
4 minute read
EM DEFESA DO JORNAL LOCAL
Tomás Costa
É importante haver jornais locais, regionais e nacionais, apesar da proliferação de tantas outras formas e plataformas de comunicação que não param de nascer e, sobretudo, de crescer.
Advertisement
O jornal local continua a ter o seu lugar próprio, mas precisa, de forma vital e fundamental, de ter mais leitores. O jornal local vai à porta do leitor, vai através de assinatura, dando-lhe, este facto, uma marca especial de proximidade e de entreajuda de grande preciosidade. É um companheiro esperado e, mesmo que haja discordância com algum conteúdo, é uma companhia amiga e com os amigos também podemos discordar, ou, sobretudo, é com os amigos que podemos discordar, mas continuar sempre ao lado, porque é lá que queremos ficar a lutar.
Esperar pelo jornal local, para ver se saiu aquela notícia que queremos ver mais desenvolvida, ou para criticar a desatenção do jornal em relação a um assunto que nos parece essencial, tudo isso alimenta o leitor do jornal que, por ser local, exige um maior cuidado na abordagem dos temas, sobretudo quando se trata de noticiário, onde a objectividade é mais exigente ou mais delicada, se
A opinião, com a qual concordamos, discordamos ou queríamos ainda mais incisiva ou então que fosse mais inteligível e atingível, tudo constitui a marca decisiva da qualidade do jornal local, que deve ser equilibrado entre a opinião, a reportagem, a notícia e a entrevista que, normalmente, é muito apreciada pelos leitores.
Outro aspecto da importância do jornal local é o insubstituível papel histórico que o mesmo transporta. Os jornalistas, os directores, os colaboradores vão passar, mas o jornal vai ficar e a ele muitos recorrerão quando quiserem lembrar ou fazer a história da terra, num determinado momento.
Até a publicidade, a forma como é feita, quem anuncia, até isso servirá para se fazer um balanço histórico, social e económico da vida da gente ao longo dos tempos. O jornal tem sido uma casa de memórias.
Há decisões de um governo que deviam ser aproveitadas por outros governos.
Uma boa decisão tomada por um antigo governo regional, presidido por Mota Amaral, foi, sob o lema de “ler jornais é saber mais”, levar os jornais açorianos a todas as escolas, através da assinatura dos mesmos. O governo pagava uma assinatura e os jornais enviavam três exemplares, salvo erro, e dessa maneira os alunos, os professores e os funcionários de cada escola tinham acesso aos diferentes diários, semanários, quinzenários e mensários que se publicavam nas diferentes ilhas do arquipélago, podendo acompanhar a vida regional de uma maneira acertada e crítica.
A medida do governo de Mota Amaral nem sequer resistiu ao tempo dos seus próprios criadores, e lembro-me de departamentos governamentais cortarem as assinaturas para pouparem, mas agora era mesmo uma medida inteligente e de grande alcance, na ajuda à sobrevivência dos jornais, e no conhecimento da realidade insular pela juventude açoriana, sob a boa orientação docente. Claro que tudo isto pode circular digitalmente, mas até aqui, o papel pode ser pedagógico e sanitário, para ajudar a equilibrar o abuso do telemóvel.
A qualidade já o Ilha Maior a tem, embora com parcos recursos, mas sem recorrer ao expediente do ordenado mínimo. Não é uma fatalidade ter de haver baixos salários nos jornais e na sociedade açoriana.
Não queremos subsídios garantidos, queremos o pagamento de serviços prestados pelo jornal e lamentamos que algumas câmaras municipais ainda os concedam, derrotando, irremediavelmente, a livre concorrência, com expressão até nos preços da publicidade.
Não quero falar muito de outras concorrências, menos próprias, talvez duvidosas, talvez sinais destes tempos, que são os proliferados gabinetes municipais de comunicação, alguns com muitos profissionais da área da informação, que vão substituindo, com dinheiros públicos, algum papel dos jornais privados, que moram mesmo ao lado.
O jornal local é uma espécie em vias de extinção.
E provar que existe realidade além da internet.
O governo prometeu dar uma grande ajuda para a independência e robustez dos jornais regionais, dizendo reconhecer o seu papel fundamental para a livre opinião no debate de ideias para uma sociedade mais esclarecida, porque quanto mais esclarecida, mais capaz para o desenvolvimento. Espero para ver, mas já vai demorando o novo PROMÉDIA ou o seu sucedâneo. Agora, a independência seduz-me, porque sem ela a sociedade açoriana ficará a perder. E a democracia, que aprendi a aprender todos os dias, ganhará se houver o escrutínio de um jornalismo independente e robusto nos Açores.
Precisamos de mais assinantes, mas a gente mais nova não se mostra interessada nestes modos de estar na vida e prefere a rapidez da informação sem escrutínio, muitas vezes, porque a pressa também é sinal de esquecimento. Só a lentidão, neste caso a do jornal em papel, sobretudo, e até em digital responsável, será capaz de favorecer a memória.(Milan Kundera)
Também não queremos que haja discriminação no que diz respeito a publicidade institucional, como sentimos em tempos próximos. Há dias, tivemos uma certa publicidade governamental paginada e, quando estava quase a ser enviado o jornal para a gráfica, no Faial, ordenaram-nos que a retirássemos. Curiosamente, ou não, dias depois, apareceu o mesmo edital no facebook da câmara municipal, “a pedido da secretaria regional”. De outra vez, uma página inteira, a cores, saiu em todos os jornais, todos, locais e regionais, excepto no Ilha Maior. Coincidências, mas sempre penosas para o mesmo lado...
Por outro lado, apreciamos e festejamos o empenho de algumas empresas privadas que nos escolhem para fazer publicidade, algumas até empenhadas quase só em nos ajudar, pura e simplesmente, mas compreendemos que a baixa demografia picarota não permita mais, infelizmente. De quando em vez, sai-nos a rifa, e a câmara faz um anúncio que muito apreciamos, pela indispensabilidade do mesmo.
É quase trágico. Atingimos o reconhecimento da nossa situação precária, e não foi de repente. O destino é inexorável na sua caminhada para a catástrofe e não haverá catarse que nos salve, servindo para nossa descarga emocional e purificação, o querer, esforçadamente, continuar até poder.

O jornal local em papel é uma espécie em vias de extinção.
Até lá, e o lá está mesmo ao virar da esquina, vamos aguentando, mas temendo que o unanimismo acelere ainda mais. Esta é a normalidade e o normal é só uma estatística daquilo que é mais frequente. (Rosa
Montero)
Os jornais, todos eles, os grandes, os nacionais, os regionais, os pequenos, os locais, todos eles navegam em mares de turbulência, com a diminuição de leitores, de publicidade e a tendência é para fechar, para desaparecer e então há-de haver gente a lamentar tal facto e a dizer, “que pena, até dava tanto jeito ler aquele jornalinho, à sexta-feira, ao fim de semana, sempre trazia alguma coisa de interesse, nem que fosse a publicidade, para a gente ver quem comprava novas terras, quem legalizava outras, quem oferecia novos empregos, embora poucos, mas enfim... ou até para forrar o caixote do lixo”.
E com este fim, do fim à vista, me despeço, e, em Abril, razões mil para pensar que a democracia devia estar melhor.