EURP 2010 (3) Jul-Set

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ISSN 2175-2338

www.eurp.edu.br

Volume 2 n. 3 – Jul/Set 2010


EURP

Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Editor Científico Wellington de Paula Martins Editor Executivo Francisco Mauad Filho

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Augusto César Garcia Saab Benedeti

Jorge Garcia

Carlos César Montesino Nogueira

Jorge Renê Arévalo

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José Eduardo Chúfalo

Daniela de Abreu Barra

Luis Guilherme Nicolau

Fernando Marum Mauad

Procópio de Freitas

Francisco Maximiliano Pancich Gallarreta

Simone Helena Caixe

Gerson Cláudio Crott

Secretária Executiva Amanda Aparecida Vieira Fernandes

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Expediente Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives – EURP

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Publicação oficial da EURP Escola de Ultra-Sonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto

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Daniela de Abreu Barra

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Fernando Marum Mauad

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Francisco Mauad Filho

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Francisco Maximiliano Pancich Gallarreta

Procópio de Freitas

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Simone Helena Caixe

Jorge Garcia

Wellington de Paula Martins

Jorge Renê Garcia Arévalo


SUMÁRIO EURP v. 2, n. 3, p 109-163 – Jul/Set 2010

ISSN 2175-2338

Miomectomia durante a gestação e o parto

109

Myomectomy during pregnancy and cesarean section Ana Cristina C Fernandez , Wellington P Martins, Francisco Mauad Filho

Cardiomiopatia hipertrófica: ecocardiografia no diagnóstico e 112

prognóstico Hypertrophic cardiomyopathy: echocardiography in diagnosis and prognosis Danillo C Estevam, Wellington P Martins

Diagnóstico da adenomiose por métodos de imagem

117

Diagnosis of adenomyosis by imaging Elaine M A Borges, Wellington P Martins

O uso da translucência nucal no rastreamento de Síndrome de 122

Down Nuchal translucency on screening for Down syndrome Helena C S de Souza, Francisco Mauad Filho, Wellington P Martins

O valor da Dopplervelocimetria da artéria cerebral média na 128

gestação de alto risco The value of middle cerebral artery Doppler velocimetry in high-risk pregnancy Thaís B V de Castro , Francisco Mauad Filho, Wellington P Martins

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Ultrassom na esteatose hepática

133

Liver steatosis and ultrasound Júlio A Mânica, Wellington P Martins

Importância da ecografia no diagnóstico de massas anexiais na 140

gestação Ultrasound importance in the diagnosis of adnexal masses in pregnancy Nádia B Vasconcelos, Wellington P Martins

Ultrassom na avaliação do endométrio pós-menopausa

146

Ultrasound in postmenopause endometrium avaluation Rosane C G de Oliveira, Celene M L da Silva, Carolina O Nastri, Wellington P Martins

Características ultrassonográficas da dengue

150

Sonographic features of dengue Aldino B de Oliveira, Carolina O Nastri, Wellington P Martins

Ultrassonografia com contraste no diagnóstico das principais 154

lesões focais hepáticas Contrast-enhanced ultrasonography in the diagnosis of main focal liver lesions Rogério S Castro, Carolina O Nastri, Wellington P Martins

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Artigo de Revisão Miomectomia durante a gestação e o parto Myomectomy during pregnancy and cesarean section Ana Cristina C Fernandez 1, Wellington P Martins 1, 2, Francisco Mauad Filho1,2

O leiomioma é uma patologia benigna que acomete mais freqüente nas mulheres acima dos 30 anos de idade. Atualmente está ocorrendo um aumento da associação dos miomas na gestação em razão da tendência atual de se postergar a primeira gestação. Durante o período gestacional, a presença de miomas uterinos aumenta o risco de complicações como abortamento, descolamento ou retenção placentária e restrição do crescimento fetal. As indicações de miomectomia durante a gestação são a ocorrência de dor abdominal severa, síndrome do mioma doloroso, crescimento rápido do tumor e nódulo localizado no segmento uterino inferior distorcendo o sítio placentário. No momento do parto, podem ser ressecados os miomas subserosos ou pediculados e aqueles localizados no segmento uterino, inferior devendo ser evitados os miomas fúndicos, volumosos e intramurais. Palavras chave: Mioma; Gravidez, cirurgia; Ultrassonografia.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 19/03/2010, aceito para publicação em 04/05/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartins@gmail.comFone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract The leiomyoma is a benign condition that occurs more frequently in women above 30 years of age. Currently there has been an increase in the association of fibroids in pregnancy because of the current tendency to delay the first pregnancy. During pregnancy, the presence of uterine fibroids increases the risk of complications such as miscarriage, placental retention or detachment and fetal growth restriction. The indications for myomectomy during pregnancy are the occurrence of severe abdominal pain, painful fibroid syndrome, rapid tumor growth and nodule located in the lower uterine segment distorting the placental site. Upon delivery, there may be resected pedunculated or subserosal fibroids and those located in the uterine lower segment; surgery should be avoided on fundic, intramural or bulky myomas. Keywords: Ultrasonography.

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Myoma;

Pregnancy,

surgery;

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Fernandez et al – Miomectomia na gestação e parto Introdução O leiomioma uterino é uma tumoração pélvica sólida benigna que acomete mulheres em idade reprodutiva, principalmente acima dos 30 anos de idade, com uma incidência de 40% das mulheres, podendo ser este valor subestimado, é de 3 a 9 vezes mais freqüente na raça negra (Parker, 2007). O diagnóstico é feito associando se o exame clínico com o exame de imagem, facilitados atualmente pela melhoria dos equipamentos ultrassonográficos, principalmente pelos transdutores endovaginais de alta frenquencia. Com a modernidade a mulher está postergando a idade da maternidade, elevando a associação de leiomioma e gestação, com uma taxa de 0,1 a 3,9% das gestantes 1. A detecção do mioma na gestação é baixa, pois clinicamente a tumoração é reportada quando seu tamanho é maior que 5 cm, em 42% dos casos e somente 12,5% quando menor que 5 cm 2. Influência da gestação sobre a miomatose. A gestação tem um efeito variado e inesperado sobre o crescimento do mioma, dependente da genética, de fatores de crescimento na circulação sanguínea e de receptores localizados no mioma. Observou-se em um estudo realizado em Los Angeles que em 69% dos casos dos miomas na gestação não ocorreu aumento e em 31% aumentaram seu tamanho principalmente no período compreendido até 10 semanas de gestação. Concluíram que o crescimento do mioma na gestação não está relacionado com seu volume inicial e seu decréscimo ocorre após 4 semanas do parto3. O mioma na gestação pode ser assintomático ou causar sintomas clínicos dependentes do tamanho e da localização do tumor, podendo provocar abortamento, descolamento ou retenção placentária, restrição do crescimento fetal, síndrome da compressão fetal e trabalho de parto prematuro. Em 5 % dos casos pode ocorrer degeneração do mioma na gestação, relacionado com a obstrução venosa tumoral periférica, levando a dor abdominal intensa. Quando indicar miomectomia na gestação A miomectomia é indicada em três condições selecionadas: (1) na dor abdominal severa não responsiva a antiinflamatórios não hormonais; (2) no rápido crescimento da tumoração causando dor; (3) dependendo de sua localização 4. Segundo Phelan 5, a dor abdominal pode ocorrer devido à alteração degenerativa do mioma em 5 a 8% dos casos, caracterizando a síndrome do mioma doloroso que compreende dor associada a náuseas, vômitos, febre, ocorrendo principalmente no segundo trimestre na Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

gestação. Há casos relatados de dor decorrente do encarceramento do mioma em hérnia umbilical e por torção do pedículo do mioma subseroso 6. O mioma localizado no segmento inferior uterino distorcendo o sítio placentário e distando mais que 5 mm do endométrio tem sua indicação cirúrgica. Estudo realizado na Grécia por Lolis, com 622 gestantes com miomas, observou que 2,6% destas tiveram complicação necessitando de internação e 2.1% foram submetidas à miomectomia. Nos casos de miomectomia receberam internação por 72 hs, com uterolítico, retirando-se o dreno intra-abdominal no primeiro dia pós operatório. Após a alta fizeram seguimento ultrassonográfico de 2/2 semanas. Este caso de abortamento foi relatado na paciente com 40 anos de idade cujo mioma se localizava em segmento uterino inferior e intramural, com um volume de 1570 g. Concluíram que as duas complicações mais comuns da miomectomia na gestação eram aborto e hemorragia 7. Miomectomia na cesariana Ainda é muito controvérsia a realização da miomectomia na cesariana, é um dilema de muitos obstetras por medo de hemorragia intra e após cirurgia com conseqüente indicação de histerectomia, assim muitos são treinados a evitar a miomectomia durante a cesariana. Realizado levantamento de estudos, nas quais os autores indicaram a miomectomia dependente da localização, do número e tamanho dos miomas e sua proximidade com grandes vasos. Estudos comparativos entre dois grupos os que foram submetidas à miomectomia durante a cesariana e apenas cesariana. Kant , em 2007, relatou 9 casos de miomectomia na cesariana, dois miomas eram submucosos e 7 intramurais. Foi realizada histerorrafia em dois planos, com fio Vicryl 0, com administrado ocitocina intra e pós operatória associados antibióticos e analgésicos. Observando variação de apenas 10% dos valores de hemoglobina. Michalas et al 8, relataram 18 casos de miomectomia na gestação, sendo 8 localizados em segmento inferior uterino. Não observaram complicações. Ehigieba 6 relatou 25 casos, sendo mais freqüentes os miomas subserosos, intramurais e submucosos por ordem decrescente, 12 não tiveram complicações e os demais constataram anemia. Kwawukume 9 relatou 12 casos de miomectomia na cesariana sem complicações. Roman relatou 111 casos 10, 24% eram intramurais, 24% subserosos, 25% pediculados e os demais com localizações múltiplas. Concluindo que não havia diferença significativa em relação à EURP 2010; 2(3): 109-111


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Fernandez et al – Miomectomia na gestação e parto hemorragia intra-operatória, tempo operatório, estados febris e estadias hospitalares. Kaymark 11 relatou 40 pacientes operadas, com miomas maiores que 8,1 cm, notando uma diferença de hemorragia de 12.5% nas cesarianas com miomectomia comparado a 11.3% naquelas com cesariana relacionando este valor com valores hematométricos iniciais com o pós-operatório. Li 12 estudou 1242 gestantes divididas em 3 grupos: 200 submetidas à cesariana, 145 de cesarianas com miomas, 51cesarianas com miomectomia. Observando que no grupo em que se realizou a

miomectomia, as pacientes tinham idades maiores às demais, com partos mais precoces e miomas múltiplos. Não foi realizado miomectomia nos casos de miomas em região cornual que eram únicos. Nos estudos, os autores observaram que não houve diferenças em relação à morbidade, febre no período pós cirurgia, tempo de estadia no hospital, necessidade de transfusão e em relação a variações significativas dos valores de hematócrito no pósoperatório entre os grupos controles (Tabela 1).

Tabela 1. Dados da literatura revisada, indicando número de miomectomias realizadas na cesariana relacionada com suas complicações. Adaptado de Cooper, 2005 1 e Hassiakos, 2006 4. Autores Miomectomia na cesariana Histerectomia puerperal Transfusão sanguínea 13

9

3

0

6

25

0

0

4

47

0

0

Exacoustos (1993) Ehigiegba (2001)

Hassiakos (2006)

A miomectomia na cesariana apresenta o benefício de reduzir custos de internação, menor exposição aos anestésicos para as pacientes. Trata se de um procedimento seguro quando realizado por cirurgiões hábeis, dependente da localização, principalmente nos casos de miomas subserosos ou pediculados e os localizados no segmento uterino inferior que dificulta a histerotomia segmentar transversa. Deve ser evitada nos casos de miomas volumosos, fúndicos, intramurais e os localizados na região cornual podendo comprometer a fertilidade futura 4. Tipo de parto deverá seguir padrões obstétricos excetuando se nos casos de miomas volumosos ou cervicais 5. Considerações finais A miomectomia deve ser realizada na gestação em casos específicos como na dor abdominal severa não responsiva ao tratamento clínico, no crescimento rápido do mioma causando desconforto e quando localizado no segmento inferior uterino distorcendo o sitio placentário. Sua indicação no parto dependerá de sua localização e de se volume, evitando se o procedimento principalmente em miomas volumosos fúndicos, intramurais e nos localizados em região cornual.

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Referências

1. Cooper NP, Okolo S. Fibroids in pregnancy--common but poorly understood. Obstet Gynecol Surv 2005; 60(2): 132-138. 2. Parker WH. Etiology, symptomatology, and diagnosis of uterine myomas. Fertil Steril 2007; 87(4): 725-736. 3. Rosati P, Exacoustos C, Mancuso S. Longitudinal evaluation of uterine myoma growth during pregnancy. A sonographic study. J Ultrasound Med 1992; 11(10): 511-515. 4. Hassiakos D, Christopoulos P, Vitoratos N, Xarchoulakou E, Vaggos G, Papadias K. Myomectomy during cesarean section: a safe procedure? Ann N Y Acad Sci 2006; 1092(408-413. 5. Phelan JP. Myomas and pregnancy. Obstet Gynecol Clin North Am 1995; 22(4): 801-805. 6. Ehigiegba AE, Ande AB, Ojobo SI. Myomectomy during cesarean section. Int J Gynaecol Obstet 2001; 75(1): 21-25. 7. Lolis DE, Kalantaridou SN, Makrydimas G, Sotiriadis A, Navrozoglou I, Zikopoulos K, et al. Successful myomectomy during pregnancy. Hum Reprod 2003; 18(8): 1699-1702. 8. Michalas SP, Oreopoulou FV, Papageorgiou JS. Myomectomy during pregnancy and caesarean section. Hum Reprod 1995; 10(7): 1869-1870. 9. Kwawukume EY. Myomectomy during cesarean section. Int J Gynaecol Obstet 2002; 76(2): 183-184. 10. Roman AS, Tabsh KM. Myomectomy at time of cesarean delivery: a retrospective cohort study. BMC Pregnancy Childbirth 2004; 4(1): 14. 11. Kaymak O, Ustunyurt E, Okyay RE, Kalyoncu S, Mollamahmutoglu L. Myomectomy during cesarean section. Int J Gynaecol Obstet 2005; 89(2): 90-93. 12. Li H, Du J, Jin L, Shi Z, Liu M. Myomectomy during cesarean section. Acta Obstet Gynecol Scand 2009; 88(2): 183-186. 13. Exacoustos C, Rosati P. Ultrasound diagnosis of uterine myomas and complications in pregnancy. Obstet Gynecol 1993; 82(1): 97-101.

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Artigo de Revisão Cardiomiopatia hipertrófica: ecocardiografia no diagnóstico e prognóstico Hypertrophic cardiomyopathy: echocardiography in diagnosis and prognosis Danillo C Estevam 1, Wellington P Martins 1, 2

A cardiomiopatia hipertrófica caracteriza-se pela presença de hipertrofia de pelo menos um segmento miocárdico, na ausência de doenças capazes de levar a essa alteração. Tem origem genética, com várias mutações já identificadas, e sua prevalência é relativamente comum (0,2%). A fisiopatologia é complexa, multifatorial e o quadro clínico pode variar desde casos assintomáticos, porém com risco de morte súbita, até casos com sintomatologia exuberante e refratária ao tratamento. Diante da suspeita clínica, o ecocardiograma é o exame de eleição, que frequentemente faz o diagnóstico e ainda pode fornecer dados adicionais de grande valor na difícil tarefa de identificar os pacientes com maior risco de evolução desfavorável. Palavras chave: Cardiomiopatia hipertrófica; ecocardiograma; diagnóstico; prognóstico.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 29/07/2010, aceito para publicação em 02/09/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartins@ultrassonografia.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract Hypertrophic cardiomyopathy is characterized by the presence of hypertrophy of at least one myocardial segment in the absence of diseases that could lead to this change. It is a genetic condition, with several mutations already identified, and its prevalence is relatively common (0.2%). The pathophysiology is complex, multifactorial and the clinical presentation may vary from asymptomatic but at risk of sudden death, to cases with exuberant symptoms refractory to treatment. Given the clinical suspicion, echocardiography is the method of choice, which often makes the diagnosis and also may provide additional data of great value in the difficult task of identifying patients at increased risk of adverse outcomes. Cardiomyopathy, Keywords: Echocardiography; Diagnosis; Prognosis.

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hypertrophic;

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Estevam & Martins – Cardiomiopatia hipertrófica Introdução A cardiomiopatia hipertrófica (CMH) é uma doença cardíaca de origem genética, caracterizada pela presença de hipertrofia miocárdica na ausência de condições associadas capazes de produzi-la. Desde a sua primeira descrição, no ano de 1958 1, vem sendo motivo de vários estudos, e estima-se que afete 1:500 indivíduos – o que confere uma prevalência de 0,2% 2. A taxa de mortalidade é baixa, entre 0,5 e 1%, semelhante à da população em geral. 3. É a mais freqüente entre as cardiopatias de origem genética, sendo a forma de transmissão mais comum a autossômica dominante 4. Várias mutações já foram identificadas, em torno de 450, envolvendo pelo menos 20 genes, 5 explicando em parte a grande variação fenotípica encontrada, indo desde casos com hipertrofia importante e precoce até casos com hipertrofia tardia ou mesmo escassa. Por apresentar custo elevado, a análise genética vem sendo utilizada apenas no campo da pesquisa e não com a finalidade diagnóstica e prognóstica. Entretanto, alguns autores já preconizam seu uso para diagnóstico definitivo nos casos duvidosos e nos pacientes com mutações conhecidas e que ainda não manifestaram a doença 6. A forma de apresentação clínica é bastante heterogênea, desde formas assintomáticas, passando pela sintomatologia clássica (angina, dispnéia de esforço e síncope) até a morte súbita, que pode ser a primeira manifestação da doença. Cerca de 40% das vítimas desse evento dramático são assintomáticas 7. Disfunção diastólica, isquemia mocárdica, obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo, regurgitação mitral, fibrilação atrial e disfunção autonômica são fundamentalmente os mecanismos fisiopatológicos responsáveis pelo quadro clínico. O ecocardiograma geralmente faz o diagnóstico de CMH e ainda pode ser útil na avaliação prognóstica. Sendo assim, é essencial que, diante da suspeita clínica, seja realizado um exame minucioso e sistemático, utilizando todas as técnicas do método. Ecocardiograma no diagnóstico A CMH geralmente é suspeitada na presença de um sopro cardíaco, história familiar positiva, sintomas sugestivos (angina, dispnéia de esforço e síncope) e/ou alterações eletrocardiográficas como ondas Q anormais e sinais de sobrecarga ventricular esquerda. A partir daí, o ecocardiograma é solicitado e confirmase ou não a presença de hipertrofia ventricular, que pela própria definição, é elemento fundamental para o diagnóstico. Na avaliação inicial, dois aspectos básicos chamam a atenção: tipo e padrão da hipertrofia e obstrução da via de saída de VE. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Hipertrofia ventricular esquerda (HVE) Qualquer segmento miocárdico pode estar envolvido e o diagnóstico é feito quando há hipertrofia ≥ 15mm em alguma região ventricular 7. Outro achado que auxilia no diagnóstico é a relação entre espessura da parede septal e parede posterior > 1,3 em normotensos ou > 1,5 em hipertensos 8, característica do padrão assimétrico. Na grande maioria das vezes (95%), a hipertrofia é do tipo assimétrica, envolvendo principalmente o septo 9. Entretanto, é importante avaliar todos os segmentos, incluindo músculos papilares e ventrículo direito. Apesar do diagnóstico ser fácil em presença de alterações típicas, alguns indivíduos com genótipo positivo podem apresentar espessura da parede normal ou próxima do normal (mutações na troponina T), reduzindo muito a sensibilidade e a especificidade do exame. Nesse caso de mutação conhecida e no rastreamento de familiares de indivíduos afetados, a técnica do Doppler tecidual (TDI) ganha destaque, podendo auxiliar no diagnóstico de doença subclínica. As velocidades sistólicas estão atenuadas, apesar da FE preservada mesmo em segmentos sem hipertrofia evidente 10. Além disso, também pode auxiliar na avaliação prognóstica, o que será comentado posteriormente. Movimento anterior sistólico (MAS) e obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo (VSVE) O MAS da valva mitral é detectado no modo M, onde se observa movimento abrupto do folheto anterior/cordoalhas em direção ao septo, podendo ou não haver o contato. No início sua ocorrência era considerada patognomônica de CMH, mas estudos subseqüentes demonstraram que estava presente também em outras condições, inclusive em pacientes sem doença cardíaca 11. Estima-se que 30 a 60% dos pacientes com CMH apresentam MAS 2, e quando ocorre o contato do folheto com o septo, a conseqüência hemodinâmica é o aparecimento de um gradiente na VSVE, considerado obstrutivo quando > 30 mmHg, em repouso ou provocado. Nessa situação, o modo M da valva aórtica mostra fechamento abrupto na meso ou telessístole. Apenas uma minoria de pacientes (25%) apresenta gradiente obstrutivo em repouso, porém vale ressaltar que muitos só o desenvolvem durante testes provocativos. Maron et al demonstraram que, durante esforço, 70% dos pacientes desenvolviam gradiente significativo, sendo que em metade dos casos, apenas com a manobra de Valsalva foi possível provocá-lo 12. Dessa forma, pode-se considerá-la uma doença primordialmente obstrutiva. EURP 2010; 2(3): 112-116


