E&M_Edição 30 Outubro 2020 • As Marcas que Marcaram 2020

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Economia as buscas dos moçambicanos no google: para onde estão orientadas? Access Bank marco abalroado revela o plano de crescimento do banco em Moçambique Especial inovação O ranking das startups africanas e os desafios da digitalização

As Marcas que Marcaram 2020

A E&M junta as peças do puzzle e revela, em exclusivo, os principais números do mercado nacional e internacional da publicidade

OUTUBRO 2020 • ano 03 no 30 • 15/10 - 15/11 Preço 250 MZN

moçambique

especial covid Como a pandemia tem travado a luta pela emancipação da mulher



Sumário 6

Observação

Eleições Americanas Trump ou Biden? Os americanos decidem a 3 de Novembro o novo homem forte da Casa Branca

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Radar

Panorama Economia, Banca, Finanças, Infra-estruturas, Investimento, País

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65 ócio

58 Escape Uma viagem ao Monte Namuli 60 Gourmet Ao sabor dos pratos do chef Virgílio Machaque, o cozinheiro ‘presidencial ‘do Niassa 61 Adega Um brinde aos vinhos Barca Velha 63 Arte “Memórias do Idai”, uma breve viagem literária por um passado recente 64 Ao volante Conheça o Classe “S”, a última criação da nova fábrica ‘verde’ da Mercedes

Especial covid

Emancipação da mulher A iniciativa Spotlight quer devolver força a uma causa que está a ser prejudicada pela pandemia

22 nação O mercado da publicidade 22 O investimento As marcas que mais se destacaram e a rara aliança entre o lucro e a caridade 28 As marcas mais pesquisadas no Google O que os moçambicanos mais procuram no motor de busca 30 Publicidade no mundo Consultoras falam das grandes mudanças e das perspectivas globais

34 Megafone Marketing O que está a acontecer no mundo das marcas em Moçambique e lá por fora

36 mercado e FinanÇas Access Bank Moçambique Grupo nigeriano acaba de entrar no mercado nacional e com a ambição de chegar à liderança

www.economiaemercado.co.mz | Julho 2020

44 esPECIAL INOVAÇÃO Tecnologia As grandes tendências da Inovação em Moçambique e no continente africano

52 lÁ fora Agricultura Em que medida a produção agrícola africana está a ser afectada pelos efeitos da pandemia Covid-19

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Editorial

A mensagem por detrás da mudança na paisagem publicitária

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Celso Chambisso • Editor da Economia & Mercado eriodicamente, estudos e análises de entidades autorizadas sobre as tendências, horizontes ou perspectivas da actividade empresarial falam de todos os determinantes dos negócios, mas dificilmente se faz o follow up sobre as alterações da paisagem publicitária, elemento que, no fundo, sinaliza a percepção de estabilidade ou não das empresas ou marcas, que se manifesta através do aumento do investimento ou do desinvestimento em Publicidade. Vai passando despercebido o facto de que este é também um mercado digno de atenção enquanto medidor do pulso de tudo o resto. É esta lacuna que a E&M procura sanar trazendo à manchete o mercado da publicidade como tema principal da presente edição, inspirada nas alterações que se assistem no teor das propagandas comerciais das diferentes marcas, veiculadas nos diversos meios desde que o novo Coronavírus veio impor alterações profundas na forma de se estar em sociedade. Fácil de constatar é que as “vendas” foram literalmente substituídas pelo “humanitarismo” voltado para a prevenção e combate à pandemia. Mas segue-se uma série de questões relevantes que se conseguem esconder até do olhar atento do nosso leitor. Por exemplo, “poderá o covid-19 estar a acelerar a inevitável mudança para o digital, ou a ‘dor’ para os meios de comunicação tradicionais – televisão, rádio, jornais e revistas – é apenas temporária?”. Dados fornecidos pela Yellow Submarine e pela Enhanced Media Systems (EMS), empresas especializadas na matéria, dão-nos ângulos de visão sobre o mercado, quanto se gastou, onde se desinvestiu e quais são as marcas que mais apostaram em publicidade nos últimos meses. E também revelamos as empresas, produtos e serviços que os moçambicanos mais buscaram no Google no último ano e meio. É um tipo de informação que, além do difícil acesso, é aparentemente de pouco uso, mas a experiência de outros mercados já provou ser importante para orientar os mercados a conhecerem melhor a demanda da sociedade e melhorarem a qualidade e quantidade da oferta. Nesta edição, a E&M também inaugura um novo caderno: o “Especial Inovação”, uma mudança por razões que não surpreenderão o nosso leitor — basta lembrar que, em plena era desse tão falado ‘Novo Normal’, é cada vez maior a necessidade de criar novos rumos para o que de bom a tecnologia e o pensamento inovador nos podem trazer, do mercado de trabalho à sustentabilidade, do sector financeiro às comunicações.

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MÊS ano • Nº 01 propriedade Executive Mocambique

Liquatis nienis OutuBRO 2020doluptae • Nº 30 velit et magnis

enis necatin nam fuga. Henet exceatem seque cus, sum nis nam iu Qui te nullant DIRECTOR EXECUTIVO Pedro Cativelos adis destiosse iusci re in prae voles pedro.cativelos@media4development.com sant laborendae nihilib uscius sinusam EDITOR EXECUTIVO Celso Chambisso rehentius eos resti dolumqui dolorep JORNALISTAS, Cristina Freire, Elmano reprem vendipid que ea et eumque non Madaíl, Rogério Macambize, Rui Trindade, nonsent qui officiasi Yana de Almeida lorem ipsum Executive Mocambique PAGINAÇÃO José Mundundo Liquatis nienis doluptae velit et magnis FOTOGRAFIA Mariano Silva enis necatin nam fuga. Henet exceatem REVISÃO Manuela Rodrigues dos Santos seque cus, sum nis nam iu Qui te nullant área Comercial Ana Esteves adis destiosse iusci re in prae voles ana.esteves@media4development.com sant laborendae nihilib uscius sinusam Nádia Pene rehentius eos resti dolumqui dolorep nadia.pene@media4development.com reprem vendipid que ea et eumque non conselho CONSULTIVO nonsent qui officiasi Alda Salomão, Andreia Narigão, António lorem ipsum Liquatis nienis doluptae Souto; Bernardo Aparício, Denise Branco, velit et magnis enis necatin nam fuga. Fabrícia de Almeida Henriques, Frederico Henet exceatem seque cus, sum nis nam Silva, Hermano Juvane, Iacumba Ali Aiuba, iu Qui te nullant adis destiosse iusci re in João Gomes, Narciso Matos, Rogério Samo prae voles sant laborendae nihilib uscius Gudo, Salim Cripton Valá, Sérgio Nicolini sinusam rehentius eos resti dolumqui ADMINISTRAÇÃO, REDACÇÃO dolorep reprem vendipid que ea et E PUBLICIDADE Media4Development eumque non nonsent qui officiasi Rua Ângelo Azarias Chichava nº 311 A — lorem ipsum Liquatis nienis doluptae Sommerschield, Maputo – Moçambique; velit et magnis enis necatin nam fuga. marketing@media4development.com Henet exceatem seque cus, sum nis nam IMPRESSÃO E ACABAMENTO iu Qui te nullant adis destiosse iusci re in Minerva Print - Maputo - Moçambique prae voles sant laborendae nihilib uscius Tiragem 4 500 exemplares sinusam rehentius eos resti dolumqui Propriedade dO Registo dolorep reprem vendipid que ea et Executive Moçambique eumque non nonsent qui officiasi Exploração Editorial e lorem ipsum Liquatis nienis doluptae Comercial em Moçambique velit et magnis enis necatin nam fuga. Media4Development Henet exceatem seque cus, sum nis nam Número de Registo iu Qui te nullant adis destiosse iusci re in 01/GABINFO-DEPC/2018 prae voles sant laborendae nihilib uscius sinusam rehentius eos resti dolumqui dolorep reprem vendipid que ea et eumque non nonsent qui officiasi

www.economiaemercado.co.mz | Abril 2019



Quem será o Homem observação da Casa (Branca)? EUA, Novembro de 2020

Donald Trump ou Joe Biden? Disputam, ambos, no próximo dia 3 de Novembro, as eleições presidenciais mais renhidas das últimas décadas, o que põe o mundo em alerta em relação ao futuro da maior economia mundial. Uma das grandes incertezas é levantada pelo facto de o actual Presidente dos EUA não afastar a hipótese de uma transição violenta caso seja derrotado, uma posição que nunca tinha sido transmitida por um Presidente norte-americano na História moderna do país. Trump diz que vai esperar pelo acto eleitoral para decidir se aceita o resultado o que, segundo analistas, pode aprofundar as divisões internas a poucas semanas das eleições. Vive-se um ambiente de conflito, não apenas entre partidos rivais, mas dentro das próprias forças políticas. De um lado, se o partido democrata não conseguiu sarar as feridas das eleições primárias e enfrenta grandes cisões internas, do lado republicano, Trump não é, de forma unânime, visto como líder e há várias facções em disputa”. Que mundo teremos após o 3 de Novembro? Esperemos para ver.

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RADAR FMI alivia serviço da dívida de Moçambique por mais seis meses

De acordo com uma nota do Fundo Monetário Internacional (FMI), o Conselho Executivo da instituição aprovou, no início de Outubro corrente, uma segunda parcela de seis meses (de 14 de Outubro de 2020 a 13 de Abril de 2021) de alívio do serviço da dívida para Moçambique e outros 27 países membros. Esta aprovação segue a primeira tranche de seis meses (14 de Abril a 13 de Outubro de 2020), aprovada em 13 de Abril de 2020, no quadro do programa de Confiança para Contenção e Alívio de Catástrofes (CCRT, sigla em inglês). Em comunicado, o FMI explica que o perdão da dívida visa liberar recursos financeiros escassos para esforços de assistência médica de emergência vital, enquanto Moçambique e outros membros combatem o impacto da pandemia do covid-19. “Os Directores Executivos sublinharam que a pandemia do covid-19 continua a causar graves prejuízos humanos e económicos aos membros do Fundo. Neste contexto, os Directores observaram que os subsídios de CCRT para alívio do serviço da dívida sobre as obrigações do Fundo com vencimento durante o período de 14 de Abril a 13 de Outubro de 2020 ajudaram os seus membros mais pobres e vulneráveis a lidar com a pandemia e suas repercussões”, lê-se no comunicado.

ECONOMIA Previsões económicas. O administrador do Banco de Moçambique, Jamal Omar, disse, recentemente, num encontro dos bancos centrais lusófonos, que as previsões macroeconómicas mais recentes apontam para uma recessão económica este ano, entre 0,5% e 1% do Produto

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Interno Bruto (PIB). As novas estimativas confirmam a degradação da actividade económica em Moçambique face ao início da pandemia, quando a generalidade das instituições financeiras internacionais e consultoras anteviam que Moçambique seria uma excepção no panorama de recessão que atravessa a África Subsaariana em geral, e a África Austral em particular.

“Há a indicação de que isto (o crescimento negativo) pode continuar no terceiro e quarto trimestres, embora em magnitudes inferiores o que, a acontecer, significa que provavelmente podemos terminar o ano com uma contracção do PIB na ordem de 0,5% a 1%”, apontou o administrador do Banco Central.

Dívida pública. O serviço da dívida com a China é capaz de criar grandes desvios de fundos necessários para os sectores sociais, especialmente no contexto actual da pandemia do covid-19, entende o Centro de Integridade Pública (CIP), uma organização da sociedade civil, que se dedica à defesa da transparência e integridade na gestão do erário. Numa análise publicada recentemente, o CIP revela que, no primeiro trimestre deste ano, a dívida de Moçambique para com a China ascendeu aos 2,01 mil milhões de dólares, representando 20,2% da dívida externa total de Moçambique e 13,2% do PIB de 2019. De acordo com o CIP, a aplicação de critérios menos rigorosos para a concessão de empréstimos por parte daquele país asiático influenciou para que este se tornasse um player de destaque no leque de opções de financiamento a Moçambique, depois do escândalo das “dívidas ocultas” espoletado em 2016 e que levou à saída de diversos parceiros que apoiavam o Orçamento do Estado.

Electricidade. A empresa pública Electricidade de Moçambique (EDM) apresentou, recentemente, o seu plano estratégico de negócio para os próximos cinco anos, e uma das prioridades passa por expandir o acesso à corrente eléctrica e apetrechamento de infra-estruturas. Mas, para tal, a empresa já equaciona mexidas na tarifa de energia a partir do próximo ano, no sentido de agravá-la em 10%. O director do Gabinete Estratégico e Desempenho da EDM, António Nhassengo, justifica que o aumento da tarifa visa “equilibrar as contas” que, como tem sido muitas vezes reportado, não são saudáveis. Caso o Governo não aprove o agravamento da tarifa de energia proposto pela EDM, os gestores da empresa alertam que a rentabilidade manter-se-á negativa, com um cumulativo de 127% negativo no quinquénio 2020-2024. Para a materialização do seu plano de negócios, a Electricidade de Moçambique já está a mobilizar os recursos financeiros necessários, no valor de 1,6 mil milhões de dólares.

Apoio humanitário. O Japão anunciou recentemente uma doação de emergência no valor de 4,2 milhões de dólares para apoiar deslocados pelo conflito armado de Cabo Delgado, no norte do País. A embaixada japonesa em Maputo justificou o desembolso com a “deterioração da situação de segurança que se vive na província”, a braços www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


com uma crise humanitária que já matou mais de mil pessoas e causou cerca de 250 mil deslocados. A verba é destinada ao fornecimento de assistência alimentar para aproximadamente 23 mil pessoas, kits de abrigo de emergência e kits de higiene para aproximadamente 2500 famílias e à construção de estradas e drenagem nos acampamentos, reparação de edifícios públicos e gestão de acampamentos para cerca de 50 mil pessoas.

Inspecção. A Inspecção Nacional de Actividades Económicas (INAE) retirou do mercado três marcas de água engarrafada e fechou as respectivas fábricas após detectar microrganismos prejudiciais à saúde, disse o porta-voz da instituição, Tomás Timba. Segundo o INAE, os exames laboratoriais indicaram que três marcas de água mineral eram impróprias para o consumo devido à presença de microrganismos vivos, como coliformes fecais de minhocas e baratas, “pelo que encerrámos as unidades e retirámos os produtos do mercado”. A instituição não revelou quais as marcas em causa. Transporte e Logística. No Relatório e Contas de 2019, da empresa pública Portos e Caminhos-de-Ferro de Moçambique (CFM), o Conselho Fiscal mostra que o activo da companhia continua a cair, tendo se situado em 48,5 mil milhões de meticais, uma queda de 3% face a 2018. Ao msmo tempo www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

que o activo total apresentou um decréscimo, ao passar de 52,3 mil milhões de Meticais para 49,9 mil milhões de Meticais, de 2017 para 2018, tal cenário continuou a verificar-se em 2019.

EXTRACTIVAS Emprego. O ministro dos Recursos Minerais e Energia, Max Tonela, garantiu, recentemente, que a empresa mineira Vale vai manter todos os postos de trabalho no País, cumprindo uma promessa que assumiu logo após a eclosão da pandemia do covid-19. “As actividades da empresa tiveram uma redução, em virtude da retracção dos principais mercados, sobretudo o europeu e o indiano, mas a administração da empresa tomou decisões para proteger o emprego e não houve redução de mão-de-obra”, frisou o ministro dos Recursos Minerais e Energia. “Desde o primeiro dia, a Vale assegurou-nos que iria proteger os postos de trabalho. Hoje voltou a deixar essa promessa”, sublinhou. Poluição. A mineradora Vale Moçambique assume que a emissão de poeiras continua a ser um “grande desafio ambiental” para a empresa. “É (a poluição) um dos nossos grandes desafios ambientais e a empresa está ciente disso”, afirmou Maurício Simbine, do departamento de Ambiente da mineradora brasileira. O responsável não deu detalhes sobre a quantidade de emissões que a empresa produz, mas assegurou que a mesma instalou uma rede de monitorização de qualidade do ar ao redor das suas instalações. Simbine avançou que os meses de Setembro, Outubro e Novembro foram os “mais críticos” em termos de emissões de poeiras.


Especial Covid-19 Um vírus que faz adoecer a luta pela emancipação feminina O covid-19 fez soar o alarme: mais confinamento pode significar mais violência baseada no género. A iniciativa Spotlight, que defende a emancipação das raparigas e mulheres, adapta-se para que a implementação de novos serviços avance em Moçambique. Os parceiros escolheram histórias de sucesso para ilustrar o trabalho em curso.

