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dica cultural

O Artista: a era do cinema mudo

por Willy Schumann hollywoodiano que revela uma jovem atriz, cuja carreira decola enquanto a dele entra em declínio em função do nascimento do cinema falado.

A história do filme é tão bem contada, que o público esquece que está assistindo a um filme em preto e branco e sem diálogos. “O Artista” é uma prova factual de que um bom filme não precisa, necessariamente, ser colorido, falado ou utilizar recursos de efeitos especiais modernos. O que conta mesmo é uma boa história, com bons atores, além de uma trilha sonora primorosa.

No dia 6 de outubro de 1927, a América parou para assistir ao filme “O Cantor de Jazz”. Era o primeiro filme a utilizar a linguagem sonora a partir do som sincronizado com a imagem. Nascia, então, o cinema sonoro. O público pôde ver e ouvir o famoso ator Al Jolson, com o rosto pintado de negro, falar e cantar durante a projeção do filme através de uma parceria tecnológica entre a Warner Bros. e a Vitaphone, um gigante do mercado fonográfico americano da época.

No final dos anos 1920, Hollywood vivia seu grande momento a partir de sucessos do cinema mudo. Produtores e astros estavam apavorados ao se deparar com a novidade tecnológica. Artistas como Charles Chaplin, Rodolfo Valentino, Sarah Bernhardt e Buster Keaton haviam criado uma forma de interpretação sedimentada na expressão física e facial e, agora, com o advento do cinema falado, estariam arruinados.

Em 2012, a América parou novamente para assistir a um filme em preto e branco, que deixou de lado todos os recursos tecnológicos e sonoros. Trata-se de “O Artista”. A trama gira em torno de um conhecido ator

o cantor de

Jazz inaugurou o cinema com trilha sonora no ano de 1927, acabando com o cinema mudo. o artista conta uma história tão boa que nem se percebe que não há diálogos

É claro que eu não poderia deixar de mencionar o cativante cachorrinho chamado Uggie, que, sem dúvida, rouba a cena e merecia uma nova modalidade de Oscar: o de melhor ator animal. A produção franco-belga foi laureada com cinco estatuetas, entre elas: melhor filme, melhor ator (Jean Dujardin) e melhor diretor (Michel Hazanavicius). N

WILLY SCHUMANN é jornalista em Curitiba (PR)

perigos, como tempestades e risco de naufrágio, fizeram parte das viagens missionárias do apóstolo paulo; tudo para levar o evangelho aos gentios

O que é missão?

desde o iNÍcio, seguNdo os épicos relatos de atos dos apóstolos, Fazer missão é uma atiVidade de risco para os seguidores de Jesus. esteVe ligado a perigosas ViageNs, iNclusiVe com NauFrágios. prisões, perseguição e risco de martÍrio eXigiam coragem dos missioNários. Nas págiNas a seguir reFleXões sobre o desaFio de Fazer discÍpulos em todas as Nações.

por Rui Bender

Missão vem do latim missio. Essa palavra corresponde ao verbo grego apostéllein, do qual deriva a palavra apóstolo, em português. Esses dois termos têm algo em comum: significam “envio”. Em sua origem, missão quer dizer envio. Alguém é enviado por outra pessoa para realizar alguma ação ou entregar alguma mensagem. “Mas, originalmente, o termo não tinha caráter religioso. Ele procede do âmbito secular, mais propriamente militar. Mesmo hoje, designa ações de cunho diplomático, comercial, político e até esportivo. O uso do termo na história cristã

tem a ver com a própria expansão do evangelho no Império Romano”, explica o missiólogo Roberto Zwetsch, professor da Faculdades EST em São Leopoldo (RS), no livro “Teologia Prática no Contexto da América Latina”.

O livro bíblico Atos dos Apóstolos narra em detalhes as primeiras viagens missionárias de Pedro e de Paulo para fora do meio judaico-cristão. Paulo, Silas, Barnabé, Priscila, Áquila, Lucas, Marcos, Andrônico, Júnia, Clemente, Apolo e tantos outros cristãos e cristãs anônimos começaram a espalhar o evangelho de Jesus pelo mundo grecoromano após o evento da ressurreição de Cristo. Constituíram comunidades a partir de sinagogas e casas particulares, muitas delas dirigidas por mulheres. “Isso mostra que havia cruzadas na Idade Média.

Entretanto, o grande século da missão cristã foi o século 19. Esse se caracteriza por um intenso movimento de renovação espiritual. Grupos, associações e sociedades missionárias da Europa e da América do Norte encarregaram-se de expandir a fé evangélica para diversas partes do mundo ainda não atingidas pelo cristianismo. Partiu-se para a África, a Ásia e a Oceania. Assim foi se consolidando uma nova configuração da missão cristã. “É o hemisfério Norte evangelizando o hemisfério Sul”, constata Zwetsch.

Não há consenso fácil na teologia em torno do conceito de missão. Zwetsch aponta duas tendências na teologia da missão no livro “Missão como com-paixão”: 1 – Missão é a proclamação do evangelho a quem não conhece Jesus como Salvador. Ela não tem fronteiras nem se deixa prender por qualquer tipo de limitação ou discriminação. Procura desenvolver o seu anúncio a partir do conhecido texto de Mateus 28.18-20 (grande comissão). 2 – Missão é participar do envio de Deus. Discipulado de Jesus é um dos >>

paulo e outros começaram a espalhar o eVaNgelho de Jesus pelo muNdo greco-romaNo e FuNdaram comuNidades.

uma metodologia própria nesses primeiros tempos, que não privilegiava indivíduos, mas equipes, mesmo que Paulo fosse reconhecido como líder”, observa Zwetsch.

renoVaçÃo – Entretanto, muita coisa mudou depois dos dois primeiros séculos. “De igreja perseguida, o cristianismo passou a ser uma igreja que perseguiu e utilizou a força para impor-se aos povos não cristãos”, lamenta o missiólogo. Há muitos exemplos do uso de força, como as

Reprodução Novolhar

conceitos centrais dessa perspectiva missionária. Missão é missio Dei. A igreja cristã é instrumento na missão que é de Deus. A missão aponta para além da própria igreja que ajuda a construir.

Bússola – “A missão é a razão de ser da igreja. Não obstante, é quase impossível dizer o que ela é. Cada geração de cristãos precisa redefinir o que entende por missão”, enfatiza Zwetsch. “A Bíblia não é um conjunto de ‘leis de missão’ que nos daria um receituário seguro para a prática da missão. Ela é antes um mapa ou uma bússola de orientação”, esclarece o missiólogo.

De qualquer forma, “a missão faz parte do próprio ser da igreja. É a fé que se evidencia no dia a dia da vida como testemunho e serviço em amor”, define o pastor emérito Huberto Kirchheim, pastor presidente da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) nos anos de 1994 a 2002. Kirchheim vale-se das palavras de outro ex-pastor presidente da IECLB, Gottfried Brakemeier, para justificar a importância da missão: “Igreja sem missão não tem futuro. Igreja sem missão trai seu mandato. Igreja sem missão permanece em dívida com as pessoas”.

O assessor teológico da presidência da IECLB, pastor Romeu Martini, afirma que “ser igreja missionária não é uma questão de opção, e missão não é um assunto para um departamento ou um setor”. Na sua opinião, “ser igreja missionária é um espírito que perpassa o todo da ação da igreja”. Ele ainda acrescenta: “Missão implica, de modo muito especial, ultrapassar fronteiras geográficas, culturais, sociais, étnicas etc. A missão de Deus não conhece fronteiras”.

