Janeiro 2009

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ISSN 1646-6586

Revista Portuguesa de

FiSIOTERAPIA NO DESPORTO JANEIRO 2009 | VOLUME 3 | NÚMERO 1

EDITORIAL The importance of scientific publications in the professional development of sports physiotherapists: Do we need quantity or do we need quality? Guy Simoneau

ARTIGO ORIGINAL

www.apfisio.pt/gifd_revista

Perfil e Padrões de Prática dos Fisioterapeutas no Futebol em Portugal – um Estudo Observacional João Costa & Duarte Pereira Influência do Tipo de Cadeia Cinética no Sentido de Reposição Articular do Joelho Paulo Carvalho & Paulo Ribeiro

REVISÃO DA LITERATURA O Efeito do Tape Patelar ao Nível da Diminuição da Dor e da Actividade Muscular do Vasto Interno Obliquo e do Vasto Externo em Sujeitos com Síndrome Patelo-Femural -Revisão Sistemática Marco Jardim

ARTIGO DE OPINIÃO Lesões nos Jovens Atletas: Conhecimento dos Factores de Risco para Melhor Prevenir Raúl Oliveira

REVISÃO DE LIVROS The Shoulder in Sport: Management, Rehabilitation and Prevention Postsurgical Orthopedic Sports Rehabilitation: Knee & Shoulder Raúl Oliveira

Publicação Oficial do Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas


PROPRIEDADE Associação Portuguesa de Fisioterapeutas Rua João Villarett, 285 A Urbanização Terplana 2785-679 – São Domingos de Rana Portugal Tel: (+351) 214 524 156 Fax: (+351) 214 528 922 E-mail: apfisio@apfisio.pt Web: http://www.apfisio.pt NIF: 501790411 ÓRGÃOS DIRECTOR | Marco Jardim DIRECTOR ADJUNTO | Raúl Oliveira SUB-DIRECTOR | José Esteves EDITOR Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto GRUPO EDITORIAL Alexandra Amorim, João Ribeiro, Luís Ribeiro, Marco Jardim, Marc Reis, Rúben Miranda e Telmo Firmino. CONSELHO EDITORIAL COORDENADOR Raúl Oliveira Faculdade de Motricidade Humana António Cartucho Hospital da CUF Descobertas António Carvalhais Figueiredo Clínica CUF – Stª Maria de Belém Fernando Pereira Faculdade de Motricidade Humana Henrique Relvas Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Jacob Friscknetch Federação Portuguesa de Judo Jan Cabri Faculdade de Motricidade Humana João Paulo Sousa Faculdade de Motricidade Humana José Esteves Escola Superior de Saúde do Alcoitão Maria António Castro Escola Superior de Saúde de Coimbra Paulo Carvalho Escola Superior de Saúde do Porto Paulo Amado Hospital Privado da Boavista Orlando Fernandes Faculdade de Motricidade Humana Ricardo Matias Escola Superior de Saúde de Setúbal Rui Torres Escola Superior de Saúde do Vale do Sousa Rui Soles Gonçalves Escola Superior de Saúde de Coimbra Susana Veloso Universidade Lusófona Themudo Barata Faculdade de Motricidade Humana

OBJECTIVO A Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto é uma publicação oficial do Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas. Esta revista pretende divulgar um conjunto de informações indispensáveis para a prática clínica e desenvolvimento profissional contínuo dos fisioterapeutas que actuam na área do desporto, bem como, temas de áreas relacionadas. Pretende-se abranger temáticas relevantes sobre a prevenção, diagnóstico e tratamento de lesões resultantes da prática desportiva. Contempla estudos experimentais, quasiexperimentais, descritivos/observacionais (levantamentos epidemiológicos, estudos de caso, descrição de experiências), revisões sistemáticas de literatura, meta-análises e artigos de opinião sobre a prática da fisioterapia no desporto, bem como em áreas relacionadas. Os artigos a publicar são submetidos a análise criteriosa pelo Conselho Editorial da revista. Esta publicação dirige-se a todos os fisioterapeutas, bem como a outros profissionais da área da Saúde e do Desporto. SUBMISSÃO DE ARTIGOS Para submissão de trabalhos por favor consulte http://www.apfisio.pt/ gifd_revista Através deste endereço poderá ter acesso a todas as informações e procedimentos necessários para submeter o seu trabalho a publicação. Para enviar o seu trabalho utilize o seguinte endereço electrónico: revista_gifd@apfisio.pt. Para informações adicionais contacte o Editor – Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto – gifd@apfisio.pt SUBSCRIÇÃO A Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto é uma publicação de distribuição livre para todos os sócios da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas. PERIODICIDADE Semestral (Janeiro e Julho) PROJECTO GRÁFICO E CONTEÚDOS Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto PUBLICIDADE Para anunciar na Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto deverá entrar em contacto com o Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto ISSN 1646-6586 REGISTO I.C.S nº 125207 COPYRIGTH © Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto © 2007. Todos os direitos reservados.Esta publicação e todo o seu conteúdo estão protegidos pelos direitos do Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto. CONTACTOS Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto E-mail: revista_gifd@apfisio.pt SEDE DE REDACÇÃO Associação Portuguesa de Fisioterapeutas

Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto 1985 - 2009

Associação Portuguesa de Fisioterapeutas


ÍNDICE

EDITORIAL The importance of scientific publications in the professional development of sports physiotherapists: Do we need quantity or do we need quality? Guy Simoneau

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ARTIGO ORIGINAL Perfil e Padrões de Prática dos Fisioterapeutas no Futebol em Portugal – um Estudo Observacional João Costa & Duarte Pereira

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Influência do Tipo de Cadeia Cinética no Sentido de Reposição Articular do Joelho Paulo Carvalho & Paulo Ribeiro

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REVISÃO DA LITERATURA O Efeito do Tape Patelar ao Nível da Diminuição da Dor e da Actividade Muscular do Vasto Interno Obliquo e do Vasto Externo em Sujeitos com Síndrome Patelo-Femural -Revisão Sistemática Marco Jardim

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ARTIGO DE OPINIÃO Lesões nos Jovens Atletas: Conhecimento dos Factores de Risco para Melhor Prevenir Raúl Oliveira

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REVISÃO DE LIVROS The Shoulder in Sport: Management, Rehabilitation and Prevention Raúl Oliveira Postsurgical Orthopedic Sports Rehabilitation: Knee & Shoulder Raúl Oliveira

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EDITORIAL-CONVIDADO

The importance of scientific publications in the professional development of sports physiotherapists: Do we need quantity or do we need quality? Guy Simoneau1 PT, Phd, ATC. Director do Journal Orthopaedics & Sports Physical Therapy 1

It is an honor and a pleasure to contribute this guest editorial to the Portuguese Sports Physiotherapy Journal. The topic “the importance of scientific publications in the professional development of sports physiotherapists” is I believe timely and important, as it reflects the fundamental mission of the Journal of Orthopaedic & Sports Physical Therapy (JOSPT): sharing high-quality, clinically relevant information to promote optimal care by sports and orthopaedic physiotherapists. I am also delighted by the opportunity for JOSPT to partner with the Sports Physiotherapy Interest Group of the Portuguese Association of Physiotherapists and provide members with on-line access to our published articles and other materials. We hope that this partnership can contribute to the growth of our clinical practice and science. As I prepared to write this guest editorial, I was thinking back on how knowledge, education, and practice have changed over the 25 years I have been a physiotherapist. The systematic investigation of diagnostic techniques and treatment approaches through clinical trials, combined with sophisticated tools such as computers and modern imaging and measurement techniques have generated a recent exponential growth in our knowledge. Simultaneous to this rapid expansion in knowledge is the equally rapid expansion of technology used to quickly transfer written information. This technology has afforded clinicians, educators, and researchers the means to access, search, and share information with increasingly greater ease and speed. Ultimately, our hope is that this new information leads to improved practice and quality of care for our patients. But unfortunately, although the tools do exist, it is well known that incorporating new knowledge into clinical practice remains a monumental challenge — a challenge that I believe both scientific publications and clinicians must work together to overcome. Journals have to make every effort to provide easy access to high-quality content that helps clinicians in their daily clinical practice, and clinicians must adopt a culture of 4

life-long learning through regular reading of new clinical and scientific information. I believe that the Sports Physiotherapy Interest Group is showing great leadership in facilitating this process for its members. Maintaining high-quality clinical practice in sports physiotherapy mandates that clinicians be life-long learners. Accordingly it is my strong opinion that all clinicians should regularly read a minimum of 1 or 2 high-quality journals that are most relevant to their clinical practice. A systematic and regular process of reading selected articles from a few scientific journals provides over time not only an update on new knowledge but also a perspective on new ideas and evolving concepts in our field. Such a practice, however, should not replace the need to perform a more thorough and rigorous search of the literature when a specific clinical question arises. A regular consumer of research will, I believe, find great satisfaction in being an active witness to the growth of our knowledge and will also find the process of systematically searching the broader base of literature, when necessary, a much easier and non-threatening task. Clearly, while we should welcome the current exponential growth in knowledge related to sports physiotherapy, it is also quite reasonable to feel overwhelmed by the amount of new information. Therefore, the second topic I wish to address is do we need more information or do we need better quality information? Such a question is reasonable and may seem quite easy to answer. It would be hard to argue against a policy of promoting a lesser number of manuscripts with the intention of publishing only the highest quality papers: in other words, maximize the exposure of the very best information while minimizing the rest. In fact, that is what scientific journals try to accomplish through their review process. While this approach may seem reasonable and in fact necessary, it must be acknowledged that many lines of enquiries that eventually led to important discoveries started with Volume 3 Número 1


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seemingly mundane or simple observations or preliminary studies. But when shared through publication, these very studies may have provided impetus to pursue higher quality or more extensive research. So, a clear line of what constitutes “better quality” is difficult to define. Yet, for the clinicians interested in regularly accessing the literature, it is important that they be able to judge the scope and intent of the research being published. Most importantly, it is imperative that readers be able to recognize the quality of the various articles, a process that can be greatly facilitated if journals insist that authors dutifully present the weaknesses of their studies and how these weaknesses may impact their findings. The ability to read and understand research is very much like any clinical skills—it must be regularly practiced to improve. It must be pointed out that the quality of a publication should not be confused with the kind of publication. Many clinicians perceive randomized clinical trials as being higher quality publications than case reports, for example. While the findings of a randomized clinical trial may be ranked higher than those of a case report from the perspective of evidence-based practice, this classification is not automatically reflective of the quality of the manuscripts. It is possible to have very high

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quality case reports just as it is possible to have very poor quality randomized clinical trials. These two types of manuscripts serve different but equally important purposes for building a balanced literature. Clinicians may learn tremendously from a well-written case report that presents a diagnostic process or treatment approach for a patient with a rare condition for example. Conversely, a poor-quality randomized clinical trial, with several serious methodological flaws, may present results of questionable usefulness despite having a large number of patients in the study. “None of us is as smart as all of us,” a simple quote by Keith Blanchard which I have used before, speaks clearly to the role scientific journals can play in the development of a profession and each of its members. This role is to facilitate sharing new information among both clinicians and researchers, so that we can all benefit from new clinical observations and scientific discoveries. In today’s rapid growth in knowledge, all sports physiotherapists wishing to provide high-quality care should be taking advantage of the wisdom of “all of us” by accessing the information provided by scientific publications. Keeping up with the professional literature should no longer be considered an extra duty; it should be a regular part of our practice.

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ARTIGO ORIGINAL

Perfil e Padrões de Prática dos Fisioterapeutas no Futebol em Portugal – um Estudo Observacional João Costa1, Duarte Pereira2 Fisioterapeuta no Grupo Desportivo de Cerva, e no AguaHotels em Mondim de Basto1 Fisioterapeuta no Hospital de S. João- Porto. Mestre em Saúde Pública. Doutorando em Saúde Pública na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto2 Correspondência para: duartefisio@hotmail.com

Resumo Introdução/Relevância: A fisioterapia no desporto é a área de especialização da fisioterapia relacionada com prática desportiva e/ou actividade física, pressupondo modelos e normas de boas práticas. Objectivos: Os objectivos deste estudo foram identificar e caracterizar o perfil e padrões de prática dos fisioterapeutas a actuar no desporto, mais especificamente no futebol, em Portugal. Metodologia: O estudo foi realizado com uma amostra de 28 fisioterapeutas a exercer funções em equipas portuguesas de futebol. Foi utilizado um questionário auto-administrado, avaliando diferentes variáveis sócio-demográficas e informação relacionada com o perfil dos fisioterapeutas e padrões de prática da sua actividade no desporto. Resultados/Discussão: A amostra apresentava uma média de idades de 30,30±8,02 anos. A mediana do tempo de exercício como fisioterapeuta no desporto foi de 3,00±6,10 anos, com fisioterapeutas a exercer nos diferentes escalões da Federação Portuguesa de Futebol. Com a excepção de um fisioterapeuta, todos afirmaram exercer com total autonomia a sua actividade profissional; relativamente à sua actuação, 67,9% referiram efectuar acompanhamento longitudinal dos atletas, 72,4% actuar ao nível da prevenção; 85,7% efectuam avaliações sistemáticas, das quais 83,3% efectuam registos dessas mesmas avaliações. A formação específica e o vínculo laboral não parecem influenciar o perfil e os padrões de prática dos fisioterapeutas. Conclusões: Verificamos que o perfil e os padrões de prática dos fisioterapeutas desta amostra parecem ir de encontro com as guidelines estabelecidas pelo Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto. Serão necessários estudos com uma amostra maior para poderem ser realizadas inferências mais precisas acerca desta temática. Palavras-chave: Desporto, Futebol, Fisioterapeuta, Perfil, Padrões de Prática.

Abstract Introduction / Relevance: Sports Physiotherapy is the area of physiotherapy involved in prevention, treatment and rehabilitation of disorders and / or injuries resulting from sport and / or physical activity, that involves models and standards of good practices that ensure the quality of the intervention. Objectives: The purpose of this study was to identify and characterize the profile and practice standards of Portuguese sport physiotherapists, especially in football. Methodology: The study was conducted with physiotherapists sample that work in Portuguese football teams. Data collection was made using a self-reported questionnaire, where were evaluated different sociodemographic variables and information related to the profile of physiotherapists and practice standards. Results and Discussion: The sample consisted in 28 physiotherapists with an average age of 30.30 ± 8.02 years. The median number of practice years as a physiotherapist in sport was 3.00 ± 6.10 years. With the exception of a physiotherapist, all reported to work with complete autonomy. 67.9% reported making longitudinal monitoring of athletes, 72.4% act in sports prevention level, 85.7% systematic evaluations and of those, 83, 3% records of their assessments. We also note that the specific training and employment situation did not significantly influence the profile and practice standards of physiotherapists. Conclusions: The profile and practice standards of Portuguese sports physiotherapists seem to agree with the guidelines established by the Sports Physiotherapy Group of the Portuguese Association. Studies with a larger sample size will be needed for more accurate inferences about this issue. Keywords: Sports, Football, Physiotherapist, Profile, Practice Standards.

