Abrente nº71

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Reflexons sobre o leninismo, aqui e agora 3

A face patriarcal da A lei mordaça 5-6 Gamonal: do estratégia neoliberal Carlos Garcia Seoane General Yagüe do Partido Popular 4 à máfia da construçom 7 Helena Sabel

Miguel Ramos Cuba

A “legítima violência” que nunca se legitima 8 Eva Cortinhas

Alberto San Martín

Vozeiro de Primeira Linha www.primeiralinha.org | @PrimeiraLinhaGZ

Ano XIX | Nº 71 Terceira jeira | Janeiro, fevereiro e março de 2014

Jornal comunista de debate e formaçom ideológica para promover a Independência Nacional e a Revoluçom Socialista Galega

Unidade popular frente à involuçom do regime espanhol EDITORIAL É

indiscutível que o regime espanhol emanado da constituiçom pós-franquista de 1978 arrasta umha profunda crise em todas as ordens, de caráter estrutural. Mas também é umha evidência -suficientemente constatada na história da luita de classes- que só a luita popular organizada pode provocar a queda dos mais abjetos governos. Pois estes nom caem por si sós, há que tombá-los. Porém, a progressiva perda de legitimidade de Rajói, e da sucursal autonómica encabeçada por Feijó, ainda nom atingiu o ponto crítico que facilite implementar umha estratégia revolucionária de luita e movimentaçom de massas. A desafetaçom popular com o monopartidarismo bicéfalo, sem lugar a dúvidas, é umha das maiores preocupaçons dos inteletuais orgánicos e dos aparelhos de informaçom do sistema. Conhecem melhor que ninguém o grau de podridom de um Estado cor-

roído por uns níveis de corrupçom inimagináveis. As decisons que se aplicam com apoio implícito do PSOE estám rumadas basicamente a tentar ganhar tempo para assim amortecer as múltiplas contradiçons que desangram um regime atualmente sob o controlo da fraçom mais reacionária da oligarquia. Numha conjuntura onde convergem a dureza da crise económica do capitalismo espanhol com a evidência de estarmos governados por umha casta política cleptocrática, que pratica sem pudor algum a corrupçom generalizada, a maior ameaça para a desestabilizaçom do capitalismo espanhol está situada nas luitas de libertaçom nacional. As reivindicaçons soberanistas e independentistas da Galiza, País Basco e a Catalunha som o epicentro da luita de classes que aterroriza a burguesia espanhola. As reclamaçons do povo catalám em prol da legitimidade do seu direito a decidir a ruptura com

Espanha nom só estám acelerando a polarizaçom social e política, tenhem contribuido para carcomer a falsa coesom e unidade do PP. Perante este cenário, onde a tradicional intoleráncia do imperialismo espanhol recobra máxima atualidade, as forças do campo revolucionário devemos transmitir com franqueza, denunciar com clareza, que Espanha está disposta a todo para evitar continuar a minguar territorialmente e manter a taxa de lucro da sua burguesia parasita. Levamos muito tempo advertindo da possibilidade real dumha intervençom militar sob a fórmula constitucional para impossibilitar que o povo catalám decida democrática e pacificamente o seu futuro. Este cenário nom responde a alucinaçons radicais, e ganha máxi-

ma atualidade a partir da mudança de tática implementada por Mariano Rajói a meados de janeiro, alterando o tom e o conteúdo do seu discurso frente a posiçom maioritária do povo catalám. A medida que se aproxima a data marcada polos partidos soberanistas e independentistas cataláns para a consulta popular, a direçom do PP opta por ativar umha ofensiva combinada no ámbito mediático, político, judicial e repressivo. Porém, o vírus da falsa “normalidade democrática” imposta nestas quatro décadas de democracia burguesa bourbónica, e inconscientemente interiorizada pola imensa militáncia e ativistas do movimento popular, contribui para desconsiderar e mitigar as ameaças sobre o mais que seguro uso da força para quebrar a vontade maioritária exprimida polo povo da Catalunha. Realmente som preocupantes os silêncios ensurdecedores perante as

ameaças veladas e explícitas, polos movimentos e decisons que Espanha leva adotando nos últimos anos. Manobras militares com material antidistúrbio por parte de unidades do exército, exercícios noturnos de comandos simulando tomada do centro neurálgico de Barcelona, declaraçons golpistas de oficiais na reserva apresentados como “inofensivas” bravuconadas de casuísticas isoladas, reorganizaçom das forças armadas constituindo a Brigada Operacional Polivalente (BOP) com unidades específicas em operaçons de “caráter exclusivamente nacional”, nom som peças inconexas, respondem a um mesmo objetivo. Por um lado atemorizar e dissuadir, mas também engrassar a maquinária repressiva que nom duvidarám em empregar com a luz verde da NATO e da UE. Pois nom se deve desconsiderar a existência de um plano de intervençom militar contra a Catalunha por parte das forças armadas espanholas, com o beneplácito dos principais partidos do regime e da Casa Real. Seria ingénuo e até absurdo por


EDITORIAL

2 ABRENTE parte do independentismo socialista, e umha irresponsabilidade das forças comunistas, subestimar a utilizaçom da opçom armada como um mecanismo excecional, mas no fim de contas real, para atrasar o inevitável: a independência da Catalunha. A história do imperialismo espanhol aconselha nom infravalorizar a “Operaçom Estela”, desvendada recentemente. @s comunistas galeg@s temos claro que o regime vai chegar até onde poda visando manter a toda a custa este cárcere de povos chamado Espanha. Cumpre pois que as forças patrióticas galegas, e basicamente o MLNG, se prepararem para esta contingência onde a involuçom pode atingir limites nunca antes superados. Perante o desafio do independentismo catalám a resposta do espanholismo nom vai ser morna nem conciliadora.

As contradiçons do PP

A

adversa situaçom socioeconómica que atravessa a imensa maioria do povo trabalhador, o paulatino empobrecimento dos seto-

res intermédios, a carência de perspetivas imediatas para superar a crise, e as duras medidas implementadas por Rajói seguindo as diretrizes da troika, tenhem acelerado as contradiçons no seio do PP. Perante umha dialética na que os setores mais ultras começárom a optar pola sua reorganizaçom no seu exterior, o Partido Popular vai ter que mexer-se entre endurecer o seu discurso para satisfazê-los e cortar assim a hemorragia, mas também evitar umha fugida face adiante que provoque a sua desconexom com os setores centristas do eleitorado, essenciais para assegurar e perpetuar amplas maiorias parlamentares. Neste panorama de perda de perpetivas e visom curtoprazista dumha oligarquia disposta a dinamitar os consensos da Transiçom, é suicida seguir apostando basicamente na via eleitoral para frear a ofensiva burguesa, espanholista e patriarcal. A transformaçom social e a recuperaçom da nossa soberania nacional nom derivará de maiorias aritméticas e sim de um processo revolucionário de caráter

insurrecional. As eleiçons som um instrumento para acumular forças, e a presença institucional deve servir para denunciar o imenso engano democrático da ditadura burguesa. Sem ter que circuncrever-nos a 1936, os limites da via eleitoral ficárom bem patentes no Chile de Allende de 1973, e agora voltam a ser visíveis na Venezuela bolivariana onde a burguesia, após mais de três lustros de consecutivas derrotas nas urnas, nom respeita os resultados e teima com o apoio do imperialismo ianque em tombar o legítimo governo de Nicolás Maduro, mediante a sabotagem económica, a desestabilizaçom na rua, a manipulaçom mediática e o golpe de estado.

Crise do oportunismo

A

s últimas semanas também contribuírom a clarificar um pouco mais a fraudulenta operaçom política gestada na primavera de 2012, onde confluírom por pura necessidade antigas e recentes cisons do BNG. Os tam espetaculares como superficiais êxitos da aliança entre Anova e

Nº 71 Janeiro, fevereiro e março de 2014 IU, circunscritos ao espaço eleitoral, pouco durárom. O show parlamentar de Beiras já nom consegue ocultar as navalhadas internas que desangram a recomposiçom autonómica da social-democracia. AGE nom é mais que um grupo parlamentar sustentado no ar e Anova um campo de batalha polo seu controlo entre fraçons, as suas cisons e camarilhas. As contradiçons internas de Anova estám tam afastadas do legítimo e necessário debate de ideias numha frente ampla como que predicam ser, que em pouco mais de um ano dilapidárom as virtuais e subjetivas esperanças depositadas por um nada desprezível setor do povo galego. Com a retirada do apoio mediático e envolta nas piores práticas da política burguesa, os nossos prognósticos sobre o curto percorrido de umha operaçom política tam oportunista como carente de projeto transformador para além da vácua retórica, é umha realidade. A implosom da “Siryza galega” é umha boa notícia para a luita de libertaçom nacional e social de género pois contribui para desmascarar o

oportunismo e obstaculizar o avanço do espanholismo social-democrata na Galiza. É necessário pois consolidar os espaços unitários onde coincidimos as diversas organizaçons políticas e sociais patrióticas. Para avançar na acumulaçom de forças é imprescindível agir com honestidade e respeito mútuo, nom só manifestar vontade, é necessário constatar com factos a importáncia de vertebrar um amplo, plural e abrangente movimento social soberanista, enquadrado nos parámetros da esquerda e o feminismo, que contribua a elevar a consciência nacional do nosso povo face a ruptura democrática e a abertura de um processo constituinte galego. Mas sem quebrarmos a legalidade espanhola e burguesa, Galiza nom tem futuro, o proletariado, a juventude e o conjunto das camadas populares estamos forçadas à escravidom a que nos condena Espanha e a Uniom Europeia. Sem umha vigorosa esquerda independentista, socialista e feminista nom será viável superar os reptos da atual fase histórica.

