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FORMIGA RADICAL A CANOA POLINÉSIA
from MURAL 84
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FORMIGA RADICAL A CANOA POLINÉSIA
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O crescimento do esporte e da satisfação de quem pratica

texto LUÍS ROBERTO FORMIGA fotos PAULO GATTI e FORMIGA
Velocidade, estabilidade e muita performance na água é o que fica claro ao se ver uma Canoa Polinésia navegando, seja na canoa individual (OC 1), ou nas outras categorias por equipe, como na canoa OC 6, a maior delas, que é a utilizada por seis pessoas.
OC é a abreviação de Ocean Canoe. Pelo nome ou pela sigla fica fácil de entender a origem e o potencial de navegação dessa embarcação.
No Brasil, e mais precisamente em Florianópolis, SC, é nítido o crescimento desse esporte e o nível de satisfação de quem pratica. Trata-se de uma atividade outdoor, que cada vez se torna mais importante no mundo de hoje, onde as pessoas estão se isolando e ficando enfurnadas em frente ao computador, ou encurvadas em um mundo virtual apresentado por um telefone celular.
Para entender um pouco mais sobre essa atividade a Revista Mural foi conversar com Paulo Gatti, 62 anos, um multiesportista casca grossa, que tem o remo e a canoa como objetos pessoais sagrados, e que representam seu estilo de vida.



Skate com rodinha de ferro
Conheci essa fera no final dos anos 70, aqui em Florianópolis, mais especificamente no Clube Doze de Agosto, no primeiro Campeonato Brasileiro de Skate.
Gatti era da equipe South Shore, do RS. Competimos juntos naquele evento, que marcou o início da história do esporte no Brasil.
Antes disso, Gatti jogava basquete e depois foi da primeira geração de windsurfistas, e tornou-se fabricante de pranchas no final da faculdade de Educação Física. Em 1983 trocou uma prancha por uma asa-delta com um francês, e começou a voar.
Na sequência, Paulo Gatti virou triatleta. Foram vários anos dedicados à corrida, aos pedais e à natação, e aos voos de parapente, até que, em Saõ Paulo, na raia da Cidade Universitária, Gatti foi picado pelo bichinho do remo.
É uma trajetória de vida multiesportiva que começou com o skate, ainda na época das rodinhas de ferro... um pouco depois do guaraná com rolha. (Rsrs)


CANOA V6 UNLIMITED FULL CARBON

Templo sagrado
Foi no laboratório do entrevistado que pude ver algumas relíquias esportivas, e o que há de mais moderno em um esporte ancestral.
Gatti trouxe a tecnologia dos “composites” para a Canoa Polinésia aqui no Brasil. A fibra de carbono, as resinas epóxi e o PVC expandido – o Divinycell – garantem dureza, resistência â deformação e, consequentemente, mais hidrodinâmica nas embarcações.
Hoje, no Brasil a maioria das canoas são de fibra de vidro e madeira, mais pesadas e com menor performance. Gatti explica que a sua canoa V6 unlimited full carbon, para seis pessoas, é a primeira fabricada na América do Sul.
Nesse “laboratório”, enquanto o incenso queimava, pude sentir o quanto filosófico e espiritualé essa atividade para quem entrou fundo no mundo da Canoa Polinésia.
Como um templo sagrado, o lugar é ornamentado com objetos pessoais que poderiam ser comparados facilmente com as imagens de divindades, mas que na verdade são fotos esportivas, remos, pranchas, skates, tudo misturado de forma organizada com tintas, resinas e materiais de construção de remos e canoas.
Ficou realmente claro para mim que remar em uma “Polinésia” é muito mais do que uma academia ao ar livre.



NAPALI CHALLENGE 2011. KAIOLA TEAM, PRIMEIRO LUGAR MASTER
Espírito polinésio
Foi em viagens ao Havaí que nosso entrevistado imergiu na filosofia desse esporte. Não somente técnica e força física são necessários para ser aceito nas comunidades havaianas desse esporte. A vibração, o olhar, a serenidade de um praticante forasteiro também são facilmente analisados pelos remadores locais.
Sem esses “algo mais”, a possibilidade de interagir realmente com a cultura local desses remadores fica praticamente nula, explica Gatti. Ser aceito para competir em uma canoa com havaianos de um clube local é uma oportunidade totalmente diferente de “turistar para remar” no Havaí.
Participar de eventos gigantes desse esporte, como The Battle of Paddle ou a travessia entre as ilhas de Oahu – Molokai, ultrapassa a experiência esportiva de endurance, onde o longo tempo de prática em uma prova e a exaustão física são características. É uma questão de devoção ao esporte, uma relação com a equipe, com o equipamento, com o mar e consigo mesmo. Espiritual, ressalta Gatti.




Remo e arco e flecha
Como um presente de índio, receber um remo, segundo os polinésios, é uma honraria. Da mesma forma que um índio brasileiro te presenteia com um arco e flecha, com os quais você pode caçar para sobreviver e alimentar sua família, o remo também tem essa conotação.
O remo te leva ao mar, te possibilita pescar e te traz de volta para a terra com alimento.
O suor e a energia acumulados nesses equipamentos são respeitados e sentidos por quem rema e são mais exemplos de como esse esporte transcende a níveis superiores.


OAHU 2011, COM JOHN PUAKEA


CANAL DA BARRA, PILOTO DE DRONE FILIPE SCHUUR
O desenvolvimento do esporte
Gatti se emociona ao olhar a Lagoa da Conceição e revela que não iria morar em nenhum outro lugar do mundo por opção. A Lagoa é o paraíso também para quem rema. Aprender a remar na Lagoa é um privilégio: o lugar é mais que perfeito.
Adquirindo-se nível técnico, é possível chegar facilmente ao mar pelo Canal da Barra. Isso tudo torna Florianópolis mais perfeita ainda para a Canoa Polinésia.
Porém, Gatti tem preocupação com o aumento de praticantes. A falta de técnica e de conhecimento de muitos que estão se iniciando no esporte, ou estão envolvidos comercialmente com ele, podem ser perigosos. Manter o respeito ao esporte, à sua seriedade e às suas origens é fundamental.
Remar é uma experiência multissensorial, que requer conhecimento e técnica para não se lesionar, conhecimento de mar e marés, de vento e meteorologia. Remar exige respeito. Aí sim, remar é curtição, prazer em uma linda atividade física e esportiva outdoor.