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Texto Luís Fonseca, serviço especial da agência Lusa para a E&M • Fotografia D.R. m dos principais programas em curso em Moçambique para emancipar as mulheres e raparigas, erradicar a violência e a discriminação baseada no género (cujas vítimas são sobretudo do sexo feminino) está a adaptar-se para conviver com uma nova realidade ditada pela pandemia do covid-19. O distanciamento social e as regras de higiene e desinfecção obrigaram a implementar uma nova logística. E o novo coronavírus fez com que muitos países registassem “um aumento nos casos de violência doméstica, em resultado do confinamento e de tensões associadas”, notam os parceiros da iniciativa Spotlight: o Governo de Moçambique, a União Europeia (UE) e as Nações Unidas (ONU). A pressão económica, aliada à redução de meios de subsistência e aos desafios no acesso a serviços de saúde, sociais e de protecção, “agravou a vulnerabilidade de muitas mulheres e raparigas”, que precisam de apoio. Uma parte dos recursos disponíveis para as acções Spotlight para este ano foi redireccionada para que instituições públicas não parem por causa do covid-19 e continuem a prestar serviços essenciais às mulheres e raparigas nas áreas da saúde, acção social, polícia e justiça. Assim, o programa vai disponibilizar clínicas móveis, equipamentos de protecção individual, materiais de higiene, telefones celulares, veículos e capacitar provedores de

serviços por via virtual - além de promover linhas de apoio existentes para denunciar casos de violência. Um novo software para gerir casos de violência será também testado. “Inovação e criatividade são essenciais na resposta a esta crise”, justifica o embaixador da UE em Moçambique, António Sánchez-Benedito Gaspar. As mudanças foram aprovadas pelo comité director da iniciativa Spotlight em Julho e estão agora em implementação. “Precisamos de usar todos os recursos disponíveis para alcançar e apoiar as mulheres e raparigas que sofrem violência. Uma parceria e coordenação fortalecidas são cruciais”. Organizações locais estão atentas Na prática, a iniciativa Spotlight é implementada com o envolvimento de mais de 50 organizações da sociedade civil. O trabalho conjunto tem por objectivo ativar núcleos de resposta à violência com base no género, levar utentes a clínicas móveis que circulam pelas regiões e melhorar o sector de medicina forense e legal, para garantir que cerca de 130 000 mulheres e raparigas tenham acesso a serviços integrados e de qualidade (ver caixa sobre números). O plano que sai de encontros como o do comité director, que definiu o plano de trabalho para o resto do ano, é concretizado por activistas. Quem dá a cara e concretiza as acções são mulheres cujas vidas são o testemunho de casos de violência, mas que hoje dão o exemplo de que é possível

“Devemos reforçar as acções de capacitação económica das mulheres, por forma a contribuirmos para a construção de uma sociedade igualitária, justa e pacífica”

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superá-los. Mulheres como Teresa, o nome com que os parceiros da acção Spotlight baptizaram uma activista de 23 anos com que ilustraram a divulgação de acções da iniciativa, em Agosto. Teresa é membro da Ophenta, uma organização de mulheres sediada na província de Nampula, no norte de Moçambique – a província mais populosa, com cerca de seis milhões de habitantes, um quinto do total de habitantes do País. “As sobreviventes precisam de ser ouvidas e de quem as apoie e ame”, refere. Teresa passa os dias com as comunidades, “faz campanhas de mobilização social com megafones, disseminando mensagens em línguas locais para incentivar mulheres e raparigas a continuar a denunciar casos de violência durante a pandemia”, descrevem os parceiros. Passa informação sobre onde está o apoio e serviços mais próximos. Teresa ilustra o trabalho de activistas que mantêm “um olhar atento sobre as mulheres e raparigas mais vulneráveis, garantindo que ninguém fique para trás”, sobretudo numa época que traz mais restrições a lares precários onde é impossível conjugar o verbo ‘confinar’. Berta de Nazareth, 25 anos, é outra das activistas que dá a cara pela iniciativa, em Maputo. Os parceiros divulgaram também a sua história como exemplo de superação. Berta perdeu a mãe, vítima de feminicídio – assassinato com base no género e geralmente associado a violência doméstica –, uma realidade de que só viria a tomar consciência em 2010, em sessões com organizações sobre direitos das mulheres, normas de género e violência. “Desde o momento em que tomei consciência (do que se passou), comecei a participar no activismo social”. Hoje www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


emancipação feminina

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Os números dos promotores do projecto são ambiciosos: • Estima-se que a iniciativa Spotlight já ajudou a educar mais de 320 000 pessoas sobre violência baseada no género e sobre a nova lei que proíbe as uniões prematuras; • O programa também tornou mais acessíveis os serviços de resposta a casos de violência e os serviços de aconselhamento sobre saúde sexual e reprodutiva, beneficiando desta forma mais de 135 000 mulheres e raparigas; • Um total de 446 funcionários públicos já foram capacitados para garantir a qualidade dos serviços prestados; • Uma em cada quatro mulheres moçambicanas é vítima de violência baseada no género durante a sua vida; • Cerca de metade das raparigas moçambicanas são casadas ou estão numa união antes dos 18 anos.

“A iniciativa Spotlight funciona como catalisador para aglomerar todas as intervenções apoiadas pelo Governo e pela ONU para eliminar a violência e as uniões prematuras” participa e faz parte da Associação Sociocultural Horizonte Azul (Ascha) que ajuda crianças e adolescentes vulneráveis, “ajudando-os a permanecer na escola e envolvendo-os em actividades artísticas como dança, poesia, fotografia e encadernação de livros”, a par de actividades de sensibilização sobre a igualdade de género, saúde, direitos sexuais e reprodutivos. Boa parte das actividades estão focadas nas meninas e raparigas, “que muitas vezes são forçadas a abandonar a escola devido às uniões prematuras ou à gravidez precoce”. As estatísticas continuam a justificar a atenção dada ao tema em Moçambique. Uma em cada quatro mulheres moçambicanas é vítima de violência baseada no género durante a sua vida. Cerca de metade das raparigas moçambicanas casam-se ou são forçadas a entrar numa união antes dos 18 anos. Os costumes, em muitos casos, têm legitimado os casamentos prematuros, na medida em que, em algumas províncias, antes mesmo do nascimento, a rapariga é prometida a um homem por vários motivos, entre os quais o pagamento de uma dívida ou como preço por serviços

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prestados por um médico tradicional, prática que ainda é bastante comum nas zonas rurais. Lutas e desafios de ontem e de hoje Já com 11 anos completos a 29 de Setembro, e apesar dos avanços sociais que trouxe na protecção da mulher, a lei contra a violência doméstica ainda carece de melhorias, segundo especialistas. Do lado positivo, a lei trouxe maior consciencialização para os direitos das mulheres e permitiu mudar a perspectiva dos papéis e responsabilidades definidos culturalmente para homens e mulheres no âmbito doméstico. A mudança também se reflectiu no âmbito jurídico, por exemplo, com a criação dos gabinetes de atendimento à mulher, já que nem sempre foi assim. Do lado negativo, constata-se que, apesar do aumento das denúncias, ainda há entraves para a punição dos agressores, visto que o encaminhamento dos processos leva muito tempo e é bastante moroso. A corrupção está também presente, no sentido de que o agressor acaba por encontrar formas de corromper os agentes da justiça.

Uma iniciativa global A iniciativa Spotlight é uma parceria global entre a União Europeia e as Nações Unidas para eliminar todas as formas de violência contra as mulheres e raparigas em todo o mundo. Lançado em 2017, está orçada em cerca de 500 milhões de euros, valor que será usado em diferentes países para apoiar diversas iniciativas de luta contra a violação dos direitos da mulher e da rapariga. Em Moçambique, a Iniciativa é liderada pelo Ministério do Género, Criança e Acção Social e conta com um montante de cerca de 40 milhões de euros disponibilizados pela União Europeia. É implementada por um período de quatro anos (2019-2022), com enfoque nas áreas prioritárias de acção para o combate à violência sexual e baseada no género, incluindo as uniões prematuras, e promoção dos direitos de saúde sexual e reprodutiva das mulheres e raparigas. A Spotlight foi apresentada em Março de 2019 na capital, Maputo, e avançou depois para dez distritos piloto nas províncias de Nampula, Manica e Gaza, regiões que têm registado mais casos de violação dos direitos da mulher e da rapariga. Pretende-se que haja investimento das mulheres nas actividades económicas, emancipação social e maior participação na tomada de decisões. www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020



OPINIÃO

Como o segundo trimestre de 2020 aborda os preços baixos do petróleo e do gás

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Andy Brogan • EY Global Oil & Gas Leader

segundo trimestre de 2020 foi o primeiro trimestre completo desde o início da crise da COVID-19, tendo sido marcado por um declínio sem precedentes na procura e nos preços do petróleo e do gás. As oil majors/grandes empresas petrolíferas contabilizaram 65 mil milhões de dólares de prejuízos durante o segundo trimestre. A reavaliação dos activos foi responsável por mais de três quartos deste valor, à medida que as empresas começaram a lidar com as consequências a longo prazo da redução da procura e com a iminente transição energética causadas pela COVID-19. Entre o primeiro e o segundo trimestres, a procura do petróleo diminuiu em cerca de 10 milhões de barris por dia. Os preços do petróleo bruto desceram abaixo dos 20 USD/barril em Abril, tendo depois subido de forma constante, resultando num preço médio de 29 USD/ barril para o trimestre. No entanto, este número ainda está muito abaixo da média de 48 USD/barril do primeiro trimestre. A redução da procura agravou as situações de excesso de oferta existentes nos mercados do gás, levando os preços para mínimos históricos. Durante o trimestre, o índice Henry Hub front-month futures, em média, valeu apenas US$1.70/MMBtu, o valor mais baixo dos últimos 25 anos. A refinação também foi extremamente afectada, uma vez que os valores de crack spreads nos EUA e na Europa caíram para quase 50% dos seus valores do ano anterior.

Balancete e perspectivas de gastos Uma vez que as perdas eram um dado adquirido, os analistas concentraram-se em questões financeiras mais abrangentes, incluindo gastos e balancetes. As empresas relataram que os cortes nos gastos foram a ferramenta escolhida para gerir o fluxo de caixa, sendo que o número de plataformas de petróleo activas estão no nível mais baixo dos últimos 15 anos. Os analistas também examinaram as necessidades de capital a longo prazo para sustentar o negócio, tendo referido a preocupação de que os actuais níveis baixos de capex das empresas podem comprometer a realização dos seus objectivos de produção e de fluxos de

caixa a médio prazo. Nestas análises, o ambiente macro e os cenários da procura foram os principais temas abordados. A redução dos valores contabilísticos dos activos baseou-se no pressuposto de que os preços do petróleo voltariam a níveis mais sustentáveis. No entanto, os analistas questionaram como é que as empresas iriam reagir se o petróleo continuasse a permanecer abaixo dos 40 USD/ barril a médio e a longo prazo. Dividendos e imparidades A recente crise provocou uma reavaliação das políticas de dividendos dos retalhistas em todo o sector e o assunto esteve novamente em destaque nas análises do segundo trimestre. Algumas empresas reformularam as políticas de dividendos para que estes pudessem acompanhar os preços do petróleo em vez de permanecerem fixos. Em relação às imparidades, os analistas estavam curiosos em conhecer a percentagem das imparidades totais que não foram desencadeadas pela COVID-19, bem como a razão pela qual as empresas esperaram até agora para as reconhecer. Preocupações estratégicas Na frente estratégica, dominaram as questões relacionadas com a remodelação de portefólios. A obtenção de uma alta classificação dos portefólios estava no topo das prioridades, logo seguida pelo desinvestimento em activos e pela forma de alcançar uma combinação de activos adequada ao futuro. A diversificação para as energias alternativas e os retornos desses negócios continuam a ser áreas de foco para os analistas. Olhando para o futuro, ninguém sabe durante quanto tempo é que a procura será afectada pela pandemia. Quando descobrirmos, a transição energética poderá já estar a decorrer a grande velocidade. As empresas continuam a procurar um equilíbrio entre efectuar a injecção de capital nos seus negócios core, de forma a mantê-los vivos, ou em utilizar esse capital para financiar alternativas. Os analistas irão continuar a procurar informações detalhadas sobre o retorno desses investimentos e as respostas serão cada vez mais importantes para o sector em geral.

Ninguém sabe durante quanto tempo é que a procura do petróleo e do gás será afectada pela pandemia. Quando descobrirmos, a transição energética poderá já estar a decorrer

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Números em conta Cinco Prioridades Empresariais para o Futuro do Trabalho o covid-19 está a desvendar um futuro totalmente diferente ao nível da vida profissional. No entanto, muitas das mudanças que gora se consumam já tinham iniciado anteriormente por via da crescente digitalização do mundo profissional. Esta infografia da consultora PwC identifica as cinco prioridades que podem ajudar a fornecer um caminho para o futuro do plano de trabalho de uma empresa — reforçado pelas respostas de um inquérito em curso aos CFO dos EUA sobre a sua estratégia de força de trabalho.

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Estratégia Empresarial De acordo com o inquérito, 72% dos directores financeiros dos EUA (CFOs) dizem que responder à COVID-19 com melhor resiliência e agilidade será um factor chave para a melhoria da sua empresa a longo prazo.

Evitar 73%

actividades artísticas

Ignorar o que as suas equipas necessitam durante um processo de mudanças

72%

melhor resiliência e agilidade

56%

investimentos tecnológicos novas formas de servir os clientes inspirações mais realistas envolvimento da comunidade e da sociedade

53% 50%

27%

Formas flexíveis de trabalho também podem ajudar a melhorar a produtividade e o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal.

Invista em: Criar um ambiente de trabalho mais flexível e eficiente

Em progresso: 72% das empresas assumem que estão a procurar aumentar a resiliência e a agilidade Evitar Contratar com um mindset de curto-prazo

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Planeamento de talentos Não basta contratar apenas para alcançar os objectivos da força de trabalho. As empresas devem pensar em três passos ao construir uma forte reserva de talentos:

1 Recrutar bem

Avalie os valores e a missão da sua empresa, e mantenha-se atento à diversidade e à inclusão enquanto contrata. Está provado que as iniciativas de diversidade de género são boas para o resultado final, melhorando os resultados e aumentando os lucros e a produtividade. 57%

60%

57%

54%

Melhorar desempenho dos negócios

Aumentar os lucros e a produtividade

Aumentar a atracção de talento

Agregar mais criatividade e inovação

3Manter-se adaptável

2Reter o talento

As empresas estão cada vez mais a alavancar a economia à medida que modelos alternativos crescem em popularidade.

Actualmente, 55% dos CFOs não se sentem muito confiantes na capacidade da sua empresa para reter talentos críticos. As organizações devem evitar contratar com uma mentalidade de curto prazo. Em vez disso, devem concentrarse no desenvolvimento das competências dos empregados, com ênfase no aperfeiçoamento de ferramentas e software digital.

