Sound #23

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EDIÇÃO #20 | MAIO 2021 | GRATUITA

SOUND

DEBAIXO D’OLHO VEENHO

ENTREVISTA FILIPE KARLSSON

A CONTA PALHETAS


SOUNDSCOUT EDIÇÃO DE AGOSTO

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Guimarães

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índice

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agosto 2021

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Editorial

Poster Danifox

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Banda da Minha Vida Radiohead

Entrevista Jasmim

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Quiz Música 2021

The Strokes Is This It

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A Conta Palhetas

Agenda

sound #23


editorial

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agosto 2021 Ficha técnica: Diretores:Filipe Carvalho, João Lemos e Pedro Carvalho Chefes de redação: Filipe Carvalho Redação: Filipe Carvalho, André Morais, Alexandra Fernandes Marketing: João Lemos Web development: João Lemos Designer gráfico: João Lemos, Luís Lopes Revisores: Matilde Secca Oliveira Agradecimentos: Beatriz Pequeno, Ivânia Pessoa, Jasmim, Luís Lopes, Alexandra Fernandes, Miguel Rocha Créditos: Beatriz Pequeno, Ivânia Pessoa,

Jasmim, DJ Danifox, Radiohead, The Strokes, Devendra Banhart & Noah Georgeson, Jungle, Kool & the Gang

Em todas as imagens reproduzidas pela revista e/ou respectivo site, foram respeitados os seus devidos diretos de autor e devidamente referenciados na ficha técnica. Desta forma, não pretendemos infligir quaisquer danos aos seus respectivos autores, colocando sempre em evidência a sua justa e respeitada utilização. A SOUNDSCOUT apenas as utiliza de forma livre e referenciada não obtendo quaisquer lucros pela sua utilização. Mail: soundscoutoficial@gmail.com Telemóvel: 935946600 Instagram: revistasound Facebook: Sound Scout Twitter: soundscout_pt

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inte e três é a conta que alguém terá feito e é, por acaso, o número desta edição que vos apresentamos este mês.

Para variar, decidimos começar o conteúdo musical com o poster de Ivânia Pessoa, que decidiu “pegar” no single “Dark Hope” de DJ Danifox como tema para o seu objeto gráfico. A entrevista, este mês, é feita a Jasmim, através de uma conversa concretizada por Zoom, onde o artista nos falou sobre a sua carreira, a sua paixão pelo cinema e fotografia e muito mais. A Banda da Minha Vida regressa para um, para muitos, surpreendente segundo mês consecutivo com Alexandra Fernandes a ser a curadora com os Radiohead como cabeças de cartaz. O Quiz retorna para fazer um rescaldo intermédio do ano de 2021, nele podem encontrar questões sobre o que tem acontecido este ano até ao lançamento desta edição. Mais uma vez, relembro para não se preocuparem com pontuação porque mesmo que falhem todas, nós não fazemos as contas. “A Conta Palhetas” também regressa para mais uma edição. Mais uma vez carregamos no tema de pedais com o tema a virar para os seguintes efeitos: Phaser, Flanger e Octave.

Como não bastava, pensamos em trazer-vos ainda mais conteúdo. Sendo este o ano especial que marca o vigésimo aniversário do disco “Is This It” da banda americana The Strokes, o Miguel Rocha escreveu um artigo sobre a importância do álbum para a história do rock e da música no geral. Para terminar: esperamos que esta revista seja do agrado de todos vocês e, como sempre, não se esqueçam, se tiverem alguma dúvida ou até uma história que queiram partilhar connosco, não hesitem em contactar-nos. Por último, e não menos importante, tenham cuidado e vacinem-se. Bom mês e muita música!

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Filipe Carvalho



banda da minha vida

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Alexandra Fernandes

As contas parecem fáceis de se fazer: Radiohead completam, este ano, trinta e seis anos de banda, e eu trinta e quatro. Não consigo precisar quando entraram na minha vida. Tenho a sensação de que já o faziam mesmo antes de ter nascido, numa espécie de ligação visceral difícil de contextualizar e até compreender. “On a Friday”, fazendo alusão ao único dia em que ensaiavam, foi o nome da banda entre 1985 e 1991, que só alterou o nome para Radiohead a pedido da editora discográfica EMI com a qual fecharam contrato para seis álbuns. Creep, o primeiro single da banda e a música que rodou infinitas vezes pelos quatro cantos do mundo, nem sempre foi bem aceite. “Demasiado depressiva”, disseram algumas rádios à época. Hoje existem centenas de versões desta que foi, sem sombra de dúvida, uma das músicas que marcou a década de 90 e todo o percurso da banda. (Ainda não ouviram a nova versão que o Thom Yorke lançou estes dias? Façam-vos esse favor, num qualquer Youtube perto de vós.)

