Asas de espelho
96
Meu avô era barbeiro E na sua barbearia havia um espelho Com poderes paralelos Que aumentava e diminuía Na medida em que eu crescia Nele cabia todas as montanhas azuis Do mundo que eu sonhava Longe das penúrias frequentes Dos pecados escondidos De todos os castigos penitentes Nesse espelho eu me via Lambuzada de manga madura Cara suja de alegria Mãos cheias de estrelas Apanhadas no pomar No alto das laranjeiras Enquanto a lua dormia Cheia de versos e cantos Nova em rebeldia Nas facetas espelhadas Para não sofrer escondia Os sonhos mais eloquentes Que só eu, menina, sabia Sabia mais que sonhava
PM-0834-16N-LIVRO CONC LITERARIO 2016-23x15cm.indd 96
Sonhava mais que sabia E nas rodilhas do tempo Naquele espelho eu vivia Malabaristas das horas Ensinou-me a ser gente grande Com asas espelhadas e coração gigante. Assim, sendo passarinho Fiz de espelho o meu ninho Na sala, no quarto, no jardim E neles hoje me vejo Cara suja de alegria Num mar de sorrisos novos Com ondas de energia Onde estão os meus sonhos? É fácil! Respondo já... Escondem-se no espelho da sala Fixos no meu olhar Estão nos risos dos netos Soltos ao contemplarem Minhas asas acolhedoras Que os permitem sonhar. Perpétua Conceição da Cunha Amorim Franca-SP
09/08/17 5:50 PM