Os riscos da automação e o gap de skills

14%

dos trabalhos estão a ser automatizados

32%

dos trabalhos serão radicalmente transformados

100 80 60 40 20

2004

2006

2008

2010

Invista em: Na jornada digital dos seus colaboradores e em ferramentas digitais

16

2012

2014

2016

2018

Em progresso: 55% dos CFO’s sentem-se confiantes na capacidade das suas empresas em reter talento

Para se manter a par destas tendências, o chamado upskilling (literacia digital e pensamento crítico) será essencial: Requer compromisso organizacional e pessoal www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


5 Ambiente de trabalho

Globalmente, o trabalho flexível é uma parte essencial do novo normal

Evitar Confundir horas no escritório com produtividade

Drivers dos negócios 79%

89%

79% Ambiente de trabalho flexível desempenha um papel no sucesso dos negócios

65%

Os negócios podem tornar-se mais produtivos graças ao trabalho flexível

Negócios estão a introduzir o trabalho flexível para reduzir as despesas operacionais

As empresas devem considerar a reconfiguração dos seus espaços físicos e a melhoria das capacidades de trabalho remoto

Evitar Ignorar uma visão holística da experiência do empregador

Evitar Baixar a guarda quanto à inclusão digital: Nunca estará terminada

Aprendizagem e inovação 3No futuro, as skills humanas e digitais terão grande procura

Muitos adultos não têm as aptidões ideais para os novos empregos 6 em cada 10 adultos têm falta de informação básica e de conhecimentos em tecnologia, faltando-lhe noções básicas de informática

Invista em: Apoiar os trabalhadores a trabalhar de qualquer lugar

Em Progresso 72% dos CFO’s acreditam que o trabalho flexível vai fazer a sua companhia melhorar a longo prazo

4 A experiência do empregador

Empregadores vêm os seus trabalhos como mais do que apenas das ‘9 às 5’, procuram ‘meaningful work’ relação e experiência 7/10

trabalhadores consideram a proposta para o trabalho que mais os preencha

1/3

trabalhadores fá-lo-iam mesmo recebendo menos Nesse sentido, há um foco renovado no cuidado que as empresas devem ter nestes aspectos Os benefícios intangíveis de ‘engajar’ a sua força de trabalho - 41%

de absentismo

-24 to 59%

de turnover

+ 20%

FONTE IOCDE

+ 17%

Invista em: Numa cultutra de conhecimento e de upskilling

Em Progresso 45% dos CFO’s estão muito confiantes nas capacidades das suas empresas conseguirem fazer este upskilling

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Invista em: Construir um engajamento da sua força de trabalho clarificando expetativas e promovendo relações positivas

em vendas

na produtividade

Em progresso: 51% dos CFO’s sentem-se confiantes na capacidade das suas empresas conseguirem alcançar estes objectivos

17


OPINIÃO

Previsões económicas finais de um ano atípico

e

Alberto Pitoro • Director de Tesouraria do Absa Moçambique

m março, quando o coronavírus começou a espalhar-se da China para outras regiões, começou a desenhar-se no mundo um cenário económico difícil. As previsões de crescimento económico para algumas economias, como a China, Japão, Austrália, entre outros, foram revistas em baixa. Os cenários mais graves avançavam a possibilidade do alastramento da Covid-19 pelas economias mais fortes, afectando severamente a confiança, a mobilidade global e o consumo. Os países dependentes da exportação de commodities, do turismo e do Investimento Directo Estrangeiro (IDE) seriam afectados. Para Moçambique, sendo a China um dos principais parceiros comerciais (6% das exportações e 12% das importações), já se sentia o impacto negativo da Covid-19 principalmente nos sectores de construção, transportes e logística, comércio e turismo. Em resposta, iniciou-se uma escalada de adopção de medidas de política por governos e bancos centrais de vários países. Em Moçambique, o Governo e o Banco de Moçambique também aprovaram um conjunto de medidas de políticas económica, fiscal e monetária. O Estado de Emergência declarado por Sua Excelência o Presidente da República no final de Março, prorrogado por três vezes até Julho, e renovado em Agosto, afectou significativamente a actividade económica, sobretudo os sectores da hotelaria e turismo, recursos minerais, comércio e transportes. O IDE caiu, embora os projectos de gás natural liderados pela ENI e Total continuavam e mantinham as previsões de início de produção entre 2022 e 2024. Após um crescimento anual de 1,7% no primeiro trimestre, o PIB contraiu em 3,3% anuais no segundo trimestre. No mesmo trimestre, o Indicador do Clima Económico (ICE) e o Purchasers Managers Index (PMI) caíram drasticamente, indicando que o desempenho do sector privado continuava a deteriorar-se, apesar das medidas tomadas para estimular a actividade económica. Com o fim do Estado de Emergência e passagem para o Estado de Calamidade Pública em Setembro último, resultando na leve reabertura económica e social, o que se pode

esperar do desempenho económico do País nestes últimos meses do ano? O País e o mundo estão a lidar com um fenómeno sem precedentes e com impactos imprevisíveis, sobretudo perante o contínuo registo de um nível cada vez mais preocupante de novos casos positivos da Covid-19, e os riscos globais de uma eventual segunda vaga. Porém, olhando para determinados factores, pode-se construir algum cenário. Para Moçambique, o Grupo Absa projecta uma ligeira contracção do PIB em 2020 de 0,2% anuais e um crescimento de 4,6% em 2021. Após a contracção de 3,3% no segundo trimestre, e provavelmente no terceiro trimestre, a contracção de apenas 0,2% para o ano sugere uma retoma generalizada durante o último trimestre. Com uma inflação abaixo de 3%, o Comité de Política Monetária do Banco de Moçambique poderá cortar as taxas de juro ainda este ano, o que poderá melhorar o acesso ao crédito. O IDE, sobretudo dos mega-projectos de exploração de recursos naturais continuará a fluir, e, complementado pelas exportações e fluxos de ajuda externa à reconstrução pós-ciclones IDAI e Kenneth, continuarão a aliviar a pressão cambial decorrente do aumento da procura para importações e deslocações ao exterior. Em Agosto, o Indicador do Clima Económico inverteu a tendência de queda do trimestre anterior. Os indicadores das perspectivas da procura, emprego, hotelaria, transportes e armazenagem, produção industrial e água, e de construção e obras públicas registam uma tendência positiva. Em Setembro, o PMI situou-se em 46,6 contra 46,1 em Agosto, nível mais alto desde Março, o que espelha o abrandamento do ritmo de contracção da actividade privada, esperando-se que esta tendência se mantenha. Em suma, espera-se que os últimos três meses do ano continuem a ser desafiadores para os agentes económicos, porém, estabelecendo bases para um desempenho económico positivo em 2021, no pressuposto de que a evolução da Covid-19 não vai exigir a declaração de um novo Estado de Emergência no País.

Espera-se que os últimos três meses do ano continuem a ser desafiadores para os agentes económicos, porém, estabelecendo bases para um desempenho económico positivo em 2021

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Nação

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Publicidade

As marcas que... marcaram um ano diferente. A todos os níveis Cortar despesas de publicidade para resistir à crise ou manter a exposição no mercado para superá-la? Terá sido uma das primeiras questões que muitas marcas nacionais e internacionais terão colocado ao longo dos últimos meses. Muitas houve que orientaram as suas campanhas para a pandemia, dos cuidados com o distanciamento ao ‘fique em casa’. A E&M revela os números do mercado publicitário nacional ao longo de 2020 — quanto se gastou, quem investiu mais e em que áreas — e identifica as tendências de um ano que ninguém vai esquecer

s

Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R.

e eu tivesse um único dólar, investiria em propaganda”. Com esta frase, o mítico empreendedor norte-americano e fundador da Ford Motor Company, Henry Ford, pretendia elucidar a importância da publicidade enquanto ‘pulmão’ de um qualquer negócio. No entanto, esta premissa pode não funcionar exactamente desta forma, em termos práticos. E não funciona de facto. Os efeitos do novo coronavírus são a mais recente prova disso, como o foram todas as crises anteriores. Quando as finanças apertam, um dos primeiros itens a cortar é a publicidade, por norma. No entanto, esta é uma leitura genérica e, para os mais atentos, não terá passado despercebida a mudança a que se vem assistindo nos últimos meses, no mundo da publicidade. E esta é uma tendência nacional e global, na verdade. Muitos dos produtos publicitados nos diferentes meios, dos tradicionais aos digitais, desapareceram dos anúncios e os que resistem mudaram o seu teor, adequando a sua estratégia de comunicação ao momento actual e dando ênfase à informação sobre a prevenção das contaminações pelo vírus, por exemplo. Para entender as principais tendências do mercado e revelar os números que ele envolve, a E&M recorreu aos dados da Enhanced Media Systems (EMS), empresa de monitorização e análise de media (notícias e publicidade) e de relações públicas, que presta serviços a grandes empresas do mercado nacional na área da banca, mineração, logística e bebidas. Investimento caiu 18,4% de Janeiro a Agosto Num ano claramente disruptivo a todos os níveis, algumas empresas e marcas até procuraram agir de acordo com a

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premissa do fundador da Ford, mas a pandemia retirou-lhes o tal “único dólar”, que poderiam investir, no caso de muitas PME ligadas essencialmente ao sector dos serviços, o mais afectado pelas restrições dos últimos meses. Outras houve que optaram por cortar nas despesas da publicidade para poder resistir à dureza da crise alocando a reduzida facturação às despesas correntes. Segundo os dados da EMS, nos primeiros oito meses de 2019, o mercado interno movimentou 1193,5 milhões de meticais em publicidade. Em igual período deste ano foram investidos 973,4 milhões. Ou seja, perderam-se qualquer coisa como 220,1 milhões de meticais, uma descida de 18,4%, bastante menor do que o que seria, inicialmente, de esperar. “Apesar da conjuntura, não houve efectivamente grande desinvestimento publicitário. O que aconteceu foi que algumas marcas (as principais) quiseram manter a sua presença nos media desenvolvendo campanhas adaptadas ao contexto da pandemia. Por exemplo, os bancos passaram a comunicar mais fortemente os seus canais digitais, enquanto que as bebidas, nomeadamente as cervejas, apostaram numa vertente mais social de apoio aos produtores locais ou à responsabilidade social”, adianta Pedro Correia da Silva, country manager da EMS. Como seria de esperar, foi precisamente na altura em que foi decretado o primeiro Estado de Emergência que a situação mudou. Os dados da EMS mostram que o investimento publicitário entre Janeiro a Março de 2020 foi quase idêntico ao do mesmo período do ano passado. Em Abril registou-se uma ligeira quebra que viria a agudizar-se em Maio, numa altura em que se vivia uma quase paralisação da economia. O mês de Junho foi o mais crítico ao nível da quebra de investimento publicitário especialmente em sectores como o Turismo, que não já não fazia parte dos grandes investidores mas que desinvestiu bastante, uma vez que as fronteiras

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Nação Investimento publicitário Caiu 18,4% Com a crise, muitas marcas não tiveram escolha senão cortar nos budgets para campanhas de publicidade. De Janeiro a Agosto de 2020, o investimento caiu em mais de 220 milhões de meticais em relação ao igual período de 2019. Mas esperava-se pior Em milhões de meticais

Jan. – Ago. 2019

Jan. – Ago. 2020

1 193,5

973,4

Curva de desinvestimento acompanha curva pandémica Em termos globais e em todos os meios (televisão, rádio e imprensa escrita), a maior quebra de investimentos foi a partir de Maio e o pico em Junho Em milhões de meticais

161,4 157,6

janeiro

-3,8 122,3 134,7 12,4

fevereiro

141,6 160,3 18,7

março

149,6 130,9

abril

-18,7 150,5 102,6

maio

-47,9 153,2 77,9

junho

-75,3 156,3 107,1

julho

-49,2 158,6 102,3

agosto

-56,3 2019

22

2020

Diferença 20/19

“Não seria justo os maiores anunciantes, que ganharam imenso como resultado da pandemia, desinvestirem em publicidade” estavam fechadas. A actividade produtiva foi interrompida e a palavra de ordem passou a ser “fique em casa”. Algumas marcas caíram enquanto outras se ergueram. Quais são? Olhando para o apuramento das marcas que mais investiram em publicidade, números que resultam do cruzamento da sua exposição nos diferentes meios com os correspondentes preços de tabela fornecidos pelas próprias empresas (clientes da EMS), conclui-se que os sectores com mais peso são as telecomunicações (operadoras de telefonia móvel), bancos e bebidas. “É normal que as marcas tenham tido descontos, mas, como a EMS não está presente na negociação dos contratos de publicidade, chega a estes valores cruzando dados da exposição da marca e o preço de tabela”, sublinhou o country manager da EMS. Individualmente, o recorde vai para a Vodacom, com investimento de quase 120 milhões de meticais nos primeiros oito meses do ano, mais do que o dobro do segundo maior, o Standard Bank, ao qual se segue outra instituição financeira, o BCI, que investiu 45,5 milhões (ver gráfico na pág.25). www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


Publicidade ter contraído 18% (até Agosto), a explicação acaba por se encaixar na realidade vivida: “Não seria justo os maiores anunciantes, que ganharam imenso como resultado da pandemia, caso das operadoras de telefonia móvel, por exemplo, desinvestirem em publicidade deixando mal os meios com que se relacionam durante o ano inteiro (televisão, rádio, jornais e revistas)”, defende Pedro Correia. E tal, de facto, não aconteceu, até porque os canais tradicionais continuam a ser essenciais para fazer passar a mensagem das grandes empresas, de forma eficaz, aos seus clientes, embora seja uma tendência do mercado a nível global a passagem para os new media digitais, que ganharam peso nestes primeiros meses do ano, através de campanhas directas no Instagram, e principalmente no Facebook. A publicidade na voz das próprias marcas

O que há em comum no ‘top 10’?

Tendência comum a quase todos os dez maiores anunciantes ao nível nacional são o tipo de produtos ou serviços que disponibilizam, quase todos propícios à época que se tem vivido, em que a sociedade se vê obrigada a permanecer em casa. É o caso das operadoras móveis, como a Vodacom, que viu crescer a venda e o consumo de serviços de comunicação de voz e dados, tanto ao nível dos clientes privados como empresariais. Ao nível da banca, o Standard Bank adoptou o slogan “É Possível” como forma de manter a sua exposição no mercado, fazendo passar a mensagem de esperança na vitória contra a pandemia e o alcance dos sonhos dos seus clientes, uma tendência seguida por outros bancos no mercado, como o Absa, que lançou campanhas de agradecimento aos médicos nacionais, por exemplo. Na lista também há, sem surpresa, empresas do ramo alimentar. Para o CEO da agência de publicidade DDB, estas “ter-se-ão beneficiado dos apelos ao “fica em casa” para se posicionarem junto dos seus clientes”. E há, igualmente, os provedores de serviços de televisão e de internet fixa, que também viram na conjuntura uma oportunidade para investir em exposição mediática e que, por isso mesmo, figuram no topo da lista dos maiores investidores em publicidade nos primeiros oito meses deste ano. Voltando à questão inicial, e ao porquê de o mercado apenas www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

No ‘top 10’ dos maiores anunciantes de Janeiro a Agosto, a E&M ouviu três, um de cada sector, nomeadamente o Banco Comercial e de Investimentos (BCI), do sector financeiro, as Cervejas de Moçambique (CDM), do sector alimentar e a Multichoice Moçambique, detentora da DSTV e da GOtv, provedores de serviços de televisão por satélite, ambas entre as dez maiores anunciantes. Especialistas entrevistados pela E&M lembram, antes do mais, que as marcas que mais resistem em manter a sua exposição em publicidade em tempos de crise, não só o fazem pela sua pujança financeira e posicionamento no mercado, mas também pela noção de que a perda de visibilidade nos meios de comunicação pode dar espaço à concorrência e dificultar a retoma à posição original quando a crise passar. Mas já lá vamos. Por agora, conheça as campanhas que algumas marcas do TOP 10 dos maiores anunciantes lançaram durante o confinamento e saiba o dizem de si mesmas, de um modo geral, através de comentários enviados à E&M por e-mail. Na área da banca e olhando aos dez maiores anunciantes, o BCI, que lidera o mercado a par do Millennium bim, orientou a sua comunicação para o reforço das medidas de prevenção, uma linha seguida pela maioria da banca, no geral. Assim, só no período de Março a Junho, depois de terem sido anunciados os primeiros casos de Covid, lançou oito campanhas na televisão e na rádio. “Desde logo, quisemos dar uma tónica de esperança e lançámos uma campanha institucional motivacional designada ‘Forma de Ser e de estar Daqui′ e que teve uma enorme receptividade nacional e internacional”, diz o banco. Para justificar a razão da crescente aposta em publicitar nos meios digitais, recorreu à experiência interna: “Os índices de utilização do Internet Banking que, no início do ano, representavam cerca de 42% do volume de operações das Agências, no actual cenário, representam cerca de 73% (média dos últimos três meses), cifra que, com este crescimento, deverá, certamente, ser ultrapassada. “Nunca antes, na história do banco, esta realidade esteve tão próxima”, constata. O fenómeno replicou-se também aqui, de forma geral, por toda a banca nacional, que viu crescer a utilização dos respectivos serviços de mobile banking. CDM dedicou-se à prevenção

Com a proibição da venda de bebidas, nomeadamente no sector informal, e com a limitação ao mercado dos bares e casas nocturnas, o negócio das bebidas foi severamente

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Nação afectado, principalmente no segmento das cervejas que é, de longe, o mais representativo deste ramo de actividade. Este facto levou a CDM (que detém uma quota de mercado a rondar os 90%) e todas as marcas do grupo a direccionar as suas campanhas para a prevenção do Covid-19. “De uma forma geral, substituímos todas as nossas publicidades na TV por uma campanha de sensibilização. A grande maioria das acções das nossas marcas em outdoors, painéis digitais e paragens de autocarros foram substituídas por mensagens de sensibilização sobre o Covid-19. E em parceria com o Instituto Nacional da Saúde, usámos as nossas redes sociais no mesmo sentido”, refere o grupo à E&M. “Apesar de a nossa liquidez estar razoavelmente boa, o encerramento de bares, barracas e discotecas causou um considerável impacto no nosso volume de vendas”. Fica em casa — Trabalhar de dia, ver TV à noite

A DStv e a GOtv são as duas marcas mais representativas da Multichoice Moçambique que, de forma combinada, lideram o investimento no mercado televisivo, sendo que a TV Cabo é bastante menos representativa. “Nesta fase da pandemia, que se destaca por alterações nos hábitos de consumo, foi importante apostar em novas abordagens da nossa estratégia de marketing. Uma delas foi manter o investimento na visibilidade das nossas marcas de forma a mantermo-nos relevantes aos olhos dos nossos clientes e consequentemente defender a nossa liderança no mercado”, lê-se no comentário enviado à E&M pela Multichoice. Outra grande componente estratégica, aliada às restrições do momento, foi a aposta no digital, focalizando na comunicação das opções alternativas de pagamento, serviços de auto-ajuda e assistência remota através do serviço de USSD e WhatsApp e muito recentemente na inovação, com o lançamento da app Mydstv que permite aos clientes gerenciar a sua conta, limpar erros, fazer pagamentos e assistir aos conteúdos a partir do smarphone ou mesmo do tablet “sem custos adicionais”, explica a empresa. Aliança entre comercial e social. Que significado?

