LINHA
URÍDICA REVISTA DO CURSO DE DIREITO DA UNIFEV
Coletânea de Artigos Acadêmicos
1 ANO IV, Vol. I – 2012 ISSN 2176-6460 1
www.linhasjuridicas.com.br
UNIFEV Centro Universitário de Votuporanga
ANO IV, Vol. I – 2012 ISSN 2176-6460
Sobre a Revista Linhas Jurídicas é um periódico online com periodicidade semestral de caráter técnicocientífico, que busca a ampla integração ensino-pesquisa-extensão. Destinado a produção acadêmica dos docentes e discentes do curso de Direito da UNIFEV, bem como do público acadêmico em geral, de cunho jurídico e áreas afins.
Conselho Editorial Prof. André Luiz Herrera Prof. Me. Douglas José Gianotti Prof. Me. Edgard Pagliarani Sampaio Prof. Paulo Eduardo de Mattos Stipp Prof. Me. Jaime Pimentel Prof.ª Ma. Nínive Daniela Guimarães Pignatari Prof. Me. Walter Francisco Sampaio Filho
Coordenação do Curso de Direito da Unifev Prof. Me. Walter Francisco Sampaio Filho
Coordenação de Monografia e Extensão do Curso de Direito da Unifev Prof.ª Ma. Nínive Daniela Guimarães Pignatari
Equipe Editorial Discente Gustavo Gomes Furlani
Revisão Final Prof.ª Ma. Andréia Garcia Martin
Contato revistalinhasjuridicas@hotmail.com
2
A INCONSTITUCIONALIDADE DA DEMISSÃO POR JUSTA CAUSA NO CASO DE EMBRIAGUEZ HABITUAL OLGADO, Renata Gonçalves - Discente do 7º período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO O presente estudo tem por finalidade demonstrar que o alcoolismo, reconhecido como doença pela Organização Mundial de Saúde – OMS, é um grave problema social, haja vista que além de causar diversos distúrbios e transtornos ao dependente, também está relacionado a problemas no âmbito familiar e profissional. Nesse sentido, objetiva-se que a legislação trabalhista não autorize a dispensa por justa causa do empregado alcoólatra, uma vez que este deve ser afastado e encaminhado a tratamento médico, a fim de que seja reabilitado para o exercício de suas atividades laborais. Os métodos empregados são o dedutivo, histórico, bem como o bibliográfico.
Palavras-chave: Alcoolismo. Doença. Legislação. Tratamento.
1
"Se ages contra a justiça e eu te
Introdução
deixo agir, então a injustiça é minha." (Mahatma Gandhi)
O artigo 482, alínea “f”, da Consolidação das Leis do Trabalho, considera falta grave autorizadora de demissão
por
justa
causa
1. O contrato de trabalho
a
embriaguez habitual ou em serviço. a
O contrato de trabalho é um
uma
instituto de natureza contratual, que
patologia, que merece o devido
possui regras próprias, diferentes
tratamento médico, não podendo o
daquelas constantes nos contratos
empregador ignorar a doença do
do Direito Civil. “[...] o contrato de
empregado ou o que é pior, demiti-lo
trabalho é o fato gerador da relação
por
o
de trabalho. O contrato faz nascer a
escolha
relação entre as partes. É a dinâmica
No
entanto,
entende-se
embriaguez
habitual
justa
causa,
alcoolismo
como
que é
tratando uma
pessoal e não como um grave mal
dessa
que acomete o indivíduo em seu
1976, p. 60 apud MARTINS, 2010, p.
sistema físico e psicológico, assim
90).
reconhecido
pela
relação.”
(FERNANDES,
O contrato de trabalho tem por
Organização
Mundial de Saúde. Dessa forma, na
objeto
elaboração da presente pesquisa,
subordinado e não eventual do
através
empregado
dos
métodos
dedutivo,
com
essa
a
nossa
Carta
ao
de
serviço
empregador,
espécie 1.1 Rescisão contratual
discriminatória de demissão, visto que
prestação
mediante remuneração.
histórico e bibliográfico, pretende-se acabar
a
Magna da
A rescisão contratual é o
pessoa humana, bem como nos
término da relação de trabalho entre
valores sociais do trabalho (art. 1°, III
empregado e empregador.
fundamenta-se
na dignidade
Segundo Martins (2010, p.
e IV, CF).
371), as formas de rescisão do contrato de trabalho podem ser por decisão
do
empregador,
que
compreende a dispensa imotivada 2
ou a falta grave do empregado; por
2. A evolução histórica do álcool
escolha do trabalhador, que poderá pedir demissão, requerer a rescisão
Antigas
pesquisas
indireta do contrato de trabalho por
arqueológicas
meio de reclamação trabalhista ou
primeiros indícios de consumo de
aposentar-se; por desaparecimento
álcool surgiram aproximadamente
de uma das partes, seja pela morte
há mais de oito mil anos.
apontam
que
os
de um deles ou pela extinção da
No início, como as bebidas
empresa; por convenção entre as
eram feitas através de um processo
partes; pelo término de contrato por
de fermentação, possuíam baixo teor
prazo determinado; por força maior
alcoólico. Após, começou o processo
ou por factum principis.
de destilação, o que deixou as bebidas mais fortes e perigosas.
1.2 A embriaguez como hipótese de
A
rescisão por justa causa
partir
da
Revolução
Industrial, a bebida alcoólica passou a
ser
produzida
em
série
e
O art. 5º da Lei n° 62, de 5 de
comercializada em grande número, o
junho de 1935, em sua alínea “d”, já
que aumentou de forma considerável
tratava da embriaguez habitual como
os
hipótese
consequentemente, os problemas
de
justa
causa
para
rescisão do contrato de trabalho. A
consumidores
de
álcool
e,
sociais por ele causados.
norma anterior transformou-se na alínea
“f”,
do
art.
482,
da
2.1 Alcoolismo: problema social
Consolidação das Leis do Trabalho. Na explicação de Martins
Com o passar do tempo o
(2010, p. 380-381), a justa causa por
consumo de álcool preocupa cada
embriaguez justifica-se no fato de o
vez
empregador ter o interesse em
substância de fácil acesso está
preservar a harmonia no ambiente
presente na vida de milhares de
de trabalho, pois o ébrio, além de dar
pessoas, que não percebem ou não
mau exemplo, deixa a desejar na
têm informações suficientes para
produção, bem como pode causar
manterem distância da droga, sendo
acidentes
que em muitos casos os próprios
e
manifestar
comportamento agressivo.
meios 3
mais,
de
isso
porque
comunicação
essa
acabam
influenciando, jovens,
a
principalmente ingerirem
os
bebidas
3.
alcoólicas, associando tal prática a
Demissão
do
alcoólatra:
preconceito e discriminação
situações do cotidiano, como o hábito de beber em baladas, por
O
exemplo.
direito
patronal
de
dispensar o empregado alcoólatra é
O fator mais alarmante é que
defendido por alguns doutrinadores
o alcoólatra raramente percebe a
ao fundamento de que o empregador
sua doença, e quando admite ter
deve
excedido
os
limites
do
“beber
zelar
ambiente
de
pela
harmonia
trabalho,
do
evitando,
socialmente”, demora a procurar
assim, que o ébrio contumaz cause
ajuda ou nem a procura, acreditando
acidentes ou sirva de mau exemplo
na possibilidade de livrar-se do vício
aos demais funcionários. No entanto,
sozinho. Assim, acaba prejudicando
o trabalhador que não consegue se
suas relações afetivas e sociais,
manter longe do álcool apresenta
principalmente
e
uma patologia, devendo ser afastado
pois
do emprego para tratamento médico.
trabalho,
sua
família
respectivamente,
perde totalmente o controle de seus
O
atos.
ato
de
dispensa
do
empregado portador de doença é O alcoolismo consta na lista
extremamente preconceituoso, visto
de doenças da Organização Mundial
que o empregador, na maioria das
de Saúde (OMS) por tratar-se de
vezes, quer se ver livre de uma
enfermidade de difícil cura, que afeta
situação problemática, deixando de
o
lado o seu papel de cidadão, virando
indivíduo,
provocando-lhe
inúmeros
distúrbios
psíquica,
bem
como
na em
esfera
as costas para uma pessoa que
sua
necessita de ajuda e de atenção.
estrutura física. Recentemente a
A dispensa do trabalhador
OMS divulgou um relatório onde
dependente em nada contribui ao
consta que cerca de 4% das mortes
meio social, pois ao deparar-se com
no mundo estão relacionadas com o
o desprezo e abandono de seu
álcool, fato preocupante, haja vista
patrão, a situação do alcoólatra
que tais mortes superam aquelas
acaba piorando, uma vez que fica
motivadas pela AIDS e tuberculose,
em total desamparo emocional e
por exemplo.
financeiro, 4
o
que
acaba
aproximando-o cada vez mais da
4. Responsabilidade do estado
bebida ao invés de curá-lo. Dessa forma, fica evidente que a legislação trabalhista
fere
constitucionais
os
princípios
tratada com os devidos cuidados.
pessoa humana, bem como se
Dessa maneira, o Estado, através da
afasta do objetivo fundamental de
Previdência Social, deve permitir que
promover
o
bem
dignidade
a embriaguez habitual, tem que ser
da
o
da
Por ser considerada doença,
comum
sem
qualquer tipo de preconceito.
trabalhador
alcoólatra
seja
afastado de suas funções, a fim de
Por outro lado, caminhou bem
que
seja
feito
um
tratamento
o legislador na elaboração da Lei n°
adequado visando à reabilitação do
9.029/95, ao proibir a prática de atos
mesmo.
discriminatórios
e
limitativos
de
Seria
injusto
atribuir
ao
acesso à relação de emprego,
empregador toda a responsabilidade
devendo
ser
em relação ao trabalhador, uma vez
interpretada em prol do trabalhador,
que é papel do Estado oferecer
tendo em vista que a finalidade do
condições dignas de saúde e bem-
Direito do Trabalho é proteger o
estar à população.
referida
norma
hipossuficiente.
Uma
O projeto de Lei do Senado nº 7805/10
pretende
retirar
vez
constatada
a
embriaguez habitual, reconhecida
a
como doença pela OMS, não há
embriaguez habitual das hipóteses
outra alternativa senão a suspensão
previstas no art. 482 da CLT,
do contrato de trabalho.
acrescentando, ainda, parágrafo à CLT para estabelecer a rescisão contratual somente nos casos em
Considerações finais
que o dependente se recusar ao tratamento
médico.
No
mesmo
A busca pelo bem comum é o
sentido tem sido o posicionamento
objetivo fundamental da sociedade.
da jurisprudência, que acolheu a
Para
embriaguez habitual como patologia
alcançada, cada indivíduo, em seu
suscetível de tratamento.
interior, deve sentir-se respeitado
5
que
tal
finalidade
seja
pelos demais. Como bem define
desejar ao incluir a embriaguez
Moraes:
habitual
como
falta
grave
do
[...] A dignidade é um valor
empregado, que autoriza a demissão
espiritual e moral inerente à pessoa,
por justa causa. Pretende-se abolir o
que se manifesta singularmente na
direito patronal de dispensar o
autodeterminação
e
empregado doente, razão pela qual
responsável da própria vida e que
a alínea “f” do art. 482 deverá ser
traz consigo a pretensão ao respeito
retirada da CLT, permitindo que o
por parte das demais pessoas,
trabalhador seja afastado de suas
constituindo-se
mínimo
atividades
estatuto
processo de reabilitação. Dessa
jurídico deve assegurar, de modo
forma, o empregado alcoólatra terá
que,
oportunidade de buscar sua cura,
invulnerável
um
que
somente
consciente
todo
excepcionalmente,
para
bem
exercício dos direitos fundamentais,
atividades
mas sempre sem menosprezar a
respeitados
necessária estima que merecem
dignidade da pessoa humana, dos
todas as pessoas enquanto seres
valores sociais do trabalho e da
humanos. (2005, p. 16).
proteção do Direito do Trabalho ao
legislação
pois,
trabalhista
que
a
deixou
a
de
laborais, os
hipossuficiente.
6
retomar
e
possam ser feitas limitações ao
Percebe-se,
como
tratamento
suas sendo
princípios
da
Referências ANTONIO. Luiz. Alcoolismo. História do álcool. Disponível em: < http://www.alcoolismo.com.br/artigos/história.htm> Acesso em: 24/05/2001. BRASIL. Constituição 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado. 1988. BRASIL. Saúde pública. Especialidade: Saúde Coletiva. Disponível em: /15066/saude-publica/oms-constata-quealcoolismo-causa-mais-mortes-queaids-violencia-e-tuberculose> Acesso em: 22/05/2011. MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 26. ed. São Paulo: Atlas, 2010. MORAES. Alexandre de. Direito Constitucional. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2005.
7
A INCONSTITUCIONALIDADE DO REQUISITO CIVIL “HOMEM E MULHER” PARA O CASAMENTO BRITO, Deborah Cristiane Domingues de – Docente do Curso de Direito da UNIFEV – Centro Universitário de Votuporanga. OLIVEIRA, Millena da Silva – Discente do 7º Período do Curso de Direito da UNIFEV – Centro Universitário de Votuporanga.
“Que não se separe por um parágrafo, o que a vida uniu pelo afeto”. Carlos Ayres Britto
RESUMO O presente artigo tem como tema a inconstitucionalidade do requisito “homem e mulher” para o casamento. O problema enfocado pela pesquisa reside na necessidade de se constatar se o referido requisito é constitucional ou não. Busca-se verificar se o mesmo fere, ou não, os princípios da Carta Magna e se há possibilidade da legalização do casamento homoafetivo, uma vez que atualmente o Supremo Tribunal Federal consentiu na união civil entre pessoas do mesmo sexo.
Palavras-chave: Casamento. Homoafetividade. Constitucionalidade.
8
familiares
Introdução
formadas
por
casais
homossexuais, a presente pesquisa O Direito não é composto por
tem por objetivo verificar se o
regras gerais despidas de influências
requisito civil “homem e mulher” para
sociológicas e valorativas, tal qual
o casamento, constante nos artigos
ensinava Kelsen, mas, a priori, deve
1.514 e 1.517 do Código Civil
refletir, principalmente em sua Lei
maculam
os
Maior,
constitucionais
da
os
direitos
e
garantias
princípios dignidade
da
pessoa humana e da igualdade.
fundamentais de cada força social, legitimando um verdadeiro Estado
A partir deste ponto, cabe
Constitucional, conforme assentava
avaliar se existe a possibilidade
Ferdinand Lassale.
jurídica da realização do casamento homoafetivo, uma vez que as uniões
Partindo desse pressuposto, surge, no Brasil, um novel ramo do
estáveis
Direito,
Direito
permitidas pela recente decisão do
Homoafetivo, trilhado pela ilustre
STF, que teve votação unânime
jurista Maria Berenice Dias, capaz de
dentre todos os ministros.
denominado
homoafetivas
foram
amparar juridicamente, uma parcela
O que se busca com o
da população que sofre com o não
presente estudo é apontar que os
reconhecimento jurídico de seus
direitos e garantias fundamentais do
relacionamentos,
ser humano, consubstanciados nos
os
casais
princípios da dignidade da pessoa
homossexuais. Um importante passo já foi
humana e da igualdade, estendem-
dado, tendo em vista a recente
se a todos, sem qualquer tipo de
decisão
caráter
diferenciação, suplantando visões
vinculativo e efeito erga omnes,
pessoais, religiosas, discriminatórias
emanada pelo Supremo Tribunal
ou
Federal, ao julgar a ADI-4277 e
permeiam o âmbito jurídico.
unânime,
de
mesmo
retrógradas,
que
Assim, por meio de princípios
ADPF-132, que concedeu guarida constitucional às uniões estáveis
jurídico-constitucionais
e
da
homoafetivas.
analogia, consegue-se resguardar
Diante dos novos rumos do
aos homoafetivos um dos direitos
Direito no que concerne às entidades
mais antigos do mundo: o direito ao casamento e à família. 9
1. Do casamento
cônjuges, consoante artigo 1.511, do Código Civil.
Desde
as
épocas
mais
No Brasil, para efeitos de lei,
remotas, as pessoas se unem para
existem o casamento civil e o
ter uma vida em comum e celebrar,
religioso, sendo que este último deve
de formas diversas, tal união. Ensina
ser levado a registro em Cartório (art.
Venosa (2007) que, nos tempos
1.515, do Código Civil).
antigos, o matrimônio era o laço
Dentre
os
objetivos
do
sagrado por excelência, tendo como
casamento, conforme leciona Diniz
tronco
(2010, p. 38-39), estão:
principal
o
homem,
chamado pater, e a mulher, sua
[...] a instituição da família
submissa total.
matrimonial [...], a procriação dos
O
casamento,
filhos [...], a legalização das relações
hodiernamente, é um instituto de
sexuais [...], a prestação de auxílio
direito privado, imiscuído por normas
mútuo [...], o estabelecimento de
cogentes,
um
deveres entre os cônjuges [...], a
contrato, ora como uma instituição.
educação da prole [...] e a atribuição
Reveste-se, portanto, destas duas
do nome ao cônjuge [...].
ora
visto
como
faces, ou seja, possui caráter misto:
Ressalta a douta autora que a
na sua forma, é contrato, e no seu
procriação, que já foi vista como
conteúdo,
instituição.
finalidade precípua do matrimônio,
Regulamentado está pelo Código
hoje já não mais se caracteriza como
Civil Brasileiro, especificamente no
essencial, uma vez que se assim o
Livro IV (Do Direito de Família),
fosse, muitos casamentos dos quais
Título
não
I
(Do
Direito
Pessoal),
Subtítulo I (Do Casamento).
advieram
filhos
seriam
anulados.
O casamento consiste na
Os
caracteres
gerais
do
união legal entre homem e mulher,
casamento são: a liberdade na
celebrada com observância das
escolha do nubente, a solenidade e
formalidades exigidas na lei. Seu
publicidade do ato nupcial, a união
efeito preponderante é a comunhão
permanente e exclusiva. Citando
plena
na
Orlando
Gomes,
igualdade de direitos e deveres dos
assenta
que
de
vida,
com
base
Diniz
seus
(2010)
princípios
regentes são: “a livre união dos 10
futuros cônjuges, a monogamia e a
seja, aqueles que detinham o poder
comunhão indivisa”.
familiar
(geralmente
o
homem),
A doutrina costuma dividir o
tendo ao seu redor a esposa, os
casamento em três planos: o da
filhos e todos os agregados. Nesta
existência, da validade e da eficácia.
época,
Todavia, a legislação pátria apenas
importância para a continuidade da
amparou os casos de invalidade e
família, ocorrendo, muitas vezes, o
ineficácia do instituto, explicitando-
casamento
os nos Capítulos VIII e IX do Diploma
consanguíneos.
Civil. Logo, o plano da existência, no
a
prole
era
de
entre
Com
o
vital
irmãos
tempo,
a
família
qual se exige a diferença de sexos,
diminuiu, passando a ser formada
recai numa criação doutrinária a
basicamente por pai, mãe e filho
partir da exegese literal da lei,
(família em sentido estrito), e o
principalmente dos artigos 1.514 e
incesto
1.517, do Código Civil.
procriação
foi
repudiado, ainda
mas
tinha
a
papel
fundamental para a continuidade 2. Das entidades familiares
familiar. Surgiu, então, uma forma de
Inicialmente,
convém
enlace
familiar
destacar o conceito de família. Em
concubinato,
conceito amplo significa:
extremamente
[...] o conjunto de pessoas unidas
por
vínculo
jurídico
denominada
a
qual repelida
era pela
sociedade moralista burguesa e pela
de
Igreja, sendo que, os filhos oriundos
natureza familiar. Nesse sentido,
dessas relações eram considerados
compreende
os
ilegítimos.
descendentes
e
ascendentes,
o
do
concubinato, aquele advindo da
denominam
união de duas pessoas sem o
parentes por afinidade ou afins.
casamento, deixou a roupagem de
(VENOSA, 2007, p. 02).
imoral e passou a ser reconhecido
cônjuge,
que
colaterais
Atualmente,
se
A família, ao longo do tempo,
como união estável.
sofreu transformações quanto à sua
Há,
portanto,
diversas
constituição. Nos tempos antigos,
entidades familiares no Brasil (artigo
era composta por todos aqueles que
226, da Constituição Federal): a
dependiam do pater familias, ou
família advinda do casamento, da 11
união estável e a monoparental (e,
Guerreiro (2007, p. 18), em sua
para
monografia de conclusão de pós-
alguns
doutrinadores,
a
anaparental).
graduação UERJ: Desta forma, todos os atos
3. Da homoafetividade
sexuais
contrários
instituído A
questão
homoafetividade
da
ao
como
padrão
normalidade
passaram a ser alcunhados de atos
encontra-se
criminosos,
sendo
enraizada desde os mitos gregos,
como
a
nos quais personagens simbólicos
homossexualidade.
como Zeus e Ganimedes formaram o
médicos e psiquiatras, autoridades
casal mais famoso, além de Apolo,
em sexualidade, que passaram a ser
que raptava jovens efebos.
os
Conforme
Fátima
Maria
tais,
agentes
considerados
prostituição
que
e
Foram
a os
gradativamente
tornaram a homossexualidade um
Marins Guerreiro (2007), “os gregos
ato
consideravam
repreensão. [...] No Brasil, o Instituto
a
prática
da
reprovável
digno
Nacional
e como forma de ensinamento e
(INPS) manteve até a década de 80,
iniciação do jovem na vida adulta”.
do século XX, o homossexualismo
Havia, portanto, a aceitação social.
classificado como doença, código
Social
302.0, no campo das doenças
intervenção
social
contínua
da
mentais,
Igreja,
homoafetividade
foi
mental.
a
Previdência
de
pederastia como um ato nobre, ético
Durante a Idade Média, com a
de
e
estigmatizada como um pecado
Em
especificamente,
1.973,
a
desvio
Associação
mortal, levando muitos para a morte
Americana de Psiquiatria retirou o
na fogueira.
termo
Em 1.869, o médico húngaro
homossexualismo
manuais
de
dos
diagnósticos
Karoly Maria Benkert criou o termo
psiquiátricos como distúrbio mental.
homossexualismo,
Houve
sendo
que o
a
substituição
do
sufixo ismo remete à ideia de
sufixo ismo por idade, passando a
doença. Esta concepção logo se
ser homossexualidade, que designa
espalhou pelo mundo e, até hoje,
um modo de ser, uma opção de vida.
ainda é disseminada.
A mais recente conceituação vem de Dias, citada por Guerreiro: 12
O termo homoafetividade é
formados por dois homens ou duas
um neologismo criado pela ilustre
mulheres.
jurista e doutrinadora Maria Berenice
Mesmo
com
o
termo
já
Dias, Desembargadora na capital do
abrangido pelo dicionário brasileiro,
Rio Grande do Sul. Em seu livro
a discriminação e o preconceito
“União homossexual: o preconceito
ainda
& a justiça” Dias utilizou o termo
brasileiros. Há até um Projeto de Lei
homoafetividade para designar as
nº 122/2006 em tramitação para
uniões entre pessoas do mesmo
criminalizar a homofobia.
povoam
as
mentes
dos
sexo cujo cerne é o afeto. (2007, p. 24).
4. O
Dicionário
Aurélio
Da
inconstitucionalidade
do
requisito civil “homem e mulher” para
de
Língua Portuguesa descreve o termo
o casamento
“homoafetividade” como sendo: 1. Qualidade ou caráter de
Uma norma é inconstitucional
homoafetivo. 2. Relação afetiva e
quando
sexual entre pessoas do mesmo
estabelecido pela Carta Magna.
sexo.
diz
Partindo desta premissa, constata-
e
a
se que os artigos 1.514 e 1.517 do
pessoas
do
Homoafetivo
respeito
à
sexualidade
1.
Que
afetividade entre
fere
Diploma
algum
Civil,
princípio
instituidores
do
mesmo sexo. 2. Realizado entre as
requisito “homem e mulher” para o
pessoas do mesmo sexo: casamento
casamento, são inconstitucionais,
homoafetivo.
haja
3.
Relativo
ou
pertencente a, ou próprio de duas pessoas
que
mantém
vista
que
afrontam
vários
princípios da Lei das Leis. Prima facie, ferem o princípio
relação
conjugal, ou que pretendem fazê-lo:
da
direito homoafetivo (2010, p. 1105).
no caput, do artigo 5º, da Lei Maior,
Salienta-se, portanto, que a homoafetividade
não
é
isonomia,
consubstanciado
posto que não se pode preferir a
doença,
legalização
do
casamento
crime ou mesmo uma opção de vida,
heterossexual em detrimento do
mas consiste no afeto, desejo e amor
casais
entre pessoas do mesmo sexo, ou
rejeitados
estão
juridicamente,
seja, diz respeito às relações carnais
resultando
numa
exclusão
e espirituais concernentes a casais
desigualdade ilícitas. 13
homoafetivos,
os
quais
e
Corrompe-se
o
princípio-
5. Da possibilidade do casamento
direito à liberdade (artigo 5º, caput, CF),
como
sinônimo
homoafetivo
de
autodeterminação, ou seja, trata-se
“Mas então para que casar? (...) A
da liberdade individual de cada
razão é que assim como precisamos
indivíduo a fim de possuir autonomia
do olhar dos outros para saber que
de vida e realizar-se como pessoa.
existimos,
Viola-se, princípio
da
outrossim,
o
proibição
da
os
amores
também
precisam circular socialmente para consolidar-se”. (Diana Corso)
discriminação por qualquer motivo, haja vista que o próprio artigo 3º, IV, determina
que
não
pode
Em 05 de maio de 2011, após
discriminar ninguém por sua origem,
audiências públicas, o Supremo
raça, sexo, cor, religião, idade e
Tribunal Federal, julgou a ADI-4277
quaisquer
e a ADPF-132, declarando que as
outras
se
formas
de
discriminação.
uniões homoafetivas têm o mesmo
Por fim, tem-se maculado um
caráter e validade de união estável.
dos fundamentos e princípio-mor da
Logo, extirpou-se qualquer
República Federativa do Brasil: a
tipo de diferenciação jurídica entre
dignidade da pessoa humana (artigo
casais de pessoas de sexo oposto
1º, inciso III), a qual norteia e rege
ou igual e, a partir do acórdão
todas
unânime, com efeito erga omnes e
as
relações
jurídicas
brasileiras.
força vinculante, a situação de
Além disso, ao se dar uma
desigualdade jurídica em que se
interpretação fria e literal à lei
encontravam tais casais foi quase
civilista, está-se desrespeitando o
inteiramente solvida.
princípio da unidade do direito e da
Se a união estável, como vista
própria constituição, visto que o
anteriormente,
é
uma
ordenamento jurídico como um todo
familiar,
deve ser aplicado tendo como base
pelo caput do artigo 226 da CF: “a
a sua gênese constitucional.
família, base da sociedade, tem
está
entidade
resguardada
especial proteção do Estado”. Ipso
facto,
com
o
reconhecimento da união estável 14
homoafetiva,
esta
também
se
possuírem
semelhantes
constitui em família e deve ser
características,
protegida pelo Estado, a fim de que
análogas
lhe sejam garantidos todos os seus
instituídos
direitos, inclusive o da conversão em
jurídico-legais
casamento.
reconhecidos às primeiras.
Todavia, mesmo diante do
ou
seja,
serem
faticamente, os
serão
mesmos
trâmites
que
aqueles
Destarte,
se
união
referido julgado, paira uma questão
homoafetiva
relativamente à dinâmica jurídica da
juridicamente
união
a
conversão em casamento também o
possibilidade desta ser convertida
deve ser, posto que, pela analogia,
em casamento. Restou, portanto,
se casais heterossexuais vivendo
uma lacuna legal no que tange à
em união estável podem convertê-la
abrangência da decisão do Excelso
em casamento, por consequência,
Pretório.
os casais homoafetivos em união
estável,
qual
seja,
E, diante de uma lacuna
foi
a
no
reconhecida Brasil,
a
sua
estável também o podem.
jurídica, os meios para supri-la são:
Da mesma forma, se duas
a analogia, os princípios gerais do
pessoas de mesmo sexo têm o
direito, os costumes ou a equidade
intuito de se casar, deve-se validar
(artigo 4º, da Lei de Introdução ao
este matrimônio, pois dele também
Código Civil).
advirá uma família, a homoparental,
Utilizando-se instrumentos
jurídicos
destes para
merecedora da proteção estatal.
a
Os artigos 1.514 e 1.517 do
colmatagem das lacunas, chega-se
CC/02 são, atualmente, analisados
ao arremate das situações jurídicas
sob uma ótica literal, mas por uma
que ficaram à mercê da insegurança
exegese
e discricionariedade.
teleológica, restam inconstitucionais.
O uso da analogia consiste em
comparar
duas
ou
sistemática,
social
e
Além disso, pelos princípios
mais
gerais do Direito, decorre a tese de
situações idênticas, sendo que uma
que qualquer novo direito instituído,
delas será o parâmetro, haja vista já
não
estar inserida na seara legal; a outra
suplantar os direitos e garantias já
ou outras situações, ainda não
implantados anteriormente. Desta
regulamentadas
forma, o reconhecimento legal do
legalmente,
por 15
pode
infringir
ou
mesmo
casamento homoafetivo ou mesmo a conversão
da
união
Tem-se,
estável
entendimento
ainda,
o
respaldado
por
homoafetiva em casamento, não fere
Grasiela Cristine Celich (2011), de
nenhum
já
que a condição “homem e mulher”
estatuída aos casais heteroafetivos.
insere-se numa criação teórica, e
Conforme asseverou o ministro do
não legal, de que é pressuposto de
Supremo Tribunal Federal, Ayres
existência do casamento. Sendo
Britto, no julgamento da Ação Direta
assim, se dois homens ou duas
de
mulheres
direito
ou
garantia
Inconstitucionalidade
n.
se
casarem,
tal
ato
4277: “Aqui o reino é da igualdade
inexistirá, porquanto são pessoas de
absoluta. Não se pode dizer que os
mesmo sexo. Todavia, pode não
heteroafetivos
os
haver existência no plano do direito,
homoafetivos ganham. A sociedade
mas no mundo concreto dos fatos,
também não perde. Quem ganha
existiu sim, e, pode não constituir ato
com
Os
jurídico, mas é fato jurídico do qual
perde?
advém consequências, direitos e
a
perdem
se
equiparação?
homoafetivos.
E
quem
Ninguém perde”.
deveres, os quais existem sim.
Ademais, o que não é proibido
A própria lei não trata do plano
pela lei, é permitido, já que, pelo
de existência do casamento, mas
princípio da legalidade (artigo 5º,
tão-somente, da sua validade e
inciso II, da CF) somente a lei pode
eficácia. Nestas, não há qualquer
criar deveres e direitos.
impedimento
Se se partir da equidade,
ao
casamento
de
pessoas do mesmo sexo.
considerando que esta trata da
Encerrando
a
presente
consecução justiça no Direito, tem-
discussão, convém trazer à baila a
se a mesma conclusão jurídica, qual
ementa de um inovador julgado do
seja,
Egrégio Tribunal de Justiça do Rio
a
de
que
o
casamento
homoafetivo deve ser legalizado no Brasil, amparo
porquanto jurídico
ser
injusto
somente
Grande do Sul: Rio Grande do Sul – Porto
o Alegre
ao
-
Apartheid
A
casamento entre pessoas de sexo
segregação
oposto, vedando o mesmo direito
restringindo-lhes direitos em razão
aos casais formados por pessoas de
de
mesmo sexo.
incompatível com o princípio da 16
sua
de
sexual.
homossexuais,
orientação
sexual,
é
dignidade
da
pessoa
humana,
Diante de todo o exposto,
expresso no primeiro artigo da
conclui-se que o requisito “homem e
Constituição
nova
mulher” para o matrimônio civil é
definição legal da família brasileira
inconstitucional, posto que infringe
(Lei nº 11.340/2006) contempla os
princípios normativos estabelecidos
casais formados por pessoas do
pela Carta Magna, a lei máxima de
mesmo sexo, conforme antecipado
um ordenamento, tais como o da
pelo Poder Judiciário do Rio Grande
igualdade, da não discriminação, da
do Sul, através do Provimento 06/04
liberdade e da dignidade da pessoa
– CGJ. Concepções religiosas de
humana.
Federal.
A
família não podem ser impostas através
do
No
princípio da unidade da Constituição,
brasileiro,
segundo o qual, nenhuma norma
porque vedada qualquer forma de
deve ser interpretada ou aplicada à
discriminação, o casamento civil está
par do que impõe a Lei Maior, sob
disponível
pena de inconstitucionalidade.
ordenamento
Estado-juiz.
Ademais, macula-se, ainda, o
jurídico
para
independentemente
todos, sua
Por conseguinte, em face da
orientação sexual. Ação julgada
referida inconstitucionalidade, deve-
procedente,
se
para
de
reconhecer
a
legalizar
o
casamento
civil
família constituída pela autora e sua
homoafetivo no Brasil e, também,
companheira, que conviveram em
reconhecer
união estável por 25 anos. (TJRS,
constitucional a conversão da união
Proc. 1060178794-7, 2ª V. Fam.
estável homoafetiva em casamento.
Suc., Juiz Roberto Arriada Lorea, j.
A finalidade do casamento é a
07/01/2008).
como
válida
e
comunhão plena de vida, ou seja, para a consecução de tal fim, ilegal e inconstitucional é a imposição de cônjuges de sexo oposto, já que o
Conclusão
amor, o afeto, o companheirismo e a felicidade de um casal independem
“O ser humano, antes de um ser
da
pensante ou volitivo, é um ser
orientação
amante”.
indivíduos.
(Max Scheler).
Não diferente, 17
se mas
sexual
deve
desses
repelir
integrá-lo
o e
recepcioná-lo de forma a resguardar
discriminação não têm, nem nunca
os direitos e a dignidade de cada
terão, amparo legal.
ente social, pois preconceito e
18
Referências BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Supremo reconhece união homoafetiva. Disponível em:www.stf.jus.br. Acesso em: 16 de mai. de 2011. ______. Supremo Tribunal Federal. Voto do Ministro Relator Ayres Britto na ADI4277. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: 16 de mai. de 2011. ______. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: . Acesso em: 18 de mai. de 2011. ______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: . Acesso em: 18 de mai. de 2011. CELICH, Grasiela Cristine. A possibilidade jurídica do casamento homoafetivo no Brasil. Santa Maria: AGBook, 2011. CHAVES, Marianna. As Uniões homoafetivas e a corte constitucional brasileira. Disponível em: . Acesso em: 22 de maio de 2011. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. vol. 5. FERNANDEZ, Atahualpa. Casamento Homoafetivo. Disponível em: . Acesso em: 10 de mai. de 2011. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 5. ed. São Paulo: Positivo, 2010. GUERREIRO, Fátima Maria Marins. Família homoafetiva e os principais desafios. Disponível em: http://www.direitohomoafetivo.com.br/uploads_trabalho_tese/a_famlia_homoafe tiva_e_os_principais_-_ftima_guerreiro_-_verso_ibdfam.pdf>. Acesso em: 22 de mai. de 2011. LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. v. 6. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
19
A LEGALIZAÇÃO DA UNIÃO HOMOAFETIVA: DEFESA DA NOVA LEI CASALI, Éllen Cássia Giacomini. Docente do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. RIBEIRO, Glaucia Alves. Discente do 2º Período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO O reconhecimento legal da união homoafetiva consiste em garantir direitos, como pensão, herança, comunhão de bens e previdência às uniões homossexuais, assegurados antes apenas às uniões heterossexuais. A abordagem do assunto um tanto polêmico, por estar entrelaçado a antigos valores sociais, que foram ultrapassados pela evolução dos tempos, que reluta em convergir o preconceito social. Este artigo visa, em breve análise, elucidar os reais impactos da legalização da nova união, assim busca argumentos para defender os direitos dos novos casais principalmente através da dignidade humana, princípio da isonomia, liberdade de ação, solidariedade humana e analogia.
Palavras-chave: Legalização da união homossexual. Impactos da legalização. Preconceito. Liberdade de ação. Princípio da isonomia.
20
livremente firmado por um homem e
Introdução
uma mulher, pelo qual se assegura a
dos
Este trabalho traz à tona um
opção por uma vida em comum e
temas
pela
mais
polêmicos
do
participação
recíproca
momento relacionado ao direito, a
determinados bens. (...)
legalização da união homoafetiva, o
Podemos ainda
de
conceituar
que reflete a evolução da sociedade,
segundo Sílvio Rodrigues (1999, p.
mudanças
18):
de
costumes
e
universalização do amor. A polêmica
Casamento é o contrato de
está no preconceito ou então na
direito de família que tem por fim
falsa moralidade social.
promover a união do homem e da do
mulher, de conformidade com a lei, a
trabalho tem por objetivo a discussão
fim de regularem suas relações
do tema, e principalmente a defesa
sexuais, cuidarem da prole comum e
deste direito juridicamente garantido.
prestarem assistência mútua. (...)
O
desenvolvimento
Embora a pesquisa tenha sido
Depreende do conceito que
dificultada pela novidade do assunto,
tanto sociedade, quanto o direito,
e haver poucas fontes de estudo
reconheciam
sendo necessário, principalmente o
matrimonial como entidade familiar,
uso da analogia e princípios gerais
e ao passar do tempo com a
do direito para que sanasse dúvidas
evolução
convergentes ao tema.
mecanismos de reconhecer como
da
apenas
a
sociedade
união
criaram
instituição familiar a união estável, 1.
A
legalização
da
conforme
união
artigo
226
§
3º
da
Constituição Federal: “Para efeito da
homoafetiva
proteção do Estado, é reconhecida a de
união estável entre homem e mulher
matrimônio segundo a Enciclopédia
como entidade familiar, devendo a lei
Barsa (2002, p. 492):
facilitar
Temos
por
definição
sua
conversão
em
casamento”.
União voluntária entre duas
Segundo
pessoas, com o fim de partilhar a
João
Paulo
vida em todos os aspectos. Do ponto
Knychala e Ana Carolina Reis Paes
de vista jurídico, é o contrato
Leme: (LEME, KNYCHALA, 2011) [1]: 21
A
união
homoafetiva
tempos,
em
que
casais
de
caracteriza-se pela união de duas
namorados trocarem carícias ou
pessoas do mesmo sexo, com as
andar de mãos dadas na praça após
mesmas
as
características
de
um
missas
dominicais
eram
relacionamento, que consiste em um
consideradas de extrema violação
convívio
público
duradouro,
da
moral
e
bons
conceito
este
muito
desrespeito
à
lei,
e que
se
assemelha com o da união estável:
costumes, porém
hoje
enxergamos com naturalidade um
Art. 1.723, CC. É reconhecida
baile funk, sendo assim um sinal da
como entidade familiar à união
evolução natural que o tempo agrega
estável entre o homem e a mulher,
aos nossos valores.
configurada na convivência pública,
Juridicamente
falando da
o
duradoura e estabelecida com o
reconhecimento
objetivo de constituição de família.
homossexual
Portanto, a união homoafetiva pode
amparada no princípio da isonomia
ser reconhecida também como união
disposto na norma do artigo 5º da
estável entre pessoas do mesmo
Constituição Federal que segue:
é
união
perfeitamente
sexo, pois sua única diferença com a
Todos são iguais perante a lei,
união estável prevista no artigo seria
sem distinção de qualquer natureza,
a questão dos componentes serem
garantindo-se aos brasileiros e aos
do mesmo sexo. (2010, p.223)
estrangeiros residentes no País a
Notadamente sociedade
estão
o
direito
e
inviolabilidade do direito à vida, à
intimamente
liberdade, à igualdade, à segurança
ligados e em constante evolução,
e à propriedade.
assim, quando a sociedade modifica
Também com base no artigo
seus costumes, o direito passa pela
3º inciso I e IV da Constituição
mesma
Federal onde:
metamorfose
acompanhá-la Podemos
citar
e
para
protegê-la. em
Constituem
caráter
fundamentais
comparativo ao reconhecimento da
objetivos da
República
Federativa do Brasil:
união homoafetiva a interpretação do
I - Constituir uma sociedade
crime de atentado violento ao pudor,
livre, justa e solidária;
a ponto de que quando fora criada
IV - Promover o bem de todos
esta lei a sociedade vivia outros
sem preconceito de origem, raça, 22
sexo, cor idade e quaisquer outras
sociedade, pois a discussão não
formas de discriminação.
envolve a aprovação particular da
Podemos ainda reforçar o
existência da união estável, pois isso
assunto com base nos artigos 1521
independe
a 1524 do Código Civil, onde
judicial para se consumar, tanto é
esboçam
que
os
impedimentos
da
de
os
uma
aprovação
primeiros
procurarem
conquanto não há impedimento às
legalizarem sua situação já viviam
pessoas
juntos. Esclarecendo, a lei veio
mesmo
constituírem
sexo
relacionamento
apenas
reconhecido e amparado por lei. Assim,
verifica-se,
pelas
justiça
a
realização da união matrimonial,
do
a
casais
estender
para
os
concedidos
aos
heterossexuais,
como
direitos casais pensão,
normas supracitadas, que a decisão
herança, comunhão de bens e
do
previdência aos homossexuais que
Supremo
encontra-se
Tribunal
Federal
solidificada
e
compartilhando
dos
respaldada a fim de estender os
deveres
direitos
garantidos
mesmos direitos, assim atualizando
apenas a união heterossexual agora
e englobando a lei em vigor uma
à união homossexual também.
nova interpretação condizente a
O
anteriormente
que,
ponderadamente,
passam
a
mesmos adquirir
os
nova realidade social.
podemos perceber ser a atitude mais
O homossexualismo é apenas
sensata, uma vez que possível
uma opção sexual, que deve ser
separação de um casal gay poderia
respeitada,
propiciar enriquecimento ilícito de
individual
uma das partes, ou então ilegalidade
personalíssimo e é neste direito que
na distribuição de patrimônio pós-
a sociedade se propõe a mudar
morte uma vez que seu parceiro não
quando
seria reconhecido como herdeiro
realidade que a lei e neste caso, o
legítimo, e são nesses pontos,
judiciário
garantia de direitos que a legalização
tendência
vem atuar, assegurar os direitos dos
diferenças,
contraentes do relacionamento.
padronizado, foi assim com os
Ponto
este
ainda
pois
é
um
direito
intransponível
não
assume
vem
tutelar.
social rejeitar
a
e
nova
Pois
renegar o
é as não
não
negros e mulheres no início de suas
esclarecido ou mal interpretado pela
respectivas libertações e assim será 23
com
o
grupo
a
preconceito social abraçariam de tal
preconceito
forma a causa, porque se propõem e
escancarado depois será futilmente
desejam realmente constituir família
renegado ou escuso.
para poder perpetuar o amor que é a
princípio
homossexual,
um
Um assunto que engloba a
razão de suportarem a tudo, e é isso
nova lei é a questão da adoção pelo
que falta e precisa para forma uma
casal gay. Para abordagem deste
família: amor.
segundo ponto devemos considerar
No começo a criança adotada
a despersonificação ou modificação
por
real da figura familiar o que é
enfrentar pilhas e pilhas de olhares e
defendido segundo Maria Berenice
constrangimentos, assim como os
Dias (2007, p.46) “que após a
próprios casais enfrentam, mais a
modificação
sociedade nunca estará preparada
na
Constituição
casais
homossexuais
Federal, onde trouxeram um novo
para
conceito de entidade familiar”, não
coragem para depurá-los porque a
há mais o que considerar como
sociedade é um meio despreparado
família normal, mas devemos adotar
talvez à imposição seja a melhor
o termo famílias, como definição
forma para vencer o preconceito,
para a atual situação, então por que
não sejamos hipócritas em dizer que
não
casal
não é o momento para a implantação
homossexual com filhos adotados
desta lei, porém um dia será, será?
como uma nova forma de família?
Quando será? Simplesmente nunca,
reconhecer
um
A realidade dos orfanatos é
recebê-los
é
vai
necessário
o momento é exatamente agora.
terrível, crianças que não atendem a
Aos poucos a sociedade irá se
maioria dos critérios necessários
habituar à nova realidade, porém o
para manifesto de vontade de casais
momento é crítico para esta minoria
em adotá-los, estes supostamente
da
imperfeitos nunca adquiriram família,
crescente e cada vez gerando mais
com mais casais aptos a adoção,
violência,
como
casos
noticiários presencia-se os ataques,
uma
verdadeiros massacres de gangues
válvula de escape e solução da
aos gays, por quê? Simplesmente
problemática, os pais e mães sendo
por medo do que não se conhece? É
vítimas da ferocidade patética do
realmente difícil entender os reais
os
poderiam
gays, funcionar
nestes como
24
população,
todos
a
homofobia
os
dias
é
nos
motivos dos ataques, supondo que
Conclusão
sejam casos de gays covardes, que ao contrário dos agredidos não se
Ao término do presente artigo
dispuseram a assumir sua real
conclui-se que já havia respaldo
situação sexual. É outro tema que
suficiente para a legalização da
merece ser discutido com real rigor,
união, apesar da relutância da
além de agressão por motivo torpe
sociedade em aderir novidades, é
compete agressão associada ao
apenas um estágio que é necessário
preconceito, que deverá ser punido
ser ultrapassado para alcançar o real
com
objetivo da lei que é a garantia de
severidade
em
categoria
específica de lei.
direitos aos cidadãos e neste caso que possuem uma opção sexual diversa à originária. A
homossexualidade
não
afeta o caráter da pessoa, é um direito pessoal e intransferível de escolha conjugal,
pelo
relacionamento
encarado
poeticamente
como uma nova forma de amar. O objetivo
deste
alguma
foi
artigo
exigir
de
forma
aceitação
e
compreensão social, mas sim exigir respeito para que um dia o diferente se torne igual.
25
Referências BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. MARTINS, Rodrigo Monteiro. Legalização da união estável entre homossexuais. Disponível em:http://jus.uol.com.br/revista/texto/557/legalização-da-uniao-estavel-entrehomossexuais. Acesso em: 14 de junho de 2011. GWERCMAN, Sergio. O Brasil e os homossexuais: sim. Disponível em:http://super.abril.com.br/cotidiano/brasil-homossexuais-sim-444558.shtm/. Acesso em: 14 de junho de 2011. SANTOS, Jeferson. STF: união homossexual – casamento gay e legalizado no Brasil – STF torna união estável homossexual reconhecida. Disponível em: http://artigos.com/artigos/sociais/direito/stf-_-uniao-homoafetiva-_casamentogay-e-legalizadono-brasil.-stf-torna-uniao-estavel-homoafetivareconhecida-pela-justica-17488/artigo/artigo/. Acesso em: 15 de junho de 2011. BRASIL, Código Civil (2002). Código Civil Brasileiro. Brasília, DF: Senado, 2002. BARSA, Consultoria. Nova enciclopédia Barsa. São Paulo: Editora LTDA, 2001. LEME, Ana Carolina Reis Paes; KNYCHALA, João Paulo. Reconhecimento da união homoafetiva. Disponível em: http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/2343/RECONHECIMENTO_DA _UNIAO_HOMOAFETIVA. Acesso em: 15 de junho de 2011. DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. [1] Minas Gerais, João Paulo Kynachala e Ana Carolina Reis Paes Leme, RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA, 2011, Universo Jurídico.
26
A LEGITIMIDADE DEMOCRÁTICA DO STF À LUZ DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS Andréia Garcia Martin - Docente da Unifev - Centro Universitário de Votuporanga
RESUMO O presente estudo bibliográfico tem por objetivo demonstrar que, na nova quadra que se encontra o Estado contemporâneo e o constitucionalismo nacional, o Supremo Tribunal Federal passou a desempenhar renovada função como representante de um dos Poderes de Estado. Assim, com o intuito de manter o laço democrático, firmado pela Constituição Federal de 1988, e como forma de confirmar sua legitimidade, o STF vem atuando de maneira proativa, fulcrado nos valores constitucionalizados, para a realização dos direitos fundamentais dos seus cidadãos.
