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Decupagens e questionários respondidos

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Diário de campo

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DECUPAGENS E QUESTIONÁRIOS RESPONDIDOS

Entrevista com Fernando Polastro, fundador e voluntário da Abravem, via whatsapp em 22/04/2020

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A respeito do surgimento da entidade foi o seguinte, a cerca de 10 anos atrás um grupo de amigos estava reunido em um evento social e estávamos conversando a respeito dessa questão do erro médico e descobrimos que todos que estavam ali falando naquele momento haviam passado por isso direto ou indiretamente dentro da família e, absolutamente ninguém havia se movimentado na busca dos seus direitos. Nós chegamos a uma conclusão que se nós pessoas de um nível intelectual razoavelmente alto não havia se movimentado nesse sentido, imagina o que ocorre na esfera menos favorecida da população, principalmente, as pessoas que estão submetidas ao atendimento do SUS. A partir de então, eu, uma advogada e um médico, pessoas que estavam naquele momento, resolvemos ajudar uma pessoa, que era filha de uma diarista da casa de um desses amigos que estavam passando por um problema como esse e nós ajudamos essa pessoa, a partir daí, o boca a boca fez com que outras pessoas nos procurassem e nós passamos a auxiliar pessoas nessa demanda de erro médico. A coisa foi crescendo até que cerca de 3 anos atrás, nós institucionalizamos esse trabalho, porque como cresceu, ficou um pouco fora do nosso controle, principalmente, criando mecanismos para que as pessoas pudessem nos encontrar de uma forma mais fácil. Foi nesse momento que nós demos o nome de Abravem, criamos um site e a partir daí, o projeto explodiu. Hoje, nós auxiliamos pessoas em todo o país e temos feito esse trabalho voluntário. Já atendemos mais de 1000 pessoas. A média é de cada dez pessoas que nos procura, uma se torna ação e, em torno de, 50% a 60% dos casos que avaliamos, não é identificado o erro médico. Nosso trabalho consiste basicamente em realizar uma análise técnica tanto da área médica como jurídica e dizer para as pessoas se elas realmente foram ou não vítimas de erro médico e quais os caminhos a serem seguidos. Pouquíssimas pessoas estão dispostas a falar, o erro médico é algo que causa sofrimento, se abate sobre a família, então é muito difícil para as pessoas expor essas questões.

Questionário respondido por voluntários da Abravem, via e-mail em 22/05/2020

1. Vocês prestam atendimento a sociedade que é vítima de erro médico em todas áreas que competem à saúde? Sim. O termo correto seria “erro do profissional de saúde”. Utilizado erroneamente, o termo “erro médico” tornou-se comum em função do médico representar o ápice da pirâmide dos prestadores de serviços da saúde.

2. No portal, consta uma informação de que a negligência é a causa mais comum de erros nos hospitais do sistema público. Essa informação está baseada em algum dado da instituição ou com base em pesquisas gerais? Existem pesquisas a respeito, porém as mesmas estão desatualizadas. No entanto, levamos em consideração a experiência de nossos colaboradores no campo de direito e medicina, dentre os quais existem advogados e médicos com mais de 20 anos de experiência prática no tema.

3. Vocês dizem que os profissionais da saúde com capacidade técnica e senso humanitário são exceção à regra, porém com base em pesquisas, inúmeros profissionais rebatem essa informação dizendo que a mídia é sensacionalista ao informar sobre erro médico e que somente o responsabilizam nesses casos, esquecendo ou ignorando outros fatores como falta de estrutura dos hospitais, escassez de medicamentos etc. Como a associação vê toda essa situação?

Um exemplo: no ano de 2017 morreram 829 pessoas por dia (dados do Instituto

Nacional de Saúde Suplementar) no Brasil devido a condições adversas adquiridas em hospitais, dentre as quais a infecção nosocomial é o carro chefe.

Pesquisas mostram que, se os profissionais de saúde lavassem as mãos entre o atendimento de um paciente e outro esta quantidade de infecções hospitalares seria reduzida em mais da metade.

4. É possível responder o porquê a classe médica tende a ser, na maioria dos casos, arrogante e vaidosa? Se sim, de que forma vocês acreditam que esses atributos influenciam direta ou indiretamente nos erros médicos? Não é possível responder. Embora o juramento hipocrático seja eminentemente marcante como exemplo de atitude a ser seguida pelos médicos, infelizmente ele é apenas um elemento insignificante das cerimônias de formatura. As

escolas de medicina – via de regra – são ruins e não aplicam mais a cadeira de deontologia médica.

5. De que forma a mercantilização da medicina tem influenciado na relação médico-paciente? Nos dias de hoje, o paciente particular é uma exceção, encontradiça apenas em consultórios de médicos famosos. Os profissionais vivem de SUS ou de planos de saúde e precisam atender quantidade para garantir um volume econômico satisfatório ao final do mês. Nestas condições há um grande esgarçamento da relação médico/ paciente e uma deterioração evidente no resultado da medicina.

6. Qual seria a melhor saída para diminuir ou combater o corporativismo médico?

Não temos resposta para esta questão.

7. Vocês reúnem algum tipo de gráfico ou relatório com o número de pacientes que os procuram? Caso sim, é feito algum levantamento de dados com relação ao número de pacientes atendidos, o número de processos jurídicos que ganharam, tempo médio para as ações e afins? Sim, temos o registro de todas as pessoas que solicitaram auxílio a entidade. Já atendemos ao todo mais de mil pessoas em todo país. Somente cerca de 10% a 15% dos casos que nos são submetidos tornam-se ações na justiça. Em torno de 50% a 60% deles não identificamos erro ou possibilidade de agir juridicamente. A média de êxito nos casos de erro médico fora da ABRAVEM é em torno de 25%. Na ABRAVEM invertemos este número: cerca de 70% de êxito. O tempo das ações depende de diversas variáveis: local em que é julgado, número de recursos que as partes utilizam etc.

8. É possível estabelecer um checklist de documentações necessárias para comprovar um erro médico ou varia muito de caso a caso? Tudo começa por um relato extremamente detalhado do caso, fornecido geralmente pelo próprio paciente ou por seus familiares. Após entendermos o caso solicitamos todo tipo de documentação que possa dar lastro probatório ao relato. Os mais comuns são: prontuários, exames, laudos, relatórios médicos, atestados, fotos, vídeos, áudios etc.

9. É determinado algum prazo para a vítima ou família ser notificada com relação aos resultados da avaliação técnica médica e jurídica feita pela Associação?

Não existe um prazo determinado. Tudo depende de nossa demanda e da disponibilidade, principalmente dos voluntários da área médica. Em determinados períodos retornamos após uma semana, porém em outros chegamos a demorar mais de 40 dias.

10.O relatório que determina se o paciente foi ou não vítima de erro médico é entregue somente pessoalmente para que haja um cuidado ao explicar a situação ou vocês costumam encaminhar de outras formas? Geralmente o relatório é bem fundamentado e claro (numa linguagem acessível a todos).

Ainda assim, esclarecemos quando solicitado, aspectos de nossa análise/raciocínio. Como atendemos pessoas de todo país (contatos remotos) geralmente os relatórios são enviados eletronicamente.