O CEO da agência DDB, Vasco Rocha, destaca o carácter solidário que as marcas assumiram ao trocarem o conteúdo puramente comercial pelo de responsabilidade social, revelando que “se a marca conseguir chamar a atenção do consumidor por estar a dar algum benefício, mesmo que seja de ponto de vista mental, social, de saúde e segurança (que são, neste momento, os valores que estão no top of mind dos consumidores), ela estará a fazer o papel que eu acho que é seu dever desempenhar. Ou seja, se as pessoas gostam e têm um relacionamento com uma determinada marca, usam-na e acreditam nos valores que ela tem, então é papel desta marca olhar para estas pessoas não apenas como meio de receber dinheiro mas de as proteger e manter sã esta relação. Assim, mesmo que haja quebra das compras, a protecção do consumidor por parte das marcas vai assegurar que, no retorno à normalidade, as pessoas reconheçam o seu valor e consumam muito mais, visto que as relações sairão fortalecidas desta crise”, defende o gestor. Posição similar à de Pedro Correia para quem as marcas nacionais, seguindo uma tendência global a este respeito, mostraram, de forma geral, a perfeita noção “de que devem manter o seu espaço. Foram solidárias com as medidas de prevenção do Covid-19 e grande parte do seu espaço

24

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marcas e quanto às marcas?

Telecom e banca são quem mais investe Historicamente sempre foi assim. Já o comércio quase desapareceu telecomunicações

281,4 bancos e finanças

Mesmo com a crise, há marcas que continuaram expostas, aliando os objectivos comerciais aos sociais. O investimento total das 10 marcas de topo, nos primeiros oito meses deste ano, chegou aos 458,5 milhões de meticais

155,4 bebidas não alcóolicas

127,8

Em milhões de meticais de Janeiro a Agosto de 2020

60,8

TOP 10 marcas

bebidas alcóolicas alimentação

46,7 comércio a retalho

45,7 comércio a retalho

39,4

119,32

O fenómeno explica-se pela intensificação de mensagens de prevenção como o “fique em casa”, “utilize o desinfectante”

50,84

Campanhas de sensibilização alavancaram investimento...

...na Banca... Em milhões de meticais

94,52

45,5 152,29

...nas telecomunicações...

44,12

Em milhões de meticais

290

274

...no sector alimentar...

35,98

35,73

Em milhões de meticais

52,91

45,32

...nas bebidas alcóolicas

32,62 32,19

Em milhões de meticais

54,98 Jan./Ago. 2019

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58,37 Jan./Ago. 2020

32,15 30,03

25


Nação a publicidade nos meios tradicionais Sofreram (e ainda sofrem) imenso com os cortes feitos pelos anunciantes ao serem supreendidos pela interrupção dos negócios. Há quem defenda a intervenção do Governo para evitar falências e despedimentos massivos. Individualmente foi assim:

Na televisão…

... Na rádio…

... E na imprensa escrita

Nem a televisão que tem a audiência assegurada nas cidades escapou

O desinvestimento começou antes mesmo de a Covid-19 chegar a Moçambique

Jornais e revistas foram os meios mais penalizados pelo desinvestimento

Em milhões de meticais

Em milhões de meticais

Em milhões de meticais

janeiro

146,4 143,5

março

abril

100,8 121,2 20,4 100,8 121,2 15,9 130,1 117,6

fevereiro

133 89,9 133,9 66,6 133 88,1

-44,9 julho

-49,6

fevereiro

março

abril

maio

junho

julho

8,73 9,22 0,49 5,26 5,33 0,07 5,25 4,96

agosto

-1,51

14,1 9,46

março

abril

11,54 13,78 2,24 14,23 7,93

-6,3 maio

12,28 7,71

-4,57 7,38 5,37

junho

11,98 5,96

-6,02 9,24 7,01

-2,23 138,3 88,7

8,92 9,99 1,07

-4,64

-2,01

-67,3 julho

7,41 4,07

-0,29

-43,1 junho

janeiro

-3,34

-12,5 maio

6,01 4,02

-1,99

-2,9 fevereiro

janeiro

julho

14,1 11,99

-2,11 8,52 7,01

agosto

-5,2

11,8 6,6

Nota Televisão: A EMS monitoriza quatro estações, nomeadamente a TVM, STV, Miramar e Tv Sucesso. Rádio: A EMS monitoriza cinco estações. A RM, Super FM, Miramar, Sfm e Cidade FM Imprensa escrita: A EMS monitoriza os principais jornais e revistas nos formatos físico e electrónico

publicitário deixou de ser exclusivamente para estimular o consumo tendo passado a lançar mensagens positivas de combate ao coronavírus, já que todos nós tínhamos de aprender a encarar uma situação nova. É uma atitude muito proactiva”, assinalou. De acordo com a EMS, a expectativa é de que a quebra de investimento em relação ao ano passado seja, no final do ano, de 20%. Ainda assim, nota sinais positivos no horizonte. “Em Moçambique estamos a reagir bem a tudo isto. Estamos no Hemisfério Sul e temos a vantagem de antecipar medidas que o Hemisfério Norte tomou.” Num olhar mais macro, a força da publicidade depende da pujança da economia. A consultora World Advertising Research Center (WARC) – um dos maiores fornecedores globais de dados para as comunidades globais de marketing,

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publicidade, media e research – projecta que o investimento publicitário global cresça 6,1% para 573 mil milhões de dólares, ainda assim, 9 mil milhões abaixo do nível de 2019, na pré-pandemia. Baseia-se na previsão do FMI, que estima uma retoma económica global de 5,8% no próximo ano. E com a realização dos Jogos Olímpicos de Tóquio e do Campeonato Europeu de futebol – o EURO 2021 –, as grandes marcas vão impulsionar o mercado da publicidade ao nível global. Por cá, o crescimento é expectável, com os grandes investimentos do gás a iniciarem projectos e com a chegada de milhares de expatriados ao País, no primeiro semestre. Mas com a vacina do Covid-19 ainda longe de ser real e a crise social, nos modelos de negócio, hábitos de consumo, na mobilidade e na utilização dos media” é melhor ver para crer. www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020



Nação O que procuram os moçambicanos no Google? Como a análise detalhada das pesquisas no Google pode levar a um melhor conhecimento do mercado... sobre si próprio, até porque a publicidade está cada vez mais orientada para o digital

s

empre que alguém faz um clique para procurar uma empresa, marca ou serviço no Google está a alertar para a importância do que procura. E se o conjunto de buscas puder traçar uma tendência clara sobre o que uma determinada sociedade está a ‘buscar’ online num determinado intervalo de tempo, está dado o ponto de partida para que quem analisa esses dados possa direccionar a criação de produtos e serviços que possam responder à tendência determinada por uma sociedade. Trata-se de uma prática cada vez mais generalizada, e bastante comum em diversos mercados mais amadurecidos que Moçambique, mas que começa, também por cá, a merecer alguma atenção por parte de quem analisa este tipo de estatísticas fornecidas pelo Google. Dados para se começar a trabalhar neste tipo de informação já existem. Neste caso, a E&M analisa o período que vai de Junho do ano passado a Setembro do presente ano, uma linha temporal que abrange praticamente o período desde que se soube do primeiro caso de coronavírus na China. Ainda assim, são dados que se revestem de relevância substancial no contexto pandémico. Segundo a directora-geral da agência de comunicação e publicidade YoungNetwork Moçambique, Alexandra Lopes, “a melhor forma de comunicar com o público em ambiente de confinamento social é através das plataformas digitais,

por isso vimos os números de interacção nas redes sociais a aumentar, o número de visitas a sites a subir e o acesso à internet a ser uma constante. As marcas acompanharam a mudança e reforçaram a sua comunicação, passando a fazer grande parte do investimento publicitário no digital”. E como estamos a falar em publicidade no contexto da actividade empresarial e das marcas, vamos focar a abordagem nas pesquisas que os moçambicanos fazem a estes itens na ferramenta da Google. Baseamo-nos na parceria que a E&M e o Diário Económico têm com a sul-africana Market Technologies, ao nível da partilha dos dados fornecidos pelo serviço gomarket.io, um motor de busca com mais de 300 mil empresas registadas e que tem operações em Moçambique, bem como em Angola, para falarmos do universo dos países de língua portuguesa. Emprego, educação e saúde são os favoritos A tecnologia confirma o que todos sabemos e que há muito foi apurado pela realidade no terreno e compilado em estudos sobre o desenvolvimento socioeconómico do País. A Market Technologies traz o total de pesquisas captadas de 1 de Junho de 2019 até 30 de Setembro de 2020, num total de 1,53 milhões. Olhando para o ranking desse período, chega-se à conclusão de que os sectores que predominaram são emprego, educação e saúde. Os sites de informação e do entretenimento seguem-

Os sectores que predominaram nas buscas do Google são emprego, educação e saúde, seguindo-se os sites de informação e do entretenimento

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-se nas preferências. Se atentarmos às dez entidades mais pesquisadas, o topo da lista é encabeçado por uma empresa de recrutamento, a Emmoza, com um total de cerca de 8,5 mil buscas neste período. Segue-se a Moz Mix, uma ferramenta tecnológica que facilita o download de música, com quase 8 mil buscas. Mais para baixo, até à décima empresa mais procurada, há uma alternância entre instituições de saúde e de ensino superior (ver gráfico), com a excepção do Instituto do Coração (ICOR) e Lusomundo, que são dos sectores da saúde e do entretenimento, respectivamente. Embora a Market Technologies não explique em que momento específico a busca por cada uma daquelas empresas terá sido maior, tudo indica que a procura pelo ICOR terá tido o pico no período da pandemia que vivemos, por ser uma das instituições mais solicitadas para tratar pacientes infectados pelo covid-19. O mesmo é válido para o Cinema Lusomundo, que terá sido muito solicitado para tornar menos sofrida a obrigatoriedade de ficar em casa. www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


Marcas As mais procuradas no Google Estes dados dão a clara indicação das empresas, produtos e serviços que os moçambicanos mais procuraram na internet e confirmam a já conhecida preocupação com o emprego, sendo a saúde e a educação impulsionados pela eclosão da pandemia (quantidade de buscas na Google de 1 de Junho de 2019 a 30 de Setembro de 2020)

emmoza

8439 moz mix

7942 hospital privado

7207 inst. técnico de moç.

6851 inst.foco

5848 ipet

4294 gotvmoç

4271 club of moz.

3729 icor

2888 cinema lusomundo

2769 O digital começa a dominar... e vai imperar Segundo a directora-geral da agência de comunicação e publicidade YoungNetwork Moçambique, Alexandra Lopes, toda a tendência para publicitar mais nos meios digitais era já expectável a avaliar pela evolução dos hábitos de consumo. Mas a pandemia tornou o processo ainda mais célere e incisivo, com a adaptação a ser realizada progressivamente e uma taxa de aceitação acima do esperado. “Hoje vemos marcas a investir no mundo digital de uma forma muito mais activa e recorrente, com uma maneira de comunicar, quer em redes sociais, quer noutras plataformas, muito mais regular e patrocinada. Os sites ganharam outra vida, o e-commerce e o e-mail marketing também, e assim vai continuar por bastante tempo, porque a ‛revolução′ digital está a acontecer e os consumidores estão cientes de que este é o caminho, de que esta é a nova realidade de compra e, como tal, têm também de se adaptar”, constatou. Mas esta aceleração, de acordo com a directora-geral da YoungNetwork, não significará o fim dos meios tradiwww.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

cionais, já que “a assessoria de comunicação ganhou um peso gigante para esta gestão de crise, tudo porque a notoriedade das marcas está a ser medida pelos consumidores… daí que é necessário reforçar a comunicação das marcas, em todos os meios de comunicação, incluindo jornais, televisões e rádios”, defende Alexandra Lopes. Receita da Google cresceu 13% no primeiro trimestre Apesar da crise que se abate sobre a economia global, a Google anunciou que a sua receita aumentou 13% no primeiro trimestre do ano em relação a igual período do ano passado, atingindo o patamar dos 41,2 mil milhões de dólares. Na ocasião, a expectativa da presidente da área financeira da empresa, Ruth Porat, para o segundo trimestre, era de muita dificuldade para o sector da publicidade, que continuava sendo o maior impulsionador de receita da empresa. A multinacional norte-americana ainda não publicou dados mais actuais, mas em Abril já confirmava que as

medidas de isolamento social adoptadas por alguns países influenciaram numa maior demanda por serviços como aplicativos e streaming de vídeos. “Nos EUA, a actividade de pesquisa relacionado com o coronavírus teve o seu pico quatro vezes maior do que durante o pico do Super Bowl (jogo da final do campeonato da NFL, a principal liga de futebol americano, que decide o campeão da temporada e com muita audiência)”, afirmou, na altura, o CEO do Google, Sundar Pichai. O download de aplicativos do Google Play aumentou 30% entre Fevereiro e Março do presente ano e o executivo ainda destacou a transmissão ao vivo do show do cantor italiano Andrea Bocelli durante a Páscoa, em Abril, que teve mais de 39 milhões de visualizações. Por outro lado, a empresa observou uma redução das activações de dispositivos no primeiro trimestre devido à queda na demanda global do consumidor – sem especificar números. Ainda assim, o Google possui mais de 2,5 mil milhões de dispositivos activos mensais do Google Play.

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Nação

Mercado global da Publicidade asfixiado… ao ritmo da pandemia Depois de movimentar 582 mil milhões de dólares ao longo do ano passado, o mercado da publicidade deve conhecer um desinvestimento de 42 mil milhões em 2020. E não será por acaso. Afinal, as marcas mais valiosas do mundo podem perder até um bilião de dólares este ano...

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Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R. novo coronavírus infectou o mercado global da publicidade de tal forma que há analistas que até vaticinam a aceleração da “morte dos meios de comunicação tradicionais” que, de qualquer forma, acabarão por ceder ao rápido crescimento da digitalização. Além disso, as marcas mais importantes do mundo poderão sofrer perdas de até 1 bilião de dólares, o que justifica a desaceleração que se espera nos gastos em propaganda. Mas já lá vamos. O mais importante a esclarecer, em princípio, é que o mercado publicitário mundial é determinado

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pela dinâmica dos países desenvolvidos, onde as marcas, tradicionalmente, realizam investimentos milionários para manterem a sua exposição, factor que acaba por ser determinante no seu volume de vendas, na sua posição face à concorrência, nas suas vendas, no seu crescimento e no seu sucesso. Assim, tendo sido as mais afectadas, não admira que sejam as economias mais avançadas que assistiram a um desinvestimento mais acentuado. O grupo IPG Mediabrands, uma consultora presente em mais de 130 países e com uma equipa de 10 500 especialistas em marketing, comunicação, media e tecnologia, estima

em 42 mil milhões de dólares a redução de investimento publicitário em 2020 face ao ano passado, quando foram investidos 582 milhões de dólares, uma quebra de 7%. E calcula que as regiões da Europa, Médio Oriente, África e a América do Sul deverão ser as mais afectadas pela desaceleração do investimento publicitário. Em conjunto, estas regiões representam uma quebra de 10%. Já a região da Ásia e Pacífico deverá ser “marginalmente mais resiliente”, recuando 8,5%. As previsões do IPG Mediabrands tomam como base a “grave recessão económica desencadeada pela pandemia da Covid-19, que vai provocar www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


Mercado publicitário projectavam no período pré-pandémico, quando havia optimisto em relação ao desempenho do sector, as perdas ascendem a 96,4 mil milhões de dólares. Derrota dos meios tradicionais… Nas últimas duas décadas, com os peritos a preverem a morte dos formatos tradicionais dos meios de comunicação perante o avanço das plataformas digitais, analistas da WARC estimam que a pandemia poderá ser o factor decisivo dessa iminente extinção. Para argumentar, socorrem-se da elevada redução dos gastos em publicidade com todo o tipo de formatos de meios de comunicação tradicionais durante este ano. O grupo IPG Mediabrands avisa que,

… Triunfo do digital Facto constatado pelos especialistas das duas consultoras que citámos é que as quebras no investimento em meios tradicionais têm estreita ligação com as alterações dos hábitos de consumo de informação imposta pelo isolamento social. Com os consumidores a passarem muito mais tempo em casa, as marcas estão a atribuir mais dólares a certos formatos de meios de comunicação. Por exemplo, analistas do IPG Mediabrands revelam que o consumo do streaming de vídeo, assim como o consumo de SVOD (box das operadoras) e OTT (plataformas over-the-top, como Netlfix e Eleven Sports) acelerou durante o confinamento. Analistas da WARC acrescentam que estas

