Livro Antologia 2ª Ed

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chão. Meus pés pisavam onde Deus pisa, de acordo com minha mãe. Estou no território d’Ele e algo pode acontecer a qualquer momento. Não vou negar, tenho tanto medo. Queria tanto alguém pra me fazer companhia. Alguém pra amar e sentir que nunca estou só. Para esperar por esse Deus, de braços abertos pra vida, com alguém que seja eu de uma forma que ainda desconheço. A chuva até que está agradável. Molhou-me o corpo por inteiro. A mim e a uma moça que está nesta mesma praça. Será que Deus está nela? Por que todos fugiram da chuva e só ela que não? Parece gostar de se banhar desse jeito. Ou é Deus? Como Ele não pode sentir a chuva, pois acho que não tem pele, está nela para sentir ao menos uma vez como é sentir-se pintado numa tela na vida real. A chuva pinta essa moça. Todas as gotas que caem nela são multicoloridas. Acho que na verdade Deus se aquietou. Parou de correr e agora pinta uma das mais belas de suas obras-primas. Deus é o grande pintor. Moça? Cheguei mais perto. Tenho medo desse homem que se aproxima. Pensei que fosse Deus, mas não era, pelo menos achei que não era. Eu estava molhada e com vergonha. Mas ele também estava. E sorria. Senti que Deus estava no sorriso molhado dele. Diga. E os dois sorriram um riso acolhedor, que aquecia o corpo inteiro. E ela, estendendo sua mão para ele, olhou para o céu e sorriu (nesse sorriso cabiam todas as últimas cores inventadas pelos poetas de acrílico que desenham palavras imortalizadas em meio ao caos). E entre os dois havia um propósito: viver desconhecendo o futuro começado desde hoje. 142 II PRÊMIO PROEX/UFPA DE LITERATURA


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