Introdução A fisioterapia, enquanto profissão autónoma e com um corpo de saberes específico, têm-se desenvolvido rapidamente ao longo dos anos, integrando progressivamente uma maior profundidade e amplitude de conhecimentos e de competências e, 6

consequentemente, uma necessidade de especialização nas diferentes áreas de intervenção (Bennett & Grant, 2004). A fisioterapia no desporto é a área da fisioterapia que intervém na prevenção, no tratamento e na reeducação de disfunções e/ou lesões resultantes da prática desportiva e/ou actividade física, desde os momentos iniciais até à completa reintegração Volume 3 Número 1


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desportiva dos praticantes (Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto - GIFD, 2000). O fisioterapeuta no desporto é um profissional com competências e skills específicos relacionados com a promoção da prática de exercício/actividade física, prevenção e tratamento, com o objectivo da melhoria da funcionalidade e performance dos indivíduos, tornando-se um elemento preponderante nas mais diferentes modalidades desportivas (Bulley & Donaghy, 2005). Nos dias de hoje, praticamente todas as federações portuguesas de modalidades amadoras ou profissionais, nomeadamente no futebol, contêm nas suas equipas técnicas, fisioterapeutas como elementos integrantes do corpo clínico (Oliveira, 1990; Richardson, 1997). O futebol é um dos desportos mais populares do mundo (Dvorak & Junge, 2000); possui uma dinâmica própria, dando origem a uma série de atitudes e comportamentos táctico-técnicos que o caracterizam como uma das modalidades com maior impacto social e económico (Teodorescu, 1984; Tumilty, 1993). As exigências físicas e psíquicas em termos de actividade profissional de um jogador de futebol têm aumentado ao longo dos tempos, resultando numa maior propensão para lesões (Reilly et al., 2000), razão pela qual cada vez é dada maior importância à presença de um fisioterapeuta junto das equipas (Donaghy & Gosling, 1999). A intervenção da fisioterapia no desportista com disfunções e/ou lesões deverá ter sempre em conta o contexto bio-psico-social do mesmo, de forma a contribuir para um óptimo desempenho desportivo, dentro das melhores condições de segurança, minimizando os riscos e simultaneamente contribuindo para a saúde e bem-estar global dos indivíduos (McGrath & Ozanne-Smith, 1997; GIFD, 2000). Podemos afirmar que, para além do tratamento directo das lesões músculo-esqueléticas decorrentes da prática do futebol, a prevenção de lesões é um aspecto fundamental para a maximização do rendimento desportivo (Horta, 1995; Silva, 2001). As exigências de actuação do fisioterapeuta aumentaram levando à necessidade de definir um padrão ideal de prática do fisioterapeuta nesta área de intervenção (Donaghy & Gosling, 1999). De igual forma urge a necessidade de desenvolvimento constante de skills e competências de intervenção dos fisioterapeutas no sentido de cada vez mais afirmar a sua posição no contexto desportivo nacional e internacional. A Federação Internacional de Fisioterapeutas no Desporto, identifica a necessidade de uma maior clareza em relação aos padrões de prática profissional, no sentido do reconhecimento público e profissional dos fisioterapeutas que actuam no desporto

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(International Federation of Sports Physiotherapy IFSP, 2000). Em Portugal, o GIFD, da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas, definiu um conjunto de padrões orientadores da prática profissional do fisioterapeuta no desporto, baseados na autonomia profissional, avaliação periódica dos atletas, prevenção das lesões, prestação de cuidados imediatos, diagnostico/avaliação, tratamento das lesões, investigação/formação, educação/aconselhamento para a saúde e registos sistemáticos de toda a sua actividade (GIFD, 2000). Os fisioterapeutas no desporto enquanto especialistas no seu campo de actuação devem procurar demonstrar competências e skills adequados no sentido de garantir elevados padrões de prática profissional (Sousa et al., 2007). Este estudo teve como objectivos identificar e descrever o perfil e os padrões de prática dos fisioterapeutas a actuar no desporto, mais especificamente no futebol. Metodologia O estudo realizado foi do tipo descritivo/ observacional. Decorreu entre Dezembro de 2006 e Setembro de 2007. Foram incluídos os fisioterapeutas a exercer funções em equipas de futebol das diferentes divisões da Federação Portuguesa de Futebol (3º divisão, 2ª divisão B, 2ª Liga e 1ª Liga), bem como nos diferentes escalões (iniciados, juvenis, juniores e seniores). Foram excluídos todos os indivíduos com habilitações não reconhecidas para o exercício da actividade profissional de fisioterapeuta (pela comprovação através da cédula profissional ou certificado de habilitações). Métodos de Recolha de Informação Tendo como base as guidelines do GIFD, da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas, foi elaborado um questionário, posteriormente auto-administrado. Foi realizado um pré-teste a cinco fisioterapeutas para testar a consistência das perguntas a incluir no questionário; foi também efectuada a revisão por dois fisioterapeutas a trabalhar em equipas de futebol. Após contacto telefónico prévio e identificação do(s) fisioterapeuta(s) de cada clube, os questionários foram entregues pessoalmente ou por correio e fax. O questionário procurou avaliar o perfil e os padrões de prática dos fisioterapeutas da amostra, incluindo a avaliação de variáveis sócio-demográficas (idade, sexo, estado civil, habilitações literárias) e outras variáveis dependentes que potencialmente influenciassem a actividade do fisioterapeuta no futebol (anos de actividade enquanto fisioterapeuta, anos de experiência em fisioterapia no desporto e no futebol, formação

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específica, vínculo contratual, composição de equipa multidisciplinar, divisão e escalão da equipa, autonomia e tipo de actividades desenvolvidas). Tratamento da Informação A análise dos dados feita através de tratamento estatístico utilizando o programa informático SPSS® versão 15.0. Para caracterizar a amostra foi utilizada a estatística descritiva, recorrendo às medidas de tendência central, de dispersão, às frequências e proporções. Foi de igual forma utilizada a estatística inferencial, com recurso ao teste não paramétrico para amostras independentes (Mann-Whitney test), com um nível de significância de 5%. Resultados Verificou-se uma taxa de participação de 72,5%, tendo sido entregues 40 e recebidos 28 questionários. A partir da estatística descritiva verificou-se que a maior parte dos inquiridos era do sexo masculino (92,9%). A média de idades foi de 30,30 ± 8,02 anos. Relativamente à profissão, a média de anos de exercício enquanto fisioterapeuta foi de 6,68 anos, tendo um máximo de 31 anos e um mínimo de 1 ano. No que respeita ao tempo de exercício no desporto, a mediana foi de 3,00 ± 6,10 anos, com um máximo de 30 anos e um mínimo de 1 ano. Neste estudo, relativamente a divisão de futebol, verificou-se que a divisão com maior número de fisioterapeutas é a 3ª divisão com 32,1% da totalidade da amostra, contrariamente à 1ª liga (14,3%). Nas restantes ligas nacionais intervêm, na 2ª liga, 28,6% e na 2ª divisão B, 32,1%. Salienta-se também que a intervenção dos fisioterapeutas se processa essencialmente ao nível do escalão sénior 64,3%. Em termos de vínculo laboral, observou-se que 20 dos

fisioterapeutas exercem a sua actividade no desporto em part-time e 8 como actividade a full-time; 8 exercem fisioterapia no desporto como actividade principal e 20 como actividade complementar. Relativamente à autonomia profissional apenas 1 fisioterapeuta respondeu negativamente; os restantes 27 afirmaram exercer com total autonomia a sua actividade profissional. Os fisioterapeutas identificam, no entanto, algumas limitações na sua actividade relacionada como falta de tempo (7,1%), excesso de carga de trabalho exigido (3,6%) e outras limitações (7,1%) sem no entanto as especificar. Analisando alguns aspectos específicos de actuação, no que diz respeito à forma como os fisioterapeutas efectuam a prevenção, a resposta predominante foi no sentido da conjugação de vários factores (57,1%); no entanto, a história clínica anterior e a avaliação prévia parecem ser os factores com maior influência na determinação do programa de prevenção sendo, no entanto, possível verificar que um número significativo de fisioterapeutas não actua ao nível da prevenção (28,6%) (tabela1). Questionados quanto ao acompanhamento longitudinal do atleta, a maior parte afir ma desempenhar essa função (67,9%). Também no que diz respeito à avaliação dos atletas, 24 fisioterapeutas afirmam efectuar avaliações sistemáticas (85,7%) e desses, 20 efectuam registos das avaliações e intervenções (83,3%). Em termos de composição da equipa clínica verificamos uma grande variabilidade (tabela 2), sendo que 35,7% dos fisioterapeutas referiram composições diferentes das apresentadas, sem no entanto as especificar.

Tabela 1: Natureza do programa individual de prenvenção Frequência (n)

Percentagem (% )

Não efectua prevenção

8

28,6

Prevenção de acordo com a sua história clínica/lesões anteriores

2

7,1

Prevenção de acordo com uma avaliação prévia

2

7,1

Prevenção de acordo com a conjugação de múltiplos factores

16

57,1

28

100

Total

8

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Em relação às habilitações literárias dos fisioterapeutas da amostra, 7 apresentavam como formação bacharelato, 18 licenciatura, 2 mestrado e 1 doutoramento. Do total da amostra 12 dos inquiridos referiram possuir formação específica em fisioterapia no desporto (3 formação graduada, 4 pós graduada e 5 ambas), essencialmente na vertente de tratamento músculo-esquelético (83,3%). Foi considerada como formação específica em desporto as área relacionadas com recuperação das lesões e reintegração na actividade, prevenção da lesão e epidemiologia, prestação de cuidados imediatos (urgência/emergência), diagnóstico/avaliação, ciências do desporto aplicadas à performance humana, considerações médicocirúrgicas e educação/aconselhamento para a saúde (GIFD, 2000). Para testar a hipótese de um eventual influência da formação específica, em fisioterapia no desporto, nos padrões de prática, foi utilizado o teste não paramétrico de Mann-Whitney, tendo sido possível constatar que não existiam diferenças estatisticamente significativas (á=0,005) entre fisioterapeutas com e sem formação específica no desporto, relativamente às variáveis relacionadas com os padrões de prática profissional, nomeadamente o tempo de profissão (p=0,837), tempo de exercício em fisioterapia no desporto (p=0,909), actividade parcial ou a tempo inteiro (p=0,100), actividade principal ou complementar (p=0,174), divisão onde actua a equipa (p=0,568), acompanhamento longitudinal dos atletas (p=0,241), avaliação dos atletas (p=0,280), registo em fisioterapia (p=0,802) e investigação em fisioterapia (p=0,537). Procuramos também perceber se o vínculo contratual estava relacionado com a divisão a que pertencia a equipa onde o fisioterapeuta exercia funções.

Relativamente a este aspecto também não se verificam relações estatisticamente significativas, em relação ao facto de exercer a sua actividade em part-time ou fulltime (p=0,165), nem no que diz respeito ao facto de se tratar de uma actividade principal ou complementar (p=0,105), utilizando o teste deMann-Whitney com um nível de confiança de 5%. Discussão O presente estudo teve como amostra 28 fisioterapeutas que exercem a sua actividade profissional nas diferentes divisões de futebol nacional. A verdade é que a amostra em estudo é reduzida o que coloca algumas questões em ter mos de qualidade da informação e inferências que dela se podem tirar. De qualquer forma, pelos resultados obtidos algumas ideias devem ser analisadas. Verificou-se que a amostra em estudo é na sua grande maioria do sexo masculino 92,9%, o que parece reflectir uma tendência também obser vada em outras modalidades (Bulley, 2005). Relativamente a situação profissional, grande parte dos fisioterapeutas desempenham a sua actividade enquanto fisioterapeuta no desporto em part-time ou como actividade complementar. Este facto poderá estar relacionado com questões ao nível da remuneração, condições de trabalho precárias e ao facto de algumas das equipas não serem totalmente profissionalizadas. Com a excepção de um fisioterapeuta, todos referem actuar com autonomia, mas identificam algumas limitações no trabalho como falta de tempo ou carga de trabalho exigido, entre outras limitações. Os resultados vão de encontro com a legislação em vigor, que concede autonomia ao fisioterapeuta para executar a sua intervenção com base num programa por ele

Tabela 2: Composição da equipa clínica Frequência (n)

Percentagem (% )

Fisioterapeuta

1

3,6

Fisioterapeuta, médico e enfermeiro

4

14,3

Fisioterapeuta, médico, enfermeiro e massagista

5

17,9

Fisioterapeuta e enfermeiro

1

3,6

Fisioterapeuta e massagista

2

7,1

Fisioterapeuta e médico

5

17,9

Outra composição não especificada

10

35,7

28

100

Total

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definido, sujeito aos seus próprios meios de avaliação e intervenção (Oliveira, 1990). Observa-se uma elevada heterogeneidade relativamente à composição da equipa clínica, sendo que 35,7% referiram composições diferentes das apresentadas, não tendo, no entanto, sido clarificada pelos fisioterapeutas a composição especifica da equipa clínica. Verifica-se que existe uma elevada percentagem de fisioterapeutas que referem efectuar o acompanhamento longitudinal dos atletas (67,9%), baseados em avaliações sistemáticas (85,7%). Os aspectos referidos anterior mente parecem ser fundamentais para a qualidade de intervenção do fisioterapeuta no desporto, quer ao nível da prevenção quer ao nível do tratamento do atleta, com a elaboração de um programa de intervenção direccionado para a fase/estádio da lesão em questão, tendo em conta os aspectos específicos do atleta (GIFD, 2000). Apesar disso, importa referir que 28,6% dos fisioterapeutas refere não efectuar prevenção. Este aspecto provavelmente poderá estar relacionado, com o facto de alguns fisioterapeutas no desporto, actuarem em part-time ou como actividade complementar e deste modo centrarem as suas funções no essencialmente ao nível do tratamento (Bulley & Donaghy, 2005). Relativamente à formação dos fisioterapeutas no desporto constata-se que uma grande percentagem de fisioterapeutas (89,3%) reconhece a necessidade de formação específica no desporto. De facto, as competências de intervenção são o primeiro passo para o reconhecimento profissional (Bulley, 2005). No entanto, através da análise dos resultados constatou-se que num total de 28 fisioterapeutas apenas 12 possuem formação específica no desporto. Por fim, através da estatística inferencial, verificamos que a formação específica em fisioterapia no desporto e a divisão onde a equipa se encontra, não parecem influenciar a actividade do fisioterapeuta. De qualquer forma, apesar destes resultados, parece-nos que estes aspectos poderão influenciar o perfil e os padrões de prática “reais” dos fisioterapeutas no desporto (International Federation of Sports Physiotherapy IFSP, 2000). Os fisioterapeutas que trabalham no desporto, mais especificamente no futebol, desenvolvem as suas funções ao nível individual e/ou de grupo, para a melhoria da performance desportiva, utilizando conhecimentos e skills específicos de intervenção (Donaghy & Gosling, 1999). Os resultados obtidos e apresentados neste estudo parecem ir de encontro com as principais Guidelines do GIFD/APF.

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Limitações do estudo As principais limitações deste estudo estão relacionadas com o baixo tamanho amostral, qualidade do instrumento de recolha de dados, bem como a sua forma de aplicação. Estudos com esta metodologia tendem para alguns viés de informação, relativamente a uma tendência de “resposta correcta”, o que pode ter contribuído para algum enviesamento dos resultados observados. Pensamos também que seria necessário um instrumento de avaliação mais pormenorizado que permitisse avaliar alguns aspectos e competências específicas do perfil e dos padrões de prática dos fisioterapeutas da amostra. No contexto da fisioterapia no desporto, a competência profissional eficaz pressupõe determinados comportamentos, conhecimentos, competências e atitudes, que estão directamente relacionados com o perfil e padrões de prática. Assim, os resultados deste estudo descrevem a realidade de um grupo específico de fisioterapeutas que actuam em equipas de futebol, tendo no entanto, permitido perceber que modelos e normas de boas práticas são fundamentais para garantir ao fisioterapeuta a qualidade da sua intervenção. Conclusão Um perfil e padrões de prática adequados podem ser usados para promover o reconhecimento profissional e, simultaneamente, mecanismos de garantia de qualidade da prestação de cuidados em fisioterapia no desporto. Poucos estudos existem acerca do perfil dos fisioterapeutas a actuar no desporto, o que dificultou a sustentação bibliográfica utilizada neste estudo. Assim, este estudo observacional, acabou por ter um carácter essencialmente exploratório. Mediante os resultados obtidos e face aos objectivos propostos, verificou-se que os fisioterapeutas desta amostra parecem actuar com autonomia no âmbito das competências que lhe são atribuídas, quer ao nível da avaliação periódica dos atletas, recuperação das lesões, prevenção das lesões, prestação de cuidados imediatos, diagnóstico/avaliação, investigação/ formação, educação/aconselhamento para a saúde e registos da sua intervenção. Assim, parece-nos que, o perfil e padrões de pratica dos fisioterapeutas desta amostra, vão de encontro com os padrões de prática estabelecidos pelo GIFD/APF. Eventualmente, (e apesar de se tratar de um “exercício” um pouco ousado), poderíamos estabelecer um perfil do fisioterapeuta no futebol em Portugal: fisioterapeuta

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do sexo masculino, com idade aproximada de 30 anos, solteiro, licenciado, com cerca de 3 anos de experiência profissional no desporto. Ao nível dos padrões de prática verificamos no entanto, alguns défices em termos de actuação ao nível da prevenção e de formação específica em fisioterapia no desporto. Sugerem-se futuros estudos com maiores tamanhos amostrais, ou com outras metodologias de recolha de dados, bem como a avaliação da intervenção noutras modalidades procurando compreender mais aprofundadamente alguns aspectos abordados neste estudo.