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Estevam & Martins – Cardiomiopatia hipertrófica A partir dessa avaliação, para fins didáticos, classifica-se a CMH em assimétrica (95%) ou simétrica (5%); obstrutiva (70%) - persistente, latente, lábil - ou não obstrutiva 7. Ecocardiograma na avaliação prognóstica Uma vez estabelecido o diagnóstico, alguns parâmetros merecem ser minuciosamente analisados, pois podem fornecer valiosas informações de significado prognóstico, e serem determinantes para a decisão da terapêutica. Hipertrofia ventricular esquerda (HVE) A correlação entre espessura miocárdica maciça e prognóstico foi divergente em alguns estudos. Spirito et al 13 mostraram um risco de morte súbita significativamente maior nos pacientes com espessura ≥ 30mm, 18,2/1000 pacientes, quando comparados com aqueles em que a espessura estava entre 10 e 15 mm, 0/1000 pacientes. Posteriormente, Olivotto et al 14 não constataram nenhuma correlação entre espessura parietal máxima e mortalidade. O risco de morte súbita foi influenciado pelo número de fatores predisponentes e não pela magnitude da hipertrofia por si só. Obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo (VSVE) A importância prognóstica não está relacionada com a magnitude do gradiente obstrutivo. A sua simples ocorrência foi preditora de maior risco de morte súbita e falência cardíaca progressiva 15. Portanto, é de suma importância que se realize ao menos a manobra de Valsalva durante o exame de pacientes com CMH, pois, como já citado, com essa simples manobra se observa uma sensibilidade de 50% em induzir gradientes latentes 12. Outro fato que chama a atenção é a endocardite infecciosa, que acomete em torno de 5% dos pacientes, que geralmente apresentam obstrução de VSVE 16. Como foi relatado, o principal mecanismo responsável pela obstrução da VSVE é o MAS. Porém uma minoria de pacientes pode apresentar gradientes em outros níveis cavitários. Um detalhe interessante é que a presença de gradiente obstrutivo médiocavitário está associada à formação de aneurisma apical 9, e consequentemente ao maior risco de arritmia e evento embólico, com impacto prognóstico. Daí a importância da “varredura” de toda a cavidade para detecção do nível da obstrução. Volume do átrio esquerdo (AE) Uma das características marcantes da CMH é a disfunção diastólica, que pode se manifestar mesmo antes do aparecimento da HVE. Como conseqüência, Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

eleva-se a pressão de enchimento ventricular, transmitida para o AE, resultando em maior tensão na parede e no aumento dessa cavidade. A medida do diâmetro AE tem seu valor, porém o cálculo do volume por superfície corpórea tem maior sensibilidade prognóstica 17. Losi et al 18 relataram que pacientes que aumentavam o volume AE em mais de 3ml/ano durante seguimento tinham pior prognóstico, independente do volume inicial encontrado, que poderia estar até normal. Insuficiência mitral A insuficiência mitral está quase sempre presente nas formas obstrutivas e o mecanismo é dependente do MAS. O grau do refluxo é variável e não está relacionado com a gravidade do MAS, mas com a falha de coaptação do folheto anterior - de curta excursão-, e posterior, de pequeno comprimento 19, gerando um jato com direção posterior ou central. Já nas formas não obstrutivas, onde não há MAS, a regurgitação ocorre em menor proporção e decorre de anormalidades próprias da valva, como o prolapso e a perfuração do folheto, por exemplo. Nesse caso, o jato tem direção anterior. No trabalho de Candell et al 20 , a magnitude da regurgitação mitral teve significado prognóstico. Pacientes com insuficiência igual ou maior que moderada apresentaram pior evolução. Função sistólica Geralmente a função sistólica está preservada ou supranormal quando avaliada pelos métodos tradicionais (Modo M: fração de ejeção e fração de encurtamento). O encontro de disfunção sistólica representa pior prognóstico, principalmente quando ocorre o processo de transformação com afinamento da parede e dilatação da cavidade. No estudo de Harris et al, esse processo de remodelamento esteve associado com um aumento de 11% no risco de morte anual 21. Recomenda-se uma avaliação detalhada da função sistólica na fase inicial do diagnóstico, acrescentando o uso do método biplanar de Simpson para cálculo da fração de ejeção e o Doppler tecidual para análise das velocidades sisto-diastólicas do anel mitral. O encontro de velocidade sistólica < 4cm/s é preditor independente de hospitalização e morte 22. Função diastólica Aumento da massa do VE, fibrose e isquemia miocárdica são responsáveis pela redução da complacência e aumento da rigidez da câmara, que marcadamente acomentem os pacientes com CMH. O resultado é a mudança do padrão do fluxo transmitral. Desta forma, uma análise acurada da função diastólica deve ser realizada, através do Doppler pulsado e tecidual. EURP 2010; 2(3): 112-116


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Estevam & Martins – Cardiomiopatia hipertrófica A pressão de enchimento ventricular ainda está normal nas fases inicias da doença, nas quais se observa apenas alteração do relaxamento, mas aumenta progressivamente com o avanço da hipertrofia e/ou fibrose. Dos parâmetros do Doppler, a relação E/E’> 15 tem apenas modesta correlação com a pressão AE medida por métodos invasivos 23. Melhores resultados foram obtidos com a relação entre velocidade da onda E e a velocidade de propagação (Vp) do fluxo transmitral no modo M colorido 24. O padrão restritivo (Relação E/A ≥ 2; tempo de relaxamento isovolumétrico <60 ms; tempo de desaceleração da onda E < 150ms) é um importante preditor de curso clínico em portadores de cardiomiopatia dilatada e seu valor prognóstico também tem sido relatado na CMH 25. De acordo com o trabaho de Biagini et al, o encontro de padrão restritivo, quer na avaliação inicial ou durante seguimento, relacionou-se com aumento em seis vezes no risco de evolução para estágios finais, e em três vezes e meia no risco de morte súbita 26 . Novos métodos Strain Rate, técnica derivada do Doppler tecidual, propõe-se a analisar o grau de deformidade da fibra miocárdica, comparando as velocidades de movimentação entre dois pontos adjacentes separados por uma distância (d) em cm. Avalia-se, desta forma, o movimento regional do miocárdio, tanto o componente radial quanto o longitudinal da contratilidade, além de eliminar a influência da movimentação de tecidos sadios adjacentes, como acontece no Doppler tecidual. Pacientes com CMH apresentam redução da deformação do septo, especialmente no segmento médio, proporcional ao grau de hipertrofia 27. Speckle tracking, uma modalidade mais recente, utiliza o modo bidimensional. Por programas de computador, permite avaliar a deformidade de inúmeros pontinhos brilhantes do miocárdio, quadro a quadro, em tempo real, não sofrendo influência do ângulo como nas técnicas que utilizam efeito Doppler. Por meio desta técnica pode-se avaliar o grau de dessincronia ventricular, muito comum em pacientes com CMH, e que ocorre mesmo sem alterações no ECG de superfície. D’Andrea et al demostraram correlação entre o grau de dessincronia com o grau de hipertofia septal e presença de obstrução de VSVE 28. Considerações finais O ecocardiograma é um método de fácil acesso, baixo custo e, com freqüência, permite fazer o Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

diagnóstico de CMH. A grande limitação acontece nos fenótipos com hipertrofia tardia ou escassa, nos quais a análise genética pode der necessária. A importância do exame não se resume apenas em estabelecer o diagnóstico. Através de suas várias técnicas, pode-se obter informações importantes relacionadas ao prognóstico, representando uma ferramenta a mais na árdua tarefa de estratificar os pacientes com maior risco de evolução desfavorável. Referências

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EURP 2010; 2(3): 112-116


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Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

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Artigo de Revisão Diagnóstico da adenomiose por métodos de imagem Diagnosis of adenomyosis by imaging Elaine M A Borges 1, Wellington P Martins 1, 2

A endometriose é caracterizada pela presença de tecido endometrial fora da cavidade uterina. Trata-se de uma doença ginecológica benigna, alvo de muitas investigações em decorrência das incertezas etiológicas, da alta prevalência na população feminina e elevada morbidade. A ultrassonografia e a ressonância magnética constituem os dois principais métodos diagnósticos não invasivos, sendo o diagnóstico definitivo dado apenas pelo exame histopatológico do útero. O diagnóstico prévio à cirurgia através de métodos com boa acurácia é de fundamental importância à prática médica, podendo determinar a necessidade de histerectomia ou permitindo o tratamento conservador. A preservação do útero torna-se ainda mais importante durante o menacme em vista da preservação da fertilidade. Palavras chave: Ultrassonografia; Imagem por Ressonância Magnética; adenomiose.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 05/07/2010, aceito para publicação em 02/09/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartins@ultrassonografia.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract Endometriosis is characterized by the presence of endometrial tissue outside the uterine cavity. It is a benign gynecological disease, the subject of many investigations due to the etiological uncertainties, the high prevalence in the female population and high morbidity. Ultrassonography and MRI are the two main noninvasive diagnostic methods - the definitive diagnosis is made only by the histopathologic examination of the uterus. The use of methods with good accuracy is of fundamental importance to medical practice, and may determine the need for hysterectomy or conservative treatment. The preservation of the uterus becomes even more important during the reproductive age in order to preserve fertility. Ultrasound; Keywords: imaging; Adenomyosis.

Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Magnetic

resonance

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Borges & Martins – Imagem da adenomiose Introdução A adenomiose é ginecopatia benigna caracterizada pela presença de glândulas e estromas endometriais na intimidade do miométrio, associada ou não à hipertrofia e hiperplasia deste, ocorre mais comumente em mulheres entre 40 e 50 anos de idade 1 . Pode ser assintomática, assim como estar associada a alguns sinais e sintomas: menorragia, metrorragia, dismenorréia progressiva, útero de tamanho aumentado, dor pélvica crônica e dispaureunia. O quadro clínico, muitas vezes limitador das atividades habituais da mulher, é passível de resolução definitiva somente por meio da histerectomia 2. O diagnóstico da adenomiose é sugerido, pela anamnese e exame físico, em mulheres na quarta e quinta década de vida que já tiveram filhos ou sofreram cirurgias sobre o miométrio e apresentam alterações clínicas como menorragia, dismenorréia e aumento do volume uterino. O diagnóstico definitivo somente é firmado mediante a análise histopatológica do tecido miometrial obtido, usualmente, após a histerectomia 3. Estas mesmas alterações clínicas podem ser vistas em outras condições como leiomioma, endometriose, pólipos endometriais. Aproximadamente 650 mil histerectomias são realizadas por ano nos Estados Unidos, das quais 20% têm como única indicação a hipermenorragia 4. A prevalência da adenomiose, de acordo com artigos publicados em séries cirúrgicas, varia de 5% a 70%. A taxa de diagnóstico pré-operatório da adenomiose com base no quadro clínico é pobre de 2,6% a 26% 4. Somente na última década, os exames de ultrassonografia endovaginal passaram a ser utilizados com o objetivo de tentar diagnosticar a adenomiose. Esse exame complementar vem alcançando taxas de sensibilidade e especificidade de até 89%. Além disso, tem mostrado acurácea, em diagnosticar a adenomiose, semelhante à da ressonância magnética, exame considerado como o mais fidedigno, todavia mais dispendioso e menos acessível 2. O emprego de métodos pré-cirúrgicos que demonstrem boa validade em diagnosticar a adenomiose é de fundamental importância à prática médica, pois teremos a oportunidade de evitar tratamentos ineficazes, optando-se pela histerectomia quando a doença estiver presente ou tratamento conservador na sua ausência 2. Fisiopatologia Adenomiose é um diagnóstico histopatológico e depende da presença de glândulas endometriais e/ou estroma abaixo da junção endomiometrial. Não há acordo entre os patologistas na profundidade Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

necessária de infiltração para o diagnóstico da adenomiose. Alguns estudos consideram a penetração da infiltração de 0,5 a 0,75mm e outros consideraram de 2,0 a 2,5mm 5. A adenomiose pode ser localizada, difusa ou focal no miométrio. Nos casos leves estará presente apenas na parede miometrial e muitas vezes apenas em pequenas áreas. Em casos mais avançados pode se apresentar como uma massa localizada no útero ou como edema difuso do útero. Além disso, pode também apresentar-se como um adenomioma. O diagnóstico de adenomiomas não só exige a presença de nódulo de agregados de glândulas e estroma endometrial no miométrio, mas também uma hipertrofia circunscrita do miométrio. Adenomiomas são mais difíceis de serem distinguidos dos miomas 5. A ressonância magnética e a ultrassonografia endovaginal tem sido descritas como eficientes para o diagnóstico, porém ainda há confusão na terminologia usada para diferenciar adenomiose focal e adenomioma 5. O diagnóstico histopatológico de adenomiose (padrão-ouro) é realizado quando, na amostra do tecido miometrial, são encontrados glândulas e estroma endometriais, distando, no mínimo, 2,5mm da junção endométrio-miométrio, ou quando se encontra agregado nodular circunscrito de músculo liso e glândulas endometriais circundadas por hipertrofia miometrial com ou sem estroma (adenomioma) 2. Imagens ecográficas da ultrassonografia endovaginal Os sinais ecográficos de adenomiose devem ser diagnósticos durante o exame em tempo real. As características da adenomiose vistas ao ultrassom endovaginal definem a localização e quantidade de glândulas endometriais e estroma no miométrio e alterações típicas de hipertrofia e hiperplasia do miométrio 6. Adenomiose é freqüentemente diagnosticada pela presença de três ou mais critérios 6, 7 ultrassonográficos : heterogeneidade, ecogenicidade aumentada ou diminuída, lacunas anecóicas e cistos miometriais. A presença de cistos miometriais em uma área definida, com ecotextura pouco alterada são altamente específicos para adenomiose, estão presentes em 40-60% dos casos de adenomiose 6. Quando os cistos não estão presentes, a presença de áreas hipoecóicas e heterogêneas podem ser necessárias para o diagnóstico de adenomiose. Na diferenciação com mioma o uso do Doppler irá auxiliar. Nos casos de mioma os vasos estão localizados na sua circunferência, na EURP 2010; 2(3): 117-121


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Borges & Martins – Imagem da adenomiose adenomiose os vasos seguem seu curso normal vertical no miométrio 8. Cistos miometriais são definidos como áreas anecóicas de 1-7 mm de diâmetro 9 . Miométrio heterogêneo é definido pela presença de área miometrial de margens indistintas com aumento ou diminuição da ecogenicidade. Útero globoso ou assimétrico foi definido pelo seu aumento regular com assimetria miometrial que pode ser relacionado com leiomioma. Adenomiose não pode ser diagnosticada se estes critérios não forem cumpridos 5 . Doppler colorido pode ser utilizado para distinguir entre cisto miometrial e um componente vascular, e entre leiomioma e adenomiose focal. Adenomiose localizada e adenomioma são caracterizadas pela ausência de fluxo ou pela presença de vasos atravessando o miométrio hipertrófico 9.

Uma metanálise publicada em 2009, que revisou 15 estudos mostrou características diversas nos achados ultrassonográficos da adenomiose. As alterações mais observadas foram: ecotextura miometrial heterogênea, útero globoso e aumentado de volume, assimetria das paredes miometriais anterior e posterior, estrias lineares ecogênicas subendometrial, indefinição da junção endométriomiométrio, presença de cistos miometriais 1. Um trabalho publicado em 2000 que comparava achados ultrassonográficos de adenomiose com o diagnóstico histopatológico (Tabela 1), evidenciou como achados mais específicos nódulos ecogênicos subendometriais, assimetria do miométrio, estrias lineares subendometriais 4.

Tabela 1. Sensibilidade (S), especificidade (E), valor preditivo negativo (VPN) e valor preditivo positivo (VPP) dos principais achados ecográficos. Adaptado de Atri, 2000 4.

Critério ultrassonográfico

S (%)

E (%)

VPN(%)

PPV(%)

53

83

81

55

Predominantemente hipoecoico

60

82

83

58

Heterogêneo

35

76

74

38

Estrias lineares sub-endometriais

37

92

78

67

Junção endométrio-miométrio mal definida

45

83

78

53

Nódulo na junção endométrio-miométrio

22

92

74

52

Nódulos ecogênicos sub-endometriais

32

96

77

76

Miométrio assimétrico

23

94

75

67

Útero globoso

43

79

77

46

Cisto sub-endometrial Ecotextura miometrial difusa anormal

Características da adenomiose à ressonância nuclear magnética A presença de proliferação desordenada das células miometriais mais internas – hiperplasia da zona juncional – pode ser focal ou difusa 10. O espessamento da zona juncional, que é o sinal característico da hipertrofia muscular observado na adenomiose, também pode ser visto à ressonância. As mudanças na zona juncional podem os primeiros sinais da adenomiose: o tecido endometrial heterotópico pode ser visto como pequenos focos de alta intensidade na zona juncional. Em casos suspeitos, este sinal tem alta especificidade no diagnóstico de adenomiose, porém pode ser visto apenas na metade dos casos 5. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

A acurácia da RM para o diagnóstico da adenomiose depende das seqüências utilizadas para a formação da imagem e deve ser uma seqüência ponderada em T2 11. Além disso, as armadilhas comuns são as contrações uterinas e tumefações uniformes hormônio dependente da zona juncional 5. Reinhold et al 12 estabeleceram uma espessura máxima da zona juncional (JZmáx) de 12mm, o mais ideal valor de corte para o diagnóstico da adenomiose em mulheres na pré e pós menopausa. O valor de corte ideal de 12 mm também foi encontrado em outros dois estudos, mas resultou em menor precisão diagnóstica e critérios adicionais tiveram que ser usados 13. EURP 2010; 2(3): 117-121


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Borges & Martins – Imagem da adenomiose A espessura da zona juncional depende dos níveis hormonais, por isso impressões subjetivas de irregularidades da zona juncional são comumente usadas para o diagnóstico de adenomiose, apesar de os critérios objetivos serem preferíveis. A relação JZmáx/miométrio total maior que 40% tem sido utilizado, mas não é útil nos casos com coexistência de miomas, que pode chegar a esse nível, mesmo em pacientes normais, sem adenomiose. A diferença entre o máximo e o mínimo de espessura, que mede o

grau de irregularidade da zona juncional, pode ser preferível, e uma diferença maior que 5mm foi melhor marcador diagnóstico de adenomiose que JZmáx em mulheres na pré menopausa. Os critérios para identificação da adenomiose usando MRI foram estabelecidos, mas como eles são largamente dependentes de critérios subjetivos, estudos mais aprofundados poderiam melhorar estes critérios 14 (Tabela 2).

Tabela 2. Sensibilidade (S), especificidade (E), valor preditivo positivo (VPP), valor preditivo negativo (VPN) e acurácia (A) dos critérios utilizados na ressonância magnética para o diagnóstico de adenomiose. Adaptado de Bazot, 2001 9.

Critério

S (%)

E (%)

VPP (%)

VPN (%)

A (%)

97,5

81,8

72,5

72,5

47,5

98,8

95,0

79,0

81,7

3. Zona juncional (JZ) visível com um valor limite de 12 62,5

96,3

89,3

83,7

85,0

1. Aumento uterino homogêneo regular sem leiomioma 22,5 definido 2. Sinal de alta intensidade de ponto miometrial

mm e/ou a presença de sinal de baixa intensidade mal definido na área miometrial 4. JZ Max/miométrio > 40%

65,0

92,5

81,3

84,0

83,3

5. Combinação de critérios 2, 3, 4

77,5

92,5

83,8

89,2

87,5

Realce de imagens ponderadas em T1 após injeção de 35,7

96,4

83,3

75,0

76,2

gadolíneo Considerações finais A definição de um método simples, seguro e acurado para o diagnóstico da adenomiose é questão relevante na ginecologia. Embora as manifestações clínicas da adenomiose sejam bem conhecidas não há critério de diagnóstico clínico objetivamente definido e consensualmente aceito. No caso da ultrassonografia, por sua vez, trata-se de exame complementar simples, não invasivo e pouco oneroso, que vem se firmando como método promissor para este fim. Entre os critérios ultrassonográficos o cisto miometrial é o mais sensível e específico para o diagnóstico de adenomiose. A grande limitação do método é a falta de treinamento dos médicos ultrassonografistas, que devem ter o conhecimento prévio da patologia e assim fazer o diagnóstico diante das alterações vista a ecografia. Quanto à ressonância nuclear magnética os critérios diagnósticos ainda precisam ser estabelecidos em estudos com maior verificação histopatológica. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Referências

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Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

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Artigo de Revisão O uso da translucência nucal no rastreamento de Síndrome de Down Nuchal translucency on screening for Down syndrome Helena C S de Souza1, Francisco Mauad Filho1,2, Wellington P Martins 1, 2

As anomalias cromossômicas interferem negativamente no curso da gestação e no desenvolvimento fetal. Entre as anomalias cromossômicas mais freqüentes, destaca-se a trissomia do cromossomo 21 ou síndrome de Down (SD), considerada como a principal causa genética de deficiência mental. O diagnóstico pré-natal da SD pode ser realizado através da biopsia de vilo corial ou de amniocentese, entretanto, o emprego desses métodos acarreta no aumento do risco de abortos. A fim de minimizar os riscos envolvidos, é possível utilizar métodos de rastreamento para determinar o risco individual para SD. Entre as opções disponíveis, destacam-se os métodos ecográficos, tais como a espessura da translucência nucal (TN) que, em associação com outros marcadores, pode identificar cerca de 95% dos casos de SD, com índice de falso-positivo abaixo de 5%. Embora a ultrassonografia não possa ser considerada como um método diagnóstico, estudos indicam que a medida da TN pode ser utilizada como um importante marcador para o rastreamento de SD no primeiro trimestre de gestação, especialmente quando seu uso é associado a outros marcadores de risco. Palavras chave: Rastreamento; Medição da translucência nucal; Síndrome de Down; Ultrassonografia.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 24/01/2010, aceito para publicação em 10/09/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartinsltrassonografia.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Chromosomal abnormalities adversely affect the course of pregnancy and fetal development. Among the most frequent chromosomal abnormalities, the 21 trisomy, or Down syndrome (DS), is considered the main genetic cause of mental deficit. Prenatal diagnosis of DS might be performed through chorionic villus biopsy or amniocentesis, however, the use of these methods leads to increased risk of miscarriages. To minimize the risks involved, it is possible to use screening methods to determine the individual risk for SD. Among the available options, we highlight the measurement of nuchal translucency(NT) thickness by ultrassonography that, in association with other markers, can identify about 95% of DS cases with false-positive rate below 5 %. Although ultrasound should not be considered as a diagnostic tool, studies indicate that NT measurement can be used as an important marker for the screening of DS in the first trimester of pregnancy, especially when its use is associated with other risk markers. Screening; Nuchal translucency Keywords: measurement; Down syndrome; Ultrasonography.

