Desumanização na medicina: Os impactos do erro médico - Beatriz Magalhães

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1. INTRODUÇÃO Segundo um levantamento do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar da Universidade Federal de Minas Gerais (Iess-UFMG), com base em registros de prontuários de 182 hospitais do país, de abril de 2017 a março de 2018, entre as 19,4 milhões de pessoas tratadas em hospitais no Brasil, 1,3 milhão sofre pelo menos um efeito colateral causado por negligência ou imprudência durante o tratamento médico. Além disso, quase 55 mil pessoas morrem por ano no país, o equivalente a seis por hora, por causa dos chamados erros médicos. Engana-se quem acredita que a grande repercussão da responsabilidade médica e das demandas por eventos adversos e negligências médicas surgiram apenas nas últimas décadas do século XX. A legislação sobre imperícia médica e sua cominação podem ser encontradas nos primórdios da medicina, por meio de escritos históricos, como, por exemplo, o Código de Hamurabi, que inscreveu no século XVII a. C várias normas, prevendo penas para os médicos incompetentes ou desastrados. Naquela época, a responsabilidade jurídica do médico em caso de atuação de má qualidade era baseada na expressão “olho por olho, dente por dente”, conhecida como lei de talião (ou lei de retaliação), criada na Mesopotâmia. Diante de inúmeros códigos e tradições em diferentes regiões, surge em Roma durante a época do Império, em torno de 286 a.C, a Lei de Aquilia, um marco fundamental para a aplicação da culpa na obrigação de indenizar quando uma ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar o direito e causar dano a outro. O erro médico na visão do leigo é a antítese da magia inerente aos deuses, ou de quem ungido do poder divino dispõe do poder de cura, isto é, o poder que remite o erro natural. Haja vista que o conceito de doença na medicina antiga era exatamente de que aquele que cura absolve a culpa, desfaz o erro de origem do semelhante. Por isso, soa como despropósito que o médico possa ele também errar. Entretanto, com o passar dos anos essa visão foi sendo constantemente atualizada e, desde 1988, o erro médico é definido pelo Conselho Federal de Medicina, como uma falha médica no exercício da profissão, ou seja, uma conduta profissional inadequada e resultada da ação ou omissão de um médico que, por inobservância, produz dano à vida ou à saúde de outro. Atualmente, o erro médico tem relevância no meio da medicina circundando fortes discussões, principalmente, devido à crescente judicialização da saúde – termo


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