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ARTIGO ORIGINAL

Influência do Tipo de Cadeia Cinética no Sentido de Reposição Articular do Joelho Paulo Carvalho1, Paulo Ribeiro2 Fisioterapeuta. Mestre em Ciências da Fisioterapia. Assistente da Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto - Instituto Politécnico do Porto1. Fisioterapeuta. Prática Privada. Licenciado pela Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto – Instituto Politécnico do Porto2 Correspondência para: pcm@estsp.ipp.pt

Resumo Introdução: Ao analisarmos o corpo humano podemos esquematizar o movimento segundo o tipo de cadeia cinética (CC). Ao analisarmos a complexidade dos diferentes tipos de cadeias pensa-se que poderão estar activas variadas fontes proprioceptivas, influenciando a mesma. Objectivos: Verificar se existe influência do tipo de CC no sentido de reposição articular (SRA) do joelho; verificar a influência do género no SRA. Relevância: Em termos de reabilitação torna-se importante saber em que condições se encontram mais activas as vias proprioceptivas. Metodologia: Amostra de conveniência com 13 sujeitos do género masculino e 8 do feminino, com idades dos 18 aos 23. Cada sujeito realizou testes de reposição articular do joelho (45º de flexão) em cadeia cinética aberta (CCA) e cadeia cinética fechada (CCF). As amplitudes articulares foram recolhidas através do electrogoniómetro da Biometrics Lda. Recorreu-se ao SPSS 12.0 para Windows para efectuar o teste t paramétrico (á=0,05) para verificar a influência do tipo de CC no SRA e o teste não paramétrico de Mann-Whitney (á=0,05) para a influência do género no SRA. Resultados: O tipo de CC influencia o SRA, sendo a CCF mais eficaz (p=0,001); o género não influencia o SRA (68,5 > 60 e 83,5 > 60, ambos os valores de teste superior ao valor crítico). Discussão: Os resultados deste estudo estão de acordo com a literatura publicada nesta área. Conclusão: A CCF favorece o SRA podendo ser escolhida como meio de avaliação e tratamento sempre que se pretenda realizar exercícios de reprogramação sensório-motora, logo que não haja contra-indicações. Palavras-chave: Sentido de reposição articular, cadeia cinética, propriocepção, joelho. Abstract Introduction: Once we analyse the human body we can elaborate a scheme of the movement according to the type of kinetic chain (KC). When we process the complexity of the different types of chains we believe that various proprioceptive sources can be active, creating some influence on it. Objectives: To verify if there is any type of influence on the type of KC in the knee joint reposition sense (JRS); verify the influence of gender in the knee JRS. Relevance: In terms of rehabilitation it’s important to know in what conditions the proprioceptive ways become more active. Methods: Sample of convenience of 13 male subjects and 8 female, between the ages of 18 and 23. Each subject performed tests of knee joint reposition (45º of flexion) in open kinetic chain (OKC) and closed kinetic chain (CKC). The articular bounties were collected using the electrogoniometer from Biomedics Lda. We used SPSS 12.0 for Windows to perform the parametric t test (a=0,05) to verify the influence of the type of KC in the JRS and the non-parametric test Mann-Whitney (a=0,05) for the influence of gender in the JRS. Results: The type of KC does influence the knee JRS, being the CKC more effective (p=0,001); the gender doesn’t influence the knee JRS (68,5>60 and 83,5>60, both test values are superior to the critical value). Discussion: The results of this study are sustained by the literature published. Conclusion: The CKC facilitates the knee JRS, making it a choice as a means of evaluation and treatment whenever we want to perform exercises of sensory-motor reprogramming, and if there isn’t any inconvenience. Key words: joint reposition sense, kinetic chain, proprioception, knee.

Introdução O corpo humano, sendo uma unidade dinâmica, necessita constantemente de conhecer todas as alterações que ocorrem no sistema músculo-esquelético e outros tecidos como a pele. Para tal, recorre a um sistema de aferências capazes de detectar, codificar e 12

enviar essa informação ao sistema nervoso central para que este possa iniciar uma resposta adequada às alterações verificadas (Massion 1998; Barret 2003; Stillman 2000; Hamil & Knutzen 1999). Ao nível do sistema músculo-esquelético, esses sensores neurológicos são designados por proprioceptores (Massion, 1998). Este sentido de propriocepção existe Volume 3 Número 1


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graças à presença de terminações nervosas sensitivas específicas, podendo ser divididas em quatro grupos: mecano-receptores cutâneos, mecano-receptores musculares, mecano-receptores articulares e mecanoreceptores em outros tecidos (Stuart, Ira, Fox, 2002). Todos estes receptores desempenham, em simultâneo, a função de detectar todas as variações mecânicas e de enviar a informação recolhida ao sistema nervoso central (Massion 1998; Barret 2003; Stuart, et al 2002). Para além dos proprioceptores, o aparelho vestibular e o sistema visual também fornecem importantes informações somato-sensoriais (Asthon-Miller, Wojtys, Huston, Fry-Welch 2001; Barret 2003; Clapp & Wing 1999; Hamil & Kutzen 1999; Larue, Bard, Fleury, Teasdale, Paillard 1993; McDonnell & Warden-Flood 2000; O´Sulivan & Schimitz 1993; Perry, Santos, Palta 2001). Pode-se dizer, portanto, que a propriocepção é responsável pelo envio constante de informação sobre eventuais deslocamentos de segmentos no espaço auxiliando-nos nas diversas tarefas motoras (Barret 2003; Taylor, Marshall, Dunlap, Gable, Sizer 1998; McCloskley, Cross, Honner, Potter 1983). Voltando aos aspectos dinâmicos do corpo humano, os movimentos dos segmentos corporais podem ser descritos utilizando certas terminologias da engenharia. Segundo Norkin & Levange, (1992) se analisarmos o membro inferior de um ponto de vista mecânico podese observar que este é constituído por segmentos ligados entre si por meio de articulações, designandose este tipo de sistema por cadeia cinética (CC). As CC podem ter várias designações, como aberta (CCA), fechada (CCF) ou mesmo semi-fechada. No caso da CCA, a extremidade distal do segmento encontra-se livre ao passo que em CCF isto não acontece (para o membro inferior, a extremidade distal corresponde ao pé) (Génot, Neiger, Leroy, Dufom, Pénimou 1989; Palmitier, Kai-Nan, Scott, Chao 1991). A aplicação deste conceito tem importância pois fornece dados sobre a previsibilidade ou variabilidade do movimento presente na cadeia (Taylor et at, 1998; Norkin & Levange, 1992). Se analisarmos o membro inferior, em termos funcionais, este é responsável pela manutenção da posição bípede e pela marcha. Quanto à posição bípede, esta é em CCF e a marcha corresponde a uma sequência cíclica de alternância entre CCA e CCF (Norkin & Levange 1992; Génot, et al 1989). Analisando concretamente o tipo de CC, verifica-se o envolvimento de diversas articulações em diferentes tipos de CC (Norkin & Levange, 1992; Génot et al, 1989). No caso da CCA, a flexão do joelho pode ocorrer sem que se verifique movimento nas restantes articulações. No entanto, em CCF um movimento no joelho implica alterações nas articulações acima e abaixo

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deste (Norkin & Levange, 1992; Génot, et al 1989; Stillman & McMeeken, 2001). Perante a complexidade do tipo de CC, pensa-se que diferentes fontes proprioceptivas poderão estar activas (Taylor, et al 1998; Stillman & McMeeken 2001). No entanto, sendo a proprioceptividade uma área complexa, muitos autores estudam-na cingindo-se ao sentido de reposição articular (SRA), que consiste na reposição da posição de um segmento para uma determinada amplitude previamente memorizada (Lonn, Crenshaw, Djupsjobacka, Pedersen, Johansson 2000; Taylor, et al 1998; Stillman & McMeeken 2001; Stuart 1996). Para Taylor, et al (1998) o SRA é importante na realização de inúmeras tarefas. E, por outro lado, essas tarefas realizam-se em diferentes tipos de CC. Na prática desportiva, diversos gestos são efectuados nos diferentes tipos de CC. Assim, o estudo da influência do tipo de CC no SRA torna-se pertinente para a prática clínica do fisioterapeuta no desporto: se uma das CC influenciar mais o SRA do que outra, poderse-á optar pela que tem melhores resultados na realização de exercícios de reprogramação sensóriomotora. Com isto, o objectivo principal do estudo foi verificar se o tipo de CC influenciou o SRA do joelho. Como objectivo secundário pretendeu-se averiguar se o género, no presente estudo, influenciou o SRA. Métodos Tipo de estudo O presente estudo seguiu uma metodologia observacional analítica transversal. Amostra A amostra foi constituída por 21 indivíduos, 8 do género feminino e 13 do masculino, com idades dos 18 aos 23 anos (21,05±1,20), todos alunos da Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto. Nenhum indivíduo tinha lesões músculo-esqueléticas nos membros inferiores e tronco, não referenciaram dor no joelho, nem problemas neurológicos, doenças articulares degenerativas e não eram atletas de alta competição ou treinavam mais de 7 horas por semana (Barret, Cobb, Bentley 1991; Birmingham, et al 1998; Bullock-Saxton, Wong, Hogan 2001; Gilsing, et al 1995; Hurley, Scott, Rees, Newham 1997; Jerosh, Prymka, Castro 1996; Palmitier, et al 1991; Stillman 2000; Stillman & McMeeken 2001).

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Instrumentos e materiais O único instrumento utilizado neste estudo foi o electrogoniómetro Penny and Gilles, com eléctrodos Xm 180 (Penny and Gilles – Biometrics Ltd, Blackwood Ltd, London UK), com uma precisão de 0,5º (Bartlett & Warren, 2002). Como materiais utilizaram-se ligadura adesiva não elástica de 3,8cm, vulgarmente conhecida por tape (Cramer®) e uma venda para os olhos. Procedimentos Os procedimentos deste estudo dividem-se em dois momentos, um momento em CCA e outro momento em CCF, sendo cada um efectuado em todos os sujeitos. Antes da execução dos procedimentos, foram explicados sucintamente todos os passos a seguir e esclarecidas quaisquer dúvidas que pudessem vir a interferir no estudo. Também foi dado a assinar o consentimento informado a todos os sujeitos após explicação prévia do estudo.

Procedimento em cadeia cinética aberta O primeiro passo foi colocar o sensor do electrogoniómetro na face lateral do joelho direito em todos os sujeitos, em posição ortostática, segundo as referências para goniometria do joelho de Epler & Palmer, (1998). Assim, o eixo foi colocado ao nível do epicôndilo lateral do fémur, um dos braços numa linha que une o epicôndilo lateral ao grande trocânter e o outro, numa linha que vai do epicôndilo lateral em direcção ao maléolo peronial. O electrogoniómetro foi fixo ao membro inferior através de pequenas tiras do tape. Nessa mesma posição (extensão máxima do joelho direito), calibrou-se o electrogoniómetro para os 0º (ver figura 1 a)). Após a colocação do electrogoniómetro, pediu-se ao sujeito para que se sentasse na marquesa, previamente

elevada de modo a que os pés do sujeito não tocassem no solo. O sujeito foi instruído para manter as costas erectas e os braços em extensão com as mãos apoiadas no tampo da marquesa numa posição ligeiramente posterior às costas (Stillman & McMeeken, 2001). Seguidamente, foram vendados os olhos do sujeito para que a reposição articular não fosse influenciada pela visão (Stillman & McMeeken 2001; BullockSaxton, et al 2001; Beers, Wolpert, Haggard 2002). Terminando a preparação, pediu-se ao sujeito para fazer extensão do joelho direito activamente (posição de partida do teste; ver figura 1 ao centro). Seguidamente, pediu-se para fazer flexão activa do joelho direito a 45º (amplitude alvo; ver figura 1 à direita), manter essa posição durante 3 segundos e informar o sujeito que é essa a posição que se pretende que reproduza. Por fim, pediu-se ao sujeito para regressar à posição inicial (movimento activo). Pediu-se então que o sujeito voltasse aos 45º de flexão do joelho direito activamente e que quando achasse que tinha alcançada a posição, o referisse dizendo “OK”. Assim que o dissesse, registava-se o valor e o paciente voltava à extensão activamente. Este procedimento foi repetido mais duas vezes, registando em cada repetição o valor alcançado pelo sujeito, num total de três registos.

Procedimento em cadeia cinética fechada Depois de realizar os procedimentos em CCA, retirouse a venda dos olhos do sujeito e pediu-se que se levantasse. Seguidamente, elevou-se a marquesa até cerca de metade da altura do tronco do sujeito. Para este procedimento, a marquesa serviu de ligeiro ponto de apoio para as mãos para que o sujeito se equilibrasse durante a realização do procedimento em CCF (Stillman & McMeeken, 2001). Foi pedido aos sujeitos que

Figura 1 – colocação e calibração do electrogoniómetro. (a), posição de partida em CCA (b) e amplitude alvo em CCA (c).

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mantivessem as costas erectas durante a realização dos testes. Com o sujeito em posição ortostática (posição de partida; ver figura 2 a)) vendaram-se novamente os seus olhos. Depois pediu-se para que ficasse em apoio unipodal sobre a perna direita. Nessa posição, o sujeito teve que fazer flexão do joelho direito, mantendo o apoio unipodal, até o mandar parar na amplitude articular de 45º de flexão do joelho (amplitude alvo; ver figura 2 b)). Pediu-se para manter essa posição durante 3

segundos e, seguidamente, regressar a posição inicial (movimentos activos). Pediu-se então que o sujeito voltasse aos 45º de flexão do joelho direito activamente e que quando achasse que tinha alcançada a posição, o referisse dizendo “OK”. Assim que o dissesse, registava-se o valor e o paciente voltava à extensão activamente. Este procedimento foi repetido mais duas vezes, registando em cada repetição o valor alcançado pelo sujeito, num total de três registos.

Figura 2 – posição de partida para o procedimento em CCF (a) e amplitude alvo para CCF (b)

Após a aprendizagem da amplitude alvo pretendida, pediu-se ao sujeito que reproduzisse a amplitude articular três vezes, sendo registado o valor reproduzido nas três tentativas, tal como em CCA. Estatística Recorreu-se ao SPSS, versão 12.0 para Windows. Com os valores obtidos nas três medições, efectuouse o cálculo da média destas para CCA e CCF, para cada sujeito, obtendo-se um valor médio. Depois subtraiu-se cada valor médio pela amplitude alvo (45º), para se obter, desta forma, o erro relativo (ER). Todos as medidas de tendência central e de dispersão como os testes estatísticos foram realizados recorrendo ao ER. Para efectuar a caracterização da amostra, utilizou-se estatística descritiva, determinando medidas de tendência central e de dispersão, ou seja, média e desvio padrão, respectivamente. Efectuou-se o teste de Shapiro-Wilk para verificar a normalidade da amostra dos valores obtidos em CCA e CCF. Para verificar a influência do tipo de cadeia cinética na capacidade de

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reposição articular efectuou-se o teste t paramétrico para amostras emparelhadas uma vez que a amostra seguia uma distribuição normal. Atendendo ao facto da amostra ter indivíduos de géneros diferentes com número amostral diferente (13 masculino e 8 feminino) efectuou-se o teste não paramétrico de Mann-Whitney para verificar se existiam diferenças significativas entre os géneros segundo o tipo de cadeia cinética. Para todos os testes usou-se um nível de significância (á) igual a 0,05. Resultados Para analisar os valores dos erros relativos (ER’s) obtidos nos testes, para CCA e CCF esquematizou-se os resultados no gráfico 1. Verifica-se que a média em CCF (-0,03) aproxima-se mais do valor 0 do que a média em CCA (-6,52), ou seja, que o valor médio em CCF está mais próximo da amplitude alvo pretendida. Quanto aos desvios padrões têm ambos valores próximos (±4,44 e ±4,07 para CCF e CCA respectivamente).

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Gráfico 1 – gráfico com os valores das médias, desvios padrão, mínimos e máximos para CCA e CCF (geral).

Após uma análise de estatística inferencial, recorrendo ao teste t para amostras emparelhadas, com um nível de significância á=0,05 , obteve-se um valor prova de 0,001 (p=0,001), o que nos permitiu rejeitar a hipótese nula. Pode-se assumir, para esta amostra, que os valores obtidos em CCA são significativamente diferentes dos obtidos em CCF. Existindo diferenças significativas, através das medidas de tendência central, (média) pôde-se constatar que a CCF permite efectuar reposições articulares com menos erro, já que o valor absoluto do erro relativo se encontra mais próximo do valor 0. Por outro lado, atendendo ao objectivo secundário, organizaram-se os dados num segundo gráfico (gráfico 2). Os dados ficaram agrupados segundo o género e o tipo de CC. Pôde-se então verificar que o género

masculino obteve valores de -5,34 e 0,13 para CCA e CCF respectivamente e que o género feminino obteve valores de -8,37 (CCA) e 0,30 (CCF), ou seja, o género feminino esteve sempre mais afastado da amplitude alvo do que o masculino, para as respectivas CC. Outro aspecto a reter é o facto dos valores em CCF continuarem a estarem mais próximos do zero do que os valores em CCA (segundo o género). No que respeita ao objectivo secundário, recorreu-se ao teste não paramétrico de Mann-Whitney (amostras independentes). Obtiveram-se os valores de 68,5 para CCA e 83,5 para CCF. Ambos os valores são superiores ao valor crítico igual a 60 (para á=0,05 e níveis 13 e 8). Isto não nos permite rejeitar a hipótese nula, logo, nesta amostra, não foram encontradas diferenças significativas entre os géneros para cada tipo de CC.

Gráfico 2 – gráfico com os valores das médias, desvios padrão, mínimos e máximos para CCA e CCF, segundo o género.