Palavras-chave: Legitimidade. Direitos Fundamentais. Jurisdição Constitucional 27
Judiciário, por meio de seu Tribunal
Introdução
Constitucional, Sob
o
fulcro
adquirirá
uma
legitimidade de índole democrática,
do
constitucionalismo contemporâneo,
ao
nominado novo constitucionalismo
fundamentais constantes da Carta
ou
de Outubro.
“neo-constitucionalismo”,
vislumbra-se atividade
a
do
crescente Poder
concretizar
os
direitos
pro1. Jurisdição constitucional
Judiciário,
principalmente, do Supremo Tribunal Considerando o atual patamar
Federal no que tange à efetivação
nacional, no qual se pode afirmar
dos direitos fundamentais. Indelevelmente,
que se está diante de um Estado
constata-se
que o compromisso democrático
Constitucional
firmado em 1988, vem sendo, de
Direito, vez que se adota um modelo
forma despicienda, descumprido por
político democrático fundado numa
parte dos Poderes de Estado, dessa
Constituição,
forma, pretende-se demonstrar que,
imprescindível a existência de uma
em
“instância
que
pese,
Constitucional detenha
de
o
brasileiro uma que
decorre
escolha
povo
dos
condão
torna-se neutra”,
que
seja
de
preservar
este
da
documento, sua supremacia, dando
seus
suporte ao resguardo da própria democracia.
representantes, é detentor de uma legitimidade
de
curadora, guardiã, e que tenha o
não
legitimidade
representativa, pelo
Tribunal
Democrático
Esta instância é a Jurisdição
especialmente
democrática, já que esta decorre do
Constitucional
dever que se comprometeu no pacto
Constitucional, que se configuraria
republicano-democrático de realizar
pelo agrupamento de técnicas e
os valores constantes do Texto
instituições com o intuito de garantir
Constitucional.
a supremacia e a imperatividade da
Pretende-se,
ou
Constituição,
também,
Justiça
pois
“o
estabelecer, de forma contundente,
reconhecimento da supremacia da
porém
Constituição
concisa,
como
o
Poder 28
e
de
sua
força
vinculante em relação aos Poderes
democrático assumido a partir da
Públicos torna inevitável a discussão
Constituição de 1988. Depreende-
sobre as formas e modos de defesa
se,
da
Constitucional
Constituição”.
(MENDES;
BRANCO, 2011, p. 1059).
pois,
que
“a
Jurisdição emergiu
historicamente como um instrumento
Eis que uma das formas mais
de defesa da Constituição, não da
contundentes de defesa da Carta
Constituição considerada como um
Constitucional por essa “Justiça”
puro nome, mas da Constituição tida
ocorre por meio do controle de
como expressão de valores sociais e
constitucionalidade das leis, que se
políticos” (SILVA, 1999, p. 555).
perfaz através de técnicas postas à
Ora, como instrumento de
disposição da Corte Constitucional,
defesa dos valores de ordem social
tendo como desiderato instrumental
constitucionalmente
a própria Constituição, em que será
pode-se afirmar que se possibilitou
axiologicamente
um mastodôntico aumento da função
apreciada
com
relação ao ordenamento jurídico,
jurisdicional
assim “a Constituição se juridifica e
detrimento das demais – legislativa e
judicializa” (OTTO, 2001, p. 36, Apud
executiva –, que ultrapassou o mero
GARCIA, 2008, p.189), ganhando o
papel de realizar o controle de
status que lhe é inerente.
constitucionalidade,
Nesse sentido, ensina Walter
do
assegurado,
Estado,
em
passando
também a exercer as funções de
Claudius Rothenburg: “O controle de
fiscalização
constitucionalidade,
do
pública e do legislativo, além de ser
contexto mais amplo da jurisdição
o guardião dos direitos fundamentais
constitucional, tende a desenvolver-
em suas mais variadas dimensões.
se
dentro
preponderantemente
em
um
De
da
acordo
administração
com
Mônia
destes dois sentidos: a tutela dos
Clarissa Hennig Leal, as mudanças
direitos
a
e a evolução do Estado, originaram
governo
a modificação da Constituição e,
fundamentais
estabilidade
do
ou
(“governabilidade”)” (2002, p. 269). Outrossim,
esta
consequentemente,
Jurisdição
as
próprias
funções exercidas pela jurisdição
tem por premissa a defesa dos
constitucional,
valores constitucionais básicos, no
“assim como a própria Constituição
afã de conformar o compromisso
se desenvolveu na perspectiva do 29
asseverando
que
Estado, também o papel da garantia
Ademais, deve-se considerar
e as formas de atuação da jurisdição
que o controle de constitucionalidade
constitucional se modificaram na
como precursor da atividade afeita
esteira
transformações”
destas
ao
(LEAL, 2007, p. 5).
Constitucional,
favoreceu a ampliação de suas
Dessa forma, “o controle de constitucionalidade, desempenhado
Tribunal
tal no
atividades na atualidade, pois fez
como
com
que
esta
Corte
não
se
Estado
reprimisse em mergulhar a realidade
contemporâneo, deve enquadrar-se
e vislumbrar as reais necessidade da
no contexto da democracia e reforçá-
sociedade,
la”
p.
incólume às questões sociais. Nesta
104). Tendo em vista que somente
quadra, é conveniente passar-se à
dessa forma se poderá falar que o
breve
Tribunal Constitucional é legitimo
controle de constitucionalidade.
(ROTHENBURG,
2005,
não
análise
das
quedando-se
origens
do
para desempenham amplamente tal Jurisdição.
1.1
Eis que “a instituição da
Origens
do
Controle
de
Constitucionalidade e Histórico STF
jurisdição constitucional [in casu, da ampliação de suas funções] não se acha
de
forma
alguma
O
controle
judicial
de
em
constitucionalidade tem suas origens
contradição com o princípio da
fundadas em um clássico julgado da
separação
Suprema Corte norte-americana, o
dos
poderes,
ao
contrário, é uma afirmação dele”
caso
(KELSEN, 2003, p. 152). Ou seja,
tornando-se paradigmático para o
encontra-se
constitucionalismo universal.
intimamente
relacionada,
pois,
constitucionalismo
hodierno
Marbury
versus
Madison,
o
Por meio desse julgado, na
tem
ocasião presidido pelo juiz John
a façanha de conjugar institutos que
Marshall, cogitou-se, pela primeira
por muito tempo existiram de formas
vez, a compatibilidade de disposição
apartadas,
de
legal em face de uma constituição,
promover os ideias democráticos
sustentando a tese da supremacia
compatibilizado
da lei constitucional sobre a lei
com
o
com
condão
a
plena
proteção aos direitos fundamentais.
ordinária (SWISHER, 1962, p.1014). Tal decisão declarou que todo 30
ato
do
Congresso
Constituição
contrário
à
Ademais,
tal
modelo
dá
obrigatoriamente
respaldo, ainda, a não aplicação por
deveria ser tomado como nulo,
qualquer juiz ou tribunal de norma
inválido e ineficaz (“null and void and
presente na legislação ordinária, que
of
se
no
effect”).
Deste
modo,
vislumbre
contrária
à
“reconheceu-se, assim, que a Corte
Constituição.
poderia
textos
pendente somente a uma declaração
à
pelo Tribunal Constitucional de sua
Constituição, demonstrando que a
inconstitucionalidade, que quando
interpretação das leis terá que ser in
proferida terá efeitos retroativos,
harmony
porém, somente entre as partes.
interferir
legislativos
nos
contrários
of
the
Constitution”(CUNHA
JÚNIOR, esse
sistema
que com o passar do tempo este
há
modelo de controle foi aperfeiçoado
constitucional
por
sistema
a
fica
difuso,
originário
do judicial review norte-americano,
Ademais, convém ressaltar
decisões
lei
Em contrapartida, frente a
2009, p.105).
outras
Referida
Corte
o
sistema
é
de
jurisdição
concentrada, denominado
tal
também
Americana, porém, não se retirou o
sistema austríaco, tem suas origens
brilho dessa primeira decisão, que
na obra de Hans Kelsen, a decisão
passou
Jurisdição
deste controle se concentra em um
Constitucional de diversos Estados,
único órgão competente, qual seja, a
entre eles o Brasil.
Corte Constitucional.
a
nortear
a
De tal julgado, pode-se extrair alguns
pontos
controle
fundamentais
americano.
do
de 1988 o constituinte desejou
de
conceder ao STF um status similar
norte-
ao de uma Corte Constitucional,
jurisdicional
constitucionalidade
Já com a Constituição Federal
Inicialmente,
outorgando-lhe
a
competência
compreende-se por lei fundamental
basilar de guarda da Constituição,
a
velando por sua supremacia.
própria
Constituição
escrita,
declaração da vontade originária do
Com efeito, o controle de
povo, que no mesmo momento que
constitucionalidade
lhe outorga poderes os restringe,
alberga ambas as modalidades,
representando a adoção do princípio
porém, pela sistemática nacional,
da supremacia da Constituição.
várias 31
reformas
brasileiro
promoveram
a
abertura do processo constitucional,
Dessa forma, a Jurisdição
como, por exemplo, a Lei nº 9.868/99
Constitucional além de manter uma
que
no
permanente
processo de órgãos ou entidades
democracia,
com o intuito de fomentar uma maior
em colapso os elementos clássicos
entronização
de
que fomentaram a instituição do
democráticos
para
permite
a
intervenção
elementos tornar
tal
também
a
coloca
antigo desenho conferido às funções
Nesse diapasão, entende Luiz
de Estado por ocasião da teoria
Roberto Barroso que: tem-se
com
Estado de Direito. Eis que modifica o
procedimento deveras legítimo.
[...]
tensão
clássica de Separação dos Poderes, travado,
nos
outorgando
ao
Poder
últimos anos, uma ampla discussão
protuberante
sobre
de
coloca nas mãos desse Poder
constitucionalidade pelo Judiciário e
aultima ratio no que diz respeito a
seus limites. Sustenta-se que os
manter
agentes
normatividade
o
controle
do
Executivo
e
do
a
posição,
Judiciário vez
que
supremacia
e
do
a
Texto
Legislativo, além de ungidos pela
Constitucional, o que fomenta a
vontade popular, sujeitam-se a um
legitimidade
tipo de controle e responsabilização
Constitucional
política de que os juízes estão
decisões tomadas (ou não tomadas!)
isentos.
pelos representantes do povo.
Daí
afirmar-se
que
o
do em
Tribunal interferir
nas
controle judicial da atuação dos outros Poderes dá lugar ao que
2.
denominou de “countermajoritarian
neoconstitucionalismo
difficulty”
(dificuldade
manutenção da inefetividade dos
contramajoritária). Notadamente os
mandamentos constitucionais: o dito
segmentos
pelo não dito?
conservadores
têm
Do
constitucionalismo e
ao a
questionando o avanço dos tribunais Houve diversos momentos – e
sobre espaços que, segundo crêem, ao
ainda há – na evolução histórica do
processo político (BARROSO, 1996,
Estado de Direito, desde a instituição
p. 157).
das primeiras Constituições, em que
deveriam
ficar
reservados
os seus Textos apesar de conterem determinações 32
de
índole
institucional,
de
formação
e
precedentes,
em
que
se
orientação do Estado, consignando
proporcionava mais valor e poder às
os Poderes e determinado o modo
leis e aos Códigos do que às
de
de
Constituições e, ainda ao legislativo
maneira mais assídua ou mais
era outorgada posição de destaque,
branda eram preenchidas, havia
sendo que sua função consistia em
também,
tentar justificar a irrealizabilidade
concepção
política,
que
outros
tantos
que
passavam
assentamentos
constitucional.
desapercebidos das considerações
Depreende-se que há uma
quer dos membros do legislativo,
insistente
quer do executivo.
função hipertroficamente simbólica e
Este era o fenômeno que tornava
as
Constituições
“discrepância
entre
a
a insuficiente concretização jurídica
mero
de
diplomas
constitucionais”
baluarte, monumento incólume à
(NEVES, 2007, p. 1), nesse contexto
consumação de seus fundamentos,
o
princípios e finalidades, destinados
constitucionais
àqueles que pertenciam a este
principalmente
Estado, compreendendo, a exemplo
função legiferante em que a fictícia
do que aduz Marcelo Neves (2007),
proteção da lei de todas as situações
a
que
constitucionalização
simbólica.
déficit
eficacial
das
normas
instaurado pela
podem
exacerbada
geram
alguma
Assim, em que pese houvesse toda
modificação no mundo dos fatos,
uma estrutura que conjecturasse
também poderia ensejar a mais
determinações jusfundamentais à
ampla tutela prestacional de direitos
conformação da tutela dos direitos
fundamentais, como justificativa à
declarados em seu bojo, essas se
imprescindível efetividade da Carta.
quedavam inertes, sob um pedestal
Ora,
inalcançável e inexequível. Sob
essas
premissas,
panorama,
em
concretude
e
que
[...] Criar uma imagem de um Estado
determinações
normativamente
o
século
constitucionais, XVIII
presteza,
conformando-se em:
praticamente a totalidade de suas
desde
legislação-
justificativa tem o intuito de cominar
em terra brasilis, vislumbrou-se o mesmo
esta
que
responde aos
problemas
eram
reais da sociedade, embora as
permeadas por um simbolismo sem
respectivas relações sociais não 33
sejam realmente normatizadas de
em que a divisão dos Poderes passa
maneira consequente conforme o
a ser verdadeiramente trialista, ou
respectivo
melhor, pluralista, assumindo todos
texto
legal.
Nesse
sentido, pode-se afirmar que a
os
legislação-álibi constitui uma forma
constitucional. Com efeito,
de manipulação ou de ilusão que
redutos
de
concretização
Passou-se de um discurso
imuniza o sistema político contra
fundado
outras alternativas, desempenhando
centralizado no juiz, apolítico e
uma função ideológica. (NEVES,
demonstrativo, que aplicava o direito
2007, p. 39-40).
material posto e fundado nos direitos
Nesta senda, elucubra-se a iniquidade
do
constitucionalismo
codificadas,
discurso democrático que relaciona
vez
autor, juiz e réu em colaboração,
que a busca em efetivar fórmulas
com
desprovidas
argumentativo,
de
regras
subjetivos preconcebidos, para um
malfadado simbólico,
em
qualquer
viés
problemático
e
fundado
na
partes
para
vinculatividade com os fundamentos
participação
constitucionais verte-as ao Poder
obtenção da melhor solução jurídica;
Judiciário o dever de dessimbolizá-
em síntese, na garantia substancial
los.
do contraditório. (ZANETI JÚNIOR, Ademais,
convém
afiançar
2007, p. 55-55).
que com a Constituição de 1988, segundo
Hermes
Zaneti
das
Esse renovado papel que
Júnior,
passa a desempenhar o Poder
insuflou-se uma modificação sob a
Judiciário
perspectiva dos domínios políticos,
modificação na ideologização da
detendo uma “abertura participativa
função exercida pelo julgador e, por
e
reconhecimento
instâncias
de
seja,
numa
de
diversas
consequência, dos operadores que
decisão
política”
postulam em juízo. Devendo o juiz desmistificar a nefasta neutralidade
(ZANETI JÚNIOR, 2007, p. 55). Ou
conjectura-se
a
democracia,
que o torna imune à realidade e
gradativamente vem perpassando
enclausurado
por uma mitigação da prevalência
imparcialidade é inerente a sua
dos Poderes Executivo e Legislativo,
atividade,
em que havia um controle central
transformá-lo em neutro, isento de
desses dois, para uma composição
responsabilidade ante a Carta que 34
ao
porém
processo,
não
a
precisa
tem o dever de tornar viabilizada
inadimplindo
pela decisão. A neutralidade não faz
elucubrado na Carta, como que
justiça
seus
entre
as
partes,
pelo
senda,
defender
adjetivos,
verbos
e
conjunções fossem tidos como não
assevera
ditos.
Walber de Moura Agra que: Ao
compromisso
substantivos,
advérbios,
contrário, gera mais injustiça. Nesta
o
que
a
Constituição é uma “ordem objetiva
2.1
de valores” e que a concretização
neoconstitucionalismo na atividade
dos
jurisdicional:
direitos
fundamentais
deve
Manifestação
A
do
Hermenêutica
garantir um mínimo existencial ou
constitucional do protagonismo do
densidade
Judiciário
suficiente
de
seus
preceitos está se tentando assegurar sua efetiva realização, mormente
Conforme elucubrado linhas
dos direitos que têm uma natureza
acima, conjectura-se como uma das
programática.
formas
Supremo
Dessa
Tribunal
forma,
o
Constitucional
de
manifestação
do
neoconstitucionalismo a atividade
assume uma relevante importância
jurisdicional,
no
os
anotar que não compreende aquela,
direitos fundamentais abrigados pela
que ainda é tão insistentemente
Constituição de 1988, tornando-se o
forjada pelos operadores pátrios,
“guardião
o
qual seja: da simples subsunção do
instrumento de tutela e efetivação
fato à norma, do juiz mera boca da
das
lei, que descreve o fato típico que se
sentido
de
implementar
dos
valores”,
prerrogativas
dos
cidadãos
(AGRA, 2010, p. 500).
o
mister
de
efetivamente
as
constitucional
impedindo
a
lepra
da
simbólica
deve-se
conformou à norma sem se deter às
Assim, compete ao Poder Judiciário
entretanto,
necessidades dos jurisdicionados e
tutelar
à
declarações
realidade
que
circunda
a
sociedade.
que
Devendo, ademais valer-se
constitucionalização
de um inter-relacionamento entre
contamine
o
atividade jurisdicional, através do
neoconstitucionalismo que se avulta,
processo, vinculado aos direitos
mantendo
fundamentais constantes do Texto
a
mandamentos
inefetividade constitucionais
dos e
Constitucional, vez que: 35
A relação entre a Constituição
O papel do Judiciário em um
e o processo pode ser feita de
Estado que se quer democrático é
maneira
distinto daquele que se lhe atribui na
direta
quando
a
Lei
Fundamental estabelece quais são
formulação
clássica
sobre
suas
os direitos e garantias processuais
relações com os demais poderes
fundamentais, quando estrutura as
estatais. Do Judiciário hoje, não é de
instituições essenciais à realização
se esperar uma posição subalterna
da justiça ou, ainda, ao estabelecer
frente a esses outros poderes, a
mecanismos formais de controle
quem caberia a produção legislativa
constitucional. Por outro lado, tal
(GUERRA FILHO, 2007, p. 69-70),
relação pode ser indireta, quando,
Mas sim, um protagonismo
tutelando diversamente determinado
que tenha por bandeira a realização
bem
os
democraticamente assegurada dos
direitos da personalidade ou os
direitos fundamentais. Nesta senda,
direitos coletivos ou difusos) ou uma
em que pese possa se falar da
determinada categoria de sujeitos
ausência
(crianças,
neoconstitucionalismo
jurídico
(por
exemplo,
adolescentes,
idosos,
de
legitimidade,
atividade
o
premente com o intuito de não tornar
preveja
infraconstitucional
regras
processuais
os
mandamentos
Poder
pró-
consumidores etc.), dá ensejo a que legislador
deste
a
no
se
faz
constitucionais
específicas e para que o juiz
meras promessas sem concretude,
concretize a norma jurídica no caso
com carga apenas simbólica, sendo,
concreto (CAMBI, 2009, p. 139).
nessa perspectiva, que o juiz adquire
Sob
esta
constata-se
que
democrática
do
a
perspectiva,
a
legitimidade
auspícios de uma responsabilidade
Judiciário
não
referida
legitimidade,
sob
os
ético-constitucional de tutelar os
decorre tão-só de uma determinação
direitos fundamentais.
normativa, mas se constrói em sua
[...] torna-se evidente que o
atuação no campo da hermenêutica
apego exagerado de grande parte
constitucional realizando o escudado
dos juízes brasileiros à teoria da
no
Separação dos Poderes é resultado
Texto
Constitucional.
Ora,
depreende-se assim que:
de uma atitude conservadora da doutrina constitucional, que ainda não se adaptou as suas “lições” às 36
condições diferenciadas do moderno
especialmente
Estado Social e está devendo as
constitucionais, impõe-se considerá-
necessárias
lo
atualização
e
reinterpretação de velhos dogmas do
como
direito
Indaga-se:
2002, p. 91).
necessidade
assunção
pelo
valores
constitucional
aplicado (OLIVEIRA, 2008, p. 230).
constitucionalismo clássico (KRELL,
A
de
Poder
Porque
da
a
hermenêutica
constitucional aplicada à Jurisdição?
Judiciário de funções consignadas
A
Constituição
outorga
precipuamente aos demais Poderes
atividade
–
consciência hermenêutica, que deve
especialmente
pela
jurisdicional
à
uma
representatividade – tem o condão
ser
de promover um debate político-
imprescindível à sua realização.
jurídico
Assim, o Judiciário “só se legitima
qualificado
no
que
diz
respeito aos direitos fundamentais. A
transformação
tomada
como
técnica
como Poder na medida em que
política
garante o respeito e a efetivação dos
advém da influência proveniente do
direitos e garantias fundamentais do
poder jurisdicional, que se maximiza,
cidadão” (HOMMERDING, 2007, p.
aspecto que redefine a divisão dos
175).
poderes (FIGUEROA, 2003, p. 165).
Assim,
sendo
a
atividade
A legitimidade da jurisdição depende
jurisdicional conformadora da tutela
de
jurisdicional
uma
atividade
interpretativa,
desde que, coerente, integral e
hermenêutica,
responsável.
constitucional,
Nesta entendimento
vereda, de
tem-se
Carlos
o
de
direitos,
sob
a
fundamento apresenta-se,
juntamente com os procedimentos e
Alberto
técnicas
processualmente
Álvaro de Oliveira, ao confirmar que:
consignadas,
Realmente, se o processo, na sua
possibilidade de se concretizar os
condição de autêntica ferramenta de
direitos
natureza pública indispensável para
efetiva a prestação da atividade
a
jurisdicional.
realização
da
justiça
e
da
como
fundamentais
uma
nova
tornando
pacificação social, não pode ser
Dessa forma, a perspectiva
compreendido como mera técnica,
interpretativa do direito enseja uma
mas, sim, como instrumento de
reprogramação da responsabilidade
realização
ínsita ao julgador de índole política e
de
valores
e 37
moral,
já
que
a
compreensão
tipo de furto. Eles são demasiado
hermenêutica do juiz seria a única
gerais para que tal seja possível.
apta a captar a complexidade do
Mas tais princípios são importantes
fenômeno jurídico (ARANGO, 1999,
tópicos
p. 158), ante à realidade.
assumem
de
argumentação
um
especial
e
relevo,
Contudo, no que tange à
sobretudo, quando está em causa
promoção da dignidade humana por
tutela das minorias e dos mais
meio da jurisdição, não detém uma
fracos. Está claro que tais princípios
possibilidade simplificada apesar de
são tanto mais contingentes quanto
ser uma característica ínsita a todo e
mais concretamente os concebemos
qualquer
humano,
e raramente se poderá fundamentar
principalmente por tal cláusula geral
uma decisão apenas em um desses
ser embebida de um conteúdo
princípios. Não se pode expor em
altamente
abstracto a forma como operam os
ser
abstrato
plurissignificativo,
e
porém,
essa
princípios
gerais
de
direito
na
indeterminabilidade não é fator de
argumentação, apenas se podem
irrealizabilidade
dar exemplos” (KAUFMANN, 2004,
dependem
de
da
direitos
que
promoção
da
p. 272-273).
dignidade para se concretizarem.
Dessa forma somente dentro
Neste ínterim, comporta à dignidade
uma
de uma tutela jurisdicional que
interpretação
considere
a
realidade
necessidade
compreendendo
o
amplamente a dignidade de todos os
embasamento precípuo de presença
membros do corpo social é que se
insofismável
poderá
do
afirmar
se
a
moralmente reflexiva do julgador, esta
de
e
promover
que
se
está
neoconstitucionalismo na atuação
vivenciando uma época, Estado e
jurisdicional.
Constituição que se conforma ao
Todavia, como bem adverte
fenômeno do neoconstitucionalismo.
Arthur Kaufmann, os princípios, e
Enfim, convém ressaltar que
especificamente
a
dignidade
para que a atividade jurisdicional
humana, não podem ser aplicados:
torne-se ínsita ao fenômeno do
[...] como se de uma receita
neoconstitucionalismo,
julgador
culinária se tratasse; e não se pode
deve
neles ‘subsumir’ como se faz sob o
mergulhado na realidade, não se 38
estar
o
constantemente
justificando
uma
perspectiva
Daí
a
dificuldade
meramente estática, nos estritos
hermenêutica: seria possível incluir
limites da
nesse regime uma situação que não
relações
lei.
Pois,
humana
sendo as
extremamente
foi
originalmente
prevista
pelo
complexas e mutáveis, não cabe se
legislador ao estabelecer a premissa
traçar um quadro enclausura como
para a consequência jurídica? Não
se a realidade fosse imutável. A
haveria transbordamento dos limites
realidade é mutante, líquida, fluída,
da atividade jurisdicional? A resposta
dispersa, cresce e fenece conforme
à
os atores que a encenam.
desenganadamente
Neste sentido, vislumbra-se a
última
votos
da
ADI
adianto,
é
negativa
(BRASIL, 2011).
recente decisão do STF preferida nos
questão,
E ainda, sob o voto do
nº4.277/DF
Ministro Relator Carlos Ayres Britto,
e ADPF nº 132, que equiparou a
elucubrando
união de casais homoafetivos à
homossexualidade é um traço ínsito
união estável, determinada tanto
da
pelo
pela
humano, decorrente do direito à
forma
intimidade (inc. X, art. 5º), tido como
Código
Constituição
Civil
como
Federal,
de
literal, possível apenas por casais
que
personalidade
de
a
cada
ser
direito fundamental, eis que:
formados por homem e mulher.
[...] nessa altaneira posição de
Entretanto, os Ministros do STF
direito
argumentaram enfaticamente que a
personalidade, a preferência sexual
homossexualidade é um fato social
se põe como direta emanação do
crescente na realidade brasileira e
princípio da “dignidade da pessoa
que não pode ser ignorado, pelo
humana” (inciso III do art. 1º da CF)
contrário,
enfrentado,
[...] Com o aporte da regra da
combatendo-se qualquer forma de
autoaplicabilidade possível das
preconceito dele advindo.
normas consubstanciadoras dos
deve
se
Em seus votos, é visível a dificuldade
encontrada
fundamental
e
bem
de
direitos e garantias fundamentais,
pelos
a teor do §1º do art. 5º da nossa Lei
Ministros em proferirem seus votos
Maior, assim redigido: “As normas
nos estritos limites legais, conforme
definidoras dos direitos e garantias
se extrai do voto do Ministro Marco
fundamentais
Aurélio Mello:
imediata”. [...] Daqui se deduz que a 39
têm
aplicabilidade
liberdade sexual do ser humano
legitimidade que se pode extrair do
somente deixaria de se inscrever no
Texto
âmbito de incidência desses últimos
dos artigos. 5º, XXXV, 101 e 102,
dispositivos constitucionais (inciso X
quais sejam: uma referente à própria
e
se
Jurisdição Constitucional e a outra
houvesse enunciação igualmente
no que compreende o exercício
constitucional em sentido diverso.
dessa jurisdição.
§1º
do
art.
5º),
Coisa que não existe (BRASIL,
Constitucional,
localizados
No que tange à primeira, a
2011). Grifos no original. Ora, o que não é proibido pelo
legitimidade
da
Constitucional
diz
Jurisdição respeito
à
direito é plenamente viável e deve
competência
que
o
ser tutelado, vez que ao direito é
constituinte,
por
ocasião
impossível
Assembleia Nacional Constituinte,
normatizar
todas
as
legislador da
situações insurgentes no cerne da
assegurou
ao
Tribunal
sociedade, competindo ao Judiciário
Constitucional,
sendo
legitimo
protagonizar as devidas análises
somente pelo fato de existir, tal
interpretativas visando a tutela dos
legitimidade
direitos
estáticas, é de ordem institucional.
fundamentais,
como
preocupação moral em implementá-
tem
Infere-se,
qualidades
ainda,
dessa
fator,
convém
dita legitimidade formal algumas cat
no
que
egorias: uma condizente à vontade
legitimidade
normatizada na Constituição Federal
democrática do Poder Judiciário,
pelo Poder Constituinte Originário,
mais precisamente do Supremo
em que a maioria atual sucumbe
Tribunal Federal.
face à norma constitucional que
los.
Por
tal
demonstrar-se compreenderia
a
disponha em sentido contrário. E 3.
Legitimidade
democrática
do
outra,
supremo tribunal federal
que
a
legitimidade
da
Jurisdição Constitucional confundese com sua competência, isto é, só
Para a análise da legitimidade
por seus atributos, tal como órgão
do Supremo Tribunal Federal (STF),
oficial estatal e competentemente
antes, porém, se faz necessário
nomeado. E ainda, uma legitimidade
tecer alguns comentários a respeito
democrática
da distinção entre duas formas de
alcançaria em virtude dos membros 40
indireta
que
se
dos poderes que fazem a escolha dos
Ministros
do
A
Tribunal
defesa
constitucionais
de
direitos
fundamentais
de
Constitucional serem representantes
minorias pelo Tribunal Constitucional
do povo. Contudo, tais categorias
será
deixam aquém a conquista de uma
uma
legitimidade
democrática, tendo em vista que por
verdadeiramente
democrática. No
especial
de legitimidade
efetivar tais direitos já se torna que
concerne
à
legítimo.
legitimidade de exercício – que tem características –,
dinâmica
dotada
em
Ademais, o ponto culminante que coloca em xeque a legitimidade
constante um
do Tribunal Constitucional se dá
axiológico,
quando este se encontra numa
atuaria com pretensão de proteger a
posição oposta “às decisões dos
ordem
circulando
demais ‘poderes’ (função arbitral),
entre os ambientes do Direito e da
contra a lei da maioria (função
Política.
em:
estruturante) ou diretamente contra a
legitimidade técnica, por referir-se à
própria vontade popular ou, ainda
independência
assume
predominante
por
deter
cunho
constitucional,
Distingue-se
no
exercício
da
função jurisdicional, que apesar da
decisões
próprias
[...]”
(TAVARES, 2005, p. 496).
falta de representatividade de origem
Em “a
algumas missão
situações,
eletiva do Tribunal Constitucional
quando
não lhe prejudica a plena conquista
Constitucional se projeta, assim,
de legitimidade, que seja gravada
para além da mera função de
com caráter democrático.
legislador negativo, guardião da
do
Tribunal
Ora, convém asseverar que
coerência sistêmica do ordenamento
numa democracia complexa como a
jurídico” (BINENBOJM, 2001, p. 82),
brasileira, em que, inicialmente, se
depreende-se que ele expande sua
buscou
atuação para alcançar uma integral
albergar
na
própria
Constituição interesses tão dispares,
legitimidade
o STF pretende assegurar não
democrática, vez que passa a ter a
apenas o domínio da maioria, mas
função “de articular o debate público
igualmente
em
a
consideração
às
torno
de
dos
natureza
princípios
constitucionais [...]” (BINENBOJM,
minorias.
2001, p. 82), donde se apoia no 41
ínfimo intuito de concretizar os
procedimento legitima o Tribunal
direitos
Constitucional, isto é, ao Tribunal
constitucionais
fundamentais. Com
Constitucional efeito,
ante
ao
realizar
a
Justiça
Constitucional deverá levar em conta
elucubrado acima, o que fornece
tão-só
legitimidade democrática ao Tribunal
estabelecido. Ele defende que o
Constitucional
função
procedimento inerente às decisões
voltada
judiciais, por si só, é condição
especificamente para os anseios
suficiente para a sua legitimação,
verdadeiramente democráticos da
mesmo que seus posicionamentos –
sociedade
que em maior ou menor medida
é
sua
jurisdicional,
contemporânea,
o
procedimento
desempenhando importante papel
contrárias
as
na defesa do pluralismo das minorias
constitucionais
e no controle do Poder Público,
repercussão social.
pré-
determinações -
tragam
grande
especialmente fundado no princípio-
O conceito de legitimidade
matriz da dignidade da pessoa
defendido por Luhmann não permite
humana.
uma ligação direta com os interesses dos
3.1
Legitimidade
Niklas
Luhmann
Procedimental: versus
atores
sociais,
não
se
importando se as decisões judiciais
Jünger
obtêm consenso em virtude da
Habermas
aceitação dos jurisdicionados ao conteúdo da sentença. Assim, não
Destarte, ainda no que diz
há o imperativo de se construir um
respeito à legitimidade no exercício
espaço público para a participação
da Jurisdição Constitucional, há uma
dos jurisdicionados como defendido
corrente procedimentalista que gira e
por Jünger Habermas. A rigor,
torno de Niklas Luhmann (1980) e
Luhmann entende que a atividade
Jünger
jurisdicional
Habermas
(2003a),
que
transforma-se
em
apesar de serem da mesma vertente
legítima a partir do momento que são
adotam
aptas a coligir uma aceitação diante
posicionamentos
divergentes.
da decisão.
De acordo com a doutrina de
Assim,
legitimidade, o
de
Niklas Luhmann, que funda sua obra
acordo
na teoria dos sistemas, somente o
luhmanniano, advém da função que 42
com
a
entendimento
o procedimento judicial representa
fechado agindo sob o código binário
no desembocar em uma decisão
licito/ilícito. Não levando em conta a
judicial, ou seja, o procedimento e o
sociedade, nem a realidade para as
processo judicial tem a função de,
tomadas de decisão.
necessariamente, findar-se numa
Contudo,
decisão judicial.
asseverar
A Jurisdição Constitucional
que
necessário
se
a
de
posição
Luhmann queda um tanto quanto
somente se legitimará a partir do
inadequada,
momento que seja apta a suscitar
procedimento que legitimará, mas
uma generalização que faça com
sim um procedimento adequado
que as decisões proferidas pelos
para
que
se
órgãos do Poder Judiciário sejam
Constituição
e
aceitas,
de
fundamentais, devendo o referido
serem a mais acertada aos casos
Tribunal Constitucional estar aberto
concretos
à realidade.
independentemente
ou
não.
Portanto,
a
legitimidade está vinculada a um procedimento numa
que
decisão,
Dentro
desemboque mesmo
pois
não
será
concretize os
desse
o
a
direitos
panorama,
Habermas (2003a e 2002) afiança
que,
que
a
legitimação
pelo
normalmente, não decorra esta de
procedimento, sem estar associado
um consenso, nem seja a mais justa,
a uma sintonia direta com o espaço
mas terá o condão, simplesmente,
público, é uma perfumaria jurídica,
de generalizar as expectativas.
no afã unicamente promover uma
nos
Nesse diapasão, Luhmann
ilusória
apresenta
sistema, em que as controvérsias
a
definição
de
estabilização
dentro
do
legitimidade como uma “disposição
são
generalizada para aceitar decisões
ordenamento normativo, resolvidas
de conteúdo ainda não definido,
pelo
dentro
lícito/ilícito.
de
certos
limites
de
tolerância” (1980, p. 30). Dessa Constitucional
forma,
exauridas
código
no
jurídico
próprio
binário
Habermas atua no sentido de o
Tribunal
compatibilizar a soberania popular
somente
torna-se
com os direitos fundamentais, pois
legítimo, bem como suas decisões,
além
quando
imprescindíveis
ao
processo
democrático,
os
direitos
pauta-se
procedimento
em
um
operacionalmente 43
de
serem
elementos
fundamentais
precisam
ficar
constitucionalidade
protegidos dos caprichos da maioria
(HABERMAS,
2003, p. 326).
legislativa.
Há uma abertura discursiva
A atuação que legitima o
na
Jurisdição
Constitucional
Tribunal Constitucional é aquela
buscando a construção racional das
voltada à proteção dos direitos
decisões
constitucionais
fundamentais.
constitucionalidade, que se dará por
Assim, “em face de um procedimento
meio da comunicação, através do
como
legitimamente
debate. Dessa forma, o STF torna-se
reconhecido, ainda se pode fazer
um espaço público por excelência
valer a diferença entre um resultado
para ocorrência desse debate, onde
“válido”
as
esse,
e
um
resultado
sobre
questões
controle
constitucionais
“racionalmente aceitável” (no âmbito
serem
institucional dado)” (HABERMAS,
edificação
2002, p. 107).
coadunam com a realidade.
A
força
legitima
de
promovem decisões
ao a que
a
No que tange à defesa dos
Jurisdição Constitucional sustenta-
direitos fundamentais, é no Tribunal
se
Constitucional onde esses direitos,
no
que
discutidas
de
estabelecimento
de
procedimentos interligados a uma
dada
comunicação
para
encontram um espaço adequado ao
pública,
amplo debate, em sede de controle
constituir
com
uma
índole
opinião
fundando uma política deliberativa.
examinar
controvertidos contexto
os
dos
comunicativos procedimentais
por
no
de
condições processo
do
controle
de
garantir
legislativo
o e
devido os
processo direitos
de
fundamentais, com fundamento no
Tal
desígnio de que o constitucionalismo
compreensão procedimentalista da
e a democracia não são contrários,
Constituição imprime uma virada
mas sim ao agirem em conjunto
teórico-democrática ao problema da
promovem a integral concretização
legitimidade
dos direitos fundamentais.
legislação
do
meio
constitucionalidade, tem a obrigação
pressupostos e
fundamentalidade,
Assim, a Jurisdição Constitucional,
conteúdos
especialmente
sua
de controle de constitucionalidade.
[...] o Tribunal Constitucional precisa
a
democrático.
de
controle
de
44
Os
órgãos
judiciais
elevado grau de criatividade que lhe
encarregados de velar pelo respeito
concedida pelo Poder constituinte
à
Originário.
constituição,
especialmente
Tribunal
o
Constitucional
Portanto,
pode-se
afiançar
desempenham um papel importante
que, hodiernamente, a Jurisdição
na obtenção e manutenção do
Constitucional brasileira alberga um
consenso,
arquétipo
à
medida
que
lhes
procedimental
que
competi decidir em termos jurídicos
apresenta alternativas e condições,
sobre opções políticas que lhes são
nas quais possibilitam, de forma
submetidas, e que lhes podem ter
fortemente aberta, a ingerência de
sido
uma
deliberadamente
deixadas
multiplicidade
de
sujeitos,
pelas instâncias políticas, que não
interesses, assuntos e pontos de
conseguiram obter o consenso e a
vista
autoridade necessária para mantê-
constitucional.
lo. (HABERMAS, 2005, 102). Apesar
A
Habermas
do
abertura
processo
comunicacional
ter
para o exterior faz-se necessária em
legitimidade
todo e qualquer sistema, com o
procedimentalista quanto à atuação
intuito de mantê-los vivos, e em
do
constante evolução, conservando-os
adotado
de
dentro
uma
Tribunal
Constitucional,
ele
admite que, para que este não se
em
torne
necessidades e ocorrências do meio.
um
reduto
autoritário
e
conformidade
Assim,
arbitrário de poder, é necessário
a
com
fresta
as
que
utilizar-se da lição de Peter Häberle
desabrolha no sistema constitucional
da
aos
por meio da atividade de Jurisdição
Constituição”.
Constitucional à interpretação de
“Sociedade
Interpretes
da
Afirmando
que,
Aberta
forma,
novas necessidades da realidade
havendo a possibilidade da abertura
torna-o um concretizador impar do
do
Texto Constitucional.
Tribunal
influxos
de
dessa
Constitucional outros
redutos
aos da
sociedade donde se extrairá a
3.2
realidade
tornando-se
Fundamentais
possível que se coloque um fim a
Constitucional
presumida falta de legitimidade do
A dessimbolização da Constituição
STF, vez que é suprida com o
Federal de 1988
social,
45
A
defesa
dos pela
Direitos Corte Brasileira:
urnas, advém da relevantíssima Diante do quadro que se afigura
o
atual
estágio
função que tal Tribunal galgou, com
do
passados mais de vinte e quatro
constitucionalismo contemporâneo,
anos,
donde se encontra na era dos
do esplêndido conto de fadas que se
direitos fundamentais sob o fulcro de
encontrava o Texto Constitucional.
um princípio-matriz (dignidade da
de
acordar
Destarte,
o
pessoa humana), tomando o lugar
Constitucional
do período em que se sustentava
possui legitimidade principalmente
com maior primazia a separação dos
por sua função contramajoritária,
poderes. Eis que, velar por sua
com o fito de proteger os direitos
guarda e supremacia é velar pela
fundamentais, bem como, a própria
própria vivificação da concretização
ordem jurídica Constitucional.
dos direitos fundamentais, retirandoos,
por
conseguinte,
simbolismo,
as
do
é
Tribunal
democrático
e
Nesse ínterim, considerando
mero
que o próprio Texto Constitucional
elucubrações
seria o resultado da reunião de
incrustadas no bojo constitucional.
forças,
interesses
e
bens
Nesse mesmo cotejo, frente
contraditórios, ou seja, – segundo o
às mazelas da realidade sócio-
entendimento de Niklas Luhmann –,
política-jurídica brasileira, o STF
um complexo mecanismo em que há
começou a não só albergar as
o acoplamento estrutural entre a
temáticas
de
política e o direito, em que se
constitucionalidade em suas pautas,
favorece a troca de conhecimento
foi além! Ora, o STF como um
entre os sistemas, atuando como um
Tribunal Constitucional é órgão que
mecanismo
tem legitimidade, para completar a
recíproca
pretensão negativa do legislador
favoreceria a abertura cognitiva do
constituinte na defesa dos direitos
sistema jurídico ao seu ambiente,
constitucionais
fundamentais,
promoveria a captação de influxos
minorias,
da realidade e, consequentemente,
do
principalmente dotando-se
controle
de de
uma
especial
de entre
interferência eles,
concretizando
legitimidade democrática.
o
STF
o
Texto
forma,
assevera
Constitucional.
Legitimidade esta que, apesar
Dessa
de não derivar diretamente das
Luhmann 46
que
é
através
da
Constituição que se estabelece as
um juízo permeado de realidade,
zonas de contato entre os sistemas
atendo-se
jurídico e o político. Instala-se uma
possibilidades e vicissitudes, para
recíproca irritabilidade entre esses
que promova a concretude de seu
dois
texto, dessimbolizando-a.
subsistemas
Desencadeando-se
sociais.
as
às
múltiplas
maiores
possibilidades do sistema jurídico registrar decisões políticas em forma
Considerações finais
jurídica, além de corroborar para que a política utilize-se do direito para concretizar
seus
Sob a nova perspectiva que
objetivos
se
(LUHMANN, 2002, p. 539-541).
vislumbra
especialmente
comum a ambos os sistemas, e o
necessidades
Tribunal,
fundamentais
a
visão
Estado
Constitucional, qual seja, voltado
A rigor, Constituição seria
segundo
o
de
às dos e
reais direitos
aos
valores
e
Luhmann, seria o centro do sistema
princípios
jurídico
os
comprometeu, promove uma total
por
reviravolta também na atividade
interno,
subsistemas se
reduto
que
acoplariam,
ocasião de suas decisões.
realizada
Portanto, compete ao STF,
que
pelo
especialmente
o
Estado
Poder a
se
Judiciário,
desempenhada
por se situar no centro dessas trocas
pelo STF, em sede de Jurisdição
de informações e no cerne decisório
Constitucional.
da Jurisdição Constitucional, efetivar
Uma
Jurisdição
a Constituição, valendo-se, também,
Constitucional
de tal acoplamento estrutural entre
legítima é aquela que, além de estar
os sistemas. Logo, por encontrar-se
voltada para a concretização dos
numa posição ambivalente garante o
direitos fundamentais e seguindo os
pleno funcionamento dos “códigos
fins que o Texto Constitucional lhe
da política e do direito”, com suas
relegou, realiza um diálogo com a
influências mútuas nos sistemas.
realidade no afã de acompanhar as
A Jurisdição Constitucional,
democraticamente
constantes mutações da sociedade
neste Estado Constitucional que se
moderna.
afigura, deve desempenhar uma interpretação da Constituição com 47
Tendo em vista que, no atual estágio
que
se
encontra
luhmanniano, que não faz a devida
o
composição entre os ambientes dos
constitucionalismo
brasileiro
sistemas político e jurídico, e torna
(neoconstitucionalismo),
edificado
esta
Jurisdição
sob uma sociedade em crescente
simples
grau de complexificação, que por
procedimento.
sua atividade jurisdicional girar em
legitimada
venerar
de
pelo um
Para tanto, faz-se necessário
função dos direitos fundamentais, a
adequar
simples supressão da insegurança
Jurisdição Constitucional com os
jurídica
plena
reais
mera
mantendo-se um diálogo contínuo
não
gerará
a
procedimento
anseios
da
democráticos,
realização
destes.
formalidade
do
procedimento
é
com a realidade social, para que o
insuficiente
para
concretizar
as
Tribunal Constitucional Brasileiro se
dos
transforme no guardião maior da
necessidades
A
o
essenciais
jurisdicionados. Não Jurisdição
basta,
Carta assim,
Constitucional
a
Constitucional
concretizando
estar
os
de
1988, direitos
fundamentais constantes de seu
pautada em um procedimentalismo
Texto.
formalista, segundo o entendimento
48
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51
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52
A QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL BRITO, Déborah Cristiane Domingues de. Docente do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. POZZOBON, Lívia Pincerato. Discente do 6º período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. SILVA, Bruno Henrique Procópio. Discente do 6º período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO O presente artigo científico tem como finalidade demonstrar objetivamente a impossibilidade de se quantificar as indenizações referentes a danos morais, constitucionalmente previstos no artigo 5º, incisos V e X, da Constituição Federal de 1988. Devido à complexidade de ser estabelecido o quantum indenizatório nas ações que versam sobre referidas indenizações, muito se discute acerca de um possível tabelamento de valores, apresentado, inclusive, pelo Projeto de Lei nº 334/2008 do Senado Federal, de autoria do Senador Valter Pereira. No decorrer do presente trabalho, serão apresentados os fatores que impossibilitam que o dano moral seja quantificado, sendo que, para tanto, foram utilizados os métodos dialético e comparativo, e o tipo de pesquisa não empírica, mais precisamente a bibliográfica.
ABSTRACT The present article has as its aims to demonstrate objectively the impossibility to quantify the compensations for moral damages, constitutionally contemplated in article 5º, line V and X, of the 1988 Federal Constitution. Due to the complexity of establishing the quantum indemnity concerning this kind of compensation, much has been discussed about the scale of value, also presented by the Draft Law nº 334/2008 of the Federal Senate, by Senator Valter Pereira. During this present work, it will be shown the factors that made it impossible to quantify the moral damages, so that, it were used dialectic and
53
comparative methods, and the kind of non empirical research more precisely the bibliographic one.
Palavras-chave: Dano moral. Quantificação. Impossibilidade. Keywords: Moral damage. Quantify. Impossibility. 54
(...)
Introdução
X
-
são
invioláveis
a
se
intimidade, a vida privada, a honra e
discutiu acerca da indenizabilidade e
a imagem das pessoas, assegurado
da cumulabilidade do dano moral, ou
o direito a indenização pelo dano
seja, quando este seria devido e se
material ou moral decorrente de sua
poderia ser pleiteado juntamente
violação;
com os danos de natureza material.
REPÚBLICA
Porém, atualmente estas discussões
BRASIL, 1988).
Durante
muito
tempo
(CONSTITUIÇÃO
Desta
já se encontram pacificadas, o que
FEDERATIVA
forma,
DA DO
vislumbra-se
faz vir à tona uma nova discussão,
que o direito ao recebimento de
acerca da quantificação do dano
indenização
moral.
morais é, inclusive, uma garantia
referente
a
danos
jurídico
constitucional. Por outro lado, com
nacional prevê a possibilidade de
relação à cumulabilidade do dano
indenização relativa a danos morais
moral, pode-se citar, por exemplo, a
em vários de seus dispositivos.