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OPINIOM

Nº 71 Janeiro, fevereiro e março de 2014

ABRENTE 3

Reflexons sobre o leninismo, aqui e agora Miguel Ramos Cuba Militante de Primeira Linha

U

mha disertaçom sobre a vigência do leninismo como pensamento emancipador bem entrado o terceiro milénio e numha estrutura como a galega requer, além da sua própria casuística, a existência de algo que se poda denominar como leninismo. Em caso de enterdermos a existência do leninismo como umha pura questom de nomencatura, tal preocupaçom torna absurda, pois som multidom as organizaçons que no momento atual e por todo o globo se reclamam como tais. E num aspeto puramente folclórico, a figura de Lenine e da simbología a ele ligado acham-se num momento de difusom crescente nestes tempos de identidades mercantilizadas. Outra cousa é que todo isto tenha algo que ver realmente com Vladimir Ilich Lenine. Este início procuradamente polémico nom é casual, pois pretende restaurar umha das chaves imprescindíveis para umha correta compreensom do pensamento leninista. Lenine nom redigiu nengum dos seus contributos teóricos a partir da equidistancia, sendo resultado dum contexto de conflito e confronto, do fragor do combate ideológico contra aquelas tendências político-teóricas consideradas erradas para as necessidades da proletariado russo ou mundial. Nom é pois o que hoje se denomina como leninismo fruto dumha elaboraçom teórica sistématica, mas resultado das múltiplas exigências e necessidades da contruçom dum partido revolucionário de novo tipo, da realizaçom da primeira revoluçom socialista trunfante da história da humanidade e da edificaçom dum Estado operário sem antecendentes de nengum tipo. Assim, o leninismo nom conta entre as suas virtudes umha universalidade enciclopédica que permita a sua aplicaçom com pequenas variantes independentemente do lugar ou do momento histórico. O leninismo que promulgamos nom é, entom, reduzível a umha série de fundamentos ou principios clasificadamente descontextualizados. Mas tampouco é umha reliquia historiografica enquadrada dentro da história da filosofia ou do movimento operário. É a configuraçom dumha realidade teórica criativa que ganha vida com a introduçom de sangue e bile no pensamento de Marx. Um pensamento global respeito às necessidades da revoluçom com a conquista do poder como elemento central. Um pensamento que nom só nom necessita, como lhe é contraditório, qualquer tipo de idolatria ou exibicionismo ideológico. Ora bem, a totalidade de organizaçons que se reclamam leninistas possuem umha identidade, além do diferente grau de ajustamento a umha sistematizaçom desnaturalizadora, a irreconciabilidade com o poder estatal burguês. Independentemente das suas diferenças, a etiqueta do “marxismo-leninismo” é umha marca de natureza rebelde e indómita.

A atualidade da Revoluçom e a necessidade flexibilidade tática

Esta oposiçom, mas também esta identidade, estám determinadas polo conceito fundamental do leninismo,

que é a atualidade da revoluçom. Nom umha atualidade em termos do imediato mas a visom de que é necessário atuar de forma revolucionária desde o presente. Isto é, a tarefa dos revolucionários é fazer a revoluçom e a isto se dirige a totalidade da sua praxe política, verificando o sucesso ou nom de linhas e programas políticas. Isto nom quer dizer que no leninismo a revoluçom estejam para chegar, nem que haja que se comportar politicamente como se estivesse; quer dizer que é necessário desenvolver umha atividade política no presente com essa finalidade. Partindo do principio da necessidade e da viabilidade da Revoluçom Socialista, da revoluçom operária. Umha unidade dialética entre necessidade e possibilidade marcada pola análise do desenvolvimento capitalista na sua fase imperialista. Processo mediante o qual se desloca o necessário aumento da taxa da exploraçom do centro para a periféria, atingindo assim a formaçom dumha aristocracia operária no centro que divide as massas populares e formulando-se umha distribuiçom territorial do capital e do trabalho. Ora, tal processo está submetido à inoxerável tendência à queda da taxa de lucro e mais as inevitáveis e purificadoras (para o capital) crises capitalista, produzindo-se além do mais cada processo de reordenaçom capitalista cada vez com maior virulência. A I

Independentemente das suas diferenças, a etiqueta do “marxismo-leninismo” é umha marca de natureza rebelde e indómita. Guerra Mundial, a II Guerra Mundial, a Guerra Fria, o Estado de bem-estar som exemplos deste no qual a faixa social e o espaço territorial. Inevitabilidade da barbárie e umha cada vez maior velocidade nas transformaçons capitalistas som fenómenos observados e estudos por Lenine nos quais intervém atraves dumha forte flexiblidade tática unida a umha instransigente firmeza estratégica. Flexibilidade tática provocada pola grande variabilidade da realidade económico-social imperante que provoca a exigência dumha constante análise concreta da realidade concreta. Porém, nunca escapando da dialética geral do capital que impede asseguar qualquer conquista social, mas a destruiçom revolucionária dum monstro cada dia com umha face mais obscura. A I Guerra Mundial, a II Guerra Mundial, a Guerra Fria, o Estado de bem-estar som exemplos deste processo, no qual a faixa social e o espaço territorial recetores dos benefícios imperialistas sofrem fortes constriçons.

Modelo organizativo, combate ideológico e construçom de Hegemonia

A

Revoluçom atual está vigente por simples necessidade mas também porque é possível. Lenine mostra ao longo da sua atividade teórico-pratica as imensas capacidades dos povos

trabalhadores para combater e construir um futuro de seu. Como é possível que a revoluçom proletária fosse trunfar à Rússia? Um pais atrasado, com umhas estruturas sociais medievalizantes e com umha social-democracia hiper-fragmentada? Sim, como consequência das tremendas e rápidas transformaçons capitalistas que levárom à extrema concentraçom proletária e ao estourido da maior confrontaçom bélica até entom. Mas também e principalmente pola extrema utilidade das ferramentas organizadas propostas por Vladimir Ilich Lenine. Apesar do que se costuma afirmar, desse lugar comum da social-democracia; o modelo organizativo exposto no Que Fazer?, e denominado Partido de novo tipo ou partido de vanguarda; nom é umha estrutura rígida, só válida para situaçon de repressom extrema e muito menos é um couto privado de inteletuais. Como afirmamos anteriormente, a obra leninista é polémica, inconexa sem a sua conjuntura mas guiada por uns mesmos principios reitores. Esquece-se habitualmente que o mesmo Lenine, que promulgava pola cerraçom absoluta das estruturas partidarias como órgao clandestino de luita e combate; foi depois do período de abertura ocasionado pola crise revolucionária de 1905 quem tendeu à expansom partidária aproveitando a conjuntura mas sem romper os seus requisitos de segurança. Porque ao fim e ao cabo, o mesmo modelo de partido também está guiado polo mismo princípio da combinaçom de flexibilidade e intrasigência com o fim de se adaptar às condiçons de mudança do meio político-social que lhe é próprio, que mudam cada vez a maior velocidade e que tendem inexoravelmente para um maior endurecimento e autoritarismo. E um partido clandestino nom se organiza de repente, tem que estar preparado para resistir a repressom e sobreviver; para isso serve o centralismo democrático. Um modelo organizativo fléxivel que se prepara nos momentos de abertura e democrácia para aqueles nos que a centralizaçom é imprescindível. Porém, o modelo de partido leninista nom é só um metodo organizativo para a sobrevivência política interna, pois está desenvolvido em base a um meio de comunicaçom para influir ideologicamente nos adversários políticos mas sobretodo agitar e realizar propaganda entre o povo trabalhador. Hoje pode soar ridiculo falar dum jornal como organizador coletivo, mas o certo é que som escassas as organizaçons galegas que podem contar com um porta-voz impresso com umha regularidade apreciável. E achacar isto a influência da internet sabemos tod@s que é fazer da necessidade virtude. Um jornal: ou meio de comunicaçom, como organizardor é-o como um instrumento para a coesom ideológica interna mas sua finalidade é a difusom dum programa, a socializaçom em base a agitaçom e ao debate dos alicerces dum movimento político. Um partido de novo tipo está desenhado estrategicamente para influir no exterior, para construir hegemonia em base a um programa rupturista, para desenvolver dentro e fora de si o novo paradigma cultura dominante. Nom

Retrato de Lenine, aguarela de Maurício Castro, 2012

pouca cousa para um modelo acusado de fechado...

