"Mundos de uma noite só" TAG Curadoria - Março/2025

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TAG CURADORIA Mundos de uma noite só

TAG — Experiências Literárias

Tv. São José, 455

Porto Alegre, RS (51) 3095-5200 (51) 99196-8623

contato@taglivros.com.br www.taglivros.com @taglivros

Publisher Rafaela Pechansky

Edição e textos Débora Sander, Rafaela Pechansky e Tatiana Cruz

Colaboradoras Laura Viola e Sophia Maia

Designer Bruno Miguell Mesquita

Capa Renata Spolidoro

Revisores Antônio Augusto e Liziane Kugland

Impressão Impressos Portão

Olá, tagger

Há muitas formas de celebrar a literatura, mas a nossa favorita é reunir um par de escritoras contemporâneas brilhantes em uma caixinha da TAG. Indicado por Carola Saavedra, Mundos de uma noite só é o romance de estreia da escritora baiana Renata Belmonte.

O livro é um romance de formação protagonizado por uma menina que cresceu espremida entre duas figuras maternas e atormentada pelo desconhecimento da identidade de seu pai.

A casa onde ela vive é habitada por violências transgeracionais, intrincadas contradições e um estreito espaço existencial. Já adulta, ela encontra um livro entre os pertences de sua mãe e é conduzida por histórias de um passado familiar cheio de mistérios. Em uma narrativa fragmentada, a autora nos confronta com enigmas que refletem a fragilidade e o desconhecimento da própria personagem sobre si mesma. Mas faz isso sem desviar de uma trama instigante, que alimenta tanto a curiosidade quanto a sensibilidade e o olhar estético dos leitores.

Nesta edição da revista, nosso convite é que possamos percorrer juntos algumas das sombras dessa história, que guarda tesouros inestimáveis para cada leitor que se aventurar por ela. Nas páginas a seguir, você encontrará entrevistas exclusivas com a curadora e a autora do mês, uma seleção de narrativas valiosas para seguir imerso em histórias como essa e um panorama sobre três autoras que conversam de várias formas com o livro do mês: Aglaja Veteranyi, Clarice Lispector e Marguerite Duras. Um prato cheio para cultivar seu apetite literário!

Boa leitura!

sumário

Experiência do mês

Para você ir preparando seu coração 04 06 08 14 19 22 24 26 29 30

Para inspirar o olhar e as ideias antes, durante e após a leitura

Por que ler este livro

Bons motivos para você abrir as primeiras páginas e não parar mais

A autoria

Um retrato caprichado e uma entrevista com quem está por trás da história

A curadoria

Conheça Carola Saavedra, que escolheu seu livro do mês

Dois dedos de prosa

De onde veio, do que fala, o que é o livro que você vai ler

Da mesma estante

Livros que poderiam ser guardados na mesma prateleira do livro do mês

Universo do livro

Livros, séries, filmes que orbitam o livro do mês

Leia. Conheça. Descubra.

A percepção social e a força narrativa de Edith Wharton

Espaço da comunidade

Um espaço todo seu, para aproximar e celebrar a maior comunidade leitora do Brasil

Vem por aí

Experiência do mês

Seu livro além do livro: para ouvir, guardar, expandir, crescer.

Mimo

Leitores são também colecionadores de citações. No mês da mulher, preparamos com carinho uma cápsula de inspiração literária através das palavras de escritoras gigantes. Para um ritual diário de reflexão, para conhecer novas autoras, para dedicar a alguém especial, atravessar angústias, arejar as ideias e contemplar o mundo sob múltiplos olhares.

“As pa l av ras s i g ni f i ca m mais

do q u e o q u e es t á e s c r i t o n o pa p e l . ” M ay a A n g e l o u

Projeto gráfico

Mundos de uma noite SÓ é um romance de formação. Mas també de destruição: de uma cidade, de um tempo e, em especial, de nossas mais preciosas ilusões. Assim, somos convidados a acompanhar a jornada de uma mulher que, após encontrar um livro antigo entre as coisas de sua mãe, se vê obrigada a revisitar sua própria história. Multifacetado e de leitura hipnótica, este romance nos revela que, realmente, nada é apenas o que parece ser. Nem mesmo aqueles que mais amamos.

Renata Belmonte é autora do romance Mundos de uma noite só (Finalista do Prêmio São Paulo de Literatura de 2020 e Semifinalista do Prêmio Oceanos de 2021) e de três livros de contos: Femininamente (Prêmio Braskem de Literatura, 2003), O que não pode ser (Prêmio Arte e Cultura Banco Capital, 2006) e Vestígios da Senhorita B (P55, 2009). Doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e Mestre pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), ela é também advogada.

mundos de uma noite só renata belmonte

A protagonista do livro deste mês cresce em uma casa repleta de fotogra fias de mulheres, buscando reconhecer suas próprias feições em meio aos frag mentos de uma misteriosa e recortada memória familiar. A sobreposição de narrativas que traz um livro dentro do livro também é uma característica marcante dessa história. Foi essa a ins piração para a capa da edição da TAG de Mundos de uma noite só pela designer Renata Spolidoro.

mundos de uma noite só

Depois de concluir a leitura, convidamos você a acompanhar o Podcast da TAG para conferir uma entrevista exclusiva e reverberar junto com a gente os sentimentos e reflexões despertados pelo livro do mês.

Você tem em mãos uma história que pede entrega total de seus leitores, tanto para apreciar a força e a delicadeza da prosa poética de Renata Belmonte quanto para juntar as peças do quebra-cabeça que compõe a narrativa. Por isso, preparamos uma seleção de músicas que pode tornar sua leitura ainda mais imersiva no universo de introspecção e profundidade criado pela autora.

Visite o app para saber mais sobre o livro e participar da comunidade.

“Gosto de autores que mostram não apenas as suas garras, como também suas entranhas. Belmonte escreve a partir desse útero, mas não é caricata. É um útero com cólica, com dor, com raiva. Sem, com isso, enaltecer — muito pelo contrário — esse feminino.”