Sempre me pareceu delicado encaixar uma banda em determinado estilo musical. Rock alternativo ou experimental, dizem os entendidos. Essa dificuldade, para mim, advém do facto de uma banda poder ao longo do seu percurso ir variando no seu estilo. Radiohead contam com 10 álbuns de estúdio, entre os quais uma reedição comemorativa do álbum OK Computer de 1997 (em 2017) como marco dos 20 anos do álbum que cunhou a década de 90 e também o sucesso mundial da banda. Contudo, o estilo musical nem sempre se encaixou naquele rock “diferente”. Foi o que aconteceu em 2000 e 2001 com o lançamento de Kid A e de Amnesiac, respectivamente. Álbuns controversos entre os fãs da banda, com a introdução de elementos experimentais de música eletrónica e jazz. Uma vez mais, à miúda da World Music, Radiohead surpreenderam e captaram ainda mais: fazer a música que lhes faz sentido, que sentem como sua naquela fase do seu percurso e que, incontestavelmente, hipnotiza quem os segue. Radiohead acompanharam-me, (também) por isso, em todas as minhas fases. No meu quarto, sozinha; nos quilómetros de carro em viagens intermináveis; no embalo do comboio em dias de chuva; de auriculares aos berros em piruetas alucinadas como forma de libertação de energia;… frequentemente, “for a minute there, i lost myself”. E mesmo quando me ensinaram How to disappear completely, o sentido sempre foi o inverso.


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Aos quinze anos não tinha autorização para rumar sozinha aos Coliseus, pelo que a primeira vez que vi Radiohead ao vivo foi em 2012, no festival NOS Alive. Voltei, quatro anos depois, única e exclusivamente pela banda que me fez levitar durante todo um concerto. No epicentro de cinquenta mil pessoas, aqueles momentos foram só meus e da banda da minha vida. Pediu-se silêncio, entre os fãs, e o mesmo instalou-se na vasta multidão durante largos momentos. Talvez quiséssemos todos voltar ao nosso quarto, àquele abraço caloroso em que a voz do Thom sempre nos envolveu. Acredito que um concerto de Radiohead seja construído por cada uma das pessoas presentes. A banda toca, canta, atua da sua forma muito própria, quase como que para si, e toda a magia acontece cá dentro, numa vibração única e inexplicável. Não vos consigo desenhar o local para onde fui mal ouvi os primeiros acordes da Reckoner ou Nude e,

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talvez por isso, seja tão absolutamente especial. Há algo (extra) sensorial difícil de descrever na sonoridade da banda. Contudo, Melissa McCracken, artista sinestésica, conseguiu fazê-lo incrivelmente com a música Karma Police – replica essa que dá cor a uma das paredes do meu quarto. São a única banda de que detenho todos os álbuns originais, mesmo na era da disponibilização digital de conteúdos fáceis na qual vivemos. Há poucas coisas que preenchem as minhas estantes pejadas de livros mas os álbuns d’Eles são, sem dúvida alguma, uma parte fundamental. Não é segredo certamente para quem os acompanha de perto que, em 2019, foram alvo de um ataque informático que lhes levou uma série de gravações numa espécie de “coletânea” intitulada MINIDISCS. São mais de dezasseis


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horas de demos, ensaios, performances ao vivo e outros materiais gravados que não iriam ver a luz do dia caso este episódio não tivesse acontecido. Contrariedades à parte, Thom Yorke (enquanto detentor dos MINIDISCS) resolveu disponibilizar todo o material na plataforma Bandcamp durante dezoito dias (apenas) e todo o lucro das vendas reverteu para o movimento/causa ambientalista Extinction Rebellion. Este tornou-se o primeiro conteúdo exclusivamente em formato digital da banda que detenho. Dezasseis horas que respiro, com alguma frequência, devagar. Mas Radiohead não nos habituaram apenas a incríveis músicas e álbuns, mas também a verdadeiras obras-primas cinematográficas. Em 2016, pela direção de Paul Thomas Anderson, lançaram o videoclipe da música Daydreaming – uma viagem repleta de pormenores e alusões a vários momentos do percurso da banda e da vida de Thom até