O Estado como coerçom, o Estado como ditadura

J

unto com o Que Fazer?, O Estado e a Revoluçom é umha das obras mais conhecidas de Lenine. Porém, costuma considerar-se como um obra sem influência determinante na configuraçom dum cánone leninista, deixando-se de lado como se for umha veleidade anarquizante. O certo, ao nosso modo de ver, é que a conceçom do Estado leninista é um dos pontos essencias do seu contributo para a emancipaçom dos povos. Em primeiro lugar, porque é umha crítica demolidora às tendências que afirmavam o caráter neutral do Estado e o seu exercício de arbitragem nas relaçons sociais. E em segunda lugar porque de dita crítica desenvolve-se umha visom marxista do estado como elemento coercitivo, em base ao monopólio da violência, para o exercício da ditadura de classe. O Estado como formaçom política contemporánea surgida para assegurar a hegemonia burguesa em base a violência e o consenso (esta junto com a chamada “sociedade civil”) que esencialmente é umha democracia para a minoria e umha ditadura para com a maioria. É a alternativa socialista que como Estado é intrinsicamente umha ditadura mas que devido ao caráter maioritário da clase representa, converte-se na democracia mais profunda possível na forma estatal. Ditadura da maioria contra a minoria exploradora e portanto, em causa de extinçom desde o minuto 0 da sua existência. O problema é que ao falar de Estado nestes termos falamos de violência, de violência estatal mas também de violência revolucionária. Na Galiza dos nosso dias, a enunciaçom destes termos é perigosa de por si, mas é impossíel aproximar-nos de Lenine, quer dumha optica militante ou académica; sem tratar o tema da violência. Lenine afirmava que a insurreiçom era umha arte, Lenine desenhou umha organizaçom política virada para a atuaçom clandestina, Lenine caraterizava o Estado como monopólio da violência e a necessidade de o derrubar de forma violenta... E Lenine dirigiu umha insurreiçom armada contra umha democracia burguesa formal que acabou com a tomada do poder polo proletariado e o campesinhado na forma de assembleia de sovietes.

O Estado e a violência como necessidade para o exercício do poder som consubstáncias a toda a obra de Lenine, pois a atualidade da revoluçom assim o demanda. Porque tomar o poder, para o leninismo, nom significa assumir um governo e por a funcionar a estrutura estatal burguesa noutra direçom, mas conscientes da impossibilidade dessa tarefa supom derrubar o Estado e construir outras a partir das suas cinzas. Em base sim, à hegemonia construída anteriormente e à sobrevivência aos ataques do enemigo.

Lenine e o leninismo, vigentes e necessários

A

atualidade da revoluçom como única saida ante umha civilizaçom capitalista que pola sua própria natureza nom tem marcha atrás no processo de embrutecimento desatado é a premisa da que jurde toda a corpus leninista. Numha situaçom presente na qual se esta a desmantelar o estado de bem-estar, o Estado espanhol títere da troika se arma até os dentes e a crise económica só aumenta o mesmo virus financeiro que a ocasionou; está presmisa leninista é ainda mais real agora que fai um século. A flexibilidade tática necessária ante ainda assim o aberto horizonte político que se nos apresenta nom pode deixar-nos esquecer tal realidade. Os sonhos e as esperanças da maioria social som incompatíveis com a existência a longo prazo do brutal sistema que nos explora e a contraçom do centro imperialista mundial fai que para nós isto seja mais cedo que tarde. É necessário expandir as ferramentas necessárias para sobreviver à agonia do capitalismo, construindo hegemonia em base ao programa tático, mas também em base aos objetivos estratégicos. E mais que nunca é urgente fugir da ilusom do Estado espanhol que pretende difuminar a viabilidade de qualquer alternativa estranha a ele, pretendo ser um ente eterno e metafísico. Podemos aproveitar para isso as tremendas possibilidades que nos dá o nosso factor nacional, irresolúvel dentro do Estado espanhol; aplicando de forma integral o pensamento de Lenine sobre a questom nacional: pátria socialista e autodeterminaçom como direito à independência nacional. E porque como dizia Roque Dalton: Para os assassinos da minha pátria,
para os carcereiros da minha pátria,
quero o ódio de Lenine,
quero o punho de Lenine,
quero a pólvora de Lenine.


ANÁLISE

4 ABRENTE Helena Sabel Membra da Mesa Nacional de BRIGA

F

azer um balanço destes dous anos de legislatura do Partido Popular serve para constatar como o reforço dos pilares que sustentam o capitalismo é fundamental para paliar os efeitos da crise sistémica e assegurar o mantimento do sistema. O patriarcado, como estrutura em que se cimenta o atual sistema de produçom, foi um dos elementos óbvios em que centrar os seus esforços, junto com o aumento da exploraçom da classe trabalhadora no seu conjunto e o pioramento das suas condiçons de vida. Nom podemos analisar aqui cada umha das reformas legislativas impulsadas polo governo espanhol desde a implosom “oficial” da crise sistémica. Porém, sim queremos reflexionar sobre como parelha à estratégia neoliberal de desmantelamento da rede pública de serviços sociais, se fomenta que sejamos as mulheres da classe trabalhadora as que assumamos estas responsabilidades gratuitamente.

Nº 71 Janeiro, fevereiro e março de 2014

A face patriarcal da estratégia neoliberal do Partido Popular

Guerra aberta contra as mulheres

N

unca sairia de nós umha defesa do feminismo institucional, essa perigosa ferramenta do sistema que com os seus apelos à “igualdade” e “paridade” distorcem os discursos feministas, ocultam de maneira consciente a raiz do problema –pois ante todo devem proteger-se os alicerces sobre os quais se cimenta a exploraçom capitalista–, e transmitem a mensagem de que as práticas reformistas e institucionais som as mais adequadas e eficazes, condenando, assim, a luita feminista radical e combativa. Porém, as primeiras estruturas governamentais a que a legislatura do PP reduziu em orçamentos e autonomia fôrom a Secretária de Estado de Igualdade e o Instituto da Mulher. Do mesmo jeito, as partidas orçamentárias dedicadas a “políticas de igualdade” (que principalmente estavam focadas em programas de formaçom que, em teoria, fomentam o trabalho assalariado feminino) e aquelas destinadas à erradicaçom da “violência de género” fôrom-se reduzindo nestes dous anos de maneira drástica. Nom pretendemos analisar a funçom que desempenhavam as instituiçons citadas, nem o pouco eficazes que eram umhas medidas reformistas que nem se achegavam a perceber a ponta do icebergue; porém, consideramos que nos servem como a primeira declaraçom de intençons do atual governo, que se permite manifestar abertamente que nem as formas pensa guardar. A sua estratégia neoliberal marca-se como objetivo paliar os efeitos da crise na burguesia a conta da sobreexploraçom da classe trabalhadora, e as mulheres tenhem que desenvolver um rol mui concreto que vam potenciar a toda costa.

Precarizaçom do trabalho assalariado...

N

os seus inícios, o emprego feminino estava caraterizado pola alta precariedade laboral, pois a funçom das mulheres como mera reserva de mao de obra –caso da força de trabalho masculina nom estiver disponível– era mui evidente, porém, esta precariedade foi umha constante que seguiu definindo o mercado laboral feminino. Se bem é certo que as diferentes reformas laborais impulsadas polos governos de Zapatero e Rajói, especialmente a de fevereiro de 2012, constituem um brutal ataque ao conjunto da classe trabalhadora, é inegável que a divisom sexual do trabalho fai que estas medidas agridam de maneira diferente homens e mulheres. Assim, as mudanças legislativas a respeito do emprego a tempo parcial devem ser necessariamente analisadas desde umha perspetiva de género e juvenil, por sermos a mocidade e as mulheres os dous setores que maioritariamente acedemos ao trabalho remunerado através deste tipo de contratos. Vemos, pois, como desde o governo se fomentam os contratos a tempo parcial, convertendo-os na fórmula mais rentável para ao patronato. Se as mulheres já temos mais empecilhos à hora de conseguir um emprego, que este tenha contrato, que seja estável, que o salário nom seja inferior ao dos nossos companheiros, agora pioram ainda mais as nossas condiçons laborais, mercantilizando de maneira mais livre a nossa

força de trabalho. A permanência num posto de trabalho e umha prestaçom digna quando nom o tenhamos som a dia de hoje meras utopias. O trabalho reprodutivo segue sendo um labor mui maioritariamente feminino, daí que a necessidade de compaginar as duplas e triplas jornadas laborais “feminize” o trabalho a tempo parcial, mas também o temporal: o assédio laboral segue a ser umha constante na vida laboral das mulheres que som maes, sendo chantajadas ou despedidas quando tentam acolher-se a esses direitos que apelam à conciliaçom da vida laboral e familiar com que tanto se enchem a boca quando falam de “políticas de igualdade”. Assim, muitas mulheres som forçadas ou veem-se na obriga de abandonar o trabalho assalariado para poder centrar-se no trabalho gratuito que desenvolvem no lar.

