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Suárez, a mitologia da “Transiçom” e os movimentos do regime 3

Podemos, think tank espanhol 4

Leninismo e libertaçom nacional 5-6

A independência da Catalunha 7

Maurício Castro

Xose Lombao

Miguel Ramos Cuba

Extraterrestres 8

Anjo Torres Cortiço

Iago Barros

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Ano XIX | Nº 73 Terceira jeira | Julho, agosto e setembro de 2014

Quadro galego de luita e pólo patriótico rupturista

EDITORIAL O

s resultados eleitorais das europeias de maio constatárom a dimensom da crise de legitimidade do regime espanhol emanado da Constituiçom de 1978. A perda da maioria eleitoral dos dous partidos do bipartidarismo bicéfalo provocou enorme preocupaçom entre os poderes fáticos, que vírom em risco o modelo vigorante nas últimas quatro décadas. Como saltárom as alarmes a bloco oligárquico, optou por implementar umha das opçons que há anos reservava, com o intuito de perpetuar o capitalismo espanhol: mudar o desgastado chefe de Estado nomeado diretamente por Franco. Contrariamente aos desejos de Juan Carlos, que se negou voluntariamente a abdicar, as empresas do Ibex 35 e o Clube Bilderberg optárom por cessá-lo fulminantemente como melhor forma de cortar momentaneamente a hemorragia da perda de mais de 5 milhons de votos polo PP e o PSOE. Sendo umha decisom com certos riscos, os resultados até o momento fôrom satisfatórios para o regime. O debate republicano ocupou durante semanas a atençom pública como nunca tinha acontecido, mesmo superando a etapa da transiçom, mas em negum momento se configurou um movimento de massas que na rua pugesse em perigo a débil estabilidade do Estado espanhol. Para que o sistema caia, nom chega que se corcoma internamente por um conjunto de crises parciais que concatenadas adotam a forma de multicrise estrutural. O sistema por ele só nom vai ruir. Há que tombá-lo, mas isto só é possível combinando a existência de forças organizadas dispostas a fazê-lo e massas na rua a luitar com decisom por idêntico objetivo. De momento, as organizaçons revolucionárias ainda nom atingimos a dimensom imprescindível para contribuir para a queda do sistema e o grau de consciência social, em constante desenvolvimento face posiçons antagónicas com os falsos consensos impostos polo pós-franquismo, ainda está muito afastada do mínimo pata-

mar que permita transitar da desafetaçom com a casta cleptocrática para posiçons rupturistas. Nom podemos desconsiderar que o debate “monarquia versus república”, que acompanhou a abdicaçom do caçador de elefantes e a proclamaçom do seu filho, foi promovido por umha das organizaçons do regime. PCE/IU jogou um rol determinante no lifting do franquismo e na imposiçom dos acordos que permitírom transitar da ditadura franquista para a atual monarquia constitucional. Em nengum momento, os de Cayo Lara nem AGE, –a sua sucursal autóctone–, pretendêrom a queda da monarquia. O reformismo espanhol só buscou estruturar e alargar a sua base social, abrir contradiçons no PSOE, e ressituar-se eleitoral e institucionalmente num sistema que nom pretende transformar.

Jornal comunista de debate e formaçom ideológica para promover a Independência Nacional e a Revoluçom Socialista Galega hegemonia do paradigma estatal nas redes sociais alimentam a espanholizaçom da luita. As chaves madrilenas som cada vez mais fortes e mais difíceis de combater pola perda de vitalidade do nacionalismo e pola incapacidade da esquerda independentista de incidir e alargar o seu espaço sociopolítico.

do capitalismo espanhol optou por fomentar, através do seu potente aparelho mediático, umha substituiçom ordenada do espaço que parcialmente até o momento vinha ocupando o PSOE, mediante a promoçom dumha figura carismática com um discurso suge-

Crise política do regime promove novo rosto eleitoral

A

aceleraçom da crise do PSOE é umha das principais conseqüências do 25 de maio. O principal partido do regime, essencial para garantir a sua estabilidade evitando a sua descomposiçom, perdeu a legitimidade social e mais de dous milhons e meios de votos, e basicamente as possibilidades de umha recomposiçom a meio prazo. E o ascenso de IU foi freado de raiz polo fenómeno Podemos. O partido dirigido a partir da torre de marfim dumha universidade madrilena e liderado por um telepredicador alterou o mapa político institucional espanhol, mas também galego. Umha das expressons da crise de um regime é a deceçom que gera entre setores sociais que até o momento vinham apoiando o sistema enquanto beneficiários. A grave crise económica nom só afeta com intensidade a classe operária e as camadas populares, também golpeia setores intermédios que estám a experimentar um progressivo processo de proletarizaçom. A deceçom abrolha e, após um período de confusom e perplexidade, exprimida no abstencionismo ou difusamente canalizada polo 15M, adota forma política. Consciente de que nas situaçons excecionais é necessário tomar decisons com certas doses de risco, parte

rente e aparentemente rupturista, mas perfeitamente integrável na lógica sistémica, que cumpra a funçom de anestesiante social e evite o deslocamento do desassossego para posiçons rupturistas.

Unidade patriótica face avanço da esquerda espanholista na Galiza

O

utra das conseqüências das eleiçons europeias é o avanço do espanholismo de esquerda no nosso país. As causas nom se podem achar na conjuntura imediata. Devemos entender o preocupante fenómeno em curso como resultado da açom combinada de factores objetivos e subjetivos com fundamentos históricos. A traumática entrada forçada da Galiza na CEE –antecendente da atual UE– provocou a desfeita do mundo rural e um golpe demolidor

ao marinheiro, destruindo boa parte das bases materiais e sociais da etnicidade galega e, portanto, do projeto nacional, facilitando assim a acelaraçom do pocesso de assimilaçom que o imperialismo espanhol leva séculos a tentar impor. As erráticas políticas ensaiadas de forma contraditória polo nacionalismo galego desde a década dos noventa do século passado, agudizadas com um prolongado período de convulsom após o continuísta governo bipartido que cristaliza na cisom do BNG de 2012, contribuírom para a sua perda de credibilidade e identificaçom com posiçons sistémicas entre os novos setores sociais emergentes, que hoje som ativos na luita política e social contra o regime, especialmente entre a juventude. A assimilaçom que o ensino e os meios de comunicaçom fomentam, a

A curta perspetiva do período trasncorrido já permite caraterizar de traiçom o abandono do quadro nacional de luita e a renuncia à auto-organizaçom nacional de parte do corpo organizado das forças patrióticas que entregárom em bandeja de prata a direçom política do movimento de massas ao espanholismo. Após ter perdido, na segunda metade da década dos setenta do século XX, a hegemonia na orientaçom das luitas sociais, o PCE, agora da mao do beirismo, como água de maio, recuperou a capacidade de incidir na luita sociopolítica galega. E, seguindo a sua pior tradiçom chauvinista, converte-se num agente ativo na destruiçom do projeto nacional à medida que vai influindo nos conflitos sociais, transladando chaves foráneas e empoleirando-se no poder institucional. A única forma de fazermos frente a este preocupante fenónemo é erradicar da prática e da lógica sociopolítica do conjunto do movimento soberanista galego os complexos e timoratismos inoculados durante décadas em boa parte da sua militáncia. É preciso dar passos firmes e claros na unidade de açom do conjunto das forças polí-


EDITORIAL

2 ABRENTE ticas e sociais situadas no campo da esquerda patriótica. Para frear o espanholismo “de esquerda”, é necessário que o nacionalismo se dote de um programa genuinamente classista e nom duvide em intervir guiado sempre polo princípio indiscutível da auto-organizaçom nacional. Há que manter a calma e agir com serenidade. O submetimento à pressom ambiental nom contribui para realizar análises rigorosas da realidade, nem muito menos para intervir com habilidade e inteligência. Os fenómenos em curso podem ser passageiros, ao estarem tutelados e dirigidos polo sistema, porque som funcionais para a estabilidade e para a perpetuaçom que agora vê ameaçada polo incremento das luitas populares e nacionais. Mas se há cessons e leituras laxas dos princípios medulares da luita de libertaçom nacional e social de género, caminharemos ineludivelmente face a derrota estratégica a que nos quer conduzir Espanha. Neste contexto, a luita ideológica recupera máxima importáncia. Eis porque a esquerda independentista mantivo um férreo combate contra o espanholismo durante as mobilizaçons permanentes de junho em prol da República Galega. Nom é hora da resignaçom nem de relativismos e sim de avançarmos com a coragem que

tem caraterizado o movimento de emancipaçom nacional desde 1964, com a segurança e a responsabilidade histórica que nos confere sermos a garantia da continuidade da Naçom Galega.

Nº 73 Julho, agosto e setembro de 2014

Nom podemos ser devorados polo auto-ódio que levamos décadas a combater, nom podemos ficar paralisados polo avanço no campo eleitoral do reformismo espanholista.

Se nom cedermos, se nom arriarmos o princípio da unidade intrínseca entre luita social e luita nacional, se mantivermos em alto e com orgulho as bandeiras de Moncho Reboiras, conseguiremos superar com sucesso o maior repto histórico a que nos submete o espanholismo “progressista” desde a refundaçom da esquerda patriótica há agora 50 anos. É necessário construir com perserverança e firmeza um pólo patriótico rupturista, aglutinante de todas as forças e indivíduos que acreditamos que só é possível a emancipaçom da nossa classe ligando a opressom que padecemos polo capitalismo espanhol e pola UE à carência de soberania da nossa naçom. As Eleiçons municipais da primavera de 2015 som a oportunidade para plasmar esta necessidade. Há que configurar candidaturas de unidade popular em chave estritamente galega, com um programa avançado no eixo classista e feminista. O êxito deste objetivo permitirá gerar as condiçons objetivas e subjetivas para a refundaçom da esquerda patriótica, para a construçom a partir da base de umha ampla organizaçom plural e integradora das siglas hoje existentes. Isso permitirá somar centenas de ativistas que carecem de umha ferramenta sociopolítica de massas que se converta em referencial para a Galiza que luita e que acredita nas imensas potencialidades de vitória do povo trabalhador galego.