Jornal Rascunho

“Renata Belmonte não faz concessões. Ela sabe que a literatura é o espaço privilegiado da liberdade e da transgressão.”

Luiz Ruffato

Mundos de uma noite SÓ é um romance de formação. Mas també de destruição: de uma cidade, de um tempo em especial, de nossas mais preciosas ilusões. Assim, somos convidados a acompanhar a jornada de uma mulher que, após encontrar um livro antigo entre as coisas sua mãe, se vê obrigada a revisitar sua própria história. Multifacetado e de leitura hipnótica, este romance nos revela que, realmente, nada é apenas o que parece ser. Nem mesmo aqueles que mais amamos.

Renata Belmonte é autora do romance Mundos de uma noite só (Finalista

Prêmio São Paulo de Literatura de 2020

Semifinalista do Prêmio Oceanos de 2021) de três livros de contos: Femininamente

(Prêmio Braskem de Literatura, 2003), que não pode ser (Prêmio Arte e Cultura Banco Capital, 2006) e Vestígios da Senhorita B (P55, 2009). Doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e Mestre pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), ela é também advogada.

9 788542 231649 as páginas

renata belmonte

mundos de uma noite só

mundos de uma noite só

09/01/2025 09:56

Por que ler este livro

Em um minucioso trabalho de linguagem, Renata Belmonte apresenta uma instigante saga familiar sobre três mulheres: uma menina e suas duas mães. Este romance vertiginoso absorve o leitor para dentro da história, entrelaçando o mundo interno da protagonista a uma trama misteriosa e reveladora sobre as imagens, as premissas e a transformação do feminino ao longo de gerações. Uma narrativa que ultrapassa estereótipos e investiga com atenção sensível o fio que une as estruturas sociais de um tempo à experiência das personagens.

“O que sempre tento propor é uma travessia pelo desconhecido que mora em todos nós.”

Renata Belmonte fala à TAG sobre sua constituição enquanto leitora e escritora e situa os desafios e a potência de combinar a escrita com outras frentes, como o Direito e a maternidade.

Na voz narrativa de um romance está sempre impressa, de forma oculta ou relativamente explícita, a voz do próprio autor. No caso da escritora baiana Renata Belmonte, basta ler, escutar ou assistir a trechos de entrevistas com ela para reconhecer em sua fala o tom de Mundos de uma noite só. Trata-se de uma história íntima e de uma narrativa descrita com concentração e importância, que solicita a atenção sensível do leitor. A sensação é de estar penetrando no delicado território existencial de alguém que nos confia as dores de sua história pessoal, suas questões em aberto, suas incoerências, instabilidades e inquietações mais profundas.

Além desse arrebatamento afetivo, há uma arquitetura sofisticada e um primoroso trabalho de linguagem que tornam o encontro com o livro deste mês uma experiência que joga com a elasticidade do tempo. Ele avança e retrocede na perspectiva da protagonista, intercalado com passagens de um livro dentro do livro — objeto que ela encontra em meio às coisas de sua mãe, com o título Uma valsa para o esquecimento. A narrativa revela ao leitor e à personagem algumas das respostas que ela passou a vida buscando, sem deixar de abrir novas e instigantes perguntas.

O fio do tempo também demarca a persistência de certas dinâmicas de poder, silenciamento e dominação que atravessam a experiência das mulheres em diferentes épocas. Parcialmente ambientado no contexto da ditadura militar brasileira, Mundos de uma noite só faz provocações sutis e precisas sobre a repetição de lógicas viciadas de autoritarismo, sintetizadas nas experiências pessoais e políticas de uma pequena cidade interiorana. Não por acaso, a escritora e pesquisadora Carolina Vigna, em resenha publicada no jornal Rascunho, traçou um paralelo entre o romance de Renata Belmonte e o clássico Cem anos de solidão, de Gabriel García Márquez. Assim como a Macondo do escritor colombiano, a cidadezinha narrada pela autora baiana poderia pertencer a qualquer canto do Brasil ou da América Latina.

Doutora em Direito pela USP, Renata Belmonte publicou três livros de contos: Femininamente (2003), O que não pode ser (2006) e Vestígios da Senhorita B. (2009). Com Mundos de uma noite só, seu primeiro romance, foi finalista do Prêmio São Paulo de Literatura em 2021. Em entrevista exclusiva à TAG, Renata Belmonte conta sobre o longo percurso do livro, da escrita até a publicação, e comenta alguns dos tantos desdobramentos que essa narrativa inspira, na ousadia estética de percorrer as sombras e aproximar-se do invisível da condição humana.

©Luiza Singulem

Além de escrever, você atua como advogada. Como começou sua relação com a escrita, e como você equilibra essas duas camadas da sua atuação profissional?

Minha relação com a literatura se confunde com a minha própria compreensão enquanto sujeito. O modo como existo está entranhado no meu exercício diário de fabulação. Penso que sobrevivi a uma infância entediante porque inventei formas mágicas de suportar a realidade. Ainda muito nova, tornei-me leitora de ficção, e esse hábito me acompanha. Na adolescência, inclusive, já tinha alguns contos publicados em veículos de imprensa. Aos 21 anos, ganhei um prêmio para autores inéditos, e o Femininamente, meu primeiro livro, foi lançado. Nessa época, eu já estava na faculdade de Direito e me parecia muito natural que as minhas personas convivessem. Encontrava espaços internos para as duas e pensava até serem complementares. Até porque o Direito me permite, além do meu sustento financeiro, a liberdade de escrever a partir do meu desejo, sem ser pautada por demandas específicas do mercado editorial. Ou seja: vejo vantagens em habitar extremos e alternar posições. Meu grande desafio, de fato, foi conciliar a maternidade com a literatura. Ambas pedem uma atenção absoluta e quase vedam escapes. Sempre sonhei em ser mãe, mas não tinha ideia do quanto era necessária uma intensa entrega do seu eu para o exercício da função. Mas essa é uma outra e longa conversa.

Mundos de uma noite só foi sua estreia no romance. Como foi o processo de criação dessa história, e como tem sido a repercussão com os leitores desde o primeiro lançamento, em 2020?