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então, em busca de um destino desconhecido. “You can try the best you can, if you try the best you can, the best you can is good enough”, cantam em Optimistic. Uma mensagem que serviu desde sempre para os próprios e incontornavelmente para mim, perfeccionista, no meu percurso. Nunca gostei de fazer check-lists a cumprir. A vida consegue ser demasiado poética para nos trocar as voltas e apagar pontos (que achávamos) fundamentais. Contudo, confesso que há dois que fazem parte de uma qualquer lista de desejos: (re)vê-los ao vivo, agora numa belíssima sala; e, enquanto fotógrafa, imortalizá-los através do meu olhar. True Love Waits,

e eu esperarei, o tempo que for preciso.Magda Costa


entrevista jasmim

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Jasmim A SOUND teve o prazer de estar à conversa com o Jasmim numa entrevista que abordou temas como as muitas paixões do artista, o seu mais recente disco “Acordado ou a Sonhar” e muito mais...


entrevista jasmim

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entrevista jasmim

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Sound: Como é que tudo começou, o teu gosto pela música? Como entraste neste ramo?

Jasmim: O meu gosto pela música... Bem, penso que deve ter começado quando eu era adolescente, pelos dezasseis anos comecei a ouvir coisas diferentes e a procurar. Não ouvia apenas a música que me chegava aos ouvidos, ia à procura. Lembro, na altura nos inícios da internet, de sacar músicas no Limewire, o YouTube também já existia na altura e foi assim que comecei a desenvolver o meu gosto pela música que gosto hoje, talvez mais parecida com a que eu faço. S: Sei que fizeste parte de uma banda chamada Mighty Sands e li em algum sítio que fazias fotografia e vídeo para a banda e depois é que entraste para a parte da música…. J: É verdade.

S: A tua primeira paixão foi, então, a fotografia e vídeo? Ou a música?

“Para mim, a música sempre foi uma divindade, nunca foi algo que eu achasse que ia conseguir fazer, não pensava nisso sequer.”

Jasmim

sessão fotográfica para a revista sound

J: Para mim, a música sempre foi uma divindade, nunca foi algo que eu achasse que ia conseguir fazer, não pensava nisso sequer. Estava mesmo fora do alcance. Depois, quando tive de escolher o que queria estudar, optei por um curso de vídeo que foi a minha primeira abordagem ao cinema e fiquei fascinado por esse mundo. Decidi seguir por aí e essas acabaram por ser as minhas skills: filmar e fotografar. Tinha uns amigos que voltei a encontrar muitos anos depois de acabar o curso num festival e no Paredes de Coura, como a Teresa, vocalista dos Mighty Sands, que me mostrou umas canções que tinha feito e disse-me que estava a fazer uma banda. Eu fiquei interessado e as canções eram muito fixes, então combinamos que eu ia fotografar os ensaios e fazer um possível videoclipe, mas assim que fui ver os ensaios, descobri um novo mundo. Aquilo deume imensa vontade de participar e lembro-me que na altura, em piada, disse: “Querem que eu toque uma pandeireta, posso tocar um teclado…”. A partir daí comecei a ter aulas com ela, ensinou-me a tocar e foi um crescimento intenso, porque num mês já estávamos no primeiro concerto, eu ia tocar numa música e acabei por tocar numas cinco, estava tão motivado que comecei a tocar teclas. Desde daí nunca mais parei.


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S: Então, percebo que és autodidata. J: Sim.

S: Depois começaste a carreira a solo como Jasmim. Porquê Jasmim?

J: Na altura, a ideia de uma carreira a solo foi algo que surgiu num ensaio dessa banda que eu tinha, os Mighty Sands. Havia sempre espaço nos ensaios para mostrar coisas novas e o Chaby, vocalista, mostrou-me uns acordes na guitarra, eu disse uns versos e ele perguntou-me se era uma canção e eu disse: “Não, mas bora fazer uma”. Nasceu a primeira canção, “Primavera”, que está no Bandcamp, é uma gravação caseira que fizemos. Tinha de ter um nome, mas naquela altura ainda não havia qualquer intenção de fazer uma carreira a solo, era simplesmente uma canção que tinha feito com uns amigos, cantada em português, que era onde eu me sentia mais à vontade. Agora já não lembro muito bem como surgiu o nome, mas penso que é como escolher um nome para dar a um filho [risos]. Lembro-me também que na altura a imagem das flores, aquela beleza efémera, tinha muito a ver com as canções, algo belo mas com uma duração muito curta, penso que foi por aí, para além de que Jasmim faz-me lembrar o meu nome.