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OPINIOM

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Anjo Torres Cortiço Membro da Direçom Nacional de NÓS-UP

A

firmarmos a estas alturas que o regime da II Restauraçom bourbónica sofre umha forte crise de deslegitimaçom nom supom nengumha novidade, é evidente. As contradiçons entre o regime político emanado do fascismo e as demandas e as necessidades das classes populares e das naçons oprimidas som a cada vez mais inocultáveis desde que a crise do capitalismo espanhol bateu com força nos seus alicerces, demonstrando que o regime da oligarquia está muito longe de ter vontade e capacidade de as satisfazer. Apesar da propaganda do governo do Partido Popular de Mariano Rajói e da sua defesa de um alegado início da “recuperaçom económica”, baseando-se nalgumhas cifras macro-económicas e na ideologia neoliberal capitalista, nos bairros populares a contundente realidade do empobrecimento, do desemprego e do subemprego, sobreexploraçom, precariedade, cortes nos serviços públicos essenciais como a saúde e o ensino, incremento dos preços nos serviços básicos, despejos, etc, fam com que comecem a cair os véus que durante as últimas décadas fôrom colocados sobre os olhos da classe trabalhadora e de todo o povo. A isto ajuda, é claro, a sangrante evidência de que a corrupçom e os privilégios, acompanhados em geral da impunidade, reinam entre empresários, banqueiros, políticos do regime e mesmo na monarquia espanhola, a começar polo ex-chefe do Estado, o assassino de elefantes Juan Carlos. Mas nom é só isso, nom... O decadente império espanhol está a ser posto em questom como o cárcere de povos que em essência é. Os limites, avondo estreitos, que som impostos às naçons oprimidas mesmo para modificar os estatutos de autonomia estám a provocar, até agora principalmente no caso catalám e basicamente no Principat, o avanço social e político do independentismo até níveis que há uns poucos anos pareciam impensáveis. Com efeito, o regime afronta a possibilidade real de continuar a perder territórios, agora já dentro da Península Ibérica, umha hipótese que causa pánico na oligarquia. Neste contexto que acabamos de apresentar, contexto que abre a possibilidade das alternativas após mais de três décadas de imobilismo e “consenso”, produzia-se no passado 23 de março a morte de umha dessas figuras convertidas polos hagiógrafos da Transiçom num herói da democracia. O homem que primeiro foi falangista, depois presidente do governo e, finalmente, nem mais nem menos que duque e “grande de Espanha”. Falamos, claro, de Adolfo Suárez. E como o regime e os seus defensores nom perdêrom a ocasiom de bombardear-nos durante dias com umha nova campanha propagandística sobre as supostas excelências da “modélica transiçom”, sobre o bom que é o consenso que (asseguram @s tertulian@s e historiadoras/es de cámara) naqueles anos existiu, e sobre o razoável e sensato que seria encetarmos umha “segunda transiçom” pilotada por “políticos da estatura de Suárez”, nós tampouco podemos deixar fugir a oportunidade de expor e divulgar algumhas verdades que a mitologia da Transiçom quer ocultar.

Umha transiçom modélica

S

em esquecermos os/as antig@s esquerdistas agora integrad@s que repetem aquilo de que “foi o único possível naquele contexto”, assim é como costuma ser qualificado o processo de transmutaçom gatopardiana do fascismo espanhol. Os e as apologistas da monarquia bourbónica, na imprensa, nos parlamentos burgueses, nas salas de aulas e mesmo nos púlpitos, levam décadas a repetir o mantra doutrinador de umha transiçom maravilhosa que seria, aliás, um “modelo para o mundo”. Umha feliz reconciliaçom entre irmaos que voluntariamente teriam decidido esquecer velhas disputas para iniciarem juntos um caminho de paz, liberdade e prosperidade... Nunca mencionarám umha questom como a do controlo do processo

ABRENTE 3

Suárez, a mitologia da “Transiçom” e os O movimentos do regime

agora como um projeto que oferece umha “alternativa” indefinida, um republicanismo sem conteúdo social e umha alegada sensibilidade com a questom nacional (lá onde nom lhe fica mais remédio, claro está!). Umha mercadoria suspeita, mas que alguns setores da esquerda galega estám dispostos a comprar custe o que custar.

A armadilha de umha segunda transiçom

Adolfo Suárez jura solenemente o seu cargo como chefe provincial do "Movimiento", 11 de junho de 1968, perante o secretário-geral do partido único franquista, José Solís Ruiz

polas potências imperialistas ocidentais, a começar por uns Estados Unidos aos quais o genocida Franco já rendia vassalagem desde o final da Segunda Guerra Mundial. Agora nom podia ser que as veleidades democráticas, para nom falarmos já das revolucionárias, dos povos do Estado espanhol fossem pôr em risco a posiçom norte-americana num lugar estratégico como a Península Ibérica, no contexto da Guerra Fria. Os Estados Unidos, como a Alemanha Federal e as restantes potências capitalistas ocidentais, necessitavam controlar o processo e assegurar a instauraçom de umha monarquia parlamentar unitária que acabasse por entrar na NATO e na CEE. Juan Carlos, o ambicioso principezinho imposto por Franco como sucessor na chefia do Estado, é também o homem dos americanos, que através da CIA e da Secretaria de Estado levavam planificando os passos a seguir desde anos antes da morte do ditador, que nom por acaso sabia que ia deixar todo “atado e bem atado”. Se a evidente intervençom do imperialismo nom for suficiente para questionarmos esse carácter exemplar da Transiçom, também podemos falar de como a mobilizaçom popular, por vezes nom controlada polos partidos e sindicatos encarregados de a encarreirar polos caminhos da frustraçom (PCE-CCOO e PSOE-UGT), foi reprimida sem duvidá-lo de umha maneira brutal nos anos que vam da morte na cama de Franco à vitória em 1982 do arrivista Felipe González e do seu PSOE (que só o nome conservava do partido histórico). A história oficial da Transiçom inventou um processo essencialmente pacífico, onde entre música e música de Jarcha, como muito, se sentiu algum golpe das porras dos grises ou se produziu algum atentado obra de descontrolados, como o assassinato de cinco advogados laboralistas vinculados às CCOO e ao PCE em Madrid no ano 1977. O regime assegurou o êxito do processo a ferro e fogo, empregando os meios legais, alegais e ilegais ao seu dispor. Foi umha constante do processo a repressom das manifestaçons obreiras e populares, dos movimentos

de libertaçom nacional, as detençons e as torturas e as mortes e execuçons de militantes revolucionári@s a maos dos corpos repressivos oficiais e dos grupos terroristas de extrema-direita controlados pola polícia e os serviços secretos espanhóis. Entre 1976 e 1980 (e portanto dentro do período em que Adolfo Suárez foi presidente do governo), mais de 100 pessoas morrêrom e centenas mais sofrêrom malheiras, ameaças e agressons a maos dos corpos repressivos e dos grupos fascistas (Guerrilleros de Cristo Rey, as seçons C e Z de Fuerza Nueva, o Batallón Vasco-Español, ATE –Antiterrorismo ETA–, etc.). Para além disto, durante todo o processo foi utilizado o “ruído de sabres” como umha outra maneira de condicionar a vontade popular sob a ameaça de umha intervençom militar e umha volta à ditadura pura e dura (e à repressom mais brutal) em caso de haver “excessos radicais”. E é certo que, longe de qualquer posiçom neutral e subordinada à vontade democrática das Forças Armadas (que corresponderia, supostamente, aos exércitos das democracias burguesas), o exército espanhol franquista, fachendosamente golpista e intervencionista ao longo da história, nom iria ter nengum problema em utilizar as armas para impedir um hipotético processo de ruptura feito a partir de baixo e das naçons oprimidas, algo que, além do mais, o imperialismo ocidental nom impediria. O auto-golpe de Estado do 23 de fevereiro de 1981, com certeza o episódio da Transiçom mais e melhor utilizado durante todo este tempo para criar umha mitologia do triunfo e consolidaçom da democracia e, sobretodo, do papel salvador da monarquia e do próprio Juan Carlos, é também o melhor exemplo de como as elites que dirigírom aquela farsa utilizárom a ameaça da intervençom militar reacionária para amedrontar, desmobilizar e abocar à resignaçom boa parte dos setores que ainda apostavam na ruptura ou nom estavam totalmente integrados no circo democrático burguês. Finalmente, também cumpre assinalar a desigualdade de con-