A primeira versão do Mundos de uma noite só ficou pronta e foi vendida para uma editora portuguesa em 2012. Ocorre que, depois de um breve período no mercado brasileiro, tal casa optou por não continuar atuando no país, e eu pedi um distrato antes da publicação, pois sempre desejei ser lida pelos meus conterrâneos. E o que se sucedeu depois desse acontecimento foi uma série de imprevistos e desencontros que geraram um atraso de oito anos,

até o livro encontrar uma nova editora que topasse editá-lo. Ele era considerado, por muitos que liam os originais, como um romance sofisticado demais estruturalmente. Sofri muito nesse período, pois tinha certeza de que o Mundos encontraria seus próprios leitores e nunca menosprezei meu público. Em 12 de março de 2020, ou seja, na véspera de nos trancarmos em casa por conta da pandemia, ocorreu o lançamento do livro. Na noite de autógrafos, estávamos (eu e os presentes) muito felizes, não imaginávamos com exatidão a gravidade do porvir. E se tudo que ocorreu depois desse dia parece ainda bruma na memória, também é feita dela a matéria desse grande sonho que realizei. Indicado aos prêmios São Paulo e Oceanos, o romance chegou nas vidas daqueles que precisavam dele, minha maior premiação. Até hoje, recebo mensagens de leitores que encontraram em suas páginas alguma espécie de companhia para suas angústias profundas. Sinto que nada é por acaso e, neste março de 25, justo quando o livro completa cinco anos, está sendo publicada esta sua nova edição pela TAG. Espero, portanto, que ele continue trilhando a sua jornada e quero dizer que ficarei feliz em saber como será recepcionado pelas pessoas que o receberão em suas vidas.

Seu livro é um mergulho profundo no mundo interno das personagens. Como leitora, você também busca essa flutuação pela subjetividade humana? Quem são suas maiores referências na literatura? Sim, sem dúvida. Seja qual for o gênero que eu esteja lendo, sempre busco personagens vívidos, consistentes e densos. Confesso, inclusive, ter pouco interesse em romances que exploram mais descri ções de ações e espaços do que as consequências desses nas vidas das pessoas. O humano, em suas adversidades, permanece no centro das minhas aten ções. Susan Sontag, Clarice Lispector, J. M. Coetzee, Milton Hatoum, Beatriz Bracher, Mohamed Mbougar Sarr, Luiz Ruffato, Carola Saavedra, Hilda Hilst, Guimarães Rosa, Kafka, Didier Eribon e Marguerite Duras são grandes referências para mim.

É possível dizer que o feminino é uma temática central neste livro. Você entende Mundos de uma noite só como uma obra feminista? Sou uma mulher feminista porque entendo que a realidade material deste mundo, em regra, organizou-se a partir de dicotomias que dificultam a existência das mulheres no espaço público e lhes permitem menos oportunidades que aos homens. E se, de modo geral, vejo a realidade assim, também sei que ela não é sempre absoluta, ou seja, circunstâncias específicas e particularidades podem atuar para que as coisas não se organizem como costuma estar descrito no figurino. Dito isso, tenho muito cuidado em não criar personagens maniqueístas ou incorrer em narrativas panfletárias. Tampouco aceito infantilizações e reducionismos desnecessários. Verossimilhança e subjetividades diversas na literatura interessam-me muito mais do que a minha própria militância. Não fico cerceando minha voz ficcional ou tentando dar lições de moral para meus leitores. Acredito profundamente na capacidade de reflexão crítica de cada pessoa que abre um livro meu. Até porque o que sempre tento propor é uma travessia pelo desconhecido que mora em todos nós.

Li uma declaração sua, a respeito do atravessamento das experiências pessoais do autor na escrita, de que “os fatos podem não ser autobiográficos, mas as emoções são”. Quais emoções te instigaram a escrever este livro?

O Mundos de uma noite só parte de uma experiência subjetiva radical de sua personagem frente a um momento limite. Portanto, embora não seja um livro de autoficção, cada cena dele foi permeada pelo meu próprio espanto de habitar um corpo de mulher e de estar viva. Sem dúvida, o horror e a angústia que senti ao longo do meu crescimento, bem como as lutas que travei para me tornar quem sou, podem ser sentidos a partir da trajetória da protagonista. No entanto, também fiz um exercício de invenção ao me permitir sensações novas que decorrem da própria experiência de criação. Nunca estou separada daquilo que estou escrevendo. Não há transcendência sem essa mistura.

Essa é uma história marcada por traumas transgeracionais, algo que, em maior ou menor medida, faz parte da experiência de qualquer pessoa — seja dentro da própria família, seja em relação a um determinado grupo social. Enquanto leitora e escritora, você enxerga a literatura como um território de cura dessas feridas compartilhadas? Penso que a literatura não tem que cumprir, de modo predeterminado, função alguma, pois ela basta em si mesma. No entanto, também não posso ignorar o efeito transformativo que o Mundos de uma noite só teve na minha existência, assim como os relatos que recebi dos seus leitores. Tive que olhar muito de perto para algumas dores profundas para ser capaz de escrevê-lo. E, ao longo desse processo, pude também compreender que não precisava mais ficar tão identificada com meus ferimentos e cicatrizes, que minha grande subversão narrativa seria renunciar à posição de vítima para conseguir construir uma nova história íntima, descobrindo minha real voz e autoria existencial. Estou sempre em movimento. Por vezes, assim como a personagem principal do romance, interrogo Deus, tento compreender certos desafios que me são impostos. Sou uma espécie de inconformada com o estado das coisas, creio que esse foi um dos motivos que me tornou escritora. Mas descobri que a única coisa que permite qualquer pessoa, mesmo consciente de sua mortalidade, suportar seus medos é uma espécie de fé e apaixonamento pelo não sabido. Escrever e ser lida, sem dúvida, me ajudam a dar conta da alternância dos papéis de protagonista e narradora da minha vida.

MINHA ESTANTE

Primeiro livro que li:

Minha primeira memória como leitora é de um livrinho infantil que se passava numa fábrica de brinquedos. Jamais esqueci a experiência de um tempo dentro do tempo que ele me proporcionou.