Súmula 37 do Superior Tribunal de
Apenas a título de exemplo cita-se
Justiça, que prevê: “Indenizações -
abaixo o artigo 5º da Constituição
Danos - Material e Moral - Mesmo
Federal, em seus incisos V e X:
Fato – Cumulação. São cumuláveis
O
ordenamento
Art. 5º Todos são iguais
as indenizações por dano material e
perante a lei, sem distinção de
dano moral oriundos do mesmo
qualquer
fato.” (Superior Tribunal de Justiça,
natureza,
garantindo-se
12/03/1992, DJ 17/03/1992).
aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
Entretanto, a quantificação do
do direito à vida, à liberdade, à
dano moral não encontra qualquer
igualdade,
previsão
à
segurança
e
à
legal,
devido
à
propriedade, nos termos seguintes:
complexidade do tema. Diante dessa
(...)
situação, foi apresentado no Senado V - é assegurado o direito de
Federal o Projeto de Lei nº 334/2008,
resposta, proporcional ao agravo,
pelo Senador Valter Pereira, que
além da indenização por dano
prevê
material, moral ou à imagem;
indenizações por danos morais, de
55
um
tabelamento
das
acordo com a natureza do fato
atentado à reputação da vítima, à
gerador.
sua autoridade legítima, ao seu
O presente estudo versará,
pudor,
à
sua
segurança
e
então, sobre a impossibilidade de se
tranquilidade, ao seu amor próprio
quantificar o dano moral, ante as
estético,
diferenças de cada caso concreto,
inteligência, a suas afeições, etc.
mesmo àqueles oriundos de um
(SAVATIER,1989 apud PEREIRA,
mesmo tipo de fato gerador.
1999, p. 54).
à
Ainda, 1. O conceito de dano moral e seus
integridade
para
o
de
sua
Professor
Yussef Said Cahali, dano moral é:
fatos geradores
(...) a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor
O que configura e o que não
precípuo na vida do homem e que
configura o dano moral? Na falta de
são a paz, a tranquilidade de
critérios objetivos, essa questão
espírito, a liberdade individual, a
vem-se tornando tormentosa na
integridade individual, a integridade
doutrina e na jurisprudência, levando
física, a honra e os demais sagrados
o
de
afetos, classificando-se desse modo,
perplexidade. (CAVALIERI, 1996, p.
em dano que afeta a parte social do
76.)
patrimônio moral (honra, reputação,
julgador
a
situação
De acordo com a doutrina e a jurisprudência
dominante,
etc.) e dano que molesta a parte
dano
afetiva do patrimônio moral (dor,
moral é todo aquele que atinge de
tristeza, saudade, etc.), dano moral
forma efetiva “bens de natureza não
que provoca direta ou indiretamente
patrimonial
dano
do
indivíduo”
patrimonial
(cicatriz
(PARIZATTO, 1998, p.4.). Em outras
deformante, etc.) e dano moral puro
palavras, os danos que não atingem
(dor, tristeza, etc.). (CAHALI, 1998,
o patrimônio material do indivíduo,
p. 17).
ou seja, os extrapatrimoniais são
Diferentemente do dano de
considerados de natureza moral.
natureza material, que é líquido e
Para Savatier, dano moral é:
certo, visto que foi atingido um bem
(...)
patrimonial
qualquer
sofrimento
que
possuía
valor
humano que não é causado por uma
determinado, o dano moral não
perda pecuniária, e abrange todo
possui esta liquidez. Isto porque não 56
há como se determinar o valor de
suficiente para não provocar apenas
uma
um mero aborrecimento, mas sim um
vida,
de
uma
imagem
maculada, ou mesmo de uma saúde
efetivo abalo psicológico.
psicológica atingida por determinado
Nessa linha de princípio:
ato ilícito.
(...) só deve ser reputado
Todavia,
mesmo
não
se
como dano moral a dor, vexame,
originando de lesão à bem material,
sofrimento
ou
a reparação por dano moral ocorre
fugindo
normalidade,
em moeda, visto que, via de regra,
intensamente
não há como se recuperar o bem
psicológico do indivíduo, causando-
imaterial atingido. Desta forma, a
lhe aflições, angústia e desequilíbrio
indenização
de
em seu bem-estar. Mero dissabor,
reparação, buscando amenizar os
aborrecimento, mágoa, irritação ou
resultados danosos.
sensibilidade exacerbada estão fora
toma
a
forma
Muito se discute acerca da
à
humilhação
no
que,
interfira
comportamento
da órbita do dano moral, porquanto,
natureza da indenização referente a
além
de
fazerem
danos morais, ou seja, se esta deve
normalidade do nosso dia-a-dia, no
possuir caráter compensatório para
trabalho, no trânsito, entre os amigos
a vítima do dano ou caráter punitivo
e até no ambiente familiar, tais
para o agente do dano.
situações
não
são
parte
intensas
da
e
duradouras a ponto de romper o 1.1 Fatos geradores de dano moral
equilíbrio psicológico do indivíduo. (CAVALIERI FILHO, 1996, p. 76.)
Como já citado, o dano moral
Desta forma, necessário se
é aquele que atinge algum bem
faz que, ao analisar a necessidade
imaterial
podendo
ou não de reparação por danos
afetar a parte social ou a parte
morais, seja identificado se o fato
afetiva do patrimônio moral, bem
gerador do alegado dano teve o
como pode provocar apenas o dano
condão de provocar efetivo prejuízo
moral puro como também dano
moral ao indivíduo, não sendo
material decorrente de dano moral.
indenizáveis os atos que fazem parte
do
indivíduo,
Todavia, para que o dano moral
possa
ensejar
da normalidade, gerando apenas um
o
mero aborrecimento.
ressarcimento, ele deve ser grave o 57
Portanto, pode-se afirmar que
supracitado instituto: “Aquele que,
o dano moral derivar tanto de uma
por ação ou omissão voluntária,
ofensa moral pura, quanto de uma
negligência ou imprudência, violar
ofensa ao patrimônio material que
direito, ou causar prejuízo a outrem,
possa posteriormente afetar a esfera
fica obrigado a reparar o dano”. Após a entrada em vigor do
moral. Ainda, que tais danos podem afetar
diversas
modalidades
Código Civil de 2002 a situação foi
do
patrimônio imaterial do indivíduo e
modificada.
que, para que seja passível de
necessário se faz que, para ensejar
indenização,
a responsabilização civil do agente
deve
efetivamente
A
partir
de
então,
causador de dano, este viole direito
provocar abalo moral no indivíduo.
alheio
e
lhe
cause
prejuízo,
conforme estabelece o artigo 186 do
2. Responsabilidade Civil
referido código: “Aquele que, por A possibilidade de reparação
ação
ou
omissão
voluntária,
de danos, sejam eles materiais ou
negligência ou imprudência, violar
morais, depende da existência de
direito e causar dano a outrem, ainda
um ato ilícito. Em outras palavras,
que exclusivamente moral, comete
para que um indivíduo faça jus ao
ato ilícito”.
qualquer
Desta forma, observa-se que,
indenização, um agente deve ter
anteriormente, a ocorrência de uma
cometido contra ele algum ato ilícito.
das situações já caracterizava a
Anteriormente,
responsabilização, ao passo que
recebimento
de
tais
atos
eram
previstos no artigo 159, do Código
atualmente
Civil
que,
ocorrência de ambas as situações,
atualmente, estão previstos no artigo
tanto a violação de direito alheio
186, do Código Civil de 2002.
quanto o efetivo prejuízo.
de
1916,
enquanto
Outro
No período em que vigorava o
é
necessária
ponto
a
importante
Código Civil de 1916, para que
inserido com a nova redação é o fato
houvesse a responsabilização civil
de que a responsabilização ocorre
do agente causador de dano, era
mesmo que o dano provocado seja
necessário que este violasse direito
apenas de natureza moral, mesmo
alheio ou lhe causasse prejuízo. Esta
não refletindo de qualquer forma no
era a redação do artigo 159, do
patrimônio material do indivíduo. 58
2.1 Responsabilidade objetiva e
a existência de contrato, bem como
subjetiva
as situações previstas nos incisos I a V do artigo 932, bem como a
Estão previstas no Código
responsabilização
por
atos
Civil de 2002 duas modalidades de
praticados por terceiros ali referidos,
responsabilidade civil, quais sejam, a
no artigo 933, ambos do Código Civil
objetiva e a subjetiva. Possuem,
de 2002:Art. 932. São também
entre si, uma grande diferença, que
responsáveis pela reparação civil:
será explicada a seguir.
I - os pais, pelos filhos
A obrigação de indenizar está prevista
no
artigo
927
e
menores que estiverem sob sua
seu
autoridade e em sua companhia;
parágrafo único, do Código Civil, no
II - o tutor e o curador, pelos
qual pode-se observar a diferença
pupilos
básica entre a responsabilidade civil
acharem nas mesmas condições;
objetiva e a subjetiva:
e
III
curatelados,
-
o
que
empregador
se
ou
Art. 927. Aquele que, por ato
comitente, por seus empregados,
ilícito (arts. 186 e 187), causar dano
serviçais e prepostos, no exercício
a outrem, fica obrigado a repará-lo.
do trabalho que lhes competir, ou em
Parágrafo obrigação
de
único. reparar
Haverá o
razão dele;
dano,
IV - os donos de hotéis,
independentemente de culpa, nos
hospedarias,
casos especificados em lei, ou
estabelecimentos onde se albergue
quando a atividade normalmente
por dinheiro, mesmo para fins de
desenvolvida pelo autor do dano
educação, pelos seus hóspedes,
implicar, por sua natureza, risco para
moradores e educandos;
os direitos de outrem.
casas
ou
V - os que gratuitamente
Ao interpretar o parágrafo
houverem participado nos produtos
único, observa-se que nos casos
do crime, até a concorrente quantia.
previstos em lei, a reparação deverá
Art.
933.
As
pessoas
ocorrer independentemente de culpa
indicadas nos incisos I a V do artigo
do agente. Esta é a responsabilidade
antecedente, ainda que não haja
civil objetiva, decorrente de força de
culpa de sua parte, responderão
lei. Além disso, outra situação que
pelos atos praticados pelos terceiros
enseja a responsabilidade objetiva é
ali referidos. 59
Desta
forma,
pode-se
parágrafo único do artigo 927 já
conceituar a responsabilidade civil
citado acima.
objetiva como aquela na qual a
Importante salientar que a
reparação é obrigatória apenas com
responsabilidade
a comprovação da existência do fato,
suplantou, nem derrogou a teoria
não sendo necessário demonstrar
subjetiva, a qual continua a ser
que tenha ocorrido culpa ou dolo por
aplicada, quando a culpa do infrator
parte do agente causador do dano.
restar
Por
outro
lado,
a
objetiva
demonstrada.
aplicação
da
não
Para
a
responsabilidade
responsabilidade civil subjetiva é
objetiva, necessária a presença de
aquela na qual se faz necessário
alguns requisitos, (...). É aplicável
demonstrar a existência de culpa ou
quando a exigência da culpa se
dolo por parte do agente causador
configura
do dano, pois não possui qualquer
comprovação
obrigação advinda de lei ou de
inviabilizando a indenização pelo
contrato.
dano sofrido. A teoria subjetiva tem
Em
outras
palavras,
a
aplicação
responsabilidade subjetiva ocorre
em
ônus
de
pela
genérica,
difícil vítima,
enquanto
a
objetiva específica. [1]
quando o dever de indenizar surge
Desta forma, conclui-se que a
em razão do comportamento do
simples comprovação da existência
sujeito que causa danos a terceiros,
do fato, quando não houver previsão
por dolo ou culpa.
em lei ou contrato, não tem o condão
Para um melhor entendimento
de gerar, por si só, o direito à
acerca da existência de ambas as
indenização relativa a danos morais.
situações, podemos citar trecho de
Nestes casos, em que ocorre a
decisão do Tribunal Regional do
responsabilidade
Trabalho da 15ª Região:
necessário se faz comprovar, ao
civil
subjetiva,
No Brasil, a responsabilidade
menos, a culpa do agente. Por outro
objetiva era considerada exceção à
lado, quando há previsão em lei ou
regra da teoria subjetiva, tendo
contrato,
aplicação
apenas
casos
responsabilidade civil objetiva, a
previstos
em
especiais.
simples demonstração da existência
Entretanto, com o advento do Código
do fato e do nexo de causalidade
leis
nos
Civil de 2002, foi adotada no 60
ou
seja,
casos
de
entre fato e dano já acarretam o
danos sofridos pelo indivíduo que
direito à indenização.
suportou os danos. Neste sistema, estipula-se
3.
Critérios
para
fixação
um
valor
para
a
indenização pelo qual a vítima do
do quantum indenizatório
dano
se
sinta
compensada,
independentemente do agente se Antes
de
adentrar-se
sentir efetivamente punido.
especificamente nos critérios para
Assentadas essas premissas,
fixação do quantum indenizatório
passa-se a abordar os aspectos que
adotados no ordenamento jurídico
influenciam na fixação do quantum
pátrio, devemos fazer uma breve
indenizatório
consideração sobre os possíveis
jurídico brasileiro no tocante aos
sistemas
danos morais.
de
fixação
de
danos
morais, que podem ser o de caráter punitivo
e
o
de
No
caráter
no
ordenamento
ordenamento
jurídico
brasileiro adota-se o sistema de
compensatório.
danos
morais
de
caráter
O sistema de fixação de
compensatório. Todavia, visualiza-
danos de caráter punitivo é aquele
se alguns aspectos que o tornam um
cujo
tanto mais complexo do que o
principal
indenização
objetivo
é
servir
da como
sistema
penalidade ao agente, de modo que
simples.
compensatório
puro
e
este se sinta impelido a não mais
Ao serem analisadas algumas
praticar atos que possam ensejar
decisões já proferidas, em casos
indenizações. É o sistema adotado
envolvendo indenização por danos
nos Estados Unidos da América,
morais, pode-se observar que muito
denominado “punitive damage” ou
se fala em estabelecer um parâmetro
“exemplary
justo
damage”,
conhecido
para
pelas indenizações milionárias às
indenizado,
quais
consideração
são
condenadas
grandes
empresas, por exemplo.
de
compensatório
montante levando-se alguns
a
ser em
fatores
específicos.
Por outro lado, o sistema de fixação
o
danos
de
é
aquele
Entre tais fatores, pode-se
caráter
citar como um dos critérios para a
cuja
quantificação,
finalidade está na compensação dos
a
análise
das
circunstâncias do caso, a gravidade 61
do dano e a sua repercussão, a
4. Projeto de lei nº 334/08
situação econômica do lesado e do lesante, o grau de culpa do agente, o
Como último tópico deste
sofrimento da vítima, a extensão do
estudo, analisa-se o conteúdo do
dano, entre outros.
Projeto de Lei 334/08 que prevê a
Quando da fixação de valores
indenização do dano moral fixando
em uma sentença, o juiz deve
valores para serem utilizados como
atentar-se, ainda, aos princípios da
base e teto. Porém, a referida
equidade, da dignidade da pessoa
quantificação está longe de ser
humana, da razoabilidade, entre
considerada eficaz. Não há como
outros.
considerarmos
O
ordenamento
jurídico
que
bens
que
nacional não estabelece piso ou teto
possuem valores diferentes sejam
para os valores, demonstrando o
quantificados adotando-se o mesmo
caráter subjetivo que a indenização
parâmetro.
por danos morais possui.
A real intenção do legislador
Desta forma, apesar de o dano
moral
caráter
foi de delimitar as possibilidades de
ordenamento
valoração para ações ou omissões
jurídico brasileiro, tem-se que, para
que ofendam o patrimônio de uma
chegar a tal compensação, não
pessoa física ou jurídica e dos entes
basta analisar apenas questões que
políticos,
envolvam a vítima, mas também
disparidades e potenciais injustiças
devem ser analisadas as condições
nas fixações de valores por parte do
do agente.
Poder Judiciário.
compensatório
possuir
ao elaborar o referido Projeto de Lei
no
O valor estabelecido deve ser razoável,
sendo
suficiente
Um
para
impedindo
assim
bom
exemplo
da
do
Projeto
em
qualidade
compensar o sofrimento da vítima,
determinados aspectos é o que pode
bem
a
ser observado em seu artigo 3º que
reprovabilidade da conduta para o
nada mais faz do que transformar em
agente causador do dano.
texto legal os critérios já adotados
como
demonstrar
para a quantificação: Art. hipótese tempestiva 62
3º de
Ressalvada reparação
e
da
natural
suficiente,
a
I – morte: de R$ 41.500,00
indenização a que se refere o art. 1º tem
caráter
exclusivamente
(quarenta e um mil reais) a R$
compensatório e a sua fixação
249.000,00 (duzentos e quarenta e
deverá considerar:
nove mil);
I – o bem jurídico ofendido;
II – lesão corporal: de R$
II – a posição socioeconômica
4.150,00
da vítima;
(quatro
mil,
cento
e
cinquenta reais) a R$ 124.500,00
III – a repercussão social e
(cento e vinte e quatro mil e
pessoal do dano; de
III – ofensa à liberdade: de R$
dano,
8.300,00 (oito mil e trezentos reais) a
quando a vítima for pessoa física, e
R$ 124.500,00 (cento e vinte e
de
quatro mil e quinhentos reais);
IV superação
–
quinhentos reais);
a
possibilidade
psicológica
recomposição
do
da
imagem
econômica ou comercial, quando
IV – ofensa à honra:
pessoa jurídica;
a) por abalo de crédito: de R$
V – a extensão da ofensa e a
8.300,00 (oito mil e trezentos reais) a
duração dos seus efeitos;
R$ 83.000,00 (oitenta e três mil
VI – o potencial inibitório do
reais); b) de outras espécies: de R$
valor estabelecido. Parágrafo
único.
Na
8.300,00 (oito mil e trezentos reais) a
apreciação da demanda, o juiz
R$ 124.500,00 (cento e vinte e
poderá considerar outros elementos
quatro mil e quinhentos reais);
que determinem a gravidade da lesão
ao
patrimônio
ideal
V
do
–
descumprimento
de
contrato: de R$ 4.150,00 (quatro mil,
ofendido.
cento e cinquenta reais) a R$
Entretanto, no referido projeto
83.000,00 (oitenta e três mil reais).
existe um grande defeito, que acaba
A proposta inserta do artigo
por prejudicar o Projeto como um
transcrito é inviável. Isto porque,
todo, que é o seu artigo 6º o qual se
mesmo se estabelecendo grandes
transcreve um trecho:
intervalos para a fixação, isto não
Art. 6º O valor da indenização
evitará que sejam arbitrados valores
por dano moral será fixado de acordo
que
com os seguintes parâmetros, nos
incompatíveis.
casos de: 63
possam
ser
considerados
Pode-se exemplificar com a
em
conta
os
critérios
de
seguinte situação: caso ocorra um
razoabilidade, motivo pelo qual a
acidente de trânsito que cause a
criação de tal lei é desnecessária,
morte do pai do condutor que estava
pois não representaria qualquer
como passageiro, mesmo levando
evolução com relação ao instituto
em
dos danos morais.
consideração
o
grau
de
proximidade e a extensão do dano sofrido pela vítima, nada impedirá que o juiz fixe a indenização no valor
Conclusão
de R$ 41.500,00; por outro lado, caso no mesmo acidente não ocorra
Após
esta
breve
análise
nenhuma morte, mas o próprio
acerca
condutor sofra uma lesão corporal
importantes
grave, como a perda de um membro,
temática do dano moral, pode-se
da mesma forma nada impede que o
perceber que seria uma tarefa
juiz fixe a indenização no valor de R$
bastante difícil retirar a quantificação
124.500,00.
do campo subjetivo, passando-a
Diante desta situação pode-
tabelamento
aspectos que
mais
envolvem
a
para o campo objetivo.
se observar que mesmo havendo o pretendido
dos
Observa-se
haveria
que,
no
ordenamento jurídico pátrio, tais
disparidade na fixação. Assim, nota-
indenizações
se que realmente possui importância
compensatório, mas sem deixar de
são os critérios de razoabilidade e
lado uma análise das circunstâncias
não
previamente
que envolvem o caso concreto, tais
tabelados. Caso sejam adotados os
como a situação econômica da
referidos
vítima e do ofensor, devendo o valor
os
valores
valores
padronizados,
possuem
caráter
estes continuariam sendo inúteis se
arbitrado
não fossem observados os atuais
compensação para a vítima quanto
critérios de quantificação.
uma
Portanto, o principal objetivo
representar
forma
de
tanto
demonstrar
a
a
reprovabilidade do ato para o agente
do referido projeto em análise é
causador.
ineficaz, visto que, havendo ou não
Portanto, estabelecer valores
tabelamento de valores, o dano
fixos como base e teto para a
moral não pode ser fixado sem levar 64
quantificação dos danos morais não seria uma forma eficaz de garantir uma melhor aplicação de tal instituto. O dano moral continuará sendo um tema complexo e, mesmo com parâmetros fixos, continuará sendo arbitrado com grande carga de interpretação por parte do juiz, motivo pelo qual o tabelamento de valores torna-se inviável.
65
Referências BRASIL. Código Civil. Brasília, DF: Senado. 2002. BRASIL. Constituição 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado. 1988. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 37. In:______. Diário da Justiça. Brasília: 17/03/1992. BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (15. Região). 3ª Turma. 5ª Câmara. Recurso Ordinário. Proc. nº 01612-2006-012-15-00-1. Relatora: Desembargadora Federal do Trabalho Gisela R. M. de Araújo e Moraes. CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Malheiros Editores, 1996. PARIZATTO, João Roberto. Dano moral. Belo Horizonte: Edipa. 1998. PEREIRA, Caio Mario da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1989. PEREIRA, Valter. Projeto de Lei nº 334/2008. Brasília, DF: Senado. 2008. [1] Recurso Ordinário, TRT 15ª Região, 3ª Turma, 5ª Câmara, Proc. nº 016122006-012-15-00-1, Relatora Desembargadora Federal do Trabalho Gisela R. M. de Araújo e Moraes
66
A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO EM FACE ÀS VÍTIMAS DE BALA PERDIDA. FILHO, Walter Francisco Sampaio – Docente do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. MESQUITA, Ana Maria Alves – Discente do 9º período do Curso de Direito da Unifev- Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO O trabalho visa estudar o fenômeno bala perdida e tem como pressuposto que este deva ser tratado como questão de ordem e segurança pública pelo Estado, o qual deve se fazer presente na responsabilização dos danos ocasionados às vítimas, tornando-se efetiva sua reparação. Justifica-se o tema, por tal problemática já fazer parte do cotidiano do cidadão brasileiro, devido à ineficiência estatal em conter a violência urbana instalada no país. O presente artigo tem por objetivo expor, por meio de pesquisa bibliográfica, a divergência jurisprudencial sobre uma questão tão polêmica, e propor através uma regulamentação do assunto.
Palavras-chave: Responsabilidade Civil do Estado. Segurança pública. Bala perdida. Omissão. 67
1. A responsabilidade civil do estado
Introdução Nos últimos anos, o Estado
A responsabilidade civil do
brasileiro tem sido considerado palco
Estado funda-se, resumidamente, na
de
episódios
imposição dada ao ente estatal de
desastrosos, geradores do aumento
ressarcir os prejuízos causados por
dos índices de violência urbana no
sua
país, em razão da omissão estatal
restabelecendo o equilíbrio rompido
em
pelo evento danoso.
infindáveis
fornecer
segurança
pública,
ação
ou
omissão
sendo esta dever do Estado e direito
Neste sentido, é importante
fundamental de todos os cidadãos
destacar no prescrito § 6º do artigo
brasileiros.
37 da Constituição de 1988, que
Tendo em vista a adoção pelo
dispõe: “as pessoas jurídicas de
ordenamento jurídico brasileiro da
direito público e as de direito privado
responsabilidade
prestadoras de serviços públicos
objetiva
estatal, da
responderão pelos danos que seus
pode-se
agentes, nessa qualidade, causarem
afirmar que o Estado tem o dever de
a terceiros, assegurado o direito de
ressarcir os danos ocasionados por
regresso contra o responsável nos
sua ação ou omissão a vítima de
casos de dolo ou culpa”.
atinente
ao
Constituição
artigo
37
Federal,
§6º
O instituto jurídico em questão
bala perdida, sendo desnecessária a trata
análise do elemento culpa. Deste
modo,
o
da
responsabilidade
civil
objetiva do Estado, a qual impõe,
presente
trabalho analisa casos específicos,
através
levando
os
obrigação de reparar o dano, sem
preceitos constitucionais, a matéria
estar atrelada à necessidade de se
de responsabilidade civil estatal e
comprovar a culpa, bastando a
pareceres jurisprudenciais, na busca
demonstração da ação ou omissão
da decisão mais equânime para
estatal, do dano e do nexo de
cada situação ilustrada.
causalidade entre eles.
em
consideração
de
norma
cogente,
a
Com isso, é válido ressaltar o entendimento da mestra Diniz (2002, p 540), que com muito saber leciona: “Funda-se 68
a
responsabilidade
estatal, portanto do princípio da
de Janeiro e de São Paulo, mas já
isonomia, logo, deve haver igual
está se alastrando para outras partes
repartição dos encargos públicos
do país.
entre os cidadãos [...]” Assim,
Estado
como bala perdida o projétil de arma
responsabilizar-se pelos atos lesivos
de fogo, que venha a atingir alguém,
a que de alguma forma der causa,
sem que se saiba de onde e por
pois além deste dever estar prescrito
quem ela tenha sido disparada,
no artigo 37 § 6º da Constituição, o
resultando em algum dano à saúde
ente estatal deve também levar em
ou vida da vítima.
consideração
cabe
No senso popular, entende-se
a
ao
aplicação
do
O
Instituto
Segurança
Rio
Janeiro
princípio da isonomia, que defende
Pública
que o dano não seja suportado só
(2010,
pelo indivíduo atingido, mas sim por
bala perdida como uma “[...] pessoa
toda
que não tinha nenhuma participação
a
coletividade
a
qual
é
beneficiária do serviço público.
do
de
p.3) define a vítima de
ou influência sobre o evento no qual houve disparo de arma de fogo,
2. O fenômeno bala perdida
sendo, no entanto, atingida por projétil e podendo vir a falecer ou
É
visível
o
aumento
não”.
da
violência urbana nos últimos anos no
Infelizmente tem-se tornado
Brasil, gerado por vários fatores,
recorrente a veiculação pela mídia
mas principalmente pela omissão do
de notícias que apontam vítimas
Poder Público em garantir os direitos
atingidas por bala perdida. O mesmo
básicos dos cidadãos previstos pela
pode ser observado em pesquisa
Constituição Federal.
divulgada
Uma das evidências desta violência
o
de
Segurança do Estado do Rio de Janeiro (2010, p. 6-11), o qual
Este
relatou que entre o período de
termo, ainda sem uma conceituação
janeiro a setembro de 2010, 108
precisa sociológica ou jurídica, já faz
pessoas foram atingidas por bala
parte do cotidiano de algumas
perdida, sendo dessas 12 vítimas
pessoas, notadamente em algumas
fatais.
“bala
surgimento
Instituto
do
fenômeno
é
pelo
perdida”.
metrópoles, como as cidades do Rio 69
Este estudo demonstra que
Mas se eu não voltar não precisa
houve diminuição no índice em
chorar
relação a 2009, quando 193 vítimas
Porque levar uma bala perdida hoje
foram
baleadas.
Contudo,
em
em dia é normal
relação às vítimas fatais o índice
Bem mais comum do que morte
subiu, pois apenas oito morreram em
natural
2009.
Nem dá mais capa de jornal[...] Assim,
estes
números
Todo dia morrem dois ou três
revelam a fragilidade do Estado em
Eu só quero saber quando vai ser a
proporcionar
a
minha vez [...]
tranquilidade suficiente para uma
A maioria ainda nem percebeu:
vida segura e digna, de forma que
Vocês tão muito mais perdidos do
este
a
problema,
integridade
moral,
sociedade
não
afete
patrimonial
a
que eu.
e
Pra variar estamos em guerra
física dos cidadãos brasileiros.
Pra variar...
Com muita propriedade, o cantor e
compositor Gabriel
O
A referida canção demonstra
Pensador, em seu disco “Quebra
o medo e a incerteza que o cidadão
Cabeça”, lançado em 1997, retrata a
enfrenta ao sair de casa para
insegurança
em
trabalhar sem saber se voltará vivo
diversos trechos de sua canção, a
ao lar e, ainda, descreve a realidade
qual preconiza:
de pessoas inocentes que estão
da
sociedade,
apreensivas
em
viver
em
uma
[...] Porque eu tô indo pro
sociedade em que há ineficiência do
trabalho com medo da morte
Estado na prestação de serviços
Nessas horas eu queria ter
básicos inscritos na Carta Maior.
um carro-forte
Portanto, cabe ao Estado
Pra poder sair de casa de
assegurar a vida e proporcionar a
cabeça erguida
segurança a todo cidadão e, se
E não ser encontrado por uma bala
esses direitos forem violados, o
perdida [...]
Poder Público deverá assumir a
Por favor, meu amor, eu não quero
responsabilidade em reparar o dano
encontrar você morta se eu voltar
causado a pessoa atingida pela bala
pra casa vivo
perdida. 70
2.1 Análise de casos específicos
Dessa
forma,
há
a
responsabilidade objetiva, devendo Levando em consideração o
o
Estado
ressarcir
o
prejuízo
intuito do presente trabalho, serão
causado à vítima de bala perdida,
detalhados alguns aspectos desta
podendo a Administração Pública
questão controversa, na busca da
exercer o seu direito de regresso
uniformização
contra
jurisprudencial,
acerca dos casos de bala perdida, a
Nesta
forma harmônica. melhor
agente
público,
se
comprovado seu dolo ou culpa.
fim de que todos sejam decididos de
Para
o
situação,
há
indiscutivelmente a responsabilidade compreensão
objetiva do Estado, visto que o tiro
sobre o tema, analisam-se quatro
proveio da arma de um policial, não
situações hipotéticas: a) quando a
podendo ele se esquivar de sua
bala é oriunda da arma do policial b)
obrigação,
quando a bala proveio da arma do
observar na jurisprudência a seguir:
bandido ou não sabe se a bala
consoante
INDENIZAÇÃO
-
pode
AUTOR
adveio da arma do policial ou do
ATINGIDO
criminoso c) quando a bala é oriunda
DISPARADO
do confronto entre criminosos, sem a
MILITAR NO EXERCÍCIO DE SUAS
presença da polícia, em local de
FUNÇÕES - prova satisfatória dos
frequente conflagração armada, e; d)
fatos - conduta do agente público
quando não há nenhum confronto
concorreu de forma decisiva para o
que possa ter a ver com o evento,
fato danoso - responsabilidade do
não
Estado comprovada - culpa objetiva
sendo
possível
saber
a
procedência da bala.
POR
se
PROJÉTIL
POR
POLICIAL
- obrigação de indenizar - agentes
Inicialmente, deve-se analisar
públicos absolvidos na esfera penal
o primeiro caso, quando em um
militar - absolvição que não retira do
confronto entre bandidos e policiais,
Estado o dever de indenizar - esfera
uma bala oriunda da arma de um dos
penal
agentes
necessidade
públicos
comprovadamente inocente,
estando
atinge
um
terceiro
e
civil
independentes do
disparo
-
não
comprovada. (grifo nosso)[1]
configurado
Deste modo, no desempenho
visivelmente o nexo causal.
de suas funções cabe aos agentes públicos observar toda a diligência 71
possível,
para
evitar
eventos
perdida resultante do confronto, se
gerando
da arma do agente público ou do
consequências a pessoas inocentes
criminoso, também configurando a
que, ao invés de serem vítimas,
responsabilidade civil do Estado,
deveriam receber do Estado toda a
visto
proteção necessária para uma vida
penoso à vítima provar de qual arma
tranquila e segura.
adveio o projétil causador do dano.
desastrosos,
Partindo
para
é
demasiadamente
segundo
Se isso ocorresse, causaria
caso, quando em um confronto entre
grandes obstáculos à vítima em
policiais e bandidos a bala advinda
garantir o direito que lhe é inerente,
da arma de um dos criminosos
o qual fora ferido por uma agressão
atinge a um terceiro que nada tinha
injusta, necessitando esta de uma
a ver com aquela verdadeira batalha,
resposta imediata, pois, na maioria
resta
das vezes, não possui condições de
também
o
que,
configurada
à
responsabilidade do Estado. À
luz
do
prover as carências geradas pelo
princípio
acontecimento danoso.
constitucional da eficiência, pode-se
No caso em tela, o nexo
afirmar que a polícia deve atuar
causal está presente no confronto
dentro dos parâmetros legais e sem
em si, que contou com a participação
praticar excessos, evitando que na
dos criminosos e dos policiais, os
coibição
urbana
quais não cumpriram o seu dever, de
terceiros sejam alvejados em um
modo a controlar a ocorrência de
confronto com delinquentes.
balas perdidas e consequentemente
da
violência
Porém, embora agindo os
que terceiros inocentes não tenham
policiais com todo o zelo possível, mesmo
assim
o
Estado
a sua integridade física lesada.
será
Quanto a esta situação, os
responsabilizado em razão da teoria
Tribunais
adotado pelo artigo 37§ 6º da
controversas, alguns acreditam que
Constituição, já que tal preceito não
a vítima deve provar se a bala
impõe a comprovação de dolo ou
proveio da arma dos policiais ou dos
culpa.
bandidos, já outros entendem que Este mesmo entendimento
proferem
decisões
basta a vítima provar a ocorrência do
pode ser utilizado na situação de não
confronto.
se saber qual a origem da bala 72
Diante de tais divergências, o Supremo
Tribunal
posicionou
no
Ante a análise do acórdão
Federal
apresentado, pode-se afirmar que o
mais
entendimento da Suprema Corte
equânime ao priorizar a vítima,
encontra-se em conformidade com o
entendendo ser irrelevante a origem
defendido
da bala, não importando se partiu da
defende
arma
dos
causal quando a vítima provar a
criminosos, nos moldes da ementa
ocorrência do confronto entre os
abaixo:
policiais
dos
sentido
policiais
DECISÃO:
ou
RE,
a,
contra
neste
trabalho
que
estar configurado o nexo
e
dispensável
criminosos, provar
de
sendo que
a
acórdão do Tribunal de Justiça do
munição proveio da arma do agente
Estado do Rio de Janeiro, assim
público.
ementado
-
f.
215:
No que diz respeito ao terceiro
CIVIL.
caso, quando a bala provém do
TIROTEIO.
embate entre criminosos, em um
CONFRONTO ENTRE POLICIAIS E
local onde reiteradamente há uma
MELIANTES.
conflagração
"RESPONSABILIDADE ESTADO.
NEXO
INDENIZAÇÃO.
CAUSAL.
armada,
sem
a
DANOS
presença da polícia, em regra, não
MATERIAIS E MORAIS. Inteligência
haverá a responsabilidade civil do
dos artigos 5º e 37, § 6º, da
Estado, já que o dano sofrido pela
CRFB/88. A configuração do nexo de
vítima incidiu de fato de terceiro, sem
causalidade em caso de tiroteio
a participação do ente estatal.
entre policiais e meliantes atingindo
Contudo,
tal
entendimento
vítima inocente, não se exige prova
somente prevalece se comprovado
direta de projétil de arma do agente
que o Estado não tinha nenhum
público,
conhecimento
sendo
suficiente
a
daquele
evento
demonstração do embate entre eles,
danoso ou da probabilidade de
causa necessária dos danos injustos
acontecê-lo, pois se pelos agentes
perpetrados a terceiro, sem o qual o
públicos era previsível a ocorrência
fato
de
não
teria
ocorrido.
tal
confronto,
caberá
PROVIMENTO DO RECURSO. [...]
responsabilização estatal, em razão
Na linha dos precedentes, nego
de estar caracterizada sua omissão
seguimento
específica.
ao
recurso
extraordinário. […] [2] 73
Em relação a esta situação,
estar caracterizado o caso fortuito,
alguns Tribunais, decidiram a favor
excludente de responsabilidade.
da vítima que tem o seu direito ferido
Logo, no referido caso, não há
por uma bala perdida, em locais de
a configuração do nexo causal entre
frequente conflagração armada:
a lesão e a ação ou omissão estatal.
Administração
pública.
Afirmar que o Estado nesta situação
Segurança. Dever do Estado. Bala
é responsável é o mesmo que dizer
perdida.
que
Policiamento.
Omissão.
este
deve
sempre
ao
praticar
se
Culpa. Dano. Reparação. Incumbe
responsabilizar
ao Estado por dever constitucional
omissão
promover políticas que assegurem
entendimento
segurança ao cidadão. Constitui
doutrina e jurisprudência pátrias.
genérica,
uma
sendo
condenado
tal pela
omissão, a negligência do Estado em deixar de prover bairro periférico da segurança mínima necessária a
Conclusão
inibir atos de violência extrema, e, na medida em que, da omissão, resulta
Diante
dano, impõe-se a reparação. (grifo
exposto,
fica
evidente a responsabilidade objetiva
nosso) [3]
do Estado em reparar os danos
Assim, a polícia tendo o
causados às vítimas de bala perdida
conhecimento que em determinados
nos três primeiros casos, haja vista
locais ocorrem de forma corriqueira
ser o
confrontos entre facções rivais, estes
Estado
o
garantidor da
segurança pública e o cidadão
devem agir de forma preventiva para
sujeito de direitos prescritos na Lei
que os moradores destas áreas de
Maior.
risco não tenham a sua incolumidade
Dentre as várias formas de
violada.
preservar a segurança do cidadão e
Já em relação ao último caso,
promover a responsabilização do
quando não há nenhum confronto
Estado pela prática de atos lesivos,
que tenha a ver com evento danoso, sendo
do
impossível
saber
ressalta-se a promoção de políticas
a
públicas que busquem a paz social
procedência do projétil, não haverá a
dentro
responsabilidade do Estado, por
de
garantidor. 74
um
plano
jurídico
Ademais,
busca-se
a
Ainda,
busca-se
a
conscientização pelo Poder Público
uniformização
doutrinária
e
em melhorar a segurança pública,
jurisprudencial
acerca
da
através
em
problemática, a fim de que todos os
infraestrutura e qualificação dos
casos atinentes as vítimas de bala
agentes públicos, a fim de superar o
perdida sejam decididos de forma
caos presente na atual realidade
equivalente.
de
investimentos
brasileira.
Portanto, esse ressarcimento
Juridicamente, defende-se a
mostra–se necessário não só pelo
criação de normas que determinem
fato dessa reparação ser um direito
a
inerente ao cidadão lesado, como
responsabilização
do
Estado,
consoante os casos discriminados
também,
acima, como forma de facilitar o
injusta colocar o referido sujeito em
trabalho do Judiciário e de garantir o
uma situação a qual exige uma
atendimento
resposta imediata.
das
necessidades
imediatas do cidadão lesado.
75
devido
essa
agressão
Referências BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 5 de outubro de 1988. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 16 fev. 2012 DINIZ. Maria Helena. Direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil.16. ed. São Paulo: Atlas, 2002. O PENSADOR, Gabriel. Bala perdida. In: Gabriel O Pensador. QuebraCabeça. SONYBMG, 1997. Faixa 10. Disponível em: http://www.gabrielopensador.com.br/index1_flash.htm. Acesso em 22 mai. 2011 PROVENZA, Marcello Montillo; TEIXEIRA, Paulo Augusto Souza &OLIVEIRA, João Batista Porto. Relatório temático sobre a bala perdida. Rio de Janeiro: ISP, 2010.Disponível em:http://www.urutau.proderj.rj.gov.br/isp_imagens/Uploads/BalaPerdidaJanS et2010.pdf.Acesso em 24 mai. 2011 [1] BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação n. 734.130.5/9-00, da 2ª Câmara de Direito Público. Apelante: Fazenda do Estado de São Paulo e outros. Relator: José Luiz Germano, São Paulo, 04 de maio de 2010. Disponível em: http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=4476571. Acesso em: 13 fev. 2012. [2] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 467681 / RJ. Recorrente: Estado do Rio de Janeiro. Recorrido: Ernandes Mucciolo. Relator: Des. Sepúlveda Pertence, Brasília, 17 de março de 2006. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14782604/recursoextraordinario-re-467681-rj-stf. Acesso em: 13 fev. 2012 [3] BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia. Apelação Cível n. 00120070248868, da 1ª Câmara Especial. Apelante: Estado de Rondônia. Apelada: Inês Carvalho Santos. Relator: Juiz Daniel Ribeiro Lagos, Rondônia, 28 de janeiro 2009. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/6154117/apelacao-civel-rito-sumarioac-10000120070248868-ro-1000012007024886-8-tjro/inteiro-teor. Acesso em: 13 fev. 2012.
76
APLICABILIDADE DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE NA RESPONSABILIDADE CIVIL MARINOTO, Denise Nunes – Discente do 10º período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. CASALI, Éllen Cássia Giacomini – Docente do Curso de Direito da Unifev Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO A presente pesquisa estuda a Teoria da Perda de Uma Chance, visando enfatizar sua inserção na Responsabilidade Civil como forma idônea de indenização. Demonstra que a necessidade da indenização da chance se faz cada vez mais necessária porque grande número de indivíduos já sofreu privações de suas chances sérias e reais suportando prejuízos diversos por culpa alheia. Ademais, enfatiza que a indenização será prudente não se tratando de mera expectativa, ou seja, se tiver probabilidades significantes de concretização, constatando-se sua valoração por meio de expressões matemáticas, probabilidades e porcentagens até a sua perfeita adequação. Igualmente, mostra que apesar do direito positivista influenciar os juristas, já há aceitação da chance em relevante número de julgados. O método utilizado foi o raciocínio indutivo, a necessidade criou a teoria, e a pesquisa feita foi a não empírica, baseada em trabalhos bibliográficos, artigos e internet. O trabalho enfatiza a insuficiência do direito quanto às formas de responsabilidade, trazendo a solução para a chance perdida, que ainda não tem proteção na lei. Concluindo-se, que a teoria da perda de uma chance deve ser implantada na legislação brasileira definitivamente, pois atende à função social de norma defendendo direitos sociais e fundamentais dos indivíduos.
Palavras-chave: Perda da chance séria e real. Probabilidade de conquista indenizável. 77
Em seu estudo foi utilizado o
Introdução
método de raciocínio indutivo, e o Quando tratamos da Teoria da
Perda
de
percebemos
Uma
que
fundamental
dialético,
Chance,
ela
é
importância
para
confrontando
entendimentos diversos sobre o
de
assunto, além dos métodos de
o
procedimento
histórico
e
direito, e é a solução buscada pelos
dogmático-jurídico,
sendo
juristas durante muito tempo, para
pesquisa
empírica
reconhecerem
bibliográfica.
as
oportunidades
não
o uma e
como sérias e reais. A chance inova em nosso direito civil, e traz uma indenização
1. Teoria da Perda de Uma Chance
que apesar de parecida, não guarda
1.1 Defesa à teoria e suas vertentes
qualquer semelhança com apenas
Para adentrar-se no estudo da
expectativas como muitos dizem, pois
ela
tem
probabilidades
fundamento e
Teoria da Perda de Uma Chance, é
em
importante
porcentagens
sobre
notórias. Sua pesquisa é de extrema
reembolsar
dano, e essa indenização é sempre caracterizada de acordo com o caso
incerto, mas que é integralmente
concreto.
sentido pela pessoa prejudicada.
A Teoria aqui explicitada visa
Os raciocínios revolucionários
defender também um dano, porém,
que criaram a Teoria defendem que
um dano ainda nunca previsto em lei,
para que se caracterize a perda de
chamado indenização pela perda de
uma chance, longe de conceitos que
A
indivíduo a quem tenha causado um
ser visto imediatamente, que tem fim
o
civil.
dever de alguém em indenizar um
perdas
relativas a um dano que não pode
positivistas,
responsabilidade
pouco
Yoshikawa (2009), basicamente, o
na audácia em se desenvolver uma de
um
responsabilidade civil é, segundo
relevância científica, pois, se funda
maneira
conhecer
uma chance.
realmente
[...]
interessa é se houve uma perda
a
evolução
da
responsabilidade civil fez com que o
razoável e se ela foi verificada antes
foco
de ser alcançada a vantagem total
da
atenção
do
julgador
mudasse radicalmente do ato ilícito
esperada pelo indivíduo lesado. 78
para a proteção da vítima contra os
reparação
de
danos,
danos considerados injustos pelo
independentemente
ordenamento jurídico. Sendo a perda
comprovação de culpa.
de
da chance um dano injusto, não há
E a partir disso, a Teoria da
como negar a indenização nestes
Perda de Uma Chance passou a
casos. (SAVI, 2009, p. 101).
possuir arcabouço em nossa lei
Quando queremos algo e há
suprema, pois, após o surgimento da
um esforço pessoal imensurável
teoria objetiva, como expõe Savi
para
(2009,
conquistá-lo,
acreditamos
p.