diçons imposta às organizaçons e movimentos rupturistas na hora de concorrerem, mesmo a nível eleitoral, com os partidários da reforma. Em dezembro de 1976, tem lugar o referendo sobre a reforma política promovido polo governo de Adolfo Suárez. Nessa altura, nem sequer o PCE ou o PSOE estám legalizados, se bem a sua atuaçom política já está mais ou menos tolerada. Junho de 1977 é o momento das primeiras eleiçons legislativas às Cortes espanholas, que serám as encarregadas de pactuar e redigir a atual Constituiçom. Nesta ocasiom os partidos da esquerda reformista e das burguesias periféricas sim podem participar plenamente (o PCE fora legalizado poucos meses antes), mas as organizaçons rupturistas e revolucionárias, tanto as das naçons oprimidas como da esquerda estatal, ainda nom estám legalizadas e estám submetidas a todo tipo de dificuldades na sua atuaçom política e eleitoral e à hora de transladar as suas mensagens em igualdade de condiçons, quando nom estám condicionadas e limitadas pola criminalizaçom e a repressom estatal e para-estatal. Um processo, há que dizê-lo mais umha vez, que precisou da triste cumplicidade das organizaçons da esquerda reformista. Tanto PSOE e UGT como o PCE e CCOO aceitárom com gosto o seu papel na farsa contribuindo de maneira decissiva para a derrota popular e a frustraçom histórica. Apoiárom a monarquia, os Pactos da Moncloa, a Constituiçom e a Lei de Anistia. Traírom o republicanismo, o direito de autodeterminaçom, a memória e a justiça para @s combatentes antifascistas e a possibilidade de erguer umha alternativa ao capitalismo. Adaptárom-se perfeitamente ao novo contexto, o PSOE até governar como qualquer outro partido burguês e o PCE-IU cumprindo o papel de falsa alternativa na recámara. Mas nom só isso, também ajudárom a combater e deslegitimar a quem nom se somou ao circo e mantivo a dignidade revolucionária contra vento e maré. Isto também é memória histórica e cumpre lembrá-lo, especialmente quando o PCE-IU se quer apresentar

debate sobre a Transiçom está a ganhar umha nova importáncia nos últimos anos, ao calor da crise de legitimidade do regime emanado da mesma por causa, como indicamos no início deste artigo, do crescimento do descontentamento popular derivado das conseqüências da crise capitalista, das duríssimas medidas antipopulares dos governos do PSOE e do PP, da evidência da corrupçom generalizada nas elites do regime e do avanço do processo soberanista catalám. Mais umha vez, a questom social e a questom territorial. As referências à necessidade de umha segunda transiçom para o regime superar estes reptos som a cada vez mais habituais tanto na imprensa burguesa como de dentro dos partidos políticos dinásticos. Mais ainda após o aviso ao bipartidarismo que supujo o resultado das recentes eleiçons europeias, um resultado que levou o regime a acelerar os passos e mover ficha com a abdicaçom de Juan Carlos e a coroaçom de Felipe de Bourbon. Propagandisticamente, o novo rei e chefe de Estado foi apresentado como umha pessoa preparada, membro de umha nova geraçom disposta e tomar as rédeas num contexto difícil e capaz de encabeçar umha nova etapa e renovar consensos. Precisamente a morte de Adolfo Suárez fora aproveitada por alguns neste sentido, apelando à necessidade de novos “consensos” e laiando-se pola ausência de “grandes líderes políticos” capazes de guiar o processo “como durante a Transiçom figérom Juan Carlos de Bourbon e Suárez”. Uns posicionamentos públicos que nom som casuais, que sondam e preparam o terreno para umha nova fraude, para umha nova operaçom cosmética dirigida polas elites para garantir a continuidade dos seus interesses e do seu poder e neutralizar de novo as possibilidades rupturistas que o atual contexto oferece potencialmente. As opçons som diversas e o nível de profundidade aparente desta hipotética “segunda transiçom” dependerá do medo que a oligarquia tiver a umha transformaçom real. O primeiro passo está a ser a mudança no seio da monarquia e, com matizes entre os diferentes setores, a defesa de umha reforma constitucional; mas, se isto nom for suficiente, o regime nom se descarta prescindir da coroa numha saída republicana controlada que dê aparência de ruptura. Nom é casual que a opçom republicana, até há pouco tempo oculta nos grandes meios e tabu para os principais partidos (curioso ver como até o PSOE fai piscadelas republicanas de quando em vez), volta agora ao debate nos ámbitos oficiais. No tocante à questom territorial, o regime também se debate entre o imobilismo total e as propostas de reformulaçom do sistema autonómico, com apelos ao federalismo por parte de PSOE e IU, mas sempre negando o direito de autodeterminaçom às naçons oprimidas. A ideia é atingirem um novo pacto com as burguesias catalá e basca e debilitarem até anularem as atuais demandas e processos soberanistas e os que podam conformar-se no futuro. Umha repetiçom da armadilha dos Estatutos de autonomia. É a nossa tarefa denunciar e combater a possibilidade de umha nova fraude que frustre as possibilidades de umha ruptura favorável à Naçom Galega e ao seu povo trabalhador. Para isso, temos que dar com mais força a batalha ideológica contra as posturas favoráveis à “segunda transiçom” e, sobretodo, contribuir para a construçom de um movimento popular amplo por umha ruptura própria, galega e popular. Porque o nosso povo sim tem forças para o fazer.


ANÁLISE

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Nº 73 Julho, agosto e setembro de 2014

Podemos, think tank espanhol Miguel Ramos Cuba Militante de Primeira Linha

S

ejamos sinceros, a mim cai-me bem Pablo Iglesias. Nom vai ser este um artigo em que a figura política do professor da Universidade Complutense de Madrid se critique ao ponto de a tornar inútil para as tarefas da esquerda real e transformadora do nosso país. Nom é este o nosso estilo, pois consideramos que a irrupçom mediática de Podemos e do seu dirigente-tertuliano nos deixa evidentes liçons das que devemos apreender. Somos verdadeiros admiradores do carisma como ferramenta para a transformaçom política e por isso talvez sejamos algo indulgentes com o excesso de personalismo que às vezes implica. Seria absurdo criticar grandes condutores políticos da luita de classes contemporánea como Fidel Castro, Hugo Chávez ou o mesmo Lenine pola sua forte personalidade associada ao carisma. E igual que criticamos Beiras nom pola própria utilizaçom que fai das suas virtudes comunicativas e simbólicas, e sim polo projeto político em que se contextualizam estas, assim vamos tentar fazer com Pablo Iglesias e com o projeto político nucleado em torno dele. E, como último aviso introdutório, nom vamos neste pequeno artigo fundamentar a nossa oposiçom a Podemos na capacidade e focagem analítica do grupo da madrilena Faculdade de Ciências Políticas de Somosaguas; antes consideramos necessário para a militáncia revolucionária apreender lá onde for possível. É impossível desligar o sucesso de Podemos da formaçom académica e academicista de Iglesias, Errejón e Monedero, a modo dum verdadeiro think thank que aplica processos de engenharia social sobre todos nós e, embora nom podamos nem desejemos entrar no mesmo jogo da élite universitária, devemos assumir todo o que necessitarmos e considerarmos importante. A terrível, por certa e necessária sentença de que o burguês nos venderá a soga com que o enforcaremos toma aqui sentido simbólico a respeito do inteletual possibilista. E sobre isto temos a máxima expressom na utilizaçom dos meios de comunicaçom como forma de difusom massiva de ideologia (no sentido marxista original do termo como “falsa consciência necessária”) fundamental para o exercio de hegemonia, neste caso simplesmente eleitoral. Assim, os meios de comunicaçom de massas pertencentes aos diferentes oligopólios espanhóis dérom a Pablo Iglesias Turrión um espaço mediático sem o qual lhe seria impossível construir a referencialidade necessária para levar a bom porto o projeto de Podemos. Isto é umha verdade inegável que, como muito, pode ser matizada em torno da habilidade do discurso e das formas retóricas de Podemos para romper a apatia e oferecer umha imagem formal de rebeldia e insubmissom que, evidentemente, cativou o eleitorado. É necessário percorrer este caminho já trilhado e golpear com imaginaçom, originalidade e transgressom nos pequenos espaços que o aparelho mediatico pode reservar àqueles que peretendem destrui-lo. Essa formulaçom pode soar absurda num espaço político da esquerda independentista que se acha expulso de qualquer meio de expressom de caráter mediático. Porém, se assumirmos o ascenso de forças pró-espanholas como um problema para a sobrevivência do projeto nacional galego, devemos identificar suficientes expressons jornalísticas de caráter nacional com potencia formal suficiente para aplicar estratégias semelhantes. Sendo mais claros, o conjunto da esquerda nacional conta com força para aplicar estratégias comunicativas à altura do think thank de Somosaguas

Podemos é umha alternativa regeneracionista e orgulhosamente espanhola

se abandonar o acomoditício e aborrecido estilo institucional.

Que é Podemos?

N

os dias de hoje, a formaçom política que, como logótipo, registou a cara do seu próprio lider é ante todo um fenómeno mediatico. A gente posiciona-se, apaixona-se e posiciona-se em torno desta formaçom política com um nome a meio caminho entre umha palavra de ordem futebolística e umha legenda de marketing eleitoral gringo. Isto objetivamente é um sucesso que determina a intervençom do resto de agentes políticos, influindo diretamente na mentalidade e posiçom de grande parte da militáncia da esquerda real. Podemos é hoje mais um fenómeno político de caráter processual que um sujeito político objetivizado dentro de um sistema hegemónico ou contra-hegemónico. Mas o presente nom nos pode fazer esquecer a história como contexto geral que determina o futuro. Um pequeno exercício memorístico que se calhar nom tem porque ir além deste ano político, leva-nos a um momento no outono de 2013 em que todos os faladoiros políticos da capital espanhola ferviam ante a manobra de Izquierda Anticapitalista de criar umha nova marca eleitoral sob o comando dum Iglesias Turrión e amigos em ascenso mediatico. Um rumor madrileno transladado ao conjunto de territorios submetidos por Espanha devido às virtudes da internet, que deixavam um claro aroma a conspiraçons de café e cigarro de portas para dentro, num ambiente mui parecido com a velha e triste política de casta. Porque nom podemos esquecer o dinheiro malgasto pola sucursal espanhola do Secretariado Unificado da IV Internacional nós últimos para erguer um espaço político e mediático no panorama espanhol. Igual que nom podemos esquecer o passado político do catedrático da trama, Juan Carlos Monedero, como assessor de um Gaspar Llamazares, na tentativa deste último de converter Izquierda Unida ainda mais num apêndice do PSOE neoliberal. Sabemos isto e pouco mais, porque o certo é que este perfil de conspiraçom clandestina impregna grande parte do modelo organizativo de Podemos. Nom lhe conhecemos estatutos nem modelo organizativo definido e o que sabemos deste e das dinámicas internas deve-se à rumorologia de internet e às diferentes declaraçons de distintos gurus que se associam ao sucesso eleitoral de Podemos.