A previsão é que os investimentos em televisão diminuam 12% este ano, principalmente devido ao cancelamento de muitas campanhas televisivas e ao adiamento de grandes eventos desportivos. Também se prevê uma redução em jornais e revistas na ordem de 32%, e de 15% em rádio uma contracção do PIB entre 5% e 12% nos maiores mercados do mundo”. Ou seja, as empresas vão ressentir-se dos efeitos económicos do surto epidemiológico do novo coronavírus e deverão continuar a reduzir os orçamentos para investir em publicidade. Os cenários mais complexos concentram-se sobretudo na Europa, nomeadamente na Espanha (-14%), França (13%) e Itália (-15%). Fora da Europa, o destaque é o Japão (-14%). Um pouco mais pessimista, o World Advertising Research Center (WARC) – um dos maiores fornecedores globais de informações, conhecimentos, percepções e dados para as comunidades globais de marketing, publicidade, media e pesquisa – também faz um prognóstico semelhante ao do grupo IPG Mediabrands, ao prever a queda do investimento publicitário este ano. A diferença é que, enquanto esta última estima a redução em 7%, correspondente a 42 mil milhões de dólares, a WARC prevê “uma contracção brutal de 8,1% - que se eleva a quase 50 mil milhões de dólares”. Trata-se de uma tendência que, segundo a WARC, contraria a projecção anterior à eclosão do Covid-19 e que previa um crescimento do investimento global na publicidade em 7,1% em 2020. Olhando para os números que se www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

ainda em 2020, o investimento no mercado global da publicidade deverá registar um “forte declínio” nos meios não digitais, nomeadamente na ordem dos 16%, para 238 mil milhões de dólares. A análise ao mercado aponta para que a televisão, imprensa escrita, rádios e formatos out-of-home (OOH) – indicador para publicidade em outdoors e cinema, por exemplo – sejam os canais publicitários mais prejudicados. A previsão é que os investimentos em televisão diminuam 12% este ano, principalmente devido ao cancelamento de muitas campanhas televisivas e ao adiamento de grandes eventos desportivos (lembrando que, entre outros, os jogos olímpicos de Tóquio, o EURO e o Campeonato Africano das Nações em futebol ter-se-iam realizado este ano). Também se prevê a redução do investimento publicitário em jornais e revistas na ordem de 32% e de 15% em rádio, que terá sofrido pela redução de circulação de veículos, visto que são as deslocações de carro que representam grande parte da audiência diária. Também por haver menos carros e pessoas a circularem sofreu a publicidade out-of-home, canal que era mais dinâmico antes da pandemia, e que deverá registar uma quebra de cerca de 22% no investimento publicitário.

plataformas “estão a transmitir o dobro dos produtos de vídeo em serviços como a Netflix, em comparação com o ano passado”. Essencialmente, segundo a WARC, “a obrigatoriedade de permanência em casa aumentou a confiança dos consumidores nos serviços de telecomunicações para permanecerem ligados aos seus entes queridos e trabalharem a partir de casa. Além disso, a pandemia provou ser um ponto de viragem para a indústria das telecomunicações, uma vez que a importância de velocidades mais rápidas da internet é enfatizada e o potencial de 5G é realizado”. Com todas estas vantagens ressaltadas, espera-se que o investimento publicitário cresça 1%, para 302 mil milhões de dólares este ano. Este crescimento, segundo o IPG Mediabrands, poderá atenuar a recessão que se fará sentir nos meios não digitais. Assim, a consultora conclui que “os investimentos em meios digitais devem manter-se estáveis, tendo em conta que a recuperação do segundo semestre deverá compensar a redução do primeiro semestre. Os formatos digitais vão beneficiar do aumento da sua utilização durante o confinamento, com uma aceleração do comércio electrónico que provavelmente sobreviverá no

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Nação recuo é inevitável… Estimativas do grupo IPG Mediabrands estimam que o mercado publicitário global terá uma quebra de 7% este ano em comparação com o ano passado, para 540 milhões de dólares, com uma recuperação em 2021, ainda assim, abaixo do investimento de 2019. Em mil milhões de dólares

2019

582

Projecção 2020

Previsão 2021

540

573

… com uma queda acentuada em todos os meios O confinamento desestimulou o investimento em publicidade para todos os meios que não são digitais, com magnitudes diferentes, obviamente

Televisão -12%

Entre Março e Maio de 2020, durante o período de isolamento, o consumo de televisão aumentou entre 10% e 40%, um crescimento que deve ser corrigido no 2º semestre e explicar a quebra do investimento publicitário em televisão.

Imprensa -32%

Sem pessoas a circularem, assistiuse à redução da circulação de jornais e revistas em formato físico, o que de certa forma desestimulou o investimento publicitário nestes meios.

Rádio -15%

O formato rádio “sofreu um grande abalo, tendo em conta que as deslocações de carro representam grande parte da audiência diária”, explica o estudo ao justificar a razão da queda do investimento publicitário.

Out-Of-Home -22%

Fazem parte deste grupo os outdoors. Segundo a pesquisa, também sofreram uma redução assinalável, chegando a registar quebras entre 60% e 80% na América do Norte e na Europa, no segundo trimestre. fontes IPG Mediabrands e WARC

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pós-pandemia e um aumento das ferramentas de marketing clássicas nos tempos de recessão”. Marcas sofrerão perdas brutais: 1 bilião USD Afinal, não é por acaso que se vai assistir ao recuo do investimento publicitário. Recentemente, previsões da Brand Finance apontaram que as 500 marcas mais valiosas do Mundo perderão um total de um bilião de dólares devido aos efeitos da pandemia. Segundo a consultora, aviação, combustíveis, turismo, lazer, restaurantes e comércio retalhista deverão ser as áreas mais afectadas pela crise pandémica em termos de valor de marca. “A pandemia é agora uma grande ameaça global para a saúde e o seu impacto nos mercados é muito real”, disse David Haigh, da Brand Finance. Segundo o responsável, marcas de todos os sectores têm de estar preparadas para consequências massiças nas respectivas actividades, cadeias de abastecimento e receitas. “Os efeitos sentir-se-ão bem para lá de 2021”, prevê o especialista. No sentido inverso, marcas de áreas como entrega de refeições, videochamadas ou streaming de conteúdos sairão vencedoras da crise – Uber Eats, Zoom, Netflix e Disney são alguns exemplos dados pela consultora. Há ainda que ter em consideração as marcas cujo valor não deverá ser influenciado pelo novo coronavírus, nomeadamente nas áreas de telecomunicações, farmacêuticas ou imobiliário, que não deverão subir nem descer. Olhando exclusivamente para as insígnias de luxo, a Brand Finance indica que o prejuízo total irá ascender a 30 mil milhões, esperando-se uma quebra de 30% no seu valor. A justificação reside no recuo do consumo e nas restrições à circulação internacional. Neste segmento, as marcas têxteis deverão ser as mais afectadas, antecipando-se uma descida de 20% no seu valor. Seguem-se as fabricantes automóveis, também menos procuradas num ano de pandemia. Por outro lado, cosmética e cuidados pessoais mostram-se protegidas. Ainda assim, o top 10 das marcas de luxo mais valiosas apresenta um aumento no seu valor individual: a Porsche surge em primeiro lugar com uma subida de 15,6%; Gucci logo a seguir, com mais 20,2%. www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020



megafone Absa Bank na edição especial do Mozgrow Tratava-se de mais uma ocasião de partilha de ideias para desenvolver o agronegócio

Access Bank inicia cooperação com a APIEX O objectivo do protocolo de cooperação entre as duas instituições é promover e divulgar oportunidades de negócio no País, bem como a implementação de projectos de investimento. Trata-se de um memorando assinado recentemente e que estabelece um relacionamento estratégico entre as duas entidades. “O protocolo permite ao Access Bank trabalhar de forma estratégica com a Agência para a Promoção de Investimento e Exportações (APIEX), facilitando contactos com potenciais investidores e exportadores em Moçambique”, refere a instituição financeira em comunicado.

Banco Moza abre mais duas agências A instituição conta desde Setembro com mais duas agências, uma nos arredores da cidade de Lichinga, capital provincial de Niassa, no norte do País e outra em Dondo, na província de Sofala, Centro. Com estas agências, o Moza passa a estar representado em todas as capitais provinciais, para além de outras grandes cidades e alguns distritos, sendo actualmente o banco com a terceira maior rede bancária. De acordo com o PCA do Moza, João Figueiredo, pretende-se, com esta inauguração, estar cada vez mais próximo dos clientes e população no geral.

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contribuir para estimular o desenvolvimento, crescimento e competitividade da actividade económica no País através da promoção do agro-negócio e da sua cadeia de valor foi o objectivo da participação do Absa Bank na II Edição do MOZGROW que teve lugar recentemente em Maputo. Desta vez realizado virtualmente devido à pandemia, o evento foi alusivo à semana da alimentação sob o lema: “Produzir, valorizar, nutrir e preservar”. De acordo com o director da Banca Corporativa e Investimento do Absa Bank Moçambique, Bernardo Aparício, a sua instituição tem-se posicionado estrategicamente na apresentação de soluções inovadoras que permitam aumentar a disponibilidade de serviços financeiros para potenciar e estimular o sector de agro-negócios em Moçambique. “É neste âmbito que decidimos abraçar esta iniciativa com os nossos parceiros”, frisou. O debate visava incentivar todos os intervenientes do sector do agro-negócio a trabalharem de forma articulada para aumentar a disponibilidade, acessibilidade e qualidade no fornecimento de alimentos essenciais para a segurança alimentar e nutricional, ao mesmo tempo que potencia cada vez mais o produto nacional.

O Absa Bank Moçambique, SA. faz parte do Absa Group Limited, um Grupo Africano de serviços financeiros. Está listado na Bolsa de Valores de Joanesburgo, na África do Sul, um dos maiores grupos de serviços financeiros diversificados em África, com presença em 12 países em todo o Continente e com cerca de 42 mil funcionários.

JLA Advogados eleita melhor sociedade de África JLA Advogados, sociedade de advogados moçambicana, parceira da Abreu Advogados, foi eleita, recentemente, como a melhor sociedade de advogados do ano no mercado africano, nos prémios internacionais African Legal Awards 2020, uma iniciativa da editora Law.com International. Actuando no mercado moçambicano há dez anos, Zara Jamal, sócia da JLA Advogados, considera a sua eleição como uma das maiores conquistas da comunidade jurídica em África. A JLA conta, em Moçambique, com uma equipa de dez advogados que se dedicam a grandes projectos de investimento estrangeiro.

Coca-Cola entra no mercado das bebidas alcoólicas A companhia Coca-Cola prepara-se para lançar a sua primeira bebida alcoólica nos Estados Unidos da América (EUA). A dona de marcas como Coca-Cola, Sprite ou Fanta fechou uma parceria com cervejeira Molson Coors Beverage para desenvolver uma versão com álcool da água Topo Chico. Segundo a companhia, o lançamento da novidade está previsto só para o próximo ano, e marca um ponto de viragem na estratégia da gigante de bebidas. Actualmente, apenas a América Latina e Japão contam com produtos com álcool da Coca-Cola. www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020



mercado e finança “Crescemos sempre nas grandes crises e viemos para ficar” O Access Bank acaba de entrar no mercado moçambicano com uma ambição desmedida: a de se intrometer na luta dos bancos que lideram o mercado com o intuito de se constituir enquanto uma instituição financeira universal de “referência no mercado nacional. À E&M, Marco Abalroado, Administrador-delegado do Access Bank Moçambique, explica como o quer fazer

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Texto Pedro Cativelos • Fotografia Mariano Silva:

uma das notícias do ano no sistema financeiro moçambicano — Um novo banco a entrar num mercado ainda pouco amadurecido já seria um acto de coragem estratégica. Fazê-lo, no contexto actual, ainda será mais ousado. Claro que, quando se começou a preparar a expansão do Access Bank para Moçambique, se estava longe de prever que o covid-19 viria aí. No entanto, nem isso fez recuar um dos maiores bancos africanos de se aventurar num mercado bancário nacional, que tem especificidades muito próprias. É pequeno, tem crescido pouco e é dominado por dois grandes bancos predominantemente de retalho. Ganhou um novo fôlego com a previsão de entrada em cena dos projectos de oil & gas da bacia do Rovuma e com algumas (ainda poucas) empresas que se vão habituando a recorrer à banca dentro dos standards de boas práticas. Mas voltando ao Access, e fazendo-se valer do background que traz do mercado nigeriano ao nível da participação no financiamento de grandes projectos de oil & gas, por via do acesso a financiamento às grandes praças financeiras mundiais, entrou no mercado com o anúncio da aquisição do bancABC (ainda a aguardar aprovação final do regulador), como forma de aproveitar a rede de agentes bancários e os balcões que o Abc detinha

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no País. Moçambique é o segundo mercado da região da SADC para o qual o Access Bank se expandiu, depois da Zâmbia, e o primeiro num de expressão portuguesa. Para o Administrador-delegado da instituição, Marco Abalroado, ter entrado neste momento conturbado da economia global não afasta a “expectativa de retoma do bom desempenho que se espera para 2021 e 2022, graças ao avanço dos projectos de Cabo Delgado” que, afinal, se assumem como o principal chamariz à sua entrada no País. Como ponto de partida, pedia-lhe para resumir o processo de entrada do Access no sistema financeiro nacional. Há dez anos que o Access Bank não abria uma nova subsidiária e Moçambique é a primeira que estamos a abrir. Tudo começa em Junho de 2018. O banco tinha grande concentração na África Central e começou a expandir para outros mercados, nomeadamente para a SADC onde estamos a abrir algumas operações. Mas notámos que o mercado de Moçambique é quase natural para a estratégia de expansão do Access Bank. Por que razão? Entrámos no País no momento certo, em que grandes projectos terão impacto bastante grande na economia e vão crescer. O processo de licencia-

mento bancário é longo. Há uma autorização inicial, depois há um conjunto de necessidades elencadas pelo Banco Central que é necessário cumprir, a começar pelo Capital até aos estatutos passando pelos órgãos de gestão, entre outros procedimentos. Esse período durou até Outubro do ano passado, em que tivemos a aprovação e o registo como entidade financeira do mercado. Seguiu-se um processo que era o da aprovação do espaço físico, também com um conjunto de aprovações regulamentares e que culminou, em Setembro, com a aprovação da agência bancária e a autorização para realizar transacções. A licença de direito já existia desde Fevereiro deste ano. No processo, há a questão da operação da compra do bancABC. Como podemos olhar para esta operação à luz da vossa estratégia? Tínhamos um projecto de expansão previsto para iniciar em Março deste ano mas que, infelizmente, devido ao covid-19, atrasou. No entanto, os astros alinharam-se e o timing foi quase igual entre o anúncio da abertura e o anúncio da proposta www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


Entrevista

“O Access Group e o Access PLC têm, hoje, um rating superior a quase toda a banca africana, tem o maior banco africano a operar o Reino Unido e isso dá-nos acesso privilegiado aos mercados internacionais” da aquisição do bancABC, que também foi um processo longo. O Access Bank é um banco cujo historial é de um crescimento orgânico e inorgânico, portanto, estamos sempre atentos a possibilidades interessantes no mercado, sejam fusões ou aquisições de outros bancos. Nesta fase é importante termos a banca mais consolidada e mais forte e acreditamos que juntos farão, com toda a certeza, um banco mais forte caso a operação seja aprovada pelo Banco Central. O que é que o bancABC aporta a este início de actividade do Access que entrou com “dinheiro fresco” e com uma aquisição de um banco que já tinha o seu lugar no mercado? O projecto de expansão que temos é bastante agressivo. É bom lembrar que, quando tomámos a decisão de investimento em Moçambique, os limites regulamentares em termos de capital situavam-se, grosso modo, em torno www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

dos 25 milhões de dólares, mas decidimos trazer 35 milhões de dólares de capital social, que acabaram por se transformar em 39 milhões por questões cambiais. Como tal, isso demonstra a aposta que o banco está a fazer em criar uma instituição de média dimensão. Mesmo a estruturação de pessoas que fizemos no banco mostra isso mesmo. Estamos hoje com cerca de 70 pessoas e vamos acabar o ano com mais de 100. Em termos de estrutura isso já nos dá a dimensão de um banco médio, mas estamos já preparados para o passo seguinte. Qual é esse passo, lutar com os dois maiores bancos? Como disse, há um projecto de expansão natural. Para já, o objectivo era chegar a todas as províncias em dois anos e meio ou três anos. Com a compra do bancABC, se tiver sucesso, vai permitir, em primeiro lugar, encurtar substancialmente este

período. Se calhar o mercado não tem noção, mas o BancABC é bastante interessante. Nas áreas onde lidera, nomeadamente nos agentes bancários, fez um excelente trabalho de inclusão financeira nos últimos tempos, tem um portefólio de produtos e clientes bastante interessante, além de se ter reestruturado bem e transmitir-nos confiança clara de que será uma unidade bastante boa. Do nosso lado, acrescentamos o aporte digital, de inovação e de retalho que temos por natureza e abrimos a porta a mercados internacionais e financeiros que nos permitem olhar de outra maneira para os clientes corporate, bem como às facilidades que podemos criar para os importadores e exportadores do mercado. O Access Group e o Access PLC têm, hoje, um rating superior a quase toda a banca africana, têm o maior banco africano a operar o Reino Unido e isso dá-nos acesso privilegiado aos mercados internacionais, quer da componente de project finance, quer de capitais internacionais, investimentos. Acreditamos que por aqui temos uma mais-valia.