105),
ocorreu
na
piamente poder consegui-lo, e a
Constituição Federal o advento da
teoria da perda de uma chance
“[...]
aplicada na responsabilidade civil
dignidade
protege
como
essa
esfera
de
já
possui
antes
de
à
proteção
humana,
princípio
da
estabelecida
fundamental
da
República.”
possibilidades de vitória que cada ser
prioridade
ser
Dessa forma, sendo cada vez
prejudicado.
mais frequentes os acontecimentos
Um
aspecto
muito
que colocavam em risco a dignidade
interessante da Teoria da Perda de
humana, a teoria da perda de uma
Uma Chance, é que, ao contrário da
chance
Teoria
só
ganhando, espaço no ordenamento
indenizava as vítimas de danos que
não só brasileiro, mas mundial,
conseguiam provar materialmente
mesmo não havendo ainda em
seus prejuízos, ela defende que para
nosso
que haja a indenização não se
expressamente, ela já pode ser
necessita mais do ônus probante da
encontrada em dezenas de julgados
parte autora.
proferidos nos tribunais.
subjetivista,
que
É que, a partir do momento
ganhou
país
A
lei
e
ainda
que
a
Teoria
vem
defina
consiste
em que a esfera de possibilidades de
basicamente, na perda de uma
acontecimentos danosos às pessoas
oportunidade buscando proteger o
começou
direito das vítimas em receber uma
produção
a
se
de
expandir, algumas
e
a
provas
indenização
devida
pelo
agente
tornaram-se deveras impossíveis o
causador quando este ocasionar a
que deu espaço a um sistema de
elas, por ato negligente, imprudente
responsabilidade
ou imperito seu ou de quem seja
solidarista
para 79
responsabilidade
sua,
a
perda
responsabilidade civil, em regra, não
irremediável da chance única que a
é indenizável. (SOUSA, 2009).
vítima possuía de alcançar o que
Assim, a vítima que teve sua
desejava.
chance perdida, não será indenizada
Para Melo (2007), o que
se essa chance que diz possuir
ocorre nessas situações é que, por
estiver presente apenas no campo
exemplo,
prepara
das esperanças, imaginário, pois,
duramente por muito tempo para
seguindo a linha de raciocínio de
conseguir algo, possuindo, dentro do
Adriano de Cupis (1960, p. 264-
critério
de
uma
265 apud SAVI, 2009, p. 12),
grande
chance
conseguir,
“simples esperanças aleatórias não
a
vítima
se
possibilidades, de
conquistar o objetivo que busca, e
podem
antes de chegar ao final dessa
indenização”.
conquista, estando quase certa a
ser
passíveis
de
A chance, ou oportunidade, já
sua vitória, alguém interrompe o
possui
curso natural das coisas, fazendo
improvável, então para a aplicação
com que a pessoa perca para
da Teoria da Perda de Uma Chance
sempre
que,
não se tornar frustrada, a chance em
praticamente já fazia parte de seu
si, deve trazer consigo os elementos
patrimônio.
da realidade e seriedade, ou seja,
essa
chance,
a
característica
de
ser
Importante destacar que a
deve ser possível afirmar que não
chance protegida pela teoria não é
fosse o ato do terceiro ofensor, a
apenas uma chance hipotética ou
vítima
que se presuma existir, ela precisa
alcançar o fim o qual desejava.
ser determinante, significante para
ter
conseguido
Além disso, a teoria não se
sua aceitação.
baseia na ideia de que deve ser
A chamada teoria da perda da chance,
poderia
adotada
responsabilidade
em
tema
civil,
indenizada a vantagem total e final
de
que receberia a vítima se fosse ela
aplica-se
vencedora
caso
nada
tivesse
quando o dano seja real, atual e
intervindo no seu destino, ou que ela
certo,
deva
dentro
de
probabilidade,
e
um
juízo
não
de
receber
como
se
tivesse
mera
conseguido chegar ao fim que
possibilidade, porquanto o dano
desejava, pelo contrário, o que é
potencial ou incerto, no espectro da
objeto de indenização de acordo 80
com a teoria, é a real oportunidade
andamento dos acontecimentos a
perdida de poder ter conseguido o
vítima tem uma probabilidade de
que se buscava.
vitória, e em grande parte dos casos,
Como expõe Melo (2007), não
essa
probabilidade
só
será
se trata de afirmar com certeza,
indenizada se for superior a 50%
diante dos acontecimentos, que a
(cinquenta por cento). Para Savi
vítima conseguiria o resultado final
(2009, p. 65): “Não é, portanto,
esperado, ou seria condenado o
qualquer chance perdida que pode
causador a indenizar a vítima na
ser levada em consideração pelo
integralidade do que ela conseguiria
ordenamento jurídico para fins de
se ele não tivesse a prejudicado com
indenização”.
seu ato negligente ou imperito, pois
E é por estar presente no
se isso ocorresse, estaríamos diante
campo das probabilidades que ele
apenas, da indenização de lucros
conclui (SAVI, 2009, p. 68): “[...] a
cessantes, que estipula o que a
quantificação do dano, deverá ser
pessoa deixou de lucrar depois do
feita de forma equitativa pelo juiz,
prejuízo sofrido.
que deverá partir do dano final e
[...] a indenização da perda da
fazer incidir sobre este o percentual
chance jamais poderá ser igual ao
de probabilidade de obtenção da
benefício que a vítima obteria se não
vantagem esperada”.
tivesse perdido a chance e tivesse
Enfim, a certeza de conquista
conseguido o resultado útil esperado
é
[...]. Por não haver certeza acerca da
indenização será devida apenas
vitória no recurso, a indenização da
quando houver a convicção de que
chance
sempre
era mesmo possível que a pessoa
inferior ao valor do resultado útil
conseguisse o que queria dentro do
esperado. (SAVI, 2009, p. 68, grifo
campo
do autor).
havendo certeza alguma, apesar de
A
pedida
será
perda
por
isso,
probabilidades,
a
não
existirem chances de vitória maiores
das
que 50%, sendo a teoria da perda de
da
uma chance diferente de tudo o que
razoabilidade, sendo possível sua
se viu até o momento e diferente
indenização
também do direito positivista sempre
probabilidades
no
chance
das
e
fica
enquadrada
da
hipotética,
campo
matemáticas,
apenas
quando
verificar-se que em relação ao
apegado a coisas presumíveis. 81
Graças às mentes abertas a
Para a aplicação da teoria
novas ideologias e sedentas por
nesse exemplo, é muito importante o
conhecimento, ela vem tomando
conhecimento de seus fundamentos
espaço entre nós nos dias atuais,
já explicitados anteriormente, por
definindo-se
isso, vejamos a explicação:
como
uma
teoria
visionária e moderna que se adéqua
[...] se o dono do animal
perfeitamente ao momento histórico
pretendesse obter a condenação em
vivido por todos nós.
juízo, do responsável pela guarda do animal, ao pagamento do valor equivalente
1.2 Jurisprudências e aplicabilidade Apesar
de
ainda
teria
conforme
participasse
nossos exemplos
desses um
caso
haveria
como
certeza,
que
considerado
sua
com
sairia
vitorioso.
comercial
193 apud SAVI, 2009, p.38, grifo no original). Note-se que é exposto de
negligência da pessoa que cuidava
maneira clara que se a pessoa
do trato do seu animal ele morreu e participar
negociação
aumentasse. (ALVIM, 1965, p.192-
raro,
fosse vencedor, e infelizmente, por
assim,
afirmar,
se
concurso fazia com que o preço de
ganhando um grande prêmio quem
pôde
não
e esta probabilidade de vencer o
e neste concurso seria apresentado
não
concurso,
prêmio como vencedor do certame,
muito
estava participando de um concurso,
animal
do
tinha a possibilidade de receber o
exemplos
interessante, onde um rapaz que
seu
pois
antes de participar do concurso já
o tema que seguem.
demonstra
repelida,
Contudo, é inegável que o animal,
pertinentes do mundo jurídico sobre
Um
ser
hipotético. Afinal, ainda que o animal
conseguiu muitos adeptos e já tem
tribunais,
que
estaríamos diante de um dano
Teoria da Perda de Uma Chance já
em
que
morrido, por certo a sua pretensão
hoje
entendimentos avessos a ela, a
expressão
prêmio
concorreria se o animal não tivesse
enfrentar muitas dúvidas e muitos
grande
ao
ofendida buscar a reparação dos
do
danos que não ocorreram, ou seja,
concurso.
buscar a reparação de tudo o que podia 82
ter
ganhado
caso
fosse
vitoriosa e conseguisse alcançar o
razoavelmente
fim almejado, a perda de uma
lucrar, pela perda da oportunidade.
chance não estará caracterizada.
2- Recurso conhecido e, em parte,
Ainda como exemplo, segue
haja
deixado
de
provido (2009, p.76, grifo do autor).
abaixo uma das mais utilizadas e
[1]
importantes decisões relacionadas
Conforme
se
extrai
do
ao tema, que é o respeitável julgado
julgado, a participante do programa,
do Superior Tribunal de Justiça
frise-se, programa este que faz uma
referente ao programa de perguntas
premiação de R$ 1.000.000,00 (um
e
chamado
milhão de reais) à pessoa que
“Show do milhão” transmitido pela
conseguir responder corretamente
rede SBT e apresentado por Silvio
várias
Santos, onde houve uma perfeita
assuntos, havia conseguido, por sua
interpretação da Teoria da Perda de
surpreendente inteligência, chegar à
Uma Chance no desenrolar da lide.
dificílima fase da pergunta do milhão,
respostas
televisivo
Savi comenta em seu livro
questões
que
que:
se
sobre
fosse
diversos
respondida
corretamente daria o prêmio de um RECURSO
ESPECIAL.
milhão de reais em barras de ouro a
INDENIZAÇÃO. IMPROPRIEDADE
participante.
DE PERGUNTA FORMULADA EM
Antes
PROGRAMA TELEVISÃO.
de
responder
DE
perguntado
PERDA
DA
expressa Savi (2009,
1-
O
OPORTUNIDADE.
finalista
milhão,
já
conforme p. 76), a conseguido
questionamento em programa de
acumular
perguntas
pela
500.000,00 (quinhentos mil reais),
televisão, sem viabilidade lógica,
por ter respondido todas as outras
uma vez que a Constituição Federal
perguntas certeiramente, então por
não indica percentual relativo às
estar
terras
índios,
conhecimentos, demonstrados ao
decidido
pelas
longo do programa, a participante
ordinárias,
a
não hesitou, porém, após ter visto o
impossibilidade da prestação por
que era perguntado na questão do
culpa do devedor, impondo o dever
milhão,
de ressarcir o participante pelo que
resposta correta para aquele tipo de
e
respostas,
reservadas
acarreta, instâncias
como
aos
83
a
havia
a
premiação
convicta
entendendo
de
não
de
R$
seus
haver
pergunta,
ela
optou
por
não
tradições, e os direitos originários
respondê-la, conseguindo apenas o
sobre as terras que tradicionalmente
prêmio de quinhentos mil reais ao
ocupam,
desistir de continuar no jogo.
demarcá-las,
competindo
à
proteger
União
e
fazer
respeitar todos os seus bens”.
Como se viu, a finalista não se conformou com o ocorrido, e então
Assim, em primeira instância,
pleiteou o que perdera, ensejando
mais precisamente na 1ª Vara
que fosse reconhecida a perda de
Especializada
sua chance de vencer o programa
Consumidor de Salvador, a finalista
por má-fé dos organizadores deste
do programa teve sua ação julgada
que desenvolveram uma questão
procedente, sendo reconhecida a
sem resposta.
perda de sua chance de responder a
de
Defesa
do
Segundo Savi (2009, p.77), a
questão e acertá-la, condenando-se
“pergunta do milhão”, no caso, era a
a ré no pagamento de R$ 500.000,00
seguinte: “A constituição reconhece
(quinhentos mil reais) à autora, onde
direitos aos índios de quanto do
fora fundamentado que era devido à
território
como
participante essa quantia, pois era o
possíveis respostas, o programa
que ela havia deixado de ganhar por
apresentou quatro opções: (1) 22%;
não ter tido a chance de responder a
(2) 2%; (3) 4% ou (4) 10%.
pergunta.
Brasileiro?”,
e
Como se verifica, não há
Ocorre que, analisando essa
possibilidade de ser respondida essa
decisão,
pergunta,
a
grosseiro é que, após todo o já
Constituição Federal de 1988 em
exposto aqui, cumpre ressaltar que
seu texto não diz em percentagens
não deve ser indenizada a vantagem
específicas qual seria a quantidade
total perdida, como feito na decisão
de terras disponibilizada aos índios
acima, isso é equivocado.
destarte
que,
como fora perguntado, não havendo resposta,
portanto,
à
E
pergunta.
verifica-se
nesse
um
erro
sentido
fundamentação
do
foi
a
recurso
Nesse sentido é o que dispõe a
interposto pela ré, mas que fora
norma do artigo 231 da Constituição
negado provimento pelo Tribunal de
Federal, “São reconhecidos aos
Justiça
índios
estudar o assunto, a ré interpôs
sua
costumes,
organização línguas,
social,
crenças
e
da
Bahia.
Então,
após
Recurso Especial, alegando que a 84
vítima deveria receber apenas o
qualificar o lucro cessante”. (2009,
relativo a 25% do restante do prêmio,
p.80, grifo do autor).
pois essas eram as suas verdadeiras chances,
em
existindo
Tem-se então, dentro das
quatro
possibilidades e probabilidades, que
alternativas.
a
Assim, o Superior Tribunal de
finalista
havendo
do
programa
quatro
teria,
alternativas
de
Justiça, por meio do julgado do
possíveis respostas, o percentual de
Ministro
25% de chances de ter respondido a
Fernando
Gonçalves,
aplicou a Responsabilidade Civil
pergunta
corretamente
pela perda de uma chance, baseado
houvesse resposta, e assim, por
no entendimento acima.
meio
de
um
simples
caso
cálculo
Oportuno é o comentário de
matemático, a vítima deveria receber
Savi em relação ao julgado que
pela perda de sua chance o valor de
passo a expor:
R$ 125.000,00 (cento e vinte e cinco
[...]
por
entender
que
a
mil reais), condenação esta que
conduta da ré fez com que a autora
ocorreu.
perdesse a oportunidade de ganhar o
prêmio
máximo,
fixou
Importantíssimo
a
conforme
se
destacar,
observa
nesse
indenização com base no percentual
magnífico exemplo de utilização da
das chances que ela teria de acertar
teoria, que a chance da autora foi de
a resposta à “pergunta do milhão”, se
apenas 25%, e não de o mínimo de
corretamente formulada. [...] não era
50%, como são mais aceitas as
possível
autora
indenizações por perda de uma
acertaria, com absoluta certeza, uma
chance em nossos tribunais, e
nova pergunta que viesse a ser
seguindo o já expresso acima,
formulada e que, desta vez, fosse
porém, mesmo assim, a perda de
passível de resposta. Inexistindo
uma
certeza do acerto da resposta,
encaixada aqui e deve ser aplicada
entendeu não ser possível condenar
em casos equivalentes a esse.
afirmar
que
a
a recorrente ao pagamento da
chance
Além
foi
dos
perfeitamente
exemplos
integralidade do valor que ganharia
jurisprudenciais trazidos, destaca-se
se obtivesse êxito na pergunta final,
também, segundo Massoni (2010, p.
já que ausente um dos pressupostos
1),
“do acréscimo patrimonial apto a
utilização da perda de uma chance 85
que
podemos
encontrar
a
em vários outros julgados, como, o
Quando
se
tratar
de
caso da estagiária que foi indenizada
responsabilidade pela perda de uma
após ter aceitado uma proposta de
chance, é importante aclarar o que
emprego da empresa concorrente e
configura
depois esta tê-la dispensado. O caso
destaca-se que para a verificação
do vereador de uma cidade de Minas
dela é de fundamental importância
Gerais que perdeu a chance de ser
que haja a busca incessante por uma
eleito porque a rádio da cidade
vitória futura e incerta, além de um
divulgou
desfecho
erroneamente
que
sua
essa
chance,
impossível
assim,
de
ser
candidatura havia sido cassada,
demonstrado, ou seja, a chance só
entre outros tantos que já se tem
será vista como tal, se realmente for
notícias.
constatado
que
ela
tinha
Como visto, inúmeros são os
possibilidade relevante de trazer
casos em que se pode aplicar a
êxito para quem a perdeu e se esse
Teoria objeto de nosso estudo, e os
êxito
Tribunais já vêm tomando decisões
consequência da interrupção do
favoráveis à sua inserção no mundo
processo aleatório.
for
improvável
por
jurídico, o que prova que não será
É que, se esse processo de
tardia a sua completa utilização e
conquista chegar ao seu fim, não
que esse tipo de dano será um dia,
estaremos diante de chances ou
muito próximo enfim recompensado.
probabilidades de vitória, a vitória ou a derrota já terá acontecido, e o prejuízo seja qual for sua monta será
Conclusão
provável e visível aos olhos do julgador.
A perda de uma chance,
A chance será séria quando a
quando considerada séria e real
sua
diante de probabilidades do eventual
probabilidade
sucesso que a vítima teria caso não fosse
a
intervenção
alheia,
existência
configurar
razoável
de
uma que
ocorreria a conquista futura almejada
é
pela
atualmente considerada por juristas,
vítima.
probabilidade
como uma lesão idônea a garantir
E de
real
se
essa
alcançar
a
vantagem final referir-se a uma
indenização, assim como qualquer
porcentagem de pelo menos 50%,
outra já existente e defesa em lei.
dentro das vertentes matemáticas. 86
Isso é perfeitamente concebível,
são
pois, quando a lei trata dos lucros
negligência e desinteresse.
cessantes, define para reconhecê-lo, que
se
deve
probabilidades
e
utilizar
arrebatadas
por
infâmia,
Dessa forma, é indiscutível a
de
já demorada obrigação de inserir a
porcentagens
perda
da
chance
na
partindo da observação cotidiana
responsabilidade civil, dispensando
para encontrar se realmente merece
a esse instituto um texto de lei que
acolhida, portanto, a chance não
supra as necessidades de quem as
deve ser encarada de maneira
recepciona, sendo que se não
diversa.
houver a concessão de reparação a
Destaque-se que a teoria da
esses
casos,
ocorrerá
uma
perda de uma chance em muito
infringência à nossa lei suprema, a
contribuirá, diminuindo insatisfações
Constituição Federal por não haver
com
respeito ao que ela estabelece.
o
positivismo
que
alguns
aplicadores do direito ainda insistem
É necessário que surja uma
em defender, como também, elevará
norma para justiçar as pessoas que
a visão dos outros países para o
foram
nosso ordenamento que não ficará
alheias e proteger as que ainda
considerado retrógrado. A sociedade
possam sofrer a mesma intervenção,
como um todo, clama por justiça ao
evitando que danos como esse
ser lesionada em seu patrimônio, e a
continue a surgir sem a devida
teoria trará a satisfação de todas as
defesa da lei.
camadas sociais que diariamente
87
vítimas
de
intervenções
Referências ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e consequências. 3. ed. Atualizada. Rio de Janeiro/São Paulo: Jurídica e Universitária,1965. CUPIS, Adriano de. II Dano: Teoria generale del la responsabilitàcivile. 2. ed. Milano: Giuffrè, 1966. v. 2. MASSONI, Túlio de Oliveira. Judiciário concede indenizações a pessoas que perderam uma chance.Valor online. 16/11/2010. Disponível em: . Acesso em: 17 nov. 2010. MELO, Raimundo Simão de. Indenização pela perda de uma chance.Boletim Jurídico. 22/04/2007. Disponível em: . Acesso em: 7 abr. 2010. SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. 2. ed.São Paulo: Atlas, 2009. SOUSA, Áurea Maria Ferraz de. O que se entende pela teoria da perda de uma chance? Rede de Ensino Luiz Flavio Gomes - LFG. 14/12/2009. Disponível em: . Acesso em: 7 abr. 2011. YOSHIKAWA, Daniella Parra Pedroso. Teoria da perda de uma chance exige uma chance real, séria e objetiva. Jusbrasil. 23/06/2009. Disponível em: . Acesso em: 10 nov. 2010. [1] SÃO PAULO. Supremo Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 788.459-BA. Quarta Turma. Relator: Ministro Fernando Gonçalves. Julgado em 08 de novembro de 2005. DJ em 13/03/2006.
88
ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO ARRUDA, Luiz Paulo. Discente do 4º período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. NASCIMENTO, Marcelo Pereira do. Discente do 4º período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. PIGNATARI, Nínive. Docente do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO Assédio moral ou violência moral no trabalho não é um fenômeno novo. Pode-se dizer que ele é tão antigo quanto o trabalho. A novidade reside na intensificação, gravidade, amplitude e banalização do fenômeno e na abordagem jurídica que tenta estabelecer o nexo causal com a organização do trabalho tratando tal violação como não inerente ao trabalho. A pesquisa bibliográfica tratou do problema com objetivo de divulgar informações e esclarecer alguns pontos controvertidos desse problema. Em razão do desconhecimento, o trabalhador não tem buscado seus direitos, pois este tipo de assédio é passível de penalidades se comprovado.
Palavras-chave: Assédio moral. Ambiente de trabalho. 89
psicológica, social e econômica.
Introdução
Indagar os motivos que levam o o
assediador a agir de forma tão
conceito e as implicações do assédio
violenta (uma "violência sutil") nos
moral.
remete aos caminhos da ética e da
O
artigo
visa
discutir
Considera-se
relevante
pela
o
tema
quantidade
moral.
de
O
assediador um
é
ocorrências e pelo fato de haver
essencialmente
poucos estudos sobre o assunto. O
destituído de ética e de moral. O
assédio moral constitui-se de atos
assediador
agressivos de desqualificação e
negativos e sem nenhuma nobreza
desmoralização de um profissional e
de caráter, revelando seu lado
causa a desestabilização emocional
perverso ao verificar sua vítima
deste, tornando o ambiente de
sucumbir aos poucos diante de sua
trabalho desagradável, insuportável
iniquidade. (SILVA, 2010).
age
indivíduo
por
impulsos
e hostil. A pesquisa bibliográfica, 1.1 Conceito e proteção legal
realizada com base no método dialético,
confronta
posições
e O assédio moral no trabalho
baseou-se em de artigos e dados de
configura-se pela exposição dos
entidades governamentais.
trabalhadores humilhantes
1. O que é assédio moral?
a e
situações
constrangedoras,
repetitivas e prolongadas durante a Toda
e
jornada de trabalho e no exercício de
qualquer conduta palavra,
suas funções, sendo comuns em
comportamento, atitude) que atente,
relações hierárquicas autoritárias e
por sua repetição ou sistematização,
assimétricas.
Nessas
situações,
contra a dignidade ou a integridade
predominam
condutas
negativas,
psíquica ou física de uma pessoa
relações
constitui assédio moral:
duração, de um ou mais chefes
abusiva
(gesto,
desumanas
de
longa
dirigida a um ou mais subordinado,
[...] O assédio moral, a repercussões
desestabilizando a relação da vítima
extremamente negativas ao homem,
com o ambiente de trabalho e a
repercutindo
organização.
princípio,
traz
na
seara
física,
pressão 90
leva
Muitas a
vezes,
a
enfermidades
psíquicas ou força o trabalhador a
Projeto de Lei nº 4.591/200130, de
desistir do emprego. Em casos mais
iniciativa da deputada Rita Camata
graves, o assédio pode ser tido como
(PSDB-ES), que modifica a Lei nº
uma
de
8.112, de 11 de dezembro de 1990,
suicídios, pois a humilhação pode
proibindo a prática do assédio moral
ser tão intensa a ponto de levar o
no âmbito do serviço público federal
sujeito a findar a própria vida para se
e cominando pena que vai da singela
livrar do abuso moral.
advertência até a demissão, esta em
das
O
diversas
causas
assédio
moral
está
caso de reincidência.
tipificado, ainda que indiretamente, pela legislação e pela Constituição
PROJETO DE LEI FEDERAL Nº
Federal. No item que trata dos
4742/2001
direitos fundamentais no o artigo 5º
O Congresso Nacional decreta:
da Constituição Federal, parágrafos II
e
III,
que
abrangem
Artigo 1º - Art. 1º O Código
respectivamente o assédio sexual e
Penal Brasileiro - Decreto-lei nº
o moral, o artigo 483 da CLT e
2848, de 7 de dezembro de 1940 -
138,139 e 140 do Código Penal,
passa a vigorar acrescido de um
relativos a crimes contra a honra, ou
artigo 146 A, com a seguinte
seja, calúnia, difamação e injúria;
redação:
sem mencionar o artigo 146 –
Assédio Moral no Trabalho
constrangimento ilegal- do referido
Art.
código,
que
também
pode
ser
146
reiteradamente,
A.
Desqualificar,
por
meio
de
aplicado ao assédio. A dificuldade na
palavras, gestos ou atitudes, a
aplicação dos dispositivos está na
autoestima,
comprovação
causal
imagem do servidor público ou
consequência)
empregado em razão de vínculo
(relação
entre
do a
nexo
indispensável para a punição na
a
segurança
ou
a
hierárquico funcional ou laboral.
esfera criminal.
Pena: Detenção de 3 (três)
No Brasil, além de algumas
meses a um ano e multa.
leis municipais existem projetos de lei sobre o tema, tramitando na
SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE
Câmara dos Deputados:
LEI Nº 4.742, DE 2001
91
Acrescenta o art. 136-A ao
TÍTULO III
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
DO REGIME GERAL DE
dezembro de 1940, Código Penal
PREVIDÊNCIA SOCIAL
Brasileiro, instituindo o crime de
CAPÍTULO II: DAS PRESTAÇÕES
assédio moral no trabalho.
EM GERAL
O Congresso Nacional decreta:
Seção I: Das Espécies de
Artigo 1º - O Decreto-Lei nº
Prestações
2.848, de 7 de dezembro de 1940, Código
Penal
Brasileiro,
Art.
fica
21
-
Equiparam-se
também ao acidente do trabalho,
acrescido do art. 136-A, com a
para efeitos desta Lei:
seguinte redação:
I.
o
acidente
ligado
ao
"Art. 136-A. Depreciar, de
trabalho que, embora não tenha sido
qualquer forma e reiteradamente a
a causa única, haja contribuído
imagem
diretamente
ou
o
desempenho
de
para
a
morte
do
servidor público ou empregado, em
segurado, para redução ou perda da
razão de subordinação hierárquica
sua capacidade para o trabalho, ou
funcional ou laboral, sem justa
produzido lesão que exija atenção
causa,
médica para a sua recuperação;
ou
tratá-lo
com
rigor
excessivo, colocando em risco ou afetando
sua
saúde
física
II. o acidente sofrido pelo
ou
segurado no local e no horário do
psíquica.
trabalho, em consequência de:
Pena - detenção de um a dois
[...]
anos.
b. ofensa física intencional, Mais recentemente, o PL N.º
inclusive de terceiro, por motivo
7.202, DE 2010, de autoria de
de disputa relacionada ao trabalho
Ricardo Berzoini, Pepe Vargas, Jô
(ASSÉDIO..., 2012).
Moraes, Paulo Pereira da Silva e
Devida ao fator subjetivo que
Roberto Santiago prevê alterações
envolve esse tipo de delito, alguns
na Lei nº 8.213 de 1991. A redação
países
proposta inclui o inciso II, b, no artigo
específica
21 da referida lei:
assédio moral no trabalho. É o caso
já
têm para
uma
legislação
criminalizar
o
da Alemanha, da Itália, da França, da Austrália, dos Estados Unidos e da Suíça. 92
2. Os tipos de assédio moral no
Na forma ascendente, bem mais
ambiente de trabalho
rara, o grupo não aceita um superior que vem de fora ou que pertencia ao
A
perseguição
trabalho
pode
modos:
fenômenos
moral
ocorrer
de
no
próprio grupo e foi promovido.
dois
verticais
O fenômeno horizontal ocorre
e
quando o assédio se estabelece de
horizontais.
colega para colega. Observa-se
O fenômeno vertical é o mais
quando não se consegue conviver
comum. Num fluxo descendente,
com as diferenças, especialmente
partindo do superior hierárquico
quando
rumo ao subordinado, aquele se
destaques na profissão ou cargo
serve da autoridade formal e por
ocupado.
vezes do aval da instituição para
p.112-114).
essas
diferenças
(HIRIGOYEN,
são
2002,
perpetuar e manter o assédio deste.
2.1 Tabela de origem do assédio ORIGEM DO ASSÉDIO
%
Hierarquia
58
Diversas pessoas (incluindo colegas)
29
Colegas
12
Subordinado
1
Total
100 Fonte: HIRIGOYEN, 2002, p. 111.
3. Estratégias do agressor São estratégias do agressor, segundo o Guia Trabalhista (2011):
o Escolher a vítima e a isolar do grupo.
93
o Impedir de se expressar e não explicar o porquê. o Fragilizar, ridicularizar, inferiorizar, menosprezar em frente aos pares. o Culpar ou responsabilizar publicamente, podendo os comentários de sua capacidade invadir, inclusive, o espaço familiar. o Desestabilizar emocional e profissionalmente a vítima gradativamente vai perdendo simultaneamente sua autoconfiança e o interesse pelo trabalho. o Destruir a vítima (desencadeando ou agravamento de doenças préexistente). A destruição da vítima engloba vigilância acentuada e constante. A vítima se isola da família e amigos, passando muitas vezes a usar drogas, principalmente álcool. o Livrar-se da vítima que são forçados a pedir demissão ou são demitidos frequentemente, por insubordinação. o Impor ao coletivo sua autoridade para aumentar a produtividade.
4. Danos da humilhação à saúde
O empregado assediado passa a conviver com depressões, palpitações, tremores, distúrbios do sono, hipertensão, distúrbios digestivos, dores generalizadas, alteração da libido e pensamento ou tentativa de suicídio que configuram um cotidiano sofrido. Este sofrimento nas relações de trabalho faz adoecer, pois a pessoa vive de modo indesejado, reprimindo o mal estar por um longo tempo. Desta forma, também os pequenos assédios causam alterações à saúde, a curto médio ou longo prazo. É difícil fazer uma análise precisa da intensidade de cada tipo de assédio à saúde, no entanto, é sabido que seja ele causador de sérios danos à saúde.
4.1 Consequência do assédio moral a saúde
Segundo Barreto (2000), entrevistas realizadas com 870 homens e mulheres vítimas de opressão no ambiente profissional revelam como cada sexo reage a essa situação (em porcentagem). 94
Tabela 1. Consequência do assédio moral a saúde. [1] Sintomas
Mulheres
Homens
100
-
Dores generalizadas
80
80
Palpitações e tremores
80
40
Sentimento de inutilidade
72
40
69,6
63,6
Depressão
60
70
Diminuição da libido
60
15
Sede de vingança
50
100
Aumento da pressão arterial
40
51,6
Dor de cabeça
40
33,2
Distúrbios digestivos
40
15
Torturas
22,3
3,2
Ideia de suicídio
16,2
100
Falta de apetite
13,6
2,1
10
30
Passa a beber
5
63
Tentativa de suicídio
-
18,3
Crises de choro
Insônia ou sonolência excessiva
Falta de ar
5. É possível estabelecer um nexo
ü.
causal?
A
história
clínica
e
ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de
Segundo Resolução 1488/98
nexo causal;
do Conselho Federal de Medicina, “para
estabelecimento
do
ü. O estudo do local de
nexo
trabalho;
causal entre transtornos de saúde e
ü. O estudo da organização
as atividades do trabalhador, além
do trabalho;
do exame clínico (físico e psíquico) e
ü. Os dados epidemiológicos;
dos
ü. A literatura atualizada;
exames
complementares,
quando necessários, deve o médico considerar”: 95
ü. A ocorrência de quadro
A vítima também deve dar
clínico ou subclínico em trabalhador
visibilidade, procurando a ajuda dos
exposto a condições agressivas;
colegas, principalmente daqueles
ü. A identificação de riscos físicos,
químicos,
que testemunharam o fato ou que já
biológicos,
sofreram humilhações do agressor.
mecânicos, estressantes, e outros; ü.
O
depoimento
e
Deve a
evitar
agressor
experiência dos trabalhadores;
conversas
sem
com
testemunhas
o (ir
sempre com colega de trabalho ou
ü. “Os conhecimentos e as
representante sindical).
práticas de outras disciplinas e de
Além disso, pode exigir por
seus profissionais, seja ou não da
escrito, explicações do ato agressor
área de saúde.”
e permanecer com cópia da carta
(Artigo 2° da
Resolução CFM 1488/98).
enviada ao D.P. ou R.H e da
ü. Duração e repetitividade da exposição
dos
trabalhadores
eventual resposta do agressor. Se
a
possível
situações de humilhação.
mandar
sua
carta
registrada, por correio, guardando o recibo. O empregado deve procurar
6. Ações possíveis para a vítima
seu
sindicato
acontecimento
e para
relatar
o
diretores
e
A vítima deve primeiramente
outras instâncias como: médicos ou
resistir e anotar com detalhes todas
advogados do sindicato assim como:
as humilhações sofridas (dia, mês,
Ministério
Público,
ano, hora, local ou setor, nome do
Trabalho,
Comissão
agressor,
Humanos e Conselho Regional de
colegas
que
de
do
Direitos
da
Medicina
conversa e o que mais esta achar
Conselho
necessário).
providência
Medicina n.1488/98 sobre saúde do
objetiva facilitar a e prova do assédio
trabalhador). Outra possibilidade é
moral e consequentemente fazer
recorrer ao Centro de Referência em
com que o agressor sofra as
Saúde dos Trabalhadores e contar a
penalidades
humilhação
testemunharam,
conteúdo
Essa
adequadas
(ver
Justiça
Resolução Federal
sofrida
ao
do de
médico,
(dependendo do caso até a sua
assistente social ou psicólogo. É
demissão).
sempre importante buscar apoio 96
familiar, de amigos e colegas, pois o
caráter sintagmático do contrato de
afeto
trabalho,
e
a
solidariedade
são
fundamentais.
e
por
descumprindo
a
consequência, sua
principal
obrigação que é a de fornecer o trabalho, fonte de dignidade do empregado. Recurso improvido. [2] 7. Decisões judiciais sobre assédio
Dinâmica
–
grupal
Desvirtuamento – Violação ao
moral
patrimônio moral do empregado – Assédio moral – Indenização: A
Reproduzem-se, abaixo, três decisões
judiciais,
mais
dinâmica
grupal
na
precisamente acórdãos, a respeito
Recursos
de pedidos de reparação por assédio
objetivos: testar a capacidade do
moral:
indivíduo, quanto à compreensão
Humanos
área tem
de por
Assédio moral – Contrato de
das normas do empregador e gerar
inação – Indenização por dano
a sua socialização. Entretanto, sua
moral:
aplicação
A
tortura
psicológica
inconsequente
destinada a golpear a autoestima do
efeitos
empregado,
sua
emocional
sua
manipular tanto a emoção como o
dispensa através de métodos que
íntimo do indivíduo, a dinâmica pode
resultem
o
levá-lo a se sentir humilhado e
inúteis,
menos capaz que os demais. Impor
demissão
empregado
visando ou
em de
forçar
apressar
a
sobrecarregar tarefas
danosos do
ao
produz equilíbrio
empregado.
sonegar-lhe informações e fingir que
pagamentos
não o vê, resultam em assédio
publicamente, tais como, ‘dançar a
moral, cujo efeito é o direito à
dança da boquinha da garrafa’,
indenização por dano moral, porque
àquele que não cumpre sua tarefa a
ultrapassada o âmbito profissional,
tempo e modo, configura assédio
eis que minam a saúde física e
moral, pois, o objetivo passa a ser o
mental da vítima e corrói a sua
de inferiorizá-lo e torná-lo ‘diferente’
autoestima. No caso dos autos, o
do grupo. Por isso, golpeia a sua
assédio foi além, porque a empresa
autoestima e fere o seu decoro e
transformou o contrato de atividade
prestígio profissional. A relação de
em contrato de inação, quebrando o
emprego cuja matriz filosófica está 97
de
Ao
prendas
assentada no respeito e confiança
comportamento
mútua
contratantes,
grave com o autor, e menos ainda
impõe ao empregador o dever de
omitir-se diante de agressão física
zelar pela dignidade do trabalhador.
sofrida pelo reclamante no ambiente
A CLT, maior fonte estatal dos
de trabalho; mormente se esta
direitos e deveres do empregado e
agressão
empregador, impõe a obrigação de o
agentes de segurança do reclamado,
empregador abster-se de praticar
os quais não esboçaram qualquer
lesão à honra e boa fama do seu
tentativa
empregado
reclamante, como empregado do
das
partes
(art.
483).
Se
o
fora
de
discriminatório
presenciada
coibi-la.
por
Se
empregador age contrário à norma,
demandado,
deve responder pelo ato antijurídico
estabelecimento do réu, sofre, por
que praticou, nos termos do art. 5º,
parte de seus colegas de trabalho,
X, da CF/88. [3] (Recurso provido).
deboches e até chega a sofrer
Dano
moral:
estando
o
no
Empregado
agressão física, e se delas tem pleno
submetido a constrangimentos e
conhecimento a gerência constituída
agressão física, em decorrência de
pelo
sua orientação sexual, praticados
responderá,
por empregados outros no ambiente
danos
de trabalho e com a ciência da
reclamante (CCB então vigente, art.
gerência da empresa demandada –
159 c/c art. 5º, X, da CF). Sendo o
Imputabilidade
ao
empregador pessoa jurídica (e não
empregador. Se a prova colhida nos
física), por óbvio, os atos de violação
autos revela, inequivocamente, que
a direitos alheios imputáveis a ele
o autor sofrerá no ambiente de
serão necessariamente praticados,
trabalho, discriminação, agressões
em sentido físico, pelos obreiros e
verbais e mesmo físicas por sua
dirigentes
orientação
quadros.
de
culpa
homossexual,
mesmo
empregador, por
omissão,
morais
que
este
último pelos
causados
integram
(Recurso
ordinário
ao
seus do
que não pudesse o empregador
reclamado conhecido e desprovido).
impedir
[4]
que
empregados
parte
de
desaprovasse
seus o
comportamento do reclamante e evitassem contato com ele, não poderia permitir a materialização de 98
fundamentais do homem, dentre eles
Conclusão
a dignidade, a qual tem sido violada de modo crescente e alarmante no
Hoje, no mercado de trabalho
ambiente laboral.
altamente competitivo, o respeito pelo ser humano está cada vez mais
As pesquisas apresentadas
fragilizado. O assédio moral é uma
revelam números assustadores e
das causas que mais abalam a
consequências graves desse ilícito,
saúde dos trabalhadores, em razão
razão pela qual o assunto merece
de
destaque nos meios acadêmicos,
pressões
perseguições superiores
desumanas praticadas
ou
pelos
e
caso
pelos
contrário,
aumentará
próprios
o
cada
vez
mais
número
de
vidas
colegas. Para tornar-se cidadão o
prejudicadas, pois a grande maioria
indivíduo deve conhecer, cumprir e
das pessoas que sofre esse tipo de
exigir
abuso na desconhece seus direitos.
o
respeito
aos
direitos
99
Referências ASSÉDIO moral no trabalho. Disponível em: www.assediomoral.org>. Acesso em 16 de novembro de 2011. ASSÉDIO moral no trabalho. Disponível em: <www.assediomoral.net/publicacoes>. Acesso em: 16 de novembro de 2011. ASSÉDIO moral no trabalho, http://www.assediomoral.org/spip.php?article81. Acesso em 20 de janeiro de 2012. BARRETO, M. Uma jornada de humilhações. São Paulo: Fapesp: PUC, 2000. Guia Trabalhista. http://www.guiatrabalhista.com.br/tematicas/assediomoral.htm acesso em 20 de dezembro de 2011. IBES, Instituto brasileiro de estudos sociais. Disponível em: ://www.sociologia.org.br>. Acesso em 16 de novembro de 2011. HIRIGOYEN, Marie - France. Mal estar no trabalho - redefinindo o assédio moral. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002, p. 111. PAROSKI, Mauro Vasni. Assédio moral no trabalho. Disponível em: Acesso em: 16 de novembro de 2011. TARCITANO, João Sérgio de Castro; GUIMARÃES, Cerise Dias. Assédio moral no ambiente de trabalho. Centro de Educação Tecnológica Estácio de Sá de Juiz de Fora - MG; TCC. 2004. Disponível em:http://www.assediomoral.org/IMG/pdf/assedio_moral_no_trabalho_no_ambi ente_de_trabalho.pdf. Acesso em 01 de julho de 2011. SILVA, Jorge Luiz de Oliveira da. Ética e assédio moral: uma visão filosófica. Disponível em: Acesso em 16 de novembro de 2011. [1] Fonte: BARRETO, M. Uma jornada de humilhações. São Paulo: Fapesp: PUC, 2000. [2] Roraima -TRT – 17a R – n°1315.2000.00.17.00-1 – Rela. Sônia das Dores Dionísa. End. Eletrônico [3] Roraima - TRT – 17ª R – n. 1294.2002.007.17.00.9 – Relª. Juíza Sônia das Dores Dionísio. End. eletrônico [4] Distrito Federal - TRT – 10ª R – 3ª T – n° 919/2002.005.10.00-0 – Rel. Paulo Henrique Blair – DJDF 23.5.2003 – p. 51. end. Eletrônico
100
CRIME PASSIONAL E PRECONCEITO DE GÊNERO NA SOCIEDADE BRASILEIRA FERNANDES, Barbara Rossi. Discente do 9º período de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. PIGNATARI, Nínive Daniela Guimarães. Docente do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO O trabalho analisa aspectos relacionados à prática do crime passional a fim de demonstrar a discriminação de gênero (em desfavor da mulher) que ainda existe no caso desse tipo de violência, apontando algumas controvérsias da jurisprudência com relação à punibilidade. Pretende-se mostrar que, a despeito da Constituição Federal, que determina que “todos são iguais perante a lei”, e das campanhas de repressão à violência doméstica, a mulher ainda é vitimada de modo alarmante. Os crimes passionais são apenados de modo significativamente
mais
brando
quando
são
praticados
por
homens,
especialmente se forem traídos, o que denuncia o preconceito social que ainda reina no Brasil. Para a pesquisa bibliográfica será utilizado o método de raciocínio dedutivo.
Palavras-chave: Preconceito de gênero. Sociedade. Condição feminina. Crime passional. 101
benevolência piedosa e isso termina
Introdução
por lhes acarretar penas mais leves. Isso não pode ser admitido, pois a
O objetivo desse estudo é analisar a disparidade de tratamento
procuradora
jurídico dado ao crime passional
explanando sobre vários crimes
praticado por homens e mulheres.
passionais
Justifica-se a pesquisa o número
afirma que pesquisas levantadas
exorbitante de homicídios praticados
pela União das Mulheres de São
contra mulheres diariamente (10 por
Paulo relatam que pelo menos 2.500
dia) em razão de ciúmes e traições.
mulheres são mortas por ano vítimas
A pesquisa bibliográfica analisa os
de
conceitos
pesquisas, citadas na mesma obra,
de
amor,
de
crime
seus
Luiza
Nagib
ocorridos
no
companheiros.
que
10
Eluf,
país,
Outras
passional e propõe uma reflexão
indicam
mulheres
são
sobre a visão social e jurisprudencial
assassinadas por dia no Brasil
com relação ao crime passional.
(2009) em decorrência de violência doméstica.
A razão dos crimes passionais
Isso se explica, em parte, pois
é sempre o ciúme decorrente da ou
desde criança, a mulher foi ensinada
à
a cuidar da casa, dos filhos, do
companheira. Considera-se que a
marido, e a este deve ser submissa,
distinção de tratamento começa na
aceitando suas atitudes, violências e
sociedade,
o
traições sem rebelar-se. Com o
adultério masculino e repugna o
passar dos anos, essa visão vem
feminino. Por essa razão o criminoso
mudando e a mulher tem se tornado
passional recebe do júri, em geral,
a cada dia mais independente. Mas,
penas mais brandas do que o
mesmo com essas mudanças, ainda
homicida que pratica o crime movido
há uma resistência da sociedade em
por vingança (pena qualificada).
aceitar tanto a liberdade quanto a
imputação imaginária)
(verdadeira de
que
uma
tolera
traição
bem
traição feminina, o que dá ao
Embora não se admita mais a tese da legítima defesa da honra, os
homicida
jurados, incentivados pelos esforços
proteção.
passional
uma
certa
retóricos da defesa, projetam no
A reação social, quando um
assassino traído uma espécie de
homem mata a mulher (porque ela não o quer mais e principalmente 102
porque preferiu a outro), é mais leve
amoroso e enviar os estímulos
do que no caso do homicídio comum,
sensoriais e psicológicos. (2011).
como se o crime, nesse caso fosse
Emilio Mira y López, em sua
de certa forma justificado. O choque
obra Quatro Gigantes da Alma
maior da sociedade ocorre quando a
(2007, p.
esposa
algumas classificações quanto aos
viola
os
deveres
de
fidelidade do que quando o homem a
149- 158), nos traz
tipos de amor, sendo eles:
mata.
Amor Esquizoide: a palavra A figura feminina é tratada,
esquizoide, segundo definição do
nesse caso, com preconceito e
professor
virulência muito maiores do que a
Bueno, no Minidicionário da Língua
figura masculina. Essa diferente
Portuguesa (1996, p. 267), é um
valoração social das condutas está
adjetivo de “anormal, desiquilibrado”,
na
e
gênese
da
diferença
de
tratamento jurídico.
é
a
Francisco
clara
da
Silveira
explicação
dessa
modalidade do sentimento: aquele que tem como característica a
1. O amor
mudança
de
seu
(manifestação) Não é fácil dar uma definição do
amor.
forma
proporção
(intensidade).
simples,
Amor Paranoide: é aquele
podemos trazer ao caso o que diz no
que, com facilidade, o indivíduo
site Wikipédia quanto à acepção
consegue
desse sentimento:
amada, todavia ele pode retraí-la,
Pode
De
e
sintoma
significar
afeição,
conquistar
a
pessoa
pois logo se enche de ciúmes e afligir
compaixão, misericórdia, ou ainda,
quem recebe todo esse amor;
inclinação, atração, apetite, paixão,
Amor Hipomaníaco: não é
querer bem, satisfação, conquista,
diferente dos outros quanto ao seu
desejo, libido, etc. O conceito mais
brilhantismo, alegria, atração, no
popular de amor envolve, de modo
entanto,
geral, a formação de um vínculo
buscando o prazer, rapidamente
emocional com alguém, ou com
alcança sua fulgência, porém quem
algum objeto que seja capaz de
o sente é de forma frívola e ligeira;
receber
este
comportamento
aqui
Amor
a
pessoa
Pessimista
ama
ou
Melancólico: este é impregnado de 103
medo e até rancor, pois o indivíduo
é afligido pelo ciúme e vive sob a
que o sente olha mais para os
ameaça da violência, na verdade o
perigos que pode trazê-lo e acaba
que a pessoa aqui quer é ser
não aproveitando do sentimento,
venerado e obedecido;
afetando
dessa
forma,
seu
Amor Lúbrico: o ponto em
companheiro;
comum dos amantes aqui é o desejo
Amor Compulsivo: ele é do
que eles têm em satisfazer os
tipo temeroso, inquieto, de modo que
impulsos e posse de seus corpos, é
acaba complicando a convivência,
mais algo carnal;
devido
suas
inexplicáveis
Amor
mudanças;
está
criador:
nele
Intelectual, existe
mais
o
Amor Ansioso: é aquele que
companheirismo e amizade do que a
sempre
questão erótica. O maior interesse
aos
extremos:
é
ofegante e aflito, de modo que não
entre os pares é se amarem;
consegue alcançar a doce suavidade
Amor em vaivém: aqui o
do sentimento;
homem se interessa e seu amor
Amor Nutritivo: é o amor
chega ao extremo, enquanto a
canibalesco, sendo o mais primitivo,
mulher fica fazendo ‘jogo duro’,
pois
sentem
depois quando o homem perde o
prazeres orais, são estipuladas pelas
encanto e parte para outras, ela
papilas
descobre que o ama loucamente, aí
as
pessoas
gustativas
aqui
e
cílios
das
células olfativas;
parte para a conquista. Resumindo
Amor Mortal: é caracterizado
seria enquanto cada um vive em
pela solidão, silêncio, obscuridade, tristeza e desânimo.
período diferente do outro;
O prazer de
Amor
Explosivo:
os
quem sente esse amor é a morte,
companheiros se alteram entre a
sacrifício, renunciando tudo que
repulsa violenta e a atração, eles
possa representar vitalidade;
gastam seu tempo brigando e se
Amor Imperialista, Sádico e
reconciliando, vale ressaltar que
Tirânico: ele é típico de pessoas
essas brigas podem ser tão intensas
orgulhosas que sentem prazer em
a chegar à agressão física.
mostrar que seu companheiro é
O Amor, um sentimento tão
submisso a ele. Sua nutrição é a
excelso deve querer o bem à pessoa
arrogância, vaidade e orgulho, ainda 104
amada acima de tudo, e não trazer
termos da qualificadora do artigo 121
destruição e morte.
do CP. Desse modo, é o ciúme
2. O ciúme
sexual-possessivo (sentimento de domínio sobre a outra pessoa) a
“O ciúme incomoda, fere,
primeira grande causa do crime
humilha quem o sente.” (ELUF,
passional, já que o ciúme possessivo
2009, p. 136).
é uma distorção do amor e não uma
Como todo sentimento, ele é
prova desse sentimento nobre.
subjetivo e por isso cada pessoa o
Todavia, como o ciúme se
sente de uma forma, com uma
enquadra facilmente no rol dos
intensidade. A mulher pode senti-lo
sentimentos
de um jeito e o homem em outra
expressão
proporção. A pessoa ciumenta pode
dependendo
ser
advogado em convencer os jurados,
definida
como
aquela
que
acobertados “violenta da
ainda
pela
emoção”,
habilidade
beneficiam
sempre vive em tensão, e se sente
esses
também humilhada, pelo fato de
admitindo
pensar que não conseguirá manter e
contida no Código Penal, quando, na
cuidar de seu amor, caso apareça
verdade, este mereceria a pena
outra pessoa, vista por ele como
agravada
pela
qualificadora
outro rival.
vingança!
Vale
lembrar
a
forma
o
do
réu
privilegiada
que
da o
O ciúme está intimamente
homicídio privilegiado possui causa
ligado ao sentimento de posse que a
de diminuição de pena, variável
pessoa pensa ter sobre a outra.
entre um sexto e um terço (§ 1°, art.