…E fomento do trabalho invisibilizado

O

s cortes na sanidade pública, à que vam privatizando passo a passo, junto com a reduçom económica e supressom de direitos básicos das cuidadoras/es e outros cortes presentes na última reforma da Lei de Dependência, que aposta pola privatizaçom e o copago deste serviço básico, tenhem como objetivo obrigar a que seja a mulher a que assuma de maneira gratuita todo o trabalho invisibilizado por volta dos “cuidados” das/os seus familiares. Outra das medidas que podemos incluir dentro desta tática do governo é a ampliaçom até 12 anos do período em que umha mae ou um pai pode solicitar a reduçom da jornada laboral para cuidar das crianças. Este ponto leva-nos de volta à necessidade do sistema de que, se a mulher tiver um emprego, este só seja a tempo parcial, para que assim poida cobrir todas as necessidades básicas que doutra maneira teria que assumir o Estado.

Legitimaçom da violência machista

C

om a finalidade de que passasse desapercebida, o governo do PP fijo umha modificaçom encoberta da Lei Integral Contra a Violência de Género, vigente desde 2004, através da polémica reforma do Código Penal, umha reforma que concentra tantas aberraçons aos direitos mais básicos, como a legalizaçom da cadeia perpétua ou a perseguiçom ao ativismo de este “convidar à desordem pública”, fai que os ataques que afetam diretamente as mulheres, as eternas invisibilizadas, sejam os menos difundidos.

Sabemos que a família burguesa é umha instituiçom potencialmente perigosa para a integridade física e psíquica da mulher. Analisando a violência machista como um elemento estruturante da sociedade e reconhecendo a sua funçom como mecanismo de controlo social, sabemos que esta impregna o dia a dia de tod@s nós; porém, os dados demonstram que no seio familiar é onde tenhem lugar com mais freqüência os atos mais violentos contra as mulheres. Como vinhemos afirmando, parte da tática patriarcal do PP reside na condena da mulher à casa, daí que esta reforma do Código Penal legitime a utilizaçom da violência para controlar as mulheres no seu lar. Por umha parte, esta reforma contempla a mediaçom como alternativa à pena. Um humilhante sem-sentido que joga com a ideia de que o maltratador é um homem “normal”, um pai de família, que de maneira pontual espancou na companheira, mas que este “pequeno” conflito pode solucionar-se através dum processo de (re)conciliaçom supervisado, polo que nom só se indulta ao agressor, senom que se obriga a vítima a tratar com ele como se estivessem em igualdade de condiçons: todo um despropósito que oculta e degrada a verdadeira dimensom da violência machista, com o fim de preservar o modelo de família nuclear heterossexual, que veem perigar. Evidentemente, caso de esse “núcleo familiar” se dissolver, também é do seu interesse que o homem nom perda ainda mais privilégios dos que a família lhe oferecia, polo que o incumprimento das responsabilidades familiares deixa de ser delito, passando a julgar-se pola via civil, que devido à sua lentidom e custo provocará que muitas mulheres e crianças numha situaçom económica precária se vejam gravemente afetadas (e se ademais está medida cumpre desde o início umha funçom dissuasória entre aquelas mulheres dependentes economicamente para que sigam atadas, melhor). A despenalizaçom do agressor é um ponto chave desta lei, daí que, além da mediaçom, também se contemple a multa como umha pena mais do que ajeitada para quem maltrata. Para suavizar as penas, alguns dos fatores desencadeantes mais recorrentes aos que apela o agressor, como o consumo de álcool e drogas, passam a ser atenuantes; do mesmo jeito, a entrega voluntária depois de cometer o assassinato, também será valorada positivamente (!). Nom seria

de estranhar que proximamente volvam a potenciar as etiquetas de “crime passional” e derivadas, para invisibilizar e despolitizar ainda mais o problema, pois na própria reforma a etiqueta “violência de género” (que tem umha dimensom legislativa própria) nom é a mais habitual, aparecendo por vezes “violência doméstica” ou sintagmas nominais confusos que explicitam a necessidade da existência dumha relaçom “de casal” entre agressor e agredida para que poida considerar-se que merece umha consideraçom jurídica especial. A fim de contas, espancar, ameaçar ou coagir umha mulher passará a ser apenas um delito leve, como também se reflete na lei. A todo isto, também teríamos que acrescentar que só a vítima dumha agressom pode tramitar a denúncia, e mesmo os partes de lessons realizados polo pessoal sanitário deixam de ser tramitados diretamente pola via judicial. O fomento da culpabilizaçom das vítimas que o aparato ideológico promove ou o sentimento de medo som alguns dos fatores que determinam que muitas mulheres (e homens) que som agredidas nom cheguem a denunciar nunca o seu agressor; polo que o sistema jurídico garante mais umha vez a impunidade deste.

O golpe final: a reforma da lei do aborto

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reforma da lei do aborto é a guinda perfeita com que adornar esta ofensiva patriarcal. Recortar os nossos direitos sexuais e reprodutivos tem umha importantíssima carga ideológica que, em contextos como o atual, à classe dominante lhe interessa potenciar. Assim, junto com a retirada do financiamento público dos contracetivos de “terceira geraçom” (os mais utilizados devido à sua composiçom mais avançada) ou a intençom de vetar do serviço público de reproduçom assistida a todas mulheres que nom sejam heterossexuais com casal, acrescenta-se agora a imposiçom legislativa que nos desautoriza para decidirmos sobre os nossos próprios corpos. Na Galiza, o governo de Feijó já preparara o terreno para este tipo de ataques conscienciosamente. Primeiro aprovou a entrega de orçamentos públicos a Red Madre e outras organizaçons ultraconservadoras para que pudessem gerir centros e difundir material de caráter antiabortista e heterossexista (prévio desmantelamento dos centros

Quérote, para garantir que a educaçom afetivo-sexual da mocidade galega tenha umha determinada orientaçom ideológica). Mais tarde, aprovava-se a Lei de Apoio à Família e à Convivência da Galiza, com a que se pretende legislar a obrigatoriedade da maternidade, a supremacia da família patriarco-burguesa –nuclear, monogámica e heterossexual–, e a condenaçom das mulheres ao trabalho reprodutivo. Para nom alongar mais esta lista de despropósitos, finalizamos citando o perverso Plano Integral de Apoio à Mulher Grávida, polo qual os fetos computam a determinados efeitos legais como membros da unidade familiar. Seguindo esta linha, e tendo em conta os programas de dinamizaçom demográfica com os quais fomentam a natalidade culpabilizando as mulheres de serem as culpáveis do envelhecimento da Galiza, parece que o seguinte passo lógico é promulgar umha lei que obrigue as mulheres a sermos maes, polo que a reforma da lei do aborto nom desentoa nesta dinámica de agressons. A delirante análise do Ministério de Justiça espanhol afirmando que se esperam benefícios económicos graças ao incremento da natalidade também corrobora o dito. Ademais, a privatizaçom do nosso direito a decidir encaixa bem com as políticas neoliberais que vínhamos analisando. As jovens da classe trabalhadora seremos as principais prejudicadas, pois simplificando a reforma, tirando-lhe a carga simbólica e despindo-a apenas aos empecilhos que há que “superar” para aceder legalmente a umha interrupçom da gravidez, podemos afirmar que as mulheres em posiçons de precariedade económica serám as que terám que assumir umha maternidade nom desejada, ou submeter-se a processos de interrupçom da gravidez precários que ponham em perigo as suas vidas. Porém, também nom se pode obviar a carga simbólica desta reforma: informa-se-nos que há quem tem mais poder sobre os nossos corpos que nós mesmas; di-se-nos que somos incapazes de decidirmos e que portanto as nossas decisons tenhem que ser tomadas por outros; delega-se nos nossos úteros a capacidade de sermos sujeitos úteis socialmente; condena-se que tenhamos umha sexualidade que vaia além da finalidade meramente reprodutiva.