11.Como fazer com que a sociedade no geral, lide com essa dor da perda/do dano e lute por justiça, uma vez que elas são desacreditadas por familiares, profissionais, às vezes até midiaticamente? Realmente existe um movimento comum entre os contatos mais próximos em desestimular àqueles que buscam respostas e caminhos nas questões de erro médico. Desta forma, buscamos conscientizar vítimas e famílias sobre seus direitos e mostrar que as consequências da condenação desses profissionais tem a função didática de evitar que eles continuem agindo de forma a ocasionar danos a outros, tornando os profissionais mais cautelosos, mais bem formados, mais diligentes no trato de seus pacientes. Percebemos que o sofrimento imposto à vítima ou a sua família é, em muitos casos, responsável pela omissão, medo e descrença na busca de seus direitos, porém a experiência nos mostrou que somente a justiça – em suas mais variadas esferas - é capaz de amenizar a dor dessas pessoas. A condenação de um profissional de saúde e o pagamento de indenização não são aspectos capazes de restabelecer todos os aspectos emocionais, porém certamente restabelece a dignidade e a sensação do dever cumprido.

12.Durante uma entrevista, você mencionou que estavam em busca de psicólogos para auxiliar as vítimas de erro médico. Vocês conseguiram atender essa necessidade? Ainda não.

13.Em complemento a pergunta anterior, como funciona esse atendimento psicológico para as vítimas e familiares? O erro médico geralmente abate-se sobre toda família com a particularidade de causar extrema revolta nos envolvidos. Notamos ao longo do tempo que tanto vítima quanto familiares, necessitam de tal suporte, pois em alguns casos, o êxito numa ação judicial não é o suficiente para amenizar a dor de uma sequela deixada ou a perda de um ente querido perdido prematuramente.

14.No site consta que a Associação começou em 2000, mas da última vez que conversamos você comentou que a associação surgiu a cerca de 10 anos atrás, poderia explicar um pouco melhor essa questão do surgimento da

Associação? Não, o site menciona “início dos anos 2000”. Considerando que estamos falando de um intervalo de mil anos, 2008 ou 2009 (quando auxiliamos a primeira pessoa) certamente encaixa-se como “início” deste milênio. Durante uma reunião informal entre amigos descobrimos que todos possuíam casos de erro na família e de que nenhum de nós acionou a justiça. Assim, resolvemos auxiliar (eu, uma advogada e um médico) a filha de uma diarista que atuava na casa de um destes amigos. Obtivemos êxito nesta ação e a partir de então passamos a dedicar voluntariamente nosso tempo para lutar por um desfecho digno e justo para as vítimas de erro médico. Somente há cerca de 5 anos é que institucionalizamos esse movimento na formatação de ABRAVEM.

15.A estratégia utilizada para chegar até a população continua sendo o be to be (boca a boca) ou é feito algum tipo de marketing/divulgação para que as vítimas conheçam a associação e tenham acesso a ela? Não realizamos nenhum tipo de ação de comunicação para difundir nosso trabalho, até porque não temos receita para tal. A maior parte daqueles que nos procuram nos encontram através de pesquisas na internet. Outra grande parcela, através de indicações de conhecidos ou de autarquias ligadas a justiça, como MP, delegacias e escritórios jurídicos.

16.Com relação as causas que foram perdidas juridicamente, é possível destacar algum elemento que foi crucial na determinação do juiz? Notamos ao longo dos anos que o ponto mais frágil no decorrer das ações é o parecer dos peritos nomeados pelos juízes.

17.Como é organizado os custos da associação como um todo? Não temos receitas e geralmente os custos são embutidos nas atividades profissionais do dia a dia de cada voluntário. Exemplo: o escritório da ABRAVEM, na verdade é o escritório onde eu (Fernando) atuo profissionalmente.

18.A equipe médica ainda é composta por 8/9 voluntários? Para ser mais preciso, atualmente 8. Nossa maior dificuldade reside em encontrar profissionais da área da saúde que colaborem com este voluntariado.

19.Quantas pessoas hoje compõem a associação como um todo? Como é feito essa distribuição? Em torno de 14. Metade atuando no corpo técnico médico, outra metade no corpo técnico jurídico e eu (que não sou nem médico nem advogado) que faço o atendimento a todos que nos procuram, gestão do tráfego das informações e atendimento a demandas institucionais (entrevistas, pesquisas etc).

20.Verifiquei que o atendimento a outros estados é feito de forma digital, poderia explicar um pouco melhor como funciona esse processo? Basicamente solicitando toda informação através de canais eletrônicos (e-mail, compartilhamento via drives, telefone, aplicativos de mensagens etc.).

21.Como vocês buscam voluntários para a Associação? Não buscamos. Os que atualmente nos ajudam, conheceram nosso trabalho e se ofereceram para atuar como voluntários. Creio que iniciaremos uma busca na questão do auxílio psicológico.

Entrevista com Albaneide Magalhães, mãe da vítima de erro médico, Vitor Mendes, realizada pessoalmente em 16/08/2020

Algumas anotações:

Entrevista com Albaneide Magalhães, mãe da vítima de erro médico, Vitor Mendes, via whatsapp em 27/10/2020

“Caso vocês tivessem demorado mais dez minutos, ele não haveria resistido. A

traqueia dele está muito lesionada e o pulmão comprometido, precisamos agir, urgente”.

“Eu sinto muita raiva pelo o que eles fizeram com o meu filho. Sempre procurei que ele fosse atendido por bons médicos, mas me sinto incapaz de não ter evitado tanta negligência. Infelizmente, somos leigos e acabamos por aceitar tudo que é falado”.

“Eles alegavam que o meu filho estava com morte encefálica, mas nenhum laudo comprova isso. É algo que me dói muito, porque se ele realmente estivesse com todas as funções do cérebro paradas, não lutaria tão bravamente para viver, não mexeria os olhos ao ouvir minha voz, por exemplo”.

“Ele é a minha razão de viver! Hoje eu vivo por ele e para ele”.

“Eu só queria o meu filho bem e saudável de volta. Por diversas vezes, me sinto impotente por não poder ajudá-lo mais. Todas as noites, oro a Deus pela sua recuperação e tenho certeza que vamos vencer juntos essa batalha”.

Entrevista com o pediatra, Dr. Rodrigo Batista, via Microsoft Teams em 08/09/2020

Formação: Centro Universitário do Espírito Santo – 2017 Trabalha para: Santa Marcelina (Itaquera), no Hospital Neomater (São Bernardo do Campo), Hospital Next Seisa (Guarulhos) e Hospital Madre Regina Protmann (Santa Teresa, no Espírito Santo).

1. Está fazendo alguma especialização no momento? Não, no momento não, estou me preparando para fazer uma.

2. Mas, já possui alguma ideia de qual será? Já, eu vou fazer a área de alergia e imunologia.

3. Por que medicina? Eu sempre tive proximidade, dentro da minha casa, minha mãe é médica, então eu acabei crescendo vendo muito minha mãe no meio de hospital e eu gostava muito daquela rotina que ela tinha de poder atender e cuidar de um paciente, isso sempre me agradou muito, eu sempre achei muito legal essa parte da medicina. Na verdade, desde quando eu era criança já tinha certeza que era isso que eu queria fazer.