Contodo, isto torna-nos, no mínimo, sabedores da intençom que tenhem de criar umha organizaçom sem filaçom nem rendiçom de contas que tivo como primeiro episódio crítico a eleiçom sem alternativa viável dumha gestora sob eleiçom digital de Iglesias Turrión. A impressionante constituiçom de assembleias territoriais ou temáticas sob o nome de Circulos nom nos pode enganar, pois o modelo organizativo reside na telemática, a participaçom aberta e a desapariçom do conceito de militáncia. Esta modernidade política que parece umha utopia democrática nom deixa de ser umha nova forma de caudilhismo ilustrado, que pretende acumular a máxima pluralidade sem debates nem problemáticas associadas. Afirmamos isto porque a combinaçom entre o enorme capital cultural e mediático acumulado polo clam da Complutense (assim como o seu acesso preferencial aos meios de difusom) junto com inexistência de mecanismos de rendiçom de contas diante do esforço da militáncia impossibilitam qualquer tipo de decisom coletiva. Nem Lacan, nem Monedero nem Raimundo Viejo; o modelo organizativo de Podemos foi inventado por Juan Domingos Perón há quase setenta anos e à esquerda pouco mais legou que umha simpática trilha sonora.

Pluralidade ideológica? Flexibilidade programática? Ou oportunismo?

N

o Peronismo conviviam corporativistas e marxistas, grandes proprietarios com proletariado industrial, organizaçons armadas com caraterizaçons de bonapartismo e fascismo. Todo unido exclusivamente pola magnificência de Perón e a ausencia de qualquer tecido organizativo de caráter democrático. Salvando as distáncias, Podemos tem refletido contradiçons semelhantes entre as suas diferentes expressons organizativas em temas chaves como o feminismo, a questom nacional ou a caraterizaçom da exploraçom social vigente. Independentemente da formulaçom de tais divisons internas, esta claro que as temáticas som as que no campo político geral (e na esquerda em particular) deslindam espaços e constituem material teórico e ideológico para a criaçom de formulaçon orgánicas diferenciadas. A existência de tal heterogenidade em Podemos é permitida pola inexistência dum mecanismo democrático de debate, devido à submissom ao lider, mas também pola prática ausência dum programa político de tal nome.

É conhecida a admiraçom por parte de Iglesias Turrion em relaçom a Julio Anguita e à sua sentença em relaçom à possiblidade de pactos políticos de “programa, programa e programa”. Nós somos defensores da necessidade das articulaçons programáticas para o exercício da política (quer para a elaboraçom de pactos e alianças, quer para outra circustáncia qualquer) e por isso mesmo somos conhecedores da importáncia da análise destes, além da simples retórica eleitoral. Parece que a dirigência de Podemos nom é da mesma opiniom, pois a sua proposta de programa é insuficiente como programa político e impossível de levar a cabo a partir do Parlamento europeu. Esta ambivalência converte tal instrumento político num exercício de marketing com que vender o maior número de packs sem transformar a consciência de nengum dos compradores, pois para isso parece que já bastam as tertúlias. Fora desta caraterizaçom do programa como umha ferramenta auxiliar às figuras mediaticas, existe umha clara insufiência e contradiçom entre as suas medidas relativas à Europa, que, lembremos, é a unica instáncia à qual concocorreu por agora a eletoralista Podemos. Estamo-nos a referir à relativa ambigüidade a respeito do Euro, assim como à proposta de realizar umha auditoria sobre a dívida em vez de a declarar ilegítima na sua totalidade. Há que ter presente que, independentemente da pergunta de quem realizaria tal auditoria, é impossível qualquer exercicio soberano no que di respeito à dívida externa, quando a soberania monetária se encontra seqüestrada polos mesmos credores.

Um novo projeto nacional?

Q

uando Podemos fala da pátria ou da soberania como respeito à divida, fai-no dumhas coordenadas distintas às que estamos habituados a escuitar por parte da esquerda. Para nós, a esquerda nacional galega, a pátria tem um significado inequívoco, que se refere ao sujeito sociopolítico e cultural, num espaço territorial, onde pretendemos erguer a República da Galiza. A Pátria (Galega) é um projeto político, de carácter nacional, que historicamente estivo nas maos das camadas populares e que hoje representa a nossa alternativa para transformar a realidade numha chave socialista e feminista. Que este projeto seja galego representa umha ruptura com a opressom nacional e umha ampla margem de liberdade para mudar todo, ao cortar amarras com a pressom simbólica

(e nom só) que o chauvinismo nacional espanhol representa. Porque “pátria” referido a Espanha é a denominaçom dum projeto nacional expansionista que foi encolhendo com o passar dos séculos, mas que aumentou compensatoriamente a pressom sobre os restantes. Espanha é um projeto político, mas também material (nas suas formas económicas e militares) dumha burguesia subsidiária a nível internacional que nos tem que oprimir para poder sobreviver como tal. Podemos quer utilizar o termo Espanha como se estivesse vazio de significado e de conotaçons materiais, como alavanca simbólica de mobilizaçom; pretende recuperar para a esquerda espanhola o termo pátria. Mas o problema é que, por muito que mudem formalmente a conceçom tradicional de Espanha por umha fundamentada na vontade, a realidade presente é a que é. Espanha existe e pressiona a consciência dos seus súbditos como um narcótico imobilizador em forma de seleçom de futebol ou orgulho monárquico. As identidades nacionais definem-se por oposiçom e a espanhola define-se por oposiçom à galega (ou à basca, ou à catalá), antes que por oposiçom à alemá ou à francesa. Os aderentes a Podemos na Galiza entendem-no muito melhor que os seus inteletuais e tenhem bem claro que o seu inimigo simbólico é o galego.

Conclusom

P

odemos é um produto de marketing político e engenharia social que pretende ser um a alternativa amável de um seitor concreto da oligarquia espanhola que neste momento se encontrada afastada dos centros de decisom pola hegemonia do bipartidarismo monárquico. As suas formas de intervençom política estam contextualizadas neste ámbito, mas, apesar disto, suponhem umha escola de aprendizagem que a militáncia revolucionária deve estudar, embora só seja por curiosidade política Ora bem, isto nom nos pode baralhar e devemos ter sempre presente que Podemos é umha alternativa regeneracionista e orgulhosamente espanhola, que inclusive deixa de ser frentepopulista para ficar em populista. A feroz crítica que hoje em dia sofre está mais relacionada com a necessidade de asseguar umha transiçom pacifica perante a “pasokizaçom” do PSOE, do que com um temor real. Podemos ameaça o bipartidarismo, mas nunca Espanha nem o seu projeto capitalista.


ANÁLISE

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ABRENTE 5

Leninismo e libertaçom nacional Maurício Castro Membro do Comité Central de Primeira Linha

I

ndo brevemente aos inícios do marxismo, devemos indicar a parcial compreensom de algumhas importantes implicaçons do fenómeno nacional e do nacionalismo polos primeiros teóricos marxistas e das outras correntes da esquerda no século XIX. Hoje sabemos bem que o próprio desenvolvimento histórico do capitalismo nom poderia ter chegado ao grau de desenvolvimento global atual sem a funçom de intercámbio desigual e sem o espólio ilimitado verificado polas grandes potências capitalistas europeias em relaçom às suas colónias. Foi isso que permitiu o avanço tecnológico e económico necessário para a universalizaçom do capitalismo como processo histórico1 a partir dos estados-naçom centrais em que surgiu o mundo burguês.

Marx e Engels: A visom a partir do capitalismo avançado europeu

É

um facto conhecido o nascimento histórico do estado-naçom como forma jurídico-institucional ao serviço da expansom mercantil e industrial no ascenso da burguesia como nova classe dirigente, no seu longo processo de afirmaçom que lhe permitiu ultrapassar os limites das velhas relaçons de produçom. A substituiçom primeiro factual e depois de legal da relaçom salarial entre patrons e trabalhadores, o sustento jurídico do estado de direito como legitimaçom das novas normas impostas à divisom do trabalho e a necessária abertura de um mercado único estatal ajudam a entender o avanço, a par e passo, das novas formas de capitalismo e as novas formas estatais ao seu serviço. É essa constataçom por parte dos próprios Marx e Engels no coraçom da Europa desenvolvida do século XIX (Inglaterra) que os levou a afirmar essa nova forma estatal como facto progressivo nom apenas na própria Europa (onde a sua Alemanha natal sofria um atraso socioeconómico refletido no atraso na constituiçom da nova naçom unificada), mas no resto do planeta. O otimismo com que ambos autores enxergavam a expansom do modelo central europeu a outras regions do planeta, como a Ásia ou a América, explica o apoio sem reservas à colonizaçom indiana por parte do imperialismo británico, à anexaçom territorial mexicana por parte do jovem capitalismo norte-americano ou mesmo a sua errada avaliaçom da figura e do papel de Simón Bolívar. Na sua visom, a imposiçom de modelos capitalistas avançados consoante o padrom europeu levaria as naçons instaladas em modos de produçom atrasados à conformaçom de proletariados capazes de liderar futuros processos revolucionários. Já no caso do continente europeu, o critério de Marx e, sobretodo, de Engels enfrentárom contradiçons entre a condena dos chamados “povos sem história”, considerados incapazes de protagonizar a sua própria emancipaçom e, por isso, condenados à desapariçom pola inexorável imposiçom do correspondente Estado-Naçom2, portador do capitalismo; e os que, incapazes até aí de construir o seu próprio Estado, protagonizavam processos que ambos vírom com aberta simpatia. Para além do seu “tradicional” apoio ao movimento nacional polaco, especialmente significativo vai ser o que dam ao independentismo irlandês. Significativo, nom só porque contradi a sua visom mecanicista em relaçom às colonias americanas e asiáticas, mas também porque ambos vivem na Inglaterra, conhecendo por isso de perto esse conflito nacional3, cada vez mais acirrado conforme avança o século XIX, atingindo formas insurrecionais por parte do movimento feniano irlandês. As sucessivas recomposiçons do capitalismo inglês após cada crise, a absorçom do movimento cartista polo sistema, a integraçom dos outrora combativos sindicatos para se limitarem à luita por melhorias salariais, as votaçons maioritárias contra os partidos operários na década de 60... Engels identifica o significativo progresso e integraçom do proletariado inglês no capitalismo como resultado do espólio das colónias. Daí ao apoio expresso à “colónia branca” irlandesa, é só um passo que ambos camaradas nom demorárom a dar com total clareza, avançando para posiçons de maior coerência com os objetivos libertadores do marxismo. Implacável frente ao cosmopolitismo e às teses proudhonianas de desprezar qualquer conflito nacional como “preconceito antiquado”, Marx escreve a Engels em 1866, comentando a discussom num encontro entre diferentes correntes operárias em Londres, no qual alguns franceses defendiam a dissoluçom em pequenas comunas associadas como alternativa à conformaçom dos modernos estados: “Os ingleses rírom muito quando comecei dizendo que o nosso amigo Lafargue e outro que acabavam de abolir as nacionalidades, nos falavam em ‘francês’, quer dizer, um idioma que nom compreendiam 9/10 partes do auditório. Depois sugerim que por negaçom das nacionalidades, Lafargue parecia