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Discussão Com os resultados obtidos pôde-se verificar que o recurso à cadeia cinética fechada diminui os erros de reposição articular favorecendo o sentido de reposição articular. Stillman & McMeeken, (2001) e Birmingham, et al (1998) afirmam igualmente nos seus estudos que a CCF permite obter valores com menos desvios do que a CCA. No entanto, Taylor, et al (1998) não encontraram diferenças significativas no seu estudo. Estas discrepâncias podem dever-se a diferenças entre metodologias utilizadas nos diferentes estudos. No estudo de Taylor e colaboradores, a abordagem à CCF é diferente dos outros dois estudos. Nesse estudo, não foi usada uma posição ortostática com apoio unipodal mas sim um plano deslizante, com uma inclinação em que os sujeitos ficavam semi-deitados. Por outro lado, a selecção da amostra consistiu na elaboração de dois grupos, um para os procedimentos em CCA e outro para CCF. Quanto ao plano, este elimina em grande parte a informação do aparelho vestibular que segundo Lackner & Dizio, (1992), é uma importante fonte de informação proprioceptiva que se encontra no máximo em posição ortostática. Por outro lado, devido à inclinação do plano, a força aplicada na superfície plantar do pé é inferior à força imposta em posição ortostática, o que poderá ter diminuído a activação das terminações sensitivas dessa região (McDonnel & Warden-Flood, 2000). Em contra-partida, os estudos de Stillman, et al 2001, e Birmingham, et al 1998, já recorreram à posição ortostática, o que aumenta a informação proveniente do pé e do aparelho vestibular. Por outro lado, o apoio ligeiro das mãos num plano poderá levar a essas diferenças pois, segundo Clapp & Wing, (1999), um ligeiro contacto com o indicador aumenta as aferências proprioceptivas. Deste modo, no presente estudo, a posição ortostática, devido a carga do pé apoiado no solo (McDonnel & Warden-Flood, 2000), o apoio na marquesa (Clapp & Wing, 1999) e toda a informação proveniente do aparelho vestibular (Lackner & Dizio, 1992) teve influência na quantidade de informação proprioceptiva recebida em CCF, quando comparada com a CCA. Outro aspecto a ter em conta é a existência de uma maior actividade agonista-antagonista em CCF, denunciando uma elevada actividade dos fusos neuromusculares (Palmitier, et al 1991; Jerosh, et al 1996; Stuat 1996; Weiler & Awiszus 2001). Este acontecimento representa uma importante fonte de informação

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propriocetiva o que pode explicar a diferença obtida entre os dois tipos de CC. Perante todos estes trabalhos, o ponto de discussão poderá estar na abordagem às cadeias cinéticas, que consequentemente poderão levar a diferentes resultados. Será, por esse motivo, difícil o isolamento de todas as variáveis externas à capacidade de reposição articular do joelho, nomeadamente em CCF devido à complexidade dessa cadeia por envolver diferentes componentes, tanto articulares, no joelho e outras articulações, como o aparelho vestibular e todas as aferências cutâneas em diferentes partes do corpo. Ainda em relação ao presente estudo, existem algumas limitações que poderão ser alvo de futuros estudos. Em todos os testes a reposição articular do joelho foi feita de for ma excêntrica para uniformizar o movimento. Mas, em CCA, o movimento poderia ter sido feito igualmente com contracção concêntrica do quadricípite, podendo-se obter resultados diferentes. Por outro lado, a amplitude alvo foi memorizada com movimento activo. A própria amplitude alvo de 45º não foi comparada com outras (como 30º e 60º, por exemplo) o que poderia levar a resultados diferentes. Este aspecto poderá ter influenciado a capacidade de reposição articular. Por seu lado, o número de repetições dos testes (3 no presente estudo) poderia ter sido diferente. Ao aumentar o número de repetições poderiam ocorrer variações nos resultados verificados. Por estes motivos, para seguimento deste estudo, poderiam ser estudados aspectos relacionados com a metodologia, como o tipo de contracção muscular, a amplitude alvo e o número de repetições. Quanto à influência do género na propriocepção, os resultados obtidos estão de acordo com estudos como o de Jerosh, et al (1996). Com esta conclusão pode-se afirmar que a variável género não influenciou os valores obtidos para os dois tipos de cadeia cinética, não introduzindo, por isso, nenhum erro no estudo. Conclusão Assim, atendendo à metodologia utilizada neste trabalho, o tipo de CC influencia o sentido de reposição articular do joelho, sendo a CCF a que apresenta melhores resultados. Para a Fisioterapia no desporto estes resultados podem ser importantes na medida em que no desporto ocorrem lesões nos joelhos com bastante frequência. Assim, na abordagem terapêutica do joelho, o uso de CCF poderá obter melhores resultados na realização de exercícios de reprogramação sensório-motora, caso

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a patologia ou estado de evolução da mesma permita carga no membro inferior. Resta referir que a extrapolação dos resultados para a prática da Fisioterapia apenas pode ser feita para exercícios semelhantes aos descritos na metodologia deste estudo e para o joelho. Por este motivo, a generalização para outras articulações ou segmentos articulares e até mesmo diferentes tipos de exercícios para o joelho, não deverá ser feita já que diferentes articulações poderão ter comportamentos diferentes e que a variação nos exercícios podem levar a diferentes resultados. Assim, será pertinente a realização de outros estudos para verificar a influência dos diferentes tipos de CC em diversas articulações.

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ARTIGO ORIGINAL

O Efeito do Tape Patelar ao Nível da Diminuição da Dor e da Actividade Muscular do Vasto Interno Obliquo e do Vasto Externo em Sujeitos com SÌndrome Patelo-Femural – Revisão Sistemática Marco Jardim1 Fisioterapeuta. Assistente na Escola Superior de Saúde- Instituto Politécnico de Setúbal1 Correspondência para: marco.jardim@ess.ips.pt

Resumo

Introdução: Os Síndromes Patelo-Femurais são uma condição clínica caracterizada pela presença de dor e alterações ao nível da actividade muscular entre o VIO e o VE. É amplamente reconhecido que o tape patelar é uma das estratégias mais utilizadas e aceites na intervenção em utentes com esta condição. No entanto, os seus resultados ao nível da dor e da actividade muscular parecem não ser consensuais e apontam para uma evidência conflituosa e pouco consistente. Objectivo: Análise crítica da literatura para determinar os efeitos do tape patelar ao nível da intensidade da dor e da actividade muscular em sujeitos com SPF. Metodologia: Recorreu-se a trÍs bases de dados electrónicas de referência para pesquisa de Randomized Controled Trials e Controled Trials publicados em língua inglesa entre 2003 e 2008. Resultados e Discusção: Da pesquisa realizada apenas 6 estudos cumpriram os critérios de inclus„o. Dois avaliadores procederam de forma independente à análise da qualidade metodológica dos estudos, através da escala PEDro. Apesar da baixa qualidade metodológica dos estudos, a maioria apresenta resultados positivos do efeito do tape patelar na diminuição da dor e nos tempos de recrutamento muscular, sem apresentar resultados significativos ao nÌvel da intensidade da contracção muscular. Conclusões: Através da nossa análise, os mecanismos fisiológicos dos efeitos do tape patelar continuam a ser pouco claros. No entanto, parece-nos que os seus resultados ao nível da dor e da actividade muscular re·nem informações importantes para a prática clínica dos fisioterapeutas. Palavras-Chave: Sindromes Patelo-Femurais; Revis„o Sistem·tica; Taping; Efectividade Abstract

Introduction: Patellofemoral Pain Syndromes (PFPS) are a clinical condition characterized by the presence of pain and changes of muscle activity between the VIO and VE. It is widely recognized that the patellar taping is one of the most used and accepted intervention strategies for patients with PFPS. However, the results on pain and muscular activity not appear to be consensual and evidence seems to be contentious and somewhat consistent. Objective: Critical analysis of the literature to determine the effects of patellar tape on pain and muscle activity in subjects with PFPS. Methodology: Three electronic databases were used to search for Randomized Controlled Trials and Controlled Trials published in English language between 2003 and 2008. Results and Discussion: The survey conducted only 6 studies met the inclusion criteria. The methodological quality of these studies was analysed independently by two reviewers using the PEDro scale. Despite the low methodological quality of studies, most of them present positive effects of the patellar taping regarding pain reduction and muscular onset, but without providing significant results in muscle intensity contraction. Conclusions: Through our analysis, the physiological mechanisms of the patellar taping are still unclear. However, it seems that their results on pain and muscle activity gather relevant information for the physiotherapist’s clinical practice. Key-Words: Patellofemoral Syndromes; Systematic review; Taping; Effectiveness

Introdução O Sindrome Patelo-Femural (SPF) é uma das condições mais frequentes na prática clínica dos fisioterapeutas (Tobin & Robinson, 2000) e considerados como a

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disfunção mais comum ao nível do joelho (Fagan & Delahunt, 2008). A sua incidência varia entre os 10% na população em geral e os 28% em indivíduos fisicamente activos (McConnell, 1986; Witvrouw, 2000). A sua prevalência abrange um vasto número de

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indivíduos com idades compreendidas entre os 10 e os 35 anos e ocorre 2 a 3 vezes mais nas mulheres do que nos homens (Lichota, 2003 citado por Ng, Zhang & Li, 2008). Apesar da sua elevada incidência e prevalência, não existe uma evidência consistente quer ao nível da terminologia, da sua origem ou da intervenção. Em 1906, Bundiger assumiu que qualquer sintoma relacionado com a articulação patelo-femural deveria ser encarado como um problema articular degenerativo e durante quase meio século a Condromalácia Patelar prevaleceu como sinónimo de SPF (Thomee, Augustsson, & Karlsson, 1999). No entanto, nas últimas duas décadas, vários estudos imagiológicos encontraram uma fraca relação entre alterações degenerativas da cartilagem posterior da patela (condromalácia patelar) com os mecanismos de dor retropatelares (Lindberg, Lysholm, & Gillquist, 1986; Tria, Palumbo, & Alicea, 1992). Nesse mesmo contexto, vários autores consideraram que o termo Dor Anterior do Joelho era desadequado, demasiado generalista e que dificilmente excluía outras condições clínicas, como a tendinopatia patelar, Sinding-Larsen, OsgoodSchlatter ou até mesmo as bursites supra e infra patelares (Reid, 1993; Thomeé, 1997). De acordo com as considerações anteriores Thomeé et al, (1999) sugerem que os SPF devem de ser reconhecidos como um conjunto de sinais e sintomas relacionados entre si, com base nas alterações entre a tróclea femural e a patela, sem sinais de patologia degenerativa intraarticular. Estes autores sustentam estas afirmações através de três importantes factores biomecânicos: as Forças de Reacção Patelo-Femurais (Steinkamp, Dillingham, Markel, Hill, & Kaufman, 1993), as Áreas de Contacto (Besier, Draper, Gold, Beaupre, & Delp, 2005; Csintalan, Schulz, Woo, McMahon, & Lee, 2002; Huberti & Hayes, 1984; Kersh & Lynn Ploeg, 2005; Powers, Lilley, & Lee, 1998; Salsich, Brechter, & Powers, 2001) e o Stress Articular (Grelsamer & Klein, 1998; Steinkamp, et al., 1993; Wallace, Salem, Salinas, & Powers, 2002). Clinicamente, caracterizam-se por dores com início gradual e de localização difusa na face anterior do joelho, quase sempre associadas a actividades que promovem o aumento das FRPF: o subir e descer escadas, o subir planos inclinados, os agachamentos, a corrida ou os longos períodos na posição de sentado (Crossley, Bennell, Green, Cowan, & McConnell, 2002; McConnell, 1986; Ng & Cheng, 2002; Nissen, Cullen, Hewett, & Noyes, 1998; Watson, Propps, Galt, Redding, & Dobbs, 1999). A actual evidência também ainda não se apresenta conclusiva quanto à sua origem,

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no entanto, a maioria dos autores afirmam que são de natureza multifactorial, resultando de alterações da cinemática e do stifeness e equilíbrio muscular do membro inferior (Fitzgerald & McClure, 1995; McConnell, 2002; Powers, Mortenson, Nishimoto, & Simon, 1999; Wilk, Davies, Mangine, & Malone, 1998; Witvrouw, 2000). Em situações dinâmicas, o aumento do Ângulo Q (Doucette, 1992; Schulthles, Francis, Ficher, & Van De Graaff, 1995) a rotação interna do fémur, a rotação externa da tíbia (Lee, Morris, & Csintalan, 2003) e a pronação excessiva do pé (Eng & Pierrynowski, 1993; McConnell, 1996) parecem ser factores determinantes no aumento do vector valgo da patela entre os 0 e os 30º de flexão do joelho. A diminuição da flexibilidade relativa do psoas-íliaco, recto anterior, tensor da fascia lata e banda ílio-tibial (incluindo o retináculo externo) (Puniello, 1993; Winslow & Yoder, 1995), assim como, as alterações da actividade muscular do médio glúteo (fibras posteriores) (McConnell, 2002), vasto externo (VE) e vasto interno oblíquo (VIO) (McConnell, 1986, 2002, 2007) também parecem contribuir para as alterações da dinâmica e posicionamento da patela dentro da tróclea femoral. Independentemente do sentido da (possível) relação entre todos estes factores e qual a sua preponderância, alguns autores defendem que as principais causas dos SPF traduzem-se nas alterações da coordenação/ equilíbrio muscular entre o VIO/VE (Fulkerson, 2002; McConnell, 1986) e no encurtamento das estruturas laterais – banda ilio-tibial e retináculo externo (Garth, 2001; Puniello, 1993). Os autores justificam esta teoria devido ao papel determinante que o VIO e as estruturas tecidulares têm no controlo das áreas de contacto e consequentemente na distribuição do stress articular ao longo trajecto da patela dentro da tróclea femural (Bose, Kanagasuntheram, & Osman, 1980; Goh, Lee, & Bose, 1995) Apesar destas afirmações as opiniões têm sido divergentes, existindo estudos que apontam para uma relação das alterações da intensidade e do recrutamento muscular do VIO e do VE em sujeitos com os SPF (Cowan, Bennell, Hodges, Crossley, & McConnell, 2001; Souza & Gross, 1991; Voight & Wieider, 1991) e outros não (Karst & Willett, 1995; Laprade, Culham, & Brouwer, 1998; Powers, 2000; Sheehy, 1998). Devido à sua natureza multifactorial, muitas têm sido as propostas de intervenção em fisioterapia para esta condição clínica. No entanto, reconhece-se que uma das estratégias mais utilizadas e aceites pela comunidade clínica seja o tape patelar descrito por Jenny McConnell

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(Herrington, 2002; Herrington & Payton, 1997). De acordo com a autora, os objectivos da aplicação do tape baseiam-se em dois pontos essenciais: 1) na correcção da patela dentro da tróclea femural, promovendo um aumento das áreas de contacto e diminuindo o stress articular, resultando numa diminuição da intensidade da dor e 2) facilitar a actividade (intensidade e recrutamento) do VIO através da sua influência na relação comprimento-tensão do tecido muscular. Ao longo dos anos estes pressupostos tem suscitado um enorme interesse por parte da comunidade científica. Muitos são os estudos que têm procurado justificar o sucesso clínico da aplicação do tape patelar ao nível da diminuição da dor e das alterações da actividade muscular do VIO e do VE. Contudo os resultados existentes parecem não ser consensuais e apontam para um corpo de evidência conflituosa e pouco consistente. Neste contexto, através de uma revisão sistemática, pretendemos responder à seguinte questão – Qual a efectividade do tape patelar ao nível da diminuição da intensidade da dor e da actividade muscular do VIO e do VE em sujeitos com Síndrome Patelo-Femural?

Critérios de Selecção A selecção dos estudos dividiu-se em duas fases distintas. Numa primeira fase seleccionaram-se os estudos tendo em conta o idioma (só os publicados em língua inglesa), o tipo e data de publicação, recorrendo à leitura do título e do resumo do estudo. Numa segunda fase, com recurso à consulta do título, do resumo e se necessário ao texto integral, excluíramse os estudos que não abordavam a aplicação do tape patelar na articulação patelo-femural e que não tinham na amostra sujeitos sintomáticos. Dos restantes, foram eliminados todos os estudos que não tinham como variáveis dependentes a dor e/ou a actividade muscular do VIO e VE e todos os que não eram RCTs. Avaliação da Qualidade Metodológica Após a selecção dos estudos, procedeu-se à avaliação da qualidade metodológica dos mesmos. Além do autor, um elemento independente reviu os critérios de selecção e avaliou a qualidade metodológica recorrendo à escala PEDro. No final, ambos compararam e analisaram aos itens divergentes e chegaram a uma versão final de consenso (Tabela 1).

Metodologia Resultados Estratégia de Pesquisa A estratégia de pesquisa incidiu em literatura de língua inglesa publicada nos últimos cinco anos (2003 – 2008) com recurso a três bases de dados electrónicas de referência: PubMed (MEDLINE), Web of Science (Web of Knowledge); AMED (Allied and Complementary Medicine Database – OVID Technologies). Os termos utilizados foram [ patellofemoral pain syndrome; patellofemoral pain; patellofemoral syndrome, anterior knee pain syndrome, patellar taping, patella taping, taping e McConnell taping ]. Os resultados entre a combinação dos termos utilizados foram posteriormente importados para um software de gestão de referências bibliográficas – End Note X1Ò (Thomson Scientificä, Philadelphia, EUA).