4. Ela também é pediatra? Sim.

5. Então foi uma influência familiar? Foi uma grande influência sim. Eu sempre fui apaixonado por criança, sempre adorei criança, só que até então eu não entendia se isso era apenas o eu gosto de criança ou se era algo que eu realmente quisesse trabalhar. Nisso, quando eu fiz a opção pela medicina, eu não tive qualquer sombra de dúvidas de que a área que eu escolheria dentro da medicina seria pediatria.

6. Como você define a questão da relação médico-paciente? Principalmente na pediatria, eu acho que a gente vê isso de uma forma muito importante, porque eu sempre falo assim, na pediatria a sua relação médico-paciente não é apenas com o seu paciente, mas ela se estende também aos pais, avós, aqueles que estão acompanhando o paciente, então eu acredito que a relação médicopaciente é fundamental para todo o processo, seja o processo do início de uma consulta, quando você está ali ouvindo o porquê daquele paciente está indo procurar o seu atendimento até todo o processo de uma internação, de um tratamento. Tudo flui de uma maneira muito mais fácil quando essa relação é boa, então eu vejo como algo fundamental, até mesmo porque se você não consegue construir uma boa relação médico-paciente, o paciente nem acredita naquilo que você está falando, ele não consegue confiar em você, mesmo que talvez seja às vezes o melhor tratamento, o melhor remédio, então eu vejo como extremamente fundamental essa boa relação.

7. A relação médico-paciente é abordada nas universidades? Deveria ser abordada muito mais, eu vejo assim que na verdade, por exemplo, não há uma matéria em que estudamos para poder debater sobre essa necessidade da relação médico-paciente. O que acontece na verdade é que, principalmente, nos últimos dois anos da faculdade em que nós vivemos dentro do hospital, a parte do internato, é que você acaba na verdade vivendo mais essa relação médico-paciente, porque você passa viver na prática realmente essa relação.

Mas, isso é abordado de uma certa forma, mas muito menos do que deveria ser com certeza.

8. Você acredita que isso acaba influenciando durante a residência ou até mesmo quando já é um profissional? Claro, com certeza influencia. Eu vejo que isso acaba sendo algo também muito pessoal, por exemplo, eu tenho isso muito intrínseco dentro de mim e eu sei que deve haver. É algo na verdade pra mim

Rodrigo meio que automático, eu sei que eu preciso manter a boa relação, o respeito com o meu paciente, mas existem pessoas que não são assim e essas são as que mais precisam ouvir e trabalhar isso, deveria ser algo obrigatório manter uma boa relação médico-paciente.

9. Como manter/criar essa boa relação ainda mais na pediatria que você não lida diretamente com o paciente, mas sim com os responsáveis, ou seja, como criar esse vínculo? Eu acho que isso é um pilar muito importante e eu acredito que só existe um caminho que é conversar. É o saber conversar com o paciente, com a família ou mais do que saber, é conversar propriamente. Eu acho que às vezes falta muito isso, falta a conversa, explicar, utilizar um vocabulário mais fácil para que a pessoa possa compreender, porque existem muitas coisas teóricas, por mais que seja difícil, existe um vocabulário que nós acabamos utilizando mais quando está falando entre médicos e tudo mais, então as vezes para você passar uma coisa que pode ser muito complexa, mas que você consegue falar isso de uma forma um pouco mais simples, então eu acho que a conversa é a base de tudo, é conversar, explicar, tirar dúvidas, é estar ali disponível para esclarecimentos, não há outro caminho, fazendo isso sempre irá haver uma boa relação médico-paciente.

10.Que dica você daria para os profissionais que não possuem essa boa relação intrínseca como você? Eu vejo que às vezes não é fácil você conseguir para algumas pessoas desconstruir algumas ideias ou pensamentos que as pessoas tem, mas eu acho que como em qualquer profissão você possui bons e maus profissionais, independente da medicina ou qualquer outra profissão, eu vejo que muitos daqueles que possuem essa dificuldade de ter uma boa relação médico-paciente são aqueles que muitas vezes escolheram a medicina não por amor, lógico que devemos ter a medicina também como um recurso financeiro, afinal é uma profissão, aquilo que nos mantém, mas isso com certeza não foi o pilar principal que me fez escolher isso, então pra mim acaba sendo mais fácil, porque eu vejo a medicina realmente como uma maneira de poder ajudar as pessoas, então assim, conseguir desconstruir da cabeça de uma pessoas que às vezes escolheu essa profissão como poderia ter escolhido outras profissões apenas pensando na parte financeira ou no retorno que terá ou até mesmo um status que a pessoa acha que acaba alcançando por conta da profissão, eu acho que é difícil conseguir desconstruir um pouco essas pessoas, mas lógico, há sim caminhos e pra minha assim, na minha vida, eu acho que na verdade todo caminho começa com uma conversa, então eu acho que é conversar, tentar explicar para a pessoa que o médico, o profissional que está ali lidando consiga enxergar a dor, o sofrimento, as angústias que aquele paciente está passando, independentemente do tipo e do grau da doença, quem está indo ali procurar um médico está precisando de uma conversa para poder explicar por menor que seja essa patologia, então eu vejo que a maneira de tentar reverter isso para esses profissionais que infelizmente não são assim é tentar conversar e mostrar para eles esse outro lado.

11.Você acredita que aprender medicina é ser jogado na fogueira ou aprender em meio ao próprio voo? Eu não veria dessa forma tão radical, toda e qualquer profissão que demanda algo prático, obviamente você irá aprender muito mais no momento da prática, um engenheiro por exemplo, ele estuda 5 anos dentro de uma faculdade, aprendendo cálculos para um dia ele poder sair dali e levantar um prédio através daquela teoria que ele aprendeu dentro da sala de aula, a única grande diferença que a medicina tem, é porque nós não temos a possibilidade do erro, então essa nossa prática acaba sendo muito mais delicada, por isso nós estudamos durante tantos anos, porque nós precisamos possuir uma prática muito refinada e não existe outra forma de fazer isso, você precisa ter uma parte teórica, onde você aprendendo realmente a base daquilo que você vai fazer e depois você tem a prática, eu não falaria que é algo jogado porque, por exemplo, dentro da faculdade você fica dois anos de forma exclusiva fazendo a prática supervisionada, quando você entra em uma residência, no meu caso uma residência de pediatria são mais 2 anos de supervisão, então eu estou ali, mas sempre tem alguém acima de mim que está vendo o que eu faço, me ensinando, instruindo, direcionando para aquilo que eu preciso fazer, então eu não faço nada sozinho, então em algum momento você precisa ter um certo tipo de autonomia porque daqui a pouco, quando você sair dali, é você quem vai estar fazendo sozinho, mas sempre supervisionada, então não vejo como algo que você é jogado na fogueira pra poder fazer, talvez em alguns lugares sejam assim, existem boas e ruins universidades, assim como existem boas e ruins residências, mas de uma forma geral pelo menos dentro daquilo que eu passei, eu passei por bons hospitais não vejo dessa forma.