Entretanto, há o risco de desfigurar o rosto da igreja na ânsia de querer ser igreja missionária. Martini entende que é fácil observar igrejas que crescem numericamente e que sempre há quem busque copiar ou imitar essas mesmas. Não se pode negar que há o que aprender com outras igrejas. “Mas, no atual supermercado religioso brasileiro, é enorme o risco de desfigurar o rosto da IECLB quando se tenta copiar ou imitar”, alerta Martini. Não obstante, “ser igreja missionária implica aprender mutuamente, permutar conhecimento, trocar experiência”, arremata o assessor teológico. Martini observa que “há comunidades históricas, ‘antigas’, com belos exemplos de presença e ação missionárias”.

proJetos – O assessor teológico lembra alguns projetos missionários da IECLB. Há iniciativas que surgiram a partir da migração de pessoas de confissão luterana e que a igreja decidiu acompanhar (Apuí, Sínodo da Amazônia). Também há projetos missionários que surgiram “do zero”, como iniciativas da IECLB em contextos onde não residem pessoas luteranas (projetos da Missão Zero no sertão nordestino). Assim como há projetos com um viés diaconal, normalmente em áreas periféricas, onde pessoas são acompanhadas em sua luta por dignidade. Martini entende que “toda ação em nome do evangelho tem uma dimensão diaconal, considerando que diaconia é o serviço solidário que brota da ação de Deus”. Há na IECLB projetos missionários junto a grupos em periferias urbanas, onde pessoas vivem em extrema pobreza ou em meio à violência. “Obviamente, ali o projeto terá um viés diaconal mais expressivo”, observa o assessor teológico.

Para ajudar a compreender e a executar essa missão na prática, existe um instrumento na IECLB: o Plano de Ação Missionária (PAMI). Nesse plano, as ênfases são a formação, a sustentabilidade e a comunicação, conforme o assessor teológico. E falando em prioridade, há mais de duas décadas a missão urbana tem sido identificada como prioridade. Mesmo fortemente marcada como igreja de área rural por um bom tempo, na última década ficou claro “o quanto o povo da IECLB está nos centros urbanos e o quanto as características do mundo urbano também alcançaram as comunidades rurais”, constata Martini.

Arquivo Pessoal missão implica, de modo muito especial, ultrapassar FroNteiras geográFicas, culturais, sociais, étNicas etc. a missão de deus Não coNhece FroNteiras.

romeu martiNi

pai da missão e, por eXteNsão, do pami é o próprio deus, que atraVés do espÍrito saNto iNcumbe as comuNidades com a tareFa missioNária.

huberto Kirchheim

Quanto ao Pami, atribui-se ao pastor Kirchheim ser o “pai do Pami”. Mas ele próprio não se considera. Entende isso como expressão de cunho popular, até carinhosa. “Pai da missão e, por extensão, do Pami é o próprio Deus, que através do Espírito Santo incumbe as comunidades com a tarefa missionária”, frisa o pastor emérito. Junto com muitas pessoas “pude ser, pela graça divina, instrumento, animador e motivador do Pami”, acrescenta.

orientaçÃo – O Pami é resultado de um verdadeiro mutirão, segundo Kirchheim. Ele teve o seu momento expressivo na realização do fórum sobre missão em 2000 em Rodeio 12 (SC). Nascia ali a concepção básica do plano sob o título “Recriar e criar comunidade juntos”. “Já que a missão é de Deus, que a confia à comunidade, ela precisa ser reformada e recriada constantemente com o objetivo de reconhecer e assumir a sua dignidade e responsabilidade em seu contexto social, cultural e eclesiástico”, afirma Kirchheim. Para o pastor emérito, “as ideias e os critérios do Pami se expressam no slogan Nenhuma comunidade sem missão. Nenhuma missão sem comunidade”.

Foi no concílio da IECLB em Chapada dos Guimarães (MT), em outubro de 2000, que o projeto do Pami foi aprovado como documento orientador da IECLB. Ele correspondia aos anseios e às expectativas das lideranças comunitárias, que “há muito sentiam falta de uma proposta missionária”, lembra Kirchheim. E se tinha muito clara “a necessidade de retomar o tema missão de uma forma intensa e programática nesses novos tempos”. Como primeiros frutos da concretização do Pami, Kirchheim cita com orgulho que em muitos sínodos já existe um grupo permanente de missão e em quase todos os sínodos, bem como em algumas paróquias, foi elaborado um plano missionário estratégico.

Hoje, o pastor Kirchheim sente alegria e esperança com a retomada da missão através do Pami. Por outro lado, sente-se frustrado com a demora em retomar esse plano. “Perdeu-se tempo precioso”, entende. Ele finaliza: “Igreja de Jesus Cristo é missionária por excelência. Caso contrário, não é igreja cristã. Essa consciência, contudo, precisa receber novos impulsos em cada tempo e lugar. Missão, pois, precisa ser constantemente ensaiada, vivenciada, aprendida. Faz parte do ser igreja”. N

a missão é a razão de ser da igreJa. Não obstaNte, é quase impossÍVel dizer o que ela é. cada geração de cristãos precisa redeFiNir o que eNteNde por missão.

roberto zWetsch

RUI BENDER é jornalista em São Leopoldo (RS)

Arquivo Faculdades EST

PAMI qualifica PAMI qualifica missão na missão na IECLB IECLB

mauro schWalm: o pami é um passo a passo metodológico com um roteiro sobre como implementar o planejamento de missão

por Carine Fernandes

As transformações ocorridas nas últimas décadas têm exigido da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) reflexão sobre a sua atuação e adaptação a novas realidades. O trabalho, antes desenvolvido fortemente em comunidades de interior, foi se expandindo também para áreas urbanas. Migração e urbanização intensificaram a presença da IECLB nesse contexto, colocando-a diante de diferentes desafios. “Precisamos continuar nos exercitando no aprendizado de ser igreja nas cidades. O ritmo urbano é diferente. Mudam o estilo do trabalho bem como o do lazer. Além disso, o receio diante da violência urbana faz com que as pessoas se recolham. Então, como motivá-las a sair ou deixar de lado outras atividades, ou mesmo seu descanso, para vivenciar a sua fé em comunidade? É preciso adaptar-se e exercitar a criatividade constantemente”, acredita o pastor Mauro Schwalm, secretário de Missão da IECLB. Para ele, a realização bem-sucedida desse trabalho depende de lideranças preparadas, pois reunir comunidade em metrópoles exige um exercício diferenciado de linguagem e metodologia.

Para auxiliar as comunidades da IECLB a lidar com esses e outros desafios, a compreender melhor o cenário em que atuam e a perceber por onde devem caminhar, a igreja desenvolve o Plano de Ação Missionária (PAMI) desde o ano de 2000. “É um instrumento que ajuda as comunidades a se autoanalisar. No momento em que aprendemos a nos conhecer, no horizonte de nossos contextos de inserção, damos qualidade a nossas ações”, considera o pastor. À frente da Secretaria de Missão, que foi reativada no ano passado, uma das atribuições de Mauro consiste em acompanhar o processo de execução do PAMI.

O secretário de missão faz questão de salientar que o PAMI não quer induzir a um planejamento unilateralmente centrado em resultados. “Ele tem também um olhar de espiritualidade, baseado no olhar amoroso de Deus, de perceber o contexto, de estudar o caminho a ser percorrido para cumprir a tarefa de levar o evangelho às pessoas. Para agir com mais qualidade, é preciso planejar ações, executar e avaliar as mesmas para ver se o caminho percorrido é o correto”, acredita.

O texto-base do Plano teve sua primeira versão no período de 2000 a 2007 e, atualmente, está na sua segunda versão, a qual se estende entre 2008 a 2012. Do primeiro documento para o segundo, o PAMI procurou adotar uma visão mais realista das possibilidades da igreja. Uma das metas da primeira edição,

por exemplo, centrava-se muito no aumento numérico de membros e comunidades. Para o pastor Mauro, isso não ocorrerá por decreto ou força de um texto: “Essa possibilidade está vinculada à capacidade de comunidades traduzirem a mensagem missionária no seu contexto e olharem para além dos seus muros, abrir-se para o seu entorno, cativando pessoas. As pessoas deveriam poder perceber onde estão as comunidades da IECLB e que é bom ser membro da IECLB”.

Outra mudança da nova versão do PAMI foi a inclusão de três eixos transversais: educação cristã, sustentabilidade e comunicação. Além disso, foi oferecido um programa de qualificação e orientação sobre como articular o PAMI na prática. “Trabalha-se com base num passo a passo metodológico com um roteiro sobre como implementar o planejamento. Um grupo de assessores foi criado, e os mesmos visitaram sínodos auxiliando na implementação do planejamento, oferecendo suporte e capacitando lideranças para executar o mesmo”, explica o secretário de Missão. A segunda versão também estimula a reflexão acerca das boas iniciativas: não se trata apenas de olhar para o que precisa ser mudado; trata-se também de fortificar o que de bom vem sendo feito nas comunidades.