Livro que estou lendo: Nostalgias canibais, do Odorico Leal.

Livro que mudou minha vida: Juventude, do J. M. Coetzee. E o conto “Amor”, da Clarice Lispector.

Livro que eu gostaria de ter escrito: A mais recôndita memória dos homens, do Mohamed Mbougar Sarr.

O último livro que me fez chorar: Piscinas russas, meu próximo romance, o livro dois da trilogia inaugurada pelo Mundos de uma noite só. Senti uma dor imensa enquanto escrevia uma das cenas mais importantes do enredo. Chorei por quase duas semanas depois do seu fim.

Último livro que me fez rir: O colibri, do Sandro Veronesi (que tem pequenos momentos hilários, embora não seja um livro cômico).

Livro que não consegui terminar: Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa. O livro dos livros, a travessia infinita pela vida e língua, meu eterno companheiro de jornada, algo que me causa tanto maravilhamento que nunca consigo terminar, pois sempre temo perder, acabar, morrer também quando do seu fim.

“Renata tem uma capacidade rara, que é um estilo muito cuidado, feito uma ourivesaria literária. Nada sobra, nada está fora do lugar.”

A curadora do mês fala à TAG sobre o livro de Renata Belmonte — que foi sua aluna de escrita criativa —, a expansão da presença feminina na literatura e a relação com o Brasil como escritora e pesquisadora de arte e literatura indígena.

Vamos começar pela obra que você indicou como curadora, Mundos de uma noite só. Como foi seu encontro com esse livro, e por que você gostaria que ele chegasse a mais leitores? Meu encontro com esse livro começou pela autora, Renata Belmonte, que foi minha aluna na oficina de escrita criativa que eu ministrava em São Paulo. Um dia ela me entregou Vestígios da Senhorita B., livro publicado em 2009, levei para casa e, quando comecei a ler, foi uma surpresa, era um texto belíssimo, uma escrita rara, de grande força narrativa e estética. Disse isso a ela — é algo que sempre faço, falar do meu entusiasmo quando vejo um texto muito bom. É claro que escrever algo muito bom não significa que o livro seguinte também o será, às vezes aquela obra é apenas fruto de um momento em que tema e forma se encontraram. Mas esse não é o caso da Renata; depois desse, veio Mundos de uma noite só, e com ele a confirmação de que se tratava de um trabalho a longo prazo, de um projeto literário que não só se sustentava como se expandia. Renata tem uma capacidade rara, que é um estilo muito cuidado, feito uma ourivesaria literária, você vê isso na construção das frases, nada sobra, nada está fora do lugar. E, ao mesmo tempo, há esse mergulho profundo na vida e nas emoções das personagens.

A curadora do mês

Nome:

Carola Saavedra

Nascimento:

1973, Santiago (Chile)

Profissão:

Escritora, tradutora e professora

Duas ou três coisas sobre ela:

1 TRÂNSITO

O deslocamento é um tema recorrente nas obras da autora. Natural de Santiago do Chile, Carola Saavedra se mudou para o Brasil ainda na infância e, desde então, não parou de viajar. Morou na Espanha, na França e, atualmente, vive na Alemanha, onde leciona na Universidade de Colônia.

2 AUTORA DA TAG

Seu romance Com armas sonolentas foi enviado na TAG Curadoria em 2022, indicado por Carlos Eduardo Pereira, e logo se tornou um dos queridinhos do clube, com nota 4.3 no aplicativo. Assim como o livro deste mês, é um romance visceral que acompanha mulheres através das gerações.

3 REALISMO ONÍRICO

Adotado pela autora, o realismo onírico oferece uma leitura onde as fronteiras entre o real e o sonhado se dissolvem, criando uma atmosfera ao mesmo tempo mística e vívida. Nas palavras de Saavedra: “não importa se as coisas aconteceram no inconsciente ou na ‘vida real’, para a psique, tudo é verdade”.

Em 2022, enviamos seu livro Com armas sonolentas aos associados da TAG Curadoria. Assim como o livro de Renata Belmonte, é uma história que transcorre a partir da experiência de personagens mulheres de diferentes gerações, investiga o feminino e navega por dimensões do inconsciente. Você vê pontos de contato entre as duas narrativas?

Sim, acho que o principal ponto de contato é esse mergulho nos aspectos mais profundos e misteriosos da psique das personagens, nisso que não é óbvio, que não é claro, nessa ambiguidade insustentável da palavra. E de como isso vem à tona. Talvez o que haja em comum seja isso, uma cartografia do que vem à tona a partir daquilo que não foi falado nas famílias, do que passa de geração em geração, seja como escrita-sintoma no corpo, seja como ato-sintoma na vida. Há sempre algo que se sabe sobre essa história familiar, algo que se escreve, mesmo que tentemos ignorar.

Há cada vez mais mulheres escrevendo e sendo reconhecidas no meio literário. Como você enxerga este momento da literatura contemporânea no Brasil? Em que aspectos ainda precisamos avançar? Houve uma clara mudança de paradigma na literatura brasileira a partir de 2010, 2015. Para ficar só nos números, basta fazer uma análise dos principais prêmios literários: se até então era raro ver mulheres entre os finalistas, mais raro ainda era que fossem premiadas. Também houve um aumento no número de mulheres publicadas pelas principais editoras do país, outro marcador

dessa transformação. Isso não é algo isolado, claro, é reflexo das políticas identitárias, um movimento que vem se dando em muitos lugares, e com muita força na América Latina. É claro que se trata de um processo que está apenas começando e que não se dá de forma linear nem progressiva. E, apesar das grandes mudanças — o reconhecimento da literatura de mulheres como a Renata é sinal disso —, há ainda muita coisa a ser feita, especialmente no que diz respeito ao racismo, ou seja, ainda estamos longe de um feminismo que considere a voz e a escrita das mulheres negras e indígenas. Aliás, acho que este é o principal aspecto para o qual devemos olhar: nos afastarmos de um feminismo liberal de mercado, que tudo engole e transforma em produto, para construirmos uma literatura que realmente dê espaço para outras vozes — mulheres negras, indígenas, lésbicas, pessoas trans, não binárias, e todas as demais dissidências. Não digo isso como uma espécie de benevolência, ao contrário, a literatura só tem a ganhar, a se enriquecer quando incluir outras diversidades.