Conclusom: as mulheres ao lar

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s mulheres nom podemos ser participantes ativas do mundo laboral remunerado sem a discriminaçom por género, pois o sistema capitalista nom se sustenta sem umha divisom sexual do trabalho (nunca o fijo e é inviável que o faga). O sistema necessita que haja quem realize os trabalhos com maior carga de exploraçom (mulheres e trabalhadoras/es de naçons oprimidas), além de que é imprescindível de que a reproduçom da força de trabalho seja realizada de maneira gratuita através de todo o trabalho invisibilizado que se esconde sob a etiqueta de “cuidados”. Assim é que a realidade demonstra que a pobreza tem nome de mulher. O mantimento da família como instituiçom que garante esta sobreexploraçom das mulheres é um fator chave para entender a ofensiva patriarcal com que nos atacam. O trabalho remunerado cada vez é mais precário para as mulheres, o que potencia a nossa volta ao lar (se alguém tem que estar no desemprego, melhor que sejamos nós). O afamado “Estado de bem-estar” promovia que as mulheres estivéssemos no lar realizando esse trabalho reprodutivo, mas aportando umha pequena ajuda estatal, ao mesmo tempo que favorecia que também tivéssemos a oportunidade de trabalhar fora (a dupla jornada e benéfica para o capital). Porém, agora que as medidas neoliberais fam que o Estado se desentenda dessa mínima ajuda ao trabalho reprodutivo, apostando pola sua privatizaçom e reduzindo de maneira drástica os gastos em proteçom social, necessita-se mais do que nunca que a mulher assuma esse labor: convertemo-la numha pessoa dependente economicamente, controlamo-la através da violência e do medo a ela, condenamo-la à obrigatoriedade desse trabalho, infantilizamo-la, cortamos a sua capacidade de decisom, e conseguimos estabilizar o sistema de produçom temporalmente, suavizando os embates da crise sobre a classe dominante, e agravando ainda mais a exploraçom da maioria social.


ANÁLISE

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Carlos Garcia Seoane Membro do Comité Central de Primeira Linha

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quase cinco anos e meio após o anúncio oficial do início da crise de lucro capitalista, as conseqüências para as condiçons de vida do povo trabalhador agudizárom-se até um nível crítico. Os principais indicadores sociais assim o revelam: recordes históricos nas taxas de desemprego e inatividade, significativo aumento da emigraçom (sobretodo da nossa juventude), incremento dos preços de bens e serviços básicos (água, luz, recolha do lixo, combustíveis, transportes, alimentaçom, habitaçom, medicamentos, etc.), aumento do número de famílias com tod@s @s seus/suas membr@s ativ@s no desemprego e sem possibilidade de aceder a umha prestaçom económica, e assim, umha longa ladainha de questons reveladoras sobre um claro deterioramento das condiçons de vida da maioria social galega. As estatísticas que o mesmo regime elabora evidencia uns dados objetivos que a todas luzes demonstram a incapacidade do sistema capitalista para satisfazer as necessidades mais básicas para a subsistência da maior parte da sociedade porque o objetivo deste sistema nom é outro senom satisfazer a sua única necessidade vital, a realizaçom do lucro capitalista. Neste panorama social crítico, o descontentamento popular com o atual sistema está em ascenso. E ainda mais, quando saem à luz numerosos casos de corrupçom que atingem desde a totalidade das forças políticas sistémicas com responsabilidades de governo, até as diferentes instituiçons do Estado. É evidente que os Carioca, Arena, Campiom, Pokémom, Nóos, Gürtel, Malaya ou os ERE andaluzes som só alguns dos exemplos que mostram a ponta do icebergue dum regime como o atual monárquico-parlamentar espanhol que está corrupto até as suas entranhas. Porém, os mecanismos de alienaçom ainda som muito fortes e efetivos, estendendo um estado de opiniom em boa parte do povo trabalhador que ainda só vê a realidade tal qual a disfarça o regi-

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A lei mordaça me, por exemplo, analisando o caso da imputaçom por fraude fiscal da filha do monarca espanhol eleito por Franco da ótica da “imprensa rosa”, que para nada crítica as questons polas quais chegou a sentar-se ante o juíz. Mas por enquanto, para umha cada vez maior parte de setores do povo trabalhador está a encontrar diáfanos todo este tipo de episódios contribuindo para gerar esse bule-bule popular que começa a questionar a mesma essência do atual sistema corruto. A melhor política é aquela que fai as pessoas julgarem que som livres. Como demonstra o materialismo histórico, mais cedo que tarde as pessoas oprimidas terminam rebelando-se se nom som convenientemente enganadas, subornadas, divididas e enfrentadas entre elas. Este é o trabalho do Estado burguês e o seu sistema repressivo.

O sistema repressivo como arma da classe exploradora

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eferimo-nos a sistema repressivo quando falamos dumha totalidade estruturada que integra diferentes níveis, espaços e meios diferentes, mas funcionais a essa totalidade, e que tenhem como objetivo estratégico defender o poder dumha minoria social dominante e exploradora à custa de desintegrar qualquer reivindicaçom emancipatória da maioria social explorada. Sem o Estado, e o seu poder centralizador decisivo, nom haveria sistema repressivo. O Estado burguês dispom dumha grande variedade de instrumentos com os quais desenvolver a sua estratégia repressiva: desde os aparelhos burocráticos e ministeriais -que som o cérebro do sistema-; passando polos ga-

binetes de direçom e planificaçom integrada -Estados Maiores-, grupos paraestatais de colaboraçom financiados polos orçamentos gerais do Estado e os grupos extraestatais, que atuam à margem da legalidade; até os diferentes ajudantes fiéis (judicatura, meios de comunicaçom, empresas de segurança privada, etc.), ou mesmo cooptados polo Estado como sindicatos amarelos ou partidos políticos pró-regime. A melhor efetividade repressiva é a que realiza um sistema que integra medidas económicas, políticas, culturais, policiais, etc., o qual exige um bom funcionamento do Estado. A ausência de planos políticos e económicos, por exemplo, supom umha grande carga dos instrumentos especificamente policíaco-militares que devem suprir com o pau o que se poderia tentar de paliar com a cenoura, ou umha combinaçom de ambas. A ditadura de Franco nom tinha necessidade dum sistema repressivo porque a própria ditadura era o sistema repressivo. Porém, a atual democracia burguesa espanhola posterior ao regime franquista arrasta profundas contradiçons e debilidades intrínsecas à sua trajetória histórica, o qual lhe exige grandes esforços para o permanente reforço do seu sistema repressivo e a sua readequaçom periódica.

Um sistema repressivo em mudança permanente

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a conjuntura atual, quem detém o controlo do cérebro do sistema repressivo prognostica os diferentes panoramas que se lhe podem apresentar, sabedores do potencial transformador do povo trabalhador unido em luita

contra o sistema opressor e explorador vigorante. Para se defenderem, ponhem em andamento toda umha série de medidas destinadas a reforçar-se e a equilibrar as diferentes áreas da estrutura do seu sistema. Exemplos desta tese pudemo-los contrastar nos últimos meses ao ver como o Ministério do Interior realizava umha redistribuiçom geoestratégica dos seus efetivos policiais, umha vez a organizaçom armada ETA declarou o cessar-fogo permanente, mobilizando unidades para outros pontos do Estado, com mha significativa conflitiualidade social ou com indícios de explosom do mal-estar popular acumulado. Nos orçamentos gerais do Estado aprovados para o ano 2013, vimos como se multiplicava por 18,8 o gasto destinado a adquirir material anti-motim para as forças repressoras de choque a respeito do ano anterior. Apesar da tam cacarejada austeridade, e que os cortes atingiriam também o Ministerio do Interior -concretamente em 6’3%-, o investimento em materiais de choque crescêrom dos 173.670 euros do ano 2012 até os 3’26 milhons em 2013. Porém, com os novos orçamentos gerais para o presente ano, readequam-se os gastos e o Ministério que dirige Fernández Díaz incrementará a sua verba em 2,3%, com um total de 7.300 milhons de euros, dos quais, 75% serám destinados à política de segurança cidadá, com 72 milhons de euros mais que no 2013. Torna mais que revelador para onde é que reserva os verdadeiros esforços orçamentários o governo do Partido Popular, dinheiro para armar-se ante o povo trabalhador. De facto, é um dos poucos

ministérios que aumenta a sua verba – junto ao de Indústria, que procura ajustar o astronómico défice ocasionado polo livre mercado da subministraçom elétrica-, e como nos governos espanhóis anteriores, erige-se no membro mais valorizado dentro do seu gabinete, adoptando a figura de verdadeiro marechal. A releváncia repressiva dos orçamentos gerais do Estado a nível prático radica em que essas verbas monetárias materializam-se em factos concretos como o treino contínuo das forças policiais -incluindo o departamento anti-motim das forças armadas espanholas, como o realizado publicamente há uns meses na cidade de Ferrol quando @s operári@s do estaleiros estavam a realizar semanalmente mobilizaçons em demanda de trabalho-, a especializaçom dos seus membros no estudo do comportamento de grupos de guerrilha urbana, aumento do controlo policial a pé de rua e, como nom podia ser doutra maneira, colaborando estreitamente com os meios de comunicaçom do regime para gerar o necessário medo e alarme social. Todos os governos espanhóis da denominada Transiçom sempre tivérom presente nas suas ordens do dia a questom interna, nom só na sua vertente social, mas também na nacional, na de género e na generacional. Independentemente da cor política de quem detivesse o comando, sempre tivérom de fazer grandes esforços por adequar o sistema repressivo à relaçom de forças existente na luita classes, das naçons, das mulheres e da juventude. Desde as contínuas reformas do Código Penal -insólito em qualquer regime democrático digno de tal nome-, passando pola promulgaçom de leis de controlo social até a declaraçom de estados de alarme, como o declarado polo governo do PSOE -cujo Ministro de Interior era Rubalcava- em dezembro do 2010 para intervir no conflito laboral d@s controladores/ as aére@s, onde efetivos militares tomárom de armas na mao os aeroportos de boa parte do Estado. passa à página 6


