

Embora vários cenários não estejam presentes nesta tabela como o valor do TSH e presença de vários nódulos similares na glândula, por outro lado, esta prevê orientações para a maioria dos nódulos. Conforme orientação da ATA, a PAAF deve ser realizada se o valor do TSH é elevado ou normal e outros critérios ecográficos estão presentes. Assim como, um baixo nível de TSH deve fazer cintilografia. As recomendações da ATA na tabela 1 são para nódulos iso ou hipofuncionantes em pacientes com TSH baixo ou pacientes TSH normal ou baixo. As duas sociedades recomendam biópsia de linfonodos anormais à ultrassonografia. Nenhum dos critérios de orientações já descrito pelas diversas sociedades é totalmente aceito, embora vários estudos tenham tentado validar a eficácia do guidelines. Esta polemica tem sido principalmente para os pacientes com pequeno volume de câncer diferenciado da tireóide. Considerações finais Nódulo da tireóide é um dos achados patológicos mais freqüentes da glândula, freqüentemente pode ser diagnosticada clinicamente, mas muiExperts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

tas vezes os achados clínicos podem ser inconclusivos. Nestes casos os estudos por imagem associado a punção por agulha fina guiado pelo ultrasom, podem ser úteis na conclusão diagnóstica. A ultrassonografia é um exame de baixo custo e fácil acesso, quando comparada aos demais métodos de imagem. Com o advento de equipamentos de alta resolução, a ultrassonografia se tornou o método de imagem de primeira escolha nos casos suspeitos de nódulos ligados ao câncer. O ultrassonografista deve estar preparado para realizar um exame que proporcione ao médico assistente, dados confiáveis para uma tomada de decisões. Isto somente será possível com os conhecimentos das novas tecnologias do ultrasom ligado ao estudo Doppler color e dos critérios ecográficos utilizados pelas associações competentes. Apesar de vários consensos terem sido publicados acerca das características suspeitas de nódulos e câncer da tireóide, ainda serão necessários outros estudos apropriados para diferentes regiões ou países.

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Artigo de Revisão

Acompanhamento ultrassonográfico de mioma uterino durante a gestação Ultrasonography follow-up of uterine leiomyoma during pregnancy Rebeca Saliba Ferreira Bortone 1

Os tumores benignos mais comuns em mulheres com idade fértil são os leiomiomas uterinos. A incidência tem aumentado nas últimas décadas como consequência do adiamento da gestação. Apesar de danos materno-fetais ocorrer apenas em pequena parcela das pacientes, a presença de miomas durante a gestação pode causar implantação inadequada do embrião, dor, anemia, compressão fetal, restrição de crescimento fetal, trabalho de parto prematuro e descolamento prematuro de placenta. A literatura sugere seguimento com ultrassonografia mensal e estudo Doppler iniciando-se na vigésima sexta semana. O objetivo é a avaliação da circulação feto-placentária e eventual presença de acretismo placentário, a qual é mais comum após miomectomia. O tratamento ideal da leiomiomatose na gestação é clínico, podendo ser indicada ressecção apenas se houver dor persistente ao uso de medicação, como em caso de torção de miomas pediculados, ou se houver sangramento, infecção, degeneração, dor ou retenção urinária em leiomiomas cervicais. Miomectomia no momento do parto deve ser evitada por aumentar o risco de hemorragia. A detecção de miomatose uterina ao exame ultrassonográfico na gravidez, deve ser avaliada com muito critério e sempre levando em conta o quadro clínico de cada paciente. Palavras-chave: Mioma; Complicações na Gravidez; gravidez, Ultrassonografia. Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP)

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Recebido em 16/02/2012, aceito para publicação em 28/02/2012. Correspondências para Rebeca Saliba Ferreira Bortone. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: rebecabortone@bol.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract The most common benign tumors in women of childbearing age are uterine leiomyomas. The incidence has increased in recent decades as a consequence of postponing pregnancy. Although maternal-fetal damage occurs only in small number of patients, the presence of fibroids during pregnancy can cause poor implantation of the embryo, pain, anemia, fetal compression, fetal growth restriction, premature labor and placenta previa. The literature suggests follow-up with Doppler ultrasound and monthly beginning in the twentysixth week. The objective is the evaluation of fetal-placental and possible presence of accretion, which is more common after myomectomy. The ideal treatment of leiomyomata during pregnancy is clinical, resection may be indicated only if there is persistent pain medication, as in the case of torsion of pedunculated fibroids, or if there is bleeding, infection, degeneration, pain, or urinary retention in cervical leiomyomas. Myomectomy at delivery should be avoided to potentiate the risk of bleeding. The detection of uterine fibroids by ultrasound in pregnancy should be evaluated with great care and always taking into account the clinical condition of each patient. Keywords: Myoma; Pregnancy Complications; Ultrasonography.