Maurício Castro, Lenine caminhando no escuro, 2014, óleo sobre madeira entelada, 46 x 38 cm

entender, muito inconscientemente, a absorçom delas na exemplar naçom francesa”4. A distinçom entre internacionalismo e cosmopolitismo tem importáncia na hora de interpretarmos a famosa sentença contida no Manifesto Comunista, segundo a qual “os operários nom tenhem pátria”. Existem diferentes interpretaçons de um texto meio ambíguo que só pode compreender-se a partir do estudo geral da posiçom marxiana, contrária à desapariçom ou desconsideraçom das naçons e defensora da constituiçom do proletariado como classe hegemónica no comunismo. Um horizonte em que se situa, isso sim, a extinçom dos estados.

Depois de Marx-Engels e antes de Lenine: Entre o chauvinismo e a insuficiente compreensom do facto nacional

O

grande contributo de Lenine foi, sem dúvida, ultrapassar as carências dos autores que, seguindo o marxismo, tentárom realizar umha atualizaçom da compreensom e do programa revolucionário no plano nacional. Do chauvinismo kautskista, que o leva, junto ao conjunto da II Internacional, a defender a burguesia do seu próprio país em 1914; ao mecanicismo cosmopolita de Plekhanov, pai dos marxistas russos, que acredita na progressiva “eliminaçom das diferenças nacionais”; o determinismo economicista de Rosa Luxemburgo, que nega qualquer viabilidade nacional ao seu próprio povo, o polaco; ou o culturalismo de Bauer e os austromarxistas; assim como o ecleticismo de Trotsky, a caminho entre o culturalismo e o economicismo; e a rígida receita staliniana, caraterizada pola insuficiente distinçom entre o nacionalismo da naçom opressora e o nacionalismo da naçom oprimida5. Foi em debate com esses autores e autoras, entre outros, assim como na escola prática da militáncia revolucionária, que Vladímir Ilitch perfilou a mais madura teorizaçom marxista para o capitalismo monopolista desenvolvido diante dos seus olhos ao longo do primeiro quartel do século XX.

Lenine: as naçons oprimidas como sujeitos políticos ao serviço da revoluçom

C

omo primeira caraterística do pensamento de Lenine, já desde 1903, em que começa a escrever sobre o assunto, devemos destacar o reco-

nhecimento explícito do direito de autodeterminaçom e o rejeitamento aberto da opressom nacional. De facto, o POSDR converteu-se nesse ano no primeiro partido marxista a incluir no seu programa o direito de autodeterminaçom. Até a Revoluçom de 1905, podemos afirmar que a sua é umha “defesa passiva” dos direitos nacionais, com escassa dedicaçom teórica e umha clara desconsideraçom prática quanto à importáncia da resoluçom do problema nacional no interior do Império russo6. Em 1905, regista-se umha mudança de tendência, com o protagonismo do movimento de libertaçom nacional na Finlándia, onde se registam as maiores mobilizaçons. Apesar do definhamento do movimento revolucionário nos anos que se seguem à derrota, a partir de 1912 o fator nacional ganha peso tático na luita política novamente ascendente contra o Czarismo. Os povos oprimidos em que nom se tinham manifestado expressons de afirmaçom nacional em termos políticos começam a fazer frente à crescente russificaçom forçada de um nacionalismo Gram-Russo exacerbado, temeroso de perder os seus privilégios nacionais. Lenine, que sempre tinha reconhecido os direitos nacionais como princípio democrático, assume agora umha posiçom ativa, integrando-os como parte da imprescindível acumulaçom de forças revolucionárias. É nesta altura e nesse contexto de maior protagonismo do fator nacional que pede a um “maravilhoso georgiano” que elabore um trabalho que poda servir de base à orientaçom política do Partido Bolchevique. O artigo “O marxismo e a queston nacional” é concluído em 1913, ficando como o mais importante texto teórico elaborado por Staline. Apesar das suas carências, algumhas das suas teses ficarám como referência durante décadas para as esquerdas ligadas à III Internacional pós-Lenine e nom só7. Porém, no intervalo entre 1913 e a morte de Lenine, o trabalho de Staline nem cumpriu a tarefa para a qual tinha sido elaborado, nem o próprio Vladímir Ilitch o citou na sua cada vez mais abundante elaboraçom teórica sobre a matéria. Contodo, sim detetamos aspetos comuns ao que vai ser o programa bolchevique até 1917, como a ratificaçom do reconhecimento do direito de autodeterminaçom ou umha rígida negativa tanto às propostas aus-

tromarxistas como às federativas do Bund (organizaçom da esquerda socialista judia no interior da Rússia). Em ambos aspetos, as cousas vam mudar com a vitória revolucionária, abrindo-se a aplicaçom de políticas análogas às propostas polo austromarxismo (em relaçom ao ensino da língua ídiche à populaçom judaica na Ucránia e na Bielorrússia) e reconhecendo-se soluçons de tipo federal a nível organizativo do novo Estado operário8. Noutros pontos, as teses de Staline discordam das defendidas por Lenine nos anos seguintes. É o caso do psicologismo (“psicologia peculiar”, “fisionomia espiritual” e “comunidade de psicologia”, chama-o Staline) e da “exigência” de umha tabela fechada de caraterísticas imprescindíveis para a “catalogaçom” de umha comunidade humana como nacional. Som elas: “comunidade estável, historicamente formada e surgida sobre a base da comunidade de idioma, de território, de vida económica e de psicologia, manifestada esta na comunidade de cultura”. Segundo o autor do texto, “basta com que falte nem que seja só um desses traços, para que a naçom deixe de ser tal”. Tam chocante como a “exigência” do referido “catálogo integral”, que Lenine descarta explicitamente em diferentes escritos sobre o assunto, é a ausência do que o próprio Vladímir Ilitch irá afirmar como elemento central para o reconhecimento da naçom: A vontade9 e, em conseqüência, a existência de um sujeito político que constrói a naçom. Dá nas vistas também, na visom de Staline, a afirmaçom de que, na Europa Ocidental, todos os estados coincidem com espaços nacionais, situando o caso irlandês como única exceçom. Contradi assim a sua própria definiçom dogmática, pois é evidente a existência de diferentes comunidades nacionais no interior da maioria dos estados capitalistas do ocidente europeu. Ao invés, Staline considera que a Europa Oriental sim se carateriza pola existência de “Estados multinacionais”. Mais umha caraterística do nacionalismo explicado por Staline é a insuficiente distinçom entre naçom opressora e naçom oprimida, igualando ambas na disputa interburguesa que, no caso da naçom oprimida, tenta arrastar outras classes sob a bandeira dos interesses da “pátria”; umha pátria que Staline escreve assim, entre aspas. Coincide com Lenine, entretanto, ao definir a autodeterminaçom como o direito à plena separaçom, assim como, em simultáneo, à negativa a favorecer a auto-organizaçom do proletariado de cada naçom oprimida: “...os operários estám interessados na fusom completa de todos os seus camaradas num exército internacional único...”. Só após a chegada ao poder do Partido Bolchevique mudará Lenine a sua posiçom nesse terreno, defendendo a federaçom tanto a nível de partido como do novo Estado operário: a URSS, criada em 1922. Também coincidem no reconhecimento da Suíça como mais avançada democracia burguesa na abordagem da diversidade nacional. No caso de Lenine, chega a pô-la como exemplo da soluçom da questom lingüística, contrapondo o seu modelo territorial com o “cultural-nacional” que defendia a corrente austríaca de Otto Bauer10. O esquematismo e reducionismo do artigo de Staline vai ser ultrapassado em todas as frentes polo desenvolvimento teórico (e prático) da linha política leninista nos anos seguintes, até 1917 e mais além. Entretanto, a passagem de Kautsky para o campo burguês com motivo da Guerra de 1914 acelera a ruptura de Lenine com o que tinha sido um importante referente teórico. A sucessom de acontecimentos e o protagonismo crescente das luitas nacionais obrigam-no a elaborar um quadro teórico próprio nos anos seguintes. Perfila com clareza a distinçom entre naçom opressora e naçom oprimida, partindo da extensom da posiçom de Marx sobre a Irlanda, projetando à realidade imperial russa o princípio de que “um povo que oprime outro povo nom pode ser livre”. Denuncia cada vez mais abertamente o nacionalismo opressor russo e deteta a sua influência no campo popular, tal como Marx e Engels tinham detetado o británico no proletariado inglês. Situa claramente o movimento popular como sujeito da autodeterminaçom e reafirma o caráter político (nom meramente cultural nem económico) do facto nacional; declara a durabilidade dos fenómenos nacionais contra as teorias mecanistas sobre a diluiçom das diferenças entre as naçons e situa no imperialismo a causa para umha explosom de luita nas pequenas naçons europeias que favorecerám a luita do proletariado socialista11. No plano internacional, apela à inclusom do princípio de autodeterminaçom nos programas dos estados europeus mais avançados, rompendo com a inconseqüente omissom da Europa Ocidental como palco das luitas de libertaçom nacional e contrariando as teses do artigo de Staline. passa à página 6


ANÁLISE

6 ABRENTE Vem da página 5

O ano 1917 marca um novo passo em frente. Coincidindo com crise revolucionária russa, Lenine já abandona a ideia da bondade intrínseca da integridade territorial do Império. Os direitos nacionais som incorporados ao programa revolucionário, junto à reivindicaçom da terra e dos sovietes como organismos de nova democracia popular.