Você mora há alguns anos na Alemanha, pesquisando e lecionando literatura e estudos culturais no Instituto Luso-Brasileiro da Universidade de Colônia. Como é escrever e integrar a cena literária brasileira estando fisicamente longe do Brasil? Em que medida esse olhar de fora traz desafios e potencialidades para o seu trabalho? Hoje em dia, a distância geográfica não é mais necessariamente uma distância cultural, aliás, acho que nunca estive tão próxima do Brasil como agora.

Além de viagens constantes, algo que meu trabalho não só permite como exige, eu trabalho numa longa pesquisa sobre arte e literatura indígena, então, apesar de morar na Alemanha, toda a minha atenção está voltada para o Brasil, especialmente para os povos originários nesse território, suas diversas culturas, narrativas e formas de resistência. Um aprofundamento que criou em mim uma série de deslocamentos no meu ponto de vista, talvez uma forma mais intensa de pensar a nossa história colonial e todo o movimento decolonial. Em outras palavras, às vezes surge esse olhar que o distanciamento geográfico intensifica, que é um olhar crítico para certas realidades. Funciona da mesma maneira quando nos afastamos de “casa”, percebemos melhor do que não gostamos e do que sentimos falta, também nos ajuda a lembrar quem somos. Talvez estes anos na Alemanha tenham servido para me lembrar o quanto eu estou ligada ao desenrolar da história colonial brasileira (e, mais amplamente, latino-americana), suas resistências, esse lugar ancestral, e do quanto esse espaço é a minha casa. Resultado disso é, num aspecto literário, o meu romance mais recente, O manto da noite, uma espécie de viagem onírica pelo passado (ancestral) e futuro (distópico) do continente.

MINHA ESTANTE

Livro que estou lendo:

As aventuras da China Iron, de Gabriela Cabezón Cámara, e Chamanes eléctricos en la fiesta del sol, de Mónica Ojeda.

Livro que mudou minha vida: A bolsa amarela, da Lygia Bojunga.

Livro que eu gostaria de ter escrito:

Não há nenhum livro que, por mais que eu admire, gostaria de ter escrito. É que, para escrevê-lo, eu teria que ter sido essa pessoa, passado pelo que ela passou, ter lido o que ela leu, e eu estou bem com quem sou.

O último livro que me fez chorar: Instruções para morder a palavra pássaro, livro de poemas de Assionara Souza.

Último livro que me fez rir: Interessante, pensei muito, mas não consigo me lembrar de um livro que tenha me feito rir de verdade (não apenas um sorriso). Talvez isso diga algo sobre a dificuldade do humor na literatura ou, mais provavelmente, sobre as minhas escolhas literárias.

Livro que não consegui terminar: No caminho de Swann (primeiro volume de Em busca do tempo perdido), de Marcel Proust, é um livro maravilhoso, mas a verdade é que já retomei a leitura várias vezes e nunca consigo terminar.

Um dos temas que atravessa sua escrita é a experiência de viver em um mundo em destruição e as formas de se relacionar com nosso tempo sob diferentes perspectivas e modos de vida. Como podemos cultivar a criatividade neste cenário de catástrofe climática, e o que podemos aprender com os povos originários nesse sentido?

Acho que o principal a se aprender com os povos originários é o respeito por esses povos, permitir coisas básicas como o direito à vida, à própria língua e cultura. Digo isso porque é importante lembrar que o saber dos povos indígenas não pode ser mais um produto a ser consumido, a busca por esses saberes precisa em primeiro lugar estar integrada com políticas que permitam a sobrevivência desses povos. Porque, se eles sobreviverem, se manterá também a floresta — as florestas em geral e tudo o que vive nelas —, e, se isso sobreviver, aumentam as nossas chances também. Agora, para além desse aspecto, há sim muito a aprender; o principal é a forma como lidamos com a natureza, com o planeta e especialmente com a alteridade. Se olhamos para o outro como algo ou alguém que só existe para nos servir, ou se seremos capazes de compreender (e atuar) que toda relação, não importa se com outro ser humano, com animais não humanos, com uma montanha, um rio ou com o próprio planeta, deve ser sempre uma relação horizontal, de trocas justas, para que todos possam continuar neste mundo.

Diante da solidão, os livros

Um panorama sobre três autoras gigantes que oferecem à protagonista de Mundos de uma noite só um espaço mais amplo para existir.

Em uma das cartas que o poeta austríaco Rainer Maria Rilke enviou ao jovem Franz Kappus sobre o fazer poético, ele afirma que “no fundo, e justamente quanto aos assuntos mais profundos e mais importantes, estamos indizivelmente sozinhos”. A solidão é assim, complexa: para crescer, precisamos tanto cultivá-la quanto escapar dela — e o encontro com a arte é um caminho de conciliação fantástico entre essas duas necessidades. Um jeito de estar sozinho e acompanhado, de redimensionar e acolher nossas dores através da experiência do outro.

A protagonista de Mundos de uma noite só , uma menina que cresce na solidão de uma dinâmica familiar opressiva, tem seu grande momento de redenção quando passa a frequentar uma biblioteca e conhece três mulheres que transformam seu coração: Aglaja Veteranyi, Clarice Lispector e Marguerite Duras. De nacionalidades diferentes, as escritoras têm em comum uma biografia marcada pela experiência de desterritorialização forçada e uma escrita que verte no fluxo livre da mente humana.

“Aglaja é quase idêntica a mim. Além de possuir um nome esquisito, também é uma menina que não foi estrela. O pior de tudo é que ela tem um pai terrível. Quando descobri, achei até melhor o meu não ter aparecido.”