Estratégia e Resultados da Pesquisa Através da expressão inicialmente definida iniciou-se a pesquisa através dos motores de busca. Dos três recursos utilizados, a Web of Science devolveu o maior número de resultados (n=27), seguida da PubMed (n=23) e a AMED (n=18). No total foram recolhidos 68 resultados. No processo de eliminação de duplicados, no total eliminaram-se 31 registos bibliográficos (45,6%), 22 (32,3%) por eliminação automática e 9 (13,2%) por eliminação manual1. De acordo com os critérios de selecção definidos para a 1ª fase, foi eliminado o registo de um artigo não publicado na íntegra em periódicos com revisão por

Tabela 1 – Resultados da Avaliação da Qualidade Metodológica Estudos

Wilson, et al (2003) Whittingham, et al (2004) Christou, (2004) Cowan et al (2006) Keet, et al (2007) Aminaka & Gribble (2008)

Critérios da Escala PEDro 1

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Total

1 1 1 0 1 1

1 1 1 1 1 1

0 1 0 0 0 0

0 1 0 0 0 0

1 1 0 0 1 0

0 0 0 0 0 0

1 1 0 1 1 0

0 1 1 0 0 0

0 1 0 0 0 0

1 1 1 1 1 1

0 0 1 0 0 1

4/10 8/10 4/10 3/10 4/10 3/10

Baixa Elevada Baixa Baixa Baixa Baixa

1 A necessidade de um processo de eliminação manual prende-se com algumas limitações do software no reconhecimento de abreviaturas (ex. tipicamente utilizadas para identificar a revista/journal/publicação) que impedem a identificação de um estudo como duplicado de outro.

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pares e 16 artigos (23,5%) que não estavam centrados na aplicação do tape na articulação patelo-femural. Após esta primeira fase encontravam-se 20 referências (29,4%) na base de dados principal. Na continuação do processo de selecção, procedeu-se à aplicação dos critérios da 2ª fase baseados, na consulta integral do artigo original. Foram eliminados 7 estudos (10,2%) por não incluírem na amostra sujeitos sintomáticos (utentes com SPF) e 3 (4,4%) por não terem como variáveis dependentes a intensidade da dor e/ou a actividade muscular entre o VIO e o VE. Ainda nesta fase, e em consequência da consulta integral aos conteúdos do artigo, eliminou-se um outro estudo, por verificar-se que o tape patelar utilizado tinha características elásticas, o que não corresponde às características do tape em análise. O tape patelar (originalmente desenvolvido por McConnell) não tem qualquer propriedade elástica quer no sentido transversal ou longitudinal (McConnell, 1994) e as diferenças entre os dois tipos de materiais podem ter efeitos mecânicos e sensoriais distintos (Jardim, Esteves, & Oliveira, 2001) ao nível da articulação patelo-femural. Após estes critérios restavam apenas 9 referências na base de dados. De acordo com critério definido sobre o tipo de estudo ou desenho metodológico, eliminaram-se 3 artigos (4,4%) por serem revisões sistemáticas da literatura. Dos últimos 6 registos, 4 (5,8%) eram estudos sem distribuição aleatória da amostra (CCT´s) e apenas 2 (2,9%) eram RCT‘s. Face ao reduzido número de RCT´s não ser suficiente para a realização de uma revisão sistemática, decidiu-se incluir os CCT´s. De acordo com Van Tulder, Furlan, Bobardier & Boutier, (2003) as revisões sistemáticas devem apenas contemplar RCTs, quando no grupo total de estudos a considerar, o número for igual ou superior a 5. No fim do processo de selecção foram eliminados 62 (91,2%) referências e consequentemente seleccionados 6 estudos (8,8%) de um grupo inicial de 68 resultados (Figura 1). A descrição das principais características dos estudos é apresentada na Tabela 2. Qualidade Metodológica dos Estudos Os resultados da avaliação metodológica destaca-se que o item com a pontuação mais pobre foi o do critério relacionado com o facto dos fisioterapeutas serem “cegos” na aplicação do tape patelar (item 6). Entendemos que este resultado surge pelo tape patelar ser uma variável virtualmente impossível de controlar

dada a natureza da sua aplicação. Os restantes itens, apresentam variabilidades de pontuação, verificandose no entanto, que todos os estudos obtiveram uma pontuação máxima nos itens 2 (distribuição aleatória dos sujeitos nos diferentes grupos) e 10 (comparação de resultados entre grupos). Observa-se ainda que o estudo de Whittingham, Palmer & MacMillan, (2004) foi o único onde existiu ocultação da distribuição da amostra (item 3) e onde todos os participantes incluídos foram considerados nas conclusões do estudo (item 9). Segundo Cruz e Silva (2005), como regra empírica, se mais do que 15% dos participantes desistem, os resultados dos estudos ficam altamente comprometidos e podem ser considerados não-válidos Idealmente, a análise estatística (intention to treat analysis2) deve ser efectuada considerando todos os participantes (mesmo quando alguns não completaram o follow-up) nos grupos em que foram distribuídos. Destaca-se ainda que os estudos de Aminaka & Gribble, (2008); Christou, (2004) e Cowan, Hodges, Crossley & Bennell, (2006) foram os únicos onde os sujeitos não eram “cegos” e curiosamente os de Aminaka & Gribble, (2008) e Christou, (2004) foram os únicos que obtiveram pontuação positiva no item 11, porque calcularam, respectivamente, a dimensão do efeito da intervenção e a variabilidade dos resultados. De acordo com Harvey, Herbert & Crosbie, (2002) estudos submetidos a avaliação segundo a escala PEDro, com valor superior ou igual a 7, devem de ser considerados de “qualidade elevada”, os que têm 6 ou 5 valores devem ser considerados de “qualidade moderada” e todos os que têm valor igual ou inferior a 4, devem ser considerados de “qualidade baixa”. Neste contexto só o estudo de Whittingham et al, (2004) (8/10) apresenta uma qualidade metodológica “elevada” e os restantes uma qualidade metodológica “baixa” (Tabela 2) (Aminaka & Gribble, 2008; Christou, 2004; Cowan, Hodges, Crossley, & Bennell, 2006; Keet, Gray, Harley, & Lambert, 2007; Wilson, Carter, & Thomas, 2003). De uma forma global a pontuação média dos estudos foi de 4,3 pontos (qualidade baixa), com uma pontuação máxima de 8 e uma mínima de 3 e uma moda de 4 pontos.

Um método de análise dos estudos aleatórios no qual os utentes que foram distribuídos aleatoriamente são analisados em conjunto, independentemente de terem completado ou recebido a totalidade da intervenção, de forma a preservar a aleatorização.

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AUTOR

Wilson, et al (2003) CT

Christou, (2004) CT

AMOSTRA/POPULAÇÃO

COMENTÁRIOS - A colocação do tape patelar (McConnell) foi realizada de forma - Cada sujeito realizou “step down test”em 4 - O tape para o desvio externo (média de 15,9%), o tape neutro aleatória - Sujeitos eram “cegos” diferentes condições: 1) sem tape (baseline); (média 34,9%) e o tape para o desvio interno (média 33,2%) 71 Sujeitos com SPF (32 mulheres, 2) tape para correcção do desvio externo; 3) promoveram uma diminuição da intensidade da dor - O tape foi aplicado por 11 39 homens, média de idade - 34 tape para correcção do desvio interno; 4) tape comparativamente à avaliação inicial – baseline (p<0,0001). O tape fisioterapeutas experientes exactamente da forma como fazem anos) neutro (sem promover qualquer correcção) neutro e o tape para o desvio interno promoveram maior - Dor foi avaliada e registada na NPRS depois diminuição da intensidade da dor comparativamente ao tape para o na prática clínica. da aplicação dos tapes. desvio externo (p<0,0001). Foi utilizado o mesmo tipo de tape sem ter em conta o tipo de disfunção patelo-femural.

30 Sujeitos do sexo feminino (15 com SPF e 15 assintomáticas). Média de idades – 27,3 anos)

Whittingham 30 Militares recrutas com SPF (24 , et al (2004) homens e 6 mulheres; média de RCT idades – 18 anos)

10 Sujeitos com SPF (média de idades – 23,0 anos) e 12 sujeitos assintomáticos (média de idades – 19,5 anos)

RESULTADOS

- Diminuição significativa da intensidade da dor (70-80%) com a - Os sujeitos realizaram o exercício concêntrico utilização do tape para o desvio externo e o tape placebo (p<0,01). leg press isocinético entre os 90 e os 0º de flexão O tape para o desvio externo não teve resultados mais joelho a 30º/seg em cada uma das condições: 1) significativos que o tape placebo (p<0,05). O tape para o desvio tape (controlo); 2) tape sem desvios (placebo); 3) interno diminui a dor mas não de forma significativa (p<0,06). O para o desvio interno; 4) tape par desvio externo tape não teve qualquer efeito ao nível da força no exercício de “leg - Registo da actividade do VIO e VE através press” (p<0,1). de EMG em cada um dos testes. - Verificou-se um aumento da actividade do VIO e uma - A intensidade da dor foi avaliada através da diminuição da do VE com a utilização do tape nos sujeitos versão modificada do McGill Pain sintomáticos (SPF). O tape não teve efeitos opostos na actividade Questionnaire. do VIO e no VE nos sujeitos assintomáticos.

- Os testes foram realizados de forma aleatória - Utilização do Electrogoniometro na medição do ângulo de flexão do joelho. - Utilização do dinamómetro isocinético para avaliar a força. - Aplicação do tape foi realizada da forma como o autor faz na prática clínica. - Foi utilizado o mesmo tipo de tape sem ter em conta o tipo de disfunção patelo-femural.

- Os sujeitos foram distribuídos aleatoriamente por 3 grupos: Grupo 1 (n=10): Tape patelar com exercício; Grupo 2 (n=10): Tape placebo com exercício; Grupo 3 (n=10): Apenas exercício. - Frequência da intervenção: diariamente durante 4 semanas. - Foi utilizada a EVA para avaliar o comportamento diário da intensidade da dor e durante a realização do “step test”.

Evoluções significativas ao longo do tempo em todos os grupos ao nível da intensidade da dor e função (FIQ) (p<0,01). Tape diminuiu a dor durante 24h e no “step test” sem tape a dor foi mais intensa do que nos grupos 2 ou 3 nas semanas 2-4 (p<0,01). - O grupo com tape também não apresentou sintomas às 4 semanas. Grupo 1 (tape) reduziu os sintomas de forma mas efectiva no “step test” do que nos outros grupos durante toda a semana (imediatamente) (p<0,01). Os resultados da FIQ foram melhores no Grupo 1 do que nos outros grupos nas semanas 2-4 (p<0,01).

- Distribuição dos sujeitos pelos grupos de forma aleatória. - Fisioterapeutas não tiveram conhecimento na distribuição aleatória dos sujeitos. - O tape McConnell foi aplicado de acordo com a disfunção encontrada. - Sujeitos eram cegos

- Os sujeitos realizaram “step up step down test” em 3 diferentes condições: tape; tape placebo e sem tape. - A EVA foi utilizada para avaliar a intensidade da dor durante a realização do “step up test”. - A EMGs foi utilizada para avaliar a magnitude de activação do VIO e VE na fase concêntrica.

- Redução significativa da dor durante a realização do “step up test” no grupo com “tape” comparativamente com os grupos do “tape placebo” e “sem tape” (p<0,0001). Não existiram diferenças significativas entre os grupos do “tape placebo” e do “sem tape” (p<0,591). - Não existiram diferenças significativas na magnitude de activação do VIO e VE entre as 3 condições quer no grupo de controlo (p<0,171).quer no grupo com SPF (p<0,256).

- O tape patelar (McConnell) foi aplicado de acordo com a disfunção encontrada de forma aleatória e por sequência standarizada até ser verificada uma redução de pelo menos 50% da intensidade da dor. - O degrau utilizado tinha 20 cm de altura.

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Cowan et al, (2006) CT

INTERVENÇÕES


35 Sujeitos (15 sintomáticos e 20 assintomáticos) 24 mulheres e 11 homens; Média de idades – 29,4 anos

- Grupo de controlo não referiu qualquer sintoma durante a realização dos testes enquanto que o grupo sintomático referiu um aumento significativo da intensidade da dor (p<0,05) durante a realização dos testes. Não foram encontradas diferenças significativas no grupo sintomático entre as 3 condições. - O tape não mostrou resultados significativos na produção de força quer no grupo sintomático quer no grupo assintomático. - A actividade EMG do VIO foi 28% maior durante o “step up test” e 29% maior no “step down test” (p<0,05) no grupo com SPF comparativamente ao grupo assintomático na condição de sem tape. - Durante o “step up test” a actividade EMG do VIO diminui 17% no grupo com SPF e 22% no grupo assintomático na condição com tape comparativamente à condição de sem tape. - No “step down test” na condição com tape os resultados foram semelhantes, verificando-se uma diminuição de 15% da actividade EMG do VIO nos sujeitos com SPF e 17% nos sujeitos assintomáticos, comparativamente à condição sem tape.

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- Os sujeitos realizaram um teste de equilíbrio/controlo postural (Star Excursion Balance Test - SEBT) em duas diferentes condições com e sem tape. Durante o teste os - Verificou-se um aumento significativo da intensidade da dor no autores pretendiam quantificar o contributo grupo de sujeitos sintomáticos nas duas condições com tape (SPF cinemático da flexão da anca e do joelho do tape =1.073 e Controlo tape = 0.175) e sem tape (SPF sem tape = membro em apoio (sintomático) na simulação 1.453 e Controlo sem tape = 0.109) comparativamente ao grupo de do “passo na fase oscilante da marcha” controlo (F1,38 = 19.06, p<0.001). seguindo a linha desenhada no chão. Nesse - O grupo sintomático apresentou uma redução da intensidade da 20 Sujeitos sintomáticos (12 mesmo momento foi medido a maior mulheres e 8 homens) e 20 sujeitos dor na condição com tape (SPF tape =1.073) comparativamente à Aminaka & distância possível alcançada pelo membro assintomáticos (12 mulheres e 8 condição sem tape (SPF sem tape =1.453) Gribble assintomático. (2008) homens). - O grupo sintomático apresentou um aumento significativo da - Foi utilizado um sistema de análise Média de idades – 21,25 anos. distância do passo na condição com tape (SPF tape = 63,5%) cinemática para as medições dos ângulos de comparativamente à condição sem tape (SPF sem tape = 62,8%). flexão da anca e do joelho e um cálculo - Não existiram resultados significativos nos ângulos de flexão da aritmético para medir a maior distância anca e do joelho com a aplicação do tape F1,36 = 0.126, p<0.725 e alcançada pelo membro assintomático F1,37 = 0.119, p<0.732, respectivamente. baseado nos os valores da posição inicial com os valores da posição final com o cumprimento do membro - Foi utilizada a EVA para avaliar a intensidade da dor. Legenda: SPF = Síndrome Patelo Femural, NPRS= Numeric Pain Rating Scale; EMGs = Electromiografia de superfície, EVA = Escala Visual Análoga, VIO = Vasto Interno Obliquo, VE = Vasto Externo; FIQ = Function Índex Questionnaire; mV = millivolts; CCA = Cadeia Cinética Aberta; CCF = Cadeia Cinética Fechada; STEB

- A colocação do tape patelar (McConnell) foi realizada de forma aleatória por um fisioterapeuta experiente. - Foi utilizado o mesmo tipo de tape (correcção do desvio externo) sem ter em conta o tipo de disfunção patelo-femural. - Não foram explicadas aos sujeitos as potenciais diferenças entre o tape placebo e o tape para correcção do desvio externo. - Os testes isocinéticos foram realizados entre os 5 e os 85º de flexão.

- A colocação do tape foi realizada pelo autor - As medições da distância do passo foram realizadas pelo mesmo avaliador. - Foi utilizado o mesmo tipo de tape (correcção do desvio externo) sem ter em conta o tipo de disfunção patelo-femural. - O teste era repetido sempre que os sujeitos colocavam o pé fora da linha estabelecida.

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Keet, et al (2007) RCT

- Os sujeitos realizaram exercícios isocinéticos e testes isométricos em CCA, assim como exercícios em CCF (step up and step down test) em 3 diferentes condições: tape para correcção do desvio externo; tape placebo e sem tape. - Foi utilizado um dinamómetro isocinético para avaliar a força muscular isocínetica e isométrica do quadricípete e a EMGs para avaliar o comportamento da actividade muscular. - A EMGs foi também utilizada para avaliar a actividade muscular do VIO e de VE nos “step up and step down tets” - Foi utilizada a EVA para avaliar a intensidade da dor.


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Figura 1 – Representação do processo metodológico

Expressão de Pesquisa utilizada (Patellofemoral pain syndrome OR patellofemoral pain OR patellofemoral syndrome OR anterior knee pain syndrome) AND (patellar taping OR patella taping OR taping OR McConnell taping OR patella tape) Pesquisa realizada pelo autor nas bases de dados. AMED (OVID) (18)

PubMed (23)

Web of Science (27)

Total de estudos recolhidos (68)

Eliminação de Duplicados Automaticamente: 22 estudos Manualmente: 9 estudos

Estudos eliminados por não cumprirem critérios de selecção (Fase 1) Língua: 0 estudos Tipo de Publicação: 1 estudos Temática: 16 estudos

Selecção utilizada com consulta do título, resumo e publicação periódica.