Na avaliação do pastor Mauro, o PAMI desencadeou uma dinâmica significativa na vida da igreja. “Mas esse é um trabalho contínuo, que não se encerra em 2012. Bem pelo contrário! Quando se planeja, é preciso avaliar para então planejar novamente. 2012 será um ano decisivo para o PAMI, já que o plano será tema central no Concílio da Igreja. Ajudará a olharmos onde chegamos e como continuar”, acredita. N

Ser igreja na cidade

por Edson Edilio Streck

Pregar a palavra de Deus e torná-la concreta em ações é mandamento que vem de Deus em todos os tempos e lugares. Deus confia, portanto, essa missão também a cristãos neste início de século e que residem em contexto urbano.

Há muitos relatos na Bíblia que nos ajudam a compreender e realizar essa tarefa. Jonas, por exemplo, é enviado para a grande cidade de Nínive. Fez o que pôde para fugir desse desafio, mas Deus não desistiu de seu intento. Por mais que fujamos, assim como Jonas, Deus não desiste de nos

metrópole: o templo em meio à cidade como um desafio missionário

Debora Ludwig

enviar para as grandes cidades. Jesus chamou, capacitou e enviou discípulos para que, em casas, vilas e cidades, anunciassem que o reino de Deus chegou. O apóstolo Paulo foi mestre em termos de missão e deixou-nos lições impressionantes para o ser igreja em contexto urbano.

Na história recente de nossa igreja, há vários momentos em que esse tema retorna. Missão urbana não é algo novo. Novas são determinadas abordagens. Novos são compromissos que comunidades e sínodos colocam como prioridade na definição de suas ações estratégicas.

Esse é o caso do Sínodo Rio dos Sinos. A maior parte de suas comunidades está localizada em contexto urbano. Esse fato levou a Assembleia Sinodal, em agosto de 2011, a definir o tema “Missão Urbana” como a prioridade que deve perpassar toda a ação missionária das comunidades localizadas nesse sínodo nos próximos anos.

Algumas questões motivaram essa decisão. Como vivem hoje as pessoas num contexto urbano? Como vivemos nós em um mundo globalizado, na era da pós-modernidade ou da hipermodernidade? Como nós nos organizamos hoje em nossa vida pessoal, familiar, comunitária, em sociedade?

Considerando essa realidade, entendemos que é necessário elaborar uma pastoral (ação da igreja) a partir de modelos existentes, enriquecida com novas propostas de ação.

Para tal, precisamos considerar as características da pós-modernidade, época que se caracteriza por profundas mudanças e pela velocidade com que essas transformam a vida de pessoas e da sociedade. Por um lado, o ser humano nunca produziu tanto conhecimento. As informações estão disponíveis com incrível rapidez. Por

Divulgação Novolhar

o apóstolo paulo Foi mestre em termos de missão e deiXou-Nos lições impressioNaNtes para o ser igreJa em coNteXto urbaNo.

edsoN strecK

detrimento do passado e do futuro. Esses aspectos determinam também as relações interpessoais. O ser humano, por mais que se comunique, convive com a solidão, o medo e a ansiedade e sente falta de perspectivas para planos a médio e longo prazos. As pessoas anseiam por algo seguro. A espiritualidade está em alta. Como as instituições tradicionais estão em baixa, as pessoas buscam suprir essa necessidade em outros lugares. O mercado religioso apresenta múltiplas ofertas. Cada pessoa escolhe a oferta que mais se adapta à necessidade do momento. Descarta-se, também em termos de espiritualidade, o que não serve mais. Quando o atendimento não satisfaz, simplesmente muda-se de igreja. Veem-se exemplos de espiritualidade individualizada, que não promovem a vida comunitária. Percebemos que, nesse momento e contexto, a igreja deve repensar sua forma de ir ao encontro das pessoas e promover vida em comunidade. Visando preparar-se para esse desafio, o Sínodo Rio dos Sinos, em parceria com a Faculdades EST, ofereceu em 2012 um Curso de Extensão sobre “Missão Urbana”, destinado a todos outro lado, segundo Leonardo Boff, a os ministros, ministras e líderes de sociedade está criando, “contradito- comunidades. Outra decisão tomada riamente, cada vez mais incomunica- pelo Conselho Sinodal é a elaboração ção e solidão entre as pessoas”. de um projeto de “Pastoral da Conso-

A crise que atualmente atinge lação”, que tem por objetivo colocar várias instituições também chegou à pessoas, em nome de Cristo, ao lado igreja. Há alguns anos, ela tinha uma de enfermos e seus familiares, que palavra decisiva em relação a temas buscam atendimento em hospitais candentes. Hoje, a igreja encontra- localizados em nosso contexto urbase em um espaço periférico. Quem no. Curar doentes é uma das ações e quantos ainda se importam com a prioritárias que Jesus estabelece a opinião da igreja? Reconhecer esse seus seguidores. Como essa não seria fato leva a igreja a buscar novas formas prioridade em nossa ação, no conde trazer seu testemunho. texto e no momento em que Deus

Uma série de aspectos marca nossa nos coloca? N forma de viver: a transitoriedade, a cultura do supérfluo e do descartável, o predomínio do presente em EDSON EDILIO STRECK é pastor sinodal do Sínodo Rio dos Sinos em São Leopoldo (RS)

Missão faz a igreja crescer

por Geraldo Schach

a igreJa deVe apostar No seNso de respoNsabilidade dos membros, coNFiaNdo a eles a tareFa de participar também No plaNeJameNto das metas, das atiVidades comuNitárias, da elaboração e da eXecução de um orçameNto que priVilegia a tareFa missioNária da igreJa.

geraldo schach Ocrescimento de uma comunidade não se mede pelo número de membros que a compõem. Aliás, nem é preciso medir. Basta ser comunidade que se espelha no Cristo que veio, não para ser servido mas para servir. Onde impera o amor de Deus, ali o amor ao próximo é consequência. A felicidade das pessoas é fruto da gratidão pelas dádivas de Deus. Logo, o segredo da missão é a gratidão.

Muito além de orações piedosas e de belas palavras de efeito emocional, a gratidão manifesta-se nas mãos calejadas, no suor do rosto, nas lágrimas, na solidariedade e no brilho do olhar, na partilha e na comunhão. Onde Cristo é o Senhor, ali a graça de Deus transforma o nosso jeito de olhar o mundo e as pessoas. Repartir alegria e dor é próprio de quem descobriu que a verdadeira felicidade é dádiva do Deus que transforma vidas.

A igreja luterana tem uma excelente teoria e visão missionárias, mas a prática comunitária nem sempre é coerente com o evangelho, o que fere a credibilidade e gera desmotivação. Repetindo o velho chavão “ninguém quer assumir cargos na igreja”, estamos desestimulando o engajamento de novas lideranças e, ao mesmo tempo, ajudamos “os mesmos de sempre a se perpetuar no poder” por meio de sucessivas reeleições. E reclamamos da ausência dos jovens na igreja. >>

Coragem para praticar escolhas democráticas de lideranças ajudará a desobstruir os canais (regulamentos, costumes, tradições) que engessam a missão em nossa igreja. Confiar nos fará compartilhar e descentralizar. E descobriremos que, na verdade, os que nada querem sabem fazer até melhor do que nós. Crescer pela missão exige respeitar os espaços dos demais.

Também a prática da contribuição obrigatória, com valores fixados para os membros, contradiz e dificulta a vivência evangélica do “levar as cargas uns dos outros” (Gálatas 6.2). Respeitar e valorizar as pessoas em sua realidade existencial evitará sua debandada para outras denominações, em que se sentirão bem acolhidas. Por que não apostar no senso de responsabilidade dos membros, confiando a eles a tarefa de participar também no planejamento das metas, das atividades comunitárias, da elaboração e da execução de um orçamento que privilegia a tarefa missionária da igreja?