Abstract

Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

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Souza et al. – Rastreamento da síndrome de Down Introdução Anomalias cromossômicas interferem negativamente no curso da gestação e no desenvolvimento fetal, sendo consideradas como as principais causas de inviabilidade fetal, morte perinatal e nascimento de crianças portadoras de deficiência mental. O diagnóstico pré-natal dessas anomalias pode ser realizado através de métodos invasivos, como a biopsia de vilo corial ou de amniocentese. No entanto, o emprego desses métodos acarreta no aumento do risco de abortos, estimado em cerca de 1%. Devido ao alto risco envolvido, os testes diagnósticos para anomalias cromossômicas são indicados apenas para gestantes pertencentes aos grupos com elevado risco para o desenvolvimento de cromossomopatias (gestante com idade superior a 35 anos e mulheres com gestações prévias de fetos com trissomias); as gestantes que não se enquadram nos critérios descritos acima podem se beneficiar de método de rastreamento de anomalias cromossômicas para determinar o risco individual 1. O rastreamento de anomalias cromossômicas fetais tem sido encorajado por diversas instituições de pesquisa e associações profissionais envolvidas na atenção à saúde de gestantes. De acordo com o American College of Obstetrician and Gynecologist (ACOG), os rastreamentos realizados no primeiro e segundo trimestre de gestação apresentam resultados efetivos e devem ser oferecidos as gestantes a fim de identificar prováveis casos de cromossomopatias 2-5. Entre os principais critérios utilizados no rastreamento de casos de anomalias cromossômicas, destacam-se os marcadores ecográficos, tais como: translucência nucal (TN), ducto venoso, osso nasal; além de marcadores bioquímicos, α como: fetoproteína, hCG total, fração livre de β-hCG e PAPPA. Estes marcadores podem ser utilizados para identificar grupos de maior risco de ocorrência de trissomias, em especial, da trissomia do cromossomo 21, também conhecida com síndrome de Down (SD) 3, 5 . Embora a ultrassonografia não possa ser utilizada como um método diagnóstico para identificar casos de aneuploidia, estudos indicam que a medida da TN pode ser utilizada como um importante indicador para o rastreamento de anomalias cromossômicas em fetos no primeiro trimestre de gestação. Existem fortes evidências de que o aumento da espessura da TN entre a 10ª e 14ª semanas de gestação está associado à ocorrência de trissomia do cromossomo 21 entre outras aneuploidias 6-10. Tecnicamente, a TN pode ser definida como o acúmulo de fluido entre o periósteo da coluna cervical Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

e a pele fetal, sem septos em seu interior, visualizado entre a 10ª e 14ª semanas de gestação através de imagens translúcidas visíveis ao ultra-som. Sua origem morfológica e etiológica, entretanto, permanecem incertas, podendo estar associada à maior perfusões de fluido durante o desenvolvimento cerebral ou devido a ajustes hemodinâmicos durante o desenvolvimento cardiovascular 11, 12. Assim, a medida da TN pode ser considerada como uma importante ferramenta para detecção de alterações cromossômicas, entretanto, sua eficiência no rastreamento de possíveis casos de SD e outras aneuploidia depende da precisão do equipamento de ultrassom, da habilidade e motivação do examinador e da associação com outros indicadores de risco 6, 13-15. Histórico da Síndrome de Down A trissomia do cromossomo 21 ou “Síndrome de Down” (SD) pode ser considerada como a mais freqüente causa genética de casos de deficiência mental. A primeira descrição da SD historicamente é atribuída ao pesquisador Édouard Onésimus Séguin (1812-1880) que, em 1846, publicou um estudo em que registrava a presença de características físicas comuns em portadores de um tipo de deficiência mental freqüente em uma determinada região da Europa. Em 1866, John H. Langdon Down, influenciado pelas teorias genéticas mendelianas, publicou um estudo no qual classificou pacientes com deficiência mental com base em características étnicas (Etíope, Malaios, Americanos e Mongóis); de acordo com esse estudo, Down detalhou e classificou o conjunto de características físicas, inicialmente descritas por Séguim, como “cretinismo do tipo mongol”. Embora os estudos realizados por Down já tenham sugerido o envolvimento de fatores genéticos na ocorrência desse tipo de deficiência mental, foi apenas em 1932 que P. J. Waardenburg postulou que o chamado “cretinismo do tipo mongol” era causado por uma anomalia cromossômica. Desde então diversos pesquisadores contribuíram com estudos para identificar o tipo de anomalia cromossômica envolvida, até que em 1959, os estudos realizados por Lejeune et al. elucidaram o envolvimento de fatores genéticos na ocorrência dessa deficiência mental, provando que a alteração cromossômica consistia na trissomia do cromossomo 21, e sua expressão fenotípica passou a ser identificada como “Síndrome de Down” 16. Rastreamento De acordo com Gekas, Bujold et. al. 17, as principais metodologias de rastreamento eficazes na EURP 2010; 2(3): 122-127


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Souza et al. – Rastreamento da síndrome de Down identificação de casos de SD podem ser classificadas em: 1) Testes integrados: consistem na avaliação conjunta de indicadores de risco no primeiro trimestre (TN e PAPP-A) e no 2 trimestre (α-fetoproteína, hCG total, fração livre de β-hCG e inibina-A), neste caso, a análise final é realizada, de forma conjunta, no segundo trimestre, ao final dos testes. 2) Rastreamento seqüenciais: consiste na avaliação de indicadores de risco no primeiro trimestre (TN e PAPP-A) e encaminhamento para testes diagnósticos no segundo trimestre, apenas para os casos classificados como positivo para o risco de SD. 3) Rastreamento contingenciais: consiste na avaliação de indicadores de risco no primeiro trimestre (TN e PAPP-A), categorizando as gestantes em baixo risco, risco intermediário e alto risco, de acordo com esse método, as gestantes classificadas com baixo não devem continuar com a pesquisa de anomalias cromossômicas, gestantes classificadas com risco intermediário devem realizar testes no segundo trimestre, para avaliação integrada dos dados, e para as gestantes com alto risco para SD são oferecidos os testes diagnósticos. 4) Triplo teste: consiste na avaliação de marcadores bioquímicos no segundo trimestre. Entre os diferentes tipos de métodos diagnósticos, o método considerado com melhor desempenho e melhor custo-efetividade para rastreamento populacional de casos de SD é o rastreamento do tipo contingencial 17. Ultrassonografia Estudos mostram que imagens ultrassonográficas são capazes de identificar expressões fenotípicas características da SD, tais como: espessura da TN, hipoplasia nasal, atresia duodenal, encurtamento femural, cardiopatias, especialmente alterações no septo atrioventricular, entre outras. Szabo e Gellen (1990) foram os primeiros pesquisadores a associarem o acúmulo de fluido na nuca de fetos como um potencial marcador para a ocorrência de SD. Posteriormente, Nicolaides, Azar et al., (1992) avaliaram a medida da TN em fetos de 10 a 14 semanas de gestação e verificaram que a medida de TN ≥ a 3 mm no primeiro trimestre de gestação estava associada à anomalias cromossômicas fetais, podendo ser utilizada como marcador ultrassonográfico de tais anomalias 1, 2, 18. Associação de marcadores A idade materna é um importante preditor de risco para SD. Estudos indicam que a associação da medida da TN com idade materna superior a 35 anos melhora Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

a eficiência dos rastreamento de casos de SD, uma vez que a associação desses dois marcadores apresenta elevada sensibilidade para casos positivos 2, 6, 19, 20. A aplicação de outros marcadores, em associação com a TN, mostrou-se também importantes na determinação do risco fetal de SD. A ausência do osso nasal e as concentrações de marcadores bioquímicos fetais e maternos podem contribuir para melhorar a acurácia do rastreamento para SD 6, 20-22. Estudos indicam que existe uma forte correlação entre a ausência do osso nasal e a presença de SD no período entre 11 semanas e 13 semanas e 6 dias de gestação. Imagens ultrassonográficas fetais em três dimensões (3D) mostram que a estrutura óssea do nariz fetal é composta por dois ossos que, nesta fase do desenvolvimento fetal, não estão completamente fechados, formando um espaço que pode ser medido. A medida desse espaço superior ou igual a 0,6 mm corresponde à ausência do osso nasal 22. De acordo com esses achados, a ausência de osso nasal, em associação à medida de TN e concentrações séricas maternas livres de β-hCG e PAPP-A podem identificar mais de 95% dos casos de SD, com índices de falsopositivo abaixo de 5%. Entanto, os pesquisadores alertam que as imagens em 3D foram fundamentais para a análise do resultado e que imagens obtidas em 2 dimensões (2D) não demonstraram a mesma eficiência 20, 22. Um estudo prospectivo 23 com 15.030 gestantes avaliou o risco de SD entre a 11a e 14ª semanas gestacionais mostrou que o rastreamento foi mais efetivo quando combinou dados de idade materna, TN fetal e níveis séricos de β-hCG e PAPP-A. De acordo com os dados observados, os níveis maternos de βhCG encontrados em gestantes com fetos afetados pela SD foram, em média, duas vezes maiores do que a dosagem encontrada em gestantes de fetos sem alterações; os dados observados também indicaram que a dosagem de PAPP-A mostrou-se elevada em gestantes com fetos com SD, especialmente quando dosados entre a 10-13ª semanas de gestação, indicando que estes marcadores são úteis no rastreamento de SD, quando associado á medida de TN. Esses dados são semelhantes aos encontrados por outros grupos ao avaliarem o uso de marcadores bioquímicos em associação a TN em mulheres com gestações gemelares 23, 24. Independente dos indicadores utilizados observase que o controle da qualidade na avaliação de medidas de TN tem se mostrado imprescindível, em virtude do impacto do resultado do rastreamento sobre o desfecho da gestação 6, 7, 9, 25.

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Souza et al. – Rastreamento da síndrome de Down

Figura 1. Critérios de qualidade da medida da translucência nucal estudados por Herman, 1998 19.

Controle de qualidade da medida da TN A fim de assegurar a qualidade das imagens e contribuir para análises criteriosas, desde 1997, o Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG) recomenda o uso de controles de qualidade na medida de TN. Seguindo essa orientação, o Fetal Medicine Foundation (FMF) estabeleceu valores de referência para avaliar a qualidade das medidas de TN que consiste na análise de 10 imagens selecionadas pelo operador, comparadas com um padrão de referência médio de medidas de TN e CCN. Os critérios definidos pela FMF para a análise da qualidade das imagens são: corte sagital, ampliação da imagem, posição da cabeça, posição do caliper na Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

espessura máxima da transluscência subcutânea e via de acesso (abdominal/transvaginal) 6, 15. Em 1998, Herman et al. 19 utilizaram o padrão de referência proposto pelo FMF e desenvolveram um método de avaliação de medidas de TN no primeiro trimestre de gestação. Este método consiste em atribuir valores para determinar a qualidade das imagens de TN de acordo com os seguintes critérios: tipo de corte (oblíquo:0, médio-sagital:2); localização do caliper (deslocado:0, adequado:2), borda da pele (exclusivamente da nuca:0, nuca e dorso:2); tamanho da imagem (insatisfatório:0, satisfatório:1); amnio (não visível:0, visível:1) e posição da cabeça (fletido/hiperextendido: 0, reto: 1). A qualidade da EURP 2010; 2(3): 122-127


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Souza et al. – Rastreamento da síndrome de Down imagem, medida através da somatória dos valores atribuídos a cada critério, foi classificada em 4 grupos: excelente (8-9), razoável (4-7), intermediário (2-3) e inaceitável (0-1). A Figura 1 apresenta a coleção de imagens utilizadas para avaliar cada critério e a respectiva pontuação atribuída 19. Mais recentemente, em 2007, um estudo avaliou oito parâmetros de qualidade na medida da TN e concluiu que os aspectos que, qauando realizados de

forma adequada eram melhores na predição de SD: visualização da imagem em corte sagital, visualização da pele e posição da cabeça 15. Os oito critérios estudados foram: corte sagital, posição do caliper, distinção entre o líquido amniótico e a pele fetal, posição da cabeça, ampliação da imagem, acesso ortogonal ao plano cutâneo, imagem ultrassonográfica padronizada e medida do CCN.

Figura 2. Imagens da medida da translucência nucal com diferentes aumentos: (a) 60%; (b) 100%; (c) 200%. Adaptado de Edwards, 2003 13.

Além das metodologias para calcular a qualidade da medida da TN, a análise de critérios individuais também pode contribuir para a melhoria da qualidade do rastreamento. Com relação ao tamanho da imagem, observa-se que a medida da TN é significativamente afetada pelo tamanho da imagem, interferindo na interpretação dos resultados de casos tidos como positivos; estes estudos observaram que imagens com maior dimensão apresentavam medida de TN significativamente menor. A Figura 2 ilustra as medidas de TN em imagens nas dimensões, 60%, 100% e 200%, respectivamente 13, 14. Entretanto, há necessidade de interpretação cautelosa de medidas de TN em imagens com diferentes dimensões 13. Havendo a necessidade de se padronizar o tamanho da imagem analisada e da medida mínima de TN para avaliar o risco de SD 6, 13. É também importante ressaltar que o treinamento formal de examinadores, certificados pela FMF, e a motivação do examinador em aderir rigorosamente à técnica de medida e avaliação da TN são prérequisitos essenciais para o eficiente rastreamento de aneuploidia 6, 10, 13, 24. Em um estudo foi avaliada a qualidade metodológica de um rastreamento realizado na população de Flandes, na Bélgica 24, e verificaram que o resultado obtido subestimou o risco de aneuploidia fetal. De acordo com esses pesquisadores houve uma Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

série de falhas metodológicas no delineamento do rastreamento, entre os quais se destacam: treinamento incompleto dos examinadores no programa desenvolvido pela FMF falta de padronização do tipo de imagem e do equipamento utilizado, grande número de examinadores e falta de padronização no tipo de abordagem utilizada pelo profissional de saúde na interação com a gestante 24. Considerações Finais O uso de métodos de rastreamento de anomalias cromossômicas pode ser considerado como uma importante ferramenta na detecção de potenciais casos de trissomias no primeiro trimestre de gestação, em especial a trissomia do cromossomo 21, conhecida como Síndrome de Down. Neste contexto, o uso da medida de transluscência nucal (TN), em associação com a medida do comprimento cabeça-nádega (CCN), idade materna e concentrações séricas de biomarcadores maternos, contribui para a seleção de gestantes pertencentes ao grupo de maior risco para desenvolvimento de Síndrome de Down, resguardando os indivíduos com baixo risco dos potenciais prejuízos decorrentes de rastreamentos mais invasivos. Cabe ressaltar a importância da formação de examinadores plenamente capacitados para operar equipamentos e aplicar, de forma criteriosa, as técnicas de avaliação da TN, EURP 2010; 2(3): 122-127


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Souza et al. – Rastreamento da síndrome de Down estabelecendo relações com outros parâmetros, a fim de fornecer informações cada vez mais precisas. Referências

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Artigo de Revisão O valor da Dopplervelocimetria da artéria cerebral média na gestação de alto risco The value of middle cerebral artery Doppler velocimetry in high-risk pregnancy Thaís B V de Castro 1, Francisco Mauad Filho1,2, Wellington P Martins 1, 2

A artéria cerebral média é um vaso que irriga a maior parte de cada hemisfério cerebral, e, por tal, seu sonograma reflete o estado hemodinâmico fetal frente a um efeito adverso que atinja esse território. A escolha deste vaso se dá pela facilidade de avaliação durante à ultrassonografia Doppler frente aos outros vasos cerebrais devido a sua localização anatômica, com a vantagem de se conseguir um ângulo de insonação menor que 20o, além da alta sensibilidade para a detecção de quadros que cursam com hipoxemia cerebral, como crescimento restrito e anemia fetal. Na hipoxemia fetal tem-se uma diminuição do índice de resistência e pulsatilidade na artéria cerebral média do feto abaixo dos valores das curvas de normalidade, caracterizando o fenômeno da centralização fetal. Em fetos isoimunizados, o aumento da velocidade sistólica máxima na artéria cerebral média acima de um desviopadrão sugere de anemia fetal. Palavras chave: Ultrassonografia Doppler; artéria cerebral média; gravidez.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 12/02/2010, aceito para publicação em 30/08/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartinsultrassonografia.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract The middle cerebral artery is the main vessel that irrigates the cerebral hemispheres, and, as such, reflects the state of your sonogram fetal hemodynamic front of an adverse effect that reaches this area. The choice of this vessel is by the ease of measurement and detection than the other cerebral vessels due to their anatomical location, with the advantage of getting an insonation angle less than 20, in addition to high sensitivity for detecting frames that occur with cerebral hypoxia, such as growth restriction and fetal anemia. In fetal hypoxemia there has been a decrease of resistance index and pulsatility in fetal middle cerebral artery below the values of normal curves, characterizing the brain-sparing effect. In isoimmunized fetuses, increased peak systolic velocity in middle cerebral artery above one standard deviation suggesting fetal anemia. Keywords: : Ultrasonography, Doppler; Middle Cerebral Artery; Pregnancy.

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Castro et al. – Artéria cerebral média na gestação de alto risco Introdução A ultrassonografia, como método propedêutico, revolucionou a prática obstétrica, possibilitando acesso a informações até então desconhecidas, que facilitaram o desempenho clínico. Antes do advento da ultrassonografia, os conhecimentos de anatomia e fisiologia da circulação fetoplacentária eram obtidos por meio de estudos invasivos com animais, pela placentografia com radioisótopos ou estudos com óxido nitroso para avaliar o fluxo sangüíneo na placenta humana 1. A avaliação Dopplervelocimétrica é realizada através da análise de índices que relacionam a sístole (S ou A), a diástole (D ou B) e a velocidade média do fluxo (VM), ou a forma da onda de velocidade de fluxo (OVF). As relações mais utilizadas para o estudo das artérias são: Sístole/Diástole, Índice de Pulsatilidade (A-B/VM), e Índice de Resistência (A-B/A). Para estudar o território venoso, principalmente o ducto venoso e a veia cava inferior, utiliza-se o Índice de Pulsatilidade para as veias (S-a/VM), onde “a” é a velocidade durante a contração atrial. A artéria cerebral média (ACM) é um vaso de grande importância porque irriga a maior parte de cada hemisfério cerebral2, e, por tal, seu sonograma reflete o estado hemodinâmico fetal frente a um efeito adverso que atinja esse território. No caso de sofrimento fetal, a hipoxemia fetal está associada à redistribuição hemodinâmica do fluxo sangüíneo, resultando em perfusão preferencial do sangue para órgãos nobres, tais como cérebro, coração e glândulas adrenais, em detrimento da perfusão de pulmão, rins, baço e esqueleto, ou seja, há vasoconstricção periférica e vasodilatação cerebral 1. Assim sendo, na hipóxia fetal observamos diminuição do índice de resistência e pulsatilidade na artéria cerebral média do feto abaixo dos valores das curvas de normalidade, caracterizando a centralização fetal. Em fetos isoimunizados, o aumento da velocidade sistólica máxima na artéria cerebral média acima de um desvio-padrão é forte indicador de anemia fetal 2. Neste trabalho ressaltaremos a importância da avaliação Dopplervelocimétrica da artéria cerebral média no acompanhamento de fetos de alto risco, quer seja na análise da vitalidade fetal, quer seja no diagnóstico presuntivo de anemia fetal, o que vem revolucionando a obstetrícia nas últimas décadas. Anatomia e análise Dopplervelocimétrica da ACM As artérias cerebrais médias (ACM) são importantes ramos laterais do Polígono de Willis (Figura 1), uma anastomose heptagonal das artérias cerebrais principais, derivada das artérias carótidas Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

internas e vertebrais e localizada na base do cérebro, ao redor do quiasma óptico. A escolha deste vaso para os estudos Doppler do cérebro fetal se dá pela maior facilidade de medição e detecção que os outros vasos cerebrais, além da alta sensibilidade para a detecção de quadros que cursam com hipoxemia cerebral, como crescimento restrito e anemia fetal 3. A insonação deste vaso é feita seguindo do corte transverso do cérebro fetal ao nível do diâmetro biparietal até a base do crânio. Usando a imagem do fluxo colorido, a ACM pode ser vista como um ramo lateral maior do polígono de Willis, passando anterolateralmente pelos limites entre a fossa cerebral anterior e média.

Figura 1. Anastomose do Polígono de Willis à ultrassonografia com Doppler de amplitude, destacando-se a artéria cerebral média (ACM).

O ângulo de insonação entre o raio do transdutor e o eixo axial do vaso deve ser menor do que 20° e a mesma deve ser realizada no terço proximal da ACM (Figura 2), com o objetivo de melhorar a acurácia deste método nos casos em que se pretende predizer a anemia fetal. Esse é um dos motivos para a escolha da artéria cerebral média como ponto de insonação, pela maior facilidade de se obter uma angulação próxima ou, até mesmo, de zero grau 4. Se necessário, o ângulo deve ser corrigido. O ponto mais alto da curva na análise espectral é considerado o pico sistólico e sua velocidade é dada em cm/s 5. Aplicabilidade clínica Diagnóstico de Anemia Fetal A Doença Hemolítica Perinatal (DHPN), também conhecida como Eritroblastose Fetal, é decorrente da produção de anticorpos maternos contra antígenos presentes no sangue fetal, devido a algum tipo de incompatibilidade sanguínea materno-fetal. Os antígenos ABO e Rh são os principais responsáveis por este processo. Apesar da incompatibilidade ABO EURP 2010; 2(3): 128-132


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Castro et al. – Artéria cerebral média na gestação de alto risco responder pela maioria dos casos, a doença decorrente da produção de anticorpos a partir do fator Rh, conhecida como aloimunização Rh, tem maior relevância, devido a sua maior gravidade. Outros antígenos presentes na superfície das hemácias fetais, de outros sistemas de grupos sanguíneos, também podem ser responsáveis pelo desencadeamento da doença, porém em muito menor escala e, na maioria das vezes, de forma subclínica. Podemos citar os Kell, Duffy e Kidd como os mais encontrados.

Figura 2. Dopplervelocimetria da artéria cerebral média fetal utilizando ângulo de insonação abaixo de 20°. Adaptado de Costa e Gadelha, 20066.

A incidência da doença veio declinando com o passar dos anos, principalmente após a descoberta e disseminação do uso da imunoglobulina anti-Rh pósparto em gestantes Rh negativo, a partir de 1968. Antes da introdução desta medicação, a incidência de conceptos afetados era de 9% a 10% das gestações e era a maior causa de morbidade e mortalidade perinatal 5. Entende-se por aloimunização Rh materna o aparecimento de anticorpos circulantes anti-D na circulação de gestantes Rh negativo, em resposta aos antígenos D provenientes da circulação de fetos Rh positivo, inexistentes nas hemácias maternas. O contato do sangue fetal com o sangue materno e a conseqüente sensibilização da gestante ocorrem a partir de hemorragias feto-maternas que podem ocorrer durante a gestação, como nos casos de sangramento de primeiro trimestre e, principalmente, durante o parto, em especial nos do tipo operatório. Na maioria dos casos, para haver sensibilização, é necessário hemorragias feto-maternas consideráveis. Apenas uma em cada 23 gestantes Rh negativos é sensibilizada pelo concepto Rh positivo7. Hemácias fetais podem ser encontradas no sangue materno a partir de oito semanas de gestação, mas a Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

freqüência e o volume delas aumentam progressivamente com a gravidez 7. Através do teste de Kleihauer, Bowman et al. dosaram o volume de células fetais no sangue materno, encontrando 0,01ml em 3%, 12% e 46% das gestantes nos três trimestres sucessivos, respectivamente 8. Esta é a quantidade suficiente de sangue fetal na circulação materna para que a aloimunização se desenvolva 7. O método Dopplervelocimétrico de detecção da anemia fetal se baseia no fato da anemia levar a um estado de circulação hiperdinâmica de resposta no feto, devido a um aumento compensatório do débito cardíaco para tentar suprir a demanda de oxigênio dos tecidos, e posterior aumento do fluxo sanguíneo. O fluxo é medido pela multiplicação da velocidade média pela área transversa do vaso. Considerando que na anemia fetal não existe mudança na área transversa, o aumento da velocidade sanguínea pode se refletir na elevação do fluxo, ou seja, o feto anêmico tende a apresentar valores de velocidade máxima do pico sistólico acima do limite esperado para determinada idade gestacional 4. Os estudos que enfatizam a ACM baseiam-se no fato que tal sistema responde mais rapidamente à hipoxemia, devido à grande dependência do tecido cerebral do suprimento de oxigênio, e na facilidade da insonação do vaso em questão 9. Restrição de Crescimento Fetal intra-uterino (RCIU) A maioria dos estudos sobre a restrição de crescimento fetal intra-uterino (RCIU) não diferencia os fetos constitucionalmente pequenos dos fetos patologicamente pequenos. Além disso, estudos sobre a patogênese da RCIU têm sido limitados pelo conceito de que os fetos com RCIU representam um grupo homogêneo. Esta situação gerou muita confusão e tem dificultado a nossa compreensão dos mecanismos que estão na base da RCIU 9. A redistribuição sangüínea que ocorre em fetos com restrição de crescimento intra-uterino é regulada por mais de um mecanismo. A hipercapnia isoladamente, ou associada à acidemia, desempenha um papel de controle das respostas vasculares da carótida e aorta, ao passo que a hipoxemia isoladamente, ou por meio da hipercapnia, seria responsável pela resposta vascular cerebral1. Estudos recentes têm confirmado a associação significativa entre a centralização sangüínea fetal e o aumento da mortalidade e morbidade em fetos com restrição de crescimento com menos de 34 semanas de gestação, sugerindo que não haveria associação com resultados adversos após a 34ª semana 10. EURP 2010; 2(3): 128-132


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Castro et al. – Artéria cerebral média na gestação de alto risco inclui ducto venoso com fluxo reverso, a veia umbilical revertida e fluxo da valva tricúspide E/A (enchimento passivo/ativo) de pelo menos 1,0 ou regurgitação. Os autores subdividiram as etapas em categorias 'a' e 'b', dependendo se a RCIU é "idiopática" (categoria a) ou se há associação com patologia materna ou fetal (categoria b). Todos esses fatores, além de levar em consideração a idade gestacional, devem pesar os riscos de prematuridade contra os riscos de deterioração fetal intra-uterina11.