Total de estudos após 1os critérios (20)

Selecção utilizada com consulta do título, resumo e conteúdo do estudo

Estudos eliminados por não cumprirem critérios de selecção (Fase 2)

Total de estudos após 2os critérios (6)

Condição Clínica: 7 estudos Variáveis Dependentes dor e actividade muscular: 3 estudos Desenho de Estudo RCT e CT: 3 estudos Temática*: 1 estudo

Além do autor, um elemento independente reviu os critérios de selecção e procedeu à avaliação da qualidade metodológica através de Escala PEDro. Depois de analisados os resultados foi determinada a versão de consenso.

Recolha e síntese das principais características dos estudos

Pontuação da escala PEDro

Análise e Conclusões

* O estudo foi eliminado na 2ª fase com base nos critérios estabelecidos para a 1ª fase. Esta situação surge em consequência da consulta ao conteúdo do estudo onde se verificou que o tape utilizado e mencionado no título e no resumo do estudo não correspondia em características ao tape patelar em análise

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Identificação e Análise de Características Relevantes dos Estudos Nesta fase são identificadas e analisadas algumas características relevantes sobre aspectos metodológicos dos estudos, nomeadamente os fisioterapeutas não serem “cegos”, a dimensão, género e métodos de selecção da amostra, os critérios de inclusão e exclusão, os protocolos de aplicação do tape e por último com os procedimentos, testes e instrumentos utilizados. Na grande maioria dos estudos, um dos aspectos mais difíceis de controlar está relacionado com o facto dos investigadores ou profissionais de saúde serem ou não “cegos” à aplicação da intervenção/tratamento. Nos estudos por nós analisados, o caso não fugiu à regra e nenhum deles pontuou neste critério. No entanto, nos estudos de Wilson et al, (2003), Whittingham et al, (2004) e Keet et al (2007) quer os sujeitos quer os avaliadores foram “cegos”. Aminaka & Gribble (2008), Christou, (2004), Cowan et al, (2006) falharam na descrição deste parâmetro, assumindo-se que o procedimento não foi realizado. Outras das grandes limitações dos estudos prendem-se com o tamanho reduzido da amostra. Este factor pode ser determinante para que não sejam encontrados resultados estatisticamente significativos e consequentemente descredibilizar potenciais efeitos e benefícios de uma determinada estratégia de intervenção. Na presente revisão, um dos seis estudos analisados tinha uma amostra inferior a 30 (Cowan, et al., 2006) e quatro entre os 30 e os 40 sujeitos (Aminaka & Gribble, 2008; Christou, 2004; Keet, et al., 2007; Whittingham, Palmer, & Macmillan, 2004). Apenas um dos estudos utilizou uma amostra acima dos 50 sujeitos (Wilson, et al., 2003) (ver Tabela 1). Greenhalgh, (1997) sublinha que este tipo de situação normalmente conduz os estudos a um erro do tipo II ou ß, ou seja, a conclusão de que uma determinada intervenção não tem qualquer efeito. Em relação ao género, a maioria dos estudos incluíram mais mulheres do que homens. No entanto, dois dos estudos tinham mais homens do que mulheres (Whittingham, et al., 2004; Wilson, et al., 2003) e um outro foi realizado apenas com sujeitos do sexo feminino (Christou, 2004). O estudo de Cowan et al, (2006) foi o único que não especificou o género dos participantes. A presença de um maior número de mulheres neste tipo de estudos, parece suportar os resultados de outros, que demonstram existir uma maior prevalência dos SPF em mulheres do que nos homens (Callaghan & Selfe, 2007; Taunton, et al., 2002). Apesar desta característica, nenhum dos estudos faz qualquer reflexão sobre uma possível relação entre os resultados obtidos com o género da amostra.

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Todos os estudos em análise descreveram o método de selecção da amostra. Alguns utilizaram a recolha por conveniência (Keet, et al., 2007; Whittingham, et al., 2004; Wilson, et al., 2003), incluindo voluntários (Aminaka & Gribble, 2008; Christou, 2004) ou sujeitos referenciados por profissionais de saúde (Cowan, et al., 2006). Nenhum dos estudos utilizou aleatorização na selecção da amostra. De uma forma geral, todos os estudos definiram convenientemente os critérios de inclusão e exclusão, contribuindo para um processo adequado na diferenciação de outras condições clínicas e/ou variáveis que pudessem confundir sintomas. Entre os estudos, apenas um reverte a descrição destes critérios para outras fontes literárias (Cowan, et al., 2006). Todos os outros descrevem na íntegra e de forma semelhante os critérios de inclusão, considerando presença ou exacerbação da dor em actividades que aumentam as forças de reacção patelo-femurais: subir e descer escadas, agachamentos, sentados por longos períodos, marcha e saltos. Os critérios de exclusão foram considerados com base nas condições clínicas não relacionadas com os SPF, como são os casos das lesões meniscais ou ligamentares do joelho, luxações e fracturas da patela, tendinopatias do tendão patelar, lesão neurológica e antecedentes cirúrgicos (Aminaka & Gribble, 2008; Christou, 2004; Cowan, et al., 2006; Keet, et al., 2007; Whittingham, et al., 2004; Wilson, et al., 2003). Relativamente ao protocolo de aplicação do tape patelar, a maioria dos estudos utilizou o tape sugerido por McConnell, aumentando deste modo, a possibilidade de comparações entre os mesmos. Apenas um dos estudos (Christou, 2004) descreve a aplicação do tape patelar com ligeiras diferenças, relacionadas com a posição inicial e final das bandas, mas que no nosso entender mantêm os princípios subjacentes ao tape originalmente descrito por McConnell, (1986). Três dos estudos utilizaram fisioterapeutas experientes, (Keet, et al., 2007; Whittingham, et al., 2004; Wilson, et al., 2003) mas apenas um deles refere ser na aplicação do tape patelar (Whittingham, et al., 2004). No estudo de Wilson et al, (2003) todos os fisioterapeutas eram igualmente experientes e treinaram a aplicação do tape antes do inicio do estudo. Apenas dois dos estudos utilizaram o tape de acordo com a disfunção patelar encontrada (Cowan, et al., 2006; Whittingham, et al., 2004) com a particularidade de diferirem cinco pontos entre si na avaliação da qualidade metodológica (Tabela 1). Na maioria dos estudos a aplicação do tape patelar foi sempre associada à realização de testes funcionais

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dinâmicos. Dos seis estudos em análise, quatro utilizaram o “step up step down test” (Cowan, et al., 2006; Keet, et al., 2007; Whittingham, et al., 2004; Wilson, et al., 2003) considerado por vários autores como o exercício/actividade que mais contribui para a exacerbação dos sintomas (S. Cowan, Bennell, K. L.; Hodges, P., 2000; Pulzatto, et al., 2005; Selfe, Richards, Thewlis, & Kilmurray, 2008; Sheehy, 1998). Curiosamente apenas Cowan et al, (2006) descreveram a altura do degrau utilizado (20 cm). Este factor pode ser determinante ao nível da intensidade da dor, porque a magnitude do stress articular entre a patela e a tróclea femural varia com o ângulo de flexão do joelho (Grelsamer & Klein, 1998; Steinkamp, et al., 1993; Wallace, et al., 2002). Os outros dois estudos verificaram o efeito do tape utilizando o leg press isocinético (Christou, 2004) e um teste de equilíbrio/controlo postural (SEBT) (Aminaka & Gribble, 2008). Estes dois estudos tiveram a mesma pontuação na avaliação da qualidade metodológica (5/10). Quatro dos estudos utilizaram a EVA para a avaliação da intensidade da dor (Aminaka & Gribble, 2008; Cowan, et al., 2006; Keet, et al., 2007; Whittingham, et al., 2004). Este instrumento é amplamente utilizado em trabalhos de investigação e considerado por muitos como um método fidedigno na avaliação da intensidade da dor (K. M. Crossley, Bennell, Cowan, & Green, 2004). Os outros dois estudos avaliaram o parâmetro da dor através da NPRS (Wilson, et al., 2003) e do McGill Pain Questionnaire (Christou, 2004). Os estudos de Wilson et al, (2003), Whittingham et al, (2004) e Keet et al, (2007) foram os únicos a avaliar a intensidade da dor em sujeitos “cegos” o que significa que os valores da dor nos restantes estudos podem não ser considerados fidedignos devido ao possível viés nas respostas dos sujeitos. Outro dos instrumentos utilizados foi a EMGs para a avaliação da actividade muscular entre o VIO e o VE. Christou, (2004), Cowan et al, (2006) e Keet et al, (2007) utilizaram procedimentos idênticos quer na colocação dos eléctrodos quer nos set ups para a recolha de dados. De acordo com vários autores a EMGs é considerada um método apropriado e fidedigno na recolha de informações relativas à intensidade e padrões de recrutamento muscular (Kleisen, 1998; Soderberg & Knutson, 2000). Ainda para a avaliação da função Whittingham et al, (2004) foram os únicos a usar instrumentos de auto-preenchimento: o FIQ e o Anterior Knee Pain Scale (AKPS). De acordo com Crossley et al, (2004) o AKPS tem sido considerado um instrumento válido e objectivo na avaliação da função em sujeitos com SPF, sugerindo a sua

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aplicabilidade clínica. Discussão Enquanto que a maioria dos estudos identificou resultados positivos na redução da intensidade da dor outros variaram nos resultados ao nível da intensidade e tempos de activação do VIO em relação ao VE. Além disso, grande parte dos autores estudaram os efeitos isolados da aplicação do tape e apenas um analisou esses mesmos efeitos associados a programas de exercícios direccionados para a intervenção dos SPF. Com base nos resultados dos estudos, faremos de seguida uma análise sobre aplicação do tape, considerando os seus efeitos ao nível da dor e da actividade muscular do VIO em relação ao VE. Tape patelar e a Dor Em 1986, Jenny McConnell propôs a utilização do tape patelar considerando-o como um dos recursos efectivos na redução da dor em utentes com SPF. Desde então, tem sido uma estratégia amplamente estudada pela comunidade científica. Enquanto os seus pressupostos de aplicação na redução da dor permanecem inconclusivos, (Cowan, Bennell, & Hodges, 2002; Ng & Cheng, 2002) a maioria dos estudos por nós analisados, suportam a teoria de que o tape patelar diminui a dor em sujeitos com SPF. Apesar da baixa qualidade metodológica dos estudos, a maioria apresenta resultados positivos do efeito do tape na diminuição da intensidade da dor em actividades que produzem um agravamento dos sintomas. Christou, (2004), Cowan et al, (2006), Wilson et al, (2003), Whittingham et al, (2004) verificaram uma diminuição da intensidade da dor nos nos “step up and down tests”, no entanto, só o estudo de Whittingham et al, (2004) apresentou uma qualidade metodológica elevada (Tabela 2). A maior parte destes estudos utilizaram pelo menos uma das componentes do tape patelar sugeridas por McConnell. No entanto, Christou, (2004) e Wilson et al, (2003), dois estudos com baixa qualidade metodológica (4/10 na escala PEDro), adicionaram um tape que promovia o desvio externo da patela (biomecanicamente implica uma diminuição das áreas de contacto articular que teoricamente não diminuiu o stress articular) e um outro neutro/placebo sem que existisse efeito mecânico para qualquer um dos desvios. Foi interessante verificar que ambos os tapes foram efectivos na diminuição da dor, comparativamente ao tape para o desvio externo da patela. Na nossa opinião estes resultados não vão ao encontro das premissas da

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aplicação do tape para a correcção do desvio externo (aumento as áreas de contacto - diminuição o stress articular - resultando na diminuição da dor), e como tal, parecem não justificar os seus resultados por uma acção mecânica, sugerindo-se então, a existência de um efeito sensorial. De acordo com vários autores os efeitos do tape ao nível da dor podem estar directamente relacionados com um estimulo sensorial nas fibras aferentes Aâ (Bockrath, Wooden, Worrell, Ingersoll, & Farr, 1993; Herrington, 2001, 2004). Outro aspecto que gostaríamos de destacar relacionase com o facto de apenas dois estudos terem aplicado o tape patelar de acordo com a disfunção encontrada (Cowan, et al., 2006; Whittingham, et al., 2004). Segundo McConnell, (2002) a decisão sobre a aplicação das componentes do tape deverá ser realizada com base na avaliação da disfunção da patela dentro da tróclea femural3. A autora explica, que na presença de uma inclinação externa da patela não é esperado uma diminuição da intensidade da dor, com a aplicação do tape para a correcção do desvio externo. Acrescenta ainda, que em certos casos poderá ser necessário aplicar mais do que uma componente, por poder existir mais que um tipo de disfunção. Por esta ordem de ideias, considerando a premissa da correcção do efeito mecânico, esta poderá ser uma das hipóteses explicativas da não diminuição da intensidade da dor nos estudos de Wilson et al, (2003) e Keet et al, (2007). Contudo, ao contrário da hipótese levantada inicialmente, o efeito sensorial parece também não ter tido qualquer influência na diminuição da intensidade da dor. Por último, realçamos que Whittingham et al, (2004) foram os únicos que estudaram os efeitos da aplicação do tape associado a outro tipo de estratégia de intervenção. Apesar da dor e da função terem melhorado em todos os grupos estudados, os autores verificaram resultados mais significativos no grupo do tape patelar associado a exercícios para o controlo e aprendizagem motora do VIO. Tape patelar e a Actividade Muscular do VIO em relação ao VE Outro dos pressupostos de aplicação do tape patelar está relacionado com a sua influencia ao nível da actividade muscular do VIO em relação ao VE (aumento da intensidade e dos tempos de recrutamento do VIO) pela colocação do tape no sentido longitudinal

às fibras musculares (alterações no comprimento-tensão do tecido muscular) fundamentados através do estimulo cutâneo aferente (McConnell, 1996, 2007). Dos estudos por nós analisados, três estudaram os efeitos do tape patelar ao nível da intensidade muscular (Christou, 2004; Cowan, et al., 2006; Keet, et al., 2007) e apenas um destes (Christou, 2004) considerou os efeitos nos tempos de recrutamento do VIO em relação ao VE. Metodologicamente, todos estes estudos foram considerados de baixa qualidade (Tabela 2). Cowan, et al, (2006) verificaram que o tape patelar e o tape placebo não alteraram a amplitude EMG do VIO e/ou VE, quer nos sujeitos sintomáticos quer nos assintomáticos. Por um lado, baseando-nos na premissa de que estimulo cutâneo aferente influência a actividade muscular, seria esperado encontrar resultados semelhantes entre as duas condições, quando comparadas com a condição de sem tape. Por outro, os autores ao verificarem uma diminuição da dor nas duas condições, também seria esperado encontrar alterações ao nível da resposta motora nos sujeitos sintomáticos, a propósito da hipótese sobre os efeitos do tape na modulação da dor por via do estimulo nas fibras aferentes. Mais contraditórios são os resultados encontrados no estudo de Keet et al, (2007). Para além de terem verificado uma diminuição da intensidade do VIO em relação ao VE, nos sujeitos sintomáticos e nos assintomáticos nas condições com tape (grupo experimental e placebo), os autores não verificaram resultados positivos na diminuição da intensidade da dor nos sujeitos com SPF. Se por um lado os resultados são contraditórios ao nível do efeito do tape na modulação da dor, na nossa perspectiva, mais parecem ser ao nível do estimulo cutâneo (alterações no comprimento-tensão do tecido muscular) por se ter verificado maior diminuição da actividade do VIO em relação ao VE. Christou, (2004), o único autor que estudou os efeitos do tape nos tempos de recrutamento muscular, verificou que o tape patelar e o tape placebo aumentaram os tempos de activação do VIO em relação ao VE, quer nos sujeitos sintomáticos quer nos sujeitos assintomáticos. Ao contrário do estudo anterior, neste verificou-se uma diminuição significativa da intensidade da dor nos sujeitos com SPF. Estes resultados parecem sustentar os pressupostos defendidos por McConnell

McConnell sugere quatro componentes de tape patelar: I) correcção do desvio externo da patela; II) correcção da inclinação externa da patela; III) correcção da inclinação antero-posterior da patela e IV) correcção das rotações interna e externa da patela. De acordo com a avaliação clínica de McConnell, existem quatro tipos de disfunção da patela dentro da tróclea femural: I) desvio externo; II) inclinação externa; III) inclinação antero-posterior e IV) rotação externa e interna.