(Mundos de uma noite só, p. 76)

Aglaja Veteranyi foi uma escritora de língua alemã e influências multiculturais. Nascida na Romênia em 1962, ela passou a infância viajando com seus pais, artistas de circo, depois que a família fugiu da ditadura de Nicolae Ceau ș escu. A experiência formativa incomum marcou profundamente a vida de Aglaja e é relatada em seu único romance, Por que a criança cozinha na polenta . Notadamente autobiográfica, a obra foi publicada originalmente em 1999 e ganhou uma edição brasileira pela DBA em 2004.

Sob o ponto de vista de uma criança, a narrativa expõe os contrastes entre o ambiente lúdico e complexo do circo, o pano de fundo político da Guerra Fria, o despertencimento geográfico e linguístico e a proximidade da menina com o mundo dos adultos, em uma cruel equação de degradação da infância. O livro foi adaptado ao teatro pela própria Aglaja, que se formou na área, trabalhou como atriz e dramaturga e dirigiu por mais de uma década uma escola de teatro na Suíça, país que se tornou seu lar na adolescência. Em 2008, a obra inspirou uma adaptação teatral brasileira, pela Companhia Mungunzá de Teatro, de São Paulo.

Aglaja também foi prolífica na escrita de poesia, em textos marcados por uma linguagem bela e concisa e por temáticas de desamparo e isolamento afetivo. Sem edição em português, alguns poemas da autora foram contemplados pelo projeto de tradução Arcas de Babel, da revista Cult, e podem ser lidos no site do periódico. A escritora romena faleceu em 2002, aos 39 anos.

“Clarice é bonita, esguia. Guarda no rosto uma expressão de criança assombrada. No mesmo dia em que a conheci, compreendi que não precisava sofrer tanto. Não fui, no mundo, a única vítima de uma criatura infeliz.” (Mundos de uma noite só, p. 76)

Clarice Lispector é, sem sombra de dúvida, um dos nomes mais emblemáticos da literatura brasileira. Nascida em 1920 na Ucrânia, ela migrou ainda criança com a família para o Brasil, para escapar da perseguição aos judeus durante a Guerra Civil Russa. Se não há síntese possível para a dimensão de sua obra, escolhemos nos deter aqui sobre um romance específico, o primeiro publicado pela escritora, que guarda algumas semelhanças com a proposta estética e temática do livro de Renata Belmonte.

Em Perto do coração selvagem, circulamos entre a infância e a vida adulta de Joana, uma menina que passa por perdas precoces significativas e mergulha em um processo profundo de busca por si mesma, pela liberdade e pelos sentidos de sua relação com o mundo. O livro carrega na estrutura e na linguagem a identidade escorregadia da personagem, cuja tentativa de dar conta de si mesma escapa a ela própria e também ao leitor. Em um salto temporal que nos leva ao cotidiano doméstico de uma Joana adulta e casada, novas situações, memórias e encontros mobilizam questões profundas a respeito da construção e das expectativas sociais sobre o feminino, a relação com outras mulheres e a inquietação existencial da protagonista. Definido pelo crítico literário Antonio Candido como um “romance de aproximação”, esse é um livro que parece jamais fechar questões, sustentando as complexidades do desamparo, da inconformidade e da eterna busca pela liberdade.

“Assim como Marguerite, há uma fotografia minha que nunca foi tirada, que restou para sempre esquecida.” (Mundos de uma noite só, p. 97)

Marguerite Duras é uma francesa nascida fora da França — mais especificamente em Saigon, atual Cidade de Ho Chi Minh, sul do Vietnã. Na época, o território fazia parte da Indochina colonial francesa. A futura escritora viveu lá sua infância e adolescência, e a experiência foi matéria-prima do livro que, décadas mais tarde, a tornaria uma escritora conhecida mundialmente. O amante narra a experiência de uma adolescente francesa que vive um romance com um chinês rico e mais velho nas margens da província de Saigon, durante o declínio do império colonial francês. O encontro entre os dois é marcado por um desejo arrebatador que contrasta com a dura realidade social do entorno e com a miséria vivida pela família da personagem. Fragmentada e intimista, a narrativa reflete a construção subjetiva e fugidia da memória, confundindo realidade e ficção. Em 1984, o livro recebeu o Prêmio Goncourt, um dos mais prestigiados da literatura francesa, e em poucos anos ganhou traduções para dezenas de idiomas.

O atravessamento desse pano de fundo histórico na vida pessoal da autora faz com que essas questões transbordem de maneira muito fluida e orgânica de seus textos. Através da experiência íntima de suas personagens, Marguerite Duras compôs uma obra que mobiliza de forma orgânica e profunda elementos políticos de exploração, colonização e da experiência das mulheres.

Da mesma estante

Livros que poderiam ser guardados na mesma prateleira do livro do mês, para quem quiser continuar no assunto.

INFÂNCIAS E A CONSTRUÇÃO DO FEMININO

Histórias lindamente narradas sobre experiências de crescer e descobrir quem se é com uma sensibilidade aterradora e em meio a ambientes turbulentos

PERTO DO CORAÇÃO

SELVAGEM,

Clarice Lispector

Rocco, 208 pp.

Joana é uma menina introspectiva e profundamente sensível. Em uma narrativa fragmentada, transitamos entre as memórias de infância e o olhar sobre o casamento da protagonista já adulta, entrelaçando reflexões existenciais que exploram a busca pela verdade interior, o desejo de liberdade e a complexidade da alma humana.

ÁGUA DOCE,

Akwaeke Emezi

Kapulana, 208 pp.

Tradução de Carolina Kuhn Facchin

Narrada na primeira pessoa do plural, a história de uma criança nigeriana que vive com vários seres dentro de si. Em uma jornada marcada pela incompreensão da família e ameaçada pela loucura, ela aprende a conviver com os espíritos que a constituem e a abraçar uma existência ogbanje — sem gênero e sem extremos, múltipla.

PEQUENA COREOGRAFIA

DO ADEUS, Aline Bei Companhia das Letras, 264 pp.

Julia cresceu atravessada por traumas familiares e emaranhada na complicada relação dos pais separados. Com uma prosa poética forte e original, Aline Bei percorre a vida da personagem da infância à vida adulta — uma jornada marcada pela solidão e pelo desejo de construir um espaço para sua própria coreografia.