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Leninismo e libertaçom nacional

Lenine, a coerência e o compromisso com as luitas nacionais depois de 1917

A

té aqui vimos, de maneira esquemática, o desenvolvimento do pensamento de Lenine avançar ao ritmo dos acontecimentos políticos, sempre estreitamente ligado ao pulso da realidade e das necessidades do avanço da luita revolucionária. Poderia haver quem acusasse essa evoluçom leninista de simples oportunismo ou instrumentalizaçom da luita dos povos oprimidos. Porém, achamos que a tendência foi antes a contrária. Das declaraçons favoráveis alheias de compromisso prático real dos primeiros anos, o Partido Bolchevique avançou, nom sem contradiçons e mesmo contando com significativas forças proximas do chauvinismo russo ou com escassa compreensom da importáncia da questom nacional. Lenine situou-se aí à frente da corrente mais comprometida com os direitos nacionais dos povos oprimidos polo Império Russo e, umha vez tomado o poder, a sua identificaçom com essas luitas nom deixou de aumentar, em contradiçom com setores importantes da dirigência bolchevique. De facto, os primeiros anos de política revolucionária no poder supugérom um salto sem precedentes no grau de reconhecimento desses direitos, incluindo o acesso de dúzias de línguas ao sistema de ensino, a criaçom de instituiçons nacionais próprias e o reconhecimento da independência da Finlándia (1917), Polónia, Estónia, Letónia e Lituánia (1918). Também supugérom, na última etapa da sua vida, um dos motivos do confronto de Lenine com um setor da dirigência do partido, encabeçada polo georgiano Josef Staline (Comissário do Povo para as Nacionalidades), nos anos 1922 e 1923, com motivo da política aplicada na Geórgia, passando por cima dos critérios dos próprios dirigentes bolcheviques georgianos para impor um aparelho de Estado centralizado e unificado. Em escritos como “A respeito do problema das

nacionalidades ou sobre a ‘autonomizaçom’”12 (alerta contra a reduçom da igualdade nacional a puro formalismo ou a águas de bacalhau em maos da burocracia partidária russa. Aponta para os exageros dos dirigentes bolcheviques de origem georgiana nessa direçom (Staline, Dzerzhinski, Ordzhonikidze...) lembrando que “os nom russos russificados sempre exageram quanto às suas tendências puramente russas”.

Depois de Lenine... A luita nacional à frente nos processos revolucionários do século XX

O

papel histórico de Lenine à frente do movimento revolucionário mundial no primeiro quartel do século XX abriu passagem para a compreensom e o lançamento de luitas nacionais um pouco por todo o planeta. A independência irlandesa, ratificando as simpatias de

Marx, foi só o antecedente de toda umha série de processos revolucionários com protagonismo dos povos oprimidos como sujeito político num palco internacional caraterizado pola hegemonia imperialista. Revoluçons de forte conteúdo nacional como a chinesa, a vietnamita, a coreana ou a cubana, mas também processos de libertaçom nacional como o argelino, o angolano, o congolês, etc. Com maior ou menor êxito, o facto nacional continua a ser central nas luitas que continuam hoje diante dos nossos olhos. Teóricos como Ho Chi Minh e experiências como a vietnamita nom só dérom continuidade à teorizaçom leninista, como lhe dérom novos contornos e ultrapassárom as suas limitaçons. Ninguém duvida hoje do acertado da ruptura do movimento comunista de libertaçom nacional no Viet Name com o Partido Comunista Francês.

Tese defendida por Ho, por sua vez fundador do PCF em 1920, que denunciou abertamente os preconceitos do proletariado das metrópoles e o papel rendista dos estados coloniais, verdadeiros parasitas em relaçom aos povos colonizados. O mesmo pode dizer-se doutros revolucionários ao longo do século XX, entre os quais só referiremos dous casos sobranceiros: o latino-americano Ernesto Che Guevara e o africano Patrice Lumumba, ambos assassinados polo imperialismo e seguidores prático-teóricos da teoria leninista da libertaçom nacional. 1 Transnacionalización y desnacionalización. Ensayos sobre el capitalismo contemporáneo. Rafael Cervantes et alii. Ed. Tribuna Latinoamericana. Buenos Aires, 2000. 2 Com destaque para os povos eslavos do sul (checos, eslovacos, bósnios, sérvios, eslovénios...) acusados de colaboracionismo com os Impérios Czarista e austríaco contra os levantamentos liberais-progressistas na própria Áustria, Hungria, Polónia e Itália. 3 Para além da intervençom no movimento operário inglês, com importante presença irlandesa, lembremos que a companheira de Engels era dessa nacionalidade. 4 Correspondência de Marx a Engels. Londres, 20 de junho de 1866. 5 Um estudo divulgativo dos diferentes autores e autoras marxistas em relaçom à questom nacional pode ser consultado numha obra bem conhecida na Galiza: Patria ou Terra Nai? Ensaios sobre a Cuestión Nacional, de Michael Löwy. Edicións Laiovento, 1999. 6 Lenin y las naciones. Javier Villanueva, Editorial Revolución, 1987. 7 Na Galiza, Castelao e o conjunto do galeguismo primeiro e do nacionalismo que renasce na década de 60 do século passado depois, fai suas as teses estalinianas na definiçom “objetiva” da naçom a partir do “catálogo fechado” proposto polo dirigente de origem georgiana. 8 Em 1918, a Declaraçom dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado apela à formaçom de umha federaçom de repúblicas soviéticas com base na uniom livre e voluntária dos diferentes povos que a integrassem. 9 Sobretodo nos seus escritos de 1917, Lenine destaca a vontade e a autoconsideraçom por parte da comunidade nacional em questom, manifestada por qualquer via, como única condiçom para o seu reconhecimento como naçom. 10 “Notas críticas sobre a questom nacional”, V. I. Lenine. 3 de maio de 1913. 11 “Balanço da discussom a respeito da autodeterminaçom”, V.I. Lenine, julho de 1916. 12 Notas de 30 e 31 de dezembro de 1922, dentro da “Carta ao Congresso” ditada por um Lenine convalescente à secretária entre 23 e 31 de dezembro desse ano.

LIVROS Castro, Olga e María Reimóndez Feminismos Vigo, Xerais, 2013, 296 páginas Como é sabido, o patriarcado afeiçoa-se ao sistema de produçom imposto, adaptando-se a como a exploraçom da maioria social é desenvolvida. Isto fai com que se manifeste de diferentes maneiras segundo o lugar do globo em que estivermos e que, portanto, exija também umha resposta distinta. Castro e Reimóndez exponhem nesta obra umha descriçom divulgativa dessas diferentes respostas feministas no mundo, rachando com o “perpétuo olhar colonial que de Ocidente mantemos”. Desde as Caraíbas ao Médio Oriente, passando pola URSS, China ou o Japom, nom só apresentam o movimento feminista de diferentes momentos e pontos geográficos, como também escolhem temáticas transversais, através das quais ligam o paradigma dominaçom/ submissom patriarcal à exclusom que o capitalismo provoca sobre outros setores sociais (nom heterossexuais, jovens, pessoas discapacitadas...). Além disso, um terceiro bloco em que se aborda a teoria feminista a partir de diversas disciplinas recolhe de modo mui sintético as mudanças conceituais que o feminismo provocou, e continua a provocar, em diferentes áreas do saber, dando mais umha perspetiva transversal à luita contra o patriarcado. Escrito com um tom se calhar surpreendentemente otimista, serve como manual inicial para explorar a pluralidade dos movimentos feministas, graças a essa visom de conjunto que transmite a diversidade e transversalidade dos feminismos. Eva Cortinhas