Decorre
121)
da
insegurança
e
do
enquanto
para
a
forma
desrespeito ao direito alheio de
qualificada a pena será de 12 a 30
escolher se quer ou não manter um
anos. Isso determina uma diferença
relacionamento. “coisifica”
a
considerando-a extraindo
a
O
ciumento
enorme na pena. Se o réu é apenado
outra
pessoa,
com a forma privilegiada, sendo
um
objeto,
condição
dela
primário e de bons antecedentes,
humana
experimentará uma pena irrisória
essencial que é a liberdade. Quem
pela violência praticada.
mata por ciúme age por vingança, merecendo ser repreendido nos 105
3. A condição feminina e o adultério
Oliveira
(2012)
“as
mulheres
na sociedade
costumam ser mais resistentes e, quando traídas a maioria perdoa ou
Quando uma pessoa mata
tenta o suicídio, pois, historicamente,
amor”,
está
a educação lhes dá mais tolerância.
dominada pelo sentimento de posse,
No entanto, quando cometem este
orgulho e vingança.
tipo de crime às vezes são mais
“por
na
verdade
A mulher
cruéis que os homens”.
dificilmente faz isso. Normalmente a traída se revolta e briga com a outra, e
não
com
companheiro. raramente
o
Existem culturas em que é
próprio
natural
De qualquer modo,
chega
a
matar.
um
homem
ter
várias
esposas, e é natural dividir o marido
A
com as suas outras mulheres. Desse
sociedade tolera bem a traição
modo, para elas, não existe nenhum
masculina e, às vezes, até exalta o
incentivo para matar o adúltero ou
homem “garanhão” que ludibria uma
desenvolver o sentimento de posse
mulher em casa e se aventura com
pelo homem.
tantas outras fora do lar. Já o
Quando
homem, quando privado de seu
independente,
objeto
à
financeiramente, pode estar menos
rejeição, e se foi traído, torna-se
vulnerável ao crime passional, mas
furioso e se vê no direito de se
não está livre dele. Recentemente
vingar matando.
vimos o caso do jornalista Pimenta
de
O mulheres
desejo,
pequeno que
sucumbe
índice
cometem
de
a
mulher
psicológica
é e
Neves que matou a namorada,
crimes
também jornalista, por ciúmes.
passionais se dá pelo fato de que as
Na tentativa de reprimir a
mulheres são criadas com a ideia de
violência contra a mulher, a Lei
tolerância à traição. “A esposa deve
Maria da Penha nº 11.340/2006,
ser sábia e contornar as escapadas
dispõe sobre a criação dos Juizados
do marido”, recomendam as avós. A
de Violência Doméstica e Familiar e
ideia que predomina na sociedade é
estabelece medidas de assistência e
a de que os desejos masculinos são
proteção às mulheres em situação
mais incontroláveis e a traição para
de violência doméstica e familiar.
eles não significa nada por fazer
Todavia, mesmo após a lei, os
parte de seu “instinto”. Segundo
crimes passionais não diminuíram. 106
4. Crime passional
na vida dos passionais, é meramente episódico. Esses delinquentes, à
Quando falamos em crime passional,
devemos
verdade, não reincidem. Mas a
entender,
ameaça de pena exerce intimidação
primeiramente, sua definição. Essa
sobre todos. A impunidade açularia,
denominação é dada para quem
ao
comete um homicídio e diz que tal
passionalismo.
revés,
o
incremento
do
ação foi feita em nome do amor ou
A legítima defesa da honra
até mesmo por legítima defesa de
não é mais aceita pelos tribunais,
sua honra, que foi manchada com a
sendo inconstitucional devido ao
separação, por ver em outros braços
artigo 5º, I da Constituição Federal.
alguém
Este prevê a igualdade entre os
por
quem
nutria
um
sentimento de posse.
sexos. Assim, a honra do homem
Além desse sentimento de
tem o mesmo valor da honra da
posse, o desejo de vingança também
mulher. Além disso, a honra do
é
crime.
marido não pode ser manchada por
conduta
atitudes da esposa, ou vice-versa, já
a
ação
que a honra é um atributo pessoal: a
doentia
atitude de um indivíduo não pode
(patológica). Conforme afirmação de
contaminar ou atingir a honra do
Ivair Nogueira Itagiba (1958, p. 334
outro.
apud ELUFT, 2009, p. 134 - 135), o
“vingança”, e com relativa anuência
verdadeiro amor é resignação e
da sociedade, que considera a
autossacrifício, ternura e perdão...
traição feminina com mais rigor do
Transpira animalidade o amor que
que a traição masculina, o homicida
assassina,
egoísmo
não apenas mata, mas também
paroxístico, da sensualidade bestial,
confessa seu ato, pois para ele, não
da ameaça da exclusividade da
basta eliminar a vida; o importante é
posse, do despique do amante
que todos fiquem sabendo ou, em
preterido,
linguagem popular, ele busca lavar a
um
dos
motivos
do
Podemos
entender
passional
como
sendo
motivada
pela
paixão
gerado
do
ciúme
a
do
da
mulher
ofendida na vaidade, da prepotência
Todavia,
em
busca
de
honra com sangue!
da concupiscência e do ódio, a que
A emoção e a paixão, também
chama sentimento de honra. Nada
não
colhe o argumento de que o crime,
segundo o Código Penal: 107
excluem
a
imputabilidade
Art. 28 - Não excluem a Imputabilidade
A atenuante genérica prevista
penal:
no art. 65. III, c, última parte do CP,
I - a emoção ou a paixão;
difere da figura privilegiada do
Mas, na redação do Código
homicídio.
Naquela
o
crime
é
Penal, a violenta emoção provocada
praticado sob influência, e não
pela injusta provocação, é uma
domínio, de violenta emoção e sem
atenuante genérica:
o requisito logo em seguida, do
Art. 65 - São circunstâncias
homicídio privilegiado para o qual a
sempre
pena:
lei exige que o sujeito esteja sob o
agente:
domínio de violenta emoção. Já na
c) cometido o crime (...) sob a
atenuante, basta que o sujeito esteja
influência
sob a influência da violenta emoção.
que (...)
III
atenuam
-
ter
de
a
o
violenta
emoção,
provocada por ato injusto da vítima; Evidentemente pode
ser
ciúme
considerado
O privilégio exige reação imediata, já
não
a atenuante não. A consequência
injusta
direta da distinção está relacionada
provocação, pois é um sentimento
com
a
dosimetria
ligado à própria insegurança do
(OLIVEIRA, 2012) As
traições inexistente e, portanto não
coerentemente
se configura provocação injusta da
pesquisas revelam o crescimento da
vítima.
violência que as mulheres sofrem no possibilidade
devem
pena.
ciumento que, muitas vezes, fantasia
Outra
penas
da
dosadas,
ser pois
de
âmbito do lar. A cada 100 mulheres
privilegiar o crime passional consta
vítimas de homicídio, 70% delas são
no §1º do art. 121 do Código Penal,
vítima de um momento irracional de
preceituando que:
seus próprios companheiros. Um
(...) se o agente comete o crime
impelido
de
defesa do criminoso é a acusação de
relevante valor social ou moral, ou
adultério, mesmo que seja apenas
sob domínio de violenta emoção,
uma suspeita ou uma invenção.
logo
injusta
Diante do preconceito social, ainda
provocação da vítima, o juiz pode
enorme, a alegação toma facilmente
reduzir a pena de um sexto a um
a proporção de realidade e o
terço.
assassino passa a ser considerado a
em
por
seguida
motivo
dos subterfúgios mais usados em
a
vítima. Luiz Ângelo Dourado (apud 108
OLIVEIRA, 2012), especializado em
vida. Trata-se de pessoa de grande
psicologia criminal, entende que o
preocupação com sua imagem social
homicida passional não é vítima:
e sua respeitabilidade de macho.
É
acima
de
tudo,
um
Emocionalmente
é
imaturo
e
narcisista, ou seja, uma pessoa
descontrolado, presa fácil da “ideia
vaidosa,
fixa”. Assimilou os conceitos da
com
autoconfiança
exagerada. Estas pessoas passam a
sociedade
patriarcal
vida enamorada de si, elege a si
completa e sem crítica.
de
forma
próprio ao invés de aos outros, como
Podemos concluir que, para
objeto de amor. Reage contra quem
alguns homens, influenciados por
tiver a audácia de julgá-lo uma
uma criação machista, ainda aceita
pessoa comum, que pode ser traída,
na sociedade brasileira, a rejeição de
desprezada, e não amada.
uma mulher é inaceitável.
Perder
o
aquilo que ele considera ser “seu”
verdadeiro homicida passional, o
amor lhe daria, nessa lógica doentia,
que
o direito de matar. Desse modo, ou
Tanto
está
é
verdade
tomado
pela
que
loucura
amorosa, geralmente se mata após
com
o cometimento do homicídio. Na
emoção, ou do relevante valor moral,
realidade, todavia, é raro o suicídio
os defensores conseguem persuadir
passional, pois o sentimento de raiva
os jurados a julgar com certa
é dirigido contra a pessoa rejeitou o
permissividade
criminoso e não contra si mesmo, de
passionais. Essas atenuantes, na
modo que esse criminoso raramente
verdade, são maneiras indiretas e
se arrepende da vingança. Vale
estratégias retóricas disfarçadas que
ressaltar o perfil do passional, na
validam na prática a antiga legítima
conclusão de Luiza Nagib Eluf (2009,
defesa da honra, atenuando as
p. 236).
penas.
É homem, geralmente de
a
atenuante
Sendo
os
assim,
violenta
homicidas
embora
homicida
cometeram o delito), é egocêntrico,
apenado com a forma agravante,
ciumento e considera a mulher um
pois
ser inferior que lhe deve obediência
egocentrismo,
ao mesmo tempo em que a elegeu o
vingança, geralmente por meios
“problema” mais importante de sua
cruéis, ainda vinga no júri a tese
pratica
o
deva
o
meia idade (há poucos jovens que
109
passional
da
crime
impelido
ser
por por
privilegiada. Eluf (2009) apresenta
5. O crime passional nos tribunais
em sua obra a seguinte visão jurisprudencial:
Oliveira
O uxoricida passional, que pratica
o
crime
em
(2012)
relaciona
algumas decisões proferidas em
exaltação
crimes passionais.
emocional, pode apenas invocar a
1) Negando a qualificadora da
causa de redução de pena prevista
torpeza:
no §1º do artigo 121 do Código
O
ciúme
em
si
reprovável,
mesmo,
Penal, não porém a legítima defesa
embora
não
o
da honra” (TJSP, AC, Rel. Humberto
caracteriza. Embora seja sentimento
da Nova, RT 486/265).
que afeta o equilíbrio emocional do
Na verdade, tudo dependerá
homem, desencadeando instintos
da habilidade do advogado em fazer
primitivos de agressividade e posse
soar no júri as emoções moralistas
obsessiva,
que
sinonímia da torpeza47.
facilmente
podem
ser
não
se
insere
na
despertadas no caso dos crimes passionais. Se o advogado for
2) Negando a qualificadora do
eficiente nessa tarefa, poderá dar a
motivo fútil:
seu cliente homicida uma pena
Ciúme,
em
dos
que
este
irrisória. Nesse sentido vale citar
profundos
Corrêa (2003, p.40): no momento em
sentimento normalmente causa no
que os atos se transformam em
psiquismo do agente, não pode ser
autos, os fatos em versões, o
confundido com o motivo fútil48.
concreto perde quase toda a sua
Todavia,
importância e o debate se dá entre
desproporção
os atores jurídicos, cada um deles
(rompimento de um namoro) e o
usando a parte do ‘real’ que melhor
efeito da conduta (a morte da vítima),
reforce o seu ponto de vista. Neste
é razoável o enquadramento da
sentido, é o real que é processado,
conduta
moído, até que possa se extrair dele
futilidade49;
um esquema elementar sobre o qual
abalos
face
quando
na
gigantesca
entre
a
qualificadora
a
causa
da
3) Admitindo a qualificadora
se construirá um modelo de culpa e
da vingança:
um modelo de inocência.
É certo que a vingança, por si só, não torna torpe o motivo do 110
delito,
já
que
qualquer
passional, havendo controvérsias
vingança que o qualifica. Entretanto,
com relação às qualificadoras e ao
ocorre a qualificadora em questão se
homicídio privilegiado nesses casos.
o acusado, sentindo-se desprezado
Cada crime deve ser visto de acordo
pela
com suas particularidades, mas o
amásia,
não é
resolve
vingar-se,
matando-a 50.
esforço dos juristas deve ser no
4) Admitindo a atenuante do
sentido de conter e apenar com
relevante valor moral:
severidade os delitos de violência
Em tema de homicídio, a
homicida
contra
mulheres,
pois
atenuante do relevante valor social
como se viu, tais crimes merecem
ou moral é circunstância subjetiva
repúdio veemente da sociedade em
compatível com a qualificadora da
razão
surpresa 51.
quantidade enorme de incidências.
5)
Admitindo
o
da
banalização
e
da
homicídio
privilegiado: A decisão do Conselho de Sentença,
consentânea
com
Conclusão
a
confissão do réu reconhecendo o
A discriminação da mulher é
homicídio privilegiado e rejeitando a
uma
tese da legítima defesa, ajusta-se a
passado. A sociedade é machista e
o entendimento no sentido de que o
as mulheres aceitam isso. Apesar
conceito
ser
de hoje em dia ser vedado o
eminentemente pessoal, não se
preconceito, podendo a pessoa que
coaduna com ato de infidelidade da
sofreu tal atitude entrar com uma
companheira, nem confere ao varão
ação de indenização, só isso não é
o direito de ceifar-lhe a vida, ainda
suficiente para servir de exemplo.
que
a
de
honra,
eclosão
decorrente
do
emocional,
possa
por
de
questão
que
começa
no
violência,
Em termos de julgamento, as
descontrole
circunstâncias particulares é que
minorar
a
determinarão a admissibilidade ou a
reprovabilidade da conduta 52.
coexistência das qualificadoras, ou
Pelo exposto, percebe-se que
da forma privilegiada. É verdade
os tribunais divergem quanto à
que, se em um julgamento de crime
aplicação das minorantes e das
passional, a defesa utilizar, ainda
majorantes
de
pena
no
crime 111
que indiretamente, o argumento da
ter traído a esposa ou companheira,
legítima defesa da honra, e os
(numa
jurados acatarem, o Tribunal poderia
(PAULOLOPES,
até rever esse Júri, pois teria havido
acontecia
um
resolvessem também lavar a honra
julgamento
contrário
a
um
princípio constitucional. Mas vale lembrar que o ideal
média
nacional)
2011),
se
as
exterminando
os
Evidentemente
essa
o
que
mulheres
adúlteros? hipótese
para a sociedade seria a abolição
assusta e parece absurda, pois
definitiva
que
contraria a tradição e, além disso,
possibilita as formas privilegiadas
instalaria o caos social. A reação que
em crimes passionais, como medida
temos a essa construção mental,
de contenção da barbárie que se vê
meramente hipotética, por si só,
diariamente no Brasil. Diariamente
evidencia como a disparidade de
10 mulheres são mortas por seus
tratamento jurídico e social aqui
maridos e namorados, na maioria
denunciada é real.
do
entendimento
das vezes em razão de abandono ou adultério.
morrem
com a educação para a igualdade e
apanham e ficam marcadas física e
o respeito à vida e culminar com
psicologicamente.
julgamentos
O
As
que
combate
não
A mudança deve começar
que
violência
intimidem a prática de violências
doméstica é amplamente propagado
dessa natureza, equiparando as
pelas mídias e instituições estatais.
condutas masculinas e femininas
Mesmo assim, a cada 100 mulheres
diante do preceito supremo da
assassinadas
isonomia.
pelo
à
equânimes
companheiro,
apenas um homem é vitimado nas Notas
mesmas circunstâncias. As penas, portanto, devem ser duras, para que
47. 69 RJTRGS, 114/115. 48. RJTRGS, 87/82. 49. RJTRGS 132/123. 50. TJSP-AC-Rel Jarbas Manzzoni, RT, 593/310.
o ideal da redução da violência doméstica seja finalmente atingido. Ademais, se considerarmos o fato de que 70,8 % dos homens assumem
112
REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado. 1988. BUENO, Francisco da Silveira. Minidicionário da língua portuguesa. Ed. rev. e atual. por Helena Bonito C. Pereira, Rena Signer. São Paulo: FTD: LISA, 1996. CORRÊA, Mariza. Morte em Família. Rio de Janeiro: Graal,1983. COTES, Paloma. Assassinos ainda lavam a honra com sangue e são absolvidos na justiça. Diário Vermelho, São Paulo, 9 jul. 2004. Disponível em: http://www.vermelho.org.br/diario/2004/0209/0209_lavar_honra.asp. Acessado em 12 de set. 2011. ELUFT, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres de Pontes Visgueiro a Lindemberg Alves. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. LÓPEZ, Emílio Mira y. Quatro gigantes da alma. Tradução e rev. e prefaciada por Cláudio de Araújo Lima. 27. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2010. OLIVEIRA, Lucielly Cavalcante. Homicídio passional: qualificado ou privilegiado?disponível em:http://jusvi.com/artigos/22121/2. Acesso em 20 de janeiro de 2012. PAULOLOPES. http://www.paulopes.com.br/2008/11/traio-feminina-cresce-emasculina-cai.html PEGO, Natália César Costa de Matos. Crimes passionais: atenuantes x agravantes. Monografia. Presidente Prudente: 2007. Disponível em: <http://intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/Juridica/article/viewFile/622/63 7> Acesso em: 15 abril 2011. WIKIPÉDIA. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Amor >. Acesso em: 18 maio 2011, às 20h05min.
113
LARANJA MECÂNICA; JUVENTUDE, ESTADO E SOCIEDADE FACIONI, Fernando Alberto de Jesus Lisciotto. Discente do 8º Período do Curso de Direito da UNIFEV – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO Laranja Mecânica (A Clowork Orange), um filme britânico de 1.971, dirigido por Stanley Kubrick, mostra em seu enredo a história vivida por Alex (Malcolm McDowell), um jovem pervertido, cujos hábitos agressivos são as determinantes de um processo de ressocialização que o submetem. Atualmente, verifica-se no contexto pátrio uma verdadeira identidade comportamental com aquela protagonizada no filme. Os jovens brasileiros, cada vez mais, estão protagonizando a violência e a criminalidade. A inércia do Estado e da Sociedade, em promover ações materializadoras dos preceitos constitucionais a fim de impedir que jovens sejam autores e ao mesmo tempo vítimas de seu ímpeto, de seu comportamento afoito, tem sido um fator contributivo para que a situação se agrave mais. Através de uma abordagem comparativa entre o filme e o cenário brasileiro, o objetivo deste trabalho é demonstrar a identidade existente entre o filme e a situação crítica dos jovens com a finalidade de se criar uma reflexão acerca desta realidade, demonstrando-se também a culpa que a Sociedade o Estado concorrem nesta ocorrência. Para tanto foi utilizado o método dialético, bibliográfico e audiovisual.
Palavras-chave: Laranja Mecânica. Identidade com a juventude atual. Responsabilidade do Estado e da Sociedade pela marginalização Juvenil. Comparações entre o filme e a situação atual dos jovens. 114
Hoje pode transformar e o que diria
as semelhanças do filme com o que
a juventude.
o jovem vivencia, atualmente. Valeu-
Um dia você vai chorar, vejo claras
se do método dialético, bibliográfico
fantasias[...]
e audiovisual.
Eu entendo a juventude transviada[...]
1. Uma breve abordagem do filme
(Luiz Melodia: Juventude
laranja mecânica
Transviada) Laranja Mecânica (A Clowork Orange), um filme britânico de 1.971, dirigido por Stanley Kubrick, mostra
Introdução
em seu enredo, a história vivida por uma
Alex (Malcolm McDowell), um jovem
abordagem comparativa entre o
pervertido, cujos hábitos agressivos
filme Laranja Mecânica e a realidade
são
brasileira dos jovens. O objetivo é
processo de ressocialização que o
demonstrar a identidade existente
submetem.
Este
trabalho
visa
as
determinantes
de
um
entre o filme e a situação crítica dos
Ele lidera uma gangue de
jovens com a finalidade de se criar
jovens arruaceiros, aos quais ele se
uma reflexão acerca desta realidade,
refere
demonstrando-se também a culpa
etimologicamente
que
Estado
termo russo Drug, que se significa
ocorrência.
amigo. Junto com seus amigos, ele
a
Sociedade
concorrem
nesta
Primeiramente
o
far-se-á
como
comete
uma
“droogs”,
anarquia
palavra
relacionada
e
ao
crueldade,
explanação sobre o filme, e em
agredindo indivíduos aleatórios, sob
seguida
o
será
demonstrada
a
efeito
de
substâncias
psicotrópicas.
identidade entre o contexto do filme com a manifestação irresponsável e
Desse sadismo, o que mais se
delinquente dos jovens brasileiros.
destaca, é uma invasão à casa de
Após,
um escritor, agredido por Alex, ao
será
tratado
sobre
a
Responsabilidade do Estado e da
tempo
em
que
seus
amigos
Sociedade neste panorama. Ao final,
estupram a esposa do escritor,
se concluirá com uma análise entre
enquanto o protagonista canta a música Singin' in the Rain (cantando 115
na chuva); e um assalto conspirado
tem a má-sorte de se reencontrar
por seus amigos, onde Alex acaba,
com pessoas, cujas quais, ele, no
fatalmente, ocasionando o óbito da
passado praticara injustiças. Estas,
vítima, e depois traído por seus
movidas
pelo
“droogs”.
vingança,
acabam
sentimento
de
retribuindo-lhe
Em decorrência da traição dos
todas as barbaridades que dele
amigos, a polícia captura Alex. Ele é
sofreram. Como se não bastasse, os
julgado, e sentenciado a 14 anos de
ex-amigos integram a polícia local,
prisão. Após cumprir dois anos da
reencontram-no,
pena, ele é condicionado a um
vingam dele. Após espancá-lo, o
tratamento experimental, criado pelo
abandonam em um local ermo e
governo,
distante.
como
método
de
prevenção da delinquência. Trata-se do
Tratamento
Ludovico,
e
também
se
Para se proteger da chuva,
uma
ele busca ajuda numa casa que
terapia experimental de aversão,
encontra, e para seu azar, é a casa
consistente no uso coordenado de
do escritor que ele, no passado,
substâncias do paciente, que ao
havia invadido, mas que devido ao
mesmo tempo, assiste cenas de
seu estado, não se recordava. O
violência. Durante este período o
mordomo atende a porta e se
paciente enfrenta uma experiência
comove com o estado do jovem,
de
refugiando-o com o consentimento
quase-morte.
purificação
Busca-se
do
paciente
a pela
do
patrão,
que
inicialmente
repetição do método. O indivíduo
desconhece a identidade de Alex.
submetido ao tratamento assimila a
Entretanto, posteriormente, ambos
violência observada com a sensação
se reconhecem, mas não denotam
tida durante o tratamento, e torna-se
nenhuma reação. É que na verdade,
incapaz ou indisposto de agir com
o escritor, oculta o sentimento de
violência ou testemunhar a sevícia.
vingança, por ter presenciado o
O
tratamento
positivamente experimento
em é
Alex,
divulgado
rende
estupro da esposa, e mais tarde esta
e
ter vindo a óbito.
o pelo
O
escritor,
que
em
governo. O jovem é recolocado na
decorrência da violência remota que
sociedade. Porém, a família o rejeita,
sofrera de Alex e seus amigos,
e ele fica desabrigado. Na rua ele
restou paraplégico, troca a vingança 116
por seus interesses políticos, os
estão protagonizando a violência e a
quais consistem na depreciação do
criminalidade.
método divulgado pelo governo, no
discutem-se diariamente soluções
qual Alex foi cobaia; com o intuito de
para a delinquência juvenil, inclusive
afastar o Ministro de Interior de seu
defendendo-se pela redução da
cargo, e fazer o partido deste,
imputabilidade penal.
sucumbir nas eleições próximas.
Por
conta
disso,
Hoje o que se vê é a
Para tanto, junto com amigos, o
irresponsabilidade
escritor faz com que o jovem relate
jovens, que usualmente, acabam
as minúcias do tratamento, e, após,
deturpando a ordem social. Além
provoca o pânico em Alex, através
disso, observa-se o surpreendente
dos efeitos colaterais do tratamento
recrutamento
de Ludovico, fazendo com que o
jovens. Quadrilhas expandem suas
jovem tente o suicídio.
atuações delituosas com a maçante
Após frustrada a tentativa do
crescente
criminoso
dos
destes
participação de jovens. Segundo
suicídio, o fato, e tudo o que foi
Costa:
relatado por Alex, é divulgado a
De fato, em uma sociedade
público pelo escritor e o governo
em que meninos de oito anos
passa a ser criticado pela mídia. Em
desempenham cargos de vigia ou
razão disso, o Ministro de Interior,
"avião" dos esquemas de trafico das
procura,
no
favelas e morros dominados pelos
Hospital e com ele transaciona, a fim
criminosos, recebendo gratificações
de obter vantagens políticas. O filme
que chegam a superar os salários
termina com os dois se exibindo
mensais de seus pais, o caminho
lado-a-lado perante fotógrafos.
natural
pessoalmente
Alex
destas
crianças
é,
ao
tornarem-se adolescentes, subirem 1.2 Da ligação da personalidade de
na escala hierárquica do crime,
Alex com os jovens de hoje
galgando cargos e encargos mais importantes na mesma.
Atualmente, contexto identidade
pátrio
verifica-se uma
no
As
verdadeira
comportamental
obviamente,
com
preponderante
quadrilhas parte da
são,
integrante vida
e
dessas
aquela protagonizada no filme. Os
comunidades pobres da periferia,
jovens brasileiros, cada vez mais,
esquecidas pelos poderes públicos, 117
tendo como única presença efetiva
Duas estudantes morreram,
dos mesmos naquelas áreas apenas
após serem atropeladas por um
a polícia, com toda a carga negativa
motorista de 17 anos, em Guarulhos,
que esta historicamente representa
na Grande São Paulo. O acidente
para as classes menos favorecidas.
ocorreu na madrugada de domingo.
O poder público, em tais regiões,
As estudantes Gabriely Alves
parece isentar-se de seu dever como
da Cunha, de 11 anos, e Janine
agente cooptador de recursos, de
Casimiro Novaes, de 18, foram
programas
de
atropeladas. Uma mulher de 44 anos
outras,
também foi atingida e chegou a ficar
deixando brechas sociais, que são
presa nas ferragens. O motorista que
aproveitadas
organizações
atropelou as três fugiu sem prestar
criminosas para atuarem nessas
socorro. (EBAND, Disponível em:
comunidades
benfeitores,
<http://www.band.com.br/primeirojor
suprimindo uma responsabilidade do
nal/conteudo.asp?ID=10000041464
Estado. Nestas, graças à astuta e
7>)
sociais,
infraestrutura,
dentre
pelas
como
calculada atitude dirigentes, encontra respeito
obras
o
adotada
Jovens de classe média se
favelado
uniram pra formar uma quadrilha de
fraternidade,
ladrões, no interior de São Paulo.
jovem
dinheiro, e
pelos
ascensão
social
no
Segundo a polícia, usando charme e
ambiente onde vive, tornando-se
sobrenome importante, os rapazes
"alguém" na sociedade local, embora
conseguiam
para a sociedade em geral passe a
privilegiadas para praticar arrastões
ser um marginal. (2004, Disponível
em residências.
em:
informações
[...] A maioria mora em casas <http://jus.uol.com.br/revista/t
confortáveis em Franca, conhecida
exto/5076/violencia-juvenil-
como a capital nacional do calçado.
resultado-da-marginalizacao-da-
E,
juventude-pela-sociedade-de-
segundo
a
polícia,
nenhum
trabalha ou estuda. (FANTÁSTICO,
consumo>).
Disponível
em:
<http://fantastico.globo.com/Jornalis Como exemplos atuais dessa
mo/FANT/0,,MUL1662714-
marginalização:
15605,00.html>
118
A estes se unem muitos
bairro, as festas e bailes, a ajuda
outros casos de grande repercussão,
para comprar o gás, a cesta básica
por
Suzane
ou o caixão. Esta corrupção social
Richthofen e o recente homicídio que
apresenta-se, realmente, como o
a estudante Verônica Verone, 18
pior tipo de corrupção pois, enquanto
anos, confessou ter praticado contra
na outra se compra e corrompe
o
apenas o indivíduo, afasta-se o
exemplo,
o
empresário
de
Fábio
Gabriel
Rodrigues.
escrúpulo e a honestidade pessoal, nesta se corrompe e compra a
2. Responsabilidade social e estatal
própria sociedade, com a propina do
pela marginalização do jovem
benefício à comunidade, que assim é levada a compactuar com a
Ainda delinquência
Segundo juvenil
Costa, tem
a
organização criminosa e a aceitar
boa
seus
contribuição da sociedade:
chefes e
membros
como
benfeitores e cidadãos exemplares,
o poder corruptor, cuja força e
tornando-se praticamente cúmplice
atividade são conhecidas a séculos,
dos criminosos. (2004, Disponível
agindo sempre como um "quinta
em:
coluna" dentre as hostes do combate
<http://jus.uol.com.br/revista/t
ao crime, e que coloca em cheque
exto/5076/violencia-juvenil-
todo
o
aparato
político-policial-
resultado-da-marginalizacao-da-
judicial do Estado e a própria
juventude-pela-sociedade-de-
sociedade,
agindo
de
maneira
consumo>).
silenciosa e subterrânea, criando áreas
de
impunidade
e
Além da corrupção existente,
invulnerabilidade. Deve-se entender
Freitas e Papa atribuem ao processo
como corrupção não apenas o
de desinstitucionalização dos jovens
suborno em espécie, a propina que o
outros fatores, quais sejam: a crise
traficante
da
distribui
a
políticos,
família
tradicional
à
policiais ou juízes para facilitar sua
multiplicidade
liberação ou dos seus comparsas
neofamiliares que se fundam na
mas, também, o favor que é feito ao
transação,
morador do bairro, a praça de
autoridade dos pais; a falta de
esportes doada à Associação do
perspectivas pelos jovens, que já 119
dos
aliada
núcleos
enfraquecendo
a
não
possuem
expectativas
de
disposição
ascensão social e a exploração que os
jovens
fazem
de
do
artigo
227
da
Constituição Federal:
novas
Art. 227. É dever da família,
condições, isto é, a busca de novos
da sociedade e do Estado assegurar
interesses, rompendo, assim com o
à criança, ao adolescente e ao
tradicionalismo (2008, p. 23-24).
jovem, com absoluta prioridade, o
Pode-se ressaltar também, o
direito
à
vida,
à
saúde,
à
comodismo estatal, que em sua
alimentação, à educação, ao lazer, à
atuação, tem posto à margem a
profissionalização,
manutenção
As
dignidade, ao respeito, à liberdade e
poucas políticas que se teve nos
à convivência familiar e comunitária,
últimos anos neste sentido, refletem,
além de colocá-los a salvo de toda
na verdade “a ausência de uma
forma de negligência, discriminação,
proposta clara do governo federal
exploração, violência, crueldade e
para a população juvenil do país e
opressão.
seu
deste
lugar
no
contexto.
modelo
desenvolvimento
à
cultura,
à
de
A nova redação deste artigo
pretendido”
foi dada pela emenda 65/2010, e o
(FREITAS; PAPA, 2008, p. 66).
objetivo foi a inserção dos jovens no
No Brasil, nos últimos 15 anos
manto
constitucional.
Assim,
é
uma nova experiência democrática
possível atribuir responsabilidade à
se desenha a partir do poder
Sociedade e ao Estado pela conduta
executivo municipal ou, com menor
negligente, e que em decorrência
intensidade,
desta, se assiste o aumento da
no
nível
estadual,
propondo a construção de uma
irresponsabilidade
interação entre sociedade civil e
crescente submersão dos jovens na
Estado, para a conformação de uma
delinquência, além de muitas vezes
esfera
vitimá-los.
pública
democrática.
juvenil
e
a
(FREITAS; PAPA, 2008, p. 67). Interessante
que
há
fundamento constitucional para que
Conclusão
a Sociedade e o Estado, ambos, conjuntamente, cenário,
combatam
conforme
o
teor
este
Verificou-se neste trabalho,
da
comparando
120
o
contexto
cinematográfico do filme Laranja
invés de reeducar os jovens para
Mecânica com o contexto social
que estes estejam aptos ao convívio
atual pátrio uma ampla identidade.
social, na verdade os educa para
Alex, o protagonista do filme,
que eles sejam mestres, doutores,
representa nossos jovens, afoitos e
PhD’s em delinquência. Compare-se
irresponsáveis. Seu comportamento
ainda o método do filme, com o
bárbaro, não está longe de ser
método utilizado no Ensino Público,
enxergado no Brasil. Hoje, a maior
que na verdade engana e não
parte da população juvenil rompeu
ensina.
com os valores tradicionais. Vemos
Por fim, é correlacionado o
jovens delinquentes, ansiosos e
acordo entre o Ministro e Alex com
intolerantes. Jovens que agridem,
as
idosos,
prometidas por políticos, que na
professores,
namoradas.
mendigos,
vantagens
Vemos
jovens
homicídio,
estupros.
pela mobilização da massa jovem
Vemos jovens autores de bullying.
nas teclas das urnas eletrônicas;
Jovens que não respeitam os pais,
também possível de ser comparado
jovens que não respeitam as leis.
com o falso encanto dos projetos
cometendo
verdade
A traição que sofreu de seus
somente
pré-eleitorais
interessam-se
criados por agentes públicos, que
“droogs” é perfeitamente comparável
superficialmente
com a traição que nossos jovens
resolver a situação em que os jovens
sofrem com os sujeitos obrigados à
se encontram atualmente, mas que
norma do art. 227 da Constituição
na verdade são meras abstrações
Federal, ou seja, é comparável com
ineficientes, com um único resultado:
a inércia da Sociedade e do Estado
a dilapidação dos cofres públicos.
em zelar pela aplicabilidade do dispositivo
constitucional,
em
materializar políticas que coíbam que os jovens sejam autores e ao mesmo
tempo
vítimas
de
seu
ímpeto, de sua rebeldia. Compare-se o método de Ludovico, cruel e ineficiente, com o nosso falho sistema prisional, que ao 121
destinam-se
a
Referências BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 26 de Maio de 2.011. COSTA, Mauricio Daltro. Violência juvenil, resultado da marginalização da juventude pela sociedade de consumo. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 279, 12 abr. 2004. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/5076>. Acesso em: 25 maio 2011. EBAND, Do Primeiro Jornal. Jovem de 17 anos atropela e mata duas estudantes na Grande SP. Publicado em 28 de Março de 2.011. Disponível em: <http://www.band.com.br/primeirojornal/conteudo.asp?ID=100000414647> Acesso em: 26 de Maio de 2011. FANTASTICO. Quadrilha de jovens de classe média rouba mais de R$ 1 milhão. Disponível em: <http://fantastico.globo.com/Jornalismo/FANT/0,,MUL166271415605,00.html> Acesso em: 26 de Maio de 2.011. FREITAS, Maria Virgínia de. PAPA, Fernanda de Carvalho. Políticas públicas: juventude em pauta. 2. ed. São Paulo: Cortez; Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Informação; Fundação Friedrich Ebert, 2008. G1, Rio de Janeiro. Polícia terá dados telefônicos de Verônica e empresário assassinado. Disponível em: <http://g1.globo.com/rio-dejaneiro/noticia/2011/05/policia-tera-dados-telefonicos-de-veronica-eempresario-assassinado.html> Acesso em: 26 de Maio de 2011. LARANJA MECÂNICA, A Clockowork Orange. Direção e Produção: Stanley Kubrick. Elenco: Malcolm McDowell (Alex DeLarge); Patrick Magee (Frank Alexander); Michael Bates (Chefe Barnes); Warren Clarke (Dim); Adrienne Corri (Sra. Alexander); Carl Duering (Dr. Brodsky); Paul Farrell (Tramp); Clive Francis (Lodger); James Marcus (Georgie); Aubrey Morris (P.R. Deltoid); Godfrey Quigley (Chaplain); Michael Glover (Diretor do presídio). Roteiro: Stanley Kubrick, baseado em livro de Anthony Burgess. Edição: Bill Butler: Warner Bros.; Hawk Films Ltd.; Polaris Production. Inglaterra, 1971; 138 min. WIKIPÉDIA, A Enciclopédia Livre. Laranja Mecânica (filme). Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Laranja_Mec%C3%A2nica_%28filme%29> Acesso em: 26 de Maio de 2011.
122
MONITORAMENTO ELETRÔNICO DE PRESOS PADUAN, Rafael José – Discente do 7º período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga-SP. SAMPAIO FILHO, Walter Francisco – Docente do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO A pesquisa versará sobre a utilização do monitoramento eletrônico em condenados, pela Lei 12.258 de 15 de junho de 2010 que altera o Código Penal e a Lei de Execução Penal para prever a possibilidade do monitoramento nos casos em que a lei autoriza. O método empregado é o não-empírico, bibliográfico e dialético.
Palavras-chave: Poder. Punitivo. Penas. Monitoramento. Eletrônico.
123
para a existência de uma sociedade
Introdução O
tema
discutido
neste
harmoniosa.
Assim,
desrespeitasse
tal
quem
ordenamento
de
estaria
de
deveria ser punido por quem detinha
condenados, existe a possibilidade
o poder, aparecendo a figura do
de utilização de equipamento de
soberano, impondo uma pena ao ato
vigilância indireta pelo preso nos
ilícito, para que se restabelecesse a
casos em que específica a lei. Na lei
paz social e alcançasse o bem
de execução penal o preso não seria
comum.
trabalho
é
a
monitoramento
nova
lei
eletrônico
praticando
um
crime
e
Como consequências foram
vigiado em suas saídas, mas com o novo sistema mais presos poderão
criados
sair para trabalhar e assim desafogar
assegurar o convívio harmonioso em
os presídios, buscando a verdadeira
sociedade, entre eles o direito penal,
finalidade da pena, respeitando-se o
que tem na norma jurídica a função
princípio da humanidade das penas.
de descrever infrações e organizar sanções
diversos
sistemas
(penas e
para
medidas de
segurança), outorgando ao Estado
1. PODER PUNITIVO DO ESTADO
(atualmente) o direito de punir. Aparece
Com o passar dos anos
o
chamado
ius
homens independentes e isolados
puniendi estatal, pois compete ao
começaram
em
Estado punir aquele que violar o tipo
sociedade por uma questão de
penal e, criar normas jurídicas,
sobrevivência, cansados de viver em
estabelecendo
estado de guerra e de ter uma
infrações e destinando-lhes penas
liberdade inútil pela incerteza de sua
ou medidas de segurança.
a
agrupar-se
condutas
Observa-se
continuidade. Começaram a interagir
como
em
três
com outros homens e uma parte
momentos esse ius puniendi estatal.
desta liberdade foi sacrificada, mas
O primeiro aparece no surgimento do
trouxe segurança e tranquilidade.
direito penal objetivo, sendo a edição
Dessa maneira foram estabelecidas
de leis que tornam determinada
regras, nas quais cada um deveria
conduta
agir dentro do novo ordenamento
segundo,
fato
determinada 124
no
típico ato sanção
punível; de
o
impor
quando
a
conduta do agente violar o disposto
2. Das penas
na legislação vigente e, por último o direito que possui de executá-la.
A pena é a consequência para
Segundo Montesquieu (apud
o agente que cometeu um crime
BONESANA, 1997, p. 42): Toda
tipificado no ordenamento jurídico
pena que não derive da necessidade
penal.
absoluta é tirânica.
O
impor
determinada
sanção
a conduta de um homem e não uma ficção.”
respeitando o caráter humanitário da pena,
surgem
fontes
Neste sentido uma conduta só
mediatas do Direito Penal, sendo,
será punível quando o agente puder,
uma delas, os Princípios Gerais do
no mínimo, prever a possibilidade de
Direito. (BITENCOURT, 2009, p. 10).
ofensa a um bem juridicamente
Para
algumas
penal, segundo
Pierangeli (1999, p. 228), “[...] pune
Para orientar o aplicador da lei a
código
que
esse
caráter
tutelado, se este não agir com culpa
humanitário da pena seja respeitado
ou dolo, será considerado um fato
há alguns princípios do direito,
atípico.
chamados de princípios que limitam o
poder
punitivo
conhecidos
como:
do
O
Estado,
princípio
Código
Penal
vigente
estabelece em seu artigo 32, quais
da
são as espécies de pena: privativas
legalidade ou reserva leal; princípio
de liberdade, restritiva de direitos e a
da ampla defesa e do contraditório;
de multa.
princípio da intervenção mínima;
As penas restritivas de direito
princípio da culpabilidade; princípio
aparecem
da irretroatividade da lei Penal;
privativas
princípio
suspendendo
da
adequação
social;
em
substituição de certos
das
liberdade, direitos
princípio da insignificância; princípio
individuais, e de acordo com o artigo
da
da
43 do Código Penal podem ser: a)
individualização da pena; princípio
prestação pecuniária; b) perda de
da proporcionalidade; princípio da
bens e valores; c) prestação de
humanidade das penas.
serviço à comunidade ou a entidades
ofensividade;
princípio
públicas; d) interdição temporária de direitos e; e) limitação de final de semana. 125
Para aplicação da pena de
estabelecimento similar à noite e nos
multa o Código Penal adotou o
dias de folga.
critério de dia-multa, pagando ao
Estas
penas
deverão
ser
fundo penitenciário a quantia fixada
executadas de forma progressiva,
na sentença e calculada em dias-
podendo ocorrer a substituição do
multa.
será
regime a que estiver sujeito o
atualizado pelos índices de correção
condenado, por seu próprio mérito,
monetária.
do mesmo modo pode ocorrer o
O
As
valor
da
penas
multa
privativas
de
inverso, a regressão, por exemplo, o
liberdade que restringem o direito de
condenado
locomoção do agente, sendo dividida
semiaberto e vem a cometer novo
pelo
delito penal, poderá ser transferido
legislador
em
reclusão
e
detenção. A pena de reclusão admite
que
cumpri
regime
para o regime fechado.
condenação nos regimes fechado, semiaberto ou aberto, ao passo que
3. Finalidade das penas
a detenção só admite a imposição dos regimes semiaberto ou aberto.
De acordo com Bonesana
O regime fechado consiste no cumprimento
da
em
da pena é impedir que o réu cometa
segurança
novos delitos prejudicando outras
máxima ou média, na penitenciária,
pessoas e inibir outros a praticar os
cadeia pública ou casa de detenção.
mesmos delitos.
estabelecimento
No
regime
pena
(1997, p. 62), a principal finalidade
de
semiaberto
o
O Código Penal eleva como
cumprimento da pena será em
fim da pena a ressocialização do
colônia
condenado,
agrícola,
industrial
ou
tornando
apto
ao
estabelecimento similar e é imposta
convívio na sociedade. O sistema
aos condenados não reincidentes
brasileiro é considerado misto, pois
cuja pena seja superior a 04 (quatro)
não
anos e não exceda a 08 (oito),
retribuição e a prevenção, onde tais
observado o art. 59 do Código Penal.
fatores são somatórios. A Lei de
No
Execução
regime
aberto
o
apenado
existe
hierarquia
Penal
entre
a
busca
trabalha ou frequenta cursos em
principalmente a ressocialização do
liberdade, durante o dia, e recolhe-se
condenado.
à
casa
de
albergado
ou 126
4. Das medidas de segurança
determinar-se de acordo com esse entendimento.
Possui como conceito ser
O juiz proferira uma sentença
uma sansão penal imposta pelo
absolutória
Estado,
absolver o réu, mas aplica-se a
na
execução
de
uma
sentença, tendo como finalidade exclusivamente
preventiva,
típica que demonstre periculosidade,
presos
novas
ira
para 5.
a
pois
medida de segurança.
evitar que o autor de uma infração
potencialidade
imprópria,
Monitoramento
eletrônico
de
ações
danosas, volte a delinquir.
A Lei nº 12.258 de 15 de junho
No Código Penal é adotado o
de 2010, autoriza o monitoramento
sistema vicariante, não sendo aceito
eletrônico de condenados nos casos
a aplicação de pena e medida de
de saída temporária no regime
segurança.
semiaberto e de prisão domiciliar.
O inimputável ao praticar uma
O condenado será advertido
conduta típica e ilícita, deverá ser
sobre os cuidados que deverá ter em
absolvido,
ser
relação ao equipamento eletrônico e
aplicada a medida de segurança,
os seguintes deveres: receber visitas
que possui uma finalidade diferente
do
da pena. A finalidade da medida de
monitoração, responder aos seus
segurança se destina a cura do
contatos e cumprir suas orientações;
inimputável, dando um tratamento
não remover, violar ou modificar de
aquele que praticou o ilícito.
qualquer maneira o aparelho da
O
contudo,
deverá
inimputável
está
servidor
responsável
pela
monitoração, ou permitir que outra
assegurado pelo Código Penal em
pessoa faça.
seu artigo 26, pois dispõe que será
O condenado que não cumprir
isento de pena o agente que, por
com
doença mental ou desenvolvimento
revogado a sua autorização de saída
mental incompleto ou retardado, era,
temporária,
ao tempo da ação ou da omissão,
medida cautelar, além de regressão
inteiramente incapaz de entender o
do regime e advertência por escrito
caráter
no caso do juiz da execução decida
ilícito
do
fato
ou
de
127
seus
deveres
prisão
poderá
domiciliar
ter
ou
não aplicar alguma das medidas
Conclusão
acima. O
meio
monitoração
utilizado
para
eletrônica
a
O legislador deu um grande
dos
avanço editando esta lei, pois dessa
condenados poderá ser por meio de
maneira
pulseiras ou tornozeleiras.
maneira mais eficaz o condenado,
pode-se
controlar
de
Também poderá ser revogada
inibindo-o a prática de novos delitos
quando se torna desnecessária ou
penais. Porém, o método utilizado
inadequada e se o acusado ou
deveria ser outro, sendo utilizada a
condenado violar os deveres a que
introdução de chip no corpo do
estiver sujeito durante a sua vigência
condenado, para a monitoração
ou cometer falta grave.
invés de pulseiras, por ficarem
O artigo 23 da Resolução nº
aparentes
e
assim
causar
113, de 20 de abril de 2010, autoriza
constrangimento à imagem do preso.
o
E este, teria dificuldade na tentativa
monitoramento
eletrônico,
na
execução de medida de segurança.
de remoção do objeto, pois as
Nas épocas em que são
pulseiras e tornozeleiras são de fácil
concedidos saídas temporárias, há
remoção.
presos que não retornam para as
recompensar o mal ao bem, pois o
penitenciárias.
reconhecimento torna-se um fardo,
aumentam
Nesta
época
significativamente
os
delitos,
pequenos
furtos,
dificilmente
polícias
visto como um prazer.
vandalismos, roubos,
que
chegarão
sociedade
prefere
já o desejo de se vingar sempre é
crimes nas cidades, pois ao saírem cometem
A
à
autoria. Assim monitorados estes não irão se envolver em ocorrências, para não perder tal benefício.
128
Referências BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. BONESANA, Cesare. Dos delitos e das penas. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997. BRASIL. Constituição 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado. 1988. BRASIL. Lei 12.258 de 15 de junho de 2010. Altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), e a Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), para prever a possibilidade de utilização de equipamento de vigilância indireta pelo condenado nos casos em que especifica. Brasília, 15 de junho de 2010. BRASIL. Resolução nº 113, de 20 de abril de 2010. Dispõe sobre o procedimento relativo à execução de pena privativa de liberdade e de medida de segurança, e dá outras providências. BRASIL. Vademecum. Direito penal. São Paulo: Saraiva, 2011. CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 8. ed. revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2005. FABRIS, Lucas Rocha. Monitoramento eletrônico de presos. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2594, 8 ago. 2010. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/17136>. Acesso em: 23 maio 2011. GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 12. ed. Revista, ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Impetrus, 2010. PIERANGELI, José Henrique. Escritos jurídicos – penais. 2. ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos tribunais, 1999.