A exemplo da contribuição voluntária, também as ofertas dos cultos, trazidas ao altar, tornam-se instrumento missionário na medida em que são consagradas em oração para a obra do reino de Deus. Ofertar com alegria é tudo o que as pessoas querem, mas é preciso criar um ambiente acolhedor, que respeite o espaço onde elas se sintam motivadas e à vontade para fazê-lo.

Ao invés de esperar as pessoas na porta, a igreja vai ao encontro delas ali onde elas vivem e trabalham. O corpo a corpo é a mais eficiente forma de missão e de comunicação. Em Itapema (SC), os luteranos estão organizados em grupos de famílias conforme a localização geográfica e reúnem-se nas casas, juntamente com amigos e vizinhos, também os de outras confissões religiosas, muitos dos quais, espontaneamente, cedo ou tarde, acabam integrando a vida da comunidade luterana.

Nesses encontros, com ou sem a participação do pastor, as pessoas compartilham alegrias e preocupações, debatem temas da atualidade, oram, cantam e estudam a Bíblia. O coordenador de cada grupo de famílias tem assento nas reuniões mensais do presbitério, favorecendo assim a comunicação, a integração e a dinâmica da vida comunitária. Em consequência, as pessoas engajam-se nos trabalhos de diaconia, liturgia, comunicação, visitação, organização de retiros, celebração de eventos etc. A participação nos cultos triplicou, e a resposta em forma de contribuições, ofertas e campanhas de solidariedade supera todas as expectativas.

Comunidade que cresce pela missão aprende a unir forças no engajamento ecumênico com outras igrejas. Da mesma forma, investe e usa os diferentes meios de comunicação como rádio, TV, internet, telefone, boletins informativos, avisos, murais, cartazes, outdoors e outros.

Comunidade satisfeita consigo mesma é comunidade desconectada, e comunidade desconectada não passa de uma mera agência de prestação de serviços religiosos.

As comunidades no litoral do Sínodo Vale do Itajaí, em fidelidade ao Senhor da igreja, juntam forças e coragem para combater o legalismo, a soberba, a luta pelo poder e a projeção pessoal. Ao mesmo tempo, movidas por gratidão, testemunham a fé com alegria, ensaiando o acolhimento, a solidariedade e a comunhão. São comunidades aprendizes, sempre em missão.

N

Sonho no sertão

por Airton Härter Palm e Marcos A. Rodrigues

Osertão nordestino é uma das regiões mais pobres do Brasil. A falta de água, a má política dos governantes, a ineficiência na educação, saúde e emprego fazem dessa uma região muito carente. Espiritualmente, a perspectiva é a mesma, pois 95% das pessoas praticam o chamado “catolicismo popular”. As pessoas adoram e fazem procissões a Maria, em suas muitas “facetas”, ao Padre Cícero, ao Frei Damião e outros.

É nesse contexto que, em 2001, a Missão Zero realizou o primeiro projeto missionário luterano no sertão nordestino. Pessoas de várias partes do Brasil ficaram alojadas em uma escola na cidade de Araripina (PE) durante cerca de 30 dias, faszendo visitas

crato: o projeto sítio modelo ajuda famílias necessitadas

Arquivo Missão Zero/IECLB

Sonho no sertão

de casa em casa, apresentando-lhes o evangelho do Senhor Jesus Cristo e levando-as a um compromisso pessoal com ele (Romanos 10.9-10). Além disso, fez-se o convite para cultos diários em uma praça da cidade, em que havia música (louvor), teatro, coreografia, pregação da Palavra, chamado a um compromisso com Jesus e trabalho com crianças.

Foi realizada uma programação especial para crianças e atendimento na área de saúde, direito etc. Ao final do período, com as pessoas que assumiram um compromisso e com outras que se interessaram, começou a nova comunidade luterana. Essa experiência repete-se ano após ano. Hoje existem onze comunidades em Araripina (PE), Crato – bairros Seminário e Muriti (CE), Juazeiro do Norte (CE), Barbalha – Sítio Lagoa (CE), Teresina – bairros São João e Planalto Uruguai (PI), Ouricuri (PE), José de Freitas (PI), Petrolina (PE) e Juazeiro (BA), além de cinco pontos de pregação. Ao todo, são em torno de 450 membros atuantes nas comunidades da Área Missionária Luterana no Sertão Nordestino.

Arquivo Missão Zero/IECLB

missÃo zero: uma ieclb com feições nordestinas brota no sertão e nas capitais do Nordeste

da zona rural do sertão nordestino no plantio de hortaliças

Somos Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, uma igreja de nordestinos. Com a alegria, a espontaneidade, o sentimento “à flor da pele” e o acolhimento típico do povo dessa terra, procuramos celebrar e vivenciar a vida de fé de uma forma contextualizada, de modo que os irmãos da igreja luterana no sertão nordestino sintam a alegria de fazer parte da grande Igreja de Jesus Cristo. E essa alegria contagia outros para se juntar a essa família.

A vontade de Jesus é que as pessoas experimentem “vida em abundância” (João 10.10b). Quando o evangelho do amor de Deus encontra as pessoas necessitadas, surge a diakonia (serviço). O envolvimento com as pessoas dessa região em suas lutas e dificuldades faz brotar o anseio por auxiliá-las na busca por melhores condições de vida.

Projetos missionários e diaconais ajudam a pintar um novo quadro de vida para muitas crianças, jovens, mulheres e homens sertanejos. O projeto Vida Plena atende cerca de sessenta >>

diaconia: música é instrumento de mudança de vida e de perspectivas para crianças e jovens

Arquivo Missão Zero/IECLB

crianças carentes da Vila Bringel em Araripina (PE), oferecendo reforço escolar, iniciação musical e ensino cristão. O projeto Sítio Modelo ajuda famílias da zona rural no plantio de hortaliças. Material para irrigação por gotejamento, sementes e o suporte técnico são oferecidos aos produtores para um plantio agroecológico. Já são mais de dez famílias beneficiadas, que dobraram sua renda mensal. O projeto Pão da Vida, padaria-escola, oferece ferramentas para que pessoas aprendam a produzir e comercializar os produtos, melhorando a renda.

A Região Missionária Luterana Nordeste e Belém reúne os esforços missionários da IECLB num grande pedaço do Brasil. A metade norte do Pará, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí e Maranhão compõem essa vasta e bela região, de muita diversidade cultural, social, econômica e religiosa.

Belém do Pará é uma comunidade urbana de periferia com feições indígenas, culturalmente identificada com as tradições amazônicas, e de diversidade ecumênica, ponto de encontro do movimento inter-religioso. Grupos folclóricos e culturais, a música, a arte e a dança enriquecem a vida litúrgica da comunidade.

A comunidade em São Luís foi desejada há sete anos por maranhenses que descobriram a IECLB através da internet. Hoje a comunidade tem 35 membros efetivos e dois projetos que atendem crianças e jovens. Música é instrumento de mudança de vida e de perspectivas para 45 crianças e jovens que se integram ao projeto. Além de aprenderem um instrumento e cantarem nos corais, são integradas à comunidade através de encontros bíblicos e de jovens. A cara da IECLB em São Luís é jovem, negra, índia e branca, a cara do Brasil.

No Piauí, a Missão Zero iniciou comunidade em José de Freitas com um projeto de impacto. Agora a comunidade se empenha para construir seu templo. O trabalho da comunidade em Recife vive um processo de reestruturação, buscando aproveitar seu potencial de influência nas capitais do Nordeste para expandir a presença da IECLB.

As comunidades em Gravatá (PE), na região serrana, e Caruaru, no agreste, têm intensa presença jovem e trabalho diacônico voltado a adolescentes e jovens.

Em Fortaleza (CE), o Projeto Casa Aberta abre as portas e o coração da comunidade para crianças, adolescentes e jovens empobrecidos, oferecendo um espaço seguro para brincar, refletir e buscar a superação de suas realidades através da arte, dança, música e expressões culturais como a capoeira. O caminho escolhido foi a presença diacônica através do trabalho com crianças, adolescentes e jovens.