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“Penso que acabo por escrever em português por ser o meu default, é como eu sinto as coisas e como eu quero falar das coisas.” S: Referiste que te sentes mais confortável a escrever em português. Vês-te algum dia a cantar em inglês? J: Vejo na boa, até já fiz uma canção em inglês com a minha namorada, a April Marmara, ela tem um projeto de folk e canta sempre em inglês e na brincadeira fizemos uma canção juntos, e eu escrevi a letra em inglês. Penso que acabo por escrever em português por ser o meu default, é como eu sinto as coisas e como eu quero falar das coisas. Adorava também experimentar fazer uma canção em inglês, até agora não surgiu, mas quem sabe? S: Por falar nisso, tens umas letras com um sentido poético enorme e gostava de saber qual é o processo criativo disso. De onde vem a inspiração para escrever letras tão bonitas?


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J: Obrigado pelo elogio! O processo varia muito, não há uma fórmula. Talvez um padrão transversal a todas as canções e letras é que elas vêm sempre de uma experiência intensa, algo que foi vivido e sentido. Sem isso não conseguia ter matéria para escrever, é difícil fazer um exercício abstrato e pensar numa personagem. Se aquilo não me disser nada, eu não consigo ter pontos de conexão. Então penso que é algo comum em todas as letras. No outro dia fui ao cinema e já não ia há algum tempo, e o cinema para mim é um sítio incrível para pensar e ter ideias. Também gosto de ler algumas coisas, deve sair daí alguma inspiração, sem dúvida. Depois a questão da tentativa/erro, também, no processo e na aprendizagem, cada canção é uma descoberta, é uma nova forma de fazer.

S: Falando do cinema, quais são as tuas maiores inspirações e maiores ídolos do mundo do cinema?

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J: Gosto muito do Leo Carax, o John Cassavetes também. Lembro-me de quando vi os primeiros filmes dele pensei: “Claro que o cinema é isto, ainda bem que o cinema é isto e tem de ser isto”. Agnès Varda também, a nouvelle vague. São tantos, que ficamos aqui a falar de cinema imenso tempo. Gosto muito de cinema, sou um amante de cinema.

(Sobre o disco)“Penso que desta vez as coisas também foram feitas com mais tempo, pensámos mais antes de lançar as coisas e acho que chegámos a um número maior de pessoas, e isso sente-se.”


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S: Lançaste um álbum há pouco tempo, como é que tem sido a receção?

J: Tem sido uma ótima receção. Penso que desta vez as coisas também foram feitas com mais tempo, pensámos mais antes de lançar as coisas e acho que chegámos a um número maior de pessoas, e isso sente-se. Há muita gente que ainda não ouviu, é normal, não tem uma altura certa para ser ouvido. Faltam-nos os concertos, claro, mas é normal por causa de tudo o que tem acontecido. S: Faço a ponte para perguntar como é que foi o teu 2020? Aproveitaste para gravar o disco presumo… J: Estivemos todo o ano de 2020 a gravar, de facto, foi algo que nos manteve ali com um objetivo, não estávamos sempre a pensar que não havia concertos. Tínhamos um objetivo para cumprir e foi um ano dedicado a gravar disco, sem dúvida. S: E agora tens oportunidade de apresentá-lo, e tens vindo a fazê-lo nos últimos meses, nós até fizemos a cobertura no ZDB. Como têm sido esses concertos? Como é que te tens sentido em palco?

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J: Ótimo, são umas saudades enormes, ao mesmo tempo parece que é o primeiro concerto. É tudo novo outra vez. Estamos com muita vontade de fazer isso, de voltar a tocar para pessoas e de ir a concertos também. Para ser o lançamento perfeito, só falta mesmo conseguir apresentar o disco ao vivo em todo o lado. É só isso que falta.

(Sobre a banda) “As pessoas que tenho neste momento são as pessoas mais importantes da minha vida, não só na música mas na vida.” S: Voltando um bocado atrás, tens a tua banda, a Bia, o Humberto e a Violeta. Como é que se juntaram?


