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Quando os desfiles rompem a Avenida

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paticumbum

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TrAdição, esPeTáCulo e diáloGo

Desde que nasceram, as escolas de samba então morrendo simbolicamente, gingando entre a tradição e a modernidade. A famosa máxima “no meu tempo era melhor” enche de saudosismo uma manifestação que sempre teve como força o seu poder de negociação. Em seus mais de 80 anos, as escolas de subúrbios distantes e favelas saíram do palco da pequena folia de então ao posto de atração principal da festa carnavalesca, de singelas agremiações a donas de um espetáculo visto pelo mundo inteiro. Da idílica Praça Onze ficou a saudade dos tempos idos, nunca esquecidos, que moldam instituições vivas e mutáveis que souberam muito bem se adaptar as demandas de cada tempo e se reinventarem. Mas até quando?

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Em meio a uma crise política e econômica no país, as agremiações carnavalescas sofrem em um cenário que parecia impensável décadas atrás. Acusadas de espetaculares e divorciadas da cidade e da grande massa popular, a tensão do espetáculo segue amedrontando o desfile há décadas. Desde os anos 1960, pelo menos, quando as entidades se aproximaram de profissionais oriundos das artes institucionalizadas, as escolas de samba seguiram um processo de transformação que as transformaram em um espetáculo único no mundo, que reúne diversos saberes artísticos diante de um público amplo e apaixonado.

Foi esse processo, aliando turismo e negócio à lógica da manifestação nascida “popular”, que ajudou a alçar as escolas como principal produto cultural da cidade do Rio de Janeiro. Mas qual foi o preço dessa transformação?

Entre altos e baixos, mais altos que baixos, as escolas vivem nos últimos anos. Os ingressos não vendem mais como antes, não contagiam o povão.... Povão que sempre se interessou pela festa, vide os ensaios técnicos que reuniram enorme público presente nos seus últimos anos. Lugar de disputa e tensão, as escolas são palcos da história da cidade. O Rio é uma cidade com vocação cultural e artística indiscutível e as nossas escolas de samba se fizeram o maior empreendimento inventivo cultural dessa cidade. Mas como reafirmar o valor cultural dessas agremiações? A melhor solução é realmente vende-las como empresas e produtos simplesmente do turismo?

O carnaval sobrevive hoje em uma lógica empresarial que não se sustentou, que lotou camarotes na sapucaí e fez o público dar as costas para a Avenida, ao som de cantores sertanejos. Os turistas chegam e não levam uma boa experiência da festa, que sofre com atrasos, erros de administração e sérios problemas de infraestrutura. Apesar de espetaculares, as escolas não parecem saber aproveitar isso como deveriam. Poucos se interessam pelos desfiles, pela história da festa, pelo cultural e seus personagens.

As escolas de sambas são arte em estado bruto. Reúnem artistas das mais diversas áreas, entre dança, teatro, música, escultura, pintura e até literatura. seja num enredo, em uma comissão de frente, na bateria, nas alegorias e fantasias, na voz do intérprete e no bailado do casal de mestre-sala e porta-bandeira, uma escola de samba trasnborda arte durante o ano inteiro, em suas quadras e seus barracões.

Valorizar os desfiles das escolas de samba é aumentar seu alcance e público, dialogar com outras instituições, fazendo circular uma produção tão rica artística e culturalmente. seja na literatura, em exposições de artes, filmes e todo tipo de produto cultural. Daí a necessidade de criar selos voltados a publicação de livros sobre a folia, promover exposições e homenagens aos grandes nomes que formaram e definiram as agremiações brasileiras. De levar também essa história e personagem para dentro da academia, onde se pesquisa a fundo nas mais diversas áreas o legado cultural dessa manifestação. O carnaval precisa ocupar novos espaços, reafirmar sua importância como parte da História da Arte brasileira. Ao misturar diversas formas de expressão, as escolas de samba criaram uma linguagem artística única no mundo. A importância de nomes como Rosa Magalhães, Fernando Pinto e Joãosinho trinta se dá além da pista dos desfiles. Faz o país que somos e que queremos ser.

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