Matthews, Ann Dissidents. Irish Republican women 1923-1941 Cork, Mercier Press, 2012, 352 páginas Dissidents relata como em apenas vinte anos as 10.000 mulheres que participaram ativamente na Guerra da Independência da Irlanda (1919-21) desaparecêrom completamente do panorama político. A organizaçom paramilitar de mulheres Cumann na mBan desempenhara um papel fundamental na luita independentista irlandesa. Também das organizaçons mistas fôrom numerosas as mulheres que se convertêrom em peças chaves das suas respetivas formaçons: no Exército Civil Irlandês de Connolly, por exemplo, mulheres como Markievicz chegárom a ocupar o cargo de tenente e a presença feminina dentro do Sinn Féin era também mui relevante, com quadros políticos da importáncia de Jennie Wyse-Power ou Hanna Sheehy Skeffington. Porém, na década de 40 a voz feminina estava praticamente apagada da política irlandesa. Matthews elabora um brilhante labor historiográfico na recolha de dados sobre a atividade política das republicanas durante essas duas décadas, para explicar esta decadência. Expom como a divisom interna provocada polo Tratado Anglo-Irlandês (1921) foi o início da desintegraçom da participaçom política feminina. Dividas entre as pró-Tratado, anti-Tratado e neutrais (sendo estas últimas a maioria), Cumman na mBan, reformulada como organizaçom anti-Tratado, passa de ter 833 células registadas em 1921 a 133 em menos dum ano. Além disso, a Guerra Civil Irlandesa (1922-23) causa a eliminaçom física de muitas mulheres do IRA e de Cuman na mBan e centenas delas som encarceradas. Conflitos internos, a marginalizaçom política inerente ao sistema patriarco-burguês... as jovens vam ficando sem os fundamentos sobre os quais continuar a construir a luita republicana com umha perspetiva de género. Helena Sabel

Gérard Walter Lenin Caracas, Editorial El perro y la rana, 2011 Vol. 1, 302 páginas e Vol. 2, 521 páginas Umha obra fundamental para tod@ militante leninista ou simpatizante com os ideais libertadores do comunismo. O inteletual francês redigiu esta obra com motivo do 25º aniversário da morte de Lenine, após um intenso trabalho de investigaçom e um rigoroso esforço historiográfico expressado numha descriçom diáfana do ser que personificava Vladímir Ilich, assim como o contexto histórico e social no qual agia. Esta obra foi selecionada entre os 25 melhores livros de história modernos. Dividida em 4 partes fundamentais. Na 1ª, Walter traça com minucioso cuidado os traços do jovem Volódia durante a sua infáncia, adolescência e primeira juventude, período em que se vam formando as suas qualidades mais salientáveis: vontade, paixom, desejo por agir, domínio de si mesmo, equilíbrio moral e físico e o seu furor pola consecuçom dos objetivos propostos. Também se descrevem os principais factos que levárom Vladímir a tomar o caminho da militáncia revolucionária: a execuçom do seu irmao mais velho, ao se ver envolvido num atentado contra o tsar; o descobrimento da obra de Marx; o contato com primeiros círculos marxistas russos; a sua prisom na Sibéria, etc. A 2ª parte relata os principais episódios da construçom do POSDR, a contraposiçom dos princípios leninistas de organizaçom com as teses martovianas, das quais podemos tirar grandes liçons e aprendizagens, e assim nom repetirmos debates já superados há mais de cem anos sobre o modelo de partido de quadros revolucionários. A 3ª parte versa a respeito da luita decidida de Lenine pola conquista do poder político, desde os anos sombrios que mora em Paris, passando polo retorno a Rússia e a reconquista do Partido das maos mencheviques, em vésperas da Revoluçom de Outubro. A parte final recolhe as principais batalhas pola construçom do Estado socialista, assumindo o comando da nova nau soviética, que navega num oceano nom isento de grandes contradiçons e dificuldades que o obrigam a tomar novos caminhos. Carlos Garcia Seoane

WEB Curso: O Método em Marx José Paulo Netto, 2002 http://www.cristinapaniago.com/ Disponível gratuitamente na internet, trata-se de um curso lecionado polo professor José Paulo Netto em 2002 durante cinco jornadas. O curso completo, originariamente gravado em DVDs, está agora disponível no site da professora Cristina Paniago em duas versons: em vídeo –acessível no youtube– e em áudio com formato mp4. Nos dous casos, som 10 gravaçons e umhas 14 horas de conteúdos em que o reconhecido e veterano marxista brasileiro percorre a obra de Marx e a evoluçom do seu pensamento. Trata-se de umha boa via para se introduzir no marxismo, acompanhando o professor Netto numha visom global do percurso vital, filosófico e político de Karl Marx.


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INTERNACIONAL

ABRENTE 7

A independência da Catalunha Xose Lombao

cidade suficiente para o organizar, bem porque o Estado utilize a força repressiva para o impedir. As situaçons que podem verificar-se a partir desse momento som muito variadas. Podemos resumi-las em três cenários possíveis, aos quais pode chegar-se por caminhos diferentes: a) pacto entre as burguesias catalá e espanhola, b) Declaraçom unilateral de independência, c) repressom policial ou inclusive militar. Estes três palcos também podem verificar-se, inclusive no caso de que se chegasse a fazer efetiva a consulta, mas o processo para a independência ficaria bloqueado. Nunca podem ser vistos como cenários definitivos. Pode passar-se de um para outro, segundo a conjuntura e a correlaçom de forças.

Membro da CUP

A

s consultas populares sobre a independência, a primeira em Arenys de Munt em setembro de 2009, realizadas em mais de 550 municípios cataláns, indicam umha mudança qualitativa na popularidade da ideia de independência. Por sua vez, servírom para divulgar ainda mais a necessidade de romper com o Estado espanhol. O impulso definitivo chegou com a sentença do Tribunal Constitucional espanhol de 2010, esquartejando o Estatuto previamente apoiado polo povo da Catalunha, e cujo conteúdo tinha sido já previamente reduzido em profundidade polas Cortes espanholas. A partir desse momento, a vontade de autodeterminaçom converte-se em absolutamente maioritária, tanto no ámbito das maiorias políticas institucionais, como no das maiorias sociais, e a independência aparece, segundo praticamente todos os inquéritos, como opçom massiva. Embora podamos considerar que até agora o movimento popular pola independência está sob a hegemonia ideológica da direita e, portanto, nom questiona maioritariamente o modelo económico-social dominante, nem a integraçom da Catalunha na rede do capitalismo financeiro global, temos de enfatizar: o movimento nom é um produto da direita catalanista, tivo a sua própria génese a partir da sociedade civil, tem as suas estruturas independentes dos partidos políticos e está em expansom no seio das classes populares. Como consequência dessa expansom e da atividade militante para vincular a independência com a criaçom de condiçons para satisfazer os direitos económicos e sociais da maioria social, o movimento está a balançar progressivamente para a esquerda e abrem-se perspetivas para que o independentismo anticapitalista poda no mínimo disputar a hegemonia à direita.

a) Pacto entre as burguesias catalá e espanhola Pode acontecer em qualquer momento do processo. Por parte catalá, poderiam participar no pacto CiU (ao menos setores amplos) e o que fica do PSC. O pacto, que abriria a terceira via entre a situaçom atual e a independência, poderia supor a modificaçom da Constituiçom espanhola para se concretizar um maior ou menor incremento da autonomia, com alguma modificaçom formal na relaçom entre a Catalunha e o Estado. Seguramente, umha maior autonomia fiscal e com certeza a manutençom do atual modelo económico-social. Nom é necessário dizer que a posiçom da CUP será sempre contrária à terceira via ou saída pactuada. O objetivo é trabalhar com o movimento popular para estar em todo o momento nas melhores condiçons para provocar umha resposta que tente neutralizar essa possibilidade. b) Declaraçom unilateral de independência Poderia verificar-se como resultado da convocaçom de eleiçons plebiscitarias em substituiçom da consulta sobre a independência. Como já se explicou, nom é a primeira opçom da CUP. A CUP aposta na realizaçom do referendo, confrontando com o Estado espanhol se for necessário. Se se realizarem eleiçons plebiscitárias, a CUP tentará articular um bloco independentista, anticapitalista e feminista amplo, que poda ter os melhores resultados eleitorais.

As potencialidades do movimento popular pola independência

U

mha vez que a independência se dirige contra o poder constituído, o Estado espanhol, e se orienta à constituiçom de um novo poder, abrem-se magníficas possibilidades de que a independência implique um questionamento global de todas as formas de dominaçom e de que se abra um processo que nos permita debater sobre todos os ámbitos da sociedade: político, social, económico e cultural. A independência converte-se num instrumento que potencialmente permite o mudar todo, mediante a ruptura com os marcos atuais e a abertura de um processo constituinte.

O acordo sobre a data e o conteúdo da pergunta da consulta

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m dezembro de 2013 CiU, ERC, ICV-EUiA e a CUP chegam a um acordo sobre a data do referendo, 9 de novembro de 2014, e sobre o conteúdo da pergunta, que fica expressa em duas epígrafes, da seguinte forma: Quer que a Catalunha seja um Estado? E em caso de resposta afirmativa, queira que este Estado seja independente? Os partidos do acordo somam 64,4% dos e das representantes do Parlamento da Catalunha. A pergunta nom agradou à CUP, que preferia umha pergunta clara onde só tivesse cabimento umha resposta de SIM ou NOM à independência. Ainda assim, a CUP optou por um “sim crítico” ao acordo. Considerou-se que era o único acordo possível nesses momentos e que, com todas as suas deficiências, permitia avançar no processo. Também se avaliou que era importante que o referendo nascesse com o máximo de apoios. De todos os modos, a CUP nom renuncia a voltar a propor o conteúdo da pergunta se surge a oportunidade num momento posterior. Anteriormente, em janeiro de 2014, a CUP abstivera-se na votaçom sobre a proposta de ir às Cortes espanholas solicitar a transferência da concorrência estatal sobre convocaçom de referendos para poder realizar a consulta. A CUP considera a consulta como umha expressom do direito de autodeterminaçom que, de maneira nengumha deve ser fundamentado nas leis espanholas ou na permissom do Estado espanhol.