Diversidades e diferenças são o pão nosso de cada dia, nosso trabalho e alegria. Elas enriquecem o sabor da vida na IECLB e abrem nosso paladar para experimentar novos costumes, possibilidades, enfim, crescer na diversidade desse Deus todo-amoroso que nos convida para viver apaixonadamente a sua missão. N

AIRTON HÄRTER PALM é diretor executivo do Movimento Encontrão em Curitiba (PR) MARCOS A. RODRIGUES é teólogo e ministro da IECLB em Fortaleza (CE)

pÃo da Vida: padaria-escola oferece ferramentas para produzir e comercializar os produtos

Arquivo Missão Zero/IECLB

Voluntariado: a diaconia destaca o envolvimento voluntário na visitação hospitalar

Ação diaconal

por Valmi Ione Becker, Davi Haese e Mayke Marliese Kegel

ODepartamento de Diaconia do Sínodo Norte Catarinense tornou-se Campo de Atividade Ministerial (CAM) em 2009. Uma vez contratada e instalada, a ministra eclesiástica foi ouvir o voluntariado engajado no serviço cristão das comunidades. Centrou sua atenção nos quatro pilares de trabalhos diaconais que movem a missão do Departamento de Diaconia do Sínodo: pessoas com deficiência e seus familiares; visitação domiciliar e hospitalar; cuidado dos cuidadores e cursos sobre acompanhamento a doentes terminais e familiares.

O sucesso de qualquer trabalho depende da capacitação do voluntariado. Cabe lembrar a visitadora que foi ao encontro de uma família afastada da comunidade por causa de ofensa pública num culto. No primeiro encontro, a visitadora limitou-se a ouvir os porquês do afastamento, as mágoas e as saudades dos bons tempos de convívio comunitário. Na segunda visita, a referida família já demonstrava interesse em voltar a participar da igreja. Ora, essa reação foi fruto da boa visita protagonizada.

Há mais exemplos de missão como ação diaconal no Sínodo Norte Catarinense. Esse trabalho faz a diferença; desenvolve esperança, dignidade e vontade de servir ao próximo. A diaconia e a missão são os dois eixos do Plano de Ação Missionária da IECLB (PAMI), que caminham de mãos dadas tanto para dentro como para fora das comunidades.

Davi Haese é diácono e atua na Comunidade de Riacho do Mel – CAIC em Gravatá (PE). Já passou por experiências difíceis nesse trabalho. Aqui e ali, sentiu-se tentado a desistir e a voltar à zona de conforto. Foi preciso resistir, prestar mais atenção a seu ministério para não sucumbir.

Viveu situações extremas: assassinatos à queima-roupa; consumo e tráfico de drogas entre crianças e adolescentes; jovens baleados morrendo no colo da própria mãe; esposas esfaqueando o próprio companheiro; nascimento de bebês a caminho do hospital, enfim, situações que o fizeram mais forte na luta pela justiça.

O compromisso da Ação Diaconal resultou na germinação de bom fruto. A comunidade luterana nordestina e a ONG “Pró Ludus O Caminho” (Associação Luterana Pró Desenvolvimento e Universalização dos Direitos Sociais) crescem e se fortalecem. Ambas as instituições desenvolvem atividades prioritárias no atendimento a crianças, adolescentes, jovens e suas famílias em situação de risco pessoal e social a partir da “brinquedoteca”.

O resgate da cidadania das pessoas, da transformação da realidade ameaçada pela morte em espaço digno para viver, da autoestima e do compromisso para os diferentes serviços já se mostra. É a vida coletiva sendo >>

integral: espiritualidade e apoio de toda ordem estão entre as atribuições diacônicas

Arquivo Diaconia

sustentada pelo testemunho, pela audácia e pela coragem da fé em Deus e pela vontade incansável de anunciar o evangelho da vida e denunciar as injustiças no mundo.

A Comunidade Evangélica de Joinville (CEJ) desenvolve ações diaconais direcionadas a todas as pessoas. Auxílios de materiais básicos em momentos de catástrofe foram e ainda são recolhidos para reenvio em mutirões. No passado, as mulheres da Ordem Auxiliadora de Senhoras Evangélicas (OASE) tiveram a preocupação de cuidar da saúde. Desse olhar surgiu o Hospital Dona Helena. Não se resumiu apenas a isso. Hoje também se olha para os pequeninos de Jesus.

A CEJ, através do Departamento de Assistência Social – Diaconia, desenvolve ações que tentam exercitar o cuidado amoroso de Jesus por sua criação com atendimento às famílias que necessitam de coisas básicas (alimento, roupa, documentos, medicação, escola); que têm pessoas com deficiência e buscam entender-se como imagem e semelhança de Deus; que enfrentam o mundo da dependência química e das diversas compulsões (jogo, compras etc.); que não têm o que vestir nos seus bebês; que precisam deixar suas crianças desprotegidas no contraturno da escola; cujos membros estejam vivendo a terminalidade de sua vida.

Trata-se de uma ação de amor movida pela fé em Jesus Cristo. Nosso Batismo leva-nos a fazer missão em ações diaconais internas e externas de nossa comunidade. Sim, a diaconia é fé em ação, missão de todos nós, filhas e filhos de Deus. N

VALMI IONE BECKER e DAVI HAESE são diáconos da IECLB em Joinville (SC) e Gravatá (PE), e MAYKE MARLIESE KEGEL é teóloga e ministra da IECLB em Joinville (SC)

Arquivo Pessoal

Resgate da fé simples

por Suzel Tunes

Mais uma “Marcha para Jesus”. Ruas lotadas de gente cantando e dançando ao som da música gospel que sai do carro de som, tão estridente que quase encobre os “glórias” e “aleluias” que se multiplicam. Ao microfone, alguém “toma posse” da cidade e “profetiza” que, agora sim, ela é de Jesus... Está tudo dominado! Ou quase...

fim do shoW: eles querem levar o evangelho a todos, mas não acreditam que megaeventos como marchas e espetáculos de música gospel sejam meios de evangelização

No meio da multidão, um pequeno grupo de pessoas surge empunhando uma faixa com os dizeres “Voltemos ao evangelho puro e simples. O show tem que parar”. A frase não deixa dúvidas: os manifestantes também são evangélicos. Eles também querem levar o evangelho a todas as cidades, “até os confins da Terra”, como apregoou Jesus. Só não acreditam que megaeventos como marchas e shows gospel sejam meios de evangelização.

“Esses eventos são marcados por valores distantes das essências do cristianismo. Por exemplo, a ‘Marcha para Jesus’ tem boa música para dançar, gritos de guerra para extravasar, moços e moças para paquerar, porém a dinâmica do movimento é conduzida com uma perspectiva de entretenimento, de diversão. Há pouca maturidade, pouco crescimento. Essa multidão faz parte de um grande jogo de interesses, que vão do lucro ao voto e ao poder político”, dispara o pastor Paulo Siqueira.

Bacharel em Teologia pela Universidade Metodista, o pastor Paulo é pentecostal, membro da Igreja do Evangelho Quadrangular, mas considera que o chamado “neopentecostalismo”, que tem prevalecido nos meios de comunicação e patrocinado manifestações de massa, está se distanciando da experiência de fé que deu origem ao movimento pentecostal.

“A igreja pentecostal nasceu com o único propósito de estender o evangelho a todo o mundo. Esse foi o propósito de muitas denominações, até aproximadamente a década de 1990, mas algo surpreendente aconteceu: quanto mais a igreja cresce em número de membros, de poder midiático e político, mais ela abandona sua missão, sua tradição e sua identidade”, critica o pastor.

Ele avalia que hoje a igreja sofre as influências do “capitalismo moderno”. “Uma igreja grande é uma possibilidade de votos, de consumo, e isso no mundo corporativo tem grande valor. As essências do verdadeiro evangelismo vão se perdendo, pois uma igreja cresce para que responda aos anseios de lucro pelos acionistas, no caso seus líderes”, afirma.

Para resgatar as essências do “verdadeiro evangelismo”, Paulo Siqueira e a esposa Vera têm contado com a ajuda da internet. Os dois são autores de blogs nos quais discutem a religiosidade brasileira e estimulam ações de “responsabilidade social”, como a doação de sangue. “Não posso chamar uma organização cristã de igreja se essa não atende aos anseios dos que sofrem e não promove a vida e a justiça”, diz o pastor.