129
NULIDADE PARCIAL SEM REDUÇÃO DE TEXTO – O CONFLITO DE NORMAS CARMO, Bruna Marques – Discente do 8º Período do Curso de Direito da UNIFEV – Centro Universitário de Votuporanga. SAMPAIO FILHO, Walter Francisco. Docente do Curso de Direito da UNIFEV - Centro Universitário de Votuporanga. PIGNATARI, Nínive Daniela Guimarães. Docente do Curso de Direito da UNIFEV – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO A justiça e a razoabilidade das decisões somente são alcançadas quando os princípios constitucionais de direito prevalecem como vigas mestras, afinal, o apego à letra da lei, não raro se mostra ineficaz; daí o poder e dever do operador do direito se valer dos mecanismos que estão a sua disposição na busca da justiça e da segurança jurídica. O presente artigo pretende chamar a atenção para uma questão ainda pouco examinada, a nulidade parcial sem redução de texto. Para tanto é introduzido neste trabalho um caso concreto em que incide sua aplicabilidade e traz à discussão o instituto do arrependimento posterior frente aos princípios constitucionais de direito. Utilizando-se do método dialético aplicado a pesquisa bibliográfica, será possível vislumbrar que, de acordo com a situação fática e os princípios constitucionais, a aplicação da nulidade parcial sem redução de texto deve prevalecer, tanto como meio para o controle de constitucionalidade, como para atender ao anseio social de JUSTIÇA.
Palavras-chave: Nulidade parcial sem redução de texto. Princípios constitucionais. Controle de constitucionalidade. Arrependimento posterior. 130
normativos e especialmente evita-se
Introdução
a aplicação de normas injustas. Por fim, o objetivo deste
Este artigo visa abordar a técnica da nulidade parcial sem
estudo
redução de texto, dada sua eficácia
mecanismo
no controle constitucional de normas
constitucional de nulidade parcial
incompatíveis. Não raro, o intérprete
sem redução de texto em conjunto
do direito se vale da pura e simples
com o instituto do arrependimento
aplicação do texto legal, o que
posterior,
constantemente
disparidade
entre
ineficaz à justiça e à expectativa
propor
inovação
social.
operadores do direito na aplicação
se
demonstra
é
refletir
e
analisar
de
para
a
o
controle
demonstrar dispositivos entre
a e os
da norma.
Contudo, já triunfa a ideia de que para fazer justiça existe a
1. O caso do furto do mel
necessidade da interpretação da norma como um todo, buscando os
Lênio Luiz Streck, procurador
fins e especialmente os fundamentos de
de justiça, em parecer na Apelação
proporcionar sua aplicação razoável.
de nº. 70.018.891.119 à 5ª Câmara
Isto quer dizer que o intérprete deve
Criminal do Tribunal de Justiça do
se
Rio
da
norma,
valer
com
objetivo
simultaneamente
da
Grande
do
trouxe
à
racional,
discussão
sistemática e teleológica. Afinal, se
legislativa
fosse suficiente a aplicação literal do
arrependimento posterior frente aos
direito positivado, uma máquina
princípios constitucionais de direito,
poderia se enquadrar um fato à
na análise da prática de furto
norma legal, e o conflito estaria
qualificado imputada a três agentes,
resolvido.
os quais confessaram e ressarciram
interpretação
histórica,
a
Por essa razão deve ser
vítima
a
Sul,
incongruência relativa
dos
prejuízos.
ao
Neste
lembrada a Constituição Federal e
sentido, expõe-se a ementa do
especialmente seus princípios, por
parecer supramencionado:
meio dos quais se resolvem conflitos FURTO
QUALIFICADO
PELO
CONCURSO DE AGENTES – ART. 131
155,
§4,
IV,
DO
CÓDIGO
O procurador em seu parecer
PENAL. Reparação do dano antes
invocou o princípio da insignificância,
do
pela
recebimento
da
denúncia.
ausência
de
violência
na
Aplicação analógica das disposições
conduta dos agentes e, com isso,
da Lei n.º 9.249, Lei n.º 10.684 e
opinou pela absolvição. Demonstrou
Súmula 554 do Supremo Tribunal
a
Federal.
condenação pela prática do crime de
Nulidade Parcial sem
redução
de
(Teilnichtigerklärung Normtextreduzierung).
total
desproporcionalidade
texto
furto
ohne
concurso
Extinção da
qualificado de
na
mediante
agentes,
o
com
o
fundamento já mencionado, de que
punibilidade. Prejudicada a análise
os
dos pedidos defensivos.
confessaram
Na íntegra do parecer em
réus,
em
fase a
extrajudicial, conduta
e
ressarciram a vítima dos prejuízos.
comento consta que no ano de 2007
Em
exame,
o
procurador
três indivíduos em comunhão de
salientou que restou demonstrada a
esforços e acordo de vontades,
incongruência
subtraíram 15kg de mel de abelha, 2
arrependimento
caixas de abelha modelo simples e 1
comparação a infrações de natureza
caixa
mais grave, tal como na sonegação
de
sistema
de
caixilhos,
avaliados em R$290,00.
na
aplicação posterior,
do em
fiscal, a qual prevê a extinção da
Os réus foram condenados a
punibilidade se houver pagamento
pena privativa de liberdade de 2
do
anos
pena
recebimento da denúncia. Em seus
pecuniária de 10 dias-multa, a qual
argumentos, o ilustre procurador
foi convertida em pena restritiva de
demonstrou ser evidente a violação
direitos, a prestação de serviços à
ao
comunidade. Inconformados com a
igualdade, sugeriu a aplicação da
decisão, dois dos réus apelaram, um
nulidade parcial sem redução de
deles
e
texto, para ser extinta a punibilidade,
subsidiariamente a desclassificação
bem como a aplicação por analogia
delitiva e a consequente revisão da
do artigo 34 da Lei 9.249/95, artigo
pena, o outro pleiteou apenas a
9º, §2º da Lei 10.684/03 e da Súmula
absolvição.
554 do STF.
de
reclusão
pleiteou
a
e
a
absolvição
132
valor
sonegado
princípio
antes
constitucional
do
da
Da prestação jurisdicional não
determinado fato que não pode ser
era esperada outra resposta, senão
interpretado à luz da norma que em
absolvição dos réus, assim segue a
princípio o regulamentaria, pois tal
ementa:
interpretação
APELAÇÃO FURTO.
CRIME.
afronta
princípios
constitucionais.
ARREPENDIMENTO
Para argumentar, destaca-se
POSTERIOR. Afastada a tipicidade.
o entendimento de Gilmar Ferreira
Absolvição com base no artigo 386,
Mendes
inciso III, do Código de Processo
MEZZOMO, 2011, p.4):
Penal. Artigo 580 do Código de
(1999,
p.286
apud,
[...] se se pretende realçar que
Processo Penal. Réu não-apelante
determinada
absolvido. Estendido ao réu não-
normativo é inconstitucional, dispõe
apelante.
o
APELOS
PROVIDOS.
Tribunal
aplicação
da
do
texto
declaração
de
(TJRS 5ªCCr Ap. 70.018.891.119 -
inconstitucionalidade sem redução
Des. Genacéia da Silva Alberton.
de texto, que, além de mostrar-se
Julgado em 09/05/2007).
tecnicamente adequada para estas
Do caso exposto, notória é a
situações, tem a virtude de ser
necessidade de inovação do Poder
dotada de maior clareza e segurança
Judiciário ao se deparar com normas
jurídica expressa na parte dispositiva
conflitantes e contrárias aos fins da
da decisão (a lei x é inconstitucional
Lei Maior. Isto porque, a ele incumbe
se aplicável a tal hipótese; a lei y é
estabelecer a segurança jurídica e
inconstitucional se autorizativa da
razoabilidade nas decisões. Além do
cobrança do tributo em determinado
mais,
exercício financeiro).
torna-se
evidente
problemática
a da
Neste
inconstitucionalidade de leis.
caso,
firma-se
a
nulidade parcial do dispositivo em questão. No caso particular ele não será aplicado, mas o texto não será
2. A nulidade parcial sem redução de
reduzido do ordenamento jurídico.
texto
Pedro
Lenza
(2009,
p.238)
ao
abordar o assunto, esclarece que A
nulidade
parcial
sem
“[...]
redução de texto é uma técnica de
a
mácula
da
inconstitucionalidade reside em uma
decisão interpretativa aplicável a
determinada aplicação da lei, ou em 133
um dado sentido interpretativo”. Com
3. O conflito de normas
isso, se impõe a necessidade de adoção
deste
mecanismo
em
O arrependimento posterior
determinados casos, como no furto
previsto no artigo 16 do Código
do mel, já que a interpretação literal
Penal se caracteriza como causa
do texto legal, sem observância as
geral de diminuição da pena. Seu
particularidades do fato, se mostra
principal objetivo é estimular o
totalmente desproporcional, além de
ressarcimento dos danos nos crimes
inconstitucional.
que não tenham sido cometidos com
No furto do mel, vislumbra-se
violência ou grave ameaça a vítima,
a aplicação da nulidade parcial sem
até o recebimento da denúncia. É
redução de texto, o que abrange
inclusive o que consta no item 15 da
inegavelmente diferentes aspectos,
exposição de motivos da Nova Parte
quais
Geral do Código Penal, Lei 7.209/84:
sejam,
a
justiça
e
razoabilidade da decisão, a busca da
O
Projeto
mantém
a
segurança jurídica, o controle de
obrigatoriedade de redução de pena,
constitucionalidade e em especial a
na tentativa (art. 14, parágrafo
observância aos princípios basilares
único),
do
arrependimento
direito.
evidente
Além
a
disso,
restou
e
cria
a
figura
posterior
do à
desproporcionalidade
consumação do crime como causa
legislativa em relação ao instituto do
igualmente obrigatória de redução
arrependimento posterior, o que
de pena. Essa inovação constitui
ensejou a aplicação da técnica ora
providência de Política Criminal e é
em
a
instituída menos em favor do agente
aplicação da analogia in bonan
do crime do que da vítima. Objetiva-
partem. Esta é, pois, a problemática
se, com ela, instituir um estímulo à
a ser discutida, a fim de que o
reparação do dano, nos crimes
aplicador do direito inove em suas
cometidos “sem violência ou grave
decisões
ameaça à pessoa”. (grifo nosso)
estudo
positivo
e
especialmente
enquanto não
o
legislador
tomar
suas
Tal benesse aplica-se aos
providências.
crimes
que
não
tenham
sido
praticados com violência ou grave ameaça à pessoa, no entanto, revela total 134
incongruência
a
outros
dispositivos legais que tem o mesmo
sonegada,
já
que,
uma
vez
fim, a reparação do dano. Se não
realizada, não mais persiste o motivo
vejamos.
para o jus puniend do Estado.
Disciplina a Lei 9.249/95 em
O inconformismo prevalece
seu artigo 34 que se extingue a
pois normas com o mesmo fim
punibilidade dos crimes definidos na
atribuem soluções demasiadamente
Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de
diferentes. As infrações penais que
1990, e na Lei nº 4.729, de 14 de
não tenham sido praticadas com
julho de 1965, quando o agente
violência ou grave ameaça à pessoa
promover o pagamento do tributo ou
são passiveis de redução de pena,
contribuição
inclusive
caso haja arrependimento posterior,
acessórios, antes do recebimento da
enquanto na sonegação fiscal há
denúncia. Trata-se, pois, dos crimes
extinção da punibilidade para aquele
contra o a ordem tributária, e o
venha adimplir o valor sonegado
objetivo da norma legal é evitar o
antes do recebimento da denúncia.
dano
ao
social,
patrimônio
público,
Não há razão para prevalecer
buscando a satisfação do débito
tratamento tão desigual entre o
tributário.
patrimônio particular e o patrimônio
Atentando para este fato, é
público.
Aliás,
a
retribuição
à
válido questionar se prevalece o
conduta que afronta ao patrimônio
princípio da intervenção mínima do
público deveria ser mais rigorosa,
Direito
por
Penal,
ou
seja,
se
a
imposição da pena está realmente
estar
presente
o
interesse
público.
sendo usada como “ultima ratio”,
É conclusiva a violação aos
afinal o Direito Penal deve atuar de
princípios
forma subsidiária frente à ineficácia
igualdade
dos demais ramos do direito.
Neste sentido, leciona Pedro Lenza
Ora, a finalidade do legislador em
determinar
sanção
para
constitucionais e
da
proporcionalidade.
(2009, p.97):
a
[...]
o
princípio
da
sonegação fiscal é a de corroborar a
proporcionalidade
ideia
da
razoabilidade,
em
contribuição fiscal, pelo dispositivo
consubstancia
uma
em questão, nota-se que o fim maior
natureza
é o adimplemento da contribuição
diretamente das ideias de justiça,
de
obrigatoriedade
135
ou
axiológica
da
essência, pauta que
de
emana
equidade, bom senso, prudência,
aplicação da lei, será necessário
moderação, justa medida, proibição
buscar os fins sociais para aplicar ao
de excesso, direito justo e valores
caso concreto a solução adequada.
afins;
precede
e
condiciona
a
O
meio
para
atingir
tal
positivação jurídica, inclusive de
finalidade é o que se propõe aqui, a
âmbito
nulidade parcial sem redução de
constitucional;
e
ainda,
enquanto princípio geral de direito,
texto,
que
vem
abrir
novos
serve de regra de interpretação para
horizontes para vedar interpretações
todo o ordenamento jurídico.
inconstitucionais e direcionar o juiz
A violação a estes preceitos
para uma solução que atenda as
basilares se mostra clara, o privilégio
exigências do caso concreto e
da
especialmente
extinção
da
concedido
a
relevância
social,
punibilidade
crimes
de
é
maior
enquanto
da
Constituição
Federal. No caso exposto, além da
às
aplicação do mecanismo proposto, é
infrações penais menos gravosas
também aplicada analogia in bonan
aplica-se
partem, essencial para não acarretar
o
instituto
do
arrependimento
posterior,
que
uma
acarreta tão somente na diminuição
tutelado é o patrimônio particular.
Conclusão Diante o conflito entre normas em relação à diminuição da pena e à extinção da punibilidade, resta ao operador do direito se valer dos
atendam
hermenêuticos aos
do
Estado-Juiz
absurda e desproporcional.
da pena, quando o bem jurídico
métodos
resposta
que
preceitos
constitucionais e proporcionem a justiça e razoabilidade das decisões. Evidente não bastará a simples
136
Referências ABI-ACKEL, Ibraim. Exposição de motivos da nova parte geral do código penal: Lei 7.209 de 11 de julho de 1984. Disponível em: <http://www.ombadvocacia.com.br/acervo/LEIS/L7209_84.PDF>. Acesso em: 23 de maio de 2011. BASTOS, Marcelo Lessa. Arrependimento Posterior e “extinção da punibilidade”. Revista da Faculdade de Direito de Campus. Ano II, n. 2, ano III, n.3. 2001-2002. Disponível em <http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/bitstream/handle/2011/25383/arrependimento_post erior_extincao_punibilidade.pdf?sequence=1>. Acesso em 03 de maio de 2011. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal - Parte Geral. 12. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Introdução ao controle de constitucionalidade, difuso e concentrado. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1005, 2 abr. 2006. Disponível em < http://jus.com.br/revista/texto/8186>. Acesso em: 17 de maio de 2011. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Crime nº. 70018891119. Apelantes Ronei Nunes do Val e outro. Apelado Ministério Público. Relatora: Genacéia da Silva Alberton. Porto Alegre, 09 de maio de 2007. Disponível em <http://www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php?nome_comar ca=Tribunal+de+Justi%E7a&versao=&versao_fonetica=1&tipo=1&id_comarca= 700&num_processo_mask=70018891119&num_processo=70018891119&codE menta=1886449&temIntTeor=true>. Acesso em: 23 de maio de 2011. SOARES JUNIOR, Antonio Coelho. Reflexões sobre a extinção da punibilidade pelo parcelamento da dívida nos delitos fiscais. Jus Navegandi. Teresina, ano 14. n. 2102. Disponível em <http://jus.com.br/revista/texto/12563>. Acesso em 03 de maio de 2011.
137
O PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA NA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº. 66/2010 BALDIN, Daniela da Silva. Discente do 8º período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. CASALI, Éllen Cássia Giacomini. Docente do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO O presente trabalho visa a explanar sobre a Emenda Constitucional n. 66, de 13 de julho de 2010, conhecida como “PEC do Divórcio”. Este tema merece atenção especial, devido ao fato de dar nova redação ao artigo 226, § 6º, da Constituição Federal, gerando uma profunda alteração nos costumes e quebrando barreiras históricas no nosso Direito de Família brasileiro. O objetivo da pesquisa é demonstrar que, a partir da promulgação de tal Emenda, houve a extinção da separação judicial que impedia os cônjuges de dissolverem o vínculo matrimonial. Aplicando as regras hermenêuticas, é possível averiguar que desapareceu a figura da separação judicial de todo o complexo sistemático jurídico.
Palavras-chave: Direito de família. Emenda constitucional. Divórcio. Separação judicial. Princípio da intervenção mínima. 138
amor e carinho. É na família que o
Introdução
homem busca refúgio e alento. No Brasil, desde sempre,
Através do método indutivo, por
pesquisas
sendo um país eminentemente de
bibliográficas,
constatou-se
que
Constitucional
nº
a
religião católica, como consequência
Emenda foi
principal da colonização lusa, em
a
suas leis mais remotas - com origem
realidade social contemporânea. E,
no direito canônico - havia a previsão
apesar
do
promulgada
de
da
66/2010
acordo
grande
com
repressão
casamento
na
sua
forma
religiosa, não há mais que se falar
religiosa, sendo somente essa a
em separação judicial, esta que
família legalmente aceita no país. Já
impedia o livre-arbítrio dos cônjuges
em
para
contemporânea,
decidirem
dissolver
o
se
vínculo
divorciar
e
nossa
sociedade verifica-se,
por
força da globalização e da liberdade
matrimonial.
Apesar de muitos considerarem que
de
a separação judicial ainda prevalece,
planeta, que as religiões se tornaram
por
normas
das mais diversas, e a nossa cultura
infraconstitucionais, devemos nos
foi modificada em sua raiz. Dessa
direcionar
forma, consequentemente, além de
ser
regida
para
por
o
princípio
da
expressão
outros
disseminada
institutos,
intervenção mínima, que nos leva a
muitos
refletir sobre o limite da intervenção
casamento
do Estado nas relações humanas.
Abriu-se maior margem para aceitar
também
foi
o
no
do
afetado.
novos conceitos para uniões com o 1. A inclinação do direito de família
ânimo de constituir família. Na
brasileiro
mesma
linha
de
raciocínio,
o
casamento, que era considerado um A figura da família existe em
sacramento para a Igreja Católica,
qualquer sociedade conhecida. Ela é
foi perdendo espaço para outras
sinônimo de afeto e segurança, pois
ideologias,
é lá que o ser humano nasce, cresce,
fundamentos para a possibilidade de
aprende a conviver com outros
se dissolver esse ato fictício. E o
indivíduos, aprende o significado de
legislador, ao perceber que tais mudanças
gerando
estavam
novos
realmente
modificando a estrutura familiar e, 139
baseando-se,
principalmente,
no
particulares
sentido laico do Estado, surgiu, enraizada
nessa
[...].
(GONÇALVES,
2011, v.6, p. 25).
modificação
Daí o caráter público desse
cultural, a Emenda Constitucional n.
instituto. Muito embora o direito de
66/ 2010, alterando drasticamente
família seja amplamente classificado
posições até então majoritárias de
como um direito privado - por tutelar
cunho religioso, que impunham a
relações jurídicas entre particulares
política para aferir seus desejos, ao
–
invés de priorizar e privilegiar a
como sui generis, decorrendo, para
dignidade da pessoa humana.
os envolvidos nessa relação jurídica,
O Estado, com o intuito de
na
verdade,
é
classificado
direitos e, principalmente, deveres
proteger a família, - instituto que é
(normas cogentes).
sua base, modelo de organização
O
casamento
existe,
social – o fez amplamente ao
inclusive,
codificar
a
propriamente dito. Ele é considerado
respeito, tanto na Magna Carta
como instituição mista, pois tal ato
quanto no Código Civil, devido à sua
jurídico só se realiza por livre
importância e efeitos perante a
vontade das partes, gerando um
sociedade, esta que representa a
contrato: um conjunto de direitos e
própria vida humana.
deveres impostos pela Constituição
diversos
dispositivos
Para argumentar:
antes
até
do
direito
Federal e Código Civil. Daí o caráter o
misto – por um lado, a livre
alicerce mais sólido em que se
disposição das partes, mas, por
assenta toda a organização social,
outro, ao aderi-lo, este será regido
estando a merecer, por isso, a
por normas impostas pelo Estado -
proteção especial do Estado, como
devido à importância do instituto ser
proclama o art. 226 da Constituição
para a nossa sociedade, sendo a
Federal, que a ela se refere como
base dela.
[...]
a
família
constitui
‘base da sociedade’. É natural, pois,
Fachin (1999, p. 37) analisa a
que aquele queira protegê-la e
família como um: “[...] fenômeno
fortalecê-la, estabelecendo normas
social,
de ordem pública, que não podem
ingressa no mundo do Direito por
ser revogadas pela vontade dos
uma certa ‘redescoberta’ dessas
140
histórico
ou
político,
e
regras
pelo
legislador,
pela
objetivo da constituição da família
jurisprudência e pela doutrina.” Visa-se,
nos
na
dias
de
hoje
é
o
era
companheirismo, o apoio moral,
pela
econômico e espiritual, buscando,
amplamente
assim, principalmente, a felicidade.
subjetivo, mas que praticamente
Segundo Gonçalves (2011, v.6, p.
qualquer ser humano compreende. E
24), a real intenção do legislador ao
é justamente isso que as famílias da
prelecionar
atualidade almejam. As pessoas se
humanização
unem
unidade familiar.
contemporânea, felicidade,
a
busca
conceito
para
viver
conjuntamente
priorizando harmonia de vida, paz de espírito,
afetividade.
sociedade
cada
individualizada,
muitos
Assim,
Nessa
vez
tal
instituto
mais
do
é
a
conceito
verifica-se
do
perdendo
norma
de
que
casamento
espaço
para
o
vem outros
procuram
institutos com o intuito de constituir
justamente o oposto: o afeto, o
família, perdendo, também, o caráter
companheirismo, um local onde
sacramental do mesmo e, assim, a
chamar de sua casa, seu lar.
força
Já dizia Fachin (1999, p. 35):
socioafetivo
maritalis. que
ser
Não devemos esquecer que os fatos geram o direito. E, se a
uma
sociedade evolui, há a necessidade
conjugal,
da evolução do direito, pois só assim
matrimonializada ou não.”
é possível acompanhar as evoluções
Dentre os princípios do Direito
dos direitos e deveres nascidos
de Família, destaca-se o princípio da comunhão
de
Valor
funda
sociedade
tinha
modificação desse direito.
décadas, outros valores, a exemplo affectio
ele
indissolúvel, abrindo margem para a
“[...] vira o século e vêm novas
da
que
plena
dessas relações jurídicas.
de
De acordo com Gonçalves
vida, estabelecido no artigo 1.511 do
(2011, v.6, p. 21), o Código Civil de
Código Civil. Este faz prevalecer que
2002
a
evolução
afetividade
característica familiar,
e
meramente
é
a
da não
principal
convivência os
formais,
costumes,
elementos morais
procurou social visando
adaptar-se e
aos
à
bons
preservar
a
ligação moral, familiar e os valores
ou
culturais, conferindo-se à família
econômicos. De tal forma que o 141
moderna
um
tratamento
mais
a abertura do caminho à sua
acordado à realidade social atual. Gonçalves acrescenta
dissolução.
que
De modo geral, pois, somente
da
a morte real ou a presumida do
sociedade conjugal pelo divórcio
ausente nos casos em que a lei
tende a ser uma consequência de
autoriza a abertura de sucessão
extinção da affectio, e não da culpa
definitiva, a nulidade ou a anulação
de qualquer dos cônjuges”. (2011,
do casamento e o divórcio autorizam
v.6, p. 24).
os ex-cônjuges a contrair novo
“nessa
linha,
a
dissolução
Dessa forma, a ausência da
matrimônio.
afetividade é sinônimo de término do
Com
vínculo matrimonial.
a
promulgação
da
Emenda Constitucional n. 66, de 13 de julho de 2010, extinguiu-se, por
1.1 A inclinação do divórcio no direito
definitivo, o requisito de prévia
de família brasileiro
separação judicial por mais de 1 (um)
As causas terminativas de sociedade
conjugal
especificadas no
de
comprovada
separação de fato por mais de 2
estão
(dois) anos. Em seu parágrafo 6º, artigo 226, versa a Constituição
Código Civil: morte de um dos
Federal: “O casamento civil pode ser
cônjuges, nulidade ou anulação do
dissolvido pelo divórcio”. (BRASIL,
casamento, separação judicial e
2011).
Acrescenta
1.571
ou
do
divórcio.
art.
ano
do
Assim, dá-se a entender que
dispositivo em apreço que tem
a sociedade conjugal e o vínculo
aplicação,
matrimonial desaparecem com o
estabelecida
ainda, no
a
o
§1º
presunção
aludido
Código
divórcio.
quanto ao ausente.
Apesar
A separação judicial, embora colocasse
termo
à
disso,
há
pensamentos divergentes. Por se
sociedade
tratar de um assunto extremamente
conjugal, mantinha intacto o vínculo
polêmico, as ideias naturalmente
matrimonial, impedindo os cônjuges
tendem a pender para todas as
de contrair novas núpcias. Pode-se,
possibilidades.
no entanto, afirmar que representava
comento, surge a reflexão de que,
No
assunto
em
devido ao fato da separação judicial 142
estar
contida
em
normas
Tribunais
concederem
seus
infraconstitucionais (entre elas o
pareceres, para então ser possível
Código Civil e a Lei nº. 6.515/77), ela
um melhor estudo crítico sobre o
ainda não desapareceu, mesmo com
problema.
a Emenda Constitucional em apreço.
Mesmo
assim,
devemos
Vejamos o que Santos dispõe a
analisar a finalidade da emenda. Ela
respeito do assunto:
foi promulgada com o intuito de
Atente-se
qualquer
extinguir de uma vez por todas a
formalmente
separação judicial, figura jurídica já
constitucional pelo só fato de constar
defasada no nosso ordenamento
na Constituição Federal. Porém,
jurídico.
norma
que
será
nem todas as normas formalmente constitucionais
são
O complexo de direitos e
também
deveres que a sociedade conjugal
materialmente constitucionais. Os
impunha, com a nova emenda, deixa
dispositivos
de
apenas
formalmente
constitucionais
são
por
autores
alguns
denominados
Além
disso,
ao
se
dissolver o casamento pelo divórcio,
lei
o vínculo matrimonial não perdura,
constitucional. São regras que, por
pois os cônjuges deixam de ter o
sua
status de casados.
natureza,
não
de
existir.
precisariam
constar da Constituição, mas lá são
Dessa forma, ao eliminar da
colocadas por razões de simples
Constituição
conveniência política. É como se
referência
fosse uma lei inserida no corpo da
judicial, verifica-se que não há mais
Constituição. Uma lei travestida de
finalidade de se manter a separação
Constituição. Nossa Carta Magna é
judicial, pois esta não pode mais ser
notoriamente pródiga em normas
convertida em divórcio.
constitucionais em sentido apenas formal.
Os
à
única
separação
Ademais, pela interpretação lógica ou racional do referido artigo,
dispensáveis e não caberiam em um
a única exigência plausível para a
texto resumido como este. (2011).
ação de divórcio é o estado civil de
forma,
são
relativa
a
até
Dessa
exemplos
Federal
dá-se
a
casado.
entender que ainda persiste a figura
Gonçalves, para argumentar:
da separação judicial. Nesse ponto de vista, surge a necessidade dos 143
[...] na interpretação lógica ou
recíproca, facultando-se também,
racional, o intérprete procura extrair
em seu bojo, realizar-se a partilha
as várias interpretações possíveis,
patrimonial. (GAGLIANO, 2011).
eliminando as que possam parecer absurdas
e
que
levem
a
Assim,
um
divórcio
é
resultado contraditório em relação a
vantajoso
outros
separação.
preceitos.
Nessa
percebe-se
que
infinitamente de
que
a
o
mais simples
consonância, impõe-se a conclusão
Não há mais a necessidade e
de que a separação de direito,
o empecilho de alegar culpa a uma
judicial ou extrajudicial, foi suprimida
das
do
pela
relacionamento íntimo dos cônjuges,
constitucional
pois não atende aos fins sociais nem
ordenamento
referida
jurídico
emenda
(2011, v.6, p. 207).
partes,
constrangendo
o
ao bem comum, comprometendo a
Não resta dúvida de que tal
boa administração da justiça e a paz
modificação trouxe mais vantagens
social.
do que desvantagens para o saber
Ademais, os únicos pontos de
jurídico. É de se notar que a
litígios que realmente mereceriam
separação
nosso
ser discutidos seriam: a guarda e
ordenamento jurídico pela pressão
proteção dos filhos menores, os
religiosa, esta que exercia na nossa
alimentos que sejam devidos, a
sociedade. Porém, os aplicadores do
continuidade ou não do nome de
direito não devem se atrelar a
casado e partilha dos bens em
questões de cunho eminentemente
comum.
persistiu
no
religiosos, pois há a necessidade de se
analisar
a
descomplicação
simplificação, do
divórcio
Como
ensina
Gagliano
a
(2010): “Pois sem amor e felicidade
no
não há porque se manter um casamento”.
Brasil, pelo princípio da intervenção mínima.
Em
um
estudo
crítico,
Com a separação judicial:
podemos compreender “[...] não é
[...] dissolve-se, tão somente,
mais o indivíduo que existe para a
a sociedade conjugal, ou seja, põe-
família e para o casamento, mas a
se fim a determinados deveres
família e o casamento existem para
decorrentes do casamento, como o
o seu desenvolvimento pessoal, em
de coabitação e o de fidelidade
busca de sua aspiração à felicidade”. 144
(MICHEL,
1975,
p.
131-
casamento; sob o viés psicológico,
132, apud FACHIN, 1999, p. 290-
evita-se a duplicidade de processos
291).
– e o strepitus fori -, porquanto pode Além disso: “[...] O ato de
o casal partir direta e imediatamente
casar e o de não permanecer casado
para o divórcio; e, finalmente, até
constituem, por certo, o verso e o
sob a ótica econômica, o fim da
reverso
separação é salutar, pois, com isso,
da
liberdade
mesma de
moeda:
a
autodeterminação
evitam-se
gastos
afetiva” (CHAVES; ROSENVALD,
desnecessários
2009, p. 277, apud GAGLIANO,
duplicidade
2010).
(2010).
de
por
judiciais conta
da
procedimentos.
a
E para finalizar, Fachin “na
principiológica
transformação da família e de seu
constitucionalizada é fator inerente à
Direito, o transcurso apanha uma
contemporaneidade do Direito de
‘comunidade de sangue’ e celebra,
Família. Assim, manter o vínculo
ao final deste século, a possibilidade
conjugal nessa sociedade altamente
de uma ‘comunidade de afeto’.
liberalista e relativista não tem
Novos modos de definir o próprio
sentido algum. O que vale é a
Direito de Família”. (1999, p. 305).
Verifica-se,
assim,
liberdade
que
projeção que o indivíduo almeja de ser feliz. E nada mais. Não é dever de o Estado
Conclusão
impor condições ou regras para o fim do casamento, pois cabe apenas aos
Não resta dúvida de que a
cônjuges tomar tal decisão. Por isso
afetividade é o primeiro norteador do
que a nova Emenda foi tão bem receptiva,
ela
burocrático
ao
retira fim
o
caráter
do
vínculo
Direito de Família. É notável que o Direito
não se torne defasado e sua
Para concretizar, Gagliano: com
o
divórcio,
finalidade fique desvirtuada. Assim,
não
a Emenda Constitucional nº. 66/2010
apenas a sociedade conjugal é
é plausível de apreciação, pois o
desfeita, mas o próprio vínculo matrimonial,
acompanhar a
realidade sociológica, para que ele
matrimonial.
[...]
necessite
permitindo-se
novo 145
princípio da intervenção mínima
Portanto, a extinção da figura
clamava por atenção.
da separação judicial é o fim mais
Assim, não é mais dever do
viável que o Direito de Família
Estado ficar atrelado a questões que
poderia tomar. Agora é a hora de
não se justificam, impedindo o
preocupar
desenrolar de vidas humanas. Não
realmente precisam ser enfrentadas:
há lógica manter um casamento se
a separação de bens, por exemplo.
não é da vontade das partes.
A culpa, não. Dessa forma, onde não
O Brasil necessita de um desafogamento
no
com
sistema
questões
questões
que
há mais comunhão plena de vida, não há mais vínculo matrimonial.
judiciário, e este, sim, deve se preocupar
com
que
impedem a paz social. Ao se divorciarem, não há litígio se ambos os cônjuges decidem terminar com a instituição.
146
Referências BRASIL. Constituição (1988). Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010. Dá nova redação ao §6º do art. 226 da Constituição Federal. Disponível em: Acesso em 26/05/2011. FACHIN, L. E. Curso de direito civil: elementos críticos do direito de família. 1. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. GAGLIANO, P. S. A nova emenda do divórcio: primeiras reflexões. IBDFAM – Revista Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões. Belo Horizonte, n. 16, p. 5-19, jun./jul. 2010. GONÇALVES, C. R. Direito civil brasileiro: direito de família. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. SANTOS, L. F. B. Emenda do divórcio: cedo para comemorar. IBDFAM – Revista Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões. Belo Horizonte, jul. 2010. Disponível em: Acesso em 26/05/2011.
147
O SUPERENDIVIDAMENTO DO CONSUMIDOR SANTOS, Patricia Tonetti dos, Discente do 8º Período do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga. CASALI, Ellen Cassia Giacomini, Docente do Curso de Direito da Unifev – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO O objetivo do presente estudo é apontar a relação de causa e efeito entre a democratização do crédito ao consumo e o endividamento crônico dos consumidores. Será analisada a questão do superendividamento dos consumidores, demonstrando a necessidade de adotar medidas mais específicas em defesa do consumidor de crédito.
Palavras-chave: Superendividamento. Endividamento do Consumidor. Credito ao consumo. Consumidor. 148
INTRODUÇÃO
Conceitos e noções gerais
Atualmente, vivemos na era
O superendividamento é o
do consumo, a qual invade a vida do
endividamento superior ao normal. A
homem, passando a ser o espelho
professora Claudia Lima Marques
da felicidade humana, a razão do
define como:
trabalho e o objetivo da vida.
O endividamento é um fato
Essa vida de consumo, por outro
inerente à vida em sociedade, ainda
lado, conduz o ser humano às
mais comum na atual sociedade de
dívidas.
consumo. Para consumir produtos e
O
endividamento
está
serviços, essenciais ou não, os
o
consumidores estão – quase todos –
fácil
constantemente se endividando. A
obtenção de crédito, que gera efeitos
nossa economia de mercado seria,
na relação social e familiar.
pois, por natureza, uma economia do
diretamente consumo
relacionado excessivo
e
com a
O crédito é uma ferramenta de
endividamento. Consumo e crédito
acesso ao consumo, porém, a
são duas faces de uma mesma
facilidade de obtenção do crédito é
moeda, vinculados que estão no
um fato preocupante, pois quanto
sistema econômico e jurídico de
mais crédito o consumidor obtém,
países desenvolvidos e de países
consequentemente, mais dívidas ele
emergentes
terá, gerando o superendividamento.
superendividamento
No
Brasil,
como
o
Brasil. pode
O ser
o
definido como a impossibilidade
superendividamento ainda não tem
global de o devedor pessoa física,
uma
específica,
consumidor, leigo e de boa-fé, pagar
porém, para tratamos do assunto,
todas as suas dívidas atuais e
utilizamos o Código de Defesa do
futuras de consumo (excluídas as
Consumidor,
dívidas com o fisco, oriundas de
proteção
legal
juntamente
com
a
Constituição Federal.
delitos e de alimentos). (MARQUES,
Utiliza-se o método dedutivo e a
pesquisa
bibliográfica
2006, p. 256).
para
Assim, podemos concluir que
o melhor desenvolvimento deste
o endividamento é fato constante
trabalho.
não só no Brasil, mas também em outros países. 149
Temos
dois
conceitos
de
iniciativa de quitar todos os seus
endividamento, qual seja, o ativo e o
débitos, dentro de sua possibilidade
passivo.
financeira.
O superendividamento ativo ocorre quando o consumidor age
Causas de superendividamento
ativamente para o acúmulo de
do consumidor no Brasil
dívidas, gastando mais do que ganha,
ficando
na
posição
de
O
que
gera
o
endividado, mesmo agindo de boa-
superendividamento do consumidor,
fé.
no Brasil, é a falta de planejamento Já
o
superendividamento
dos gastos, uma vez que o homem
passivo é aquele que nasce em
passou a gastar além de seu salário,
razão
bem como em razão da falta de
da
ocorrência
de
um
imprevisto, ou seja, é quando o
orientação
consumidor não atua para tornar-se
consequentemente o abuso nas
endividado,
ofertas de créditos.
mas,
ocupa
a
tal
situação por motivos alheios a sua
dos
consumidores
e
Outro motivo seria a cobrança
vontade, como, por exemplo, em
de
razão do desemprego.
psicológica ao devedor, podendo ele
Segundo
Giancoli
(2008,
credores,
causando
tentar fazer um novo empréstimo
p.102 apud AMORIM, 2008, p. 2):
para
Em verdade, a noção de boa-fé em
gerando mais dívidas.
matéria
de
pressão
superendividamento
tentar
No
pagar
Brasil,
essa
dívida,
aplica-se,
na
implica que seja procurado em
temática abordada neste artigo, o
relação ao superendividado, através
Código de Defesa do Consumidor
de dados da causa, o elemento
(Lei nº 8.078/1990), uma vez que
intencional
não
que
evidencia
seu
conhecimento deste processo e sua
existe
legislação
específica
disciplinando sobre o assunto.
vontade de solucionar o conjunto de
As causas de endividamento
suas dívidas cujo total é excessivo,
do consumidor brasileiro dividem-se
tendo-se em conta os recursos do
em três fases: a pré-contratual, a
devedor.
contratual e a pós-contratual.
Assim,
a
boa-fé
do
A fase pré-contratual é aquela
consumidor se materializa na sua
que 150
antecede
a
assinatura
do
contrato,
através
da
oferta
de
seu nome nos bancos de dados
crédito, que, em regra, não obedece
(Serasa
aos artigos 30 a 35 e 48, ambos do
impossibilitado de exercer qualquer
Código de Defesa do Consumidor.
atividade que prescinda de análise
Pode
práticas
de crédito. Assim, esse consumidor
abusivas definidas nos artigos 39 a
afeta a capacidade de manutenção
41,
da vida familiar, em virtude de todos
ocorrer
do
também
mesmo
diploma
legal
supracitado. Já
segunda
fase,
baseia-se
nos
a
ficando
eles morais, sociais, entre outros.
juros
Ensina-nos
excessivos, nas multas, correção
contra
endividado,
o
de
[...]que a dignidade da pessoa
consumidor
ocasionando
Alexandre
Moraes:
monetária, tendo como regra o abuso
SPC),
os prejuízos que acarreta, sendo
a
contratual,
e
humana é um valor espiritual e moral
sua
inerente à pessoa, que se manifesta
inadimplência contratual.
singularmente na autodeterminação
A terceira fase, denominada
consciente e responsável da própria
pós-contratual é aquela que ocorre
vida e que traz consigo a pretensão
em
ao respeito por parte das demais
desfavor
endividado,
do
que
fundamentada
no
é
consumidor a
cobrança
artigo
42
pessoas, constituindo-se em um
do
mínimo
invulnerável
que
todo
Código de Defesa do consumidor, e
estatuto jurídico deve assegurar, de
a inscrição do nome do devedor no
modo que apenas excepcionalmente
banco de dados, elencados nos
possam ser feitas limitações ao
artigos 43 e 44 do Código de Defesa
exercício dos direitos fundamentais,
do Consumidor.
mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem
O
superendividamento
e
o
todas as pessoas enquanto seres
princípio da dignidade da pessoa
humanos. (MORAES, 2004)
humana
O
consumidor
endividado
perde a capacidade de consumo, em O
consumidor
virtude do comprometimento de seus
superendividado com o acúmulo de
rendimentos mensais com dívidas,
suas dívidas tem como resultado a
impossibilitando o pagamento das
perda do crédito, a negativação do
despesas básicas, familiar e ao 151
pagamento das dívidas, resultando
A realização de ações nos
em situação de sofrimento da família
Órgãos de Defesa de Proteção dos
e do consumidor, demonstrando,
consumidores
assim, que o superendividamento
PROCONs,
afeta o princípio da dignidade da
específicos para os consumidores
pessoa humana.
superendividados.
Segundo
Nunes
no
Brasil,
contendo
os
serviços
(2005,
Geraldo de Faria Martins da
p.123), a dignidade da pessoa
Costa, apresenta como soluções ao
humana - e do consumidor - é
problema, as seguintes hipóteses:
garantia fundamental que ilumina
1 – É preciso que o Direito
todos os demais princípios e normas
Brasileiro, a exemplo do Direito
e que, então, a ela devem respeito
Comparado,
dentro do sistema constitucional
legislativas que tenham por objetivo
soberano brasileiro.
específico a diminuição dos perigos
adote
medidas
que envolvem as operações de crédito ao consumo, indo além daquelas já instituídas pelo CDC; 2 –
Soluções para o problema
É preciso adotar medidas legislativas Para tentar resolver ou até mesmo
minimizar
que previnam o superendividamento dos consumidores; 3 – É preciso
o
superendividamento do consumidor
adotar
medidas
brasileiro, de início, podemos tutelar
instituam
por uma implementação de uma
consumidores
política nacional nas relações de
superendividamento.
consumo, baseando-se nos artigos
2000).
o
legislativas tratamento
em
situação
que dos de
(COSTA,
4º e 5º do Código de defesa do Consumidor.
Assim, o certo seria dar um
Outro caso seria a proteção
prazo longo ao consumidor para que
do consumidor compatível com a
possa refletir se é necessário a
necessidade
compra
econômico,
de
desenvolvimento
viabilizando
a
ser
realizada
e,
os
consultando os demais membros da
princípios que fundam a ordem
família, evitando que o consumidor
econômica, consagrados no artigo
se endivide por impulso e que possa
170 da Constituição Federal. 152
se defender das técnicas agressivas
disponibilizar diversas formas de
de venda.
crediário.
Seria
necessário
superendividado
que
voltasse
a
Assim,
é
evidente
a
o
necessidade de criação de leis
ser
tratando a respeito do consumidor
tratado com dignidade e não ser
superendividado.
condenado por toda sua vida como
O Estado e a sociedade tem
mau pagador, porque se ele agiu de
que fazer chegar ao conhecimento
boa-fé e obteve um acumulo de
do consumidor como ele pode
dívidas, ele é merecedor de uma
realizar a prevenção e o tratamento
nova
de superendividamento, pelos meios
chance
para
se
refazer
financeiramente.
de divulgação possíveis.
Portanto, existem vários tipos
Por fim, buscar o consumidor,
de propostas para obtermos as
que
se
julgar
prejudicado,
o
soluções, porém, o que falta é a
Ministério Público, as associações
efetivação por nossos legisladores.
de defesa do consumidor, para evitar o endividamento, devendo haver participação ativa da sociedade em relação
Conclusão
aos
esclarecimentos
e
orientações sobre o problema do endividamento ao consumidor.
Do acima exposto, constatase
o
favorecimento
Uma medida de urgência que
do
superendividamento do consumidor,
poderia
uma vez que, hoje, houve um
reconhecimento
aumento das ofertas no mercado do
concessão de crédito como nocivo e
consumidor, advindas em conjunto
perigoso,
com a facilidade para obtenção de
adequação da publicidade e oferta
crédito e somado ao crescimento de
de tais serviços, como já acontece
lojas,
com as de cigarro e bebida alcoólica.
as
quais
passam
a
153
ser
e
adotada do
a
é
o
serviço
de
consequente
Referências COSTA, Geraldo de Faria Martins da. Novas técnicas afetando o direito do consumidor. Painel nº 4, 5º Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor, em 03.05.2000. AMORIM, Eduardo Antonio Andrade. O superendividamento do consumidor. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2658, 11 out. 2010. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/17597>. Acesso em: 23 maio 2011. MARQUES, Cláudia Lima. Sugestões para uma lei sobre o tratamento do superendividamento de pessoas físicas em contratos de crédito ao consumo: proposições com base em pesquisa empírica de 100 casos no Rio Grande do Sul. In: Direitos do consumidor endividado: superendividamento e crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2004. NUNES, Rizzato. Curso de Direito do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
154
REMISSÃO DA DÍVIDA TRIBUTÁRIA KUSAKA, Danielle Thie. Discente do 10º período do Curso de Direito da Unifev - Centro Universitário de Votuporanga. COSTA, Natália Maria Pozzobon Figueira da. Discente do 10º período do Curso de Direito da Unifev - Centro Universitário de Votuporanga. FERRARESI, Luiz Carlos. Doutor em Direito e professor universitário de Direito Tributário no Curso de Direito da Unifev - Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO O objetivo deste estudo é propor uma reflexão a respeito da viabilidade de concessão de remissão da dívida tributária, levando em consideração seu pequeno valor quando afrontado com às custas de um processo de execução fiscal promovido por município.
SUMMARY The objective of this study is to propose a reflection on the feasibility of granting remission of the tax debt, taking into account its small value when confronted with the expense of a tax foreclosure process promoted by the municipality.
Palavras-chave: Remissão. Dívida. Pequeno valor. Custas. Keywords: Remission. Debt. Small value. Costs. 155
consequentemente,
Introdução
penalidades,
sobre
as
impedindo
a
constituição do crédito.
Inicialmente, é interessante diferenciar remissão de remição. A
1. Dispositivos constitucional e legal
primeira vem do verbo remitir, que significa perdoar. A segunda tem
A remissão está disciplinada
origem no verbo remir, que tem o
no art. 172 do Código Tributário
sentido de resgatar.