ANÁLISE

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A lei mordaça

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governo espanhol do Partido Popular apresentou a finais do passado ano o anteprojeto da Lei orgánica de Segurança Cidadá para a sua tramitaçom parlamentar. Há que indicar que a lei originária promulga-se em 1992 da mao de Corcuera, Ministro de Interior do PSOE naquela altura, criada num contexto de forte crise económica e de certo avanço dos movimentos de libertaçom nacional dos povos oprimidos por Espanha, facto que revela a necessidade que tem a minoria social dominante de reajustar o seu sistema repressivo quando prevê adotar medidas económicas e sociais antipopulares. Alcunhada com o nome de lei mordaça, a lei de Corcuera pretendia restringir liberdades e direitos civis ante situaçons de mobilizaçons e protestos na rua, dando passagem à caraterizaçom formal do regime constitucional espanhol como dumha democracia parlamentar burguesa semimilitar. Mais de vinte anos depois o governo atual do PP recolhe a essência daquela lei e aprofunda nela. O governo presidido por Rajói, é um governo de caráter claramente neofascista, com umha forte componente autoritária, reacionária e, inclusive, genocida, como assim o demonstra o aumento de suicídios de pessoas despejadas das suas vivendas ou daquelas pessoas, sobretodo as idosas e doentes crónic@s, que nom podem fazer frente ao custo dos medicamentos. A lei de 1992 do PSOE e a de Segurança Cidadá de 2013 do PP, no cerne significam o mesmo, as diferenças radicam nas condutas que passam a ser sancionadas (muitas delas novidosas e adequadas ao tipo de protestos atuais) e nas sançons económicas que levam incorporadas, fazendo da repressiva umha via de financiamento muito efetiva para o Estado, assim como para conter e/ou dissuadir o povo trabalhador de fazer parte ativa em mobilizaçons em defesa dos seus direitos. Com umha primeira leitura do anteprojeto aprovado polo governo, pode-se concluir que umha das intençons que se procura é restringir até o límite as liberdades de expressom e de manifestaçom. De facto, passam de 16 da lei Corcuera a 31 na nova do PP, o número de açons qualificadas como infraçons graves, constituindo algumha destas faltas recolhidas no Código Pe-

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A lei mordaça

rios que o seu próprio, poderám retirar veículos em mobilizaçons protagonizadas por estes, poderám realizar registos sempre que o considerem, poderám identificar arbitrariamente a qualquer pessoa, especialmente se esta estiver encarapuçada ou com o rosto parcialmente oculto, poderám restringir o tránsito e acesso a zonas donde se preveem distúrbios, empregar cámaras de vídeo-vigiláncia tanto de estabelecimentos públicos como privados, etc. Apontamos também umha das questons mais salientáveis deste anteprojeto como a notável subida da parte económica da sançom que pretende punir comportamentos classificados como infraçom leve (de 100 a 1.000€ de multa), infraçom grave (de 1.001 a 30.000€) ou infraçom muito grave (de 30.001 a 600.000€ de sançom), quantidades absolutamente desorbitadas.

Livres de mordaças

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Jorge Fernández Díaz, ministro espanhol da repressom

nal (que recentemente fôrom requalificadas no mesmo), que devem ser submetidas a julgamento por juízes de instruçom, o que se supom um procedimento mais garantista (que nom mais acessível, pois com o incremento das taxas judiciais realizado por Gallardón também se dificulta a apelaçom da maioria social perante os órgaos judiciais). Também recolhe infraçons que seriam muito difícil de contrastar de maneira objetiva, tal como participar encarapuçado numha manifestaçom independentemente de que se cometa ou nom açom perigosa algumha. Há outras que pola sua redaçom genérica, permitiriam incluir

mesmo os conhecidos “escrachos”; ou há aquelas que denotam umha clara intencionalidade persecutória da dissidência política, como aquelas que definem como infraçom grave as ofensas ou ultrajes a Espanha ou aos seus símbolos. Há umha clara intençom de facilitar a intervençom e impunidade das forças repressoras de choque, assim como assegurar os interesses corporativos dumhas forças policiais caraterizadas polo exercício do uso indiscriminado da violência, das detençons arbitrárias e incomunicadas e do uso da tortura, a sua verdadeira MarcaEspaña. Assim é que poderám dissolver violentamente manifestaçons sem atender a mais crité-

iante do contexto de endurecimento repressivo que se pom por diante dos militantes dessa Galiza rebelde que queremos defender-nos dos contínuos embates que estamos a receber como povo trabalhador por parte dos diferentes governos títeres do Capital, começamos por armar-nos ideologicamente para desvendar este panorama tam adverso em que está a submergir-nos o nosso inimigo de classe. Levarmos à prática o nosso pensamento é imprescindível também. Há que contrastar com a experiência se nos vemos com capacidade de fazermos umha resistência firme a quem nos quer assimilar como povo e anular como classe. E isto requer da tomada de consciência a partir de cada um/ha de nós para o coletivo, onde a uniom de vontades se fechem como um punho decidido a golpear quando for preciso para ganhar um mundo melhor. Aproveitando o começo do novo ano, em que se comemora 90º aniversário do passamento do egrégio revolucionário Lenine, tiramos dele umha citaçom bastante eleqüente a respeito da questom analisada nesta janela do Abrente: “um escravo que nom sabe que é escravo e nom fai nada por se libertar, é realmente um/ha escravo. Porém, um escravo que tem consciência de ser escravo e luita por se libertar, já nom é mais escravo e é homem livre”. Eis a melhor receita para nos libertarmos das mordaças que nos querem impor.

LIVROS Vladímir Maiakóvski Minha descoberta da América Traduçom de Graziela Schneider e supervisom de Elena Vássina Martins Editora, São Paulo, 2007, 119 páginas Estamos diante da primeira traduçom para a nossa língua de um texto dos menos conhecidos do artista total da primeira etapa da Revoluçom russa, líder da Frente de Esquerda (LEF) que agrupou toda umha geraçom de vanguardistas militantes das artes e da revoluçom. Com umha Uniom Soviética ainda inserida na NEP, o poeta, dramaturgo, artista plástico, orador e ator de origem georgiana viaja por Cuba, México e Estados Unidos. Durante a viagem, Maiakóvski escreve o relato do que vê, configurando um documento valioso sobretodo pola descriçom das diversas realidades do capitalismo com a perspetiva de um militante e artista soviético da primeira hora. Polos seus olhos assistimos à pobreza da populaçom negra e verificamos a simpatia polos bolcheviques em Havana; à crítica que ele fai às touradas (“experimentei uma alegria suprema: o touro sabia cravar o chifre entre as costelas humanas, vingando os touros-camaradas”), e o encontro com Diego Rivera no México; à pobreza visível em contraste com a deslumbrante Broadway em Nova Iorque e ao vaticínio do caráter imperialista da forja dos Estados Unidos; ao assassinato racista de negros e à referência a Chicago como cidade com mais militáncia comunista das que visitou... O regresso à terra dos sovietes reafirma o propagandista das janelas da Rosta nas suas ideias comunistas, criticando a reduçom das massas operárias a bens de consumo inesgotável por parte dos capitalistas. Apaixonado, sincero, grande admirador de Lenine até os últimos dias da sua vida breve (cometeu suicídio em 1930, com só 37 anos), esta ediçom brasileira aproxima-nos de umha etapa muito concreta do seu percurso vital. O registo escrito de um artista bolchevique no continente americano dos anos 20 deixa-nos grande número de pequenos acontecimentos e reflexons sociais, políticas, paisagísticas e artísticas que tornam de grande interesse a leitura. Maurício Castro

Dionísio Pereira Emigrantes, exilados e perseguidos. A comunidade portuguesa na Galiza (1890-1940) Galiza, Através Editora, 2013, 280 páginas Dionísio Pereira, historiador destacado na investigaçom sobre temas como o movimento operário ou a repressom franquista, acabou de publicar na Através Editora, rubrica editorial da AGAL, o seu último livro. Um trabalho que ajuda a conhecer umha questom pouco tratada como a do papel da comunidade portuguesa, das e dos trabalhadores portugueses, no nosso país. Tal e como assinala o título, o período histórico investigado inclui as décadas prévias a 1936 mas também os anos imediatamente posteriores ao golpe de Estado fascista e a bárbara repressom. A coletividade portuguesa atingiria nom menos de 20.000 pessoas naquele entom, embora a cifra exata seja difícil de conhecer pola ausência de censos fiáveis. Neste período, Pereira analisa a emigraçom portuguesa e o seu nível de integraçom laboral e social na Galiza e também a posterior repressom que esta comunidade sofreu por parte do fascismo espanhol por causa da sua implicaçom e compromisso com o movimento operário, mesmo a nível dirigente. Mas também houvo outras causas para a chegada de portugueses a portuguesas à Galiza. O nosso povo também recebeu parte do exílio português (políticos, militares ou militantes operários) após o golpe militar de 1926 e a instauraçom do Estado Novo salazarista em 1933, um regime aliado do franquismo e que colaborou na repressom tanto de galeg@s como de portuguesas/es. Anjo Torres Cortiço