Tem-se que o pico de velocidade sistólica da artéria cerebral média (PSV-ACM) encontra-se aumentado em fetos com RCIU, o que prevê o aumento da mortalidade perinatal com maior precisão que o índice de resistência da mesma. Na pulsatilidade da ACM, há uma correlação entre o PSVACM e pO 2 baixo e alto pCO 2 em fetos de RCIU 9. Mari et al. desenvolveram um sistema de classificação para RCIU, baseado na biometria fetal, nas mudanças Dopplervelocimétricas, no índice de líquido amniótico e em parâmetros clínicos. Fetos com RCIU Fase I são considerados de crescimento levemente restrito e as pacientes são acompanhadas em regime ambulatorial. Pacientes com fetos em Fase II são admitidas para observação; o parto é freqüente. Pacientes com fetos em Fase III são aquelas com alto risco de morte fetal. Este sistema de estadiamento pode ser aplicado em qualquer idade gestacional 11. Como parte da avaliação inicial recomenda-se que, na presença de um feto com peso estimado abaixo do percentil 10, o líquido amniótico deve ser avaliado e a fase, determinada. Fase I para fetos que têm um índice de pulsatilidade da artéria umbilical anormal, mas sem a ausência ou inversão do fluxo diastólico final. Além disso, na Fase I os fetos podem ter um índice de pulsatilidade anormal da ACM, mas o PSVACM é normal 11. Na Fase II, o feto tem Doppler umbilical com fluxo arterial diastólico ausente ou reverso, elevação do PSV-ACM, índice de pulsatilidade anormal do ducto venoso (incluindo onda atrial ausente) e pulsação da veia umbilical. Fase III, o que acarreta uma taxa de mortalidade fetal de 50 a 85%,

Ultrassonografia Doppler da artéria cerebral média A artéria cerebral média fetal é responsável pelo fluxo sangüíneo da região cortical e subcortical cerebral, incluindo o córtex no nível da fissura de Sylvius e áreas mais profundas, como o putâmen e o globo pálido. É de fácil aquisição pela Dopplervelocimetria e, devido a sua posição anatômica, é possível utilizar-se ângulo de insonação entre a artéria e o feixe Doppler abaixo de 20° 12. Neste vaso fetal, o índice de resistência aumenta até a 26ª semana, diminuindo a partir desta idade gestacional, cujo limite inferior da normalidade é 0,67 na 38ª semana gestacional 12. Deve-se atentar para que a diminuição do índice de resistência na artéria cerebral média fetal, no final da gestação, não seja interpretada como anormalidade. Dessa forma, para a caracterização de índice de resistência anormal, é importante analisar os valores das curvas de normalidade 6 (Tabela 1).

Tabela 1: Percentis 5, 2, 50, 75 e 95 do índice de resistência na artéria cerebral média fetal (IRACM) entre a 22ª e a 38ª semana de gestação. Idade gestacional (semanas)

IR da Artéria cerebral média p5

p25

p50

p75

p95

22

0,72

0,76

0,81

0,85

0,97

26

0,76

0,81

0,85*

0,93

0,97

30

0,73

0,79

0,83*

0,86

0,95

34

0,72

0,78

0,82**

0,89

0,95

38

0,67

0,70

0,75**

0,78

0,84

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Castro et al. – Artéria cerebral média na gestação de alto risco Nos fetos com RCIU severo, há um aumento no pico de velocidade diastólica final, aumentando o fluxo de sangue para o cérebro, o que pode ser testemunhado através do Doppler espectral da ACM. Esta modificação é detectada por uma diminuição da relação S/D ou índice de pulsatilidade e é referido como centralização fetal. Diferentemente dos casos de isoimunização, quando o pico de velocidade sistólico da ACM está aumentado devido à diminuição da hemoglobina fetal, que diminui a viscosidade do sangue. A hemoglobina em fetos com RCIU está tipicamente inalterada. Considerações finais Na atualidade, a ultrassonografia com Doppler vem se firmando como método não invasivo na propedêutica pré-natal, com sensibilidade e especificidade consideráveis para o reconhecimento antenatal de gestação com elevado risco de resultados perinatais adversos, um dos maiores desafios da obstetrícia moderna. A artéria cerebral média, como vaso cerebral e de fácil identificação, reflete de sobremaneira as condições hemodinâmicas de um território de suma importância para o bemestar fetal, o cérebro. Os parâmetros Dopplevelocimétricos deste vaso demonstram uma boa correlação com o valor da hemoglobina fetal e com estados hipoxêmicos nos fetos. Referências

1. Franzin CM, Silva JLP, Marussi EF, Parmigiani SV. Centralização do fluxo sanguíneo fetal diagnosticado pela Dopplervelocimetria

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em cores: resultados perinatais. Rev. Bras. Ginecol. Obst. 2001; 23(10): 659-665. 2. Costa AG, Mauad Filho F, Spara P, Gadelha EB, Ferreira AC, Freitas P. Importância da Dopplervelocimetria na artéria cerebral média fetal em gestações de alto risco. Femina 2004; 32(9): 765769. 3. Callen PW. Ultra-sonografia em Obstetrícia e Ginecologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002. 4. Mari G, Deter RL, Carpenter RL, Rahman F, Zimmerman R, Moise KJ, Jr., et al. Noninvasive diagnosis by Doppler ultrasonography of fetal anemia due to maternal red-cell alloimmunization. Collaborative Group for Doppler Assessment of the Blood Velocity in Anemic Fetuses. N Engl J Med 2000; 342(1): 9-14. 5. Scheier M, Hernandez-Andrade E, Carmo A, Dezerega V, Nicolaides KH. Prediction of fetal anemia in rhesus disease by measurement of fetal middle cerebral artery peak systolic velocity. Ultrasound Obstet Gynecol 2004; 23(5): 432-436. 6. Costa AG, Gadelha PS. Hemodinâmica fetal avaliada pela Dopplervelocimetria na segunda metade da gestação. Femina 2006; 7. Netto HC. Obstetrícia básica. Rio de Janeiro: Atheneu; 2004. 8. Bowman JM, Pollock JM, Penston LE. Fetomaternal transplacental hemorrhage during pregnancy and after delivery. Vox Sang 1986; 51(2): 117-121. 9. Mari G, Hanif F. Fetal Doppler: umbilical artery, middle cerebral artery, and venous system. Semin Perinatol 2008; 32(4): 253-257. 10. De Sá RAM, Netto HC, Lopes LM, Barreto MJV, Cabral ACV. Dopplerfluxometria do ducto venoso – relação com a gasometria em fetos prematuros com centralização de fluxo sanguíneo. Rev. Bras. Ginecol. Obst. 2003; 26(4): 609. 11. Hoffman C, Galan HL. Assessing the 'at-risk' fetus: Doppler ultrasound. Curr Opin Obstet Gynecol 2009; 21(2): 161-166. 12. Da Costa AG, Mauad Filho F, Spara P, De Freitas P, Arevalo J. Acceleration time in the fetal middle cerebral artery during the second half of pregnancy. Ultrasound Med Biol 2005; 31(3): 317320.

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Artigo de Revisão Ultrassom na esteatose hepática Liver steatosis and ultrasound Júlio A Mânica 1, Wellington P Martins 1, 2

Geralmente, a quantidade de gordura no fígado corresponde à 10% do seu peso. Quando a quantidade de gordura excede este limite, o fígado apresenta esteatose. As duas patologias mais freqüentemente associadas à esteatose são a doença hepática gordurosa alcoólica e a doença hepática gordurosa não alcoólica. Atualmente, não existe um método preciso que diferencie a esteatose alcoólica e a esteatose não alcoólica. Estudos histológicos fornecem informações sobre a distribuição da gordura nos hepatócitos e nos lóbulos hepáticos e permitem uma avaliação semi-quantitativa da esteatose, sendo a biópsia hepática considerada o padrão ouro para o diagnóstico da esteatose. O ultrassom é um método bastante usado para a avaliação do fígado gorduroso, sendo possível a aplicação de contraste e o uso da sonoelastografia, principalmente para a classificação do grau de cirrose. Mais estudos sobre a utilização da ultrassonografia são necessários para poder ser possível padronizar os parâmetros da esteatose, melhorar a exatidão da sua classificação e diminuir o uso das biópsias. Palavras chave: Ultrassonografia; Fígado; Esteatose.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 19/07/2010, aceito para publicação em 02/10/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartinsultrassonografia.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract Generally, the amount of fat in the liver corresponds to 10% of one’s weight. When the fat content exceeds this limit, the liver may be diagnosed with steatosis. The two diseases most frequently associated with steatosis are alcoholic fatty liver disease and nonalcoholic fatty liver disease. Currently, there is not a precise method to differentiate the alcoholic steatosis and nonalcoholic steatosis. Histological studies provide information about the distribution of fat in hepatocytes and hepatic lobules and allow a semi-quantitative assessment of steatosis, in such way that liver biopsy is considered the gold standard for diagnosis of steatosis. Ultrasound is a method widely used to assess fatty liver, and it may be used with contrast besides the application of sonoelastography, especially for the classification of cirrhosis. Further studies on the use of ultrasound may be necessary for it to be possible to standardize the parameters of steatosis, improve accuracy of classification and decrease the use of the biopsies. Keywords: : Ultrasonography; Liver; Steatosis.

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Manica & Martins – Esteatose hepática Introdução Normalmente, a quantidade de gordura no fígado é de 10% do seu peso. Quando a quantidade de gordura ultrapassa esse limite diz-se, que o fígado apresenta esteatose. A esteatose hepática é a mais prevalente doença hepática no mundo desenvolvido e associa um variado espectro de condições caracterizadas pelo acúmulo de triglicérides no interior do citoplasma das células hepáticas 1. A sua investigação foi iniciada em 1980 com a descrição da esteatose hepática não alcoólica, uma síndrome característica de mulheres obesas e diabéticas que negavam o uso de álcool, mas apresentavam alterações no fígado muito semelhantes ao da hepatite alcoólica com aumento de volume do fígado, alterações de exames laboratoriais e com biópsias que apresentavam macro gotículas de gordura nos hepatócitos, com necrose e inflamação focal e presença de corpúsculos de Mallory.

Esteatose hepática alcoólica e não alcoólica As duas patologias mais comuns associadas à esteatose são a doença hepática gordurosa alcoólica (DHGA) e a doença hepática gordurosa não alcoólica DHGNA. A DHGNA compreende lesões hepáticas que ocorrem na ausência do abuso do álcool e abrange uma série de alterações histológicas como a esteatose ou “fígado gordo”, a esteatohepatite não alcoólica (NASH) e esteatose induzida por cirrose. Esta última estaria presente na cirrose de causa indefinida 2. A DHGNA está associada à obesidade, resistência à insulina e à síndrome metabólica. Constitui a mais prevalente das doenças hepáticas nos países do ocidente e afeta mais de 30% dos adultos e 38% das crianças obesas 3. Atualmente, não existe nenhum exame de apoio que diferencie a esteatose alcoólica da esteatose não alcoólica, portanto, só pode ser considerada DHGNA quando não houver um histórico de uso de álcool ou se a quantidade de álcool ingerida for insuficiente para causar a esteatose. As possíveis causas de DHGNA são apresentadas no Quadro 1.

Quadro 1. Causas e mecanismos de ação responsáveis pelo surgimento da esteatose hepática não alcoólica. Mecanismo de ação Causa Primárias Resistência à insulina

Diabete melitus, obesidade, hiperlipidemia

Drogas

Corticóides, estrogênios, amiodarona, perhexilina, nifedipina, salicilatos, tamoxifen, tetraciclina, cloroquina Secundárias

Cirurgia

Cirurgia da obesidade, bypass jejuno ileal, ressecções extensas do intestino delgado, derivação íleo pancreática

Outras

Hipobetalipoproteinemia, desnutrição proteico calórica, doença de Weber Christian, toxinas, diverticulose, perda rápida de peso, lipodistrofia, doença inflamatória intestinal e infecção por HIV

Quadro clínico O quadro clínico da esteatose é limitado. Entre 45% a 100% dos pacientes não apresentam sintomas e, quando apresentam, especialmente as crianças, os sintomas são: desconforto abdominal, dor no hipocôndrio direito, fadiga e indisposição. A hepatomegalia pode ser observada em uma taxa entre 12% à 95%. As alterações laboratoriais mais comuns são: elevações das enzimas aspartato aminotransferase (AST) e alanina amino-transferase (ALT). Uma característica interessante é que a relação entre Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

AST e ALT é menor que 1 no intervalo entre 65% à 90% dos casos. Quando esta relação se torna maior que 1, ela pode indicar uma progressão da doença. Enzimas como a fosfatase alcalina e a gama-glutamiltransferase (Gama-GT) estão aumentadas em menos de 50% dos casos. O diagnóstico da resistência à insulina, inicialmente, é clínico. São observados sinais de síndrome metabólica (circunferência abdominal maior que 102 cm (em homens) e maior que 88 cm (em mulheres), concentração de triglicérides superior a 150 mg/dL, concentração de colesterol HDL inferior EURP 2010; 2(3): 133-139


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Manica & Martins – Esteatose hepática a 40 mg/dL (em homens) e 50 mg/dL (em mulheres), glicemia superior a 110 mg/dL e pressão arterial superior a 130/85 mm/Hg. Recentemente, foi desenvolvido o índice Homa–IR, um método simples de cálculo da resistência à insulina através da dosagem concomitante de glicose e insulina4-6. A esteatose hepática é bastante comum na clínica médica especialmente em regime ambulatorial e, freqüentemente, está associada a pequenas alterações da ALT ou da Gama-GT ou de ambas. A real prevalência na população nunca foi corretamente estabelecida, entretanto, estudos indicam estar entre 3% e 22%. Autores descreveram uma incidência de esteatose na população de 16% a 24%, esteato hepatite entre 2% à 3%, incidência em doentes com diabete tipo II de 28% à 55%, incidência em obesos de 60% à 95%, incidência em dislipidêmicos de 20% à 92%. A prevalência da doença alcoólica não gordurosa varia de acordo com a idade, sexo e etnia. Na população, a prevalência é de 25% e a incidência é de 2 novos casos a cada 100 pessoas, quer dizer, 2% se considerado o intervalo de tempo de um ano. Entre 2% a 3% dos indivíduos na população em geral sofrem de esteatohepatite não alcoólica 7. A obesidade aumenta em 2 vezes o risco de desenvolvimento de esteatose naquelas pessoas cuja ingesta de álcool foi superior à 60g diárias se comparado àqueles cuja ingesta foi normal. O resultado parece apontar no sentido de que a esteatose é freqüentemente encontrada em individuos saudáveis e quase sempre presente em individuos obesos, cuja ingesta de álcool é superior à 60g ao dia. O mais importante é a informação de que a esteatose está muito mais associada à obesidade do que ao consumo de álcool, sugerindo que o papel do excesso de peso é mais relevante do que o consumo de álcool 8. Na evolução natural da doença, entre 30% e 90% dos obesos apresentam esteatose hepática que aparentemente não causa lesão hepática, em um seguimento de 20 anos. Porém, foi observado que entre 10% a 20% dos pacientes desenvolvem esteato hepatite não alcoólica (NASH) e destes, entre 3% a 5% evoluem para cirrose e hepatocarcinoma em até 20 anos. No entanto, em pacientes com esteato hepatite acompanhados por até 9 anos, 27% evoluíram para fibrose e 19% para cirrose. Acredita-se que grande parte das cirroses de causa desconhecida são esteato hepatite não alcoólica – NASH. Um dos modelos explicativos da fisiopatologia da esteatose sugere que o acúmulo de ácidos graxos nos hepatócitos resulta na produção de espécies reativas de oxigênio (EROS) através das vias do citocromo p450, das lipo-oxigenases e da beta-oxidação, que Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

causariam apoptose e necrose dos hepatócitos, cuja inflamação ativaria as células estelares a gerar fibrose. Além disso, o aumento de ácidos graxos resulta em stress do retículo endoplasmático do hepatócito, que causaria apoptose do retículo endoplasmático pela ativação de quinases. O tecido adiposo secreta adipocitocinas (leptina e angiotensina II) e o hormônio adiponectina que interagem com o fator de necrose tumoral alfa (TNF alfa), que também ativa as células estelares e, em conseqüência, a produção de fibrose. Existe ainda a relação com a hiperinsulinemia e hiperglicemia. Histologia e classificação O estudo histológico fornece informações sobre a distribuição de gordura dentro dos lóbulos hepáticos e permite uma avaliação semi-quantitativa da esteatose 9. Microscopicamente, o padrão de esteatose pode ser dividido em macro e microvesicular. Na macrovesicular, os hepátocitos contém um grande vacúolo de gordura que muitas vezes é maior e mais largo que o núcleo, o que faz com que o núcleo possa ser deslocado. Na microvesicular, os hepatócitos possuem pequenas inclusões citoplasmáticas de gordura, sem produzir deslocamento significativo do núcleo 10. A esteatose macrovesicular é a mais comum e é encontrada na DHGNA e também na doença alcoólica do fígado. Ao contrário, a microvesicular é geralmente a forma mais severa de esteatose e pode ser verificada em diversas situações como na toxicidade medicamentosa, onde está envolvida a beta-oxidação de ácidos graxos, na Sindrome de Reye e também no alcoolismo. Embora a patogênese não seja ainda bem esclarecida, a beta-oxidação parece ser um mecanismo bastante relevante neste processo 11 . Duas classificações histopatológicas das esteato hepatites são comumente utilizadas 9, 12: a Metavir e a Ishak. Ambas estabelecem variados estágios de inflamação intra-hepática e diversos graus de fibrose, desde o fígado completamente funcional até a cirrose propriamente dita. A Metavir consiste em quantificar a atividade necro-inflamatória (necrose em saca bocados) e fibrose. A atividade necro-inflamatória é classificada em A0: ausente; A1: mínima; A2: moderada; A3: severa. Na fibrose é classificada em: F0: ausente; F1: fibrose porta sem septos; F2: fibrose porta com alguns septos; F3: muitos septos sem cirrose; F4: cirrose. De forma similar, a Ishak quantifica e qualifica com diferentes níveis de detalhamento a atividade necro-inflamatória e a fibrose. EURP 2010; 2(3): 133-139


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Manica & Martins – Esteatose hepática Diagnóstico É sabido que a progressão da doença gordurosa do fígado pode ser traduzida por diferentes graus de fibrose intra-hepática, demonstrada em diferentes estágios histopatológicos, com evolução até a cirrose hepática. Existe um aumento nas evidências de que a fibrose, nos seus estágios iniciais, é tratável e reversível 13. A biópsia hepática é considerada o padrão ouro para a avaliação da fibrose. Porém, as limitações técnicas são principalmente sangramento e a obtenção de amostras inadequadas limitando o estudo histo-patológico 14. Além disso, a peça anatômica tem caráter amostral e não representam a totalidade do tecido hepático. A NASH está associada aos estágios mais graves da esteatose, onde as infiltrações de neutrófilos mononucleares nas células hepáticas, necrose de hepatócitos e inflamação representam fatores de risco maiores no que se refere à falência hepática, cirrose e hepatocarcinoma 3, 15, 16. Está descrito que esta inflamação hepática subclínica promove um aumento na produção de glicose e, recentemente, também tem sido observado que esta inflamação hepática subclínica aumenta a secreção de fetuin-A 17. Esta proteína é uma hepatocinina e se encontra aumentada nos fígados com esteatose, e induz diretamente à resistência à insulina 18. Ultrassom com Doppler O ultrassom é aceito como um método de rastreamento na avaliação da doença do fígado gorduroso, pois é um método não invasivo e bastante disponível. Entretanto a sensibilidade e especificidade deste método para detectar esteatose hepática tem sido constantemente discutidos, uma vez que estudos tem demonstrado uma sensibilidade que pode variar entre 60% à 94% e uma especificidade que pode variar entre 66% à 95% 8. A maioria dos estudos estão relacionados com a graduação da esteatose hepática em três aspectos ecográficos: leve, moderado e acentuado, baseados na hipercogenicidade do tecido hepático, no aumento da discrepância entre a ecoamplitude do fígado em relação ao rim e na perda dos ecos das paredes dos vasos portais 19. A maior limitação do uso do ultratrassom é por ser um método dependente de operador. Em estudos para verificar a variabilidade da concordância dos resultados ecográficos intra e interobservador, foi demostrado que a concordância é de 72% interobservador e 76% intraobservador. No entanto, a concordância da severidade da quantidade de gordura variou intraobservador de 55% à 68% 20. Estes resultados foram correspondentes aos encontrados em estudos comparativos realizados com Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

biópsia hepática e o método de ressonância magnética 21. Muitos fatores são os responsáveis na formação da imagem: gordura, conteúdo de água, calibração do equipamento, freqüência usada, foco e ganho. Tais fatores podem dar aparência similar entre a fibrose e a esteatose, que podem estar presente concomitantemente. Vários estudos têm procurado determinar o melhor marcador da fibrose e da cirrose pelo método do ultrassom, porém, os resultados são contraditórios. Alguns aspectos ecográficos tais como a superfície nodular, a textura heterogênea, a atenuação dos feixes sonoros, os contornos dos canais intrahepáticos e o comprimento do baço tem se tornado parâmetros ecográficos para o diagnóstico de cirrose. A classificação ultrassonográfica foi correlacionada ao padrão histopatológico Metavir tendo sido encontrada concordância em 73% dos casos estudados. É sabido que a fibrose promove modificações hemodinâmicas no fígado, sistêmicas e/ou regionais, por isso, o ultrassom com Doppler tem sido utilizado para detectar as mudanças hemodinâmicas no processo da fibrogênese, cujos resultados são controversos 22, 23. Diferentes medidas e avaliações são utilizadas com este objetivo como o volume de sangue porta, sua velocidade média e máxima, seu índice de congestão porta, sua medida do fluxo portal, a perfusão efetiva da veia porta e os índices de resistência de fígado e baço 24. Parece existir um consenso que a velocidade de fluxo na veia porta esta diminuída nos pacientes cirróticos, existindo, porém, sobreposição dos índices em valores absolutos em pacientes hígidos apesar da velocidade e do fluxo portal mostrarem uma correlação com os estágios da fibrose em muitos pacientes. Ao contrário, a acurácia da medida em pacientes normais não é suficientemente exata para os estágios da fibrose. O fluxo portal sofre influência de diversas situações, como a posição do corpo, a respiração, a digestão, os exercícios físicos, o débito cardíaco, o uso de medicamentos, além dos mecanismos compensatórios hemodinâmicos extrahepáticos das diferentes patologias do fígado. Tais fatores, se associados aos erros das medidas do ultrassom Doppler de diferentes equipamentos e a variabilidade do observador, geralmente contribuem para tornarem não reprodutíveis as medições ecográficas. Isso ainda colabora para que não sejam clinicamente utilizáveis os parâmetros das medidas por ultrassom Doppler no que se refere à avaliação dos estágios da fibrose no fígado 22. Aube et al. relataram que a análise do espectro venoso hepático é útil 25 e consiste em três estágios. Estágio 1: normal e a forma da onda é trifásica; EURP 2010; 2(3): 133-139