Nacional, que trata das situações
Da mesma forma, não se pode
que
confundir
podem
justificar
a
sua
concessão:
remissão com anistia. Ambas tem
Art. 172 - A lei pode autorizar
sentido de perdão. No entanto, no direito tributário, a remissão refere-
a
se ao tributo devido, enquanto que
conceder,
a anistia visa às infrações fiscais e é
fundamentado, remissão total ou
forma
parcial
de
exclusão
do
crédito
autoridade
administrativa por
do
crédito
a
despacho
tributário,
atendendo:
tributário. Na remissão existe um
I - à situação econômica do
crédito tributário e o perdão dessa
sujeito passivo;
dívida extingue o crédito. Na anistia
II - ao erro ou ignorância
existe uma infração e o perdão dessa infração extingue o direito de
escusáveis
do
sujeito
punir.
quanto a matéria de fato;
passivo,
III - à diminuta importância do
A remissão é o perdão da
crédito tributário;
dívida tributária pelo credor, ou seja,
IV - a considerações de
o sujeito ativo da obrigação tributária renuncia ao direito à prestação
equidade,
tributária em proveito do devedor, o
características pessoais ou materiais
que leva à extinção o crédito já
do caso;
relação
com
as
V - a condições peculiares a
lançado.
determinada região do território da
A remissão atinge o crédito
entidade tributante.
tributário já constituído, total ou
Parágrafo único. O despacho
parcialmente, enquanto que a anistia incide
em
sobre
as
infrações
referido neste artigo não gera direito
e,
156
adquirido,
aplicando-se,
quando
situações que podem ou não ser
cabível, o disposto no art. 155. Como
se
objeto de remissão. A lei específica
verifica,
a
que autoriza a remissão é que irá
concessão de remissão depende de
detalhar as situações possíveis para
autorização legal. Evidentemente,
a
esta autorização legal só pode vir da
autoridade
pessoa
na
apenas analisar os casos concretos
como
de possível incidência da lei. A
competente para legislar sobre os
decisão administrativa que conceder
tributos componentes dos créditos
a remissão será individual e deve ser
tributários a serem remitidos.
fundamentada, como prescreve a lei
política,
Constituição
definida
Federal,
Mesmo que possa parecer uma
discricionariedade
Administração
para
Pública,
concessão
de
remissão.
administrativa
À
caberá
complementar.
a
A lei ordinária que autorizar a
por
remissão não poderá ultrapassar os
excepcionar a aplicação do princípio
limites
da
crédito
Tributário Nacional, pois este elenca
Eduardo
os casos possíveis, como, por
Sabbag (2009, p. 809), o dispositivo
exemplo, a diminuta importância do
do
Nacional
crédito tributário. Deverá, no entanto,
encontra guarida no parágrafo 6º, do
detalhar todos os limites do perdão,
artigo 150, da Constituição Federal.
evitando a discricionariedade da
Embora objeto da emenda 3/93, o
Administração Pública, inaceitável
parágrafo 6º já dispunha na versão
nos limites do direito tributário.
original
Dessa
indisponibilidade
tributário,
como
Código
do
afirma
Tributário
da
Constituição,
que
impostos
forma,
“qualquer anistia ou remissão, que
diminuta
envolva
matéria
previdenciária,
pelo
por
importância
Código
exemplo, do
a
crédito
tributária
ou
tributário deverá ser quantificada em
poderá
ser
lei.
só
concedida através de lei específica,
A exigência constitucional de
federal, estadual ou municipal”.
lei específica tem por objetivo evitar
Ainda assim, parece claro que
que a remissão seja concedida no
a lei complementar não transfere da
bojo de qualquer lei, de forma
lei
dissimulada.
específica,
discricionária
para da
a
decisão
Administração
Importante consignar que em
Pública, o poder de avaliar as
04.05.2000 157
foi
editada
a
Lei
Complementar
n°
101,
que
alíquotas, ampliação da base de
“Estabeleceu normas de finanças
cálculo, majoração ou criação de
públicas
tributo ou contribuição.
voltadas
para
a
responsabilidade na gestão fiscal” a
§ 1o A renúncia compreende
Lei de Responsabilidade Fiscal, e
anistia, remissão, subsídio, crédito
que no seu artigo 14, também prevê
presumido, concessão de isenção
a possibilidade de renúncia, no caso
em caráter não geral, alteração de
em tela a remissão, que achamos
alíquota ou modificação de base de
pertinente transcrevê-lo.
cálculo
Art. 14. A concessão ou
que
discriminada
implique de
redução
tributos
ou
ampliação de incentivo ou benefício
contribuições, e outros benefícios
de
que correspondam a tratamento
natureza
tributária
da
qual
decorra renúncia de receita deverá
diferenciado.
estar acompanhada de estimativa do
§ 2o Se o ato de concessão
impacto orçamentário-financeiro no
ou
exercício em que deva iniciar sua
benefício de que trata o caput deste
vigência
seguintes,
artigo decorrer da condição contida
atender ao disposto na lei de
no inciso II, o benefício só entrará em
diretrizes orçamentárias e a pelo
vigor quando implementadas as
menos
medidas referidas no mencionado
e
nos dois
uma
das
seguintes
condições: I
ampliação
do
incentivo
ou
inciso.
-
demonstração
pelo
§ 3o O disposto neste artigo
proponente de que a renúncia foi
não se aplica:
considerada na estimativa de receita
I - às alterações das alíquotas
da lei orçamentária, na forma do art.
dos impostos previstos nos incisos
12, e de que não afetará as metas de
I, II, IV e V do art. 153 da
resultados fiscais previstas no anexo
Constituição, na forma do seu § 1o;
próprio
da
lei
de
diretrizes
II - ao cancelamento de débito
orçamentárias;
cujo montante seja inferior ao dos
II - estar acompanhada de medidas
de
compensação,
respectivos custos de cobrança.
no
período mencionado no caput, por meio
do
proveniente
aumento da
de
receita,
elevação
de 158
2. Percurso e custas de uma
domicílio ou a residência de um e de
execução fiscal
outros; II - a quantia devida e a
“Constitui
dívida
ativa
maneira de calcular os juros de mora
tributária a resultante de crédito dessa
natureza,
acrescidos;
regularmente
III - a origem e natureza do
inscrita na repartição administrativa
crédito,
mencionada
competente, depois de esgotado o
especificamente a disposição da lei
prazo fixado, para pagamento, pela
em que seja fundado;
lei ou por decisão final proferida em
IV - a data em que foi inscrita;
processo regular” (art. 201 do CTN).
V - sendo caso, o número do
O crédito tributário a ser
processo administrativo de que se
inscrito em dívida ativa é aquele definitivamente
Em
Parágrafo único. A certidão
outras palavras, é o crédito tributário
conterá, além dos requisitos deste
não pago dentro do prazo legal,
artigo, a indicação do livro e da folha
sobre o qual não paire nenhuma
da inscrição.
pendência
constituído.
originar o crédito.
de
decisão
Segundo as regras do Código
administrativa. Para que possa ser
Tributário Nacional (art. 204), “a
encaminhado à execução fiscal,
dívida regularmente inscrita goza de
deve ser previamente inscrito em
presunção de certeza e liquidez e
dívida ativa da Fazenda.
tem
o
efeito
de
prova
pré-
O art. 202 do CTN lista os
constituída”. Mas pode ser ilidida por
requisitos que devem conter os
prova inequívoca, a cargo do sujeito
termos de inscrição em dívida ativa,
passivo
sob pena de nulidade.
aproveite (§ único).
ou
do
terceiro
a
que
Art. 202. O termo de inscrição
A Certidão de Dívida Ativa
da dívida ativa, autenticado pela
(CDA) é documento essencial para o
autoridade
ajuizamento da execução fiscal nos
competente,
indicará
obrigatoriamente:
moldes da Lei n. 6.830/80 (art. 5º,
I - o nome do devedor e,
§1º), por ser considerada título
sendo caso, o dos corresponsáveis,
executivo
bem como, sempre que possível, o
art.585, VII).
159
extrajudicial.
(CPC,
Ajuizada
a
deferimento despacho
execução,
do do
pedido,
juiz,
o
Segundo a lei estadual n.
por
ordenará
11.608/2003,
a
aviso
de
recepção,
município
está
dispensado da taxa judiciária. “Artigo 6º - A União, o Estado,
citação, que será feita pelo correio, com
o
por
o Município e respectivas autarquias
mandado ou por edital, conforme o
e
fundações,
assim
como
o
caso.
Ministério Público estão isentos da taxa judiciária”.
Feita a citação, o executado terá o prazo de 5 dias para pagar a
No entanto, ainda restam as
dívida com juros, multa de mora e
despesas
demais
poderá
Oficiais de Justiça e, alguns casos,
garantir a execução, com depósito,
despesas postais e despesas com
fiança bancária ou a nomeação à
publicação de editais. Os valores
penhora
sua
dessas despesas são divulgados
terceiros,
pelo Tribunal de Justiça do Estado
satisfazer,
de São Paulo, via internet, conforme
encargos.
de
propriedade
Ou
bens, ou
suficientes
de
de
para
integralmente,
o
crédito
da
com
diligências
por
anexo A deste trabalho.
exequente. 4. Simulação de uma execução 3. Custas processuais Considerando um débito a ser A reflexão proposta por este trabalho
é
a
conveniência
executado, cujo montante importa
de
em
cinquenta
reais,
além
remissão de créditos tributários de
computarmos
pequeno valor, quando as despesas
administrativas que são difíceis de
para a sua cobrança sejam maiores
serem
do que o sucesso de sua execução.
envolvimento de vários servidores
O
aos
nas suas diversas etapas, têm-se
municípios, portanto utiliza dados
ainda as custas processuais de
referentes ao Estado de São Paulo,
execução judicial.
pois
estudo
as
é
direcionado
execuções
fiscais
as
de
despesas
avaliadas
dado
o
Com relação às despesas
promovidas por eles têm tramitação
com
funcionários,
na Justiça estadual.
considerar não só o custo do trabalho 160
de
há
que
se
funcionários
administrativos
no
controle
dos
prosseguimento de uma ação de
valores, bem como a utilização de
execução
sistemas
de
antieconômico afrontam o próprio
dados. Na fase de execução fiscal,
interesse público ao invés de cumpri-
aparecem os custos com o trabalho
lo, visto que o custo da cobrança do
de funcionários especializados na
crédito é maior que o valor cobrado”.
de
processamento
propositura da ação judicial.
fiscal
de
valor
Conforme esclarece o autor, a
Na cobrança judicial de um
remissão da dívida tributária de
débito tributário, pelo menos uma
pequeno
valor trata
da melhor
diligência será necessária por meio
alternativa para a solução do conflito
de Oficiais de Justiça, mas poderá
de cobrança.
ser mais de uma. Os valores para
É inevitável a conclusão do
diligências são de R$ 15,13 por ato,
descabimento de cobrança por meio
se for na capital, e R$ 12,12, se for
de execução fiscal de dívida de
no interior do estado. Se a distância
pequeno valor de crédito tributário,
for além
dez
que seja inferior ao valor gasto no
quilômetros da sede do juízo, a cada
decorrer do processo, em razão das
faixa de dez quilômetros ou fração, o
custas serem superiores ao crédito
valor será acrescido de R$ 6,02.
pretendido.
As
de
um
raio
de
intimações
também
Diante de uma prestação
poderão ser tentadas por via postal.
tributária de pequeno valor, a sua
Neste
requeridos
cobrança acaba ultrapassando o
pagamentos de despesas postais
valor da dívida, razão pela qual, faz
(anexo A). Se houver necessidade
necessário adotar a remissão, ou
de publicação de editais, o custo da
seja, o perdão da dívida concedido
publicação é de doze centavos por
pelo credor, que é uma forma
caractere.
extintiva da obrigação, e na situação
caso
serão
acima descrita, é a maneira mais correta de dissolver a obrigação. Sendo
Considerações finais
que
Responsabilidade
a Fiscal
Lei
de
também
prevê a remissão de pequenos
Manoel Álvares (2007, p.749)
débitos no seu art. 14, §3º, II.
afirma que: “A propositura e o
161
É conveniente ressaltar que a
dentro dos parâmetros autorizados
remissão não é ato discricionário.
por lei, exigindo, na concessão,
Embora seja concedida, caso a
despacho fundamentado, conforme
caso, pela autoridade administrativa,
dita o artigo 172 do Código Tributário
ela só pode ser levada a efeito
Nacional.
162
Referências BRASIL. Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp101.htm. Acesso em: 11 out. 2011. FREITAS, Vladimir Passos de. (Coord.) Código tributário nacional comentado: doutrina e jurisprudência, artigo por artigo, inclusive ICMS e ISS. 4. ed. Revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. MARTINS, Ives Gandra da Silva; NASCIMENTO, Carlos Valder do; MARTINS, Rogério Gandra da Silva. (Coord.). Tratado de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2011. v. 2. PINTO, Antonio Luiz de Toledo; WINDT, Márcia Cristina Vaz dos Santos; CÉSPEDES, Livia (Col.). Vade Mecum. 9. ed. Atualizada e ampliada. São Paulo: Saraiva, 2010. SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2009. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Despesas com publicação de editais no Diário da Justiça Eletrônico. Disponível em: . Acesso em: 11 out. 2011. ______. Despesas processuais. Disponível em: . Acesso em: 11 out. 2011. ______. Diligência dos Oficiais de Justiça. Disponível em: . Acesso em: 11 out. 2011.
163
ANEXO - A - DESPESAS PROCESSUAIS - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Diligência dos Oficiais de Justiça Descrição
Valor
Recolhimento
Capital: R$ 15,13 por ato
Diligência dos Oficiais de Justiça
Interior: R$ 12,12. Além do raio de 10 Km da sede do juízo, a cada faixa de 10 (dez) quilômetros ou fração, o valor será acrescido em R$ 6,02
Recolhimento através da Guia de depósito – Oficiais de Justiça*
Despesas postais com citações e intimações TABELA - MODALIDADE CARTA Quantidade de folhas
Registro + aviso de recebimento
Registro + aviso de recebimento + mão própria
4
R$ 11,50
R$ 15,00
5 a 10
R$ 12,00
R$ 15,50
11 a 20
R$ 14,00
R$ 17,50
21 a 30
R$ 15,00
R$ 18,50
31 a 40
R$ 16,00
R$ 19,50
41 a 50
R$ 17,00
R$ 20,50
51 a 60
R$ 18,00
R$ 21,50
61 a 70
R$ 19,00
R$ 22,50
71 a 80
R$ 20,00
R$ 24,00
81 a 90
R$ 21,50
R$ 25,00
91 a 100
R$ 22,50
R$ 26,00
164
REMESSA LOCAL Nº de folhas
Valor a ser cobrado
4 5 a 10 11 a 20 21 a 30 31 a 40 41 a 50 51 a 60 61 a 70 71 a 80 81 a 90 91 a 100
R$ 6,50 R$ 7,00 R$ 7,00 R$ 7,00 R$ 7,50 R$ 7,50 R$ 7,50 R$ 8,00 R$ 8,50 R$ 9,00 R$ 9,50
CARTA-SERVIÇO DE POSTAGEM ELETRÔNICA-SPE (Caso possuam mais de uma página, o valor a ser recolhido dever ser multiplicado pela quantidade de páginas correspondentes). Modalidade
Valor a ser cobrado
CARTA REGISTRADA
R$ 4,00
CARTA REGISTRADA COM AR
R$ 8,00
INTIMAÇÕES URGENTES POSTADAS ELETRONICAMENTE – SPE Valor por página
Serviço TELEGRAMA *(vide observação abaixo)
R$ 8,00
TELEGRAMA COM CÓPIA
R$ 11,00
TELEGRAMA COM PEDIDO DE CONFIRMAÇÃO DE ENTREGA
R$ 12,00
Caso o telegrama possua mais de uma página o valor a ser recolhido deve ser multiplicado pela quantidade páginas correspondentes. 165
Despesas com publicação de editais no Diário da Justiça Eletrônico Descrição
Valor
Recolhimento
Custos de publicação de editais
R$ 0,12 por caractere
Recolhimento em favor do Fundo Especial de Despesa do Tribunal FEDT. Código 435-9
166
RESPONSABILIDADE DO ESTADO ACERCA DO CRÍTICO QUADRO DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL BONFIM, Celso. – Discente do Oitavo Período A, do Curso de Direito da UNIFEV. BRITO, M. Sc. Déborah Cristiane Domingues de. – Docente da UNIFEV. DALAN, Bruna Oliveira de Haro. – Discente do Sexto Período A, do Curso de Direito da UNIFEV. FACIONI, Fernando Alberto de Jesus Lisciotto. – Discente do Oitavo Período A, do Curso de Direito da UNIFEV. FLORES, Fernanda Medeiros. – Discente do Oitavo Período A, do Curso de Direito da UNIFEV. MIRANDA, Kamila Augusta Melin. – Discente do Sexto Período A, do Curso de Direito da UNIFEV.
RESUMO O direito à saúde é um preceito fundamental, mas verifica-se atualmente, que as expectativas das disposições constitucionais e das demais legislações, não estão sendo alcançadas, pois o Estado tem atuado negligentemente com as questões de saúde pública. Vários são os fatores que contribuem neste cenário de negligência estatal. A má gestão dos recursos públicos, a improbidade dos gestores, as diversidades regionais e alguns outros fatores, vêm contribuindo para o descaso com a saúde. Em função desse cenário, é que se justifica o presente trabalho. O objetivo deste estudo, além de evidenciar a situação fática das questões de saúde pública, foi de demonstrar as consequências jurídicas do vacilo do Estado, destacada a responsabilidade objetiva (administrativa e civil). Buscou-se com isso questionar a irresponsabilidade do Estado e demonstrar as medidas jurídicas utilizáveis para, concomitantemente, coibir a negligência estatal e reparar, ao máximo possível, os danos que ela acarreta ao indivíduo. A hipótese da qual se partiu é que o Estado é objetivamente responsável, no aspecto administrativo e civil, pelos danos que ele causa às pessoas. A pesquisa também buscou demonstrar soluções para os problemas que maculam a efetividade da saúde pública, destacando a autonomia dos municípios. O método empregado foi o dialético na maior parte da pesquisa. Porém utilizou-se também 167
do método dedutivo, na apresentação de casos práticos, e também pelo emprego de jurisprudências. O procedimento empregado foi comparativo, hermenêutico e dogmático jurídico.
Palavras-chave: Saúde Pública no Brasil. Panorama atual da saúde. Negligência. Responsabilidade objetiva do Estado. Proposta de soluções. 168
perdem frequentemente a vida, às
Introdução
vezes por falta de leitos, comuns, e O direito à saúde é um
de UTI em hospitais públicos; às
preceito fundamental, de alcance
vezes por falta de atendimento de
universal e está contido no artigo 6º
urgência financiados pelo SUS; às
da Constituição Federal. Para o
vezes por falta de medicamentos; às
Estado, representa um dever, uma
vezes em virtude das decadentes
obrigação imposta pelo legislador
condições estruturais dos hospitais
constituinte a partir do artigo 196 da
públicos. Em função desse cenário, é
Constituição. Para cumprir com o seu papel,
que se justifica o presente trabalho.
o Estado, deve, obrigatoriamente,
O objetivo deste estudo, além de
prestar os serviços públicos com
evidenciar a situação fática das
diligência
questões de saúde pública, foi de
e
satisfatoriamente,
conforme a ótica constitucional e
demonstrar
as
também
jurídicas
vacilo
infraconstitucional.
do
do
Estado,
Entretanto, verifica-se atualmente,
destacada
que as expectativas das disposições
objetiva (administrativa e civil).
constitucionais
responsabilidade
Buscou-se
com
isso
das
demais
estão
sendo
questionar a irresponsabilidade do
alcançadas, pois o Estado tem
Estado e demonstrar as medidas
atuado negligentemente com as
jurídicas
questões de saúde pública.
concomitantemente,
legislações,
e
a
consequências
não
utilizáveis
para, coibir
a
A má gestão dos recursos
negligência estatal e reparar, ao
públicos, as diversidades regionais e
máximo possível, os danos que ela
alguns
acarreta ao indivíduo.
outros
fatores,
vêm
A hipótese da qual se partiu é
contribuindo para o descaso com a saúde. E por ela ser, além de um
que
o
Estado
é
preceito constitucional, um fator de
responsável,
grande relevância e determinante na
administrativo e civil, pelos danos
vida do indivíduo, graves são as
que ele causa às pessoas. A partir
consequências
da
daí buscou-se também questionar as
irresponsabilidade estatal. Pessoas
decisões judiciais que fixam as
no
objetivamente aspecto
indenizações em valores de pouca 169
significância reparatória, por haver
saúde
interesse
apresentados
causas.
público Isso,
envolvido
pois a
nas
pública
pátria,
casos
de
foram grande
saúde é
repercussão. Ao final, buscou-se
proporcionalmente mais relevante
concluir o trabalho a partir da
que o interesse público “econômico”,
hipótese de partida.
diga-se de passagem, pois a saúde
O método empregado foi o
é uma questão de interesse público.
dialético na maior parte da pesquisa.
É um contrassenso hierarquizar o
Porém
interesse público econômico em uma
método dedutivo, na apresentação
posição superior ao interesse público
de casos práticos, e também pelo
de saúde.
emprego
A pesquisa também buscou demonstrar
soluções
para
os
problemas
que
maculam
a
efetividade
da
destacando
a
saúde
utilizou-se
de
O
procedimento
empregado
foi
comparativo,
hermenêutico
e
dogmático jurídico.
pública,
autonomia
dos
1. O Estado garantidor da saúde: aspectos
estudo dos aspectos constitucionais
infraconstitucionais.
infraconstitucionais
Após,
fez-se
um
da
do
jurisprudências.
municípios. Inicialmente, foi feito um
e
também
constitucionais
e
saúde.
estudo
da
A
saúde
é
um
direito
responsabilidade objetiva do Estado.
universal, um direito de todos, e o
Foi feita também, a demonstração do
Estado tem como dever proteger o
atual panorama da saúde pública,
nosso país dos riscos de doença e
evidenciando
do
de outros agravos implementando
Estado. Comparou-se o cenário da
políticas sociais e econômicas que
saúde pública no Brasil, com a
deem suporte para a redução desses
condição da saúde em outros países
riscos e agravos, pautando sempre
e com as legislações sobre o tema
sua atuação no acesso universal e
nos países comparados. Analisou-se
igualitário a essas ações.
também
a
o
negligência
entendimento
O poder público também deve
jurisprudencial a partir de algumas
colaborar,
decisões sobre saúde pública. Além
regulamentação,
disso,
a
controle. Sua execução deve ser
inadmissibilidade da situação da
feita diretamente, ou através de
para
exemplificar
170
dispondo
sobre
fiscalização
sua e
terceiros e por pessoa jurídica de
O controle e a fiscalização de
direito privado.
procedimentos,
produtos
e
As ações e serviços públicos
substancias de interesse para a
de saúde constituem um Sistema
saúde e a participação da produção
Único de Saúde (SUS), de acordo
de
com as diretrizes do artigo 198 da CF
imunobiológicos, além de outras
e seus incisos.
atribuições que estão elencadas no
A assistência à saúde é livre à iniciativa
privada
equipamentos
artigo 200 da CF e seus incisos,
podem
competem ao Sistema Único de
participar do Sistema Único de
Saúde, e seus órgãos coordenados
Saúde
e subordinados.
de
forma
que
medicamentos,
complementar,
mediante contrato de direito público
Um dos princípios básicos do
ou convênio, sendo preferíveis as
sistema
jurídico
entidades filantrópicas e sem fins
Supremacia da Constituição. Esse
lucrativos. Veda-se a destinação de
princípio objetiva garantir que todas
recursos públicos para auxílios às
as
instituições
privadas
lucrativos.
Além
demais
brasileiro
normas
do
é
a
sistema
com
fins
estejam em consonância com a
disso,
a
Carta Magna, ou seja, o total
Constituição Federal em seu artigo
respeito
pelas
199, § 3º, proíbe a colaboração de
constitucionais.
empresas ou capitais estrangeiros
A
Lei
8.142
normas
de
28
de
na assistência à saúde de nosso
Dezembro de 1.990 dispõe sobre a
país, salvo casos previstos em Lei
participação
da
Complementar.
gestão
SUS,
Por
Lei
do
comunidade através
na dos
Complementar
conselhos de saúde; e sobre as
o
legislador
transferências intergovernamentais
estabelece o regime normativo sobre
de recursos financeiros na área da
as condições e os requisitos para
saúde, que devem cobrir todos os
maior facilidade da remoção de
investimentos, ações e serviços de
órgãos e tecidos para transplantes,
saúde a serem implementados pelos
pesquisas, e tratamento, coleta,
entes da Federação.
infraconstitucional
transfusões de sangue proibindo-se
Pela Lei 8.080 de 19 de
qualquer tipo de comercialização.
Setembro
de
1.990,
são
estabelecidas as condições para a 171
promoção, proteção e recuperação
em todos os níveis de assistência;
da
o
conjugar os recursos financeiros,
serviços
tecnológicos, materiais e humanos
correspondentes. Verifica-se por ser
da União, dos Estados, do Distrito
dever do Estado o provimento das
Federal
condições indispensáveis ao pleno
prestação de serviços de assistência
exercício do direito à saúde, deve
à saúde da população; além de
ele, através do SUS: identificar e
outras
divulgar os fatores condicionantes e
prestação eficaz dos serviços de
determinantes da saúde; formular
saúde.
saúde,
a organização
funcionamento
dos
e
políticas de saúde destinada a
e
dos
Municípios
medidas
que
na
visem
a
Na área da saúde, existem
promover, nos campos econômico e
inúmeras
social, o pleno exercício ao direito da
infraconstitucionais como portarias e
saúde; assistir às pessoas por
instruções normativas que objetivam
intermédio de ações de promoção,
reger
proteção e recuperação da saúde,
hospitais, clínicas, profissionais da
com a realização integrada das
área da saúde, medicamentos, etc.
ações assistenciais e das atividades
Entretanto,
preventivas;
sempre respeitam os ditames da
executar
ações
de
normas
as
relações referentes a
essas
normas
vigilância sanitária, de vigilância
Constituição
epidemiológica,
do
determinadas situações, devem ser
assistência
afastadas objetivando o bem maior
de
saúde
trabalhador,
e
terapêutica
integral,
farmacêutica;
de
ou,
em
que é a “saúde”.
inclusive
participar
Federal
nem
na
Dessa forma, questionam-se
formulação da política e na execução
quais
de ações de saneamento básico;
regulamentações
ordenar a formação de recursos
infraconstitucionais que existem na
humanos
saúde;
área da saúde e a sua função no
controlar e fiscalizar os serviços,
sistema jurídico brasileiro. Nessa
produtos e substâncias de interesse
perspectiva,
para
eficácia
a
na
área
saúde;
de
enfatizar
a
são
os
a
análise
dessas
descentralização dos serviços de
contraponto
com
saúde para os municípios; capacitar
fundamental
à
a resolução dos serviços de saúde
fundamental relevo. 172
tipos
de
do
grau
normas
em
o
saúde
direito é
de
1.1 Abordagem sobre a obrigação de
conjunto de princípios e normas que
reparação de danos
regem a obrigação de indenizar. (2005, p. 13).
Nesta parte deste estudo, busca-se
tecer
considerações
Logo, pode-se entender a
algumas sobre
responsabilidade civil como uma
a
contraprestação,
de
caráter
responsabilidade de reparação de
reparatório de um evento danoso,
danos causados, ou seja, sobre a
cujo objetivo é restaurar o equilíbrio
obrigação
patrimonial e moral violado.
de
se
pagar
um
indenização.
A
responsabilidade
administrativa, ou responsabilidade 1.2 Conceito de responsabilidade
do Estado é uma tradução da
civil e administrativa
obrigação
atribuída
ao
Poder
Público, de compensar os danos Em síntese, o conceito de
percebidos por terceiros, causados
responsabilidade civil é o dever de
pelos agentes públicos que atuam no
indenizar os prejuízos gerados por
exercício de suas atribuições, ou que
um dano. Pelo entendimento de
ajam nessa qualidade.
Sílvio de Salvo Venosa: Em princípio, toda atividade
1.3 Elementos da responsabilidade
que acarreta um prejuízo gera responsabilidade indenizar.
ou
Haverá,
excludentes,
que
indenização
[...].
responsabilidade
é
dever por
Os
vezes,
impedem O
de
responsabilidade
a
civil
da são
os
seguintes: conduta ou ato humano
termo
utilizado
elementos
(ação
ou
omissão),
nexo
de
em
causalidade e o dano ou prejuízo. A
qualquer situação na qual alguma
culpa não é um elemento geral da
pessoa, natural ou jurídica, deva
responsabilidade
arcar com as consequências de um
elemento acidental.
ato, fato ou negócio danoso. Sob
e,
Constitui-se
sim,
um
a
essa noção, toda atividade humana,
responsabilidade
portanto, pode acarretar o dever de
elementos. São eles: o ato ilícito; a
indenizar. Desse modo, o estudo da
relação de causalidade entre a
responsabilidade civil abrange todo o
conduta do agente e o prejuízo 173
de
quatro
sofrido pela vítima, denominada de
A responsabilidade do causador do
nexo causal; o dano efetivamente; e
dano, pois, somente se configura se
a culpa do agente. Havendo esses
ele agiu com dolo ou culpa. Trata-se
quatro elementos, ocorrerá o dever
da teoria clássica, também chamada
de indenizar.
teoria da culpa ou subjetiva, segundo a qual a prova da culpa lato
1.4
Classificações
sensu (abrangendo o dolo) ou stricto
da
sensu se constitui num pressuposto
responsabilidade
do dano indenizável. Existem no Brasil, hoje, várias classificações da responsabilidade,
1.4.2 Responsabilidade civil objetiva
que podem ser: (A) Extracontratual – aquela cujo elemento caracterizador
A lei impõe em determinadas
verifica-se fora de um contrato e
situações, a obrigação de reparar o
decorre
descumprimento,
dano independentemente de culpa.
imputando o dever de indenizar aos
É a teoria dita objetiva ou do risco,
praticantes
(B)
que prescinde de comprovação da
Contratual que é aquela derivada do
culpa para a ocorrência do dano
descumprimento de uma cláusula
indenizável. Basta haver o dano e o
contratual; (C) Subjetiva – quando o
nexo de causalidade para justificar a
dever de indenizar o dano incidir
responsabilidade do agente. Em
sobre o culpado, isto é no indivíduo
alguns casos presume-se a culpa
que teve culpa na causa do dano; e
(responsabilidade
(D) Objetiva, sempre que a lei dispor
imprópria), noutros a prova da culpa
que o dano deve ser reparado
é
independentemente da culpa do
(responsabilidade
indivíduo que o causou.
propriamente dita).
do
de
ato
ilícito;
totalmente
objetiva
prescindível civil
objetiva
É a exceção pela qual, em 1.4.1 Responsabilidade subjetiva
alguns casos previstos em lei, o agente responde mesmo sem ter
Diz-se subjetiva a responsabilidade
havido culpa sua para o dano; por
quando se baseia na culpa do
isso, como dito acima, na teoria
agente, que deve ser comprovada
objetiva da responsabilidade, o dano
para gerar a obrigação indenizatória.
é mais importante do que a culpa. 174
Prevê a Constituição Federal,
do trabalho que lhes competir, ou em
em seu artigo 37, § 6º, que “as
razão dele;” e “os que gratuitamente
pessoas jurídicas de direito público e
houverem participado nos produtos
as de direito privado prestadoras de
do crime, até a concorrente quantia”.
serviços públicos responderão pelos
O método empregado foi o
danos que seus agentes, nessa
dialético na maior parte da pesquisa.
qualidade, causarem a terceiros,
Porém
assegurado o direito de regresso
método dedutivo, na apresentação
contra o responsável nos casos de
de casos práticos, e também pelo
dolo ou culpa”. Nota-se, portanto,
emprego
que a responsabilidade do Estado é
utilizou-se
do
jurisprudências.
O
procedimento
empregado
foi
objetiva, pois manda a Constituição
comparativo,
hermenêutico
e
que
dogmático jurídico.
este,
causados
indenize
os
danos
independentemente
de
também
do
dolo ou da culpa de seus agentes,
2. Panorama atual da saúde pública:
que se verificados, asseguram ao
um estado negligente
Estado o direito de cobrar de seus agentes o prejuízo sofrido com a
A Saúde Pública no Brasil tem
indenização, em ação regressiva. No
âmbito
responsabilidade
será
civil,
sido a
objeto
políticos,
objetiva,
religiosos.
de
muitos
jurídicos, A
razão
debates sociais,
disso
é
a
quando prevista pelo Código de
ineficiência dos serviços públicos de
2.002, ou legislação esparsa que a
saúde e a precariedade em sua
determinar. Dentre as hipóteses de
prestação.
responsabilidade
civil
objetiva
Vários são os fatores que
especificadas pelo Código Civil, as
contribuem
que
aproximam
negligência estatal. A má gestão dos
tematicamente deste estudo, são as
recursos públicos, a improbidade
prevista pelo artigo 932, incisos III e
dos
V, que dispõem, respectivamente:
regionais e alguns outros fatores,
“são também responsáveis pela
vêm contribuindo para o descaso
reparação civil: o empregador ou
com a saúde.
mais
se
neste
gestores,
as
cenário
de
diversidades
comitente, por seus empregados,
Com isso, graves são as
serviçais e prepostos, no exercício
consequências à população que 175
depende dos serviços públicos de
eficazes,
saúde. Não é incomum as pessoas
autonomia dos municípios, e neles
perderem a vida, às vezes por falta
são implantadas. Pois se é mais fácil
de leitos, comuns, e de UTI em
obter
hospitais públicos; às vezes por falta
políticas públicas, quando elas são
de
direcionadas
atendimento
de
urgência
quando
êxito
na
a
realçam
destinação
um
a
das
contingente
financiados pelo SUS; às vezes por
demograficamente menor, além de
falta de medicamentos; às vezes em
facilitar a fiscalização dos recursos
virtude das decadentes condições
aplicados. Todavia, são poucos os
estruturais dos hospitais públicos.
municípios beneficiados com essas
E mesmo assim, o Estado não
políticas progressistas (a exemplo
aprimora sua postura diante dessa
regional, cite-se os municípios de
realidade.
o
São José do Rio Preto, Araçatuba e
aperfeiçoamento dos serviços de
Ribeirão Preto), restringindo-se elas
saúde públicos instalou em todos os
aqueles
debates eleitorais, motivando os
microrregiões. De modo que a
candidatos
se
eficácia destas políticas é atenuada,
comprometerem cada vez mais com
pois as populações dos municípios
a questão, mas de lá não se
circunvizinhos
deslocou. E em todas as instâncias
atendidas, por meio de convênios
administrativas: Federal, Estadual e
intermunicipais,
Municipal, poucas foram as políticas
privilegiados pela prestação mais
implementadas para a melhoria da
eficiente dos serviços de saúde.
O
tema
sobre
políticos
a
que
sediam
passam
as
a
ser
naqueles
Saúde Pública. Na visão política do
E com isso a utilização dos
Estado, evoluiu-se, pois, as filas
serviços públicos de saúde, continua
foram
sendo um risco que o indivíduo opta
substituídas
agendamentos.
Na
ótica
por social,
por
aventurar-se,
quando
não
trocou-se seis por meia dúzia, uma
possuidor de um plano privado
vez
complementar de saúde.
que
os
agendamentos
distanciam os atendimentos, que se tornam demasiadamente morosos. O que se constata de positivo
2.1
neste panorama é que as políticas
Alguns
repercussão
públicas de saúde tendem a ser mais 176
casos
de
grande
Alguns casos que chocaram e inconformaram merecem
ser
a
chamou a atenção deste caso para
sociedade
destacados
nosso estudo foi a demora na
neste
transferência da criança para outro
estudo para tornar esta negligência
hospital, e o fato de ser público o
ainda mais nítida.
hospital cuja UTI estava interditada.
Wallas Kevyn da Conceição
Além disso, na UTI neonatal em
dos Santos, de apenas 2 (dois)
apenas um período de 2 (dois)
meses, no dia 11 de junho deste ano,
meses, 14 (catorze) morte foram
levado ao Hospital Municipal da
registradas. Segundo a diretora do
Criança
com
próprio hospital, registrava-se um
pneumonia e bronquiolite. Dada a
índice entre 14 (catorze) e 20 (vinte)
piora em seu estado de saúde, o
mortes por ano na UTI. Agentes da
recém-nascido
vigilância
de
Guarulhos/SP
precisou
de
sanitária
encontraram
atendimento na Unidade de Terapia
prontuários de 6 (seis) crianças
Intensiva (UTI), mas mesma estava
mortas por infecção. Três autos de
interditada. Três dias depois da
infração
necessidade do atendimento, é que
justificar a interdição.
o menino foi transferido para um
foram
lavrados
para
Outro caso que comoveu a
hospital em Francisco Morato. A mãe
sociedade, foi a
notou que o dedão do pé direito da
(dezessete) bebês em apenas 6
criança estava com um curativo, mas
(seis) meses na Maternidade da
a médica havia dito que a causa do
Santa Casa de Suzano/SP. Apenas
ferimento foi decorrente da aplicação
no mês de maio, morreram 7 (sete)
de soro em uma veia do pé. Parte do
crianças. O Ministério Público local
dedão do pé da criança teve que ser
passou a investigar as mortes, e
amputado.
o
exigiu esclarecimentos do prefeito e
na
da secretária municipal de saúde,
aplicação do soro na veia do dedo da
que não apareceram para prestá-los.
criança, e a eventual formação de
Por conta disso, a promotora decidiu
bolha, que ocasionou amputação,
interditar toda a maternidade do
merece uma análise mais restrita,
hospital.
contexto
Obviamente do
erro
que
médico
morte de
17
feita em outro estudo publicado na
No Rio de Janeiro, a partir do
Revista Linhas Jurídicas, do Curso
dia 08 (oito) de Novembro, do
de Direito da UNIFEV. Mas o que
corrente ano, a equipe médica e de 177
enfermagem, do Hospital Federal
Um estudo que inspirou esta
Cardoso Fontes, em Jacarepaguá,
abordagem comparativa, e mais
zona-oeste da cidade, iniciaram um
detalhado sobre a contextualização
protesto
internacional do tema saúde, foi feita
contra
a
falta
de
funcionários e condições precárias
Organização
de trabalho, que comprometem o
Saúde, com o título “Regulação do
atendimento
pacientes.
setor da saúde nas américas: as
Decidiram paralisar as atividades
relações entre o público e o privado
para protestar.
numa
aos
Foi a segunda
paralização em um lapso de tempo
Pan-Americana
abordagem
da
sistêmica”,
merece atenção especial.
menor que um mês.
Verificou-se nele (pág. 17-18),
Vários outros casos também
que, no contexto internacional, de
revoltaram a população brasileira,
um modo geral, os serviços de
contextualizando a precariedade dos
saúde, se adequam à variação
serviços públicos de saúde, a falta
dos Welfare Satates, isto é, dos
de medicamentos, ou a improbidade
Estados de Bem-Estar, que adotam
dos gestores dos recursos públicos
modelos diferentes de políticas.
destinados a saúde. Todavia, o mais
Países como a Alemanha,
preocupante é quando outros casos
Áustria, França, e Itália, que adotam
de descasos, também de gravidade
o chamado industrial achievement
considerável,
performance
não
chega
ao
model
policy
ainda são ocultados pelos próprios
industrial), vinculam suas políticas
hospitais,
ao
acobertados
pela
de
social
conhecimento da população, ou
ou
(modelo
of
desempenho
desempenho
dos
grupos
administração pública. Nesta seara,
favorecidos. Aqueles que laboram
a mídia tem exercido fundamental
para o progresso dessas nações são
papel de fiscalização e publicidade,
de certa forma, privilegiados nas
incentivando a sociedade a se
políticas estatais, inclusive as de
manifestar.
saúde. Em países como a Suécia, Noruega,
Dinamarca,
e
3. A símile da condição de saúde no
principalmente a Dinamarca, que
brasil com outros países
adotam a política doredistributive model of social policy, um modelo 178
institucional-retributivo,
baseado
somente
alcança
uma
classe
num padrão socialdemocrata, cujo
privilegiada economicamente que
bem estar social é tido como
pode fazer uso dos planos privados
elemento
das
complementares de saúde, haja
sociedades contemporâneas e cujas
vista que a prestação pública dos
políticas, incluídas as de saúde, são
mesmos através do SUS encontra-
direcionadas ao favorecimento de
se decadente.
constitutivo
toda a nação.
Em uma comparação com os
Já em países como Austrália, Suíça
e
principalmente
Sistemas
Estados
de
Saúde
de
outros
países, percebe-se que é possível
Unidos que adotam um modelo de
reverter o quadro crítico nacional.
políticas residuais (residual welfare
Conforme matéria publicada
model of social policy), prevalece o
no portal R7.com, o Brasil investe em
atendimento privado das demandas,
saúde, metade dos recursos que
inclusive as de previdência e as de
alguns países investem:
as de saúde. O Estado participa
Os atuais gastos com a saúde
dessas políticas de modo residual,
pública no país ficam muito abaixo
favorecendo apenas os segmentos
do que é investido por nações que
sociais que foram excluídos pelo
também oferecem saúde gratuita,
mercado desses canais.
como
Assim,
verifica-se
Constituição
Federal
privilegiou
a
que
de
a
Unido,
Alemanha,
Canadá e Espanha.
1.988
sociedade
Reino
Segundo
o
Ministério
da
ao
Saúde, o Brasil gastou 3,6% do PIB
universalizar o acesso aos serviços
(Produto Interno Bruto, ou a soma de
públicos
que
todas as riquezas do país) com a
anteriormente se assemelhavam ao
saúde pública, em dados de 2008 –
modelo americano. Buscou-se com a
último
alteração
Estados
de
saúde,
constitucional
aproximação
com
institucional-retributivo. aproximação,
o
uma modelo
balanço e
oficial
contando
municípios.
O
valor
equivale a quase R$ 109 bilhões. De
A
acordo
com
dados
da
OCDE
infelizmente
(Organização para Cooperação e
aconteceu só no texto constitucional,
Desenvolvimento Econômico), 56%
pois na realidade a eficiência dos
do que é investido em saúde no
serviços
Brasil vem de recursos públicos.
de
saúde
nacionais 179
Já os países citados investem
A partir de uma análise dos
ao menos 6% de seu PIB no setor
recentes julgados dos Tribunais
público de saúde. Com isso, 60% a
pátrios, verifica-se uma volumosa
70% do que é gasto com saúde é
quantidade de litígios cujo bojo se
responsabilidade
traduz na questão da saúde pública.
segundo
dos
relatório
governos, da
Opas
Nesses
processos
aponta-se
o
(Organização Pan Americana de
Estado como um ente negligente, e
Saúde).
busca-se a composição dos danos.
Mas o fator que mais incide na
Nota-se, a partir do julgamento de
ineficiência dos serviços públicos de
uma
saúde no Brasil é a má gestão dos
contra o Hospital das Clínicas em
recursos
destinados,
São Paulo, que o Poder Judiciário
caracterizada ou pelo desperdício ou
paulista tem primado pela dignidade
pela improbidade dos gestores.
da pessoa humana, que se sobrepõe
a
Acerca
eles
disso,
propôs
a
ao
apelação
cível
interesse
promovida
patrimonial
da
Organização Mundial da Saúde, em
Administração Pública. Parte do
seu Relatório Mundial da Saúde,
Voto do Relator:
Publicado
em
2.010,
e
Não pode, enfim, o juiz ignorar
posteriormente traduzido para a
a realidade, essa sim, que salta
íngua portuguesa em 2.011 (pág. 19-
dramática aos seus olhos. É que a
20), soluções para a ineficiência dos
matéria em debate diz respeito à
serviços de saúde, a partir da
dignidade humana, à solidariedade
maximização do rendimento das
e, sobretudo, à justiça social.
tecnologias e serviços de saúde, da
Toda essa pauta axiológica há
motivação dos trabalhadores da
que se sobrepor, e com firmeza,
saúde,
diante
do
aprimoramento
da
do
outro
interesse
em
eficiência hospitalar, do zelo nos
questão: o interesse secundário e
atendimentos para evitar os erros
patrimonial
médicos, no combate ao desperdício
Pública.
e à corrupção; e da avaliação crítica
AÇÃO
da
Administração
ORDINÁRIA
das necessidades dos serviços.
Indenização por danos morais Erro
4. Percepção jurisprudencial
médico Negligência na prestação do serviço público de saúde Nexo de causalidade 180
reconhecido
Responsabilidade
objetiva
do
1.
Estado Recurso provido. [1] Logrou indenização
o no
dos
entes
políticos da federação tem o dever
apelante,
valor
Qualquer
de
na
promoção,
prevenção
e
R$
recuperação da saúde. 2. Não
100.000,00 para a composição dos
prevalece a alegação do Estado no
danos percebidos.
sentido de que só é responsável pelo
E além de ser brilhante a
fornecimento
de
medicação
e
atuação de nossa justiça, que não
utensílios de higiene e tratamento
privilegia o Estado e não acoberta
médico que fazem parte da lista de
sua
remédios
omissão,
evidencia-se
sua
básicos
de
sua
efetividade em uma jurisprudência
responsabilidade, pelo simples fato
gaúcha. O Tribunal de Justiça do Rio
de
Grande do Sul, no Julgamento de um
regulamentam as gestões – de
Agravo de Instrumento mantiveram a
âmbito interno entre os entes – não
penhora de dinheiro em contas
se
públicas do próprio estado do rio
constitucional. Precedentes deste
grande do sul, para assegurar o
Tribunal. 3. É de ser deferida a
fornecimento de fraudas geriátricas:
medida
AGRAVO
DE
INSTRUMENTO.
que
as
Portarias
sobrepõem
que
à
antecipatória
norma
quando
demonstrada a verossimilhança das
Decisão
alegações
e
o
risco
de
dano
monocrática (art. 557, caput do
irreparável. É direito do cidadão
CPC).
exigir e dever do Estado fornecer
Direito
especificado.
público
não
SAÚDE
PÚBLICA.
de
epilepsia,
indispensáveis ao tratamento da
encefalopatia crônica, retardo de
moléstia quando o cidadão não
desenvolvimento
neuropsicomotor.
puder arcar com os custos da
Fornecimento de fraldas geriátricas
aquisição sem prejuízo ao seu
descartáveis. Antecipação de tutela.
próprio
Cabimento. Bloqueio de valores em
pressupostos
conta
estado.
previstos no art. 273 do CPC. 4.
VIABILIDADE. Precedentes desta
Sendo descumprida a determinação
Corte e do STJ.
judicial
Diagnóstico
bancária
do
medicamentos
e
sustento.
de
medicamentos
da
procedimentos
Presentes
os
antecipação
fornecimento requisitados
dos ao
Estado, possível o bloqueio do valor 181
correspondente
em
sua
conta
morte de seu cônjuge que, após
bancária justificando-se a medida
acidente
excepcional ante a supremacia do
transferido
bem
objetiva
públicos e, em razão de inadequado
de
serviço e atendimento, no intervalo
jurídico
que
resguardar.
se
AGRAVO
instrumento DESPROVIDO. [2]
de
motocicleta,
para
dois
foi
hospitais
de tempo em que estava sob os
O mesmo entendimento das
cuidados da saúde pública, veio a
justiças estaduais verifica-se, que é
falecer.
partilhado pelos tribunais superiores,
2. Marcou o Tribunal a quo
no sentido de que a Saúde preconiza
que, "se o ente público tivesse
o zelo do Estado. E quando este
prestado
Estado opera com falta de diligência,
atendimento à vítima, no intervalo de
ele
severamente
tempo em que ela esteve sob seus
sancionado. O Superior Tribunal de
cuidados, certamente o caso não
Justiça,
teria evoluído para tão grave e
deve
no
ser
Julgamento
de
um
Agravo Regimental oferecido em Embargos
Declaração
e
adequado
lamentável desfecho". De
acordo
Recurso Especial, manteve o valor
jurisprudência
desta
de
excepcionalmente, nos casos em
uma
de
pronto
indenização
em
de
3.
R$
100.000,00:
RESPONSABILIDADE ESTADO,
a
Casa,
que manifestamente excessivo ou
ADMINISTRATIVO E CIVIL.
DO
com
POR
irrisório, pode-se rever o valor fixado
OBJETIVA
pelo Tribunal de origem a título de
MORTE
indenização
por
danos
morais.
DECORRENTE DE OMISSÃO EM
(AgRg no AREsp 3.685/RR, Rel.
ATENDIMENTO
HOSPITALAR.
Min. Cesar Asfor Rocha, Segunda
REDE PÚBLICA. REDUÇÃO DO
Turma, julgado em 24.5.2011, DJe
QUANTUM
8.6.2011.)
INDENIZATÓRIO.
IMPOSSIBILIDADE.