WEB AGIR, entidade estudantil da esquerda independentista www.agir-galiza.org Coincidindo com um relançamento e fortalecimento organizativo da entidade estudantil da esquerda independentista, o seu espaço na rede foi também melhorado e complementado com a incorporaçom da comunicaçom direta através das principais redes sociais. Toda a informaçom sobre a atividade de AGIR está disponível no mesmo endereço de sempre, refletindo as campanhas e iniciativas da entidade nas universidades e centros de ensino secundário. Para além da página web, pode conhecer-se de perto o trabalho de AGIR no FB e no Twitter FB: https://www.facebook.com/galiza.agir Twitter: @AgirGaliza

Vijay Prashad Las naciones pobres. Una posible historia global del Sur Barcelona, Ediciones Península, 2013, 496 páginas Em Julho de 2012, publicava-se em Abrente, do mesmo autor, umha resenha de Las naciones oscuras. Una historia del Tercer Mundo, que amostrava o projeto, o sonho dum mundo novo, para essas naçons obscuras (povos de África, Ásia e América Latina) em oposiçom ao colonialismo. O presente livro descreve as tentativas desses países de se contrapor as transnacionais que os empurram à pobreza e à dependência. O livro anterior focava nos modos de evitar a nom intervençom militar e a ingerência política, enquanto este coloca no centro as políticas económicas e comerciais; fai análise da fame, dos recursos naturais esbanjados, dos subúrbios e vilas-miséria, do deslocamento empresarial na procura de mao de obra barata, das nomeadas “políticas de ajuste estrutural”, das esmagadoras políticas de dívida… Som quatro os capítulos para narrar a devandita luita. O primeiro sobre “a defunçom do liberalismo do Atlântico Norte”, onde se apresenta a Comissom Brandt, o G-7 (órgao executivo das ambiçons do Norte), o desabamento do projeto do Terceiro Mundo e o começo do neoliberalismo como lógica definitória desde mediados da década dos 70 do século passado até 2010. As encrucilhadas do Sul é o título do segundo que repousa na ideia da cooperaçom Sul-Sul e a sua teoria das “locomotivas do Sul”, mapa intelectual que dá lugar à formaçom do BRICS (Brasil, Índia, China, e mais tarde Sudáfrica). O terceiro, “As locomotivas do Sul”, examina tal variante de neoliberalismo com traços meridionais e mantém que questionam a ortodoxia do Norte e nom estám em disposiçom de se inclinar diante do poder imperial. Umha história de sonho do Sul do planeta, título do último, perscruta o potencial do Sul, o papel dos movimentos sociais e doutras formaçons…, e está no convencimento de que “a época do impossível tem feito a sua apariçom”. Domingos Antom Garcia Fernandes


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INTERNACIONAL

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Gamonal: do General Yagüe à máfia da construçom Alberto San Martín Membro de Izquierda Castellana

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o meio da polémica desatada após a notícia de que a Cámara municipal de Burgos concederá um espaço público para realizar umha exposiçom intitulada Um homem e o rexurdimento de Burgos. Yagüe, tem como objetivo homenagear o general ligado ao massacre de Badajoz, surgem algumhas questons relacionadas com o desenho urbano da nossa cidade. Como desenharom o espaço urbano de Burgos os vencedores da Guerra Civil? Como afetou a marca do Exército sobre a estrutura urbana de Gamonal ou que relaçom tem esta com a especulaçom urbanística posterior? Durante as décadas dos anos 40 e 50, Burgos é uma cidade com pouco peso industrial, de caráter muito agrícola e com umha forte herança militar desde 1938, quando Burgos foi nomeada Capital da Cruzada durante a Guerra Civil. Depois da guerra, e mudada a capital para Madrid, em Burgos fica ainda umha enorme populaçom carcerária de caráter político. Centenas das suas famílias deslocam-se para Burgos desde muitos lugares do Estado espanhol, para estarem perto dos seus parentes presas e presos. Esposas e filhas de presos trabalham como empregadas domésticas em casas de oficiais militares e nas casas de mandos políticos e económicos da ditadura franquista. Som os anos em que o General Yagüe ocupa a Capitania Geral de Burgos (19431952). O ditado estendido de que Burgos era umha cidade de padres e soldados é apenas meia verdade, pois também era a cidade de familiares de presas e presos republicanos, de centenas de pessoas exiladas no interior e inumerávels fossas comuns baixo os nossos pés. Como projetárom o espaço urbano em Burgos os vencedores? No Plano de Urbanizaçom de Burgos, elaborado por Paz Maroto (1943), reflete um desenho urbanístico, em que a presença militar desempenha um papel importante no traçado urbano. Novas instalaçons militares seriam construídas e sempre, é claro, com a participaçom da Cámara municipal de Burgos, já que muitos destes edifícios castrenses foram construídos em terreios municipais. Esse plano de urbanizaçom prevê umha grande zona militar entre a cidade e o termo de Gamonal. O objetivo era ocupar, para encher, o espaço existente entre os escassos três quilómetros que separam o centro da cidade do povo de Gamonal. Qualquer pessoa nascida nos anos cinqüenta lembra-se como a rua Vitoria estava cheia de edifícios militares, alguns deles ainda em pé hoje. Uns já existiam entom, como os “Cuarteles de Caballeria” ou a “Barriada Militar”. E outros de nova construçom, como o Governo Militar, a Academia de Engenheiros, a residência de oficiais, a do Desporto Militar, o aquartelamento “Dos de Mayo” (frente às piscinas descobertas do Plantío) ou os conhecidos como chalés de aviaçom, entre outros. Sim, chalés para os oficiais de aviaçom. Além de Gamonal, ainda se conservava o aeródromo militar, além do Parque de Intendência. Aqueles chalés fôrom ficando, com o tempo, rodeados por edifícios no bairro de Gamonal, absorvidos da noite para o dia por aquela vertiginosa transformaçom do povo Gamonal em bairro, a partir do ano 65. Sem dúvida, essas duas expressons arquitetónicas chocavam sendo o resultado de duas conceçons muito diferentes. Umha, com umha grande pegada militar, a do plano elaborado por Paz Maroto (1943), sob o olhar atento e a influência do Capitam General Yagüe. E a outra, que mais tarde seria implementada em Gamonal desde a criaçom do “Pólo de Desenvolvimento Industrial” em 1960, de marcado caráter especulativo forjado arredor do novo poder tecnocrático franquista. A década de 50, pois, supom um tránsito, umha dobradiça entre um modelo de planeamento urbano ainda dependente dos interesses militares e o novo capitalismo especulativo nascido ao calor do desenvolvimento industrial dos anos 60, e terá como paradigma o caos construtivo do Bairro de Gamonal. Esta orgia da construçom tem um ponto de inflexom importante em 1992, quando a Audiência de Burgos sentenciou que o construtor Méndez Pozo tinha recebido um ilegal tratamento favorável pola Cámara municipal e condenou nom

A organizaçom popular facilitou a vitória contra a especulaçom

só o construtor e o presidente da Cámara, como também três vereadores. Facto insólito nesse Estado em que ainda custava submeter a atuaçom de responsavels públicos a controlos jurídicos, sobrotodo quando vinham das fileiras do “Movimiento” nos anos 60 e 70. O exército espanhol mantinha, até recentemente, pouco mais de dous milhons e meio de metros quadrados de instalaçons, muitas delas ao longo de, como dixemos, o corredor da rua Vitoria. Progressivamente e dacordo com os novos critérios de “modernizaçom”, o Ministério da Defesa, desde 1995, decide vender boa parte de estes terreios ao concelho de Burgos com a condiçom de serem destinados para vivendas de proteçom oficial. O resultado final já o sabemos: reclassificaçom e venda dessas terras para o me-

O Plano de Urbanizaçom de Burgos de 1943 reflete um desenho urbanístico em que a presença militar desempenha um papel importante no traço urbano.