HISTÓRIAS DE FAMÍLIA

Uma seleção de narrativas ambientadas em surpreendentes, intrincadas e reveladoras paisagens familiares

MATA DOCE, Luciany Aparecida

Alfaguara, 304 pp.

Maria Teresa vive com suas mães num casarão antigo. Às vésperas de se casar, uma tragédia muda sua vida para sempre. Mergulhando nos sentimentos mais profundos daqueles que habitam o vilarejo rural de Mata Doce, a narradora revela uma trama de rixas familiares, segredos, sentimentos clandestinos e mistérios.

UM RIO CHAMADO TEMPO, UMA CASA CHAMADA TERRA, Mia Couto

Companhia das

Letras, 264 pp.

Marianinho volta à ilha onde nasceu para o funeral do avô e se descobre um estranho na própria família e na própria raça, pois na cidade adquiriu hábitos de um branco. Entre tradições e segredos, sua tarefa é encontrar uma forma de seguir cultivando sua história familiar e cultural.

LOUÇAS DE FAMÍLIA, Eliane Marques

Autêntica, 280 pp.

Quem cuida das necessidades cotidianas e do armário de louças de uma família branca? Partindo da vida e da morte de tia Eluma, empregada doméstica de um casarão colonial na fronteira entre Brasil e Uruguai, Eliane Marques puxa um fio que conecta ancestralidade e relações de poder em uma narrativa de dicção literária surpreendente.

Universo do livro

Livros, séries, filmes que orbitam o livro do mês

O VAZIO DO DOMINGO

FILME DE RAMÓN

SALAZAR QUE RETRATA A BUSCA DE UMA

Mundos de uma noite SÓ é um romance de formação. Mas també de destruição: de uma cidade, de um tempo e, em especial, de nossas mais preciosas ilusões. Assim, somos convidados a acompanhar a jornada de uma mulher que, após encontrar um livro antigo entre as coisas de sua mãe, se vê obrigada a revisitar sua própria história. Multifacetado e de leitura hipnótica, este romance nos revela que, realmente, nada é apenas o que parece ser. Nem mesmo aqueles que mais amamos.

MULHER POR SUAS ORIGENS MATERNAS.

renata belmonte

INFÂNCIA

Renata Belmonte é autora do Mundos de uma noite só (Finalista do Prêmio São Paulo de Literatura de 2020 e Semifinalista do Prêmio Oceanos de 2021) e de três livros de contos: Femininamente (Prêmio Braskem de Literatura, 2003), O que não pode ser (Prêmio Arte e Cultura Banco Capital, 2006) e Vestígios da Senho(P55, 2009). Doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e Mestre pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), ela é também advogada.

mundos de uma noite só

LIVRO DE GRACILIANO RAMOS QUE RELATA AS MEMÓRIAS MAIS REMOTAS DO ESCRITOR ALAGOANO, SUA SENSIBILIDADE PRECOCE E SEU ENCONTRO COM A LITERATURA.

mundos de uma

CEM ANOS DE SOLIDÃO SÉRIE DA NETFLIX INSPIRADA NO LIVRO DE GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ. UMA SAGA FAMILIAR QUE SE PASSA EM UMA PEQUENA CIDADE EM MEIO A CONFLITOS POLÍTICOS, PAIXÕES E TRAGÉDIAS COM ARES COTIDIANOS.

A TETA ASSUSTADA

FILME DE CLAUDIA LLOSA

QUE EXPLORA O IMPACTO

TRANSGERACIONAL DO ABUSO

CONTRA AS MULHERES A PARTIR DE UMA PROTAGONISTA

QUE DESENVOLVE UMA

DOENÇA EM FUNÇÃO DO TRAUMA DE SUA MÃE.

NADA DIGO DE TI, QUE EM TI NÃO VEJA

LIVRO DE ELIANA

ALVES CRUZ SOBRE OS DILEMAS SOCIAIS DE UMA FAMÍLIA RICA E A INTOLERÂNCIA DIANTE DA DIFERENÇA, QUE

TOCA EM IMPORTANTES QUESTÕES DE GÊNERO.

A PAIXÃO SEGUNDO G.H.

FILME DE LUIZ FERNANDO CARVALHO, ESTRELADO POR MARIA FERNANDA CÂNDIDO E INSPIRADO NO CLÁSSICO DE CLARICE LISPECTOR, REFERÊNCIA LITERÁRIA FUNDAMENTAL DE RENATA BELMONTE.

LEIA. CONHEÇA.

DESCUBRA:

Referência da autora do livro deste mês, Wharton foi a primeira mulher a ser laureada com o Prêmio Pulitzer de Ficção. Em vida e em uma extensa obra, lançou um olhar preciso e sensível à construção social do feminino em um determinado tempo e espaço e transpôs essa percepção para narrativas literárias de imensa força subjetiva.

©E. F. Cooper

Nome

Edith Wharton

Nascimento

24 de janeiro de 1862, Nova York, EUA

Morte

11 de agosto de 1937, Saint-Brice-sous-Forêt, França

Nascida Edith Newbold Jones, Wharton foi uma celebrada escritora e uma observadora afiada de seu tempo. Em um período que limitava as ambições femininas à esfera do casamento, ela se tornou uma das autoras mais reconhecidas de seu país com narrativas que retratam de forma crítica, sensível e profunda os valores e convenções da alta sociedade, da qual ela mesma fazia parte.

Prolífica e multifacetada, Edith Wharton escreveu mais de 40 livros. Além de romances, publicou contos, ensaios, autobiografias e obras especializadas sobre arquitetura, paisagismo, design de interiores e viagens.

Nascida em uma família da elite nova-iorquina, Wharton teve acesso a uma educação privilegiada. Passou boa parte da infância vivendo na Europa, onde aprendeu outros idiomas e desenvolveu um senso estético, artístico e literário apurado. Aos 16 anos de idade, escreveu seu primeiro volume de poemas.