Para o teólogo Ricardo Gondim, pastor da Igreja Betesda e autor do livro “Missão Integral – em busca de uma identidade evangélica”, não se pode fazer distinção entre missão (que muitos entendem como “ação social”) e evangelização. “Missão e evangelização são uma coisa só. A evangelização tem que ser diaconal”, afirma Gondim.

Ele explica que o mundo evangélico ainda pensa como os gregos, que enxergavam espírito, alma e corpo como entidades distintas. Por isso fala tanto em “salvar almas”. “Precisamos retomar a visão semítica, a visão de Jesus, que via o ser humano de forma completa, salvando a vida na sua integralidade, dentro de seu contexto social, histórico e econômico”, diz ele.

Ter a visão de Jesus também implica olhar para o próximo com amor e humildade, lembra o teólogo. Hoje – diz ele –, a igreja evangélica olha para “um mundo que jaz no maligno”, sentindo-se superior. A “teologia da queda”, diz Gondim, faz com que o evangélico veja seu próximo como um ser caído, destituído da graça de Deus. Essa visão impede o diálogo e isola o evangélico num sentimento de superioridade.

les querem levar o evangelho a todos, mas não acreditam que megaeventos como marchas e espetáculos de música gospel sejam meios de evangelização

Arquivo Pessoal

Para fazer missão, é preciso repensar esses pressupostos teológicos, alerta Gondim. Ver no próximo a imago Dei, imagem de Deus, é o primeiro passo. Foi o que o apóstolo Pedro aprendeu a fazer no episódio relatado no capítulo 10 do livro de Atos dos Apóstolos, lembra Gondim. Liberto de seus preconceitos, Pedro conseguiu enxergar o centurião Cornélio como um irmão e compartilhar com ele o “evangelho da paz”. E o Espírito Santo derramou-se sobre todos os que ouviam a palavra.

SUZEL TUNES é jornalista em São Paulo (SP)

Ver No próXimo a imago Dei, imagem de deus, é o primeiro passo para a missão. Foi o que o apóstolo pedro apreNdeu No seu eNcoNtro com corNélio. ricardo goNdim N Numa visita à Comunidade Teológica Evangélica do Chile, na qualidade de consultora em educação teológica e representante na América do Sul da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos (PCUSA), o moderador da Iglesia Evangélica Presbiteriana en Chile disse: “A melhor maneira de vocês nos auxiliarem é facilitando a publicação de nossos livros”. Depois visitei a Faculdades EST e a Editora Sinodal, em São Leopoldo (RS), e fiquei maravilhada com a alta qualidade de seus projetos. Um sonho da PCUSA era a publicação da Série Parceria na Missão de Deus em português e espanhol para enriquecer a missiologia contemporânea latino-americana. Esse projeto conjunto foi proposto à Editora Sinodal, devido à sua excelência em publicações sérias e ao nosso desejo de expandir nossas parcerias com uma igreja luterana, e ao Conselho Latino-Americano de Igrejas (CLAI), nosso parceiro com experiência editorial. Numa reunião em Quito, Equador, em 2005, a Editora Sinodal e o CLAI aceitaram nossa proposta; juntos elaboramos o projeto e decidimos os primeiros títulos. Convidamos a Aliança de Igrejas Presbiterianas e Reformadas da América Latina (AIPRAL) para nos assessorar.

Parceria na missão por Sherron K. George Nos primeiros anos, todos os livros foram publicados em São Leopoldo. Agora, o CLAI está coordenando a publicação dos livros em espanhol. Todos os parceiros procuram novos originais ou livros a serem traduzidos de um idioma para outro e leem e avaliam as propostas recebidas. Já há sete títulos em português e sete em espanhol. Com as vendas e a boa administração, a semente-doação inicial tem se multiplicado. O projeto era para cinco anos, mas seu êxito leva-nos a estendê-lo por tempo indeterminado.

A área em que se publicam livros é a missiologia, na qual há carência de conceitos claros, de fundamentação bíblico-teológica e de perspectiva ecumênica. Entendemos que a missão é de Deus e que as diversas igrejas e outras agências participam juntas nela. A missão abrange três dimensões básicas: evangelização, acolhida e discipulado, visando ao crescimento e à maturidade de igrejas; diaconia compassiva, visando à dignidade do ser humano e ao atendimento de toda uma gama de necessidades humanas; ação social/profética, visando à paz, à justiça e ao cuidado com a criação na construção de sociedades que sinalizam o reino de Deus. Muitos títulos ficam dentro de uma dessas dimensões. Outros procuram uma visão integradora e focalizam a cooperação ecumênica.

Os objetivos da Série Parceria na Missão de Deus são:

Publicar livros latino-americanos na área de missão em português e espanhol rumo a uma missiologia latino-americana;

Descobrir novos autores e autoras de diversas igrejas e países na América Latina e no Caribe;

Contribuir para a formação missiológica de pastores, pastoras, líderes comunitários, professores, professoras e estudantes de teologia para que motivem e equipem suas igrejas para participar mais efetivamente da missão local, regional, nacional e global no Brasil, em toda a América Latina e no mundo;

Modelar parceria entre Editora Sinodal, CLAI, AIPRAL, PCUSA e outras igrejas e coeditoras em todo o processo; divulgar e distribuir os livros em toda a América Latina e Caribe e em outros países. N ricardo goNdim

Outra espiritualidade possível

Como a cigarra que só deixou uma casca, chegou a hora de algumas instituições religiosas se verem mero registro histórico de boas intenções. E deixem suas suntuosas catedrais como recordação da religião imponente, guerreira, voluntariosa, que um dia foram.

Passou o tempo da religião especializada em doutrinar. Ficou para trás o sistema obcecado por pensamentos lineares; intransigente nas leituras literais; inflexível nos pressupostos. O projeto de incutir salvação como anuência acabou. Aprender o catecismo para ser considerado um discípulo mostrou-se incapaz de promover um bem social. A religião que privilegiou o individualismo se esvaziou. O bem coletivo nasce do diálogo, da abertura para o diferente, nunca de decorebas. Para ressurgir, o movimento, que se pretendia evangélico, deve abandonar sua casca dogmática e legalista – que teve pertinência, mas hoje exige a alma de muitos.

No desmonte desse esqueleto religioso, é preciso denunciar também o eleicionismo teológico. Nada mais patético do que considerarse preferido entre bilhões. Saber-se eleito significa acreditar que, em alguma época passada, numa eternidade remotíssima, Deus distinguiu alguns e preteriu a maioria. Indica afirmar que os benefícios divinos foram seletivamente distribuídos – sem que se saiba por quais critérios. Essa convicção só pode gerar uma segurança ilusória – que não só enche de empáfia, como ajuda a distanciar o punhado sortudo do drama que os demais sofrem. Vaidade espiritual vem daí.

Há de repensar-se a função do sacerdote. Não pode existir uma elite representante de Deus. Como aceitar que o acesso ao Divino seja complicado ao ponto de exigir burocratas? Peritos, especialistas em divindade, não passam de sicofantas – carreiristas, alpinistas amarrados ao sagrado.

Espiritualidade não se reduz à técnica; ela prescinde de traquejos. Um “Deus que funciona” não passa de um autômato. As relações com ele não dependem de se aprender o jeito de fazê-lo responder a estímulos corretos.

O clericalismo, detentor dos mistérios da divindade, abriu a porteira do estrelismo. E religião que reforça vedetismo, robustece o ego e desmerece a simplicidade não é digna de ser chamada “seguimento de Jesus”. Na mensagem do Nazareno, benignidade triunfa sobre teoria e a busca da justiça se concretiza em ações transformadoras.

Longe da mentalidade gerencial, outra espiritualidade florescerá nas fissuras das estradas de terra. Ali, na poeira do dia a dia, virtude desprezará gestos ocasionais para grudar na pele de pessoas comuns.

O percurso que separa o cristianismo da cristoformidade parece longo e difícil. Todavia, não vai demorar para os seguidores de Jesus aprenderem que “religião de verdade, que agrada a Deus, o Pai, é esta: cuidem dos necessitados e desamparados que sofrem e não entrem no esquema de corrupção do mundo” (Tiago 1.27).