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J: A Violeta foi a primeira pessoa de sempre que ouviu a minha música fora do meu grupo de conforto que era dos Mighty Sands, uma amiga minha de longa data, de outras aventuras. Na altura, eu queria ter um outro instrumento para além da guitarra e da minha voz e queria ter um sopro e lembrei-me de falar com ela, e aceitou logo. É a pessoa que está desde o primeiro dia. Depois, a banda já teve muitas pessoas diferentes, o Filipe Sambado já tocou baixo, a Teresa Castro já tocou baixo, o Pedro Morrison que estava nos Mighty Sands já tocou bateria. Esta formação é talvez a mais duradoura. Também gosto da ideia de ter músicos diferentes em função do que as canções pedem, sempre foi algo que quis, não limitar. As pessoas que tenho neste momento são as pessoas mais importantes da minha vida, não só na música mas na vida. O Humberto é um dos meus melhores amigos, a Bia é a minha parceira e a Violeta é o meu braço direito desde o primeiro dia que agora está em Berlim, também, a lutar pela vida na música. S: No ano passado, participaste no Vodafone Inéditos e foste um dos vencedores com “Aqui Não Falta Nada”, canção que abre o disco. Como é que foi essa participação? O processo disso e depois incluir a canção no disco…

16 - Sound, Outubro 2019

J: Foi mais ao contrário, já estava a gravar e em estúdio, e o Miguel Vilhena, produtor deste disco, que foi uma pessoa importante e toca connosco também, falou-nos na altura deste desafio da Vodafone Inéditos. Como já estávamos a gravar e a música na altura não estava totalmente gravada, acabámos por acelerar o processo e eu gostei muito do resultado, acho que tem uma vibe espontânea, com alguns erros na voz, respirações, coisas que normalmente se costuma limpar. Decidimos mandar a música como estava, e quando recebi a chamada - estava no estúdio, só com o Miguel que é normalmente quem está comigo quando eu faço os discos, gosto de estar só com o produtor – liga-me um número desconhecido, eu ponho em voz alta e recebemos a notícia. Foi muito giro, partilhámos os dois essa alegria. Para nós foi muito importante, porque se não tivesse sido esse prémio, eu não sei como é que o disco tinha sido pago, só com empréstimos ao banco. [risos] S: Também tiveste direito ao vídeo que acho que também fazia parte do concurso…

J: O vídeo fazia parte das regras, tínhamos de entregar uma música e depois tínhamos alguns dias para entregar um vídeo. S: Foste tu, então, que o realizaste.


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“As músicas que faço têm de ter sempre qualquer coisa além. (...) É um bocadinho mais, é um trabalho de colagem, de tempo também, e é assim que as coisas fazem sentido para mim.” J: Por necessidade e por gosto também. Por necessidade porque, na verdade, se pudesse adorava trabalhar com outros amigos mais experientes e muito mais capazes. Por gosto, porque também gosto de fazer os videoclipes, embora seja uma canseira. [risos] S: [risos] Acredito, sei que também realizaste o da Marinho também.

J: Eu adoro realizar videoclipes, dá imenso espaço para curtir.

S: E acho que é uma coisa que tu tratas de uma maneira que poucos tratam, como tratas do vídeo, da fotografia, em vez de ser só a música, tudo é um conjunto. Queria perguntar-te se achas que isso é importante para um artista no século em que

estamos. Não se preocupar só com as músicas, mas sim com toda a imagem que envolve.

J: Obrigado, e ainda bem que reparas nisso. Eu

tento ir sempre além do que está à superfície. Lembro-me, na altura, de estar com a Marinho, e ela dizer: “Quero uma coisa muito assim, uma coisa bonita…”. Eu percebi, mas depois não me ocorreu nada, porque precisava de mais, precisava que ela me dissesse. Tudo é um processo para chegar a algum sítio, e não consigo visualizar algo ou ter ideias sem essa matéria, o que quer aquilo dizer, de onde veio, porquê… Penso que isso também é transversal no que eu faço. As músicas que faço têm de ter sempre qualquer coisa além. Não o faço despreocupadamente ou só por fumar um charro [risos]. É um bocadinho mais, é um trabalho de


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colagem, de tempo também, e é assim que as coisas fazem sentido para mim. S: Nota-se claramente na tua música que tudo se liga com o que fazes depois. Não sei se vais concordar com isto, mas a tua música faz-me lembrar muito tardes de sol, sentados no jardim…

J: [risos] Eu acho uma referência incrível, sim. Para mim, aquele disco Culto da Brisa tenta captar muito essa sensação de bem-estar e foi daí que surgiu o nome, eu dizer à malta: “Quero que isto soe àquela brisa no verão de fim da tarde…”. Agradeço essa referência, as comparações deviam ser mais abstratas como a que fizeste, “faz-me lembrar uma tarde de brisa…”, ótimo. [risos] É mais interessante assim. S: Apesar de teres uma música chamada Inverno. [risos] J: [risos]

S: A tua canção “Tudo/Nada” faz muito lembrar música brasileira, não sei se foi uma grande influência para ti, para a tua carreira musical…

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J: Sem dúvida é uma super influência, e cada vez mais! Cada vez mais mergulho nesse mundo da música brasileira. Ao longo da minha vida toda continuo a descobrir música brasileira incrível todos os anos, todos os dias. Primeiro as bossas, que é mais fácil de conhecer e quando começas a ir ao fundo, é infinito mesmo.