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Nação Sendo Moçambique um país que se situará entre os maiores produtores de gás em África, como é que vão “atacar” essa área cá? Ao nível directo dos grandes investimentos ou apontam mais à cadeia intermédia de valor e às empresas nacionais? O Oil & Gas foi, naturalmente, um driver fundamental. Até porque grande parte dos maiores players mundiais do sector são já nossos clientes, portanto, temos uma relação privilegiada e de parceria com a maior parte deles e isso permite-nos entrar com um background que nos ajuda em termos de estruturação de operações ou de relacionamento. Sabemos como definir e projectar as necessidades que o País e estas empresas vão ter. Não só estas, mas toda a cadeia de valor que vai ser criada terá um impacto tão grande ou maior na economia do que propriamente os investimentos iniciais, recordando que grande parte destes são feitos internacionalmente porque os bancos nacionais não têm capacidade para o fazer. A nossa participação, em primeiro lugar, vai passar por aí. Estamos já a negociar e seremos um dos poucos bancos a entrar no financiamento internacional de alguns destes mega-projectos (em Moçambique, apenas o FNB por via do Rand Merchant Bank e o Standard Bank entraram no consórcio de entidades que financiaram em 15 mil milhões de dólares o empreendimento da Área 1 da bacia do Rovuma). Mas o nosso objectivo é entrar e ajudar a economia numa perspectiva global, no financiamento ao nível da dimensão do grupo, mas também localmente em toda a cadeia de valor em que acreditamos ter mais-valias de conhecimento, experiência e de produtos maturados noutras geografias. Como é que o Access Bank se vai posicionar no mercado bancário nacional? Vai ser um banco universal. É preciso que isto fique bem claro. Apesar de, numa fase inicial não termos uma rede de agências ou agentes que nos permite afirmarmo-nos como um banco de retalho, é para aí que queremos ir. Essencialmente, queremos ser um banco universal com uma forte estrutura de retalho e presença em todo o País, e capacidade de ter produtos para todos os segmentos, desde os pequenos aos mega-projectos.

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Os projectos de gás foram os principais chamarizes do grupo Access a Moçambique

Decidir lançar um novo banco num mercado ainda incipiente, e depois ver a economia mundial mergulhar na maior crise dos últimos 100 anos, fez com que os objectivos se mantivessem ou houve alguma mudança em termos de previsão do que estava planeado em relação à vossa operação no País? Bem... Sim e não! O grupo tem um histórico muito peculiar. Felizmente, em todas as grandes crises mundiais e continentais nesta última década e meia foram exactamente os momentos em que o banco mais cresceu e em que tomámos a decisão de aquisições adicionais. Não quer dizer que as crises não tenham impacto, mas acredito que criámos uma política de mitigação de risco com standards elevados e estamos ligeiramente mais bem preparados para estas situações de stress económico. E por estarmos focados no mercado africano, temos alguma resiliência extra e não estamos tão sujeitos ao que se passa no mercado internacional. Mas, de facto, mentiria se dissesse que não houve impacto. Há uma parte significativa de tudo isto

que está dependente de consultores e equipas externas que não conseguem viajar, os próprios materiais e equipamentos também atrasaram. Portanto, há um conjunto de atrasos, não muito grande, que nos adiaram em três meses a entrada em operação. Em relação ao resto das decisões, obviamente que nada mais se podia fazer com celeridade. Já devíamos estar a lançar novos balcões e não estamos a fazer por causa disso. Estivemos a repensar todo o modelo de funcionamento ao nível do grupo. Tivemos alguns meses de adaptação à nova realidade e agora estamos substancialmente mais alinhados. Diz-se que a banca é excessivamente dependente do exterior, no sentido que, à excepção do Moza, os restantes não são originários de Moçambique. Esta é uma questão relevante ou é uma falsa questão? Acredito que seja uma questão relevante e estes últimos anos provaram-nos isso. Sem falar na nacionalidade dos bancos, porque não será esta a questão central, o que temos visto www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


Uma questão que se falou muito há dois anos tem que ver com a mudança do provedor das plataformas de pagamento dos caixas electrónicos, que passa a envolver a Euronet. Vocês já entraram para o novo sistema? Vamos ser o primeiro banco a entrar no novo sistema da SIMO-Euronet. Aliás, temos estado a trabalhar em conjunto com a SIMO, nos últimos meses, em toda a componente de certificações, que está muito para breve e acreditamos que, nas próximas semanas, teremos novidades para anunciar ao mercado. Como é a relação entre os bancos? Como é que o Access é acolhido pelos demais, incluindo o Banco de Moçambique? Ajuda muito o facto de eu pessoalmente ter já dez anos neste mercado que é pequeno e onde quase toda a gente se

provavelmente, perto de 9000, mas não se consegue ter experiência suficiente para suprir todas as necessidades que existem. Dito isto, a parte da academia é fundamental. Nós temos a nossa universidade na Nigéria, e os bancários do Access cumprem lá um período de seis meses intensivos e os resultados são impressionantes. Aqui não há ainda uma parceria em que as instituições financeiras possam montar uma escola agregada, além do Instituto de Formação Bancária que já o faz. Contamos mandar para a nossa universidade entre 50 e 100 pessoas por ano. Olhando para a economia nacional, de onde é que pode vir o desenvolvimento que há tanto tempo se espera? Cheguei em 2010 e dizia-se que o gás sairia em 2018... Estamos em 2020 e

“Felizmente, em todas as grandes crises mundiais e continentais nesta última década e meia foram exactamente os momentos em que o banco mais cresceu e em que tomámos a decisão de aquisições adicionais”

é que as crises a que assistimos na Europa e nos Estados Unidos levaram a maior parte dos bancos a fecharem as suas operações em África. Isso causou um impacto muito grande por questões de risco internacional, por políticas internas e, às vezes, por ratings e problemas de países…. De facto, causa um impacto substancial e há aqui uma disrupção nas operações. Aliás, assistimos nos últimos anos, mesmo em Moçambique, Angola e um pouco por toda a África, a bancos que saíram. E a visão do Access Bank é ser o banco africano mais respeitado do mundo. Queremos, por tanto, criar um banco africano que consiga ter acesso a mercados internacionais à semelhança do que outros bancos internacionais têm, mas que não esteja sujeito a problemas de risco em continentes que não são o nosso. Mais uma vez, a nacionalidade não é o problema, mas, nestas alturas mais sensíveis da economia mundial, é mais simples um banco europeu fechar uma operação em Moçambique do que um banco africano fazer o mesmo. www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

conhece. Em relação ao banco propriamente dito, penso que havia, na maior parte das pessoas, o desconhecimento do que era o Access Bank. É um banco que tem pouca presença nos países de língua portuguesa (Moçambique é o primeiro) e na própria zona da SADC. Obviamente que os bancos maiores olham sempre de cima e, se calhar, é-lhes difícil perceber que haja um banco com ambição para querer ter uma forte presença no País. Mas a nossa recepção foi cordial. Há, de facto, uma ligação entre os bancos, quer nas reuniões formais da Associação Moçambicana de Bancos, do Banco Central ou da SIMO, quer nas conversas informais entre os quadros de gestão de todas as entidades. Dentro da banca há um conflito aberto pela disputa de quadros e continuam a não existir academias formadas pelos próprios bancos. Este é um tema que o preocupe? Quando cheguei a este mercado deviam existir acima de 2000 empregados bancários. Nos últimos dez anos, os bancos cresceram e hoje temos,

assinou-se agora a primeira Decisão Final de Investimento. São processos complicados numa altura em que a economia mundial e regional passa por duas crises seguidas e em que a conjuntura não é perfeita. Em termos do Oil & Gas, as coisas vão acontecer. No entanto, na minha opinião, o grande desafio do País é logístico. Muito tem sido feito, mas muito ainda haverá por fazer. Estamos perto de quatro países do hinterland que são principalmente servidos pelo Porto de Durban. Quando conseguirmos resolver o problema logístico (estradas, portos e outras infra-estruturas), vamos ter uma enorme vantagem competitiva que vai, naturalmente, facilitar as outras indústrias como a agricultura ou a mineração. Investimentos desta dimensão são complexos, demoram tempo e o próprio Governo tem de conseguir financiamento para os executar. Acredito que, dependendo do tempo que vai durar o impacto da pandemia, a partir do próximo ano ou em 2022 o mais tardar, vamos começar a sentir a economia a crescer substancialmente.

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OPINIÃO

Tchova lá — Públicas virtudes, Privada eficiência

v

João Gomes • Partner @ JASON Moçambique em o título deste artigo - Tchovar, verbo tsonga que significa empurrar - a propósito da distinção entre Gestores Públicos (GPu) e Gestores Privados (GPr). A- Do lado privado e na óptica da (in)eficácia (Fins): constatamos que as empresas privadas, com maior frequência e em crescendo, têm vindo a prejudicar massivamente o interesse público. E a prova está nos escândalos financeiros e fiscais provocados por empresas como a Enron, a WorldCom, a Lehman Brothers, a Groupon, e consequente resgate público milionário das respectivas economias. B- Já do lado público e na óptica da (in)eficiência (Meios): constatamos que as organizações públicas apresentam, na sua generalidade, um nível de performance/ output muito inferior, quando comparado com as congéneres privadas. E a prova está na proverbial queixa dos cidadãos em relação à baixa qualidade e o longo tempo de entrega dos serviços por estas prestados. Neste artigo cuidaremos de analisar, suportado em múltiplos estudos se, ao nível mais elevado da hierarquia (Strategic apex), entre os GPu´s e os GPr´s: - Existem práticas de gestão e comportamentos distintos? - E se tais diferenças poderão explicar a (in)eficácia privada face às finalidades de natureza pública. - E se tais diferenças poderão explicar a ineficiência da máquina pública em entregar a tempo e em qualidade os serviços? - E em caso afirmativo, se é possível TCHOVAR e transferir as melhores práticas entre sectores? Analisaremos o tema através das seguintes lentes: 1) Ambiente de negócios; 2) Finalidades, objectivos e metas; 3) Estrutura organizacional; 4) Valores (Ética). 1. O ambiente de negócios: Vários estudos suportam que os GPu tendencialmente operam em ecossistemas mais complexos do que os GPr porquanto: a) Respondem a interesses de natureza muito diferenciada e

muitas vezes contraditórios entre si (v.g. Procurar satisfazer simultaneamente os interesses de grupos de consumidores vs. grupos de produtores). Diversamente, no ecossistema dos GPr, é comum existir um maior foco e uma maior complementaridade entre os interesses em jogo. b) Ademais, sendo as entidades públicas “sistemas abertos”, os GPu são mais permeáveis às múltiplas e contraditórias influências externas (v.g. Segundo Índice de Transparência Internacional, 68% dos países afirma ter sérios problemas de corrupção nos seus aparelhos públicos). Diversamente, no caso dos GPr, um menor n.º de stakeholders envolvidos, processos de boa governação corporativa e mecanismos de controlo mais apertados, e tendencialmente mais efectivos, tornam-nos menos permeáveis a influências externas. c) Adicionalmente, os GPu normalmente operam em ambiente monopolístico (i.e., não competem com outros organismos públicos pela mesma clientela). 2. Finalidades, objectivos e metas: Vários estudos suportam que os GPu tendencialmente operam num contexto de finalidades, objectivos e metas mais difuso e vago do que os GPr. a) A natureza tendencialmente vaga e difusa das finalidades, objectivos e metas públicas resulta: i. De estes serem propositadamente formulados de maneira vaga e difusa; ii. Da autoria dos mesmos não ser dos GPu, antes serem gerados pelas lideranças políticas; iii. Em função da necessidade de cumprir compromissos eleitorais de muito curto prazo. Diversamente, os GPr prosseguem um conjunto mais limitado de interesses, no qual se destaca o lucro. E estes são por eles mesmos definidos, ou por um grupo muito restrito (v.g. Conselhos de Administração). Os interesses são em menor número, mais compatíveis entre si e definidos e controlados com maior rigor e precisão. 3. Estrutura e Controlo: Vários estudos suportam, e em consequência, do que ficou acima dito que os GPu tendencialmente operam estruturas mais volumosas, mais com-

A ineficácia dos GPr resulta da circunstância destes operarem sob um ideário ético baseado em valores como o egoísmo e o materialismo. E no sentido do TCHOVA lá... terão a aprender com os GPu

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Escândalos financeiros como o do Lehman Brothers, em 2008, são demonstrativos de como grandes empresas privadas podem causar danos ao interesse público

plexas e processos menos ágeis e com menor incorporação de tecnologia do que os GPr porquanto: a) Por exigências de transparência e responsabilidade pública, os GPu estão expostos a um maior nível de burocracia. Os processos de decisão são hierarquizados, complexos e exigem demasiadas formalidades. Diversamente, os GPr vivem em estruturas normalmente de menor porte, mais flexíveis, e com maior incorporação de tecnologia. Para os GPr vale o adágio” tempo é dinheiro”. b) E a consequência natural de estruturas e processos complexos é a de estes gerarem um triplo efeito colateral negativo para o GPu: i. A demora na obtenção de resultados; ii. A valorização da atitude de orientação para o processo, ao invés da valorização da atitude de orientação para o resultado, tal como diversamente acontece no caso do GPr; iii. O aumento do nível de responsabilidade, sem o correspondente aumento do grau de autoridade, tal como diversamente acontece no caso do GPr. c) Adicionalmente, os GPu detêm menor autonomia de gestão, em comparação com os seus pares GPr, porquanto não dispõem de mecanismos flexíveis de recrutamento, selecção, promoção e despedimento de subordinados e de procurement. A contrapartida é uma maior segurança no posto de trabalho para os GPu. Diversamente, os GPr têm maior liberdade para operarem, mas dispõem de uma limitada segurança do seu posto de trabalho. d) Consequentemente, a aversão ao risco ocorre com mais frequência no ambiente dos GPu, onde imperam mais as penalidades do que os incentivos. Diversamente, no ambiente dos GPr, à maior tomada de risco corresponde um maior nível de premiação, bem como a orientação para a inovação e para o Cliente. 4. Valores (Carácter e costumes): Vários estudos enfatizam que a maior diferença entre os GPu face aos GPr deriva, tendencialmente, do facto daqueles operarem sob um conjunto de valores/ideário ético muito distintos. Assim, www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

a) Os GPu são tendencialmente menos materialistas. Diversamente, os GPr são tendencialmente motivados para a procura da auto-satisfação económica. b) Os GPu tendencialmente apresentam um forte desejo de servir o “bem comum” (se objectivamente o fazem ou não, os estudos não permitem confirmar!). Diversamente, os GPr tendencialmente estão motivados em servir segmentos muito específicos de clientes. c) Finalmente, os GPu tendencialmente apresentam um muitíssimo baixo nível de engajamento organizacional. E não é estranho o facto de, nas entidades públicas, não existir, como regra, um link entre premiação/performance individual/grau de sucesso da organização. Diversamente, em média, os GPr apresentam níveis de engajamento organizacional maiores, e o link premiação/performance/sucesso está, em regra, presente. Conclusão. Em resultado da análise efectuada comprova-se que existem muitas práticas e comportamentos distintos entre GPu e GPr. A ineficácia dos GPr resulta da circunstância destes operarem sob um ideário ético baseado em valores como o egoísmo e o materialismo. E neste particular - o sentido do TCHOVA lá - os GPr muito terão a aprender com os GPu. Por outro lado, a ineficiência dos GPu resulta de operarem em ambiente monopolista, prosseguirem simultaneamente uma multiplicidade de interesses e clientelas, de curto prazo, muitas vezes contraditórios entre si, tornando-os mais permeáveis à corrupção, e motivacionalmente desligados da organização e dos resultados da sua acção. Não ajuda, também, o modo como as finalidades, objectivos e metas são definidos, de forma difusa e pouco clara. Nem tão pouco mecanismos de controlo que no papel são perfeitos, mas que na realidade, como na maioria dos processos, são ineficientes e sem ajuda tecnológica. E neste particular – o sentido do TCHOVA lá – os GPu muito terão a aprender com os GPr.