12.Você acredita que hoje por mais que a medicina tenha avançado muito tecnologicamente, há uma perda da humanização na medicina? Eu acredito que não perdeu essa humanização, mas eu acho que é algo em que precisamos ficar muito atento porque há uma tendência a querer de certa forma digitalizar algumas coisas por conta desse acesso que nós temos, por exemplo, a telemedicina, eu sou completamente contra, não vejo qualquer motivo para que ela exista, até porque há uma grande dificuldade em construir a relação médico-paciente que é muito importante, então é diferente nos falarmos através de uma tela e pessoalmente, até mesmo para examinar um paciente. Dentro da pediatria eu jamais vou conseguir realizar uma telemedicina, porque eu preciso ver, tocar, enxergar, então eu particularmente não gosto dessa parte da medicina, mas acho que a tecnologia é extremamente fundamental e necessária. Hoje muito do que temos e avançamos é através da tecnologia, então ela é necessária e fundamental para a medicina, mas precisa ser utilizada com muito cuidado para que não perca essa relação médico-paciente.

13.Como o médico deve lidar com as incertezas da medicina? Essa questão do erro eu vejo um grande problema que até mesmo a sociedade nos impõe e é, por isso, que às vezes o médico é muito estressado e passa por inúmeros problemas do ponto de vista psicológico, porque muitas vezes colocam o médico na posição de super-herói pra poder salvar uma vida, mas nós não somos super-heróis, nós somos seres humanos como qualquer outro e passíveis a erros a todo e qualquer momento, é claro que quanto mais você estuda e se profissionaliza, mais prática, você vai errar menos, ou seja, quanto melhor médico você puder ser, menos erro você irá cometer, mas isso é

inerente do ser humano e uma hora ou outra nós vamos acabar cometendo erro. Um outro problema que nós temos é que a medicina não é ciência exata em que 1+1=2, uma mesma doença se comporta de formas diferentes e em diferentes pacientes, então você pode ver diversos cenários e, por isso, a prática é tão importante, para tentar te preparar para esses diversos cenários dentro de um mesmo cenário. Ou seja, infelizmente nós estamos ali e eu costuma dizer que sempre estamos em uma corda bamba que para um lado está o erro e do outro, o acerto, você está sempre tentando acertar e isso é muito estressante para nós, isso pesa muito, porque você tem que tentar e se cobrar a acertar o tempo todo, essa é a nossa função, sempre tentar que possível salvar uma vida e se não for possível ao menos tentar reduzir a dor e o sofrimento daquele paciente.

14.Além dessa pressão da sociedade, também há uma pressão entre os médicos?

Sim, com certeza. Eu vejo realmente como dentro de qualquer profissão em que as pessoas que estão todas dentro de um mesmo cenário, de uma função/ posição, de tentarem fazer sempre o melhor, então há sim uma pressão sem dúvida alguma.

Entrevista com o pediatra, Dr. Rodrigo Batista, via whatsapp em 12/09/2020 (continuação da primeira)

1. Além dessa pressão da sociedade, também há uma pressão entre os médicos? A pressão eu vejo muito maior da própria sociedade, sem sombra de dúvida. Há uma pressão entre os próprios colegas, os próprios médicos, eu acho que sim. Às vezes, eu acho que, e não falo por mim, mas sim pelo os outros, que existe uma competição de ver quem é melhor que o outro e isso é bom por um lado, porque em tese você está ali em uma competição para tentar ser sempre melhor, você está tentando realmente ser cada vez melhor, mas isso em algum momento pode virar um certo tipo de atrito e algum tipo de prejuízo para o paciente, que é o único que não tem nada vê com essa história. Mas, acho sim que a pressão é muito mais da sociedade, principalmente, por essa questão de querer engrandecer o médico de uma forma como se fosse um salvador, um super-herói, mas isso não é verdade, somos humanos como qualquer outro.

2. Como é a sua rotina de trabalho? Minha rotina hoje é o seguinte, eu trabalho em São Paulo, no Estado de São Paulo e, também trabalho no Estado do Espírito Santo, aqui em SP eu trabalho na Zona Leste (no Santa Marcelina, em São Bernardo do Campo em um hospital que faz parte da rede do SM, o Hospital Neomater, e trabalho em Guarulhos, em um hospital chamado Seisa, é um hospital do grupo Amil. Lá no ES, eu vou uma vez por mês e lá eu faço 5 plantões em uma semana, que é um pouco mais corrido. Eu dou uma média de mais ou menos uns 20/22 plantões por mês de 12 horas e, nesse meio tempo que não estou trabalhando, eu tenho me preparado para uma próxima prova que eu vou fazer no final do ano para prestar uma nova residência.

3. Você costuma ter folga entre os plantões? Depende muito do dia, nós temos uma autonomia na verdade um pouco maior de montar a nossa escala, então normalmente em alguns locais você pé contratado para poder trabalhar, mas isso não é uma realidade do médico hoje, não é todo lugar que você é contratado, você é como se fosse um prestador de serviço para o local e isso

de certa forma te permite uma liberdade para montar a sua própria escala. Então, eu tento montar minha escala de forma que não fique tão cansativa, por exemplo, as vezes eu prefiro pegar um plantão de 24 horas, porque eu já vou direto para o hospital e fico ali, mas quando não da, eu tento trabalhar um dia sim, um dia não, um dia e dois não, depende muito da escala do hospital, mas eu tento me organizar de uma forma que eu não fique tão cansado nesse tempo que sobra e possa descansar.

4. Trabalhar nos quatros hospitais foi uma opção sua? Foi uma opção minha sim, hoje em dia na medicina, fala-se muito em remuneração de médico e tudo mais, porém para que você consiga ser bem remunerado, é necessário trabalhar muito e em locais diferentes, então nós acabamos diversificando os locais, os hospitais e, as vezes, até mesmo as funções dentro da sua área. Então foi uma opção minha, que eu faço para dessa forma eu poder ter um retorno um pouco maior também do ponto de vista financeiro que propriamente é necessário.

5. Você que trabalha para ambos, tanto público como privado, vê diferenças nos plantões entre o que você precisa para suprir a necessidade do paciente? Tem sim, sem sombra de dúvidas muita diferença. Assim, o Santa Marcelina especificamente é um hospital excelente, muito bem estruturado do ponto de vista, da estrutura física do local, da mão de obra e, também, das condições para o trabalho, então eu digo que ali é um público diferente, nós costumamos dizer que é um público quase que um particular, então nós acabamos vendo essa diferença porquê de um forma geral você acaba indo em um hospital público e possui sempre aquela visão de um hospital com muitas filas, as vezes que não disponibiliza de uma cadeira para o paciente sentar, falta medicação.