lhor postor, oferecendo lucros chorudos à máfia da construçom. E devo lembrar que essas terras foram originalmente atribuídas ou fornecidas pola Cámara municipal de Burgos ao exército em tempos da Capitania do General Yagüe, num contexto de miséria geral da populaçom de Burgos que contrastava obscenamente com o estilo de vida da oligarquia local nos duros anos da pós-guerra. Isto evidencia o poder do General Yagüe nos anos 40, que com a sua pressom obtivo terreios públicos para instalaçons militares e décadas mais tarde passou para as mans de interesses comerciais privados. Enquanto isso, o problema da vivenda continua a ser chave para as exíguas economias familiares burgalesas, que tenhem que comprar a sua casa num dos mercados imobiliários mais caros do Estado espanhol, junto com Madrid, Barcelona ou Donostia. Os chalés de que falava, umha vez abandonados polo exército, fôrom ocupados por jovens em 1996, sendo cenário de uma das muitas experiências de autogestom e ocupaçom desenvolvidas em Burgos por diversos coletivos e organizaçons antifascistas. Visibilizava-se já uma atitude no bairro de denúncia pola falta de

espaços públicos e equipamentos e também das dificuldades de acesso à vivenda polos jovens da altura. A Okupa dos chalés de Aviaçom albergou nas festas de San Pedro de 1996 as jornadas intituladas “5 Anos Ocupaçom e Resistência” (em 91 ocupava-se a casa da “Llana de Afuera”), organizadas pola Assembleia Okupa de Burgos. Naquela noite, os jardins da Okupa de Aviaçom estavam cheios de pessoas a verem o grupo Def Con Dos. Naquele mesmo ano, um outro espaço deixado é ocupado, as dependências da fábrica de leite CELEBUSA, também no coraçom de Gamonal, hoje parque Félix Rodríguez de la Fuente. Naquele verao, na okupa de CELEBUSA, era preciso esperar na fila para ver e Reincidentes e Andanada 7. A criaçom do Polo de Desenvolvimento Industrial no início dos anos 60 abriu as portas de par em par para iniciativas especulativas e da busca do lucro imediato para muitos construtores e políticos. Fagam negócio, senhores! Era o slogan. A distribuiçom do solo em Gamonal fixo-se atendendo a interesses particulares. Qualquer tentativa de planeamento representou um obstáculo para aqueles que estavam esfregando as mans à espera das elevadas maisvalias na venda das casas ninho dos altos blocos que foram erguidas de maneira desordeada e abigarrada por todo o Bairro de Gamonal. Em suma, desde o responsável do massacre de Badajoz no 36 Juan Yagüe, até os alcaides de Burgos no tempo da democracia (desde José María Peña até Javier Lacalle) o funcionamento da administraçom pública local está sujeito a uma espécie de influências pessoais, clientelas e interesses económicos que permitem o relevo da corrupçom ao longo dos anos. Fica muito bem refletido no caso da construçom em Burgos. Argumentos nom faltam para dizer às pessoas defensoras do modelo de Transiçom que o que houvo realmente ao longo dos anos 70 e 80 foi um contínuum no referido à corrupçom. Mas também de repressom contra os movimentos que questionárom tais práticas. Em Gamonal, levam muito tempo a sofrer esses abusos, mas também a tomar consciência de que um outro mundo é possível. O povo organizado parou o Boulevard. Há umha história por trás. Ainda que muitos especialistas e jornalistas ao serviço desses espúrios interesses continuem a criminalizar um povo que ganha poder. O Burgos dos senhoritos está a tocar fundo.


Jornal comunista de debate e formaçom ideológica para promover a Independência Nacional e a Revoluçom Socialista Galega

Edita: Primeira Linha. Redaçom: Rua Costa do Vedor 47, rés-do-chao. 15703 Compostela. Galiza. Telefone: 616 868 589 Conselho de Redaçom: Comité Central de Primeira Linha. Fotografia: Arquivo Abrente. Correcçom lingüística: Galizaemgalego Diagramaçom: ocumodeseño. Imprime: Sacauntos Cooperativa Gráfica. Encerramento da ediçom: 24 de fevereiro de 2014 Correspondência: Rua Costa do Vedor 47, rés-do-chao. 15703 Compostela. Galiza. Web: www.primeiralinha.org / Correios electrónicos: primeiralinhagz@gmail.com / primeiralinha@primeiralinha.org / Twitter: @PrimeiraLinhaGZ Tiragem: 3.000 exemplares Distribuiçom gratuíta.Permite-se a reproduçom total ou parcial dos artigos sempre que se citar a fonte. Abrente nom partilha necessariamente a opiniom dos artigos assinados. Impresso em papel reciclado. Depósito Legal: C-901-1997

Eva Cortinhas. Membra da Mesa Nacional de BRIGA

Contracapa Insurgente

A “legítima violência” que nunca se legitima F

orte foi a polémica que se desatou após a última greve estudantil galega do passado 20 de fevereiro, e para quem ainda nom saiba dela, já lhe avanço que nom, que as causas nom fôrom a detençom e identificaçom arbitrária de centenas de jovens, nem a infiltraçom de agentes policiais à paisana dentro das manifestaçons para perseguir a combatividade estudantil e nem tam sequer a criminosa retirada por parte da polícia espanhola de bandeiras da pátria. A polémica de que estamos a falar veu desatada pola implementaçom de formas de luita mais combativas que o formato de manifestaçom “pacífica” ao que estamos tristemente habituadas. E nom, essa polémica tampouco foi promovida e potenciada só por parte da imprensa burguesa, como caberia esperar, mas tivo como principais protagonistas àquelas/es que fam parte de projetos políticos que dim aspirar a liderar um processo de emancipaçom nacional e social da Galiza. Desde as críticas por nom “adaptar-nos ao momento nem ao contexto” até as que continuam imóveis e repetitivas apelando à “manifestaçom pacífica”, fôrom diversas as fórmulas que pudemos ouvir ou ler, mas mui unánime a mensagem transmitida: a combatividade está fora de lugar, e de nom está-lo, este nom era o momento... e tampouco o contexto. Porém, afirmam, nom criminalizam o estudantado que pujo em prática esses métodos de intervençom, apenas o acusam de conformar umha minoria violenta, infantilista, cheia de testosterona e individualista que com a sua “fascinaçom” pola violência deslustrou um sucesso de convocatória de greve. Ficando pois clara a inexistência de qualquer tentativa de “criminalizaçom” contra aqueles setores do estudantado mais combativo, cumpre que quem sim acreditamos na adequaçom das polémicas

práticas ao contexto concreto da situaçom que mostra às claras como nom podemos concreta, valoremos um par de importan- falar de minorias comparando a quantites questons. dade de jovens participantes das modaliA primeira delas é a automática tei- dades de protesto mais conseqüente com ma de considerar “minorias” a quem in- a totalidade do estudantado manifestante. tervém dum modo distinto ao desejado e E também se mostra às claras, como entre promovido por umha esses setores de estudeterminada organizadantes, há umha eleÉ um importante erro çom. O facto de que se vada percentagem de considere inapropriado mulheres que demonsque forças políticas desenvolver dinámicas tram que a combativie entidades juvenis e que se extralimitam dade nom é consequênestudantis enquadradas timidamente por fora cia duns maiores níveis das estreitas margens de testosterona e que a em projetos que se autoque impom a burgueviolência nom é biolodefinem emancipatórios, sia, nom devera impegicamente consubstandir a capacidade para cial ao homem. contribuam para servir de reconhecer umha reaE esta tergiversamuro de contençom da lidade que é facilmente çom dos factos engancrescente rebeldia juvenil. constatável e que se ascha com a segunda suma o coerente e resquestom que quigera ponsável papel de nom agir como cúmplice abordar. Estamos de acordo em que é umha da imprensa sistémica, ajudando a esta na tarefa fundamental por parte das e dos que sua tarefa de manipulaçom. nos auto-proclamamos revolucionárias, faO certo é que temos a sorte de contar zer um correto diagnóstico da realidade que com amplo material gráfico e audiovisual pretendemos transformar. Evidentemente as

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interpretaçons podem ser mui diversas, mas se nom tiramos os óculos de veludo que nos impedem ver a predisposiçom para a luita de importantes setores de juventude galega de extraçom popular, temos alta probabilidade de fazer umha interpretaçom errada. E nom só isso, senom que também teremos umha alta probabilidade de dar umha resposta incorreta às tendências observadas. E neste ponto sim considero um importante erro que forças políticas e entidades juvenis e estudantis enquadradas em projetos que se auto-definem emancipatórios, mostrem tanta preocupaçom em elaborar argumentaçom que deslegitime métodos de intervençom mais combativos dos habitualmente utilizados, e contribuam para servir de muro de contençom da crescente rebeldia juvenil. E nom só rebeldia juvenil, mas rebeldia inicialmente bem focada, e que quem desde o trabalho de base, quem também assistimos a assembleias, colagens e repartos, e fazemos parte consciente e comprometidamente dum projeto revolucionário de emancipaçom nacional e social de género, devemos contribuir a dirigir certeiramente contra o nosso inimigo comum. E remato aqui lembrando Lenine quando alertava dos problemas que supom que um partido revolucionário esteja atrasado em relaçom com o ascenso das massas, que se revele incapacitado e “pouco preparado para cumprir as gigantescas tarefas” tanto no plano teórico como no prático que nesses intres som tam necessárias para organizar o espontaneismo e encaminhá-lo à tomada do poder. Nom podemos nem devemos, pois, esperar a que essa rebeldia fique diluída na inércia do espontaneismo, os e as revolucionárias temos a responsabilidade de agir com coerência na açom teórica-prática e tratar de dirigir dita rebeldia para a vitória.


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