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EspecialInovação 44 ranking A revista norte-americana Fast Company, publicação de referência na área da criatividade e inovação revelou as dez empresas mais inovadoras de África. Fomos conhecê-las

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Inovagri

Uma startup moçambicana que actua na área da agricultura

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Opinião

Um olhar sobre as Edtech — A nova Realidade do Ensino

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panorama

As notícias da inovação em Moçambique, África e no Mundo


ranking

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África e o Ecossistema Global de Inovação A revista norte-americana Fast Company, uma publicação de referência no que toca às áreas da criatividade e inovação, e que lista, anualmente, as 50 empresas mais inovadoras a nível global, publicou uma lista com aquelas que considerou as dez empresas mais inovadoras de África. Fomos conhecê-las

Texto Rui Trindade • Fotografia E&M

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startup queniana Twiga Foods surge em lugar destacado mas outras start-ups daquele país, como a MPost e a Copia Global, fazem também parte deste ranking. Criada em 2014, a Twiga Foods nasceu com o objectivo de ligar os pequenos produtores agrícolas aos retalhistas. Através da sua plataforma online, estes últimos podem encomendar directamente produtos como frutas e legumes aos produtores agrícolas. As encomendas são feitas através de uma app e o pagamento por via da plataforma de pagamentos móveis M-Pesa. No ano passado, a Twiga Foods acrescentou ao seu leque de serviços uma componente fintech que permite aos fornecedores acederem a crédito para desenvol-

inovadores – os chamados hubs tecnológicos - de que o iHub foi um dos pioneiros. Criado em 2010, com um perfil que combinava o conceito de espaço de cowork com o de incubadora de startups, o iHub arrancou com base em doações de fundações e empresários, como o francês Pierre Omidyar, fundador do eBay, e operava como uma entidade sem fins lucrativos. Porém, o seu sucesso – em 2017 já abrigava 170 startups e tinha criado uma rede que conectava 17 mil profissionais – trouxe a necessidade de mudar o seu modus operandi. Nesse ano, obtém um financiamento de 2 milhões de dólares da norte-americana Invested Development, que investe exclusivamente em projectos de países em desenvolvimento e passa a posicio-

Neste momento, a Twiga Foods liga 13 mil pequenos agricultores a 5 mil retalhistas verem os seus negócios. Neste momento, a Twiga Foods liga 13 mil pequenos agricultores a 5 mil retalhistas. O seu crescimento espectacular, ao longo do último ano, permitiu-lhe obter um financiamento de 30 milhões de dólares para expandir a sua actividade não apenas a todo o País (até aqui a sua operação tem estado centrada sobretudo em Nairobi e na região envolvente) mas também além fronteiras. Entre os investidores que trouxeram este aporte à Twiga Foods encontram-se os norte-americanos da Goldman Sachs e a International Finance Corporation. O exemplo da Twiga Foods ilustra bem o dinamismo do ecossistema de inovação africano, e especificamente o do Quénia. Não é por acaso que Nairobi tem sido apontada como sendo o “Silicon Valley” de África. Esta designação reflecte um processo que se veio desenvolvendo sobretudo ao longo da última década e que passou pela criação de vários pólos tecnológicos e espaços www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

nar-se enquanto empresa com um modelo de negócio bem definido. Este exemplo do iHub fez emergir, entretanto, incubadoras em outras cidades quenianas, como a SwahiliBox, em Mombaça, e a Dlab Hub, em Eldore.

Potencial de Inovação

À semelhança do iHub, a Wennovation e o Co-Creation Hub, em Lagos, na Nigéria, a BlueMoon, em Adis-Abeba, na Etiópia, e a Bandwidth Barn, na Cidade do Cabo, África do Sul, para citar apenas alguns exemplos, contribuíram para que, em poucos anos, um ecossistema de inovação no continente fosse ganhando forma e despertasse um interesse crescente por parte de investidores internacionais. Sobretudo a partir de 2015, este “interesse” começou a ganhar um volume e escala expressivos. De acordo com a Partech Ventures, só em 2016 as startups africanas atraíram um investimento na ordem

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dos 367 milhões de dólares, valor quase dez vezes superior ao registado apenas quatro anos antes. E durante um encontro em Adis-Abeba, na Etiópia, Christine Lagarde, então directora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), destacava as inovações vindas de África, sublinhando a importância de aumentar o apoio a este tipo de iniciativas na região: “Além de ser uma oportunidade, sem paralelo, para a geração de empregos entre os mais jovens, a inovação é uma forma eficiente de reduzir o hiato de infra-estrutura do continente”, acrescentando ainda que, com os investimentos correctos, a tecnolgia “poderá ser a ferramenta mais poderosa para fortalecer a África do futuro”. O reconhecimento internacional de empresas como a queniana M-Kopa Solar, considerada pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, como uma das 50 startups mais inovadoras do mundo, devido ao dispositivo de fornecimento pré-pago de energia solar que desenvolveu, ou da nigeriana Jumia que, por via da implementação da sua plataforma de comércio electrónico, já foi avaliada em 1 bilião de dólares e considerada o primeiro “unicórnio” de África, ajudaram a projectar a imagem do continente e atrair não apenas os investidores internacionais mas, sobretudo a partir de 2018, fizeram com que gigantes tecnológicos como a Google ou o Facebook iniciassem o processo de se posicionar estrategicamente em África, até para conter os avanços das empresas chinesas no continente. Mesmo com este dinamismo, particularmente intenso nos últimos anos, e do potencial que ele comporta, o ecossistema de inovação africano continua, apesar de tudo, longe do desempenho que se verifica em outras regiões do mundo. A recente publicação do relatório “Global Innovation Index 2020”, produzido conjuntamente pelo Cornell College of Business (EUA), pelo INSEAD (França) e a pela WIPO (Organização Mundial da Propriedade Intelectual) é esclarecedor a este respeito e passível de leituras interessante a vários títulos. Em primeiro lugar, não só permite ter uma visão global – os dados apresentados resultam de uma avaliação a 131 economias mundiais – mas possibilita, devido sobretudo aos vários parâmetros de análise, ter também uma perspectiva mais fina e detalhada dos pontos fortes e fracos dos vários actores (tanto ao nível global como regional e por país). Mas, porventura ainda mais relevante, é o facto do relatório levar em linha de conta a actual conjuntura pandémica e, desse modo, constitui

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O reconhecimento de empresas como a queniana M-Kopa Solar... fez com que gigantes como a Google ou o Facebook se posicionassem em África uma ferramenta importante para antecipar os previsíveis impactos que este evento disruptor irá ter nos próximos anos em todo o ecossistema global de inovação. Vejamos então, mais pormenorizadamente, algumas das principais conclusões deste Indíce Global de Inovação (IGI) que tem como questão central a seguinte: “Quem Financiará a Inovação?”.

A Pandemia e o Futuro da Inovação

O primeiro ponto em análise procura, desde logo, traçar uma perspectiva dos possíveis impactos do Covid-19 no ecossistema de inovação. Depois de considerar que

a paralisação económica mundial surgiu num momento em que, sobretudo a partir de 2018, os investimentos em inovação estavam a conhecer um desenvolvimento muito acentuado – tanto no que toca ao sector da Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) como no que diz respeito ao Capital de Risco (CR) e ao segmento da Propriedade Intelectual (PI) – o relatório interroga-se sobre qual será a dimensão do impacto do declíno económico nestas três componentes (P&D, CR e PI). Embora não exclua a possibilidade de uma retracção acentuada, o relatório sublinha, no entanto, que, tal como já se está assistir, a pandemia poderá vir a acelerar, pelo www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


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Moçambique no Ranking Global da Inovação Na África Subsaariana, o Botsuana ocupa o 1º lugar na despesa em Educação a nível mundial e Moçambique lidera em crescimento do investimento em infra-estrutura o que se explica pela aposta na construção de data center. instituições 43,1 127

capital humano 16,1 108

infra-estruturas 37,0 83

evolução do mercado 32,2 125

evolução dos negócios 15,8 124

Conhecimento e Tecnologia

RANKING GIL 2020 Moçambique

125 contrário, a inovação em múltiplos sectores. Os principais serão, claramente, o das tecnologias de informação (e todas as dimensões relacionadas com o online, trabalho, educação à distância, comércio electrónico, etc.) e o das biotecnologias (em particular no que toca à produção de fármacos). Uma outra questão fundamental que o relatório analisa é o possível impacto da crise actual no que toca ao acesso ao CR, bem como a outras fontes de financiamento da inovação. Aqui, as conclusões são menos optimistas: “As transacções que envolvem CR estão em declínio acentuado em toda a América do Norte, Ásia e Europa. Há poucas ofertas públicas iniciais (OPI) à vista, e as startups que sobrevivem poderão tornar-se menos atraentes e rentáveis para os detentores de capitais de risco”. No que diz respeito à “geografia glowww.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

8,9 122

outputs criativos 8,2

122 Pontuação

Ranking

bal da inovação”, o relatório sublinha que a principal tendência dos últimos anos se mantém e se deve mesmo acentuar: “Ao longo dos últimos anos, a China, o Vietname, a Índia e as Filipinas são as economias com o progresso mais significativo na sua classificação no IGI relativa à inovação. Todos os quatro países estão agora no grupo das 50 principais economias mais inovadoras (...) Este ano marca a primeira vez que uma segunda economia asiática – a República da Coreia do Sul – integra o grupo das dez principais, ao lado de Singapura”. Um outro ponto que merece destaque tem que ver com a persistência de divisões regionais acentuadas no que diz respeito ao desempenho em inovação: a América do Norte e a Europa continuam a liderar, seguidas pelo Sudeste Asiático, Ásia Oriental e Oceania e, a maior distância, pelo Norte

da África e Ásia Ocidental, América Latina e Caribe, Ásia Central e Meridional, bem como África Subsaariana.

A “Heterogeneidade” Africana

Segundo o relatório, “o continente africano – que inclui a África Subsaariana e o Norte da África – apresenta um dos desempenhos em matéria de inovação mais heterogéneo entre todos os continentes. Enquanto algumas economias estão entre as 75 prinicipais (por exemplo, a África do Sul, a Tunísia e Marrocos), outras estão em posição muito inferior. Depois de referir que “os sistemas de inovação em África são amplamente caracterizados por baixos níveis de actividades científicas e tecnológicas, alta dependência de doadores governamentais ou estrangeiros como fonte de P&D, ligações ciência-indústria limitadas, baixa capacidade de absorção das empresas, uso limitado da PI e ambiente empresarial desafiador”, o relatório sublinha que, no entanto, “algumas economias dentro das regiões destacam-se porque abrigam um potencial de inovação significativo. Por exemplo, o líder típico em inovação em África tem, em geral, maiores gastos com educação (Botsuana e Tunísia) e P&D (África do Sul, Quénia e Egipto), fortes indicadores do mercado financeiro, tais como transacções que envolvem capital de risco (África do Sul), abertura à adopção de tecnologia e fluxos de conhecimento interno, uma base de pesquisa melhorada (Tunísia, Argélia, Marrocos), uso activo de tecnologias da informação e da comunicação (TIC) e criação de modelos organizacionais (Quénia), bem como uma utilização mais intensa dos seus sistemas de PI (Tunísia e Marrocos)”. Ou seja, a “heterogeneidade” do continente é sobretudo definida por uma muito acentuada clivagem entre alguns “pólos” (países/regiões) com alto desempenho e uma debilidade infra-estrutural generalizada onde, apesar de alguns parâmetros poderem ter alguma expressão significativa, não são suficientes para fazer a diferença e dar coerência a um ecossistema inovador. Por fim, note-se ainda que, apesar do dinamismo dos hubs de inovação em África, eles não integram sequer o top dos “pólos de inovação” do IGI. Isto deve-se, em parte, ao facto de que estes são classificados de acordo com a “intensidade” das suas actividades no sector da investigação em Ciência & Tecnologia, ou seja, a soma das suas patentes e publicações científicas.

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inovagri

Inovar Para Tornar a Agricultura Sustentável Da ideia à execução de um projecto inovador ‘made in’ Moçambique e premiado internacionalmente pelas garantias de sustentabilidade. No campo ou na cidade, ideias inovadoras que a tecnologia consegue materializar Texto Hermenegildo Langa • Fotografia Mariano Silva

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urgência em reduzir o impacto ambiental face à emergência das alterações climáticas que já se fazem sentir por todo o mundo está presente em várias iniciativas comprometidas com soluções sustentáveis e resilientes às transformações do meio ambiente. Em Moçambique, têm surgido algumas startup que têm seguido essa lógica, tendo já sido reconhecidas em concursos internos e internacionais ao longo dos últimos anos, uma confirmação da sua relevância. O projecto Inovagri é um desses modelos de negócio pioneiros no País, que conjuga inovação e agricultura, sendo hoje uma das startups emergentes e recentemente finalista do concurso regional de inovação verde em África, o ‘Climate Launchpad’. Mas o que é a Inovagri? “Trata-se de um projecto ligado ao plantio de hortícolas em quintais caseiros com recurso a técnicas de hidroponia, que potenciam a utilização de água, com o mínimo de recursos financeiros e técnicos. Uma forma de cultivo sustentável e geradora de income para milhares de potenciais produtores. O sistema hidropónico é uma técnica agrária que consiste no cultivo de hortas verticais com sistemas de abastecimento de água circulares que minimizam o desperdício de um bem escasso em muitas regiões do País. A empresa assenta o seu modelo de negócios na implementação destes sistemas, a custos reduzidos, sobretudo porque utiliza materiais reciclados, utilizados como sacos, vasos ou baldes, canalizações ou recipientes de hortícolas, o que tem um impacto directo ao nível da pegada ambiental. “Na verdade aplicamos técnicas inovadoras de agricultura, mas actuamos ao nível da redução do preço de implementação. A ideia passa por adaptar a tecnologia tornando-a acessível ao nosso meio.

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Queremos ser uma empresa âncora”, explica Pedro Muiambo, gestor do projecto. Assim, explica o gestor da Inovagri, numa área de 160 metros quadrados, é possível produzir diversos hortícolas poupando recursos tanto hídricos quanto financeiros. Além disso, “comparando com as técnicas normais, a redução de consumo de água anda na casa dos 90%”, revela. “Este modelo permite que os horticultores possam readaptar-se face às mudanças climáticas e aproveitarem os seus próprios quintais, topos dos edifícios, pequenas machambas comunitárias para produzirem de uma maneira mais resiliente e sustentável e terem uma produção mais eficaz e controlada que, simultaneamente, cause menores impactos ao ambiente”, sublinha. “O sistema tem também a particularidade de não usar químicos, uma vez que apostamos no uso de adubo orgânico”. Criada em 2018 com o propósito de ser uma ideia de negócio lançada especificamente para concorrer a um programa de mentoria internacional, esta startup passou do conceito à prática e provou o seu valor no mercado, algo que permitiu a sua rápida expansão. “Este ano já estamos a avançar para o nível comercial. Estamos em busca de parceiros que favoreçam a montagem de 100 estruturas hidropónicas, apenas na cidade de Maputo, para mudar por completo o paradigma da fraca produtividade que afecta a nossa agricultura”. Para já, no curto prazo, a equipa que lidera a Inovagri espera poder replicar o modelo para benefício de várias famílias que se encontram em situação vulnerável na capital do País. “Pretendemos colocar um conjunto destas estruturas hidropónicas nas casas de famílias carenciadas para que possam usar o pequeno espaço que tiverem para produzir algumas hortícolas e fazer aumentar o seu income mensal, gerando renda e novos conhecimentos”, concluiu.