SÚMULA
4. O valor fixado a título de
7/STJ.
reparação pelos danos morais, em 1. A quaestio iuris trazida aos
cem mil reais, no caso de morte por
autos cuida da proporcionalidade e
omissão no atendimento por hospital
razoabilidade do valor arbitrado a
público, não se mostra ínfimo ou
título de reparação pelo dano moral
exorbitante, o que torna impossível
sofrido pela agravada, em razão da
sua 182
modificação
pelo
Superior
Tribunal de Justiça ante o óbice
são longas, ou porque a espera é
inserto na Súmula 7/STJ.
demasiada; os agendamentos são
Agravo regimental improvido.
excessivamente protelados, enfim, é
[3]
caracterizada uma conjuntura de negligência, por parte do Estado. Se tal realidade, ao menos na
Conclusão
ótica
legislativa,
não
deveria
evidenciar-se, o que fazer para A questão da Saúde Pública é
reverter o quadro crítico? Qual a
bem complexa, como a maioria das
solução proposta para a questão da
relações
Saúde Pública no Brasil?
jurídicas
socialmente
constituídas.
que
Pela lógica da pesquisa, o
O Estado como ente público
foco é a responsabilidade objetiva do
o
Estado,
é,
Constituição
deveria,
a
da
que
judicialmente
deve
de
1.988,
reparar os danos causados aos
seu
papel
indivíduos, em função de sua culpa
constitucional de zelar pelo interesse
negligente pelo descaso na saúde.
público, salvaguardando os direitos
Assim,
individuais e coletivos. Contudo, é
constrangimento
historicamente nítido que ele assim
indivíduo vítima dessa insensatez
não age.
estatal.
cumprir
Federal
teor
com
o
restaria
diminuído suportado
o pelo
Nosso país é carente quando
Os juízes, por sua vez, como
se trata de saúde, que é deixada em
se verificou, tem demonstrado uma
segundo plano. O Estado não tem se
atuação louvável nos julgamentos
preocupado com a saúde, com a
sobre
importância devida, e esta tem se
indenizações que não são irrisórias.
tornado
Os
Pois o objetivo de uma indenização,
hospitais públicos são carentes em
além de reparar o dano sofrido pela
infraestrutura
os
vítima, é reprimir condutas repetidas
pacientes; os médicos tornaram-se
por parte do causador do dano. As
impacientes
os
indenizações baratas devem ser
precários;
questionadas. Não se pode admitir a
pessoas acabam morrendo por falta
fixação de indenizações em valores
de atendimento, ou porque as filas
de pouca significância reparatória
sinônimo
atendimentos
de
para
e
caos.
atender
revoltosos; são
183
o
tema,
e
aplicado
com a justificativa de haver interesse
tem favorecido o progresso. Porém,
público envolvido nas causas. Isso,
são
pois a saúde é proporcionalmente
privilegiados com políticas públicas
mais relevante que o interesse
eficientes. E mesmo nos municípios
público “econômico”, diga-se de
beneficiados,
passagem. A saúde é também uma
tornam ineficientes em razão dos
questão de interesse público. É um
congestionamentos
contrassenso
o
políticas de melhoria na saúde
interesse público econômico em uma
devem ser expandidas para os
posição superior ao interesse público
outros municípios, que não de
de saúde.
regiões metropolitanas. Elas devem
hierarquizar
poucos
os
municípios
essas políticas
regionais.
se
As
A transformação do caos na
ser inseridas em todos os municípios
saúde, entretanto, não se restringe
do interior dos estados membros,
na
pois
responsabilidade
objetiva
do
a
Administração
Pública
Estado, quanto aos danos por ele
arrecada recursos suficientes para
causados.
é
isso. A má gestão desses recursos
soberano por direito. Sendo detentor
abolida, uma vez que a história da
da soberania, cada indivíduo, pode e
política podre já foi escrita, e já está
deve questionar qualquer assunto de
na hora de um final feliz.
O
natureza
povo
brasileiro
pública,
exigir
A saúde é, pois, uma questão
dos
agentes
de direito, de direito que deve ser
públicos, e reivindicar melhorias dos
exercido com satisfatividade. Não se
serviços públicos. Um povo manso é
trata de uma questão de fato, de uma
um povo escravo do Estado.
realidade não transformável.
esclarecimento
Além disso, o que se verifica, é que a autonomia dos municípios
184
Referências BISOTO JUNIOR, Geraldo; DAIN; Sulamis; SILVA, Pedro Luís de Barros. Regulação do setor saúde nas Américas: as relações entre o público e o privado numa abordagem sistêmica. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2006. Disponível em: <http://www.opas.org.br/servico/arquivos/Sala5573.pdf>. Acesso em 20/11/2011. Brasil, Ministério da Saúde. Carta dos direitos dos usuários da saúde. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2007. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/carta_direito_usuarios_2ed2007.pd f>. Acesso em: 20/11/2011. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em 26/10/2009. BRASIL. Lei n° 10.406 de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/leis/2002/L10406.htm> Acesso em: 12/11/2009 às 17h. ELOVAINIO, Riku et. al. Relatório Mundial da Saúde: financiamento dos sistemas de saúde: o caminho para a cobertura universal. Traduzido por CABRAL, Jorge; FLORIANO, Aurélio; FERRINHO, Paulo. Lisboa: CPLP, Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, 2011. Disponível em: <http://www.acs.min-saude.pt/files/2011/05/Relatorio_OMS.pdf>. Acesso em: 20/11/2011. G1, São Paulo. Bebê perde parte do dedo durante tratamento contra pneumonia em São Paulo. Disponível em: <http://g1.globo.com/saopaulo/noticia/2011/07/bebe-perde-parte-do-dedo-durante-tratamento-contrapneumonia-em-sp.html>. Acesso em: 20/11/2011. G1, São Paulo. MP pede interdição da maternidade da Santa Casa de Suzano. Disponível em: <http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2011/06/mppede-interdicao-da-maternidade-da-santa-casa-de-suzano.html>. Acesso em: 20/11/2011. G1, Rio de Janeiro. Paralização em hospital público do Rio deixa pacientes sem atendimento. Disponível em: <http://g1.globo.com/rio-dejaneiro/noticia/2011/11/paralisacao-em-hospital-publico-do-rio-deixa-pacientessem-atendimento.html>. Acesso em: 20/11/2011. R7, Notícias. Brasil gasta com saúde pública metade do que investem países como Alemanha e Canadá. NEUMAN, Camila; NOVAES, Marina. Disponível em: <http://noticias.r7.com/brasil/noticias/gasto-com-saude-publicano-brasil-e-metade-do-usado-nos-paises-que-tem-esses-servicos-de-graca20110921.html>. Acesso em 20/11/2011. 185
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186
SOBRE A INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL DOS KITS ANTIHOMOFÓBICOS DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO À LUZ DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS BIMBATO, Dionísia Aparecida Rodrigues. Discente do 9º período do curso de Direito da UNIFEV – Centro Universitário de Votuporanga.
RESUMO Muito se discutiu nos últimos dias sobre a proposta contra a homofobia que o Ministério da Educação vem elaborando, mas ainda não divulgou oficialmente; e que é constituída por um conjunto composto por cartazes, um livro com sugestões de atividades direcionado aos professores, e três vídeos temáticos, os quais, vazaram na mídia e provocaram uma enorme polêmica. Gerou-se um embate divisor de águas. Políticos e psicólogos dividiram-se, religiosos e entidades manifestaram-se, e a presidenta Dilma Rousseff suspendeu
o
projeto.
O
presente
trabalho
buscou
demonstrar
a
inconstitucionalidade formal e material da proposta, através de uma interpretação dos princípios que compõem a estrutura constitucional pátria, a fim de contribuir com raciocínios jurídicos para o entendimento de que é inviável o projeto do MEC, valendo-se da metodologia dialética e bibliográfica.
Palavras-chave: Proposta Anti-Homofobia do MEC. Exegese Principiológica Constitucional. Inconstitucionalidade Formal e Material. 187
o assunto, em que busca-se avaliar
Introdução
a viabilidade do pacote criado pelo MEC.
O presente trabalho se propõe anti-
O “kit gay”, como vulgarmente
da
ficou conhecido, é constituído por um
Educação e Cultura que, nos últimos
pacote de medidas anti-homofóbicas
dias, tem sido muito discutida nos
que vem sendo elaboradas pelo
canais de mídia. O objetivo é
MEC, através da Secretaria de
demonstrar a inconstitucionalidade
Educação
formal e material desta, através de
Alfabetização
uma interpretação dos princípios que
(SECAD),
compõem a estrutura constitucional
entidades defensoras dos Direitos
pátria, a fim de contribuir com
Humanos e da Comunidade LGBT
raciocínios
o
(Lésbicas,
entendimento de que é inviável o
Travestis)
a
analisar
homofóbica
a
proposta
do
Ministério
jurídicos
para
Continuada,
e
Neste
projeto do MEC. Para tanto, utilizou-
e em
Gays,
Diversidade conjunto
com
Bissexuais
pacote,
que
e
se
dialética,
pretendia distribuir à cerca de 6.000
comparando bibliografias, a fim de
escolas, há um conteúdo polêmico,
subsidiar a tese aqui defendida.
formado por cartazes, um livro com
se
da
metodologia
sugestões de atividades direcionado 1. Da proposta de combate à
aos professores, e três vídeos
homofobia elaborada pelo ministério
temáticos. O pacote integra o Projeto
da
“Escola sem Homofobia”, criado a
educação
e
cultura
e
sua
partir de seminários e pesquisas
repercussão social
realizadas em escolas públicas, Muito se discutiu nos últimos
onde diz o MEC, ter verificado a
dias sobre a proposta contra a
existência de preconceito contra
homofobia que o Ministério da
alunos homossexuais. Apesar do projeto ainda não
Educação vem elaborando, mas ainda
não
oficialmente.
ter sido finalizado pelo órgão, os
divulgou
vídeos
Disseminou-se na
acabaram
vazando
na
e
internet, gerando um grande embate
eletrônica, um grande debate sobre
divisor de águas. Em novembro de
mídia,
televisiva,
impressa
2.010, a discussão foi levada para o 188
da
parecer, “contribuirá para a redução
manifestação do Deputado Federal
do estigma e da discriminação, bem
Jair Bolsonaro, em sessão realizada
para promover uma escola mais
no
equânime e de qualidade”.
campo
político,
Plenário
da
através
Câmara
dos
Deputados. A posição do legislador
Psicólogos divergem sobre o
é nítida: “isso é um estímulo à
assunto.
homossexualidade, à promiscuidade
psicóloga, diz em seu blog que “No
e uma porta à pedofilia”. Além dele,
fazer
o
Anthony
pautas se atravessam, dentre elas,
Garotinho, em 25 de Maio de 2.011,
a questão da sexualidade”. Ela
“chantageou” o Poder Executivo,
ainda esclarece:
Deputado
Federal
Joselaine
psicológico,
Garcia,
diferentes
advertindo a este que inviabilizasse
É mister o enfrentamento de
o Projeto do Ministério da Educação
todas as violências e opressões, é
e Cultura, para que os Projetos do
preciso inventar novas estratégias,
Governo
da
novas práticas diferenciadas, que
bancada evangélica da Câmara. O
possam romper com o modelo
senador Magno Malta também se
dicotômico e punitivo e levar a
manifestou Contrário ao Projeto, em
um olhar mais amplo. Não me refiro
audiência pública na Assembleia
aqui somente a questão frente à
Legislativa do Mato Grosso, dizendo
sexualidade, mas a todas a questões
que as crianças a que o Projeto se
que abarcam a exclusão social.
tivessem
o
apoio
destina, estariam “na academia da homossexualidade”.
Nem
São imprescindíveis projetos
é
que tragam à baila os preconceitos
necessário enfatizar que o projeto foi
sociais que abarcam a sociedade
rechaçado por religiosos.
brasileira e que se manifestam
Entretanto, há quem defenda
também, além da homofobia, no
o Projeto Anti-homofobia. O Ministro
racismo, na violência contra os
Fernando
Haddad,
arrazoou
pobres, às pessoas com deficiência,
dizendo:
“Queremos
que
a
às pessoas com sofrimento mental,
não
enfim os múltiplos segmentos que
podemos deixar ninguém fora da
são excluídos e violentados em seus
escola”. Em fevereiro de 2.011 a
direitos sociais e humanos.
sociedade
perceba
que
UNESCO manifestou-se favorável ao pacote do MEC, que, em seu 189
Mas é indispensável sempre
jurídicas. A arte ficou subordinada,
ter o cuidado de não exagerar na
em
dose, como já disse anteriormente, é
progressivo, a uma ciência geral, o
necessário adotar alguns cuidados
Direito obediente, por sua vez, aos
para que a dosagem do antídoto não
postulados da Sociologia; e a outra,
seja mais forte do que aquilo que o
especial a Hermenêutica. Esta se
sujeito quer e necessita. (Disponível
aproveita
em:
Filosofia Jurídica; com o auxílio <http://joselainegarcia.blogsp
seu
desenvolvimento
das
conclusões
da
delas fixa novos processos de
ot.com/2011/05/polemica-kit-anti-
interpretação;
homofobia.html>)
enfeixa-os
num
sistema, e, assim areja com um sopro de saudável modernismo a
No dia 25 de Maio de 2011, o
arte,
rejuvenescendo-a,
projeto foi suspenso pela atual
aperfeiçoando-a, de modo que se
presidenta
conserve à altura do seu século,
Excelentíssima
Dilma
Rousseff.
como
elemento
de
progresso,
propulsor da cultura profissional, 2.
Da
exegese
principiológica
auxiliar prestimosa dos pioneiros da
constitucional do projeto “escola sem
civilização. (2009, p. 1).
homofobia”
A
Hermenêutica
Jurídica
subsidia os juristas com diversos Esse assunto, como todos os
métodos (crivos) de interpretação,
produzem
jurídicos,
feita de maneira progressiva nestes
carecem de interpretação jurídica,
métodos. Permite que se faça a
isto é, de Hermenêutica Jurídica
interpretação literal, lógica, histórica,
Aplicada. Segundo MAXIMILIANO
sistemática, teleológica ou finalística
que
efeitos
as
e sociológica. O Projeto “Escola sem
artes em geral, possui a sua técnica,
Homofobia”, no pé em que se
os meios para chegar aos fins
encontra, consegue transpor o crivo
colimados.
da maioria dessas interpretações.
A
princípios
interpretação,
Foi e
como
orientada regras
que
por se
Como
sabe-se,
desenvolveu e aperfeiçoou à medida
historicamente, os indivíduos que
que
possuem
orientação
sexual
diferenciada
da
sofrem
envolveu
desabrocharam
a
sociedade as
e
doutrinas 190
comum,
diversos tipos de preconceitos. A
2.1 Da dignidade da pessoa humana
sociedade, nunca esteve, e não está preparada para recebê-los com bons
Este
princípio
possui
um
olhos. Há sempre quem não está
conceito aberto e muito amplo,
adaptado a este fenômeno social.
porém zela pela efetividade de todas
Com
as outras garantias constitucionais.
o
novo
Pensamento
Constitucional, estreado em 1988, o Estado
Democrático
Direito,
Cada ser humano tem, pois,
passou a promover a defesa dos
um lugar na sociedade humana. Um
direitos sociais e individuais, a
lugar que lhe é garantido pelo direito,
liberdade,
o
que é a força organizadora da
desenvolvimento, a igualdade, e a
sociedade. Como sujeito de direitos
justiça, de uma sociedade fraterna,
ele não pode ser excluído da
pluralista,
sociedade
o
de
Conforme a doutrina:
bem-estar,
sem
preconceitos,
e
como
sujeito
de
fundada na harmonia social; e tem
obrigações ele não pode prescindir
por objetivo a dignidade da pessoa
de sua pertinência à sociedade, na
humana, conforme verificado no
qual é chamado a exercer um papel
preâmbulo da CF/88, e em seu art.
positivo.
1º, III. Então toda tentativa com o
9, apud ARAUJO; NUNES JÚNIOR,
objetivo
2009, p. 101-102).
de
erradicar
estes
preconceitos, ou ao menos amenizá-
2002,
p.78-
Assim, a dignidade da pessoa
los é sempre bem-vinda. Contudo,
(MOURA,
humana tem o condão de obrigar o
este
projeto
Estado para com seus cidadãos, e
governamental, na sua expressão
não estes para com àquele. Em
original
ser
outras palavras, a dignidade da
é,
pessoa humana vincula o Estado a
precisa estar em consonância com o
zelar pelas garantias fundamentais
sistema jurídico Pátrio. A melhor
da
forma de validá-lo, é decifrá-lo
Constitucional.
conforme
funcionar de modo instrumental, isto
(literal),
juridicamente
Constitucionais,
precisa
coerente,
os
isto
preceitos sobretudo
os
é,
princípios:
pessoa,
ser
o
contidas Deve
na o
instrumento
Carta Estado
para
a
efetividade dos Direitos individuais. É pois a dignidade da pessoa humana, a efetividade de todos os 191
seus direitos. Conforme preleciona
desprovida de preconceitos raciais,
Santos,
de gênero, de idade, de origem, ou
[...]as
normas
de
direito
outras formas de discriminação. E
fundamental ocupam o grau superior
esta
da ordem jurídica; estão submetidas
diferenças, das desigualdades, em
a processos dificultosos de revisão;
alguns
constituem
limites
originário, reservou para si, como por
própria
revisão;
materiais
da
vinculam
proteção
casos,
exemplo,
ao
isonômica
o
das
constituinte
estabelecer
cotas
imediatamente os poderes públicos;
empregatícias em cargos públicos
significam
outros
para
(1998,
deficiências (art. 37, VIII, da CF).
direitos
a
abertura
a
fundamentais.
Disponível em:
pessoas
portadoras
de
Outras formas de proteção e de aplicação da isonomia incumbem ao
<http://jus.uol.com.br/revista/texto/1
legislador infraconstitucional.
60/principio-constitucional-dadignidade-da-pessoa-humana/1>)
2.3 Da liberdade de pensamento
No inciso IV, de seu artigo 5º, 2.2 Da isonomia
a Constituição Federal permite a manifestação livre do pensamento,
Apesar da faceta de igualdade
ou seja, a liberdade individual de
universal entre todos, versa este
opinião. É a liberdade de o indivíduo
princípio, sobre a proteção das
formular juízos de valores, de opinar,
minorias. O constituinte originário,
de
preocupado com um histórico de
pensamento
marginalização
assunto.
determinados
social grupos,
de
pensar
e
manifestar
sobre
seu
determinado
embora
estabelecendo tratamento igualitário
2.4 Da liberdade de consciência,
universal no artigo 5º, caput, da
crença e culto
Constituição, antes disso, já vedava a discriminação lá no art. 3º, IV, declarando
como
A
Constituição
Federal
objetivo
protege no art. 5º, VI, a liberdade do
fundamental da nossa República, a
indivíduo em acreditar em algo, ter
promoção
fé, seguir determinada religião sem a
do
bem
de
todos, 192
intervenção Estatal, haja vista a laical
atuação
do
Estado.
2.6 Do livre planejamento familiar
É,
portanto, um direito inviolável do indivíduo
o
Na combinação dos artigos
comportamento
226, § 7º, e 227 da Constituição,
conforme suas crenças.
verifica-se que ela assegura às famílias, o livre planejamento, com a
2.5 Da liberdade de expressão
vedação de intervenção oficial ou privada; obrigando-a a assegurar à
Versa este princípio a respeito da
Proteção
Constitucional
criança, ao adolescente e ao jovem,
à
a efetividade de seus direitos, e a
liberdade de expressão do indivíduo,
proteção
de
negligências,
contida no art. 5º, IX, da Constituição
discriminações,
Federal. Esclarecem Araújo e Nunes
violência, crueldade e opressão.
exploração,
Júnior: [...]enquanto a opinião diz
2.7 Da proporcionalidade
respeito a um juízo conceitual, uma afirmação
do
pensamento,
a
Exprime este princípio, ao
expressão consiste na sublimação
adequada, necessário e moderado,
da forma das sensações humanas,
juízo
ou seja, nas situações em que o
condicionador
indivíduo
jurídica.
manifesta
seus
valorativo,
É
precedente da
um
e
positividade dos
crivos
sentimentos ou sua criatividade,
hermenêuticos utilizado sempre que
independentemente da formulação
constatado o choque entre direitos,
de convicções, juízos de valor ou
entre princípios. Busca ponderar as
conceitos. (2009, p. 144).
finalidades e os meios que as
A expressão livre protegida é
buscam.
a intelectual, artística, científica, e de comunicação,
consistentes
na
manifestação
criativa
do
Considerações Finais
pensamento individual. Ante
a
principiológica
análise do
fática
assunto
e
aqui
tratado, verifica-se um conflito de
193
interesses,
contextualizado,
grupos,
adotando
medidas
sobretudo, pela busca da dignidade
prepotentes. Se a intenção é obter o
dos indivíduos que sofrem com a
respeito, que este seja alcançado
homofobia colidente com a opinião
também
individual que repele orientações
preparar a sociedade para a ordem
sexuais incomuns.
social pretendida.
Nesta
conjuntura,
pelo
respeito.
Deve-se
Ademais, imperatividade só é
erroneamente, o Estado, através do
admissível
Ministério
tentou
norma jurídica, isto é, é necessário
harmonizar esses interesses, com a
que haja norma jurídica cogente. A
pretensão de inserir nas escolas
proposta do Ministério da Educação
públicas, desde o nível fundamental,
e Cultura é inconstitucional em
a
altercações
forma, pois lesa o artigo 24, IX, o
sexuais; atitude um tanto quanto
qual dispõe que compete à União,
banal
aos
da
Educação,
catequização
e
das
desprovida
de
proporcionalidade.
quente
Estados
Federal
Eis que, conforme, o ditado, o mingau
quando
se
ao
em
Distrito LEGISLAR
concorrentemente
sobre
a
pelas
educação, a cultura, o ensino e o
bordas. Atualmente, a sociedade
desporto. Não queira o Sr. Ministro
brasileira, não está apta a admitir
Fernando Haddad, obrigar os alunos
pacificamente
de
das escolas públicas a admitirem
gênero, como se comuns fossem.
com passividade algo complexo e
Nossa nação é constituída por
divergente, pois gritante é o teor do
indivíduos, que em sua maioria, são
art. 5º, II da CF: “ninguém será
levados por suas crenças, pela
obrigado a fazer ou deixar de fazer
educação conservadora e austera
alguma coisa senão em virtude de
que têm de suas famílias; e que
lei”.
estes
come
e
contida
desvios
apesar da evolução dos costumes, ainda
prendem-se
tradicionalismo. qualquer governamental
É
Não se olvida aqui, porém,
ao
dos excessos que certos indivíduos
inadmissível
cometem,
procedimento forçoso
das
intolerâncias
individuais. É certo que algumas
neste
pessoas ultrapassam os limites de
sentido. O Estado não pode agir por
suas
impulsos, influenciado por certos
acabam por ofender as garantias de 194
garantias
fundamentais
e
outrem, através do bullying, de
estes possam guiar seus filhos nos
preconceitos perversos, inclusive de
trilhos dos caminhos pretendidos
condutas criminosas. Entretanto, o
pelo Estado.
ordenamento jurídico permite sanar
Compelir
os
alunos
tais defloramentos. Há uma vasta
reverenciarem
quantidade de crimes previstos no
sociedade)
Código Penal e legislação especial
Governamental, importa em nítida e
que limitam as liberdades individuais
material inconstitucionalidade, pois
e
de
da mesma forma que a Constituição
preconceitos,
Federal garante ao indivíduo ser
protegem
as
discriminações, atentados.
Falta
pessoas
apenas
(inclusive
a
este
a
Projeto
a
diferente dos demais, ela também
necessária aplicabilidade efetiva de
garante aos demais visualizarem as
tais normas, a fim de abolir o
diferenças.
sentimento de impunidade que paira
Que é preciso educar as
sobre a sociedade.
pessoas para que elas convivam
Além disso, não está se
com as diferenças é mais que
criticando a inovação estatal, apenas
notório, mas não do modo que se
o modo em que ela está sendo
pretende, deturpando o sistema
realizada.
jurídico
É
primeiro
antes,
necessário educar os pais, para que
e
Constitucional,
atitudes desproporcionais.
195
com
Referências ARAUJO, Luiz Alberto David. NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1.988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 25 de Maio de 2011. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2009. O GLOBO, País. ALLEMAND, Marcio. Kit anti-homofobia vetado por Dilma ainda não havia sido aprovado pelo MEC. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/pais/mat/2011/05/25/kit-anti-homofobia-vetado-pordilma-ainda-nao-havia-sido-aprovado-pelo-mec-924538388.asp> Acesso em: 25 de maio de 2011. PODER ONLINE, Congresso. Do senador Magno Malta: “O MEC quer criar academias de homossexualidade”. Disponível em: <http://colunistas.ig.com.br/poderonline/2011/05/18/do-senador-magno-maltao-mec-quer-criar-academias-de-homossexualidade/> Acesso em: 25 de maio de 2011. PSICOLOGIA PARA TODOS, Blog. GARCIA, Joselaine. Polêmica – Kit AntiHomofobia. Disponível em: <http://joselainegarcia.blogspot.com/2011/05/polemica-kit-antihomofobia.html>. Acesso em: 25 de maio de 2011. SANTOS, Fernando Ferreira dos. Princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 27, 23 dez. 1998. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/160>. Acesso em: 25 maio 2011. ÚLTIMO SEGUNDO, Educação. Secretária do MEC critica suspensão de kit contra homofobia. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/secretaria+do+mec+critica+suspens ao+de+kitcontra+homofobia/n1596978877753.html> Acesso em: 25 de maio de 2011. ÚLTIMO SEGUNDO, Educação. Unesco dá parecer favorável a material contra homofobia. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/unesco+da+parecer+favoravel+a+m aterial+contra+homofobia/n1238103119025.html> Acesso em: 25 de maio de 2011. ÚLTIMO SEGUNDO, Educação. Vídeo que trata de homofobia a adolescentes gera ira de deputado. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/video+que+trata+de+homofobia+a+a 196
dolescentes+gera+ira+de+deputado/n1237865139161.html>Acesso em: 25 de maio de 2011. ÚLTIMO SEGUNDO, Política. Bancada evangélica ameaçou não colaborar, diz Garotinho. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/bancada+evangelica+ameacou+nao+c olaborar+diz+garotinho/n1596978077449.html> Acesso em: 25 de maio de 2011.
197
SOM AUTOMOTIVO: DA INFRAÇÃO DE TRÂNSITO À CONTRAVENÇÃO PENAL BRANCO, Wendel Alves. Estagiário do Ministério Público do Estado de São Paulo e aluno do 6º período – Curso de Direito da Unifev. SAMPAIO FILHO, Walter Francisco. Docente do curso de direito da Unifev.
RESUMO O presente trabalho tem por objetivo analisar eventuais irregularidades na apuração da contravenção penal prescrita no art. 42, III, do Decreto-Lei n. 3.688/41 (Lei das Contravenções Penais), praticada em tese, pelo infrator que possui um equipamento de som mais “robusto” instalado em seu veículo, relevando deficiências hermenêuticas e probatórias, que vão desde o momento da autuação até o enquadramento imperfeito da infração, dando margens à discussões sobre qual provimento jurisdicional a ser alcançado. Enquanto alguns defendem o incurso do averiguado como contraventor, outros pugnam pela caracterização de mera infração administrativa. Todavia, é imprescindível uma boa interpretação, tanto dos fatos como das normas, bem como um meio de prova eficiente, capaz de elidir dúvidas ou falsas presunções, para encetar a tutela justa e adequada para cada caso concreto.
Palavras-Chave: Som automotivo. Perturbação do trabalho ou do sossego alheios. 198
elaboração
Introdução
de
termo
circunstanciado. Não obstante o da
direito à paz pública, que deve ser
civilização, é sabido que a poluição
respeitado, em face do convívio
sonora causa grandes transtornos
social, as pessoas não devem ser
na vida cotidiana, tanto que a
qualificadas como contraventoras ao
sociedade moderna preconiza cada
bel prazer, sem a observância
vez mais o sossego nas grandes
correta dos dispositivos legais. Há
cidades como um direito inerente a
que
todo e bom convívio social.
sistemática
Desde
os
primórdios
Consoante demanda
aumento
de
se
ter
uma
interpretação
coerente,
almejando
todas as normas correlacionadas
na
com
acessórios
os
respectivos
entanto,
ligado aos aparelhos de som, tornou-
acontecendo. Diante das diversas
se cada vez mais necessária a
determinações das autoridades, as
reprimenda aos barulhos e ruídos
pessoas
insuportáveis, principalmente pelo
constrangimentos
uso irregular em vias públicas. Para
insanáveis com o decurso temporal;
tanto, o Estado, se vale de meios
a proposta de transação penal perde
para coibir a emissão sonora que se
o seu caráter de benefício e a
encontre em discordância com as
denúncia se mostra cada vez mais
normas
apta a ser intentada, caso o acusado
estabelecendo
sanções
é
se
o
que
No
automotivos, mais especificamente
regulamentadoras,
não
fatos.
deparam e
vem
com
injustiças
a recuse.
ou
Dentre a legislação pertinente
cominando penas, conforme cada
à matéria, mantivemos o foco na Lei
caso concreto. as
das Contravenções Penais (Decreto-
perturbações, a coletividade tem
Lei 3.688/41) e no Código de
reclamado providências perante as
Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/97),
autoridades públicas, acarretando
para a discussão sobre a tipificação
grandes apreensões de veículos que
correta da conduta do averiguado,
se encontram, em tese, com volume
tema do presente trabalho.
Tendo
em
vista
acima do normal, ensejando a qualificação
do
sujeito
e
na
199
1. Da infração penal
perturbação e tampouco sua devida constatação,
Como é cediço em direito, a
procede
enquadramento
sem
ao efetivar
perturbação do trabalho ou do
nenhuma medição no momento da
sossego alheios, mediante o uso de
abordagem. O mais intrigante é que
aparelhagem sonora instalada em
a maioria dos entes incumbidos da
veículo automotor pode constituir
aplicação e fiscalização da lei ratifica
infração
o teor da abordagem sem provas
penal,
da
qual
contravenção é espécie.
a
Assim,
consistentes
e
sequer
tratando-se de infração de menor
comprovação
potencial ofensivo, é sujeita às
intencional
disposições
9.099/95,
subjetivo). Que as autoridades se
os procedimentos
vejam na obrigação de combater a
da
observando-se
lei
pertinentes.
poluição
Devido ao grande número de
da
há
veículos
coibir certos abusos, vem sendo
reconhecimentos.
determinado
combate
veículos
que
apreensão se
elemento
proveniente
da
referida aparelhagem instalada nos
reclamações da sociedade para
a
–
(dolo
sonora
motivação
dos
encontrem
merece
não
tipificação
dos
dignos
Porém,
pode
tal
ensejar
autores
na
como
circulando pelas vias públicas com
infratores penais, quando da falta de
aparelhagem de som amplificada,
tipicidade, resultado e elemento
para serem tomadas as providências
subjetivo destes.
cabíveis. Mas, conforme se tem noticiado com frequência nos jornais
1.1 Dos elementos constitutivos e da
e
consumação
emissoras
de
televisão,
a
regularização não é feita da forma correta, eis que os motoristas vêm
Prescreve o art. 42 da Lei de
sendo enquadrados como incurso na LCP
pelo
simples
fato
de
Contravenções Penais:
se
Art. 42. Perturbar alguém o
encontrarem em circulação pelas
trabalho ou o sossego alheios:
vias ou parados em sinais com o
I – com gritaria ou algazarra;
som ligado, em tese, acima do
II
–
exercendo
profissão
normal. A polícia militar autua o
incômoda ou ruidosa, em desacordo
motorista e, sem a notícia da
com as prescrições legais; 200
–
III instrumentos
abusando sonoros
ou
de
o risco do resultado. Há também a
sinais
necessidade
acústicos;
da
efetiva
importunação, juntamente com a
IV – provocando ou não procurando
impedir
plena consciência por parte do
barulho
agente de que ofende o sossego das
produzido por animal de que tem a
pessoas,
guarda:
trabalham
Pena – prisão simples, de
as
nas
(elemento
quinze dias a três meses, ou multa.
correta
O inciso III do supracitado
quais
residem
ou
proximidades
subjetivo), tipificação,
inerente não
à
sendo
admitida a modalidade culposa.
pressupõe o abuso na emissão de
Damásio E. de Jesus (1997,
barulhos ou ruídos, causando a
p. 157) esclarece que: “O momento
perturbação,
de
consumativo se dá com o ato de
instrumentos sonoros (alto-falantes,
perturbar o trabalho ou o sossego
por ex.), seja por sinais acústicos,
alheios”.
seja
por
meio
capazes de produzir incômodo ao
Atente-se ainda para a devida
bem-estar, ao sossego ou de trazer
constatação deste resultado advindo
malefícios à saúde humana, se não
da conduta, seja por meio da
intermitentes.
averiguação
policial
ou
de
Consistindo o verbo nuclear
reclamações, que podem ser feitas
numa ação por parte do sujeito ativo,
pessoalmente ou através de outro
a conduta do art. 42, III da LCP,
meio eficaz, sendo imprescindível
consiste em perturbar (embaraçar,
que chegue ao conhecimento do
dificultar), sendo óbvio que, quem
poder público a verdadeira ofensa ao
perturba, perturba alguém ou alguma
bem jurídico tutelado, qual seja, a
coisa. Assim, a conduta constitui-se
paz
na
jurisprudência relacionada:
modalidade
admitindo-se
comissiva,
também
o
dolo
pública,
conforme
PERTURBAÇÃO
farta
DE
eventual, como exemplo do carro
SOSSEGO ALHEIO COM USO DE
que
INSTRUMENTO
se
encontra
estacionado
SONORO
defronte bairro residencial com som
(ARTIGO 42, INCISO III, DA LCP).
excessivo,
de
ABSOLVIÇÃO. Há inconsistência
pelos
nos depoimentos, presentes dúvidas
devidamente
que,
após
alertado
milicianos, ignora a ordem e assume
quanto 201
à
existência
e
autoria
contravencional. Inexiste nos autos a
invocados pela ilustre Relatora, Dra.
asserção de outros moradores que
Cristina
tenham
julgamento
sido
perturbados
pelo
volume de som excessivo, não se comprovando
a
perturbação
Pereira da
Gonzales,
no
apelação
nº
71002787729:
do
Isto porque a contravenção
sossego de alheios, impondo-se
prevista no artigo 42 da LCP é delito
absolvição.
contra a paz pública, somente se
APELAÇÃO
DESPROVIDA. [1] O
sujeito
coletividade,
caracterizando passivo
é
inexistindo
quando
há
a
a
perturbação de uma coletividade, de
a
um
número
indeterminado
contravenção se o fato atinge uma
pessoas,
só pessoa, podendo subsumir-se em
proposital a uma pessoa pode
outra
a
configurar a contravenção prevista
caracterização da contravenção do
no art. 65 do Decreto-Lei 3.688/41,
art. 42 da LCP, é necessário que
cujo objeto jurídico é a tranquilidade
uma pluralidade de pessoas sofra a
alheia, desde que realizada por
perturbação, sendo insuficiente o
acinte ou por motivo reprovável, o
transtorno de um só indivíduo,
que também não é o caso dos
máxime se inexiste prova do abuso.
autos. [3]
infração.[2]
Para
enquanto
o
de
³ Portanto, prevalece o entendimento
No mesmo trilho:
de
RECURSO
que
a
ofensa
necessariamente coletividade
de
precisa
atingir moradores
certa
PERTURBAÇÃO
ou
incômodo
CRIME. DE
SOSSEGO
ALHEIO. ARTIGO 42, III, DO DL
trabalhadores na região, com vítimas
3.688/41.
identificadas, não configurando o
PROVAS. 1- A prova coligida aos
ilícito em tela quando uma ou duas
autos não demonstra que o barulho
pessoas se sentirem importunadas,
promovido pelo réu tenha perturbado
podendo ocorrer a contravenção
a vizinhança, atingido a coletividade
prevista no art. 65 do mesmo
dos moradores da região, dada a
diploma, se se verificar o incômodo
ausência de vítimas identificadas. 2-
individualizado,
Para
desde
que
presentes seus requisitos.
os
caracterização
DE
da
contravenção do artigo 42 da LCP, é
Nesse sentido, convém-nos transcrever
a
INSUFICIÊNCIA
necessário que uma pluralidade de
fundamentos
pessoas sofram efetiva perturbação, 202
independente do ânimo que moveu o
indivíduo estar com volume acima do
agente, o que não se verifica no caso
normal permitido, se se desguarnece
concreto.
SENTENÇA
da imprescindível intenção dolosa de
REFORMADA.
praticar o ato e não resta prejudicada
CONDENATÓRIA [4]
nenhuma coletividade. Dessa forma, Algumas
autoridades
além dos requisitos acima descritos,
entendem que o fato de portar algum
mister se faz a verificação do
tipo
excessivo,
de
aparelhagem
de
som
segundo
parâmetros
amplificada ligada no veículo já
previamente estabelecidos pela Lei
configura
Distrital n. 1.065/96.
a
anuência
da
importunação, porquanto ser capaz de emitir barulhos que possam
2. Da fiscalização sonora e do
perturbar a coletividade. No entanto,
conjunto probatório
tal
entendimento
não
merece
aceitação, eis que a doutrina e
Os
índices
de
poluição
jurisprudência já consolidaram os
sonoros aceitáveis, estabelecidos
pressupostos subjetivos necessários
pela Lei Distrital nº. 1.065 de maio de
à caracterização desse tipo de
1996 são determinados de acordo
contravenção.
com a zona e horário, segundo as
De acordo com Damásio E. de
normas
da
ABNT
nº.
10.151.
Jesus (1997, p. 157), o elemento
Conforme as zonas, os níveis de
subjetivo
a
decibéis nos períodos diurnos e
o
noturnos são os seguintes:
deve
consciência comportamento
alcançar
de
que é
abusivo.
Inadmissível é, destarte, a mera presunção, pelo simples fato de o
203
TABELA 01: – Níveis de ruídos máximos permitidos para cada ambiente ÁREA
Diurno
Noturno
Áreas de sítios e fazendas
40
35
Área estritamente residencial urbana ou de hospitais ou de escolas
50
45
Área mista predominantemente residencial
55
50
Área mista com vocação comercial e administrativa
60
55
Área mista, com vocação recreacional
65
55
Área predominantemente industrial
70
60
NRB 10.151, ABNT, 2000.
Teoricamente, incumbido
da
o
ente
fiscalização
autorização para sua retirada do
nas
pátio.
Aqui, o exame em tela
malhas e vias públicas é a polícia
reveste-se de caráter subsidiário, em
militar, eis que pertence a esta o
face da falta do referido aparelho no
patrulhamento
momento
ostensivo
e
a
da
abordagem.
preservação da ordem pública (CF,
Geralmente, os peritos comparecem
art. 144, § 5). Ocorre que, mesmo
ao local onde se encontra o carro e
havendo
prévios
procedem ao exame direto com uso
estabelecidos para a autuação, a
do decibelímetro, ligando todo o
aludida instituição não dispõe do uso
aparato
regular do aparelho decibelímetro,
elevação do volume até o seu limite
instrumento
usado
máximo, sem distorção. Dada as
nas medições. No entanto, tal fato
peculiaridades de cada caso, a
não obsta à apreensão do veículo,
perícia é feita conforme a variação
que será recolhido para posterior
dos modelos, como aqueles que
realização do exame pericial, sendo
possuem carroceria aberta, porta-
que, somente depois de realizado
malas, etc. Posteriormente, o laudo
este
prescreve sua conclusão embasado
parâmetros
peculiarmente
último,
será
concedida 204
sonoro,
procedendo
à
na robustez do aparato de áudio, que
Assim, frise-se que resta frágil
pode causar transtornos, isto é, que
o conjunto probatório capaz de
o suposto autor pode ter causado a
invocar
perturbação pelo simples e isolado
jurisdicional de âmbito penal em
fato de possuir um som mais
desfavor do proprietário, já que não
amplificado, tomando como incurso
se presume contra este a culpa,
no art. 42 da LCP.
porquanto ser inaceitável. A prova
Ressalte-se
ainda para
a
alguma
provocação
deve ser condizente e apta ao caso
postura intrigante das autoridades
concreto,
assegurando
policiais que, ao autuar o indivíduo,
veemência
a
requisitam a perícia apenas para a
resultado e a multiplicidade de
constatação do excessivo, mas não
pessoas atingidas com a conduta,
procedem à devida retenção do
consoante a seguinte ementa:
veículo para a regularização da
PERTURBAÇÃO
situação, senão para a elaboração
ALHEIO. ARTIGO 42, III, DA LCP.
do exame pericial. Diante disso, é
INSUFICIÊNCIA
inegável a intenção da tentativa de
SENTENÇA
eliminação
automotivo
REFORMADA. Não há prova segura
mediante aplicação da medida mais
de que o réu tenha perturbado o
grave,
sossego
da
coletividade.
Contravenções Penais, o que não
tipificar
a
contravenção
deve ser admitido. Dessa forma, não
art. 42 da Lei das Contravenções
ocorre
dos
Penais, deve a perturbação do
automóveis que se encontram em
sossego atingir uma multiplicidade
discordância com o CTB, mas sim
de
uma reprimenda penal, fazendo com
PROVIDA. [5]
qual
a
do
som
seja
a
Lei
regularização
das
com
constatação
DO
do
SOSSEGO
DE
PROVAS.
CONDENATÓRIA
indivíduos.
Para do
APELAÇÃO
que a coerção estatal alcance o
Para figurar como prova, o
medo da mancha na ficha de
excedente deve ser auferido no
antecedentes criminais, resultando
momento da abordagem, já que a
na indignação dessas pessoas por
comprovação feita pela perícia de
não terem elas o direito ao devido
que o som é capaz de produzir
processo legal, preconizado pela
barulho em excesso não significa,
nossa Constituição Federal.
necessariamente, que o averiguado encontrava-se 205
com
o
volume
máximo no momento da averiguação
não se pune como infração penal a
policial. No mais, devido ao princípio
conduta do motorista nos termos já
da especialidade, aplicado a toda
descritos, mas caracteriza grave
legislação penal, a norma a ser
infração
usada deve ser aquela que melhor
equipamento de som ou frequência
corresponda estritamente ao caso
que não sejam autorizados pelo
concreto. Logo, conclui-se pela falta
CONTRAN, prevendo sanções que
de tipicidade formal, qual sejam a
vão desde a multa até a retenção do
correlação
veículo para regularização.
perfeitas
e do
correspondência fato
com
o
tipo
de
trânsito o
Portanto,
contravencional.
requisitos
na
uso
falta
elencados
de
dos acima,
Merece atenção também a
inerentes à acusação, a situação
tipicidade material, que exige ter sido
descrita configura evento isolado, no
o bem jurídico tutelado violado. Ora,
tocante a legislação penal, restando
se a tutela é da coletividade, a prova
somente a infração administrativa
deve demonstrar que tal violação
prevista no art. 228 do CTB.
ocorreu, sob pena de o fato ser
Prescreve o artigo 228 do
materialmente atípico.
Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/97):
3. Da infração administrativa
Art. 228. Usar no veículo equipamento de som em volume ou
Em verdade, a legislação
frequência
que
não
coerente a ser aplicada ao infrator
autorizados pelo CONTRAN:
que não apresente os requisitos
Infração – grave;
objetivos
Penalidade – multa;
e
subjetivos
aptos
a
caracterizar a contravenção do art.
Medida
42, III da LCP, tais como a vontade
retenção
livre e consciente da perturbação ou
regularização.
a anuência do resultado depois de
do
Para
sejam
administrativa veículo
análise
– para
de
notificado (elemento subjetivo), o
irregularidades, a resolução Nº 204,
resultado advindo de sua conduta (a
de
efetiva importunação à coletividade),
regulamenta o volume e a frequência
dentre outros, é o Código de Trânsito
dos
Brasileiro - CTB (Lei 9.503/97). Aqui
equipamentos utilizados em veículos 206
20
de
sons
outubro
de
produzidos
2006
por
e
estabelece
medição
a
metodologia ser
adotada
para
dos veículos prestadores de serviço
pelas
com emissão sonora de publicidade,
autoridades de trânsito ou seus
divulgação,
agentes, a que se refere o art. 228 do
comunicação,
Código de Trânsito Brasileiro -
competição, etc.
CTB.
Além
decibelímetro peculiar
de
como
para
a
prever
entretenimento dos
ou
veículos
de
o
equipamento
realização
da
Conclusão
medição da pressão sonora, a resolução em tela institui em seu art.
Isto posto, não se defende
1º que a utilização, em veículos de
aqui a impunidade, senão o incurso
qualquer espécie, de equipamento
na norma correta e consonante com
que produza som só será permitida,
os fatos. A busca pela justiça deve
nas
à
ater-se à legislação que melhor se
circulação, em nível de pressão
prenda ao caso concreto, com fulcro
sonora não superior a 80 decibéis -
no uso da razoabilidade, afastando a
dB(A), medido a 7 m (sete metros)
tutela penal quando o fato se
de distância do veículo, devendo ser
encontrar em âmbito administrativo.
vias
terrestres
abertas
considerados os valores constantes
Qualquer
da tabela abaixo.
irregularidade
insanável nas apurações contamina todo o procedimento, fulminando-o
TABELA 02:
de nulidade, por ofender preceitos de
Resolução Nº 204 do CONTRAN
ordem
pública.
inobstante Dispõe
ainda,
que
a
os
respeito,
constitui
autoritarismo
infração
de
entendimentos
trânsito
é
lamentável e
a
precária
diferentemente do que ocorre com
algumas
instâncias
os
tendentes
a
exercício
comuns,
regular
de
constitui direito
as
absurda
ainda
as
prevaleçam
reprimir supostas
exceções do uso de equipamento de
desprovidas
som
lesividade significantes.
em
consonância
com
a
resolução (art. 2º), como exemplo 207
de
que
o
hermenêutica
prevista no art. 228 do CTB, mas,
veículos
entanto,
jurisprudenciais e doutrinários a
inobservância dos seus dispositivos a
No
em
inferiores, de
forma
violações
tipicidade
e
Referências CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. JESUS, Damásio E. Lei das Contravenções Anotada. 5. ed. rev. e atualizada. São Paulo: Saraiva, 1997. JESUS, Damásio E. Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada. 3. ed. rev. e atualizada. São Paulo: Saraiva, 1997. SOBRINHO, José Almeida; BARBOSA, Manoel Messias; MUKAI, Nair Sumiko Nakamura. Código de Trânsito Brasileiro Anotado e legislação complementar em vigor. 12. ed. rev. e atualizada, São Paulo: Método, 2009. NRB 10.151, ABNT, 2000. Disponível em: http://www.humanitates.ucb.br acesso em 20/10/11. Resolução Nº 204 do CONTRAN. Disponível em: http://www.denatran.gov.br/ acesso em 20/10/11. [1] PORTO ALEGRE. Turma Recursal Criminal dos Juizados Especiais Criminais do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação. Recurso Crime nº 71002463164. Relatora: Dr.ª Laís Ethel Corrêa Pias. 15 de Março de 2010. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br – acesso em 20/10/2011. [2] SÃO PAULO. TACrimSP, ACrim 257.861, JTACrimSP, 71:345; TACrimSP, ACrim 329.315, JTACrimSP,78:364, apud JESUS, Damásio E., 1997, p. 154). [3] PORTO ALEGRE. Turma Recursal Criminal dos Juizados Especiais Criminais do Estado do Rio Grande do Sul. Recurso de Apelação nº 71002787729, apud Rel. Dr. Luiz Antônio Alves Capra, no julgamento de apelação Nº 71003256096. 29 de Setembro de 2011. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br – acesso em 20/10/11. [4] PORTO ALEGRE. Turma Recursal Criminal. Turmas Recursais. Recurso Crime Nº 71002468049. Relatora: Cristina Pereira Gonzales, Julgado em 29 de Março de 2010. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br– acesso em 20/10/11. [5] PORTO ALEGRE. Turma Recursal Criminal dos Juizados Especiais Criminais do Estado do Rio Grande do Sul. Recurso Crime Nº 71003212628, Relator: Luiz Antônio Alves Capra, Julgado em 12/09/2011. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br – acesso em 20/10/11.
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