Eu, graças a Deus, nos hospitais públicos que eu trabalho, o Santa Marcelina e o do ES, em Santa Teresa, são hospitais que me dão todo o conforto para que eu possa atender o paciente da melhor maneira possível, porque o foco é unicamente esse, então assim, essa é a realidade que eu vivo, mas assim, sem sombra dúvidas, hoje é a realidade do nosso país que o hospital público de uma forma geral, carece de algumas coisas, então as vezes faltam recursos, medicação, mão de obra, as vezes você chega em um plantão que está lotado e só possui dois médicos trabalhando, sendo que se você for ver, precisa de pelo menos o dobro. No particular, como você tem em tese um público que está ali cobrando um pouco mais, apesar que não deveria ser assim, no público também deve ter essa mesma cobrança, porque é público, mas não significa que não estamos pagando, a pessoa está pagando através do seus impostos, mas há sim, uma diferença bem grande entre o atendimento do público e do particular.

Entrevista com a psicóloga de formação, Claudia Afonso, via whatsapp em 09/09/2020

Conta um pouco sobre a sua carreira profissional: Eu sou psicóloga de formação, não atuo com psicologia clínica, sempre atuei mais na área de psicologia social e de educação, porque eu trabalhei durante um período como diretora de creche. Depois trabalhei em uma entidade que na época chamava Serviço de Orientação a Família, mas que hoje é Sempre Viva a Organização Feminista, que já trabalhava com a questão da saúde da mulher e movimentos populares, após isso trabalhei na Subprefeitura de São Miguel, antigamente conhecida como Administração Regional da Luísa Erondina, em uma área mais ampla, porque o trabalho era na região como um todo, não especifica em uma área temática. Trabalhei durante 10 anos na assessoria parlamentar de um deputado do PT, na câmara legislativa, além de ser um deputado médico sanitarista e, portanto, toda a bagagem dele foi de produção de legislação na área da saúde e, também, tinha uma atuação muito forte nessa área, apesar de ter projetos e leis de outras áreas, mas a minha identidade maior é com a área da saúde. Depois eu trabalhei em Suzano, na Prefeitura de Suzano como psicóloga no CTA (Centro de Testagem e Aconselhamento de HIV Aids) e depois fui gerente de uma Unidade de Saúde em Suzano, além de ter assumido um trabalho que na época era inovador que é o Apoio Institucional aos Serviços de Saúde que era não uma supervisão aos serviços, mas sim um fazer junto, planejar junto, acompanhar e dar apoio a Unidade. Atuei durante 7 anos na área da saúde em Suzano e depois voltei a trabalhar em São Paulo na gestão Haddad, na coordenadoria de Saúde Leste, que engloba 7 supervisões de saúde (São Miguel, Ermelino, Itaim, Tiradentes, Guaianases, Itaquera e São Mateus), uma área extensa em que eu trabalhei a princípio, o apoio aos movimentos e conselhos populares de saúde, acompanhando essa área e depois, devido uma saída da coordenadora eu assumi como Coordenadora de Saúde, então eu fiquei durante um ano com essa área de participação e gestão, depois eu assumi como coordenadora durante 3 anos. Eu fiquei um ano cuidando de coisas pessoais, depois trabalhei com o deputado Carlos Neder na Assembleia um período do mandato dele também com um apoio maior nessas áreas de participação popular quanto à saúde e, hoje, estou no mandato do Deputado Federal Alexandre Padilha, também acompanhando as questões da saúde.

“É necessário ver o paciente como um todo e criar leis, programas, políticas de saúde que incentivem a saúde do mesmo. Não basta fingir que estamos cuidando do paciente, porque dessa forma apenas estamos cuidando da doença na hora da dor”.

“Quando chegamos nas unidades de saúde, nossos direitos como usuário deveriam estar colados nas paredes, mas o que vemos são cartazes pedindo silêncio ou informando que desacatar servidor público cabe pena de 3 a 6 meses de prisão. Não é essa informação que o cidadão precisa ter ao chegar no serviço de saúde, pelo contrário, isso faz com que você diminua ainda mais o direito dele”.

“O movimento não buscava ser atendimento médico em substituição ao dever do Estado. Não era apenas caridade, mas sim sede de justiça”.

“O Código de Saúde juntamente de todas as outras leis, são como a bíblia da saúde pública aqui no estado de São Paulo, é uma espécie de alicerce que garante muitos direitos ao cidadão”.

“Uma correlação de força que induz os pacientes ao tratamento, afinal existe uma indústria farmacêutica que incentiva a venda de produtos e, consequentemente, pressiona o médico ou até mesmo uma rede hospitalar para indicação de determinado remédio. Tudo isso acaba induzindo a uma não prevalência da escolha do paciente e, por isso, a importância não somente da criação, mas também da divulgação de leis como esta”.

“A lei é boa quando ela pega, isto é, quando deixa de estar no papel e todos se apropriam dela”.

“Minha experiência permite dizer que, a relação entre médico e paciente dentro do serviço de saúde é o fator mais difícil, pois é dado ao profissional da saúde muito poder, o que desiquilibra ainda mais essa relação. Além disso, os cursos tendem a formar profissionais que não podem ser questionados, ninguém pode falar da conduta médica. Por fim, o nosso maior erro é, acima de tudo, delegar ao outro a nossa saúde”.

“A lei precisa traduzir a real necessidade do cidadão e, acima de tudo, ser uma política de Estado para que esta prevaleça e continue sendo utilizada, independentemente do

governo. O principal propósito da lei é estabelecer os direitos da sociedade e estes precisam estar escritos, porque não são os primeiros a serem lembrados. Quando uma pessoa demonstra saber suas garantias e conhecer o processo, a relação muda, ela passa a ter voz e receber mais satisfação”.

Entrevista com Marina Ribeiro, mãe das vítimas de erro médico, Davi e Theo, via zoom em 16/09/2020

“Mãe, está tudo certo, não há dilatação, os corações deles estão normais, está tudo bonitinho”.

“Eles não me paramentaram, pois não deu tempo e o médico corria nos corredores, pedindo para que eu não me mexesse, porque eles poderiam nascer ali mesmo e, enquanto isso, gritava outros médicos que passavam no corredor para ajudá-lo”.

“Olha mãe, se ele passar dessa madrugada, ele tem chances, mas ele está com uma infecção generalizada. Você tem fé? Porque se você tiver, eu recomendo que você comece a rezar”.

“Era tão boba que ele não está aqui hoje, foi tão boba que vocês não perceberam e não conseguiram dar conta. Se era boba, por que chegou em tal estágio? Uma infecção absurdamente alta”.

“A sensação que eu tenho de lá é que eles esperam chegar em um ponto crítico para fazer alguma coisa e depois virar para você e dizer mãe, nós fizemos tudo que era possível, nós fizemos o nosso melhor, sentimos muito”.

“Filho, a mamãe está chorando, a mamãe está triste, mas não é com você, não tem

nada a ver com você. A mamãe está aqui, eu tenho muito orgulho de você, você é muito forte”.

“A equipe médica delega todas as funções para a mãe, é uma pressão gigantesca e por muito tempo eu me senti imensamente culpada em relação a isso. Por muito tempo eu me culpei por ter saído para tirar o leite, eu pensava que não deveria ter ido, que eu precisava ter ficado lá para avisar que ela não podia mexer nele”.

“Para ele não importava se era a filha de alguém, o neto de outra pessoa, eram estatísticas, eu tenho raiva, porque eu sei que o Davi para eles foi só mais um número”.