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e parecem ir ao encontro de estudos semelhantes, onde os autores concluíram que o tape patelar e o tape placebo mostraram ser efectivos na pré-activação do VIO (único estabilizador dinâmico da articulação patelo-femural) em relação ao VE em sujeitos sintomáticos, (Cowan, et al., 2002) mas sem resultados significativos em sujeitos assintomáticos (Macgregor, Gerlach, Mellor, & Hodges, 2005). Curiosamente, estes resultados parecem ir ao encontro de outros, em estudos realizados ao nível do complexo articular do ombro, onde os autores verificaram que o tape inibidor do Trapézio Superior (TS) não teve resultados mais significativos do que o tape placebo nos tempos de recrutamento muscular do TS, Deltóide Anterior, Trapézio Inferior e Grande Dentado no movimento de elevação do braço em sujeitos assintomáticos (Matias & Jardim, 2005) - estudo não publicado).

Conclusões Os SPF são das condições mais frequentes na prática clínica dos fisioterapeutas. Apesar da elevada prevalência, os seus mecanismos fisiopatológicos encontram-se por explicar e a utilização do tape patelar como estratégia de intervenção está longe de reunir uma evidência consistente, quer ao nível da diminuição da intensidade da dor, quer ao nível da actividade muscular (intensidade e tempos de recrutamento) do VIO e VE. De acordo com esta revisão sistemática verificou-se existirem maioritariamente CCTs comparativamente ao número de RTCs realizados sobre a temática. Do ponto de vista metodológico grande parte dos estudos revelaram ser de baixa qualidade, mas no nosso entender com resultados que podem conduzir a prática clínica dos fisioterapeutas. Através da nossa análise, os mecanismos fisiológicos dos efeitos do tape patelar continuam a ser pouco claros, no entanto, parece-nos que a sua aplicação diminui a intensidade da dor e influência os tempos de recrutamento muscular em utentes com SPF, sem apresentar resultados significativos ao nível da intensidade da contracção muscular. No nosso entender, continua a existir uma janela aberta para futuros estudos sobre esta temática, sugerindo-se a realização de mais RCTs com maior qualidade, na perspectiva de explicar os mecanismos inerentes à aplicação do tape patelar e justificar o seu sucesso clínico junto dos utentes com SPF.

Conflito de Interesses

O autor reconhece o interesse pelo conteúdo do artigo e envolvimento com o “McConnell Institute”, mas refuta determinantemente qualquer outro tipo de conflitos de interesse, sejam eles comerciais, financeiros, de direcção ou de coordenação.

Agradecimentos

Professora Carla Pereira pela sua colaboração no processo de avaliação dos estudos/artigos seleccionados

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Volume 3 NĂşmero 1


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ARTIGO DE OPINIÃO

Lesões nos Jovens Atletas: conhecimento dos factores de risco para melhor prevenir Raúl Oliveira1 Fisioterapeuta. Professor na Faculdade Motricidade Humana1 Correspondência para: raulov@netcabo.pt

Introdução As lesões resultantes da prática desportiva quer organizada (contexto de um clube) quer espontânea são a causa principal de morbilidade entre os adolescentes americanos (Emery, 2005) e as que mais requerem intervenção clínica nos serviços de urgência. Sleet & Bryn (2003) referiam que por ano um em cada 3 adolescentes canadianos tiveram de ter apoio clínico para tratar lesões resultantes da prática desportiva. Não encontrámos qualquer registo ou estudo semelhante feito ou publicado em Portugal. No entanto participámos em estudos de determinadas modalidades (ginástica, basquetebol, judo) onde encontrámos valores de prevalência anual de lesões associadas à prática desportiva em jovens adolescentes entre os 43 e 78% das amostras analisadas (Santos, JP; Esteves, J. Oliveira, R., 2003; Rego, F.; Reis, M.; Oliveira, R., 2007). Este artigo de opinião pretende de uma forma geral descrever as razões pelas quais os jovens atletas são e/ ou estão mais vulneráveis a lesões do sistema músculoesquelético indicando os princípios orientadores na prevenção da sua ocorrência. Como objectivos mais específicos pretendemos: a) identificar as causas principais das lesões mais comuns na prática desportiva em jovens e as suas possíveis consequências. b) definir o conceito de lesão e caracterizar a natureza e os tipos de lesão (lesão aguda Vs Lesão crónica) que surgem e a forma adequada de os abordar; c) caracterizar os factores de risco intrínsecos e extrínsecos associados a essas lesões. Lesões nos jovens desportistas: diferentes dimensões de um problema Os adolescentes estão mais vulneráveis às lesões desportivas não só porque participam cada vez mais cedo e mais intensamente na prática desportiva como também estão num processo de crescimento rápido e Volume 3 Número 1

de maturação neurobiológica, num ambiente psicossocial cada vez mais competitivo e selectivo. O padrão de ocorrência de lesões (tipos, causas e sua distribuição) nos jovens adolescentes é semelhante ao que acontece nos desportistas profissionais adultos (American Academy of Orthopaedic Surgeons, AAOS, 2003). No atleta jovem que ainda está no processo de crescimento/desenvolvimento (particularmente rápido no período do salto pubertário ou “spurt period”), as cartilagens de crescimento existentes nas extremidades dos ossos longos (epifíses) são particularmente vulneráveis a lesões por sobrecarga mecânica (forças de compressão). Isto acontece quer nos desportos de contacto onde são frequentes os macrotraumatismos (futebol, rugby, andebol, basquetebol, judo, luta, etc.) quer nos desportos que exijam repetições exaustivas dos mesmos movimentos (voleibol, atletismo, ginástica, patinagem artística, ténis, natação, etc.) gerando microtraumatismos repetidos cujos efeitos cumulativos excedem a capacidade de adaptação biológica da estrutura osteo-articular aos esforços solicitados (Norris, 2004; Caine, DiFiori & Maffuli, 2006). Nas regiões osteo-articulares de inserção músculotendinosa (normalmente apófises) e capsulo-ligamentar as lesões ocorrem por forças de tracção repentinas exercidas por essas estruturas que nos jovens são mais fortes e resistentes que os locais de inserção, podendo originar a sua inflamação (entesopatias) e nos casos mais graves lesões ósseas (fracturas) por arrancamento ou avulsão. (Norris, 2004; Caine, DiFiori & Maffuli, 2006). Estas lesões são mais frequentes no joelho, calcâneo e cotovelo (Cassas & Cassettari-Ways, 2006). Outra característica destas idades (10-16/17 anos) que constitui um ponto vulnerável está relacionada com os diferentes ritmos de crescimento acelerado que existe entre os ossos e os músculos e ligamentos. O pico de crescimento ósseo está desfasado (antecede) do pico 33


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de crescimento dos tecidos moles (AAOS, 2002). Este facto aumenta a susceptibilidade de lesões nos locais de inserção óssea dos tendões e ligamentos. Por outro lado os ritmos de crescimento e maturação neurobiológica são individuais e determinados pela interacção entre factores genéticos e factores ambientais. Como a divisão por escalões em todos os desportos se faz exclusivamente por idade cronológica, pode acontecer que se tenha dois jovens com a mesma idade cronológica mas com perfis maturacionais muito distintos. Este desfazamento maturacional entre opositores, particularmente nos desportos de contacto e/ou nos desportos onde a força muscular seja uma componente importante pode constituir um risco acrescido de lesão para o jovem com um estadio maturacional menos desenvolvido. Por último o crescimento acelerado dos diferentes segmentos corporais pode não ser de imediato acompanhado por uma coordenação neuromuscular e um controle postural eficientes originando um risco acrescido em alguns gestos desportivos mais complexos ou em situações imprevistas e bruscas que exigem respostas nem sempre eficazes. Os pais, professores e treinadores destes jovens conhecem bem estes períodos em que os seus filhos, alunos ou atletas parecem mais descoordenados, mais lentos e com menor capacidade de resposta a situações novas e/ou imprevistas. Lesão: definição, natureza e tipos de lesão Considera-se lesão toda a condição ou sintoma que implicou pelo menos uma das seguintes consequências e que tenha ocorrido como resultado da participação da actividade desportiva (Caine, D., Caine, C. & Lindener, K. 1996): 1.tenha sido motivo directo para interromper a actividade desportiva (treinos e competições) durante pelo menos 24 horas; 2.se a condição ou sintoma não motivou a interrupção total da actividade desportiva, mas foi determinante para alterar a sua actividade quer em termos quantitativos (menor nº de horas de prática, menor intensidade dos exercícios/ esforços físicos) quer em termos qualitativos (alteração dos exercícios ou movimentos realizados); 3.o jovem praticante procurou um conselho ou tratamento junto de profissionais de saúde para resolver essa condição ou sintoma. A lesão pode surgir a partir de dois tipos de mecanismos:

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1) macrotraumatismos (entorse, pancada/contusão, estiramento excessivo, etc.) em que o joven atleta situa no espaço e no tempo o movimento ou gesto que desencadeou os primeiros sintomas e que normalmente desencadeia uma incapacidade funcional imediata do segmento afectado tanto maior quanto mais grave for a lesão. Podemos dar sucintamente vários exemplos: a) Entorses da articulação tíbio-társica em flexão plantar e inversão (lesões capsulo-ligamentares e em algumas situações ocorrem também fracturas e lesões nas cartilagens de crescimento) na recepção ao solo após um salto; b) Entorses do joelho após uma mudança brusca de direcção envolvendo por exemplo um mecanismo de valgo e rotação externa do joelho (lesões capsuloligamentares e/ou meniscais, luxação da rótula). Aqui parece haver uma maior predisposição para as jovens do sexo feminino, particularmente ao nível das lesões ligamentares do joelho. c) Estiramento excessivo e descontrolado numa abertura das pernas (lesão dos adutores); esforços explosivos como um sprint com dor aguda tipo picada na coxa ou perna (lesão muscular dos isqueo-tibiais ou gémeos). d) Traumatismo directo da coxa (contusão com hematoma intramuscular); e) Gestos com amplitudes extremas de abdução e rotação externa do ombro que causa uma luxação da articulação gleno-umeral, ou gesto de placagem de um opositor (rugby) que causa traumatismo ou luxação da articulação acromio-clavicular. 2) microtraumatismos repetidos a partir da repetição exaustiva de elementos técnicos da modalidade sem os adequados períodos de recuperação/repouso ou na execução incorrecta de certos gestos. Este tipo de mecanismos está na base do que se chama as lesões por sobrecarga ou lesões por esforços repetidos – L.E.R. (overuse injuries). Nos jovens atletas este tipo de mecanismos adquirem uma importância particular quando se aumenta de forma repentina o volume e a intensidade do treino numa fase em que corpo biológico está em permanentes mudanças. Mais à frente desenvolveremos estes aspectos. Independentemente dos mecanismos (macro ou micro) as lesões podem ocorrer sem haver história anterior de lesão ou queixas nessa estrutura – 1ª lesão, ou serem recidiva de lesão anterior ou seja existir uma história passada de lesão nessa estrutura (pelo menos uma vez), mas com recuperação completa da mesma. Volume 3 Número 1


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Relativamente à gravidade/severidade das lesões podemos te: - lesões minor, que na maioria das vezes não obrigam a parar a actividade, embora a possam condicioná-la e aumentem o risco de ocorrer uma lesão mais grave. - lesões major que implicam quase sempre uma paragem da actividade principal (pode-se e deve-se manter sempre algum grau de actividade física) e tratamento adequado. Esta é apenas uma classificação genérica, porque consoante o elemento principal lesado (ligamento, músculo, tendão, etc.) há classificações específicas de acordo com a gravidade e extensão da lesão original. As lesões agudas ocorrem por exemplo, imediatamente após um macrotraumatismo de lesão major com sinais e sintomas precoces onde a fase inflamatória aparece com os seus sintomas inequívocos: calor (energia metabólica irradiada), rubor (vasodilatação e aumento da vascularização); edema e/ou hematoma locais (exsudado inflamatório e/ou hemorragia) e dor – estimulação das terminações nervosas aferentes, por processos quer de na natureza física, quer de natureza química sobre os nocioceptores, que ocorrem nas primeiras horas pós-lesão. O conjunto destes sinais/sintomas levam a uma limitação/incapacidade funcional que será tanto mais acentuada quanto maior for a gravidade e a extensão da(s) lesão(ões) inicial(is). Os objectivos terapêuticos desta fase passam por controlar a resposta inflamatória, melhorar a nutrição

tecidular e a drenagem das substâncias indesejadas e reduzir a dor e o edema/hematoma locais. Neste contexto devemos salientar a importância do Fisioterapeuta nos locais da prática desportiva, particularmente naqueles onde o tempo de exposição ao risco, o nível e tipo de prática e nº de jovens atletas envolvidos assim o justificam, uma vez que os primeiros cuidados na fase aguda pós-lesão são fundamentais para um processo de regeneração tecidular mais eficiente com ganhos na recuperação funcional. As lesões crónicas caracterizam-se pelo manter de sinais e/ou sintomas por um período mínimo de 3 meses, sem ter havido alívio completo dos mesmos. Condicionam a actividade e podem sofrer períodos de agudização que desencadeiam uma resposta inflamatória impeditiva de qualquer tipo de treino. Segundo Caine et al (1996), o número de anos de prática e o início da competição podem ser o principal factor de risco para o desenvolvimento de algumas lesões crónicas. O número e gravidade de lesões tende naturalmente a aumentar com o aumento dos níveis de competição. Os atletas, apesar de apresentarem maiores competências técnicas, têm uma maior carga horária de treino e executam elementos técnicos de maior dificuldade, o que os torna mais susceptíveis à lesão. As lesões crónicas mais comuns são as tendinopatias, bursites, apofisites ou entesopatias (lesões nos locais de inserção óssea das estruturas músculo-tendinosas) e fracturas de fadiga. A dor instala-se gradualmente

Tabela 1 – Factores de risco potencial associado ás lesões nos jovens desportistas Factores de risco extrínseco

Factores de risco intrínseco

N ão M odificáveis

N ão M odificáveis

Tipo de desporto (individual/colectivo; contacto e não

H istória de lesões anteriores

contacto)

Idade

N ível com petitivo (recreativo, m édio, elite)

Sexo

Posição e características especificas (ex. guarda-redes hóquei)

Predisposição constitucional

Condições atm osféricas

Índice M aturacional

A ltura de época/ altura do dia

Volume 3 Número 1

Potencialm ente M odificáveis

Potencialm ente M odificáveis

Respeito pelas regras da m odalidade e ética desportiva

Condição física de base

Tempo de exposição ao risco (treinos e jogos)

Participação anterior e nível de performance

Tipo de piso e condições m ateriais do “terreno de jogo”

Treino/condicionam ento de:

Calçado e equipam ento de protecção

Controle e coordenação neurom uscular, força m uscular,

M eio social e desportivo (com portam ento e atitudes da

flexibilidade, estabilidade articular funcional.

fam ília, pares, amigos, dos treinadores, árbitros, dirigentes,

Factores biom ecânicos

adversários, etc.)