S: É um mundo sem fim. Daí querer perguntar-te quais são as tuas maiores influências. O que tens ouvido nestes dias? J: Agora aproveito que estamos a falar de música brasileira e falo-te em Caetano Veloso. É impossível falar de música brasileira e não falar em Caetano, assim como o João Gilberto e Erasmo Carlos. O Miguel mostrou-me um nome que eu gostei muito, o Arthur Verocai. Sem ser Brasil, Bill Callahan é das grandes pedras da minha música. Quando o ouvi pensei logo que queria fazer música assim, letras poéticas, com imagens incríveis e depois a cena folk psicadélica. Julia Volter, gosto sempre de falar dela, também é uma compositora incrível, imprevisível. Tanta coisa… Fleet Foxes, curti muito do Shore. Gosto muito de ouvir música [risos].


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“Quando começas a fazer uma música não tens essa confiança para concluir se está ou não bom. As referências funcionam como uma espécie de validação.” S: Há bocado disseste que precisavas dos sopros porque achavas que fazia sentido usar. Pergunto-te se soubeste disso porque ouviste sopros em músicas de que gostas.

J: Sim, sem dúvida. Na altura, quando comecei a fazer música, era mesmo um zero, eu não tinha qualquer noção. Lembro-me que na altura andava a ouvir muito Bill Callahan e naquele disco em específico, o Dream River, tem muito o contraponto do clarinete. Eu sabia que a Violeta tocava sopros e pensei logo em ver como ficava, mas sempre com a comparação dos artistas que falo. Agora tenho mais experiência e já acho que não preciso tanto de ter essa referência para me dar a permissão de escolher seja que instrumento for.

S: Eu acho que tens razão, as nossas referências e influências claramente que nos ajudam no que queremos fazer, ou seja, se vou fazer um disco, quero que soe como uma coisa que já ouvi. J: Penso que até seja mais do que isso. Quando começas a fazer uma música não tens essa confiança para concluir se está ou não bom. As referências funcionam como

uma espécie de validação. É importante, aos poucos, experimentar aquilo que está feito e que sabemos que gostamos.

S: O que é que vem a seguir para a tua carreira? Pergunto se vais fazer um filme… [risos]

J: [risos] Ainda há uns dias atrás, estreou uma curtametragem no Vila do Conde e eu fiz a assistência de edição. Foi uma curta-metragem que o meu irmão realizou e isso reanimou-me a vontade de filmar, porque o meu irmão não estudou cinema, ele é físico e decidiu fazer um filme. Essa vontade de fazer é uma coisa que eu adoro, um filme é um sonho, mas talvez não seja para já. Na música também encontrei um sentimento e coisas que eu precisava de dizer, e consegui dizê-las, e quando tiver algo que eu queira muito dizer em cinema, em imagem, vai ser uma coisa que vai acontecer.

S: Entretanto sempre podes combinar ambos com os videoclipes. Como os Fleet Foxes, de quem falaste há pouco, que fizeram com o Shore um filme de uma hora que acompanhava o disco.




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Is This It

Convidado: Miguel Rocha Estudante no Instituto Superior Técnico. Redator no Espalha-Factos.

É complicado estabelecer o que perfaz um disco com o rótulo de clássico. Para uns, apenas o tempo ditará isso. Para outros, é o impacto imediato que causam, levando a uma transformação de toda a paisagem do mundo da música. No caso dos The Strokes e do seu disco de estreia Is This It, lançado entre o verão e outono de 2001, estamos perante ambos. Em 2001, a paisagem do mundo da música – em particular do rock – era dominada pelo nu metal e pop punk que chegaram a esse estatuto na era do pós-grunge e pós-britpop. Com o lançamento de Is This It, e todo o hype que havia em torno dos The Strokes após o lançamento do EP The Modern Age, no início de 2001 (que os levaria a assinar pela RCA Records numa autêntica guerra entre gravadoras), dar-se-ia entrada numa nova fase para a música de guitarra, que viria a marcar praticamente toda a década dos anos 2000. O sucesso de Is This It e dos The Strokes levaria a que gravadoras tentassem encontrar bandas com características semelhantes à banda novaiorquina. Jovens, estilosos e apresentando canções povoadas de melodias e hooks que soavam vindas do passado, mas atualizadas para o presente. Em suma, uma nova era para o rock alternativo, levada a cabo por um ressurgimento do garage rock, estava prestes a iniciar-se. Em retrospetiva, com tudo o que já foi dito sobre o LP de estreia dos The Strokes, é mais