“Eu me pego falando diversas vezes que queria poder voltar no tempo para fazer algo diferente, na verdade, se eu pudesse voltar atrás, não teria nem ido para o hospital naquele dia, teria ficado em casa de boa e acho que teria sido muito melhor”.

“Eu não vou ficar com a criança desse jeito. Ou você vai até lá e faz alguma coisa ou eu vou tomar alguma providência”.

“Filho, aguenta só mais um pouquinho, só um pouquinho, por favor, já já você sai daí”.

“Eu fico feliz que pelo menos eles tenham enxergado algo positivo na minha tragédia, mas ao mesmo tempo eu tenho raiva, porque a sensação que eu tenho, é que meus filhos foram cobaias lá dentro. Faltou um pouquinho de atenção e higiene né? Vamos lavar a mão direito, trocar o avental, eu não vou usar o mesmo termômetro em todos os pacientes. Se a assepsia tivesse sido feita de maneira correta, muitas coisas poderiam ter sido evitadas”.

“Falta transparência e clareza em todos os sentidos, até hoje eu sinto isso em todo

hospital que eu vou, não sei se os médicos possuem medo da reação dos pais ou o que pode ser. Tanto que eu só tive real dimensão do caso deles ao ler os prontuários médicos, enquanto estive lá, eles falavam muito por cima”.

“O Davi e o Theo quando nasceram foi um tapa na minha cara, ver o quanto eles lutavam foi um sacode na minha vida. O Theo me ensina demais, eu costumo dizer que ele é a minha luz, porque ele me salvou de mim mesma. Ele é a minha vidinha”.

“Ele é uma criança como qualquer outra que apenas necessita de cuidados especiais. Se as pessoas soubessem a força e a vontade de viver que eles possuem, o mundo seria muito melhor”.

“O Conselho Regional de Medicina possui uma posição muito leve, na maioria dos casos é apenas uma advertência, suspensão, mas a maioria passa batido. A classe médica é muito unida e quem sofre é exclusivamente o paciente”.

“Precisa doer para eles de alguma forma, mesmo que eu seja uma agulha no palheiro, eu sei que vai causar algum incômodo. Eles vão precisar se mexer para alguma coisa,

afinal é mais um processo, indenização, dinheiro que irá impactar no bolso deles. Claro que nada jamais vai reparar o que aconteceu, nada vai trazer o meu filho de volta, nada vai deixar o Theo sem sequelas, mas é uma forma deles reverem tudo que fizeram de errado. Apesar do sofrimento em precisar remexer nessa história por muitos anos ainda, é uma forma de evitar que outros pais passem por essa dor”.

Respostas de voluntários médicos da Abravem, via whatsapp em 14 e 15/10/2020

1. Diante de tanto corporativismo médico, o que te motivou a ser voluntário na

Abravem? - Na verdade, há de se considerar o paciente como o polo mais indefeso da relação médico paciente; nestas condições, a ABRAVEM procura aplainar um pouco esta diferença, proporcionando ferramentas para que o paciente entenda melhor o que aconteceu com ele ou com um seu familiar. - A possibilidade de usar meu conhecimento de forma a ajudar quem tanto precisa. Parece clichê, mas é verdade. Possuo uma formação que me permite, acredito, fazer a diferença para as pessoas de muitas formas, incluindo de forma voluntaria.

2. Qual a importância de se praticar uma medicina realmente por amor e não por questões de status/poder? - A medicina não é um "sacerdócio" como muitos costumam falar, mas sim, uma profissão honorífica, recebendo - não pagamento, mas honorários pelos seus préstimos; quando você mercantiliza a medicina você trai os ideais desta profissão, desqualificando-a e passando a receber mero pagamento pelo seu trabalho. - Sem amor pelo que fazemos, é impossível fazer uma medicina de qualidade.

Até porque, no dia a dia, temos que lidar com pessoas de todos os tipos, algumas muito compreensivas, outras nem tanto. Algumas que realmente precisam e outras que abusam do sistema de saúde. Sem amor, não é possível trabalhar. "Trabalhe com o que você ama e nunca mais precisara trabalhar um dia na vida" (Confucio).

Entrevista com Fernando Polastro, fundador e voluntário da Abravem, via whatsapp em 16/10/2020

Vou te falar rapidamente de dois casos que marcaram bastante: 1. O primeiro é de um rapaz que tinha 15 anos e começou se consultar, inicialmente, o médico se apresentou como terapeuta, começou fazer terapia, mas depois o pai descobriu que ele era na verdade um psiquiatra e não um psicólogo. Ele começou a receitar medicamento para o garoto e o pai não tinha muito acesso, porque os pais são separados e não se dão, o garoto morava com a mãe. Esse psiquiatra receitou uma medicação para o garoto que é contraindicada para menor de 16 anos e disse que ele poderia tomar, que inclusive, a mãe não precisaria ficar dando a medicação para ele, ele mesmo poderia fazer a gestão do medicamento e em um certo momento, ele além de dar uma medicação para o rapaz que era proibida, tarja preta obviamente, ele em um determinado momento do tratamento, do nada, dobra a dose do rapaz, sendo que a própria bula do remédio diz que o incremento das doses precisa ser extremamente cuidadoso e gradual, além de ser uma medicação que provoca alguns delírios e tendências suicidas nas pessoas. O resultado foi que o garoto se matou, se enforcou pouco tempo depois. 2. Outro caso, em Caieiras, a esposa levou o marido enfartando, ele com todas as características que estava infartando, levou ele até o pronto atendimento, chegou lá correndo e falou “olha meu marido está infartando, me ajude”. Na verdade, os atendentes falaram tá bom, só um minuto, aguarde aqui, algo nesse sentido e não deram um atendimento emergencial. Ela então começa se exaltar, dizendo que possui duas pontes de safena, eu sei o que é uma pessoa infartando, eu já infartei duas vezes e o meu marido está infartando, vocês precisam atender ele agora. Nisso veio o médico e simplesmente disse: “calma, minha senhora, eu vou dar uma medicação para ele, depois fazemos um eletro” e ela diz “não, você não está entendendo, meu marido está infartando”. Ai o médico, como sempre, aquela questão, “a senhora é médica? A senhora não é médica, estou dizendo para a senhora ficar calma, que nós vamos atendê-lo”. Ela continua insistindo, pedindo que ele seja atendido imediatamente e diante daquela enrolação, ela sentada no corredor, tem inclusive vídeos disso e enquanto eles estavam na maior calma, preparando a sala para o eletro, o marido cai morto no colo dela. Tem um vídeo bastante impactante dele tombando e caindo morto no colo dela. Nisso sim, se mobilizaram, correram com ele,

mas não conseguiram salvar. Então quer dizer, há uma infinidade de casos, eu lembrei desses dois agora, mas nós já atendemos mais de mil pessoas nesse tempo, muita coisa que impacta, principalmente quando desrespeita criança, mas é isso, são casos que marcou.

Entrevista com o pediatra, Dr. Renato Praxedes, via whatsapp em 24/10/2020

Formação: Universidade do Grande Rio – 2014 Trabalha para: Santa Marcelina (Itaquera); Hospital Neomater e no Hospital dos Servidores do Estado (IAMSPE).