Soli Deo Gloria

RICARDO GONDIM é teólogo. Fonte: www.ricardogondim.com.br

Preparado para o fim?

por Clovis Horst Lindner

Já começou. Um clima de expectativa em torno de mais um anúncio de fim do mundo está mexendo com as pessoas. Esotéricos de plantão afirmam que, segundo previsão maia, um evento catastrófico planetário deve ocorrer no final do ano. O deadline do apocalipse é o dia 21 de dezembro de 2012.

Esse tipo de previsão tem audiência garantida há milhares de anos e ainda hoje. O que, afinal, está por trás da previsão maia? O que ela tem a ver com o Apocalipse, um dos livros mais lidos da Bíblia e que tem dado origem a muitas interpretações e polêmicas? Qual é a mensagem do Apocalipse?

Os maias deixaram uma impressionante civilização, surgida entre 2.000 e 1.500 anos antes de Cristo, que mais tarde foi “absorvida” pelos astecas, ainda antes da chegada dos espanhóis. Essa civilização deixou um legado na América Central que intriga os pesquisadores até hoje.

Poucas civilizações deixaram registros tão significativos sobre astronomia, matemática e arquitetura. Seu calendário foi aperfeiçoado ao longo de 1.200 anos, com cálculos tão precisos e que eram capazes de relacionar os movimentos do Sol, de Vênus, da Lua e das constelações num mesmo calendário, ainda hoje usado nas comunidades de origem maia, provando que o fim dessa fascinante cultura indígena é um mito.

Com uma percepção cíclica do tempo – não linear, como a nossa –, os maias entendiam que os fatos se repetem de tempos em tempos, permitindo prever o futuro. Assim como as fases da lua e as estações do ano, também a história se repete num círculo virtuoso, permitindo prever chuva e estiagem, fartura e carestia, vigor e declínio civilizatório e a chegada de novos governantes. O calendário maia é dividido em eras de 5.125 anos, subdivididas em 13 baktunes de aproximadamente 400 anos.

Num registro encontrado no sítio arqueológico de Tortuguero-México consta a data “4 Ajaw 3 K’ank’in” (em nosso calendário, é o dia 21 de dezembro de 2012). É o fim de uma era de 13 baktunes, ao término da qual o deus Bolon Yokte retornaria para começar uma nova era.

Para quem tem percepção linear do tempo, isso é difícil de entender. O apocalipse encaixa-se bem em nossa visão porque o tempo corre em linha reta rumo a um final. Para os maias, o tempo anda em círculos. Quando uma era fecha a roda, começa outra. Não há espaço para o apocalipse.

Por muito tempo, essas inscrições foram um mistério. Hoje se sabe que são previsões com recomendações gerais para o povo, desde o nome e o destino de cada pessoa até questões sobre colheitas ou o clima. A visão cíclica do tempo e a observação cuidadosa dos acontecimentos permitiam antecipar-se à repetição no próximo ciclo, o que era parte fundamental do pensamento maia.

apocalipse – Nossas previsões de que o mundo vai acabar têm origem no medo do futuro e na perspectiva de um fim catastrófico, como castigo divino pelos desmandos da humanidade. Especialmente na época de Jesus, o apocalipsismo era muito popular. O livro do Apocalipse é apenas um dos muitos textos da época. Marcos 13, Mateus 24 e Lucas 21 são outros exemplos de textos apocalípticos no Novo Testamento. Isso é como lenha na fogueira das seitas e da criatividade dos estúdios de Hollywood. Mas não pode ser medida para a fé fundamentada em Jesus Cristo.

Embora seja um dos livros mais pesquisados e que mais despertam a curiosidade de todas as gerações de cristãos, o Apocalipse não apresenta

Shareyourwallpapere.com

preVisões de que o muNdo Vai acabar tÊm origem No medo do Futuro e Na perspectiVa de um Fim catastróFico como castigo diViNo pelos desmaNdos da humaNidade.

previsões que possam ser calculadas. Qual é, então, a mensagem do Apocalipse?

De certa maneira, há uma impressionante semelhança com a visão maia sobre o tempo. A data “4 Ajaw 3 K’ank’in” era a previsão da esperança imanente de que o deus Bolon Yokte voltaria. O Apocalipse conta como a esperança vê encerrar-se o tempo em que vivemos e indica um novo tempo, sob o reinado de Cristo, e essa é uma esperança transcendente.

Todo o resto, mesmo no Apocalipse de João, são especulação e efeitos especiais. É pirotecnia que ofusca a mensagem central de esperança cristã, de um tempo sem dor, sem morte, no aconchego revitalizador de Deus, que tudo criou e tudo renova. Em Cristo, esperamos por um novo tempo que encerra um período de sofrimentos e catástrofes, muitos deles provocados pela arrogância humana.

O Apocalipse não quer meter medo, mas nos desafia profeticamente. Colocar sinais da esperança que nos move é o motor que alimenta o nosso sonho mais remoto e mais bonito, abafando qualquer conversa atemorizante sobre um fim catastrófico e destrutivo. A esperança na parusia – a nova vinda – de Cristo anima-nos a colocar pequenas e reveladoras parusias diárias ao nosso redor, que antecipam um novo tempo repleto de paz e salvação. N

CLOVIS HORST LINDNER é teólogo e comunicador em Blumenau (SC)

Desejo de superação das mulheres

por Tania Ayma Calle

Eu sempre te ouvi, agora tu deves me escutar é o lema que antecedeu e deu origem a uma proposta de comunicação inovadora que o Centro de Educação e Comunicação para Comunidades e Povos Indígenas (CECOPI, sigla em espanhol) executou na cidade de El Alto e em algumas províncias de La Paz, capital da Bolívia.

A ideia nasceu em 2004 quando o CECOPI organizou seminários com mais de 300 mulheres aymaras no Distrito 8 da cidade de El Alto. Nesses espaços, debatia-se permanentemente a situação de marginalização e exclusão social em que se encontravam aquelas mulheres.

Nesse contexto surgiu a campanha “Eu sempre te ouvi, agora tu deves me escutar”, que busca fazer com que as mulheres sejam ouvidas. Depois, em 2007, a campanha traduziu-se no projeto de comunicação que, num primeiro momento, recebeu apoio da Associação Mundial para a Comunicação Cristã (WACC, sigla em inglês) e assim se pôde entrar em outros municípios.

A partir dessa trajetória, agora a Agência de Cooperação Canadense e a WACC apoiam a construção de um “Índice do Direito à Comunicação e Informação, associado ao acesso a serviços sociais como educação, saúde, habitação e emprego”.

Segundo Maria Teresa Aveggio, da WACC, esse novo desafio pretende mostrar o quanto a população aymara conhece a respeito de seus direitos, principalmente os direitos à comunicação, informação, educação, saúde, habitação e emprego. Sem dúvida, a experiência vivida na Bolívia é única, já que não se conhecem experiências similares e muito menos ainda experiências que envolvam a população indígena aymara, conclui Maria Teresa.

medo de falar – Os sentimentos comuns que as mulheres manifestam são a permanente frustração por não conseguir fazer parte ativa nas decisões em comunidades rurais e bairros das cidades, como é o caso de El Alto. “Temos medo de falar”, diz a maioria delas, referindo-se ao desejo de expressar uma ideia e a impotência de conseguir realizá-la, somados à discriminação por serem indígenas, migrantes, analfabetas e pobres.

“Nós mulheres queremos falar como grandes, já não somos pequenas”; “Quero ser como os homens que falam fácil nas reuniões”; “Nós mulheres não queremos estar sempre atrás, por isso quero aprender a falar mais forte” – esses são alguns testemunhos dados nos seminários de capacitação, que mostram o desejo de superação das mulheres.