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Manica & Martins – Esteatose hepática Estágio 2: bifásica com desaparecimento da onda positiva (refluxo); Estágio 3: monofásica. Enquanto que o padrão de fluxo normal é trifásico, os pacientes com padrão bifásico freqüentemente tem fibrose avançada. O padrão monofásico, Estágio 3, não está relacionado com fibrose ou cirrose, mas com a extensa infiltração gordurosa hepática – portalização 26 . Ultrassom com contraste - CEUS (contrastenhanced ultrasonographic) Este método consiste na administração de um contraste, sob forma de micro bolhas por via endovenosa, e a realização do seu estudo cinético no fígado em um determinado período de tempo. Este contraste aumenta o sinal do ultrassom Doppler em 20 dB, o que facilita e aumenta sua visualização. Estudos têm demonstrado que o tempo de trânsito das microbolhas fica diminuído em fígados deteriorados 27. Sua explicação mais provável seria a de que os pacientes com doenças difusas hepáticas apresentam, secundariamente, shunts arteriovenosos e arterialização dos leitos capilares do fígado e, em menor grau, shunts nos capilares pulmonares e gastrointestinais. O CEUS é um método simples, não invasivo e confiável para excluir cirrose hepática baseado no estudo cinético das bolhas de contraste, no entanto, não consegue classificar os diferentes graus de fibrose. Seu inconveniente é que necessita do uso de um contraste e é operador dependente. Ultrassom com medida da sonoelasticidade Este método se baseia na deformidade dos tecidos quando são excitados interna ou externamente. As técnicas baseadas no ultrassom Doppler podem medir a velocidade de uma onda mecânica de baixa freqüência. Quando uma fonte de baixa freqüência de vibração encontra um tecido incompressível, a velocidade da onda de cisalhamento é geralmente proporcional a raiz quadrada de seu módulo (módulo de elasticidade de Young). Mapas que contém as informações de fase e amplitude das vibrações internas dos tecidos são usados para calcular a velocidade da onda de cisalhamento. Lerner et al. 28 chamaram este método de Sonoelasticidade de Imagem. Através deste método, Sanada et al. 29 demonstraram que as velocidades refletem as funções do fígado, definidas na classificação de Child, e as correlacionaram com o índice de fibrose (razão da proporção de fibrose para todo o fígado), determinado bela biópsia hepática. Atualmente, um novo método tem sido utilizado para a avaliação da elasticidade tecidual: a elastografia transitória (transient elastography – TE). Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Este método não produz imagem e consiste em uma técnica que utiliza imagem unidimensional. Detalhes desta técnica foram recentemente publicadas por Cobbold et al. 30, 31. Orgãos móveis, como o fígado, podem ser facilmente medidos, pois seu tempo de aquisição é curto, ou seja, menor que 100 ms. A TE tem se mostrado um excelente método uma vez que a concordância intraobservador varia entre 96% à 98% e interobservador varia entre 89% à 98%. Uma avaliação mais precisa depende do índice de massa, da janela intercostal e do treino do observador. Pode ser realizado em 90% dos pacientes e a única contraindicação é a ascite. Nos pacientes com hepatite “C” crônica, a correlação entre os diversos estágios de fibrose não foram afetados pelos diversos graus de esteatose e atividade necro-inflamatória. A TE parece ser um método confiável para o diagnóstico de fibrose extensa - F3 e cirrose - F4 32. Os valores preditivos positivos são de 70% à 95% e os negativos variam entre 77% à 95% 32. Vários valores tem sido usados como cut off (linha de corte) para a identificação de pacientes com fibrose significativa maiores que F2: 7,1 kPa (kilopascal) 33, 8.3 kPa 34, 8.7 kPa 32. A TE pode vir a ser um método bastante útil e preciso para exclusão da cirrose. No entanto, tem pouca capacidade para a predição da cirrose. Outro método, a elastografia em tempo real, apresenta resultados semelhantes a TE. As medidas de precisão diagnóstica foram de 0,74 para fibrose significante quando F é maior ou igual à F2, 0,73 para fibrose severa quando F é maior ou igual à F3 e 0,63 para o diagnóstico de cirrose. Os valores da elasticidade não foram influenciados pelos graus de esteatose hepática 35 . A grande vantagem destes métodos reside no fato de que são menos dispendiosos e não envolvem irradiação ou contrastes. Ressonância magnética e tomografia computadorizada Outros métodos como o ultrassom Doppler tissular e o cisalhamento supersônico estão sendo propostos para a investigação nessa mesma direção, além de outros mais dispendiosos como a ressonância magnética, a ressonância magnética com contraste, a ressonância magnética DWI (Diffusion-Weighted Imaging), a ressonância magnética E (Elastography), a ressonância magnética S (spectroscopy), a tomografia computadorizada, a tomografia PET (Positronic Eletron Tomography) e a tomografia SPECT (Single Photon Emission Computed Tomography) 36. A tomografia computadorizada é um dos métodos mais difundidos, entretanto, possuI o inconveniente de estar associado à radiação, o que limita o seu uso em estudos longitudinais, em crianças e somente quantificam EURP 2010; 2(3): 133-139


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Manica & Martins – Esteatose hepática esteatoses hepáticas de leves a moderadas o que, clinicamente, não possui aplicação. Considerações finais A esteatose hepática é a doença de maior prevalência atual no mundo e sua investigação nas últimas três décadas tem aumentado de modo significativo. No seu processo evolutivo, aparecem diferentes graus de fibrose que podem evoluir até a cirrose. A ecografia convencional é um excelente método de triagem para esteatose, porém, não é suficientemente sensível para a classificação dos graus de fibrose. O ultrassom ecodoppler pouco contribui neste sentido e novos e permanentes estudos devem ser realizados para melhorar a sua precisão diagnóstica. Dentre os meios disponíveis de diagnósticos atuais, a ecografia com medidas de elastografia parece se tornar um método promissor para detectar os diversos graus de fibrose por ser não invasivo, por ser mais econômico financeiramente, por não envolver radiação ou o uso de contrastes além de poder ser utilizado para diversas pesquisas horizontais e em crianças. Finalmente, novos estudos na área do ultrassom são necessários para padronizar os parâmetros de classificação da esteatose e que permitam diminuir o uso das biópsias hepáticas que são consideradas, atualmente, o padrão ouro para ordenação e classificação das esteatoses. . Referências

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Artigo de Revisão Importância da ecografia no diagnóstico de massas anexiais na gestação Ultrasound importance in the diagnosis of adnexal masses in pregnancy Nádia B Vasconcelos 1, Wellington P Martins 1, 2

A ultrassonografia é um exame muito utilizado no acompanhamento pré-natal. O objetivo desta revisão é relacionar como a história natural e os aspectos ultrassonográficos das massas anexiais na gestação permitem diagnóstico diferencial etiológico destas lesões e a estratificação do risco de complicações na gestação tais como torção, ruptura, aborto, obstrução do parto, parto prematuro e malignidade. Estes achados ecográficos auxiliam na diferenciação entre os casos em que a conduta conservadora deve ser adotada daqueles em que a realização de intervenção cirúrgica ou investigação complementar se faz necessária. Estas considerações são o substrato desta revisão. Palavras chave: Cistos ovarianos; Ultrassonografia; Gravidez.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 21/05/2010, aceito para publicação em 20/09/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartinsultrassonografia.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract The ultrasound examination is much assessed during prenatal monitoring. The aim of this review is to relate to the natural history and ultrasonographic aspects of adnexal masses during pregnancy which would permit to diagnosis these lesions etiology and to predict the risk of complications during pregnancy such as torsion, rupture, abortion, obstructed labor, premature birth and malignancy. These sonographic findings help in differentiating between cases in which the conservative approach adopted should be those in which any surgical intervention or further investigation is needed. These considerations are the substrate of this review. Keywords: Ovarian cysts; Ultrasound; Pregnancy.

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Vasconcelos & Martins – Massas anexiais na gestação Introdução Com a inclusão do exame ecográfico na rotina prénatal, houve um incremento no estudo de massas anexiais durante o período gestacional, trazendo novos desafios relacionados ao diagnóstico diferencial e manejo terapêutico. Os achados mais freqüentes são cistos ovarianos funcionais, teratomas císticos benignos, cistoadenomas serosos, cistos hemorrágicos, alterações ovarianas específicas da gestação e endometriomas 1. A maioria das massas se resolve até o segundo trimestre de gestação. A ecografia tem importante papel ao identificar risco de eventos adversos para mãe tais como: ruptura, torção, obstrução do trabalho de parto ou malignidade auxiliando na decisão entre adotar conduta conservadora, requerer procedimentos diagnósticos complementares ou realizar intervenções cirúrgicas. Foi realizada pesquisa em artigos de revisão sobre aspectos morfológicos ao estudo ecográfico, etiologia das massas e conduta terapêutica frente a estes achados. Etiologia Na fase pré ecografia o diagnóstico das massas anexiais na gestação se baseava na sintomatologia e no exame físico. Estas massas eram geralmente

grandes e retiradas cirurgicamente para evitar potencial risco de ruptura, torção, obstrução do trabalho de parto ou malignidade 2. Contudo, a presença de massas na gestação não é usual, com uma incidência estimada entre 1% e 2% 3. As massas anexiais na gestação podem ter causas ginecológicas e não ginecológicas. A maioria é de origem ginecológica usualmente ovariana ou uterina 4, 5. Os tumores ovarianos mais comuns são os cistos ovarianos funcionais: folicular,corpo lúteo e teca-luteínico (este último usualmente relatado na doença trofoblástica). Em ordem decrescente de ocorrência teratoma cístico benigno, cistoadenoma seroso, cistos paraovarianos, cistoadenoma mucinoso, endometriomas e tumores malignos 6-8). Apendicite aguda é a causa cirúrgica de origem não obstétrica mais comum na gestação 1. O papel do estudo ecográfico destas massas é distinguir quais pacientes podem ser manejados de maneira conservadora e quais requerem maiores intervenções tais como cirurgia 1. Os tumores ovarianos com baixo potencial de malignidade (tumores borderline) são incluídos na categoria de tumores ovarianos malignos. Na Tabela 1 estão classificados o risco de malignidade (baixo, intermediário ou elevado) conforme os critérios observados na ultrassonografia.

Tabela 1. Risco de malignidade ovariana baseado nos critérios ultrassonográficos. Adapatado de Leiserowitz, 2006 4. Risco de câncer ovariano

Critérios ultrassonográficos

Baixo

Cístico unilocular, tamanho menor do que 5 cm

Intermediário

Cístico multilocular, complexo, septações finas

Elevado

Massa sólida, nódulo, septações espessas, tamanho maior do que 5 cm

Lesões funcionais Estas lesões são os achados mais freqüentes entre as massas anexiais encontradas no período gestacional 1. Incluem corpo lúteo na gestação e outros cistos associados à gestação tais como cistos hemorrágicos, foliculares e cistos simples grandes. A ecografia transvaginal identificará ambos os ovários em 95% dos exames realizados na gestação precoce. A maioria dos cistos com 2 a 3 cm de diâmetro representarão o corpo lúteo da gestação 2. A maioria destes cistos funcionais se resolverá até as 16 semanas de idade gestacional 9, permitindo tratamento conservador. O corpo lúteo da gestação é requisitado para manter a gestação inicial sendo responsável pela produção da progesterona antes do início “da produção placentária”. A regressão normal inicia em torno de 8 semanas 10. A ressecção inadvertida do Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

corpo lúteo antes de 7 a 8 semanas pode levar a perda da gestação 11. O aspecto ecográfico é variado podendo se apresentar como um cisto simples até uma lesão complexa com debris internos e espessamento das paredes. O corpo lúteo, ao estudo Doppler, é tipicamente circundado por um anel colorido com fluxo de baixa resistência chamado frequentemente de “anel de fogo” 12-15. Costuma ser maior e mais sintomático do que um cisto simples e é mais propenso a hemorragia e ruptura. Os cistos hemorrágicos apresentam aspectos ecográficos variados baseados no tempo de presença da hemorragia. O padrão inicial é de linhas finas, também referido como padrão reticular. Estas linhas finas podem ser confundidas com septações. Com o tempo de evolução pode simular presença de componente sólido com a retração do coágulo EURP 2010; 2(3): 140-145


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Vasconcelos & Martins – Massas anexiais na gestação formando angulações ou concavidade da margem externa do coágulo 16, 17. Os folículos são cistos funcionais simples que se desenvolvem mensalmente variando com as alterações hormonais, tipicamente até 2,5 cm. A hemorragia interna é menos comum do que no corpo lúteo 18-20. Lesões não funcionais Os endometriomas são lesões não hormonalmente responsivas, cujo aspecto ecográfico é variado devido às recorrentes hemorragias e vários estágios de degradação dos produtos do sangue. A aparência ultrassonográfica pode ser de um cisto até uma massa sólida 21. Porém 95% dos endometriomas terão aspecto descrito como “cisto de chocolate” apresentando ecos internos difusos,homogêneos e hipoecóicos 1. Quando a lesão é indeterminada a ressonância magnética pode fornecer informações que permitam o tratamento conservador 1. Um grande desafio na prática clínica diária é determinar a malignidade de uma lesão que ocorre em aproximadamente 2% a 3% das massas identificadas durante a gestação 6, 8, 22-24, mas esta freqüência pode variar de estudo para estudo. Os tumores com baixo potencial para malignidade correspondem a 95% dos tumores ovarianos malignos na gestação e 83% se encontram no estagio 1 5. Em geral o prognóstico das gestantes com câncer ovariano (os tumores com baixo potencial para malignidade se enquadram neste grupo) é altamente favorável. O CA 125 costuma estar elevado principalmente no 1º trimestre o que reduz sua significância clínica. Alfa feto proteína é tipicamente usada para rastreamento de defeitos do tubo neural e trissomia do 21, podendo estar elevada nos tumores do seio endodérmico. Nos disgerminomas a lactato desidrogenase pode estar elevada e pode ser usada no seguimento da resposta ao tratamento. Assim como nas pacientes não grávidas a presença de valores normais dos marcadores não deve ser utilizada para excluir a possibilidade de câncer. A decisão de realizar intervenção cirúrgica deve se basear nos sintomas, exame físico e resultados de exames de imagem. A ecografia é segura tendo grande potencial para delinear as relações anatômicas da pelve e caracterizar a morfologia das massas pélvicas, sendo o exame ideal para avaliação inicial das gestantes 4, 5. O uso do Doppler tem auxiliado a diferenciar tumores malignos de benignos. Porém pode ocorrer sobreposição de padrões de fluxo sanguíneo chegando próximo a 50% de falso positivos 25. O uso da ressonância magnética é seguro na gestação para Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

avaliar as massas anexiais. Junto com a ultrassonografia, são dependentes da experiência do médico que interpreta o exame. A ressonância provavelmente pouco adiciona após o estudo ecográfico da maioria destas lesões 4, 5. Tumores das células germinativas Os tumores das células germinativas são as neoplasias mais frequentemente encontradas complicando a gestação. O teratoma cístico maduro ou cisto dermóide é a neoplasia mais frequentemente diagnosticada na gestação 26. Na população em geral, a incidência de bilateralidade é de aproximadamente 10% a 15% 27, 28. São três as características ultrassonográficas mais comuns de um teratoma cístico maduro. A primeira é o nódulo Roktansky que tipicamente aparece com umo nódulo hiperecóico, com sombra acústica posterior em uma base com ecos esparsos. Esta aparência é atribuída à mistura de cabelos e sebo. Menos tipicamente pode apresentar heterogeneidade interna tal como calcificações focais. Outra característica é chamada fenômeno iceberg, tipicamente presente em grandes lesões, resultante da atenuação do feixe do ultrassom obscurecendo a parede posterior da lesão. A terceira característica é chamada “malha dermóide” identificada como múltiplas linhas e pontos salpicados representando a flutuação dos cabelos no sebo 29. Outro padrão raro, porém característico do teratoma cístico, é descrito como a presença de esferas flutuando dentro da massa cística 30. Patel et al. 29 concluíram que a presença de duas ou mais características comuns tem valor 100% preditivo. Quando a lesão é indeterminada, MRI pode ajudar a confirmar a presença de gordura 31. A transformação maligna é rara ocorrendo em 2% dos cistos dermóides. Os disgerminomas correspondem a menos de 5% dos cânceres ovarianos e são a doença maligna invasiva mais comum na gestação (excluídos os tumores epiteliais com baixo potencial de malignidade)4, 5, 32. Tipicamente se apresenta como uma massa sólida no ultrassom, mas pode conter áreas anecóicas devido a hemorragias internas ou necrose. Tumores do estroma dos cordões sexuais Tumoração ovariana causada por miomas e tecomas na gestação não são comuns. Ao ultrassom os miomas caracteristicamente se apresentam como uma lesão sólida, hipoecóica com sombra acústica. Como nem todos os miomas terão este aspecto ultrassonográfico, a ressonância magnética pode ser útil demonstrando sinal de baixa intensidade em T2, refletindo seu estroma abundante em fibrocolágeno. EURP 2010; 2(3): 140-145


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Vasconcelos & Martins – Massas anexiais na gestação Grandes leiomiomas podem apresentar degeneração cística ou hemorrágica no seu interior por comprometimento do suporte vascular da lesão, resultando em aspectos variados ao ultrassom e à ressonância, incluindo componentes císticos e calcificados. A presença de dor pode significar degeneração,torção ou hemorragia em paciente com lesão ovariana sólida pediculada 1. O valor do acurado diagnóstico, nestes casos, reside no fato de que a dor pode ser manejada conservadoramente com sucesso, na maioria das vezes, evitando intervenção cirúrgica. Neoplasias epiteliais Cistos adenomas correspondem a 40%-50% das neoplasias benignas na população em geral. O cistoadenoma seroso é o mais comum e é bilateral em aproximadamente 20%. Esta lesão benigna tipicamente se apresenta como um cisto unilocular simples com septações finas. Ocasionalmente projeções papilares estão presentes. O cistoadenoma seroso pode ter aspecto idêntico a um cisto simples, contudo tende a ser maior e persistir durante toda a gestação. Por esta razão os cistos simples que persistem necessitam acompanhamento para determinar se existe crescimento ou desenvolvimento de complexidade interna 33. Os cistoadenomas mucinosos são bilaterais em 5%.Costumam conter múltiplos septos e baixo nível de ecos internos.Mesmo assim podem ser indistinguíveis dos cistoadenomas serosos ao ultrassom 1. Os cistoadenocarcinomas mucinosos e serosos tem aparência similar ao estudo ecográfico. Se apresentam como uma massa cística multilocular, com paredes irregulares, septações espessas ou projeções papilares (maiores que 3mm), e vascularização mural ou nódulos nos septos. Em casos suspeitos procurar implantes peritoneais, ascite ou massa no omento 1. Tumores ovarianos com baixo potencial de malignidade Aproximadamente 10% a 15% dos tumores serosos e mucinosos são histologicamente classificados como borderline, geralmente com bom prognóstico e curso benigno. O padrão ultrassonográfico de um tumor com baixo potencial de malignidade é de um cisto unilocular com a borda adjacente ao tecido ovariano normal em forma de crescente e múltiplos nódulos murais ou projeções papilares ou uma lesão cística associada a um bem definido nódulo multilocular descrito como favo de mel. O sinal em crescente é útil para excluir invasão 34, 35. Similar aos endometriomas material ecogênico pode estar presente, mas a presença de nódulos vasculares murais ocorre nos tumores bordeline 35, 36. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Metástases Em média, 10% dos cânceres ovarianos são metástases, mas são menos comuns durante o período gestacional. Os principais sítios primários são trato gastrointestinal e mama. Existe sobreposição dos achados ultrassonográficos de tumores primários e secundários, contudo as metástases costumam ser tumores sólidos e bilaterais, ainda que lesões císticas possam ocorrer. Outras massas únicas do período gestacional O luteoma da gestação é unilateral e geralmente assintomático, e a virilização materna pode ocorrer em 20% a 30% com 50% de chance de afetar fetos femininos 37. O aspecto ecográfico não é específico, e a presença de massa ovariana complexa, hipoecogênica e altamente vascularizada em paciente com hirsutismo na gestação tardia com andrógenos elevados sugere o diagnostico. A conduta é conservadora, pois os níveis de andrógenos circulantes tendem a normalizar algumas semanas após o parto 38. Gravidez heterotópica (gestação uterina coexistindo com gestação ectópica) espontânea é rara. Ocorre com uma incidência de 1% a 2% em pacientes submetidas a técnicas de reprodução assistida 39. A apresentação típica ocorre no primeiro trimestre da gestação, quando o transdutor ainda pode visualizar diretamente os ovários na grande maioria das pacientes. Lesões paraovarianas O examinador, na suspeita de lesão paraovariana, deve pressionar o transdutor ou a mão no abdome materno a fim de separá-la do ovário. A lesão pode apresentar movimento independente do ovário ipsilateral. Cistos para ovarianos são comuns, geralmente medindo 1-2cm. São de origem mesotelial ou paramesonéfrica e não tem significância clínica. Hidrossalpinge aparece como uma estrutura tubular dilatada, secundária a aderências inflamatórias coletando secreções que distendem o lume. Pode apresentar indentações em lados opostos da parede. A trompa dilatada pode apresentar septações incompletas e dobras sobre si. Pequenos nódulos ao longo da parede representam espessamento do endossalpinge que está associado a hidrossalpinge crônica. Estes últimos podem ser considerados suspeitos,porém a identificação de ovário ipsilateral normal aumenta a possibilidade de diagnóstico de hidrossalpinge 40. Em casos duvidosos a ressonância magnética pode separar o ovário da hidrossalpinge. O carcinoma de trompa é raro e é a EURP 2010; 2(3): 140-145