A convocaçom do referendo do 9 de novembro

P

ara a CUP, a convocaçom da consulta, em linha com o manifesto “Per un referèndum tant sí com no?1, deve reunir as seguintes caraterísticas: a) Deve ser vinculativo: o seu resultado deve ser traduzido em medidas operativas para serem levadas à prática. b) Deve ser realizado unilateralmente, embora conte com a desautorizaçom do Estado espa-

nhol. Se o Governo da Generalitat, por se submeter à legalidade espanhola ou por outros motivos, é incapaz de exercer essa responsabilidade, o referendo teria que ser organizado por outras instáncias, por exemplo, polo Pacto Nacional polo Direito a Decidir, formado por numerosas entidades de diferente tipo, instituiçons, partidos, sindicatos, etc. Esta posiçom opom-se à de CiU e doutros, segundo os quais, se o Estado espanhol nom autorizar a consulta, o seguinte passo deveria ser a convocaçom de eleiçons plebiscitárias com umha potencial posterior Declaraçom unilateral de independência. Esta opçom translada o exercício da autodeterminaçom do conjunto do povo aos partidos com representaçom parlamentar e dilata o processo, evitando enfrentar o conflito e abrindo a possibilidade de que se gere cansaço e frustraçom no movimento. Todos os dados atuais indicam que o referendo se convocará efetivamente para 9 de novembro. Fracassada a tentativa, sem suporte da CUP, de fundamentar a legalidade da consulta em umha cedência de competência por parte do Estado, a Generalitat aprovará umha Lei de Consultas e convocará via decreto o referendo.

Os cenários possíveis depois da convocaçom

1– O referendo realiza-se O Estado espanhol responderá à convocaçom do referendo com a declaraçom de sua ilegalidade. Que nessas circunstáncias o referendo poda vir a ser realizado dependerá de que o Governo da Catalunha opte pola desobediência, ou que, caso contrário, o movimento independentista seja capaz de organizar um referendo credível. Além disso, deverá acontecer que o Estado espanhol considere que umha intervençom repressiva seja mais custoso para os seus interesses do que tolerar a consulta. Nessa hipótese, a reaçom do Estado espanhol iria centrar-se na deslegitimaçom do referendo. Argumentaria que nom é legal, que nom se realizou em condiçons democráticas e tentaria tirar

partido a todo incidente ou a qualquer possível interpretaçom dos resultados que enfraquecesse a opçom independentista. Considerariam nulas todas as conseqüências jurídicas derivadas da realizaçom do referendo e faria todo o possível para que os resultados nom tivessem nenhum efeito no plano internacional. Para o movimento independentista, as perspetivas de futuro do processo dependeriam em grande parte do mesmo resultado do referendo, participaçom e voto sim - sim às duas perguntas. Quanto mais clara for a maioria que opte pola independência, mais fácil será traduzir o resultado e dar os primeiros passos para a criaçom de umhas estruturas de poder político independente. Se a consulta tiver que se realizar à margem da legalidade espanhola talvez terá que ser repensada a pergunta, para que seja mais simples e inequívoca, propondo simplesmente sim ou nom à independência. No entanto, nom há que obviar que grande parte das possibilidades de sucesso neste cenário dependerám da imagem de limpeza democrática que todo o processo de consulta refletir. Este seria o cenário mais desejado para a CUP. Para se tornar possível, há que trabalhar em várias direçons. Primeiro, criando um clima de opiniom que force o Governo da Generalitat a manter umha posiçom de desobediência institucional e a organizar a consulta apesar das proibiçons estatais. Em previsom de que o Governo da Generalitat nom mantenha a convocaçom da consulta, deverá gerar-se um movimento, com implantaçom na cada vila e bairro, capaz de preparar a consulta com suficientes garantias e credibilidade. A CUP fará todo o possível para que o referendo pola independência se realize no dia 9 de novembro. 2– O referendo nom se realiza O referendo pode nom se realizar, bem porque o Govern renuncie a desafiar o Estado espanhol e o movimento popular nom tenha a capa-

c) Repressom policial ou militar Sustentada legalmente na suspensom da autonomia e na supressom de direitos e liberdades que a Constituiçom prevê para algumhas das situaçons de exceçom. É umha situaçom que nom poderia perdurar no tempo e que nom acabaria com a vontade de independência, por isso só adiaria a resoluçom do conflito. É possível umha combinaçom de pacto com terceira via e repressom seletiva do independentismo opositor.

Os objetivos políticos imediatos da CUP em relaçom com o processo independentista

O debate gira em torno destes pontos: – 9N Referendo vinculativo e unilateral. Confrontando com a legalidade espanhola, o aparelho estatal e a posiçom da Generalitat se for necessário. O referendo pola independência como melhor caminho para conseguir a ruptura democrática. – Desinstitucionalizar o processo. Traspassando o protagonismo das instituiçons para as classes populares organizadas, transbordando o esquema institucional de autodeterminaçom da Catalunha no quadro da Uniom Europeia, para instalar a autodeterminaçom dos Països Catalans e a abertura de um processo constituinte. – Desmontar a hegemonia ideológica da direita no processo. Tanto no que atinge ao respeito pola legalidade atual como à separaçom entre processo independentista e luita social. – Avançar para a ruptura e a construçom nacional. Incluir na agenda política a ruptura com o enquadramento jurídico e político espanhol, a construçom dos Països Catalans e a abertura de um processo constituinte que permita repensar todo o sistema de relaçons políticas, económicas, sociais e culturais. – Reconhecimento internacional do referendo e do processo de independência. – Impulsionar um movimento de resistência civil nom violenta. Baseado na desobediência ativa, pacífica, em massa e nom violenta, tanto no ámbito institucional como no civil/popular. Com o objetivo de reforçar o papel da mobilizaçom popular e chegado o momento poder transbordar a docilidade do Governo perante a proibiçom do referendo.

O outono apresenta-se com ares estivais, poi isso esperamos que a CUP saiba estar à altura das circunstáncias históricas do momento.


Jornal comunista de debate e formaçom ideológica para promover a Independência Nacional e a Revoluçom Socialista Galega

Edita: Primeira Linha. Redaçom: Rua Costa do Vedor 47, rés-do-chao. 15703 Compostela. Galiza. Telefone: 616 868 589 Conselho de Redaçom: Comité Central de Primeira Linha. Fotografia: Arquivo Abrente. Correcçom lingüística: Galizaemgalego Diagramaçom: ocumodeseño. Imprime: Sacauntos Cooperativa Gráfica. Encerramento da ediçom: 8 de julho de 2014 Correspondência: Rua Costa do Vedor 47, rés-do-chao. 15703 Compostela. Galiza. Web: www.primeiralinha.org / Correios electrónicos: primeiralinhagz@gmail.com / primeiralinha@primeiralinha.org / Twitter: @PrimeiraLinhaGZ Tiragem: 3.000 exemplares Distribuiçom gratuíta.Permite-se a reproduçom total ou parcial dos artigos sempre que se citar a fonte. Abrente nom partilha necessariamente a opiniom dos artigos assinados. Impresso em papel reciclado. Depósito Legal: C-901-1997

Extraterrestres

Iago Barros. Membro da Mesa Nacional de BRIGA

Contracapa Insurgente

S

e Felipe VI tivesse que imaginar o seu cargo real à volta dum horário laboral irregular para cobrar 900€ a fim de mês, talvez abdicasse. Se Rubalcaba tivesse que acudir a umha ETT ao abandonar o seu cargo no PSOE, talvez se aferrasse ao cargo. Se Willy Meyer tivesse que aguardar a fim de mês para pagar as faturas da luz e do gás, talvez continuasse a dar discursos como comunista espanhol em Estrasburgo, em lugar de se demitir. Mas em nengum dos três casos o mundo do trabalho ocupa a centralidade política que @s comunistas galeg@s cremos que deve ter. Nem Felipe VI tem que se preocupar com os estudos num colégio sem refeitório nem apoio psicopedagógico da sua sucessora a notável Leonor, nem Rubalcaba com um atendimento deficiente da sua saúde nos hospitais públicos de Santander, nem Meyer com prescindir de aquecimento durante o inverno madrileno. Porque, ao contrário do que a juventude trabalhadora da Galiza, nengum dos três tem a menor ideia do que significa ter que trabalhar para outros por umha miséria para sobreviver; nem agradecer com um mísero sorriso a gorjeta dos clientes porque assim poderá sair essa noite a drogar-se e esquecer a miséria em que subsiste. Nengum dos três vive num país cuja língua é motivo de descrédito laboral, hándicap que contrarrestar com mais sacrifício e entrega laborais para demonstrar que nom és um “pailám”. Ou mesmo que ocultar, para nom prejudicar o honorável negócio do teu patrom. Nengum vive num bairro dumha cidade galega assolado pola “livre” desvertebraçom empresarial dum país condenado a ser um paraíso de turistas apesar das suas imensas riquezas naturais e da sua história cultural, inteletual e industrial. Os três som espanhóis, som espanholitos. Som uns acomodados, uns acomodatícios. Som alheios, desconhecidos, estra-

nhos, extraterrestres para qualquer de nós e d@s noss@s vizinh@s. Nom tenhamos complexos: nós, @s independentistas e comunistas da Galiza, nom temos nada de que nos envergonhar. Somos rebento da terra fértil da Galiza obreira. Somos tam normais como a exploraçom mesma, e expressom autêntica do seu antagonismo. No Povo deixamos semente de vencer. Eles, faísca desta terra queimada que, disque, em 40 anos perderá um milhom de habitantes. Eles som ricos, burgueses,

@s comunistas da Galiza somos tam normais como a exploraçom mesma, e expressom autêntica do seu antagonismo

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assassinos do nosso futuro e vitalidade. Nós somos o trabalho, a produçom, a vida e o futuro dumha Pátria sem classes. A juventude comunista, feminista e patriota galega. Sofremos, mas a nossa própria resistência é sintoma de vitória. Porque, contra o o saque e a opressom, a emigraçom e o silenciamento, a perseguiçom e a criminalizaçom, a só existência dum Movimento de Libertaçom Nacional na Galiza deve dar muito que pensar sobre a natureza irredenta desta Pátria.


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