Revista Neo Mondo - Edição 57

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Água

Bananas is my business Da Redação

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oucos, ao longo da história, foram mais maltratados do que a casca de banana. A cena é repetitiva: alguém vem andando – geralmente um mocinho bem-apessoado, embora variantes do quadro sejam bem-aceitas – quando ela surge no meio do caminho. E aí, tombos burlescos dignos de comerciais de pomada anti-inflamatória se tornam quase obrigação. Pois a maior inimiga dos distraídos recebeu sua carta de alforria e foi liberta da condição de vilã. A responsável por isso é a pesquisadora Milena Boniolo. Doutoranda da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), Milena descobriu que é possível descontaminar água poluída com metais pesados, utilizando, para surpresa geral da nação, a casca de banana. E ainda de um jeito barato. O processo é bastante simples. Antes de tudo, colocam-se as cascas sob o sol para que elas possam secar. Depois, inicia-se o processo de moê-las. Quando o resultado é um pó bem fino, chega a hora de passá-lo por uma espécie de peneira, para que fique homogêneo. Só depois é misturado à água contaminada. Com isso os metais se unem ao pó de banana, permitindo sua extração. “Por meio de alguns testes, descobri moléculas específicas na casca de banana que possuem cargas elétricas negativas. Elas têm afinidade pelas cargas positi-

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Neo Mondo - Setembro/Outubro 2013

vas dos metais”, conta Milena. Para cada 100 ml de água contaminada, utilizam-se cerca de 5 mg do pó de casca de banana. Todas as pesquisas foram feitas com contaminação por urânio. Mas, segundo a pesquisadora, outros metais pesados como cádmio, níquel, crômio e chumbo também podem ser removidos. “É importante dizer que as cascas de banana não são queimadas antes de se fazer o pó. Se fosse assim, qualquer coisa teria o mesmo efeito”, diz. Um dos problemas da nova técnica é a porcentagem de purificação. Nos testes, em média 65% dos metais pesados foram removidos da água. Quando questionada sobre a eficiência do projeto, Milena já tem a resposta na ponta da língua. “De que adianta uma remoção de 100% em um milésimo de segundo se o processo é caro?”. E outra: o índice de descontaminação de 65% é o mínimo obtido em um processo. De acordo com a pesquisadora, é possível elevar essa porcentagem repetindo a purificação inúmeras vezes, até chegar próximo à descontaminação desejada. Mas repetir o processo significa torná-lo demorado – o que pode inviabilizar o projeto em escala industrial. Contudo, os testes em maior escala ainda não foram feitos. “Quando as indústrias me procuram, elas imaginam que é só chegar e instalar.

Na verdade, preciso de uma oportunidade para testar tudo isso em escala industrial antes de sair ‘vendendo’ a ideia”, conta. Por enquanto, o certo é que as cascas de banana têm um grande potencial. Mas, para viabilizar economicamente o processo, são necessários mais testes. Apesar dos inconvenientes, as cascas de banana resolvem outra grande questão por tabela. É claro que a contaminação da água por metais pesados gera um grande desequilíbrio ambiental, ocasionando sérios danos ao ecossistema. Contudo, a solução proposta pela pesquisadora para esse desequilíbrio propicia saídas para outro impasse: o problema do lixo. “Ao trabalhar com as cascas de banana, tratamos dois problemas de uma só vez: despoluímos a água com as cascas que iriam parar no lixo. Assim temos o chamado desenvolvimento sustentável”, diz orgulhosa. Apenas na Grande São Paulo, cerca de 4 toneladas de cascas de banana são simplesmente descartadas por ano. Como é um produto praticamente sem valor econômico agregado, algumas empresas já até se disponibilizaram a doar suas cascas para Milena. Com isso o volume de lixo orgânico diminui. E pode, inclusive, gerar renda e agregar valor a um produto que antes era sinônimo de lixo. E de vilão. Isso sim é desenvolvimento sustentável.


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