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Vasconcelos & Martins – Massas anexiais na gestação exceção entre as massas extra ovarianas em sua maioria benignas. Aspectos suspeitos incluem elementos sólidos, projeções papilares dentro de uma lesão tubular cística, similar as carcinoma ovariano 41. A doença inflamatória pélvica se apresenta clinicamente com sintomas não específicos de febre e dor. Complexo tubo ovariano é suspeitado quando no local da dor o ovário persiste ainda reconhecível , porém com aumento de fluxo em relação ao lado contra lateral. No abscesso tubo-ovariano o padrão morfológico do ovário é perdido na presença de massa anexial dolorosa. A coleção do piossalpinge tem aspecto predominantemente cístico. Antibióticos sistêmicos e/ou drenagem percutânea estão indicados 42 . Causas não ginecológicas A apendicite aguda é a condição cirúrgica não ginecológica mais comum na gravidez. A incidência não está aumentada nesta fase, porém o diagnóstico pode ser acidentalmente retardado por sintomas inespecíficos e progressiva dificuldade na visualização do apêndice devido ao aumento uterino, que colabora no aumento de casos de perfuração. Nos casos duvidosos a ressonância magnética pode diagnosticar uma apendicite e mesmo diferenciar de outras causas de massa pélvica tais como doença inflamatória intestinal. Considerações finais A grande maioria das massas anexiais na gestação serão identificadas incidentalmente durante a realização do exame ecográfico. A segurança fetal, bem como a capacidade de delinear a morfologia e as relações entre as estruturas pélvicas fazem do ultrassom o exame ideal para a avaliação inicial. Massa anexiais associadas com gestação são um risco. Hemorragia, torção e ruptura podem ocorrer. O movimento das trompas e dos ovários para fora da pelve durante a gestação e o retorno rápido destas estruturas após a parturição aumentam o risco de complicações 43. O risco de torção na gravidez é de aproximadamente 3% a 15% 7, 44, 45. Este evento pode levar a cirurgia de urgência, podendo desencadear efeitos fetais adversos tais como parto pré-termo e aborto. A cirurgia no segundo trimestre poderia prevenir complicações tardias na gestação 43. Diversos autores descreveram algoritmos para determinar o risco de malignidade. O Doppler colorido apresenta quase 50% de falso positivo o que limita seu uso isolado 25. A ressonância magnética também é segura para avaliar massas pélvicas na gestação. Ambos os métodos são dependentes da experiência do examinador. O momento da intervenção cirúrgica é Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

uma importante questão. O retardo pode aumentar o risco de complicações, atrasando também a terapia adjuvante em caso de malignidade 43. Intervenção cirúrgica precoce pode levar a perda do corpo lúteo tão importante para a manutenção da gestação inicial. Tumores ovarianos malignos e de baixo potencial para malignidade devem ser tratados cirurgicamente na paciente não grávida. Na gestante se há suspeita de malignidade pré operatória, o estadiamento cirúrgico completo que inclui o lavado peritoneal, biópsias peritoneais, omentectomia e linfadenectomia paraaórtica, pode ser prejudicado pelo grande aumento uterino e consequentemente o tratamento pode estar baseado em informação incompleta. Felizmente a maioria destes tumores ao momento do diagnóstico se encontra no estádio I permitindo tratamento cirúrgico conservador. Recentes estudos comprovam a segurança de seguimento cuidadoso se os achados ultrassonográficos não são suspeitos de malignidade. Considerações finais O estudo ultrassonográfico é de grande importância na avaliação de massas anexiais durante a gestação podendo determinar manejo conservador , discriminar os casos em que se faz necessário maior investigação diagnóstica ou outros procedimentos tais como intervenções cirúrgicas,punções etc. Pode determinar se a lesão tem características para resolução espontânea ou investigação pós parto 1. Também auxilia na identificação de lesões suspeitas de malignidade. Sintomas agudos podem precipitar intervenções em qualquer momento da gestação. Os sintomas clínicos, a história natural e o aspecto ecográfico destas massas muitas vezes determinarão o tratamento. Referências

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Artigo de Revisão Ultrassom na avaliação do endométrio pós-menopausa Ultrasound in postmenopause endometrium avaluation Rosane C G de Oliveira 1, Celene M L da Silva, Carolina O Nastri1,2, Wellington P Martins 1, 2

O sangramento uterino na pós-menopausa costuma ser motivo de busca do atendimento ginecológico. No rastreamento das causas, diversas são as possibilidades de métodos diagnósticos para elucidar o problema. A ultrassonogafia transvaginal é um método não invasivo, de baixo custo e de relativamente fácil acesso na avaliação das pacientes sintomáticas. As principais causas de sangramento uterino pós-menopausa são: pólipo, hiperplasia, atrofia e câncer endometrial. A atrofia endometrial também pode causar sangramento nesta faixa etária, mas a maior preocupação é fazer o diagnóstico precoce ou afastar a possibilidade de câncer de endométrio. O conhecimento das imagens típicas de cada patologia é importante instrumento na resolução dos casos de sangramento pós-menopausa para indicar ou excluir a necessidade de complementar a investigação com intervenções a fim de obter material para exame histopatológico. Palavras chave: Ultrassonografia; Endométrio; Menopausa.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 28/07/2010, aceito para publicação em 05/10/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartinsultrassonografia.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract Uterine bleeding in postmenopausal usually cause for search of the gynecological examination. In tracing the causes, there are several possibilities for diagnostic methods to elucidate the problem. The transvaginal ultrasonography isn’t a invasive method, it’s low cost and with relatively easy access in assessing symptomatic patients. The main causes of postmenopausal uterine bleeding are polyps, hyperplasia, atrophy, and endometrial cancer. Endometrial atrophy can also cause bleeding at this age group, but the main concern it’s to make early diagnosis or rule out the possibility of endometrial cancer. Knowledge of typical images of each condition is an important tool in resolving cases of post-menopausal bleeding to indicate or exclude the need for additional research with interventions to obtain material for histopathological examination Keywords: Menopause.

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Ultrasonography;

Endometrium;

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Oliveira et al. – Endométrio na pós-menopausa Introdução Menopausa é definida como o final do período menstrual, um ano após o último sangramento, decorrente da depleção ovariana. Sendo um diagnóstico retrospectivo, por vezes pode ser difícil para mulher identificar se o sangramento é por oscilação hormonal ou pós-menopausa, sendo este último considerado anormal 1. O sangramento uterino pós-menopausa faz parte da rotina diária dos clínicos e principalmente dos ginecologistas, sendo algumas vezes o motivo de busca do atendimento. Diante da queixa, faz-se necessário decidir sobre as possibilidades diagnósticas para elucidar o problema. Apenas 10 a 20% das pacientes com sangramento pós-menopáusico terão neoplasia, as demais apresentarão endometrite atrófica ou hiperplasia em 3 a 15% 2. O risco de câncer endometrial em mulheres pós-menopausa sem uso de terapia hormonal e com sangramento uterino é suficiente para recomendar investigação adicional. O ultrassom é o exame de primeira escolha nestes casos. Na ausência de qualquer exame o risco de câncer de endométrio é 10%, quando a espessura endometrial encontrada for menor ou igual a 3 mm o risco passa a ser de 0,6 a 0,8% enquanto que com espessura endometrial > 3 mm passa a ser de 20 a 22%. Nesse caso avaliação histológica se faz necessária seja o material obtido por biópsia, histeroscopia ou curetagem uterina semiótica 3, 4.

A ultrassonogafia transvaginal é um método não invasivo, de baixo custo e de relativamente fácil acesso como exame de rastreamento em pacientes sintomáticas. Possui alto poder de resolução e qualidade da imagem onde o endométrio pode ser visto com nitidez, assim como pode ser feito o diagnóstico da penetração tumoral em carcinoma de endométrio. O trandutor tranvaginal de 7,5 mHz alcança, em geral, cerca de 8 cm de profundidade o que torna adequado para avaliação da genitália interna feminina, mas tem como limitação a dificuldade para avaliar tumorações uterinas e pélvicas muito volumosas 1. Atualmente pode também ser utilizado exame de ultrassonografia em 3D cujo papel é complementar os achados em 2D, assim como a análise Doppler nos caso de suspeita de doença endometrial. O diagnóstico por 3D poderá ser realizado com maior precisão observando a homogeneidade ou não da lesão, suas bordas e a presença ou não de penetração miometrial que servirá como diagnóstico diferencial entre hiperplasia, carcinoma de endométrio com ou sem invasão miometrial 5. Outro exame considerado minimamente invasivo e que vem sendo estudado com mais freqüência é a histessonografia, com objetivo de maior elucidação das lesões encontradas na ultrassonografia 6.

Tabela 1. Espessura endometrial normal em diferentes fases da vida da mulher. Adaptado de Freitas, 2006 7.A Período Espessura (mm) Comentários Fase proliferativa 1ª semana

2,5 – 6,0

Interface hipoecóica pelo edema

2ª semana

Até 9,0

Isoecóico para disco trilaminar na fase periovulatória

Ovulação

10,0 – 15,9

Fase secretória

6,0 – 14,0

Fase menstrual

1,0 – 4,0

Ecogenicidade homogênea pelo aumento de muco e glicogênio

Pós-menopausa Sem hormonioterapia

1,0 – 4,0

Com hormonioterapia

4,92 ± 3,75

Achados ultrassonográficos normais As imagens ultrassonográficas encontradas na cavidade uterina normal mostram endométrio liso, com a mesma espessura das paredes anterior e posterior e com interface endométrio/miométrio preservada 7. A espessura endometrial normal em Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

mulheres pós-menopausa sem uso de terapia hormonal tem ponto de corte entre 3 e 5 mm, conforme a sensibilidade do método em estudo. Naquelas que utilizam terapia hormonal geralmente tem sido aceito como normal até 8 mm embora EURP 2010; 2(3): 146-149


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Oliveira et al. – Endométrio na pós-menopausa alguns autores consideram até 11 mm em mulheres de baixo risco para câncer endometrial (Tabela 1) 2, 7, 8. Principais causas de sangramento As principais causas de sangramento uterino pósmenopausa são: pólipo, hiperplasia, atrofia e câncer endometrial. Mesmo levando em conta que 90% das mulheres com câncer de endométrio têm sangramento pós-menopausa, a grande maioria delas têm sangramento secundário às alterações atróficas da vagina e do endométrio 1. A presença de pólipo endometrial é descrita como massa ecogênica de bordas lisas, textura ecográfica heterogênea, sendo emergente do endométrio, projetando-se para dentro da cavidade, com a interface endométrio/miométrio preservada e íntegra enquanto que na hiperplasia endometrial o endométrio é difusamente espessado e irregular, mas ainda com a interface endométrio/miométrio preservada. Grandes variações de espessura nas paredes anterior e posterior também são consideradas hiperplasias (Figura 1). As alterações típicas de câncer apresentam massa ecogênica, heterogênea e irregular, projetando-se para a cavidade endometrial e para o miométrio com perda da interface endométrio/miométrio, demonstrada pela não identificação do halo hipoecogênico periendometrial 9.

Figura 1. Imagem de ultrassonografia transvaginal mostrando a medida de um endométrio espessado em uma paciente de 72 anos em tratamento com tamoxifeno há três anos devido à câncer de mama. Adaptado de Sahdev, 10 2009 .

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Valor do ultrassom em mulheres sem sangramento O ultrasssom tem sido tipicamente utilizado como instrumento de avaliação do endométrio em mulheres com sangramento pós-menopausa. Quando o espessamento endometrial é encontrado em mulheres pós-menopausa sem sangramento existe um dilema clínico sobre qual conduta deverá ser tomada para aquela paciente. Um estudo randomizado na Dinamarca 2 encontrou que mulheres com espessura endometrial menor que 2,8 mm não tinham lesão focal em 98,5% dos casos. O mesmo estudo estabelece que mulheres com espessura endometrial maior que 8,0 mm tem probabilidade de 70% de apresentar lesão focal. Considerando que a maioria das lesões focais intra-uterinas são pólipos endometriais benignos e muito raramente câncer endometrial, o tratamento poderia ser desnecessário. Existe também a possibilidade de resultados ultrassonograficos falso-positivo para espessamento endometrial o que poderia levar a um excesso de tratamento gerando ansiedade, risco cirúrgico e custos elevados. A presença de fatores de risco para câncer endometrial deve ser levada em conta, reforçando nos casos com risco a indicação de uma conduta mais intervencionista. Utilidade da histerossonografia A histerossonografia é um procedimento que tem por objetivo determinar se a cavidade uterina é normal ou anormal e, quando anormal, se as alterações são focais ou difusas. São consideradas focais aquelas que ocupam até 25% da superfície na cavidade endometrial e difusas quando ultrapassam esta proporção. Consiste na infusão de um líquido na cavidade uterina, em geral solução salina, para melhor visualização da cavidade endometrial durante o ultrassom transvaginal. Este exame pode ser indicado para melhor visualizar alterações detectadas no US transvaginal, mas também quando as imagens capturadas forem consideradas inconclusivas. Diversas patologias endometriais podem ser mais bem identificadas utilizando esta técnica, tais como pólipos, miomas submucosos, hiperplasia, câncer e aderências endometriais. Nas mulheres com sangramento pós-menopausa tem especial função de distinguir entre atrofia (a principal causa de sangramento nesta fase da vida) e lesões anatômicas que requeiram amostra histológica ou ressecção terapêutica 11. As principais contra-indicações são: gravidez, infecção pélvica e sangramento excessivo. As principais complicações são a falha em realizar um procedimento completo (estenose cervical, dilatação cervical excessiva ou dificuldade de distender a EURP 2010; 2(3): 146-149


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Oliveira et al. – Endométrio na pós-menopausa cavidade uterina), dor pélvica, sintomas vagais, náuseas e febre pós-procedimento. Essas complicações em geral são leves e pouco freqüentes. Considerações finais O exame ultrassonografico é a primeira escolha para investigação do sangramento uterino pósmenopausa. Por ser um método não-invasivo costuma ter boa aceitação por parte das mulheres e ao mesmo tempo auxilia na decisão clínica do tratamento conservador ou indica a necessidade de avaliação histopatológica. Em mulheres pós-menopausa sem sangramento a espessura endometrial pode ser útil para excluir patologia intra-uterina focal. O limite para iniciar investigação em mulheres assintomáticas não está bem definido e a presença ou não de fatores de risco para câncer endometrial deve ser levada em conta. Enquanto há alguns poucos anos na maioria dos serviços só dispunham de curetagem uterina semiótica para avaliação histopatológica, atualmente diversos são os métodos para esse fim tais como biópsia dirigida por histeroscopia além da melhora no conforto da paciente usando instrumentais cada vez mais delicados, por exemplo a cureta de aspiração endometrial de Pipelle. O conhecimento das imagens típicas de cada patologia facilita o trabalho do ultrassonografista, mas o clinico deverá analisar os resultados encontrados levando em conta a sintomatologia da paciente. Devendo este não limitar-se a um único método diagnóstico.

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Artigo de Revisão Características ultrassonográficas da dengue Sonographic features of dengue Aldino B de Oliveira 1, Carolina O Nastri1,2, Wellington P Martins 1, 2

A dengue é uma doença endêmica no Brasil e no mundo, excetuando-se a Europa. Os mesmos quatro sorotipos virais causadores da doença clássica propiciam também o aparecimento de formas mais agressivas da doença em populações suscetíveis. A dengue hemorrágica, caracterizada por quadro de febre alta, é inicialmente idêntica à dengue clássica, contudo o extravasamento de plasma do intra-vascular é o fator diferencial entre os tipos clínicos. O aumento da permeabilidade vascular, levando a uma perda de plasma e albumina, determina um quadro descrito como poli-serosite que é responsável pelos derrames cavitários. A ultrassonografia abdominal convencional tornouse uma importante ferramenta auxiliar no diagnóstico precoce em pacientes com febre hemorrágica da dengue. O espessamento da parede da vesícula biliar é um achado precoce da doença, podendo auxiliar no seu diagnóstico inicial. Quando acima de 3 mm, está associado a casos mais graves da doença, sendo este um importante indicador de gravidade e prognóstico para febre hemorrágica da dengue. Palavras chave: Dengue; Febre Hemorrágica da Dengue; Ultrassonografia; Vesícula Biliar.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 28/09/2010, aceito para publicação em 10/10/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartinsultrassonografia.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract Dengue is an endemic disease in Brazil and worldwide, with exception to Europe. The same four serotypes causing the classic disease may also be responsible for a more aggressive form in susceptible populations. Dengue hemorrhagic fever, characterized by high fever frame, is initially similar to dengue fever, although the plasma extravasation of intra-vascular is the distinguishing factor between the clinical types. The increased vascular permeability, leading to a loss of plasma and albumin, provides a framework described as poly-serositis that is responsible for serous effusions. The conventional abdominal sonography has become an important tool for early diagnosis in patients with dengue hemorrhagic fever. Thickening of the gallbladder wall is an early finding of the disease and may help in its diagnosis. Above 3 mm, is associated with more severe cases of the disease, which is an important indicator of the severity and prognosis of dengue hemorrhagic fever Keywords: Dengue; Dengue Ultrasonography, Gallbladder.

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Hemorrhagic

Fever;

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Oliveira et al. – Dengue Introdução Dengue é uma doença de transmissão vetorial cujos agentes são as fêmeas infectadas do mosquito do gênero Aedes e em especial a espécie Aedes aegypti (Diptera: Culicidae) e é considerada a enfermidade de transmissão vetorial com o maior 1 , estimando-se crescimento no mundo aproximadamente 100 milhões de infecções anuais 2. Embora seja a Europa o único continente livre do vetor, alguns autores já relatam casos de ocorrência da doença em alguns países europeus em indivíduos oriundos de áreas endêmicas do Brasil e África 3. Segundo Eppich 4, no Brasil a transmissão da dengue tornou-se um problema de saúde pública em crescente expansão. De acordo com a secretaria de vigilância em saúde do Ministério da saúde 5 no período da última grande epidemia de 2001-2003, foram notificados 1.564.112 casos de dengue no país, sendo 4.123 na forma hemorrágica, com 217 óbitos. Contudo, os autores estimam que o número real de casos pode ter ultrapassado a cifra de 40 milhões. A dengue é uma doença febril aguda, cujo agente etiológico é um vírus do gênero Flavivírus, sendo conhecidos até o presente, quatro sorotipos virais denominados DEN-1, DEN-2, DEN-3 e DEN-4 dos quais 1 e 2 ocorrem de forma epidêmica em diferentes partes do país anualmente 6 sendoque cada um desses sorotipos possui diferentes cepas difundidas na mesma região ou em diversas partes do mundo 7. Em 2001 foi pela primeira vez o sorotipo DEN-3 8, no Rio de Janeiro, sorotipo responsável pelo aparecimento de formas mais agressivas da doença - possivelmente pelo fato da população ainda estar suscetível a esse novo sorotipo. O espessamento difuso da parede da vesícula biliar é um achado inespecífico o qual foi descrito pela primeira vez em crianças com febre hemorrágica da dengue, não necessariamente sendo relacionada a uma afecção primária da vesícula 9. Quadro clínico A infecção por qualquer um dos sorotipos do vírus pode variar desde uma infecção assintomática às formas mais agressivas. A dengue manifesta-se como uma enfermidade infecciosa aguda caracterizada por um amplo espectro clínico que varia desde formas de infecção assintomática ou febre indiferenciada, até as graves formas de hemorragia e/ou choque 7. Conforme os mesmos autores, os casos típicos da dengue podem ser agrupados em duas categorias principais denominados de síndrome de febre da dengue ou dengue clássica e febre hemorrágica da dengue ou dengue hemorrágico. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

A dengue clássica caracteriza-se por febre alta de início abrupto, cefaléia intensa, mialgias, astenia, dor retro-orbitária, dores articulares e musculares, prostração, acompanhada algumas vezes de exantema maculo papular além de manifestações gastrointestinais e linfoadenopatias 7. A dengue hemorrágico ou síndrome de choque da dengue é caracterizado por um quadro de febre alta, inicialmente indiferenciável da dengue clássica que, após a normalização da temperatura (entre o terceiro e o quinto dia da enfermidade), evolui com fenômenos hemorrágicos (petéquia, púrpura, equimose, epistaxe, sangramento gengival, sufusões hemorrágicas, hematêmese, melena) e/ou insuficiência circulatória com ou sem choque hipovolêmico 7. De acordo com a Organização PanAmericana da Saúde, um achado importante que determina a gravidade da dengue hemorrágico e que o diferencia da dengue clássico, é o extravasamento de plasma. Fisiopatologia Diversos estudos têm sido conduzidos em diferentes localidades no intuito de se elucidar os mecanismos imunopatogênicos determinantes da febre hemorrágica da dengue, bem como dos principais fatores de risco individuais e ambientais. A teoria da infecção seqüencial pelos vírus da dengue 10, determina que, a imunoamplificação da infecção dependente de anticorpos pré-existentes explica o desenvolvimento da febre hemorrágica em pacientes secundariamente infectados. Segundo o CDC (Centers for Disease Control and Prevention) 11 a dengue hemorrágica tem como base fisiopatológica uma resposta imune-anômala, dependente de anticorpos (ADA), envolvendo leucócitos, citocinas e imunocomplexos, causando aumento da permeabilidade por má função vascular endotelial sem destruição do endotélio, com extravasamento de líquidos para o interstício, causando queda da pressão arterial e manifestações hemorrágicas, associadas à trombocitopenia. Conseqüente a estas manifestações surge hemoconcentração com redução da volemia, má perfusão tissular, hipóxia e acidose lática. A hepatomegalia e derrames cavitários são achados comuns. Ainda de acordo com este centro 11, alguns sinais indicam a possibilidade da gravidade do quadro clinico e de evolução para dengue hemorrágico e/ou síndrome de choque da dengue que são: dor abdominal intensa e continua, vômitos persistentes, hipotensão postural e ou lipotímia, hepatomegalia dolorosa, hemorragias importantes, sonolência e irritabilidade, diminuição repentina da temperatura EURP 2010; 2(3): 150-153


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Oliveira et al. – Dengue corpórea ou hipotermia, aumento repentino do hematócrito, queda abrupta de plaquetas, desconforto respiratório. O principal fator fisiopatológico da febre hemorrágica da dengue é um importante aumento da permeabilidade vascular, levando a uma perda de plasma e albumina a partir do espaço intravascular, determinando um quadro descrito como polisserosite 2 . A hipotensão secundaria ao extravasamento plasmático tipicamente ocorre até 48 horas após a defervescência, momento este em que a febre cede e a temperatura passa a ser inferior as 38°C. Neste instante a ultrassonografia torna-se uma importante ferramenta auxiliar ao diagnóstico precoce em pacientes com febre hemorrágica da dengue e no diagnóstico diferencial de outras doenças febris 12. Avaliação ultrassonográfica Os achados ultrassonográficos iniciais da dengue na sua forma mais leve incluem espessamento da parede da vesícula biliar (Figura 1), presença de fluido pericolecístico, ascite leve, efusão pleural e pericárdica e hepatoesplenomegalia. As formas mais severas da doença são caracterizadas por acúmulo de líquido nas regiões para e peri-renais, sub-capsular hepática e esplênica e aumento do pâncreas, além das alterações descritas previamente. Também podem ser encontradas, em alguns casos, alterações no parênquima hepático, atribuída a hemorragia subcapsular e intra-parenquimatosa 9. O espessamento da parede da vesícula biliar é um achado ultrassonográfico inicial no curso da doença, presente em grande maioria dos casos 13. Acredita-se que ocorra devido à diminuição da pressão oncótica intra-vascular. Esse achado também pode ser encontrado em outras patologias, como em outros tipos de infecções virais, na febre entérica e na leptospirose. Entretanto essas patologias diferem na apresentação clínica, em relação à dengue. Em pacientes com febre entérica, encontram-se outras alterações à ultrassonografia, que incluem: linfadenopatia intra-abdominal, anormalidades do intestino (espessamento intra-mural da região terminal do íleo e do ceco) e anormalidades do parênquima renal. Na leptospirose são encontradas alterações do parênquima renal e hepático, além do espessamento da parede da vesícula biliar. Além disso, o espessamento da vesícula pode ser visualizado concomitantemente a outras condições como ascite, coledococistopatia congestiva, cirrose hepática e hipertensão porta. Desta forma, o achado isolado de espessamento da vesícula biliar é um achado inespecífico, quando isolado, e devem ser considerados os sinais e sintomas concomitantes 13. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Quanto ao espessamento da parede da vesícula biliar, são descritos quatro padrões 13: 1) Padrão estriado: caracterizado com múltiplas camadas hipoecóicas, separadas por zonas ecogênicas; 2) Padrão assimétrico: com tecido ecogênico projetando na luz vesicular; 3) Padrão de camada hipoecóica central: separada por duas camadas ecogênicas; 4) Padrão ecogênico: sendo que nos pacientes com FHD, é predominante o padrão de espessamento estriado devido ao acumulo de liquido entre as camadas da parede produzindo as estriações, em função da diminuição da pressão osmótica intravascular.