1. Como você avalia os cursos de medicina atual? A ascensão dos cursos de medicina deve ser avaliada com extrema cautela e preocupação, visto que estatisticamente todos sabemos que não faltam médicos, numericamente, para a população brasileira, mas sim condições de trabalho nos mais diversos locais de atendimento. A vigilância e a fiscalização dessas faculdades precisam ser uma responsabilidade, uma vez que, não podemos deixar de lado a real preocupação do paciente, ou seja, não adianta prepararmos os médicos para saber as teorias, como as doenças funcionam e como é feito o tratamento, se não sabemos lidar com pessoas, se não houver o ensinamento para poder lidar com gente. Infelizmente, falta isso nos atuais cursos e faculdades de medicina, principalmente, nos últimos que surgiram no mercado.

2. Como você enxerga a relação médico-paciente? É um importante pilar para o sucesso de um plano terapêutico, porque a partir do momento que há confiabilidade e determinada liberdade para que o paciente ou até mesmo sua própria família transmita informações, existe um sucesso maior. Ou seja, o médico possui mais possibilidades para determinar um diagnóstico preciso e, consequentemente, indicar o tratamento de forma adequada, diminuindo assim a chance do erro.

3. Apesar da medicina não ser uma ciência exata, sabemos que existem inúmeros erros que poderiam ser evitados. Como você acredita que podemos eliminar esses desacertos? A população brasileira necessita de uma melhora estrutural como um todo no fornecimento da saúde, visto que, a partir do momento que o paciente não dispõe de uma estrutura física adequada, profissionais bem capacitados e distribuídos, um atendimento que tenha como foco o seu sofrimento, entre muitas outras vertentes, a identificação do diagnóstico e até a condução do tratamento acabam sendo ineficientes.

Questionário respondido pela psicóloga Aline Costa, via e-mail em 02/11/2020

1. Como as vítimas de erro médico podem criar técnicas para conviver com os danos físicos, emocionais e financeiros? Situações de erro médico são muito pessoais. Não existe uma técnica ou direcionamento específico, apenas a compreensão da situação e amparo ao paciente e suporte à família. O acompanhamento profissional é muito importante para que os envolvidos se sintam acolhidos e percebam que não estão sozinhos nesta situação. A parte financeira fica a cargo da justiça, então para tanto, é necessário o amparo e direcionamento legal. Quanto ao erro médico, da mesma forma, deve-se tomar providências legais. Porém, sem um suporte de apoio emocional estas providências se tornam mais uma tortura atrelada a todo o processo de perda.

2. A partir do momento que tais vítimas concebem o erro, suas vidas são transformadas e regidas por outras lógicas. Como aprender lidar com mudanças tão repentinas? As mudanças fazem parte da nossa vida e algumas delas nos tira da zona de conforto e muitas vezes nos causa medo, pois não sabemos lidar com aquela situação nova. O importante é analisar essa nova fase e entender quando ela é inevitável e observar quais lições vai aprender naquele processo e ter tranquilidade e coragem para enfrentar aquela situação, pois fugir ou evitar não é um bom caminho. Não temos o poder de controlar os eventos ao nosso redor e muito menos determinar como eles irão acontecer, porém conseguimos controlar a nós mesmos e como vamos lidar com aquela nova situação, mesmo que ela cause dor e sofrimento. A mudança tem uma função importante em nossa vida, pois mostra a nossa capacidade de ampliar nosso olhar para novas práticas e mudanças de comportamento. Nos casos, que sozinho, não consiga administrar essas emoções com as mudanças, busque auxílio de um psicólogo.

3. Algumas mães se sentem culpadas, incapazes e impotentes diante do erro médico. Qual conselho você deixaria para elas? A culpa é um sentimento comum ao ser humano e muito difícil de assimilar. Mesmo que o erro não seja da pessoa, a tendência é de se responsabilize de alguma forma. Entretanto, essa culpa faz parte de um sistema de crenças e valores que são acumulados

durante a vida e muito difíceis de serem alterados. Por esta razão, a pessoa não é capaz de se livrar sozinha deste sentimento. Por esta razão a equipe médica deve ficar atenta para identificar e encaminhar para os profissionais adequados à esta demanda.

4. Apesar dos processos serem incertos e custosos, é uma forma de buscar justiça. Qual a melhor saída para reviver esses fatos trágicos sem grandes impactos emocionais? Os fatos trágicos são inevitáveis em casos de graves erros médicos, apesar de todos os sofrimentos que estes fatos nos trazem, aprender com eles e transformá-los em lição de vida é a melhor maneira de lidar com tal situação. Conversar com pessoas que passaram pelas mesmas situações ajuda muito. Se não for possível conseguir sozinho, a busca por uma ajuda profissional psicológica é fundamental para superá-los.

5. Por que os médicos possuem dificuldades em lidar com o erro? Desde muito antes do ingresso na universidade, os profissionais da medicina são constantemente pressionados em direção à perfeição. Durante o curso de medicina esta pressão aumenta e torna-se necessário que o futuro médico tenha plenas convicções sobre suas decisões profissionais, desta forma, o erro torna-se inconcebível.

6. Como um médico pode conviver com a enorme pressão de estar com inúmeras vidas em suas mãos? Os médicos são treinados a viver sob essa pressão em tempo integral. A maioria dos médicos buscam salvar as vidas que estão em suas mãos, mas, como todo ser humano, os erros são inevitáveis e as consequências disso são irreversíveis. As consequências de seus atos são constantemente julgadas por familiares dos enfermos, equipe e supervisores.

O resultado desta pressão pode levar ao estresse ou indolência afetiva, que são igualmente prejudiciais à saúde mental destes profissionais, que também necessitam de apoio psicológico.

7. Um pedido de desculpas é realmente capaz de minimizar a dor pela perda de uma chance? Quando existe um erro, este deve ser assumido pela equipe médica. O pedido de desculpas seria uma forma de assumir o erro e abrir um diálogo com o paciente e familiares. A dor é inevitável, por geramos uma expectativa grande sobre uma possível cura ou melhora. Contudo, palavras de

conforto ou desculpas, geralmente são insuficientes para uma reparação da perda sofrida. Desta forma, somente o tempo e a busca pela compreensão dos fatos serão capazes de amenizar a dor.

8. Como construir uma boa relação médico-paciente? Essa construção inicia deixando a impessoalidade de lado nos atendimentos e criando uma relação humanizada, que tenha como base o respeito, transparência, escuta ativa para os problemas do paciente, empatia com suas dúvidas e sofrimento, acolhimento e uma comunicação clara para que os pacientes e familiares consigam entender e compreender toda a dinâmica do processo terapêutico. A partir desse atendimento humanizado cria-se confiança para ambas as partes.

Sabemos que a vida em hospitais e clínicas são bem movimentadas e os médicos lidam com alta demanda e por isso precisam estar preparados para atuar com esse olhar humanizado.