A comunicação é um instrumento capaz de obter a mudança de atitudes e práticas e, ao mesmo tempo, ser o motor para o exercício real do direito à comunicação e informação. As mulheres necessitam romper o silêncio para expressar por meio de suas próprias

CECOPI

palavras suas denúncias, socializar seus sonhos, dialogar, compartilhar e comunicar-se com suas próprias palavras, em suas próprias linguagens, idiomas e dessa forma abandonar a prática de que “outros” falem e decidam por elas. N

TANIA AYMA CALLE é comunicadora social e diretora do Centro de Educação e Comunicação para Comunidades e Povos Indígenas em La Paz, Bolívia

Livro na tela

por Elismar Vilvock

Os livros digitais chegaram para ficar. É um movimento que não pode ser revertido. O número de livros impressos diminui a cada ano em virtude do crescimento explosivo dos livros digitais. Em alguns anos, o livro impresso pode deixar seu trono para ser uma peça de arte, rara ou até desconhecida. Mas quando isso acontecerá? Não há como prever exatamente, apesar de haver várias estimativas na internet dizendo que, em 15 ou 20 anos, o livro digital será o formato dominante para leitura. No entanto, se olharmos para a realidade brasileira, onde há regiões que, ainda hoje, não possuem energia elétrica, tampouco computadores, esse prazo poderá estender-se para mais algumas décadas.

Livro digital (ou e-book) é o termo utilizado para definir o formato digital de um livro, que pode ter sido publicado em livro impresso ou não. Incorpora, além do texto, recursos interativos de áudio e vídeo e pode ser lido em computadores de diversos tamanhos (desktops, tablets, smartphones, celulares etc.). Entre os livros digitais, um formato que está ganhando cada vez mais público é o ePub (Electronic Publication – publicação eletrônica). O ePub está se tornando o formatopadrão para livros digitais.

O desenvolvimento dos devices – nome popular dado aos dispositivos utilizados para o consumo de conteúdos digitais – vem crescendo de tal forma que, hoje, já é possível encontrá-los em praticamente todas as lojas de produtos eletroeletrônicos. O tablet, que é o device com tela maior do que a do smartphone, é o mais amplamente utilizado para a leitura de livros digitais. Os mais utilizados, que dominam praticamente todo o mercado, estão divididos em dois grandes tipos: os que utilizam o sistema operacional iOS (da Apple) e os que utilizam o Android (do Google). Para os tablets com iOS, existe uma loja de aplicativos chamada App Store ((http:// store.apple.com/ br), onde é possível >>

baixar, de forma gratuita ou paga, aplicativos para leitura dos livros digitais e aplicativos com várias outras funcionalidades. O mesmo aplica-se aos tablets com sistema operacional Android. Nesse caso, a loja de aplicativos chama-se Google Play (http:// play.google.com/store).

Outro grande concorrente dos tablets é o e-reader. A Amazon domina esse mercado com o e-reader mais popular do mundo: o Kindle. Mas o mercado de tablets está crescendo de tal forma que até a Amazon lançou seu próprio tablet: o Kindle Fire, com sistema Android.

No mundo digital, a compra dos conteúdos é feita por meio de usuário e senha, assim como se faz para acessar e-mails. Além disso, é necessário também inserir informações de cartões de crédito, pois todas as transações são realizadas dessa forma. Após a compra, o conteúdo desejado é baixado para o device cadastrado.

A Sociedade Bíblica do Brasil vem desenvolvendo conteúdos digitais desde 1997, quando lançou a Bíblia Online 1.0. Em 2012, a SBB conta com produtos digitais em diversos formatos, inclusive a Bíblia em formato ePub, que pode ser encontrada em grandes lojas digitais, como Submarino (http://goo.gl/y4FPh), Livraria Saraiva (http://goo.gl/Ilu3C) e Amazon (http://www.amazon.com/ author/SBB).

O próximo passo é a criação de aplicativos para iOS e Android. Dentro do planejamento está prevista a criação da revista A Bíblia no Brasil, de Bíblias interativas e de aplicativos institucionais que visam engajar os cristãos na causa da Bíblia e no aprendizado da mensagem bíblica. N

ELISMAR VILVOCK é editor assistente de Publicações Eletrônicas da Sociedade Bíblica do Brasil em Barueri (SP)

Avanços na saúde da mulher

Divulgação Novolhar

por Silvana Isabel Francisco

Aatual Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher foi implementada em 2004 e pretende contribuir para a redução da morbidade e mortalidade femininas no Brasil em todos os períodos de vida da mulher e nos diversos grupos populacionais pelo Sistema Único de Saúde (SUS). “Essa política busca a construção de um modelo mais ampliado, mais humano, em relação à mulher. Para isso, estamos fazendo esforços no sentido de procurar as tecnologias mais apropriadas em nossas ações, que incluem também as chamadas populações vulneráveis, como as indígenas, as ribeirinhas, as negras, as do grupo LBGT, entre outras”, explica Esther Vilela, coordenadora da área de saúde da mulher no Ministério da Saúde.

Os problemas são muitos, e o desafio é grande, mas a atual política já conta com alguns avanços, como o Plano Nacional de Fortalecimento das Ações de Prevenção, Diagnóstico

e Tratamento de Câncer de Colo de Útero e de Mama, que envolverá, até 2014, investimentos de R$ 4,5 bilhões. Em 2011, dados preliminares indicam a realização de 11.334.328 procedimentos de Papanicolau, mais do que no ano anterior, quando foram feitos 11.327.686 exames.

O número de mulheres que fizeram mamografias também cresceu nos últimos anos. Em 2009, foram 3.037.630 exames de detecção de câncer de mama. No ano seguinte, foram 3.039.269. Em 2011, dados preliminares revelam que foram feitas 3.445.137 mamografias. Os cânceres de mama e de colo uterino são algumas das principais causas de morte entre as mulheres.

Outro avanço é o direito à realização dos exames de pré-natal. Em 1986, o percentual de grávidas no Brasil que nunca consultaram um médico era de 26 por cento. Em 2006, a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) identificou que esse percentual baixou para 1,3 por cento. Em 2009, foram realizadas 19,4 milhões de consultas pré-natal, o que representa um aumento de 125 por cento em relação a 2003. Em 2010, o número de consultas desse tipo chegou a 20 milhões. Entre janeiro e outubro de 2011, dados parciais do Ministério da Saúde revelam que foram realizados 15,3 milhões de exames. A criação da Rede Cegonha em 2011, que oferece assistência às mulheres desde a confirmação da gravidez até os dois anos de vida do bebê, já conta com a adesão de 17 estados e 800 municípios, com previsão de atendimento a 600 mil gestantes no país.

Bahia, Pará, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco foram os primeiros estados a receber recursos de custeio, em dezembro do ano passado, para ações das primeiras etapas dos Planos de Ação das Redes Assistenciais, com a finalidade de implantar a Rede Cegonha no País. Ao todo, foram R$ 213 milhões do SUS para custear as Casas da Gestante, do Bebê e da Puérpera, Centros de Parto Normal e Maternidades, qualificação de leitos de Unidades de Cuidados Intensivos (UCI) e Unidades de Terapia Intensiva (UTI), entre outros. O Ministério da Saúde destinou R$ 4 milhões, em 2011, para 13 Casas da Gestante e do Bebê, que acolhem gestantes de risco.

No tocante ao planejamento familiar, são oferecidos à população, gratuitamente, vários métodos anticoncepcionais. O SUS oferece oito tipos de métodos contraceptivos, entre esses a pílula anticoncepcional e o dispositivo intrauterino (DIU). Há iniciativas que incluem mais acesso a vasectomias e laqueaduras, distribuição de preservativos e ampliação do acesso a métodos contraceptivos. Em 2010, o número de laqueaduras foi de 60 mil, com um custo de R$ 32,68 milhões. Os dados preliminares de 2011, consolidados até novembro, registram 56,8 mil laqueaduras a um custo de R$ 31 milhões.

As brasileiras podem contar com diferentes canais de comunicação para dar sugestões de melhorias dessas ações ou também críticas e denúncias de prestação de serviço que deixam a desejar ou irregularidades. Um deles é o número de telefone 136, da ouvidoria do SUS. Alguns hospitais públicos pelo país dispõem de ouvidoria própria. Outro caminho é contar com o Ministério Público de sua cidade ou seu estado e também os conselhos municipais de saúde.

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SILVANA ISABEL FRANCISCO é jornalista em Brasília (DF)