Figura 1. Ultrassonografia abdominal subcostal evidenciando o espessamento da parede (seta) da vesícula biliar (VB). Adaptado de Venkata Sai, 2005 13.

O espessamento da parede da vesícula, acima de 3 mm, parece estar significativamente associado a casos mais graves da doença 14, assumindo que este dado poderia ser utilizado como critério para admissão hospitalar ou monitoramento enquanto que uma espessura maior que 5 mm identificava pacientes com febre hemorrágica com maior risco de desenvolvimento de choque hipovolêmico. De acordo com os mesmos autores 14, o espessamento da parede da vesicular biliar no seu padrão estriado possui associação significativa com as formas grave de dengue, sendo este achado um marcador relevante para o diagnostico clinico e como indicador de gravidade para as formas grave da dengue. EURP 2010; 2(3): 150-153


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Oliveira et al. – Dengue Considerações Finais A ultrassonografia como método de diagnóstico é largamente empregada em praticamente todas as áreas de cunho médico, devido à simplicidade com que é feita, associado ao seu baixo custo em relação a outros métodos, principalmente, por ser inócuo. O achado de espessamento da vesícula biliar na avaliação da dor abdominal em quadros febris agudos pode sugerir o diagnóstico de dengue. A ultrassonografia também pode ser utilizada na avaliação do prognóstico, quando o espessamento da parede da vesícula maior que 3 mm é indicador de gravidade para febre hemorrágica da dengue. Referências

1. Briseno-Garcia B, Gomez-Dantes H, Argott-Ramirez E, Montesano R, Vazquez-Martinez AL, Ibanez-Bernal S, et al. Potential risk for dengue hemorrhagic fever: the isolation of serotype dengue-3 in Mexico. Emerg Infect Dis 1996; 2(2): 133135. 2. Gubler DJ. Epidemic dengue/dengue hemorrhagic fever as a public health, social and economic problem in the 21st century. Trends Microbiol 2002; 10(2): 100-103. 3. Franco L, Di Caro A, Carletti F, Vapalahti O, Renaudat C, Zeller H, et al. Recent expansion of dengue virus serotype 3 in West Africa. Euro Surveill 2010; 15(7): 4. Eppich WJ, Zonfrillo MR. Emergency department evaluation and management of blunt abdominal trauma in children. Curr Opin Pediatr 2007; 19(3): 265-269.

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5. Camara FP, Theophilo RL, Dos Santos GT, Pereira SR, Camara DC, de Matos RR. [Regional and dynamics characteristics of dengue in Brazil: a retrospective study]. Rev Soc Bras Med Trop 2007; 40(2): 192-196. 6. Figueiredo LT. The Brazilian flaviviruses. Microbes Infect 2000; 2(13): 1643-1649. 7. Pontes RJ, Ruffino-Netto A. [Dengue in a urban locality of southeastern Brazil: epidemiological aspects]. Rev Saude Publica 1994; 28(3): 218-227. 8. Rocco IM, Kavakama BB, Santos CL. First isolation of dengue 3 in Brazil from an imported case. Rev Inst Med Trop Sao Paulo 2001; 43(1): 55-57. 9. Pramuljo HS, Harun SR. Ultrasound findings in dengue haemorrhagic fever. Pediatr Radiol 1991; 21(2): 100-102. 10. Halstead SB. Global epidemiology of dengue hemorrhagic fever. Southeast Asian J Trop Med Public Health 1990; 21(4): 636641. 11. CDC C. Dengue. Available at: http://www.cdc.gov/dengue/. Accessed 15/09/2010, 2010. 12. Setiawan MW, Samsi TK, Pool TN, Sugianto D, Wulur H. Gallbladder wall thickening in dengue hemorrhagic fever: an ultrasonographic study. J Clin Ultrasound 1995; 23(6): 357-362. 13. Venkata Sai PM, Dev B, Krishnan R. Role of ultrasound in dengue fever. Br J Radiol 2005; 78(929): 416-418. 14. Setiawan MW, Samsi TK, Wulur H, Sugianto D, Pool TN. Epigastric pain and sonographic assessment of the pancreas in dengue hemorrhagic fever. J Clin Ultrasound 1998; 26(5): 257-259.

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Artigo de Revisão Ultrassonografia com contraste no diagnóstico das principais lesões focais hepáticas Contrast-enhanced ultrasonography in the diagnosis of main focal liver lesions Rogério S Castro1, Carolina O Nastri1,2, Wellington P Martins 1, 2

A ultrassonografia (US) é um método de imagem acessível, não usa radiação ionizante, entretanto, apresenta limitações quanto ao diagnóstico das lesões focais hepáticas. Outros exames de imagem como a tomografia computadorizada (TC) com contraste trifásico e a ressonância nuclear magnética (RNM) apresentam uma especificidade maior em relação à ultrassonografia. Com a utilização dos agentes de contraste ocorreu um aumento da acurácia no diagnóstico, pois, com o uso do contraste existe um realce na vascularização intra-tumoral das lesões focais hepáticas ajudando na diferenciação entre lesões benignas e malignas. O objetivo do nosso trabalho é fazer uma revisão de literatura sobre o uso do contraste no diagnóstico das principais lesões focais hepáticas e tentar definir características vasculares típicas de cada uma dessas lesões. Em suma, nota-se que a ultrassonografia com contraste é um método superior à ultrassonografia convencional e apresenta especificidade semelhante à TC e a RNM no diagnóstico das lesões focais hepáticas. Palavras chave: Ultrassonografia com contraste; Lesões focais hepáticas; Agentes de contraste.

1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 08/10/2010, aceito para publicação em 14/10/2010. Correspondências para Wellington P Martins. Departamento de Pesquisa da EURP - Rua Casemiro de Abreu, 660, Vila Seixas, Ribeirão Preto-SP. CEP 14020-060. E-mail: wpmartinsultrassonografia.com.br Fone: (16) 3636-0311 Fax: (16) 3625-1555

Abstract The ultrasonography (US) is a method of accessible image, does not use ionizing radiation, however presents limitations how much to the diagnosis of the focal liver lesions. Other examinations of image as the computed tomography (CT) with three-phase contrast and the magnetic resonance imaging (MRI) present a bigger specificity in relation the ultrasonography. With the use of the contrast agents an increase of the accuracy in the diagnosis occurred, therefore, with the use of the contrast a distinction in the intra-tumoral vascularization of the focal liver lesions exists helping in the differentiation between benign and malignant lesions. The objective of our study is to make a literature revision on the use of the contrast in the diagnosis of the main focal liver lesions and to try to define typical vascular characteristics of each one of these lesions. As conclusion, one notices that the contrastenhanced ultrasonography is a superior method to the conventional US and presents similar specificity to the TC and the MRI in the diagnosis of the focal liver lesions. Keywords: Contrast-enhanced ultrasonography; Focal liver lesions; Contrast agents.

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Castro et al. – Ultrassonografia contrastada das lesões hepáticas Introdução As lesões focais hepáticas são achados comuns na população em geral. A importância do diagnóstico preciso é a definição do tipo de seguimento e tratamento a serem administrados aos pacientes, desde o simples acompanhamento nos hemangiomas até o tratamento cirúrgico ou transplante hepático no caso do carcinoma hepatocelular (CHC), representando na atualidade, o quinto câncer mais comum no mundo e o terceiro mais mortal 1. . Atualmente, o diagnóstico das lesões focais hepáticas é realizado através de exames de imagem como a tomografia computadorizada (TC) e a ressonância nuclear magnética (RNM), dificilmente necessitando de biópsia hepática 2. A ultrassonografia convencional, baseada na aparência das lesões pela escala de cinza, permite a diferenciação entre massas císticas e sólidas. Com a ajuda do Doppler podem ser dadas informações adicionais quanto à vascularização das lesões 2. Entretanto, o otimismo inicial com relação à ultrassonografia Doppler, quanto à sua capacidade em prover informações suficientes para o diagnóstico preciso das lesões focais, não se sustentou com o passar do tempo 3. A introdução da ultrassonografia utilizando contraste com microbolhas levou a uma descrição mais precisa da microvasculatura e macrovasculatura das lesões focais hepáticas. No entanto, os contrastes de primeira geração, apresentavam curta meia-vida e uma maior rigidez de sua cápsula protetora, necessitando de elevados índices mecânicos dos aparelhos de ultrassonografia 4. Recentemente, novos contrastes foram desenvolvidos com microbolhas variando entre 1 a 10 μm, com cápsulas mais flexíveis e preenchidas por gases como perfluorpropano e perfluorcarbono, mostrando uma boa resposta harmônica com baixos índices mecânicos oferecendo uma ótima descrição da vascularização das lesões focais muito semelhante a TC e a RNM, com as vantagens de serem em tempo real e sem utilizar radiação ionizante 4. Agentes de contraste ultrassonográficos Existem vários tipos de agentes de contraste disponíveis no mercado e a dose a ser administrada dependerá do tipo de agente que será utilizado (Tabela 1). De uma forma geral, os pacientes são posicionados em decúbito dorsal para a realização da ultrassonografia convencional. Defini-se o local a ser avaliado. Realiza-se a punção de veia periférica com agulha entre 20 a 22 gauge e aplica-se a dose correspondente ao tipo do contraste a ser utilizado e logo imediatamente é realizado aplicação de bolus de Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

5 a 10 ml de solução salina a 0,9%. Inicia-se o processo de gravação das imagens, desde a aplicação do contraste em tempo real e avalia-se as fases sem contraste, a fase arterial (0-49 segundos), fase portal (50-179 segundos) e a fase tardia (>180 segundos). A ecogenicidade basal do fígado e das lesões focais são analisadas e comparadas com todas as fases: arterial, portal e tardia, procurando observar o contraste entre as lesões focais e o fígado adjacente 4. Tabela 1. Lista dos agentes de contraste e suas propriedades. Adaptado de HOMANN et al., 2004 5. Agente

Gás

Camada protetora

Levovist

Ar

Galactose, ácido palmítico

Optison

Perfluoropropano

Albumina

Echogen

Duodecafluoropentano

Surfactante

SonoVue

Hexafluorido sulfúrico

Fosfolipídeos

Definity

Perfluoropropano

Fosfolipídeos

Imagent

Perfluorohexano

Surfactantes

Sonavist

Ar

Cianocrilato

Sonazoid

Perfluorocarbono

Surfactantes

BR14

Perfluorobutano

Fosfolipídeos

IV = intravascular

Uma importante conseqüência física decorrente da ruptura das bolhas chama-se de cavitação inercial. Quando as ondas sonoras viajam através de um fluido, o meio-ciclo de rarefação da onda acústica pode abrir o fluido criando cavidades esféricas no mesmo. O rápido colapso subseqüente destas cavidades durante o meio-ciclo de compressão da onda acústica pode concentrar grandes quantidades de energia em um pequeno volume, aumentando a temperatura no centro do colapso a milhares de graus Kelvin, formando radicais livres e mesmo emitindo a radiação eletromagnética. A possibilidade de ocorrência desse efeito depende do raio de insonação negativo do pulso de amplitude, da freqüência acústica ou freqüência central do transdutor que em suma corresponde ao índice mecânico (IM). Os estudos demonstram que evidências reais de efeitos de cavitação como a formação de peróxidos e produção de ondas acústicas e efeitos biológicos como hemólise EURP 2010; 2(3): 154-163


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Castro et al. – Ultrassonografia contrastada das lesões hepáticas e destruição de plaquetas ocorreram com concentrações de contraste, longa duração do pulso acústico e alto índice mecânico. Com concentração do agente menor que 0,2%, duração do pulso menor que 2μs e IM <1,9. Sendo assim, deve-se preferir considerar um princípio de exposição ALARA (As Low As Reasonable Achievable) isto é, tão baixo quanto possível. O paciente deve ser exposto ao menor IM, a mais breve duração total de exposição acústica, à menor dose do agente com contraste e à maior frequência ultrassônica 2, 6. Lesões hepáticas Hemangioma Tumor benigno mais comum encontrado no fígado com uma prevalência que varia de 1 a 20% na população geral com uma incidência maior no sexo feminino com proporção feminino/masculino variando de 2:1 a 5:1 conforme a casuística 4. Na ultrassonografia convencional, os hemangiomas são tipicamente hiperecogênicos com brilhos dos ecos distribuído de forma homogênea, margens bem definidas com ou sem sombra posterior. Entretanto, o aspecto ultrassonográfico pode variar apresentando características atípicas até com hipoecogenicidade com bordas hiperecogênicas 4, 7. Grandes hemagiomas entre 4 a 5 cm podem se apresentar com uma ecotextura heterogênea decorrentes de trombose intralesional, degeneração cística , fibrose ou hialinização e depósitos de cálcio. Em pacientes cirróticos ou com neoplasia extrahepática, mesmo com aspecto típico, exames adicionais devem ser realizados 4. No estudo com Doppler colorido e de potência, a avaliação do hemangioma é limitada, exceto por demonstrar ausência ou pobre vascularização intralesional. Devido ao pequeno tamanho das estruturas vasculares e as velocidades de fluxo intravasculares extremamente baixas (0,003-0,008 cm/s), o estudo Doppler e pouco sensível na detecção defluxos venosos lentos característicos da estrutura anatomopatológica dos hemangiomas 2, 4. O realce característico é o preenchimento periférico do meio de contraste na fase precoce (aparência de algodão) formando glóbulos que vão se tornando maiores e mais numerosos com um preenchimento centrípeto nas fases: venosa-portal e tardia. O realce ecográfico resultante do preenchimento vascular pelo meio de contraste pode ocorrer de forma rápida ou lenta e o preenchimento pode ser completo ou incompleto 4, 7-10. Em grandes hemangiomas (>4 cm de diâmetro), o preenchimento centrípeto pode ser incompleto devido a presença de áreas com degeneração ou fibrose. Além disso, faz-se Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

importante ressaltar que este preenchimento incompleto pode se dever a meia vida curta de alguns agentes de contraste em comparação aos agentes utilizados na CT e RNM como o iodo e o gadolínio. Alguns autores com Ricci et al encontraram que entre 25 hemangiomas estudados com ultrassonografia com contraste utilizando SonoVue, apenas 12 lesões apresentaram preenchimento completo. Bartollotta et al., em 2005 4, encontraram preenchimento completo em 29 de 35 hemangiomas utilizando SonoVue. Em contrapartida, em hemangiomas pequenos (< 2cm de diâmetro) , quando o fluxo arterial é muito rápido , aquele realce periférico globular característico pode não ser observado. Existem relatos na literatura a respeito dos hemangiomas atípicos cujo realce pode ser confundido com outras lesões focais como adenomas, hiperplasia nodular focal, metástases e CHC tornando difícil o diagnóstio diferencial entre elas. No entanto, as lesões benignas normalmente são diferenciadas facilmente das lesões malignas através da análise das fases portal e tardia ou denominada fase portal venosa estendida. As lesões benignas apresentam persistência do contraste intralesional nestas fases, enquanto isso nas lesões malignas é observado um washout precoce do contraste intralesional percebendo o parênquima adjascente contrastado e lesão focal sem contraste nas fases tardias 4. Um estudo realizado Bhayana et al 11 analisou a presença de washout nas lesões focais hepáticas utilizando o Definity como meio de contraste. Neste trabalho foi avaliado a presença de washout em 4 momentos diferentes após a injeção do contraste < 30 segundos, 30 -75 segundos, 76-180 segundos e > 180 segundos, sendo encontrado que lesões benignas como o hemangioma apresentaram washout (6/29 hemangiomas) sendo 1 hemangioma com washout entre 30 e 75 segundos e 5 hemangiomas > 180 segundos. Como conclusão principal o estudo mostrou que as lesões benignas também apresentam washout e algumas apresentam washout precoce. Outro trabalho publicado por Nicolau et al 12 comparou a acurácia diagnóstica entre a análise de imagens ultrassonograficas com contraste apenas da fase tardia com análise de todas as fases(arterial, portal e tardia) em seqüência mostrando superioridade de acurácia na avaliação das três fases em seqüência. Dietrich et al 13 realizaram um trabalho mostrando que entre 58 hemangiomas diagnosticados por biópsia os achados ultrassonográficos mais encontrados com uso do contraste foram: o preenchimento centrípeto completo (78%) e o realce EURP 2010; 2(3): 154-163


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Castro et al. – Ultrassonografia contrastada das lesões hepáticas periférico na fase arterial (74%) e que a combinação dos dois apresentava 98% de sensibilidade. Hiperplasia nodular focal A hiperplasia nodular focal é o segundo tumor benigno mais comum do fígado depois do hemangioma sendo responsável por aproximadamente 8% de todos os tumores primários hepáticos, sendo mais comum em mulheres jovens em idade fértil devido a influências hormonais e invariavelmente detectada incidentalmente pelos exames de imagem em pacientes assintomáticos 14. A maioria das lesões são massas bem circunscritas e geralmente solitárias medindo menos de 5 cm de diâmetro apresentando uma cicatriz central. Histologicamente, as lesões apresentam hepatócitos, células de Kupffer, ductos biliares normais e componentes do espaço porta, apesar de não encontrarmos estruturas venosas portais. Sendo uma lesão hiperplásica, ocorre proliferação de hepatócitos normais, não neoplásicos dispostos de maneira anormal que se desenvolvem a partir de uma malformação arterial aracniforme preexistente. Os ductos biliares e artérias de paredes espessas são proeminentes, especialmente no tecido da cicatriz central 2. Na ultrassonografia convencional, a hiperplasia nodular focal se apresenta como uma massa hepática discreta muito semelhante ao parênquima adjacente. A cicatriz central pode aparecer como uma área hipoecogênica linear ou em forma de estrela 2, 14. Na ultrassonografia Doppler a HNF pode apresentar a artéria nutridora ou o aspecto característico da vascularização arterial em roda de carroça ou em formato de estrela sendo mais observados em lesões de maiores dimensões. O Doppler geralmente mostra sinais predominantemente arteriais com uma alternância na faixa média (2 a 4 kHz) na região central 2, 4, 14. Na ultrassonografia com contraste a HNF mostrase como uma lesão hipervascularizada e se apresenta hiperecogênica em relação ao parênquima hepático adjacente na fase arterial. A região central em forma de estrela é preenchida em menos de 30 segundos após a injeção de contraste como o levovist apresentando em um estudo uma especificidade de 100% no diagnóstico da HNF 4, 7, 8, 15. O diagnóstico é baseado no preenchimento centrifugo na fase arterial e da vascularização em forma de estrela e nas fases portal e tardia apresenta um persistente realce homogêneo. Outra característica sugestiva é a presença de cicatriz central não realçada pelo contraste 4, 7. Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

Alguns trabalhos têm dado ênfase a características apresentadas pela HNF em fígados com esteatose. Lin et al, em 2007 16, publicaram um estudo onde 26 pacientes com HNF foram divididos em dois grupos: grupo A 14 pacientes com esteatose hepática e grupo B com 12 pacientes com fígado normal. A grande maioria dos pacientes do grupo A apresentaram lesões hipoecogênicas na ultrassonografia convencional enquanto no grupo B a maior parte das lesões eram hiperecogênicas (p < 0,05). Com relação à ultrassonografia com contraste, no grupo A foi observado vascularização em roda de carroça em 8 pacientes e o preenchimento centrípeto do contraste foi observado nos 6 pacientes restantes, porém 3 pacientes apresentaram lesões hipoecogênicas na fase tardia. No grupo B, a vascularização em roda de carroça foi observado em 8 pacientes e o preenchimento centrípeto em 4 pacientes e em todos pacientes foi observado realce contínuo na fase tardia, concluindo-se que em fígados esteatóticos a HNF apresenta-se hipoecogênica e com washout hipoecóico na fase tardia necessitando de biópsia hepática para definição diagnóstica 16. Outro trabalho publicado em 2004 por Bartollota et al 17 mostrou resultados semelhantes enfatizando o wash out na fase portal e tardia de lesões em fígados esteatóticos dificultando o diagnóstico das mesmas. Com relação às características encontradas na ultrassonografia com contraste, vários estudos recentes vêm tentando encontrar qual aspecto ultrassonográfico é mais específico para o diagnóstico. Yen et al 18 pesquisaram 34 pacientes não cirróticos com 37 tumores hepáticos que apresentavam artéria nutridora identificada pela ultrassonografia Doppler. Alguns pacientes eram portadores do vírus da hepatite B ou da hepatite C. Foram realizados outros estudos de imagem nas lesões como CT, RNM, angiografia e cintilografia e todas as lesões foram submetidas à biópsias ou ressecadas. Como resultado foi encontrado que 36 lesões apresentaram vascularização em roda de carroça sendo 34 HNF e 2 CHCs sendo assim neste estudo a ultrassonografia com contraste na avaliação do realce do contraste do tipo roda de carroça apresentou sensibilidade de 97,1 %(34/35). Kim et al 3 publicaram um estudo propondo determinar se a ultrassonografia com contraste utilizando o contraste Definity apresenta boa acurácia na diferenciação da HNF do adenoma. Participaram deste estudo 62 pacientes, a maioria do sexo feminino (n=52), sendo análise das imagens sendo realizadas por 2 radiologistas os quais desconheciam identificação, história clinica, resultados das biópsias dos pacientes. Como resultado foi encontrado que o EURP 2010; 2(3): 154-163


