6 Edição Revista Direito e Atualidade

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artigo

A possibilidade de conversão da união estável homoafetiva em casamento civil.

A

A indagação em destaque tem sido ventilada com freqüência ainda maior desde que o Supremo Tribunal Federal emitiu decisão unânime, posicionando-se favoravelmente ao reconhecimento jurídico da união estável entre pessoas do mesmo sexo, a partir do julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade e de Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, em julgamento realizado em 05 de maio de 2011. O respeito aos direitos fundamentais e aos princípios constitucionais (dentre os quais liberdade, igualdade e a dignidade); a necessidade de se interpretar a norma com prevalência do espírito da lei sobre uma função meramente exegética, quando aquela estabelecer, exclusivamente, os termos “homem” e “mulher” ao disciplinar o instituto; o reconhecimento do novo conceito de família (mais voltado ao desenvolvimento do cidadão do que à manutenção de sua função figurativa enquanto instituição social); a premência de se tutelar juridicamente uma situação que integra a vida em sociedade desde tempos imemoriais (porquanto a homossexualidade seja inerente à própria natureza de determinadas pessoas) e a ausência de ditames legais que

efetivamente vedem uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo, dentre outras justificativas que certamente merecem estudo aprofundado, foram as bases para que os ministros finalmente assinalassem a quebra do paradigma vigente e, destarte, inaugurassem uma nova era no direito pátrio. Parênteses necessários. Antes de se adentrar ao mérito do artigo, pretende-se demonstrar aquilo que o leitor mais atento certamente já haverá de ter percebido. É que, até o presente momento, estamos trabalhando com dois institutos distintos (união estável e casamento), como se tivessem o mesmo significado. Provocação esta que se justifica à medida que, a jul-

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gar pelo que se tem ouvido na mídia em geral e pelas conversas privadas que são entabuladas na vida cotidiana, a maior parte dos cidadãos parece mesmo ignorar a diversidade existente entre ambos os assuntos, geralmente tendendo a considerá-los como meros sinônimos. Evidentemente, este é um equívoco que urge ser desfeito, em nome do desenvolvimento da consciência jurídica da sociedade, como incremento de sua própria cidadania. Neste sentido, vale rememorar que, do ponto de vista jurídico, se faz possível estabelecer algumas diferenças fundamentais entre a união estável e o casamento civil. Como exemplos de tais diferenças, podem ser citados o direito real de habitação, a chance de escolha do regime de bens e várias questões relacionadas à sucessão patrimonial, hipóteses nas quais se privilegia o casamento. Dando prosseguimento ao assunto, importante destacar que a própria Constituição Federal, no § 3º de seu Artigo 226, ao considerar que a família é base da sociedade, estabelece que a lei deve facilitar a conversão da união estável entre homem e mulher (na qualidade de entidade familiar) em casamento. A tese jurídica, portanto, que enseja a conversão da união estável em casamento civil se caracteriza pela combinação do retro mencionado dispositivo legal com o Artigo 1.723 do Código Civil, que também reconhece a união estável como entidade familiar, desde que se configure convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Dentro do contexto do relacionamento homoafetivo, no entanto, se inicia aqui um interessantíssimo debate, pois, se a mencionada decisão do STF foi expressa com relação à possibilidade de reconhecimento jurídico das uniões estáveis entre companheiros do mesmo sexo, mas, por outro lado, não estendeu referido reconhecimento em relação ao casamento civil, tem-se questionado se a aludida conversão também seria aplicável à hipótese de tais relações. Encontrar uma zona de conforto diante de tamanha discussão parece ser uma diretriz tão importante quanto complicada, afinal, sem prejuízo do reconhecimento das qualidades inerentes apenas ao casamento (conforme já demonstrado resumidamente), é certo que a tradicional cultura brasileira ainda confere a tal espécie de compartilhamento amoroso um caráter privilegiado, do ponto de vista do reconhecimento

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