Em 1885, casou-se com Teddy Wharton, também membro da aristocracia e amigo da família. Logo o casal foi viver em uma mansão em Newport, destino de verão de boa parte da elite da Era Dourada dos Estados Unidos. Durante os quase 30 anos de casamento, Wharton escreveu obras como A casa da alegria (1905) e Ethan Frome (1911). Em 1913, depois de anos conturbados lidando com questões de saúde mental do marido, a escritora se divorciou e mudou-se para a França.

Wharton vivia em Paris quando começou a Primeira Guerra Mundial. Lá, envolveu-se na criação de uma ampla rede de iniciativas humanitárias e mais tarde foi condecorada com a Legião de Honra francesa por seu trabalho. Quando o conflito acabou, mudou-se para Saint-Brice-sous-Forêt, uma pequena cidade ao norte de Paris, onde viveria até o fim de seus dias.

Em 1921, ela tornou-se a primeira mulher a receber o Prêmio Pulitzer de Ficção, pelo livro A idade da inocência (1920). Morreu em 11 de agosto de 1937, aos 75 anos.

Nenhuma criança da minha idade estava tão próxima de mim quanto as grandes vozes que falavam comigo através dos livros. Sempre que tento relembrar a minha infância, é na biblioteca do meu pai que ela ganha vida…

A CASA DA ALEGRIA

Uma jovem da alta sociedade de Nova York se vê desamparada economicamente

depois da morte dos pais. A trama explora a subjetividade feminina e a construção do que é ser mulher no começo do século 20.

A IDADE DA INOCÊNCIA

O livro que rendeu o Pulitzer a Edith Wharton gira em torno de um triângulo amoroso que traduz as tensões entre os desejos e pulsões individuais e as imposições sociais do final do século 19.

ETHAN FROME

Ambientado no condado fictício de Starkfield, na Nova Inglaterra, esse romance enigmático e instigante explora os mistérios da figura que dá nome ao livro, sintetizando os costumes e tradições dos Estados Unidos do início do século 20.

PARA

Espaço da comunidade

Olá, Madame TAG! Sou associada há cinco anos e tenho uma preocupação que não sai da minha cabeça: a minha memória. Gosto muito dos livros da TAG e também me aventuro por outras leituras, explorando autores renomados da literatura brasileira e estrangeira. Ah, e sou apaixonada pelos clássicos! Mas, depois de alguns dias do término de uma leitura, com frequência esqueço os nomes dos personagens, do autor e até o enredo da obra. Sinto que esse desafio envolve tanto minha memória quanto minha tendência perfeccionista, que me faz querer guardar cada enredo na mente. Como a leitura pode me ajudar a lidar com essas questões? Tem algum “remédio” ou dica que resolva isso num piscar de olhos?

Consuêlo Valdevino

Cara perfeccionista,

Poucas coisas nesta vida se resolvem num piscar de olhos, mas também são raros os casos em que a literatura não consegue ajudar. Vou recorrer à escritora americana Maya Angelou, que certa vez afirmou: “As pessoas vão esquecer o que você disse, vão esquecer o que você fez, mas não esquecerão o que você as fez sentir”. Ora, o mesmo vale para os livros. O que mais importa não é lembrar exatamente do que você leu, de cada detalhe de uma história ou dos nomes de todos os personagens. A verdadeira joia da leitura é o universo afetivo que aquela história abre para você. E isso eu garanto que, não importa quanto tempo passe, você não vai perder. Pegando emprestadas as palavras de mais uma escritora inspiradora, a portuguesa Matilde Campilho, é bom lembrar: “A poesia, a música, uma pintura não salvam o mundo. Mas salvam o minuto”. Concentre-se no minuto da leitura, tome nota de seus trechos favoritos se assim desejar. E, se der vontade de relembrar tudo, por que não se permitir um repeteco daquele livro que te marcou?

Mundos de uma noite SÓ é um

No próximo mês

romance de formação. Mas també de destruição: de uma cidade, de um tempo e, em especial, de nossas mais preciosas ilusões. Assim, somos convidados a acompanhar a jornada de uma mulher que, após encontrar um livro antigo entre as coisas de sua mãe, se vê obrigada a revisitar sua própria história. Multifacetado e de leitura hipnótica, este romance nos revela que, realmente, nada é apenas o que parece ser. Nem mesmo aqueles que mais amamos.

Na próxima caixinha da TAG Curadoria, uma arrebatadora e profunda narrativa autobiográfica de uma das autoras mais celebradas da literatura francesa, reconhecida com o Prêmio Goncourt. Com curadoria de um jovem escritor francês que virou sensação ao narrar a própria vida expondo dilemas de classe e sexualidade, o livro do mês explora em tom introspectivo, original, sensível e afiado uma tumultuada história de amor, entrelaçando reflexões poderosas sobre colonialismo, cultura, exílio e a experiência de mulheres ao longo da história.

Renata Belmonte é autora do romance Mundos de uma noite só (Finalista do Prêmio São Paulo de Literatura de 2020 e Semifinalista do Prêmio Oceanos de 2021) e de três livros de contos: Femininamente (Prêmio Braskem de Literatura, 2003), O que não pode ser (Prêmio Arte e Cultura Banco Capital, 2006) e Vestígios da Senhorita B (P55, 2009). Doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e Mestre pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), ela é também advogada.

As capas de livro frequentemente são verdadeiras obras de arte, não é mesmo? Recortando a página ao lado, você pode transformar este projeto gráfico em um item exclusivo, seja como elemento decorativo ou colecionável. O verso também é especial, com uma linda citação do autor para complementar a imagem.

Agora é só soltar a criatividade! E, se compartilhar nas redes, não se esqueça de nos marcar no @taglivros — adoramos ver as ideias de vocês ganhando vida.

mundos de uma noite só renata belmonte

mundos de uma noite só

Há também de existir, no meio deste meu

longo e rigoroso inverno particular, um verão invencível em mim.
“fui a criança mais velha do mundo e estava me tornando a jovem mais antiga da rua”
– ALINE BEI

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"Mundos de uma noite só" TAG Curadoria - Março/2025 by TAG - Experiências Literárias - Issuu