fácil analisar o que o torna tão importante e aclamado. Em primeiro lugar, e rapidamente notamos nisto com a faixa que abre o trabalho, é a própria sonoridade do disco. É extremamente simples, soando quase totalmente relaxada, como se um grupo de amigos se tivesse juntado numa garagem para gravar as faixas. Uma estética DIY, quase. A própria produção do disco levada a cabo por Gordon Raphael, crua e com um toque de lo-fi, profundamente influenciada pela produção do disco The Velvet Underground & Nico, revela precisamente essa sensação, conferindo-lhe um toque nostálgico, mas futurista ao mesmo tempo. Esta estética retro futurista é a segunda chave para o sucesso de Is This It. O disco traz na sua manga as suas influências, isso não há dúvida, mas a questão é como a banda as incorpora na sua sonoridade. O melhor exemplo disto talvez seja “Last Nite”, com a sua melodia a ser retirada da faixa “American Girl” de Tom Petty, para ser incorporada num pedaço perfeito de pop rock onde Julian Casablancas canta, de forma melancólica, sobre as suas experiências românticas. E “Last Nite” não é o único exemplo que mostra esta incorporação de influências. Veja-se o exemplo de “Barely Legal” (onde o muito subvalorizado baixo de Nikolai Frature segura o low end da faixa como poucos) ou “Hard To Explain”, que apresentam as baterias de Fabrizio


Is This It

Moretti a soar algo inorgânicas, construindo ritmos quase robóticos, semelhantes às drum machines predominante encontradas no new wave dos anos 80. No entanto, quando estes ritmos são combinados com as guitarras melódicas e intercaladas de Albert Hammond Jr e Nick Valensi, influenciadas pelo proto-punk e garage rock original, o resultado é algo energético e libertador, quase catártico de uma forma urbana. E esta é a terceira e talvez principal razão para o sucesso e influência que Is This It veio a ter. Esse sentimento de catarse surge na música em grande parte pelo quão jovem era a banda no momento de gravação deste trabalho. Isso reflete-se na sua sonoridade, mas, principalmente, nas líricas escritas por Casablancas. São diretas e contam histórias de um jovem a tentar perceber o seu lugar no mundo, enquanto tenta formar uma banda de rock. Os melhores exemplos da escrita de Casablancas são as faixas “Trying Your Luck” – a mais melosa do disco – e “The Modern Age”, que demonstra bem a capacidade da banda de construir muito a partir de pouco, e onde Casablancas demonstra as suas inseguranças de jovem perante o mundo que o rodeia. Com Is This It, os The Strokes colocaram os olhos no mundo do rock alternativo e iniciaram uma nova era para este, que viria a influenciar bandas como The Libertines, Bloc Party, Franz Ferdinand ou, mais importante que estas, os Arctic Monkeys.

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A Conta Palhetas


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A Conta Palhetas: Guia prático para o músico com orçamento Agosto está aí e com esta edição vamos terminar o nosso capítulo de pedais. Cobrimos ao longo desta edição mais três tipos de efeitos que podemos classificar como essenciais, pois em função da sonoridade que procuram poderão adicionar algo mais. Falamos hoje de pedais PHASER, FLANGER e OCTAVE. Agora têm toda a informação para se lançarem no mundo dos pedais de efeitos para guitarra. Toca a escolher!


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Phaser Um dos efeitos mais antigos criado originalmente para imitar a sonoridade díspar de órgãos rotativos, mas ainda bastante utilizado nos dias de hoje. Na sua essência, um pedal de PHASER utiliza o sinal original com a captação do mesmo, mas modulado numa frequência diferente (fase) permite texturizar o som e é especialmente eficaz em ritmo mais lento e não tanto em notas singulares seguidas. Um bom exemplo é a sonoridade dos primórdios de Van Halen.

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ELECTRO-HARMONIX SMALL STONE NANO (ENTRE OS 100€ E 120€) Uma opção excelente para quem procura os sons clássicos de um pedal de Phaser com um toque de modernidade e um pouco mais de complexidade nos resultados. Abordagem user friendly também com um belo pormenor que o destaca em relação aos rivais – um switch de color – permitindo uma mudança na frequência de sinal mais acentuada. Querem perceber a que soa este pedal? Radiohead!