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Castro et al. – Ultrassonografia contrastada das lesões hepáticas preenchimento centrífugo do contraste e o padrão de vascularização em forma de estrela na faz arterial são as características mais comuns na HNF e que a persistência do contraste na fase portal tardia também era comum na HNF. Neste estudo foi observado entre 89 a 95 % de sensibilidade e 86 a 90 % de especificidade com o uso do contraste na diferenciação das lesões focais. Em um estudo recentemente publicado em 2010 por Bartolotta et al 14, foram estudas 92 lesões com diagnóstico de hiperplasia nodular focal com a ultrassonografia com contraste SonoVue e foi encontrado sinal de roda de carroça, cicatriz central ou vasos nutridores em 44 lesões (47,8%). Essas características foram encontradas mais facilmente em lesões maiores que 3 cm em 27 de 36 lesões (75%) em relação às menores que 3 cm, 17 de 56 lesões(30%) com p<0,0001t al., 2010). Adenoma Os adenomas hepáticos são mais raros que a HNF e são mais freqüentes no sexo feminino e com grande associação com o uso de contraceptivos orais e com o uso de esteróides anabolizantes 2. Na grande maioria das vezes ele é assintomático, porém sintomas como dor podem ocorrer decorrente de hemorragia ou infarto da lesão. A ruptura da lesão geralmente leva a um quadro de hemoperitôneo e choque hipovolêmico, sendo a manifestação mais grave 2. Estudos relatam forte associação do adenoma com doenças de depósito de glicogênio hepáticas sendo que a freqüências dessas lesões na glicogenose tipo I (Doença de von Gierke) chega a 40% cursando muitas vezes com a presença de múltiplos nódulos 2. Na maioria das vezes o adenoma é solitário e bem encapsulado com o tamanho variando de 8 a 15 cm. À microscopia observam-se hepatócitos normais ou discretamente atípicos. Os ductos biliares e células de Kupffer estão presentes em número reduzido e podem apresentar calcificações e tecido adiposo 2. Na ultrassonografia convencional, a aparência do adenoma é inespecífica podendo ser hiperecogênica, hipoecogênica, isoecogênica ou heterogênea. A ultrassonografia Doppler pode dar algumas pistas para ajudar no diagnóstico como o padrão de venoso de vascularização central ou periférico presente nos adenomas 2. A ultrassonografia com contraste reflete a natureza hipervascular do adenoma demonstrando as artérias nutridoras com um preenchimento centrípeto na fase arterial e realce de contraste com menor intensidade nas fases portal e tardia. Em lesões pequenas pode eventualmente existir a confusão com a HNF e hemangiomas, sendo necessários, outros Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

métodos de imagem, até a biópsia hepática para a definição do diagnóstico 4. Um estudo publicado por Dietrich em 2005 comparando 24 pacientes com HNF e 8 com adenomas. Este estudo foi realizado com o contraste SonoVue através da análise das imagens por 3 radiologistas e foi demonstrado que tanto os adenomas quanto as HNF contrastaram na fase arterial porém na fase portal nenhum adenoma apresentou realce nesta fase enquanto 23 pacientes com HNF apresentaram realce na fase portal 13. Outro estudo publicado em 2008 por Kim et al 3 também compararam adenomas com HNF. Sessenta e dois pacientes participaram deste trabalho sendo 43 com diagnóstico definitivo de HNF e 19 com diagnóstico de adenomas. A característica mais encontrada nos adenomas foi o preenchimento centrípeto pelo contraste presente em 84% dos adenomas. A persistência do realce do contraste na fase portal foi mais comum na HNF (86%), porém, esteve presente em 47 % dos adenomas. Um estudo multicêntrico realizado por Ricci et al 19 analisou 25 adenomas com o uso do contraste ultrassonográfico encontrou que 24 (96%) lesões apresentaram um realce de contraste de grande intensidade na fase arterial com pico de realce entre 10 e 19 segundos. Vinte e quatro lesões (96%) apresentaram realce precoce homogêneo e centrípeto na fase arterial. Nenhuma lesão apresentou persistência do contraste na fase portal apresentando washout precoce aparecendo isoecogênicas ou hipoecogênicas nas fases portal e tardia. Carcinoma Hepatocelular (CHC) O CHC é um dos tumores malignos mais comuns no mundo com uma prevalência maior em determinadas regiões como a África subsaariana, sudeste da Ásia, Japão e alguns países da Europa, como Itália e Grécia. Acomete mais freqüentemente o sexo masculino, com uma proporção que varia entre 4:1 a 5:1, dependendo do estudo avaliado 2. Os fatores de risco para a doença variam de acordo com a distribuição geográfica, porém de uma forma geral, são doenças que levam à agressão e inflamação hepática gerando cirrose hepática como álcool, hepatites virais crônicas (hepatite B e C) freqüentes tanto em países ocidentais como no Sudeste Asiático, aflatoxinas presentes em alguns cereais constituintes da alimentação de alguns países africanos e outras doenças como hemocromatose primária na qual o acúmulo de ferro no fígado aumenta a incidência em até 20 % no desenvolvimento do CHC 2. EURP 2010; 2(3): 154-163


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Castro et al. – Ultrassonografia contrastada das lesões hepáticas Com relação à patologia segundo a classificação anatômica postulada por Eggel, o CHC pode ser classificado em padrão nodular que englobam nódulos solitários ou múltiplos encontrados em 64% dos casos; padrão maciço acometendo todo um lobo hepático encontrado em 23 % dos casos e padrão difuso encontrado em 12 % dos casos. Segundo a Organização Mundial de Saúde, através da divulgação da classificação histológica dos tumores do aparelho digestivo, apresentou que os CHCs devem ser classificados em: bem diferenciados, moderadamente diferenciados e pobremente diferenciados 20. As etapas da carcinogênese do CHC têm sido propostas como se segue: Nódulos regenerativos → nódulos displásicos de baixo grau→ nódulos displásicos de alto grau → pequeno CHC →grande CHC. Na carcinogênese o fluxo venoso portal que alimenta o crescimento do tumor vai gradativamente sendo substituído pelo fluxo arterial de vasos tumorais anormais neoformados 4. Na ultrassonografia convencional, o CHC pode se apresentar de forma variada: hipoecogênico, hiperecogênico ou isoecogênico com um padrão homogêneo mais freqüentemente encontrado em lesões pequenas. Nas lesões maiores, geralmente é encontrado um padrão heterogêneo (mosaico ou misto) como resultado de necrose e fibrose intratumoral. Em estudos utilizando a ultrassonografia Doppler foram encontrados sinais de altas velocidades mais característicos do CHC. Na ultrassonografia com contaste, além da diferenciação do CHC com os outros tumores malignos ou benignos é de suma importância a diferenciação com os nódulos displásicos para definição de tratamento. No caso desses nódulos, observamos imagens isoecogênicas ou hipoecogênicas em relação ao parênquima hepático adjacente, sem realce pelo contraste em todas as fases. Entretanto alguns nódulos displásicos de alto grau podem apresentar realce de contraste na fase arterial 4, 7. As características apresentadas com a ultrassonografia com contraste do CHC são: 1. Presença de intenso realce na fase arterial formando imagem hiperecogênica com vasos intratumorais irregulares e dimórficos 2. Presença de washout precoce na fase portal e ou na fase tardia formando imagem hipoecogênica 4, 7, 8, 21, 22. Nicolau et al. em um estudo publicado em 2005 utilizando ultrassonografia com contraste SonoVue tentou correlacionar os achados de imagem com o grau de diferenciação de 104 CHCs avaliados prospectivamente. Como resultado do estudo foi encontrado que 100 lesões (96%) apresentaram realce pelo contraste na fase arterial e as 4 lesões não Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

contrastadas eram tumores bem diferenciados. Na fase portal, notou-se que a maioria dos tumores bem diferenciados (93%) e moderadamente diferenciados (88,7%) apresentavam-se isoecogênicos nessa fase e os tumores pouco diferenciados (72,7%) apresentavam-se em sua maioria hipoecogênicos. Na fase tardia cerca da metade dos tumores bem diferenciados (48%) apresentavam-se hipoecogênicos e 77% dos moderadamente diferenciados e 100% dos pouco diferenciados apresentavam-se hipoecogênicos 22 . Outro estudo publicado por Jang em 2007 21, foram estudados 112 CHCs comprovados pela histologia e analisadas imagens com ultrassonografia com contraste. Como resultados, foram encontrados que 87% dos CHCs apresentaram realce na fase arterial com uma proporção maior dos moderadamente diferenciados (96%) em relação aos bem diferenciados (61%) e os pouco diferenciados (75%). Apenas 43% dos CHCs apresentaram washout típico (90 segundos). Washout tardio (91 a 300 s) ocorreu em 48% dos CHCs e nove tumores não apresentaram washout e destes, 78% eram bem diferenciados 21. O desafio de definir um diagnóstico de CHC por métodos não invasivos como a biópsia que apresenta algumas complicações como sangramento e disseminação tumoral, fizeram com que fossem definidos critérios confiáveis utilizando exames de imagem. Inicialmente em 2000 foi definido na Conferência da Associação Européia para o Estudo do Fígado que o diagnóstico poderia ser feito pela observação de hipervascularização arterial por 2 métodos de imagem dinâmicos em tumores maiores que 2 cm de diâmetro em fígados cirróticos 23. Em 2005, o guideline publicado pela Associação Americana para o Estudo do Fígado incluiu a ultrassonografia com contraste como um dos métodos dinâmicos para o diagnóstico e postulou que para tumores maiores que 2 cm com fase arterial hipervascularizada e washout típico apenas um método de imagem era necessário. Porém para tumores entre 1 e 2 cm seriam necessários 2 métodos de imagem coincidentes ou a biópsia hepática 24. Um estudo publicado por Forner et al., em 2008, foram analisadas 89 pacientes cirróticos sem história prévia de CHC com lesão focal única detectada pela ultrassonografia no rastreamento com tamanho variando entre 5mm e 2 cm de diâmetro, com o propósito de avaliar a acurácia da ultrassonografia com contraste e comparar com a ressonância nuclear magnética. Todos os nódulos foram puncionados e analisados a citologia ou histologia até 3 vezes se fosse necessário. Foram encontrados 60 CHCs, 1 colangiocarcinoma e 28 nódulos benignos (nódulos EURP 2010; 2(3): 154-163


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Castro et al. – Ultrassonografia contrastada das lesões hepáticas regenerativos, hemangiomas e hiperplasia nodular focal). A sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e valor preditivo negativo foram respectivamente de 61,7%, 96,6%, 97,4% e 54,9% na RNM e 51,7%, 93,1% 93,9% e 50,9% na ultrassonografia com contraste. Quando os dois métodos foram utilizados em conjunto obtiveram 100% de especificidade, concluindo que o diagnóstico de CHCs menores que 2 cm pode ser realizado pelos dois métodos de imagem em conjunto com segurança 25 . Um estudo publicado por Vilana et al., em 2010 26, com o intuito de descrever as características ultrassonográficas do colangiocarcinoma intrahepático em pacientes cirróticos. Foram estudados 21 pacientes com lesões únicas com diagnóstico confirmado de colangiocarcinoma. Nesse estudo, 11 dos 21 nódulos (52,4%) apresentaram o realce periférico e preenchimento em forma de rim e foram as características mais frequentemente encontradas. Dez colangiocarcinomas apresentaram realce homogêneo pelo contraste com washout precoce o que constituem características definidas pela AASLD para o diagnóstico de CHC. Como conclusão do estudo que a ultrassonografia com contraste não deve ser utilizada como método dinâmico único para o diagnóstico de CHC 26. Metástases As metástases hepáticas são mais freqüentes que o CHC e são consideravelmente importantes na definição de prognóstico dos pacientes 2. A incidência das metástases hepáticas depende do tumor primário. Estima-se que em autópsias, aproximadamente 25 a 50% dos pacientes que morreram de câncer apresentavam metástases 2. As localizações mais comuns dos tumores primários que resultam em metástases em ordem decrescente de freqüência são: vesícula biliar, cólon, estômago, pâncreas, mama e pulmões. A principal via de disseminação das lesões é a hematogênica, vinda da artéria hepática ou da veia porta. A veia porta oferece acesso direto ao fígado às células tumorais de órgão abdominais. Outra via de disseminação é a linfática dos tumores do estômago, pâncreas ovários e útero 2. Freqüentemente as metástases se apresentam como múltiplas lesões, porém, podem se apresentar como lesão única. Não existe uma característica ultrassonográfica típica, no entanto, imagens de múltiplas lesões sólidas com halo hipoecogênico sugerem malignidade. Estudos anátomo-patológicos mostraram que essa borda ou halo hipoecogênico corresponde ao parênquima hepático normal comprimido pela rápida expansão do tumor e mais raramente pode corresponder a: Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

camada tecidual contendo células malignas em proliferação ou área de fibrose 2. Na ultrassonografia convencional as metástases podem apresentar variados padrões de imagens: ecogênico, hipoecogênico, em alvo, calcificado, cístico ou difuso 2 . As metástases hipoecóicas são geralmente hipovascularizadas e geralmente não apresentam estroma intersticial. Metástases de câncer de mama, pulmão, estômago, pâncreas e esôfago podem se apresentar como lesões hipoecogênicas. Os linfomas especialmente os não Hodgkin se apresentam como múltiplas lesões hipoecogênicas podendo parecer anecóicas com septações, diferente dos linfomas de Hodgkin onde é observada infiltração hepática difusa 2 . O padrão em alvo caracterizado por uma zona periférica hipoecóica é mais encontrado em metástases de carcinoma broncogênico 2. As metástases calcificadas são identificadas pela hiperecogenicidade acentuada e por formarem sombra acústica posterior. O tumor mais frequentemente encontrado com esta imagem é o adenocarcinoma mucinoso de cólon. Tumores endócrinos do pâncreas, leiomiossarcoma, adenocarcinoma gástrico, neuroblastoma , teratocarcinoma de ovário, condrossarcoma e cistoadenocarcinoma são outros tumores que podem se apresentar com essas características 2. As metásteses císticas devem ser distinguidas dos cistos hepáticos benignos através da presença de cápsula, paredes espessas, nível líquido-líquido e septos internos. O cistoadenocarcinoma de ovário, pâncreas e carcinoma mucinoso de cólon são tumores primários císticos e podem gerar metástases císticas. Sarcomas e tumores neuroendócrinos podem apresentar degeneração cística 2. A ultrassonografia convencional apresenta baixa sensibilidade na detecção de metástases em pacientes com história de câncer variando entre 40 a 77% quando comparado a outros métodos de imagem como a CT e a RNM que utilizam agentes de contraste atingindo elevada sensibilidade no rastreamento destas lesões 4. A ultrassonografia com contraste vem sendo utilizada em estudos recentes demonstrando uma acurácia aumentada do método muitas vezes comparável aos resultados encontrados com a CT e a RNM considerados como métodos de imagem padrão ouro para a detecção de metástases hepáticas. As características das imagens apresentadas podem variar de acordo com o tipo de tumor primário. Na fase arterial as lesões podem apresentar aspecto hipoecogênico, mais comuns em tumores hipovascularizados como o adenocarcinoma de cólon, ou apresentar um aspecto hiperecogênico com realce de contraste que pode ser com padrão em forma de EURP 2010; 2(3): 154-163


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Castro et al. – Ultrassonografia contrastada das lesões hepáticas rim ou com padrão homogêneo mais encontrado em tumores hipervascularizados como os carcinomas da tireóide, tumores de células renais e tumores neuroendócrinos. Na fase venosa portal e fase tardia normalmente essas lesões apresentam imagem hipoecogênica , sem captação de contraste, devido ao washout precoce, sugestivo dessas lesões 4, 7, 8. A presença do washout precoce é tão importante no diagnóstico das metástases que um estudo realizado por Bhayna et al., em 2010 11, com objetivo de avaliar o papel do washout no diagnóstico das lesões focais hepáticas. Entre as lesões benignas e malignas estudadas todas as metástases (n=25) apresentaram washout precoce, diferente de outro tumor maligno, o CHC que apresentou 6 lesões com washout tardio e 2 lesões sem washout 11. Albrecht et al. 27 publicaram um estudo analisando a capacidade da ultrassonografia com contraste em detectar metástases hepáticas comparando com a ultrassonografia convencional e com a tomografia computadorizada que foi considerada como padrão de referência. Participaram do estudo 123 pacientes. Foram detectados 80 pacientes com metástases. Em 45 desses 80 pacientes (56%) a ultrassonografia com contraste encontrou mais lesões que a ultrassonografia convencional. Além disso, a ultrassonografia com contraste melhorou a detecção de metástases individuais de 71% para 87%. De forma global a sensibilidade aumentou de 94% para 98% e a especificidade de 60% para 88% 27. Outro estudo publicado por Quaia et al. 28 avaliou a acurácia da ultrassonografia com contraste, com a técnica de harmônica com inversão de pulso utilizando o levovist, na detecção de metástases hepáticas comparando com a ultrassonografia convencional e com a CT helicoidal. Oitenta e três pacientes apresentaram entre 1 a 5 lesões metastáticas. Em comparação à ultrassonografia convencional, a ultrassonografia com contraste revelou mais metástases em 39/83(47%), o mesmo número 44/83(53%) e número menor de lesões 0/83(0%). Em comparação com a CT helicoidal a ultrassonografia com contraste revelou mais lesões em 1/83(12%), o mesmo número de lesões 61/83(74%) e menor número de lesões 12/83(14%). A diferença estatística entre a ultrassonografia convencional e a ultrassonografia com contraste foi significativa (p<0,0001) enquanto a diferença entre a tomografia helicoidal e a ultrassonografia com contraste não foi estatisticamente significativa (p=0,90) 28. Outro estudo publicado em 2007 por MurphyLavalle et al. 29 com o objetivo de mostrar o padrão de realce das metástases com a utilização do agente de Experts in Ultrasound: Reviews and Perspectives

contraste Definity. Foram estudadas 50 lesões metastáticas: coloretal (28), neuroendócrino (6), pancreática (6), melanoma (3) e outras (7). Como resultado foi encontrado que 44/50 (88%) apresentaram realce de contraste na fase arterial com vasos dismórficos em 20/50 (42%). O padrão de realce em forma de rim em 21/50(42%) e difuso em 29/50(58%). O pico de realce arterial ocorreu entre 8 e 27 segundos e o início do washout entre 13 e 50 segundos. Todas as lesões (50/50) apresentaram washout completo na fase portal. Sendo assim foi observado que apesar de algumas lesões metastáticas serem consideradas hipovascularizadas, o realce de contraste arterial é observado na maioria delas 29. Finalmente para a avaliação de metástases hepáticas ocultas, um estudo foi realizado por Gultekin et al. 30. Trinta e dois pacientes com tumor primário maligno participaram do estudo. Em todos os pacientes foi realizada a ultrassonografia com contraste (levovist) e a tomografia computadorizada trifásica helicoidal uma semana após a ultrassonografia. Como resultado, foi encontrado que após o uso do contraste, ao menos uma lesão hipoecogênica foi encontrada em 4/32(12,5%) dos pacientes e múltiplas lesões foram encontradas em um paciente. A média de tamanho das lesões encontradas foi de 12 mm. A tomografia computadorizada mostrou as mesmas lesões encontradas na ultrassonografia. Como conclusão deste estudo, foi encontrado que a ultrassonografia com contraste com inversão de pulso com levovist é comparável à tomografia computadorizada helicoidal trifásica no rastreamento de lesões metastáticas ocultas com a vantagem de não ser utilizado radiação ionizante 30. Considerações finais Atualmente, com a difusão dos métodos de imagem como a ultrassonografia, um número maior de lesões focais hepáticas é encontrado na prática clínica diária. O diagnóstico preciso dessas lesões se faz necessário devido ao tratamento individualizado que deve ser oferecido aos pacientes e na definição do prognóstico desses pacientes no caso de lesões focais malignas. A ultrassonografia com contraste é um método de imagem que reúne o baixo custo, a praticidade, ausência do uso de radiação ionizante da ultrassonografia convencional com a capacidade de avaliação da vascularização e perfusão em tempo real. Com a utilização dos agentes de contraste a ultrassonografia ganhou uma especificidade semelhante a exames com a tomografia computadorizada trifásica (TC) e a ressonância nuclear magnética (RNM). Alguns estudos inclusive, afirmam EURP 2010; 2(3): 154-163


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Castro et al. – Ultrassonografia contrastada das lesões hepáticas que para lesões encontradas incidentalmente sugestivas de benignidade como hemangiomas poderiam ser diagnosticadas pela ultrassonografia com contraste sem a necessidade de realização de TC ou RNM. Na distinção de lesões benignas e malignas esse método pode ser utilizado principalmente na avaliação das fases portal e tardia, onde lesões que mantém o realce de contraste intra-lesional nestas fases sugere benignidade e washout rápido na fase arterial sugere malignidade. Quanto o padrão de preenchimento vascular, este método é capaz de distinguir lesões com comportamento de realce centrípeto como os hemangiomas, de lesões com preenchimento centrífugo como a HNF e o CHC. Entretanto, a ultrassonografia com contraste apresenta suas limitações: Método operador dependente, necessitando de experiência do examinador, depende de janela acústica, cooperação do paciente, dificuldade com presença de interposição gasosa obesidade e limitação da área de foco de avaliação. Sendo assim, concluímos que a ultrassonografia com contraste é um método de imagem muito importante no diagnóstico das lesões focais hepáticas e mais estudos devem ser realizados na tentativa de uniformizar o uso dos vários tipos de agentes de contraste encontrados na atualidade, tentando definir a utilidade de cada um deles em circunstâncias específicas conforme a necessidade do paciente. Certamente trará grandes benefícios e contribuições para o diagnóstico das lesões focais hepáticas. Referências

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