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Bortone - Mioma uterino durante a gestação Introdução Os tumores benignos mais comuns em mulheres são os leiomiomas uterinos, ocorrendo em 20 a 30% das mulheres em idade reprodutiva, com incidência ainda incerta na gravidez, variando de 0,1% a 12,5% 1. Sendo assim, na obstetrícia contemporânea, está cada vez mais comum o manejo da gestante com miomatose, principalmente pelo diagnóstico prévio que as futuras gestantes possuem e tendência crescente do adiamento da gravidez 2. Modificações do útero miomatoso com a gravidez Devido à hipertrofia endometrial, maior vascularização local e alterações dos receptores locais aos esteróides, há um aumento da possibilidade de crescimento do leiomioma durante a gravidez. Por outro lado, outros fatores favorecem a degeneração desses nódulos como: fatores de crescimento local, a própria atividade uterina no trabalho de parto, mecanismos endócrinos relacionados à lactação (insulina, hormônio lactógenoplacentário e esteróides), além da involução uterina no pós-parto retornando à condição circulatória anterior. A degeneração benigna é a mais comum (vermelha e hialina). A degeneração sarcomatosa, maligna e mais temida, felizmente só é observada em 0,5% dos leiomiomas 3. Geralmente a literatura tende a subestimar a prevalência de miomas na gestação e superestimar as complicações atribuídas a eles. É dominante a observação na literatura médica que a maioria dos miomas não apresenta mudança de volume significativa durante a gravidez, ao contrário da opinião popular, e aqueles que crescem tendem a expandir principalmente no primeiro trimestre 4. Além disso, idade materna avançada, índice de massa corpórea e paridade estão aparentemente correlacionados à variação volumétrica dos miomas na gravidez 5. Miomas versus infertilidade O papel do mioma na infertilidade e na implantação do embrião ainda não está claro. Algumas teorias são aceitas, como a de que miomas submucosos causam distorção na cavidade endometrial, podem alterar o transporte de gametas e embriões por obstrução dos óstios tubários ou por alteração da contratilidade uterina, além de que a compressão endometrial pode prejudicar a Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

implantação do embrião. Miomas parecem alterar a vasculatura uterina por expressão anormal de fatores angiogênicos e inflamatórios. Fatores envolvidos no processo de fibrose também poderiam ter efeito prejudicial 6. Complicações no curso da gravidez Gestação com miomatose é de alto risco 7 podendo causar consequências de gravidade variada. Os relatos da literatura são conflitantes sobre as chamadas complicações de miomas na gravidez, não havendo ainda dados suficientes para o estabelecimento da estratégia de gestão ideal 2. Embora a maioria das gestações não seja afetada pela presença de leiomiomas, temos que ter maior atenção aos submucosos de grande volume e aos retroplacentários por se associarem a um risco aumentado de complicações incluindo a dor (devido a sua degeneração), sangramento vaginal, descolamento prematuro de placenta, restrição de crescimento intra-uterino e trabalho de parto prematuro 4. Leiomiomas cervicais aumentam a possibilidade de cesariana e apresentação anômala 8, sendo que a apresentação pélvica é a mais comum 7. A prevalência de miomas cervicais clinicamente evidentes em uma gravidez é inferior a 1% 9. Controle no pré-natal Freqüentes avaliações ultrassonográficas são necessárias durante a gravidez visando verificar o número, localização e alteração volumétrica dos nódulos miomatosos uterinos, assim como estabelecer se há ou não contato com a placenta 8. O monitoramento do crescimento fetal deve ser realizado, atentando para o risco da compressão fetal, principalmente por leiomiomas submucosos do corpo uterino 3. Sugere-se controle ecográfico mensal e, a partir da vigésima sexta semana, complementação pelo estudo Doppler com o intuito de não somente avaliar a circulação feto-placentária, como também a eventual presença de acretismo placentário, mais freqüente após miomectomia 3. Tratamento A miomectomia na pré-concepção com objetivo de melhorar o resultado reprodutivo deve ser considerada individualmente, apenas para aquelas mulheres com história de perdas gestacionais recorrentes, com grandes miomas submucosos e EURP 2012; 4(1): 41-43


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Bortone - Mioma uterino durante a gestação nenhuma outra causa justificável de abortamento de repetição 4. Degeneração ou torção do pedículo pode causar dores. Devemos, sempre que possível, controlar uma complicação do mioma clinicamente e considerar sua ressecção no futuro 8. Miomectomia durante a gestação deve ser reservada para miomas subserosos ou pediculados com dor não responsiva à terapia clínica e que estão no primeiro ou segundo trimestre da gravidez 4. Pode ser indicada intervenção cirúrgica em leiomioma cervical se houver sangramento, infecção, degeneração, dor ou retenção urinária. Exame ultrassonográfico e ressonância nuclear magnética ajudam a elucidar a suspeita clínica 9. Miomectomia no momento do parto está associada a aumento da morbidade por hemorragia, devendo ser prosseguida com cautela apenas em pacientes selecionados 4. Considerações finais Embora esteja sedimentada a idéia de que a leiomiomatose possa trazer complicações na gravidez em uma pequena parcela dos casos, devemos na prática clínica, sempre orientar as pacientes sobre os principais riscos de sua gestação com o alarde necessário. A ultrassonografia é um instrumento precioso para diagnóstico e controle da leiomiomatose e do crescimento fetal, porém o bom senso deve

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sempre prevalecer. Frente a um achado ultrassonográfico anormal, é importante avaliar cuidadosamente se isso seria a explicação para os sintomas da paciente ou se representaria apenas um achado incidental 10. Referências

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