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MXR PHASE 95 (ENTRE OS 90€ AOS 100€) Um update do clássico PHASE 90 carregado apenas com o essencial! Simples demais de usar, permitindo desde sons vintage a sons mais modernos. Boa abordagem (com alguma manobra para modular o efeito) e o detalhe da portabilidade com o seu tamanho mini nem espaço ocupará na pedalboard. Um controlo mestre e quatro modulações, simples. 1

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Flanger Um efeito controverso que exige sabedoria (mas acima de tudo paciência) para utilizar de forma eficaz. Basta imaginar o som de um avião a passar junto dos ouvidos. A sonoridade é interessante quando esta é bem empregada, estilo Tom Morello dos RATM, permite uma espécie de efeito Chorus sem a alteração de afinação e o som prolongado como um atraso. 3

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MOOER E-LADY (CERCA DE 60/70€)

Uma opção económica em relação ao “verdadeiro” pedal que pretende recriar, apresenta-se na nossa lista para o guitarrista moderno que se pretende iniciar com calma nos gastos. Com alguns efeitos clássicos de Flanger e menos versatilidade do que esperado é, não obstante, um bom pedal para fãs de rock progressivo através do seu tom quente e agradável na palhetada. Poderá não agradar a todos, mas recomendamos!

BOSS BF-3 (CERCA DE 120/130€)

Flanger não é o tipo de efeito que agrade a toda a gente, isso é certo, mas para quem opta por qualidade e alguma versatilidade com o BOSS BF-3 é possível! Carregado de tons/ efeitos impossíveis de descrever, mas que nas mãos certas conseguiriam encaixar na sua tonalidade. Relativamente único nas expressões e modulações, permitindo algumas alterações, e o bónus é o facto de poder ser utilizado da mesma maneira ao vivo como no estúdio (Stereo) e apresentar a robustez típica da Boss.

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A Conta Palhetas

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Octave Um efeito muito simples de entender. A ideia de um pedal de OCTAVE é pegar numa nota (no seu tom original) e alterar precisamente uma oitava (subir ou descer). Tendo em mente que uma oitava representa doze notas, é fácil de perceber o conceito. Alguns pedais omitem o sinal original e emulam já com o efeito, e outros permitem que ambos se misturem, e com isso seja possível criar uma sonoridade bastante interessante.

NU

S

Volume

Tal como o nome indica – VOLUME! Um pedal óptimo para quando necessitamos de um extra volume e temos as mãos ocupadas a tocar. Estes pedais podem ser utilizados como “mestre” para todo o sinal, ou usar numa outra posição da cadeia de pedais para aumentar o volume apenas em efeitos específicos. É necessária criatividade e ponderação nesta aparente simplicidade. Deixamos a nossa melhor sugestão: 7

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BOSS OC-3 DUAL SUPER OCTAVE

BOSS FV-500H (CERCA DE 80€/90€)

Durabilidade típica da Boss. Cumpre a sua função tal e qual para o que fora criado, não se Excelente pedal para quem não se quer pode exigir mais! preocupar. Como? Simples, a adição mais Encerramos a nossa rubrica de efeitos, e relevante neste pedal: POLIFÓNICO. Significa com ela poderão escolher e experimentar que podemos tocar várias notas seguidas sem a preocupação da tonalidade. Com este pedal pedais com alguma informação do vosso lado. podemos arpejar notas e tocar pequenas Deixamos uma pequena nota: experienciem melodias para acompanhamento. Uma com as vossas mãos e permitam a vocês mesmos descobrir o que vos falta para “aquele excelente adição! É ainda possível tratar de detalhes como som”. No entanto, o músico é que faz a música baixar/elevar duas oitavas ao sinal sem grande e cada um terá resultados diferentes com o 5 preocupação. Directo na abordagem, funcional e complexo na tonalidade.

(CERCA DE 190€)

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ELECTRO-HARMONIX MICRO POG (ENTRE OS 170€ E 190€)

Um pedal espectacular e versátil, nada mais se pode dizer. Representa de facto um certo investimento no orçamento, mas se procuram emular o som da vossa guitarra e transformar numa guitarra de 12 cordas ou mesmo um órgão, é o ideal. Graças ao tratamento que o pedal aguenta nos graves, é uma excelente ferramenta para o músico moderno. Recomendamos!

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30 - Sound, Outubro 2019


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