Factores psicossociais

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chegando a atingir intensidades que incapacitam o jovem para a prática desportiva e podem interferir mesmo com as suas actividades funcionais. Factores de risco e lesões nos jovens: Os factores de risco associados às lesões desportivas nos jovens na sua generalidade podem ser extrínsecos e intrínsecos e ainda potencialmente modificáveis pelas estratégias preventivas ou não modificáveis. (ver tabela 1) As estratégias de prevenção para serem eficientes devem envolver toda a equipa técnica e clínica e estar centradas no(s) jovem(s) atleta(s). Deve-se conhecer os factores de risco associados (intrínsecos e extrínsecos) a cada modalidade e cruzá-los com as características individuais de cada jovem. É nos factores de risco modificáveis que os diversos profissionais envolvidos devem investir. Aqui assume particular importância o papel do Treinador quer como coordenador da equipa técnica, quer como gestor de todo o processo de treino, planeando as actividades necessárias ao despiste precoce dos factores de risco minimizando o risco de lesão. Por exemplo o tipo de piso, o calçado adequado (não só à modalidade, mas também às características morfofuncionais do atleta), o equipamento de protecção (genérico da modalidade e específico do atleta) tem um impacto em termos biomecânicos diferente consoante o tempo de exposição ao risco, a história recente de lesões ou o índice maturacional dos jovens atletas. É comum, sobretudo os jovens atletas mais capacitados e dotados, jogarem e competirem em mais do que um escalão. Por outro lado os jovens com aspirações a competirem internacionalmente aumentam exponencialmente o tempo de exposição ao risco antes dos grandes eventos. O aumento não gradual do tempo e intensidade de treino cria riscos adicionais de lesão no jovem atleta em fase de crescimento/maturação, pelo que o processo de planeamento da actividade deve incorporar formas de recuperação do esforço, aportes nutricionais adequados, alternância de treino das diferentes componentes da actividade e reconhecimento de indicadores que nos indicam que os limites fisiológicos e psicológicos estão a ser testados. O planeamento do qualquer actividade desportiva (sobretudo nas modalidades colectivas) deve reconhecer as necessidades individuais de cada jovem atleta, identificar em que fase do processo de crescimento e maturação ele se encontra, conhecer os constrangimentos e limites inerentes, para que possa

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incluir componentes individuais adequadas (treino personalizado). Nestes diferentes aspectos a integração de Fisioterapeutas nas equipas técnicas pode ser uma mais-valia, desde que o acompanhamento seja longitudinal e haja um modelo multidimensional de intervenção e não apenas no tratamento pós-lesão. Este modelo exige uma multidisciplinaridade onde o Fisioterapeuta do desporto deve dar o seu contributo em diversas áreas no sentido de optimizar o rendimento desportivo dos jovens atletas, num contexto de segurança e de gestão do risco, em áreas que vão da prevenção das lesões à plena reintegração desportiva pós-lesão. Por outro lado o Fisioterapeuta deve actuar numa perspectiva de educação para a saúde, junto dos jovens atletas, pais, professores e treinadores, procurando contribuir no modelo de formação daquele jovem como atleta, com conceitos onde a marca, o record, o resultado ou a medalha não se sobreponham à saúde e bem estar do jovem. Lesões de sobrecarga nos jovens atletas Relativamente às lesões de sobrecarga também se podem apontar factores intrínsecos e extrínsecos potencialmente relacionados com este tipo de lesão (ver tabela 2) Lesões de sobrecarga mais comuns e factores relacionados com o crescimento e maturidade biológica do sistema osteo-articular Há uma susceptibilidade da cartilagem de crescimento a esforços repetitivos que excedem a sua capacidade de resistência e absorção particularmente no tornozelo, joelho, cotovelo e punho. Em casos extremos mais graves podem surgir lesões condrais (osteocondrite dissecante) que podem ter repercussões graves na morfologia anatómica da articulação podendo necessitar de intervenção cirúrgica. Este tipo de lesão nas articulações do membro superior acontecem por exemplo nas ginastas que trabalham desde muito novas com os apoios invertidos, onde essas articulações passam a suportar o peso corporal durante muito tempo e com muitas repetições. Outro tipo de consequências igualmente graves se não forem despistadas precocemente as lesões na cartilagem de crescimento são as perturbações no processo de crescimento ósseo em si mesmo (paragem parcial ou total desse crescimento). Também são comuns as fracturas de fadiga nos locais de intensa e repetitiva carga como os ossos metatársicos, a tíbia, o peróneo (nos corredores, p.ex),

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Tabela 2 - Lesões de sobrecarga nos jovens desportistas – factores de risco potencia Intrínsecos

Extrínsecos

Crescimento rápido (susceptibilidade da cartilagem de crescimento a esforços repetidos e a tensões musculares elevadas) e nível maturacional

Erros nos gestos técnicos e opções de treino inadequadas

Alterações do alinhamento biomecânico (valgismo do joelho; pés planos valgos; pés cavos, dismetrias, etc).

Opções de planeamento da época, dos macrociclos e dos micro-ciclos

Lesões anteriores não devidamente resolvidas

Variações menos controladas e menos graduais na intensidade de treino e no volume total de treino. Tempo e formas de recuperação do esforço não eficazes Limitações técnicas e nível da habilidade das tarefas fundamentais Vs tarefas de excelência Calçado e equipamento de protecção

Disfunções musculares (desequilíbrios na relação força/flexibilidade); desequilíbrios entre grupos musculares Disfunções articulares (hiperlaxidão ligamentar com instabilidade articular residual) Disfunções hormonais (ciclo menstrual nas raparigas) Treino/condicionamento individual inadequado Factores psicológicos (auto-estima, traços de personalidade, auto-percepção do risco e factores condicionantes da prática)

vértebras lombares - nos istmos articulares que podem levar a situações de instabilidade articular onde o tecido ósseo é substituído por tecido fibroso: espondilólise – (nos tenistas, ginastas e patinadores que realizam movimentos repetitivos e extremos em hiperextensão da coluna lombar associada à rotação - mecanismos desencadeantes desta situação). Existem também as lesões nos locais de inserção óssea dos músculos mais potentes do membro inferior onde também está a ocorrer o crescimento ósseo (salto pubertário). A inserção do tendão patelar na tíbia (Doença de Osgood-Schlatter) ou do tendão de Aquiles na calcâneo (Doença de Sever) são os exemplos mais comuns no jovem entre os 13/16 e os 10/13 anos respectivamente. Pode variar a idade de ocorrência destas lesões em função do sexo, do índice maturacional e das solicitações físicas colocadas aos jovens. O desfasamento entre o pico de crescimento ósseo e o pico de crescimento músculo-tendinoso, a reduzida flexibilidade desses músculos, a relativa fraqueza destes locais de inserção e o aumento das solicitações mecânicas (forças de tracção) que o jovem atleta é sujeito (p.ex multi-saltos, deslocamentos defensivos, mudanças bruscas de direcção e velocidade) com um corpo em crescimento acelerado, explicam o porquê da elevada prevalência destes problemas entre os jovens.

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Por último as tendinopatias também são um bom exemplo das lesões de sobrecarga sendo mais comuns no tendão patelar - “jumpers knee”- (basquetebol, voleibol. salto em altura e em comprimento) , no tendão de Aquiles (atletas de fundo e meio fundo), nos tendões da coifa dos rotadores do ombro (natação, ténis, badminton, voleibol, andebol) e nos tendões do punho (ténis, ténis de mesa). Lesões nos jovens atletas – factores psicossociais Mas não podemos esquecer que existem outros factores – psicossociais e sócio-desportivos - que em interacção com os descritos atrás, potenciam o risco de lesão e podem comprometer a saúde actual e futura do jovem atleta. Não sendo o principal tema deste artigo serão apenas descritos de forma muito sucinta alguns aspectos mais relevantes: - O desporto de competição e de rendimento nas camadas jovens implica um tempo de exposição ao risco de lesão muito elevado que testa continuamente os seus limites de resistência e de adaptabilidade física, psicológica e mental. - A valorização social no desporto de rendimento cria expectativas, ilusões e desejos de afirmação individual e colectiva que só é atingida por

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uma reduzida minoria de atletas. Este factor é potenciado pelo papel que os media têm actualmente na divulgação do fenómeno desportivo. - A pressão social (família, clube, colegas e pares, treinadores) mesmo que de forma subtil e indirecta centrado nos resultados (vitórias, recordes, medalhas) projecta-se no jovem que se quer afirmar e ter sucesso, o que leva que em algumas situações se corram riscos dos quais nem sempre os atletas conhecem totalmente, ou se os conhecem resolvem desafiá-los. A frase “no pain, no gain” que se ajusta para descrever o espírito de sacrifício, disciplina e capacidade de trabalho que estes jovens devem ter, pode servir para explicar situações em que ou por desconhecimento dos profissionais envolvidos ou por estarem excessivamente focados nos objectivos competitivos se vão ignorando ou desvalorizando sinais de alerta que o corpo do jovem vai dando. Por outro lado também no treino desportivo a quantidade de trabalho (volume e intensidade) nem sempre são sinónimos de qualidade. Conclusão Os jovens desportistas não são “adultos em ponto pequeno”. Têm uma dinâmica fisiológica própria, um controle neuro-endócrino e metabólico também específicos e vivem uma realidade psicológica única. Neste contexto todos os profissionais envolvidos de alguma forma na actividade desportiva de jovens atletas, incluindo os fisioterapeutas, deveriam ter uma formação pedagógico-cientifica sólida e promover a multidisciplinaridade da intervenção. O conhecimento dos padrões de crescimento e de maturação neurobiológica de cada jovem atleta, a avaliação das suas características físicas e psicossociais, o domínio dos factores de risco de lesão (extrínsecos e intrínsecos) associados à prática da cada modalidade devem constituir os pilares fundamentais da intervenção

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multidisciplinar para que os jovens atletas possam praticar um melhor desporto num contexto de maior prazer, segurança e afirmação individual e colectiva. Bibliografia American Academy of Orthaepedic Surgeons (AAOS) (2002a). A guide to safety for young athletes, disponível em http:// orthoinfo.aaos.org.em 26/01/2009 às 21.22 h. American Academy of Orthaepedic Surgeons (AAOS). (2003). Pay attention to high school sports injuries, disponível em http:// orthoinfo.aaos.org.em 26/01/2009 às 21.27 h. Caine, D., Caine, C. & Lindener, K. Epidemiology of Sports Injuries. Champaign: Human Kinetics, 1st ed, 1996. Caine, D.; DiFiori, J. & Maffuli, N. Physeal injuries in children’s and youth sports: Reasons for concern? British Journal of Sports Medicine (2006); 40: 749-760. Cassas, K. & Cassettari-Wayhs. Childhood and adolescent sports-related overuse injuries. American Family Physician (2006); 73(6): 10141022. Emery CA. Injury prevention and future research. In: Caine DJ, Maffulli N, eds. Epidemiology of Pediatric Sports Injuries: Individual Sports. Basel, Switzerland: Karger; 2005 Norris, C. Sports Injuries: Diagnosis and Management, Third Edition. Edinburgh: Butterworth- Heinemann, Elseveir Limited; 2004. Rego, F.; Reis, M.; Oliveira, R.. Lesões em Ginastas Portugueses de Competição das Modalidades de Trampolins, Ginástica Acrobática, Ginástica Artística e Ginástica Rítmica na Época 2005/2006. Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto.(2007) Vol 1, nº 2: 21 27. disponível em http://apfisio.pt/gifd_revista/pages/inicio.php Santos, J.P.; Esteves, J.; Oliveira, R.. Lesões no Judo :Estudo Epidemiológico dos Atletas dos Escalões de Esperanças e Júnior.(2003). Trabalho não publicado. Tese de Licenciatura do curso de Fisioterapia da Escola Superior de Saúde de Alcoitão. Sleet DA, Bryn S. Injury prevention for children and youth. Am J Health Educ. 2003;34:S3–S4; 2003

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REVISÃO DE LIVROS Postsurgical Orthopedic Sports Rehabilitation: Knee & Shoulder Robert C Manske DPT, MEd, MPT, SCS, ATC, CSCS, Assistant Professor, Wichita State University, Department of Physical Therapy, Wichita, KS, USA Mosby Elsevier 736 páginas, 648 ilustrações; Hardcover ISBN - 13: 978-0-323-02702-1, US $64,76 ISBN - 10: 323-02702-4 Idioma: Inglês É um livro com 736 páginas escrito por diversos autores prestigiados nas áreas da Fisioterapia, Traumatologia e Medicina Desportiva, Cirurgia Ortopédica e bem conhecidos pelas suas publicações num estilo acessível, simples, bem organizado e com 648 ilustrações (a preto e branco) de testes clinicos de avaliação, testes imagiológicos, exercícios e diversos tipos de intervenção, imagens de cirurgia. Destacamos entre outros os seguintes autores: James Andrews, George, G. Davies, Mark S. DeCarlo, Todd S. Ellenbecker, W.B. Kibler, Terry, R. Malone, Robert E. Mangine, K. Donald Shelbourne. É um livro que desenvolve especificamente as linhas de orientação terapêutica da reabilitação funcional pós-cirurgica de lesões do joelho e ombro dos atletas. São descritos diversos protocolos pós-cirúrgicos e apontados princípios para a reintegração desportiva pós-lesão. É feita uma análise detalhada da relação entre as diversas técnicas cirúrgicas e os princípios terapêuticos da reabilitação funcional desde o período pós-operatório imediato até à plena reintegração desportiva, procurando fundamentar os procedimentos na evidência científica resultante dos estudos de investigação mais actuais. O livro está dividido em 3 secções com temáticas diferentes mas complementares. A 1ª secção desenvolve os conceitos fundamentais da reabilitação funcional que depois são discutidos, aplicados, avaliados no tratamento pós-cirugico das lesões do joelho (secção 2) e do ombro (secção 3). Secção 1: CONCEITOS NA INTERVENÇÃO PÓSCIRURGICA 1. The Inflammatory Process and Post-Surgical Soft Tissue Healing 2. Post-Surgical Immobilization vs. Mobilization 3. Pre- Operative and Post Surgical Musculoskeletal Examination of the Knee 4. PreOperative and Post Surgical Musculoskeletal Examination of the Shoulder 5. Training for Strength Power and Endurance 6. Propriocepive Neuromuscular Control: Implications for the PostOperative Knee Patient 7. Propriocepive Neuromuscular Control: Implications for the Post-Operative Shoulder Patient Secção 2: LESÕES NO JOELHO 8. Anterior cruciate ligament reconstruction using Ipsilateral patellar tendon autograft 9. Anterior Cruciate Ligament reconstruction using Contralateral patellar tendon autograft 10. Anterior cruciate ligament reconstruction using the hamstring/Gracillis Autograft 11. Anterior Volume 3 Número 1

cruciate ligament reconstruction using an allograft source 12. Complications with Anterior cruciate ligament reconstruction 13. Strain Gauge Studies and Their Implications to Postoperative ACL Rehabilitation 14. Posterior cruciate ligament reconstruction and rehabilitation 15. Combination ligament injuries 16. Prevention of rupture or re-rupture of the anterior cruciate ligament. Knee Meniscus Injuries 17. Meniscus: Meniscectomy, meniscus repair, and meniscus allograft replacement 18. Complications with Meniscus surgery. Knee Articular Cartilage Injuries 19. Cartilage repair: Chondroplasty, abrasion arthroplasty, microfracture 20. OATS, Autologus Chondrocyte Implantation cartilage replacements, Mosaicplasty 21. Complications with cartilage repairs 22. Proximal and distal realignment procedures 23. Arthroscopic Lateral Release Knee Tendon Ruptures 24. Quadriceps & Patellar Tendon Ruptures Secção3: LESÕES NO OMBRO 25. Acromioclavicular Joint 26. Anterior capsulolabral reconstruction 27. Capsular shift procedures – Neer, Multi Directional Instabilities 28. Bankart Repair open and arthroscopic 29. Thermal/Laser capsulorrhaphy 30. SLAP lesions Shoulder Rotator Cuff Repairs 31. Acromioplasty, Subacromial Decompression 32. Rotator cuff repair: mini open, open 33. Rotator Cuff Repair: All Arthroscopic 34. Long Head of Biceps Tendonesis and Tendon Rupture Todos os capítulos são de leitura fácil, acompanhadas por imagens, fotografias de exercícios, esquemas e tabelas que sistematizam as ideias-chave que suportam os protocolos descritos. No final de cada capítulo há uma extensa e actual lista de referências bibliográficas. Este livro reúne as condições para ser uma excelente fonte de recurso para os Fisioterapeutas que lidam com a recuperação funcional de atletas operados quer ao joelho quer ao ombro bem como a cirurgiões e médicos do desporto.

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REVISÃO DE LIVROS The Shoulder in Sport: Management, Rehabilitation and Prevention Andrea Fusco, Andrea Foglia, Frank Musarra & Marco Testa Churchill Livingstone - Elsevier 348 páginas (preto e branco) ISBN-10: 0443068747, US $71,37 ISBN-13: 9780443068744 Idioma: Inglês

Livro especializado em biomecânica, fisiopatologia, clínica e intervenção terapêutica (conservadora e cirúrgica) nas lesões do ombro de atletas e escrito por diversos autores de reconhecido prestigio internacional. Todos os capítulos apresentam uma sólida, vasta e actual bibliografia trazendo-nos, nas diversas temáticas, os mais recentes avanços da ciência nas respectivas áreas.

Secção 4 – Reabilitação e Prevenção vários capítulos como: Modelos de reabilitação; Reabilitação no pósoperatório com guidelines actuais e fundamentadas para diversos tipos de lesão e/ou cirurgia; Terapia Manual na Reabilitação; Exercícios Terapêuticos na Reabilitação; Prevenção e Treino Físico; Prevenção e avaliação de aspectos técnicos

O livro está organizado em 5 secções: Secção 1 – Anatomia Funcional e recentes descobertas da biomecânica do Complexo Articular do Ombro (CAO) que apresenta 2 capítulos: Variações anatómicas do ombro; Biomecânica do CAO.

Secção 5 – Desafios actuais em Electromiografia (EMG) com 3 capítulos que analisam os aspectos teóricos, práticos e implicações clínicas da aplicação da EMG na abordagem das lesões do ombro dos atletas

Secção 2 – Patologia, Clinica e Diagnóstico que apresenta entre outros os seguintes capítulos: Instabilidade do ombro; Sindromes de Impingment; Epidemiologia das lesões do ombro nos atletas; Exame clínico e diagnóstico imagiológico; Exame Funcional.

Os capítulos não são de fácil leitura em virtude de a letra ser muito pequena (um aspecto menos positivo) embora haja um excelente acompanhamento de imagens, quadros e esquemas que complementam bem o texto. O estado actual da arte sobre a intervenção nas lesões do ombro do atleta tem neste livro um excelente contributo que interessa a fisioterapeutas, médicos, treinadores relacionados com fenómeno desportivo.

Secção 3 – Tratamento Cirúrgico com 3 capítulos: Critérios de inclusão para o tratamento cirúrgico; Soluções Cirúrgicas para lesões articulares; Soluções Cirúrgicas para tendinopatias e lesões musculares

Revisão por: Raúl Oliveira

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