9. Como lidar com as incertezas da medicina? Diria como lidar com as incertezas da vida e não somente da medicina. Todos nós buscamos fazer o melhor no nosso dia a dia, com família, amigos, trabalhos etc. Se vivermos pensando que tudo pode ser arriscado, ou que dará errado, teremos uma vida recheada de medos, angústias e incertezas. Precisamos sim buscar uma visão mais otimista das situações e buscar informações sobre o que não sabemos, o conhecimento é um grande aliado para lidar com as incertezas e, também, conversas com pessoas que já passaram por alguma experiência que você irá passar. A troca de informações é muito rica e amplia o nosso olhar para o outro.

10.De que forma, os pacientes podem se tornar mais questionadores quanto ao tratamento médico indicado? Inicialmente o entendimento da doença e do tratamento indicado são essenciais e fundamentais para que os pacientes possam questioná-lo. Questionar o tratamento aproxima o paciente do médico, e consequentemente a busca pelos melhores resultados do tratamento. Normalmente os tratamentos seguem protocolos adotados pelos órgãos de saúde, mas nem sempre esses protocolos são a melhor maneira de tratar a doença. Por isso é muito importante que o paciente questione o tratamento prescrito. Para proporcionar uma cultura social questionadora seria necessário a adoção de meios de divulgação em massa que atingissem a maioria da

população, mas isso depende de investimento público em grandes campanhas de marketing.

Questionário respondido pela presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), Dra. Irene Abramovich, via e-mail em 05/11/2020

1. Como o Cremesp avalia a atual relação médico-paciente? A relação médicopaciente é muito complexa e ela é a base da Medicina, que envolve também o aprender a ouvir e enxergar o paciente. Quando você fala em telemedicina você não está vendo o paciente como deve ser feito em uma consulta presencial, isso não é Medicina.

2. Qual a maneira mais efetiva para se praticar tal relação? A maneira mais efetiva é você ter a consciência do que é a Medicina. Medicina não é só pedir exame, não é só receitar, mas ouvir, ver, examinar e conversar com o paciente, para um diagnóstico mais assertivo. Não se trata apenas de escrever ou encaminhar a pessoa para algum lugar. A relação médico-paciente bem feita é a própria

Medicina.

3. De que forma os cursos de medicina podem contribuir para uma efetiva relação médico-paciente? Os cursos de Medicina têm um papel fundamental. O professor tem de saber que ele é o modelo de como atender os pacientes. Eu sempre digo aos alunos/residentes, que assim como nós, o paciente tem nome.

Ao chamar o paciente pelo nome, conhecer um pouco da história de vida dele, sem se limitar só à patologia, tudo muda. É importante ter sempre em mente que estamos tratando de GENTE.

4. Alguns profissionais e usuários do sistema de saúde questionam a desumanização da medicina diante dos avanços tecnológicos. Com isso, acredita-se que o paciente deixou de ser o foco central. Como recuperar essa relação humanizada, com foco no paciente e não na doença em si? Tecnologia é fundamental, porém, mais importante é sabermos usá-la. É bom sabermos quais exames existem, porém não podemos pedir para todos. Temos de saber para quem e quando pedir, além de explicar ao paciente para que servem os exames solicitados e porque eles são solicitados. Como neurologista, por exemplo, se eu peço uma ressonância, eu preciso explicar que o paciente entrará num tubo, que faz barulho etc, mas que não há lesividade nesse procedimento. A questão é a responsabilidade pelo paciente, tendo ele doença

ou não. Não podemos solicitar exames, por exemplo, simplesmente para usarmos a tecnologia, pois esta não substituiu e nunca substituirá a relação médico-paciente.

5. Como minimizar os erros médicos? Em primeiro lugar, formando melhor nossos médicos. É preciso, porém, sabermos distinguir erro médico de erro do médico.

Temos de ter clareza de que nem todo paciente que falece é por erro médico.

Existem erros médicos, sim, e o Cremesp está atento e punindo.

6. Por que as punições costumam ser tão frágeis? As punições estão definidas na Lei 3268, de 1958, do Congresso Nacional e da Presidência da República, sendo elas: PENA A - advertência confidencial em aviso reservado, PENA B censura confidencial em aviso reservado, PENA C - censura pública em publicação oficial, PENA D - suspensão do exercício profissional por até 30 dias e PENA E - cassação do exercício profissional, que precisa ser referendada pelo Conselho Federal de Medicina, que é também o órgão máximo de recurso para solicitação de revisão das penas aplicadas pelo Conselho Regional de

Medicina. As penalidades são aplicadas havendo culpabilidade e sobre o fato ocorrido. Trata-se de julgamento ético.

7. Por que o método de avaliação tanto dos cursos de medicina, quanto dos profissionais, ainda não é visto como obrigatório? Porque avaliar um aluno que acabou de se formar é um equívoco. Consideramos que deva haver exames sequenciais para todos, mas ainda dentro da escola que é responsável pela formação do aluno.

8. Qual a receita adequada para uma boa medicina? Gostar da profissão, gostar de gente e se esforçar para atender, da melhor maneira possível, o paciente que te procura, sabendo ouvi-lo e entendendo que, às vezes, ele vai querer ouvir uma segunda opinião. Faz parte e é saudável essa troca de informações entre médicos também. No fim, entendemos que a Medicina é uma relação de confiança entre médico e paciente.

Perguntas respondidas pela secretária-geral do Conselho Federal de Medicina (CFM), Dra. Dilza Teresinha, via e-mail em 05/11/2020

1. Qual a receita adequada para a prática de uma medicina eficaz? Termos serviços de saúde bem equipados com todas as condições necessárias para que o médico possa trabalhar, além de uma boa qualificação profissional, fator importantíssimo, visto que, há uma infinidade de cursos de medicina sem nenhuma condição de proporcionar um estágio, um aprendizado eficiente ao estudante. Nós só vamos ter uma receita prática e adequada para o exercício da medicina quando esses eixos estiverem juntos, dispondo de boas faculdades, ensino qualificado, excelentes profissionais e serviços adequados para sua atuação.

2. Como o CFM avalia a atual relação médico-paciente? Qual a maneira mais efetiva para se praticar tal relação? Essa relação ocupa papel de destaque no tratamento de inúmeras patologias e, sem sombra de dúvidas, é possível afirmar que o sucesso de um tratamento depende, em grande parte, da interrelação que se estabelece entre médico e paciente, independentemente dos inúmeros avanços tecnológicos. Confiança, compaixão, reciprocidade e saber ouvir são fatores fundamentais no estabelecimento da adequada relação médico-paciente, além de serem indispensáveis no completo restabelecimento da saúde do enfermo.

3. O que é feito para minimizar tais erros? O CFM está sempre trabalhando em relação a isso para que tenhamos um serviço público e privado de qualidade por meio das fiscalizações e ensino médico. Há uma infinidade de ações que o CFM tem feito justamente com essa visão.

ILUSTRAÇÕES

Ilustração Davi Ilustração Theo

Ilustração Vitor

TERMOS DE AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM E SOM

Associação Brasileira de Apoio às Vítimas de Erro Médico (Abravem)

Doutor Renato Praxedes

Claudia Afonso

Albaneide Magalhães

Aline Costa

Doutor Rodrigo Batista

Marina Ribeiro

Doutora Irene Abramovich, presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp)

Doutora Dilza Teresinha, secretária-geral do Conselho Federal de Medicina (CFM)

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