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Projecto Inovagri Gestor do projecto Pedro Muiambo Ano de fundação 2018

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opinião

Sansão Monjane Head of IT do FNB

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assaram-se alguns meses desde que fomos obrigados a mudar a forma de cumprimentar, de fazer compras, de socializar e até de aprender e ensinar. O artigo de hoje fala da velocidade com que nos vimos forçados a adaptar as ferramentas tradicionais de ensino e a combiná-las com a tecnologia disponível para melhorar o nosso conhecimento e competências e até criar experiências mais participativas e interactivas. Quando foram anunciadas as primeiras medidas de confinamento em todo o mundo, instituições públicas e privadas rapidamente mobilizaram recursos para manter o sistema educacional a funcionar durante a pandemia do Covid-19. Um aspecto era evidente, a tecnologia desempenharia um papel importante na disseminação do conhecimento. Alguns autores definem a tecnologia educacional (Edtech) como o uso de tecnologia e processos tecnológicos para facilitar a aprendizagem. Embora a Edtech tenha sido alvo de destaque nas notícias nos últimos anos, foi em 2020 que verdadeiramente conquistou um lugar de destaque. No futuro, o Covid-19 será certamente considerado como um dos catalisadores para a adopção de tecnologias na educação. A criação de um programa eficaz de ensino à distância requer geralmente algum planeamento, e era algo que pensávamos que poderia funcionar, até sermos forçados a fazer funcionar. Com a redução da interacção humana, as ferramentas disponíveis foram adaptadas para desempenhar um papel adicional, o papel de melhorar a experiência de aprendizagem. A tecnologia educacional não se refere apenas à tecnologia de ponta aplicada à educação, mas ao uso de qualquer artefacto tecnológico para impulsionar a aprendizagem. Com a introdução dos computadores pessoais nos anos 80, o mundo começou a dispor de mais

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Edtech A nova Realidade do Ensino ferramentas em complemento aos sistemas existentes, as instituições educativas começaram a tirar partido da tecnologia disponível, oferecendo cursos de ensino à distância com recurso a computadores. A Edtech pode assumir muitas formas, de acordo com os objectivos dos conteúdos e teorias de aprendizagem subjacentes. No mundo actual, onde a massificação das plataformas de redes sociais é uma realidade, os educadores tiram o máximo partido destes artefactos para ensinar desde temas mais comuns até cursos altamente especializados. Os conceitos da Edtech estão a mudar, e existe ainda um longo caminho a ser percorrido, uma vez que estamos todos a aprender ao longo do processo. O mundo foi obrigado a adaptar-se ra-

“As startups da Edtech têm vindo a atraír a atenção dos investidores. Estimase uma valorização do mercado para 2020 na ordem dos 89.1 mil milhões de dólares” pidamente às ferramentas existentes, mas o futuro, onde já não teremos necessidade de aulas presenciais, ainda não chegou. Porém, até à data, a realidade tem-nos provado que usando a mentalidade correcta, podemos melhorar a experiência de aprendizagem com recurso à tecnologia. Em 2020, devido à pandemia da COVID-19, com muitas escolas e centros de formação ainda encerrados, estudantes e empresas viram-se obrigados a aderir ao sistema de ensino e formação à distância. Espera-se que, após a pandemia, o mundo adopte cada vez mais a aprendizagem online, ainda que não completamente. Certamente, iremos ver cada vez mais instituições a adoptar o ensino à distancia e a apostar na melhoria das técnicas de

aprendizagem. Indivíduos e empresas estão a adaptar-se à nova realidade da formação online para melhorar as suas habilidades e capacidades técnicas. Hoje, empresas como a Udemy disponibilizam mais de 130.000 cursos online abrangendo várias especialidades por uma fracção do valor do que custaria uma formação tradicional, em salas de aulas, sem contar com a ausência de custos de deslocação e alojamento. As startups da Edtech têm vindo a atrair a atenção dos investidores. Estima-se uma valorização do mercado para 2020 na ordem dos 89,1 mil milhões de dólares, com uma expectativa de crescimento exponencial ao longo dos próximos anos. Os materiais didácticos têm vindo a ser adaptados ao novo mercado onde se tem assistido a uma forte adopção das tecnologias nos mais variados estabelecimentos de ensino, desde o pré-escolar às maiores universidades em todo o mundo. Se em tempos a tecnologia tinha apenas um papel de suporte, hoje passou a ter um papel fundamental e crucial para que determinadas iniciativas possam ser desenvolvidas e implementadas. Os desafios para o sector são ainda grandes, especialmente nos países do terceiro mundo onde sabemos que as taxas de massificação tecnológica, em termos de smartphones e computadores, ainda são baixas, e as taxas de analfabetismo consideravelmente altas. Alguns dos desafios destes países passam por conseguir encontrar formas de disponibilizar materiais de aprendizagem eficazes a custos baixos e aumentar a disseminação do uso da Internet entre indivíduos, famílias, comunidades e empresas. As instituições, nestes países, enfrentam um desafio ainda maior, o de criar, desenvolver, implementar e promover as melhores práticas com recurso à tecnologia para alavancar e acelerar a aprendizagem. Uma coisa é certa: há ainda muita incerteza, mas até a data temos a prova de que, com a tecnologia disponível, a distância é facilmente quebrada. www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


panorama

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Migração Digital

Lançado oficiamente o sinal de televisão digital no País O presidente da República, Filipe Nyusi, procedeu, no passado dia 8 de Outubro, ao lançamento da televisão digital, através da inauguração do edifício do Centro de Televisão Provincial de Sofala, na cidade da Beira, construído no âmbito do projecto de migração digital. A transição do sistema analógico para o digital marca o início da dupla iluminação em que os sistemas analógicos e digitais

irão operar em simultâneo até que o processo de digitalização público alcance todo o País. Neste âmbito, foram construídos, em oito delegações da Televisão de Moçambique (TVM), estúdios modernos e apetrechados de equipamentos digitais. Falta cobrir, em infra-estruturas, as províncias de Niassa, Inhambane e o Centro da Televisão Central em Maputo.

Agricultura

Startup nigeriana aposta na digitalização da produção em África Criada em 2016 pelo nigeriano Emeka Nwachinemere, a Kitovu é uma das start-ups que mais está a contribuir para a inovação no sector do agro-negócio naquele país e não só. Numa avaliação recente do Banco Mundial ao potencial do sector do agro-negócio no continente africano - o qual, de acordo com as suas estimativas, poderá chegar a um trilião de dólares em 2030 – a Kitovu é considerada uma das cinco principais startups pelo seu contributo para a mudança de paradigma no sector e faz parte de um movimento empenhado na digitalização da agricultura no continente. A ideia para a criação da Kitovu está

intimamente ligada à história pessoal de Emeka Nwachinemere pois, tendo nascido numa zona rural, cresceu vendo a avó lutar para sobreviver produzindo alimentos com tecnologia precária e ganhando pouco após a colheita. Sem estrutura para armazenar, ela era obrigada a vender pelo quanto queriam pagar. Tendo obtido uma formação em engenharia mecânica, Emeka Nwachinemere desenvolveu interesse pelas novas tecnologias digitais tendo-se familiarizado com o trabalho, entre outros, do economista Michael Kremer (que viria a ganhar o Prémio Nobel em 2019) e o conceito de “agricultura de precisão”.

Transporte

Milionário lança rede de táxis eléctricos no Zimbabué Vaya Africa, uma empresa de transporte de mercadorias fundada pelo multimilionário do Zimbabué Strive Masiyiwa, lançou um serviço de táxis eléctricos e uma rede de carregamento no Zimbabué com planos de expansão por todo o continente. A empresa, com sede na África do Sul, adquiriu uma frota de carros eléctricos Nissan Leaf e desenvolveu as suas próprias estações de carregamento alimentadas a energia sowww.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

lar. O programa entrou em funcionamento no Zimbabué, à medida que Vaya finaliza parcerias para iniciar serviços de táxi eléctrico e de entrega em mercados que podem incluir o Quénia, Nigéria, África do Sul e Zâmbia. A Vaya é uma subsidiária do Grupo Econet, de Strive Masiyiwa, o qual inclui um dos maiores operadores móveis da África Austral, a Liquid Telecom, uma empresa de infra-estruturas de Internet

Covid-19

Investigadora moçambicana premiada por pesquisa inovadora O Instituto Nacional de Saúde (INS) vai investigar plantas nativas com potencial terapêutico para tratar o Covid-19. Trata-se de um projecto da bióloga moçambicana que recebeu, recentemente, um prémio da UNESCO para mulheres cientistas. “A ideia é comparar o potencial anti-inflamatório das plantas medicinais com o de medicamentos convencionais”, anunciou a bióloga e investigadora Raquel Matavele. A pesquisadora, que falava durante uma conferência de imprensa no INS, na província de Maputo, avançou, oportunamente, que o prémio de 50 mil dólares, oferecido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), vai ser usado nesta mesma pesquisa. Importa lembrar que Raquel Matavele foi distinguida com o prémio Early Career Fellowship, iniciativa da UNESCO, e ficou entre as 15 investigadoras de África e da região da Ásia-Pacífico vencedoras do prémio avaliado em 50 mil dólares, ao qual concorreu com um projeto relacionado com potenciais tratamentos para covid-19 em populações residentes nas zonas tropicais de África, através de plantas nativas para controlar a resposta inflamatória exacerbada que ocorre em casos graves.

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lá Fora Como a agricultura africana enfrenta a crise do Covid-19 Até agora, a agricultura africana aguentou-se melhor na pandemia do que muitos temiam, mas quais serão as consequências a longo prazo?

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Texto Charlie Mitchell • Fotografia D.R. o longo da fronteira asfaltada que separa o Quénia e a Tanzânia, centenas de camiões cheios de alimentos perecíveis ficam expostos ao calor. À beira da estrada, os motoristas sentam-se em tapetes de cartão à sombra durante dias, enquanto os esfregaços são enviados para Nairobi para testes de coronavírus. Quando os motoristas completam as suas viagens, grande parte da sua carga está pútrida e, com muitos aviões imobilizados, os quenianos estão a sofrer com os aumentos de preços nas prateleiras dos supermercados. E isto apenas numa das 110 fronteiras de África. O bloqueio oferece um vislumbre da devastação que a pandemia está a começar a causar no sector agrícola, que proporciona um meio de subsistência a 60% dos trabalhadores do continente. O vírus e os seus bloqueios afectam os agricultores, empresas agrícolas e PME africanas, bem como os consumidores e departamentos governamentais envolvidos no sector, que no seu conjunto representam 23% do PIB continental. Em vários países, contudo, o quadro já era pouco ‘cor-de-rosa’ antes mesmo do ataque pandémico, com 650 milhões de pessoas a enfrentarem uma crise de insegurança alimentar. Para o optimista, coloca-se a questão: poderia o tumulto do coronavírus apresentar uma oportunidade para reimaginar a segurança alimentar e construir resiliência para o futuro? Sempre adaptáveis, os agricultores africanos começaram a experimentar aplicações e novas tecnologias. Entretanto, os decisores políticos e as

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organizações de ajuda humanitária estão a recentrar-se na produção e fornecimento de alimentos. Os decisores políticos pioneiros estão a dar prioridade à segurança alimentar e a mudar para fontes de energia limpa tais como a hidroeléctrica e a solar. Melhores colheitas Quando se trata de agricultura, o “covid-19 parece não ter causado, até agora, um colapso tão terrível como se poderia pensar inicialmente”, diz Christopher Cramer, um professor da SOAS, Universidade de Londres. “Algumas partes da África Oriental, da África Ocidental e grande parte da África do Sul entraram na pandemia, no rescaldo de colheitas que foram as melhores dos últimos anos”, diz. Uma forte produção agrícola em muitas das principais regiões em crescimento seguiu-se a anos de seca. Na África do Sul, por exemplo, espera-se que a produção de milho em 2020 seja mais de 30% mais elevada do que nos anos anteriores. Em todo o continente, muitas estações de plantio estavam a chegar ao fim quando a pandemia se agravou em Março, poupando os agricultores das flutuações de preços dos insumos agrícolas que se aproximavam. Os especialistas são rápidos a assinalar que a produção e o fornecimento de alimentos africanos têm aumentado constantemente desde os anos 60, apesar da desgraça e das previsões sombrias, particularmente em países como o Maláui, Etiópia e Gana. No entanto, a indústria tem lutado no Zimbabué e cresceu lentamente em países como o Senegal e a Costa do Marfim. Entretanto, certas regiões agrícolas já estavam em apu-

ros quando os receios da pandemia as fecharam, principalmente na África Oriental, que enfrenta inundações e uma infestação de gafanhotos de proporções inauditas em 70 anos. No Zimbabué e em Moçambique, a precipitação no final de 2019 foi incaracteristicamente leve, enquanto que os conflitos na Nigéria, Sudão do Sul e Sahel árido agravaram a insegurança alimentar. E com os preços dos produtos de base a cair no início deste ano, os produtores de culturas vitais como o cacau e o café estão a caminhar para a catástrofe. Cadeia de abastecimento “O primeiro impacto foi nos floricultores da África Oriental, que viram a procura dos mercados europeus essencialmente colapsar”, diz François Conradie, economista político sénior da NKC African Economics. “As questões da cadeia de fornecimento também têm sido relevantes, uma vez que os factores de produção importados se tornaram mais difíceis de encontrar”. Para os pequenos agricultores de toda a região, as sementes, fertilizantes, alimentos para animais e instrumentos de protecção das culturas em que dependem para maximizar os rendimentos www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020


agricultura

“Os governos vêem-se obrigados a gastar mais para fazer face à pandemia, ao mesmo tempo que estes problemas económicos resultam em menores receitas fiscais” tornaram-se escassos, ou substancialmente mais caros, impedindo a produção de culturas de grande consumo como o arroz e o milho, bem como o café etíope, a horticultura queniana e o ananás do Gana. Muitas PME agrícolas têm sido forçadas a reduzir a produção à medida que os alimentos apodrecem nas explorações agrícolas ou em camiões, causando desemprego, insegurança alimentar e pobreza. Entretanto, os lockdowns sugaram a vida do sector informal, a principal fonte de emprego na África Subsaariana. Consequências a longo prazo Mas o impacto nos agricultores e pastores, que não podem circular livremente sob as regras do lockdown, é apenas metade da história. Os cortes nas exportações - devido à redução do frete aéreo mundial, ao colapso da procura dos mercados europeus, asiáticos e norte-americanos e à menor produção agrícola - poderiam causar www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

inflação, que por sua vez poderia depreciar as moedas africanas. E a maioria das nações africanas tem consideráveis stocks da dívida externa pagos em dólares. “Os governos vêem-se obrigados a gastar mais para fazer face à pandemia, ao mesmo tempo que estes problemas económicos resultam em menores receitas fiscais, pelo que contraem mais empréstimos”, diz Conradie. “A longo prazo, isto vai afastar as despesas de investimento produtivo e mesmo algumas despesas cruciais em redes de segurança social”. A implicação de uma crise agrícola é um golpe a longo prazo para economias africanas já vulneráveis, e menos alimentos para um continente cuja população vai duplicar nos próximos 30 anos. É por isso que os governos e instituições de todo o continente devem agir agora. “Os Estados não podem confiar facilmente no investimento ou na ajuda estrangeira. Precisam de construir sec-

tores de exportação resilientes e de assumir um papel nacional na promoção da mudança”, diz o Professor Cramer. “As despesas em I&D (instituições de investigação públicas ou privadas, sem fins lucrativos, que se dedicam à investigação científica e desenvolvimento tecnológico) precisam de aumentar, o investimento em irrigação precisa de aumentar”. O BAD lançou a Feed Africa Response to Covid-19 (Farec), que reservou 10 mil milhões de dólares para apoiar governos, pequenos proprietários e o sector privado. É importante destacar o crescimento sustentável na produção e distribuição de alimentos. A Farec já apoiou cerca de duas dúzias de países, criando “corredores verdes” para a movimentação de produtos agrícolas e a concessão de empréstimos. Entretanto, os próprios agro-negócios têm apelado aos governos para encorajarem os voos de carga, através de incentivos fiscais, subsídios de combustível e isenções de taxas de aterragem. No Quénia, os voos internacionais de carga têm vindo a aumentar lentamente, embora ao dobro do preço por quilo, em comparação com o início do ano. Soluções digitais Os agricultores também continuam a empregar soluções inovadoras, muitas delas digitais, para salvaguardar os seus rendimentos agrícolas. O BAD produz ferramentas digitais para aconselhar os agricultores sobre o que plantar e quando, bem como sobre o equipamento a utilizar para salvaguardar as suas culturas. “No total, 98% dos agro-comerciantes relataram comunicar com os fornecedores através do telemóvel, e 70% relataram receber mensagens dos agricultores sobre factores de produção pelo menos uma vez por dia”, diz Sam Strimling, um associado de pesquisa do PAD. Entretanto, uma colaboração entre a FAO e a Penn State University está a permitir aos agricultores da África Oriental identificar locais de pragas de gafanhotos para a pulverização de pesticidas. As esperanças da revolução verde do continente, construída sobre a crescente produção agrícola ao longo do último meio século, não estão mortas mas, também, não estão propriamente... verdejantes. Ainda assim, nem tudo são más notícias.

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NOVOS ÂNGULOS

A dúvida sobre o que se deve e a dívida com custos que não são para breve

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Pedro Cativelos • Director-Executivo da Media4Development

izem-nos as notícias que a notícia continua a ser o novo coronavírus. Começa a deixar de ser assim tão novo porque já se passou um ano desde os primeiros casos na China. E historicamente, porque o sars-cov-2, vírus que causa o covid-19, sendo de facto recente, pertence ao mesmo grupo de coronavírus identificado pela pesquisadora June Almeida em 1964, num laboratório de Londres. Não nos dizem as notícias algumas outras coisas sobre o mesmo vírus ou, pelo menos, não de forma tão abundante. Como por exemplo que, a nível global, a taxa de mortalidade tem vindo, tendencialmente, a cair face ao aumento do número de infectados que serão, imaginamos, muitos mais do que os que estão detectados, fazendo baixar a taxa de letalidade deste novo vírus para valores abaixo de 1% dos infectados. O que nos leva a pensar se, de facto, o ano de 2020 não terá sido mais perdido pela gigantesca histeria mediática em massa a que se assistiu (e assiste ainda) em muitos pontos do mundo do que propriamente pela perigosidade real do coronavírus. Sendo perigoso e merecedor de cuidados, não justifica o pânico e a paralisação social e económica global que milhões de vidas coloca e vai colocando em causa. Olhando a África, uma das maiores causas de morte no continente, de acordo com um relatório da OMS de 2019, é a malária que, nesse ano, atingiu 228 milhões de pessoas e matou cerca de 405 mil, principalmente na região Subsaariana. E a malária até está longe de ser uma das doenças que mais vitima em todo o mundo. Uma mórbida tabela liderada pelas doenças do foro cardíaco, que vitimam perto de 20 milhões (sim, vinte milhões de pessoas em todo o mundo, todos os anos). Juntamente com as doenças oncológicas, aproximam-se dos 40 milhões, não de doentes, mas de vítimas mortais. Por ano ao longo das últimas décadas. Não me lembro de ter visto serem inventadas apps de rastreio aos cardíacos, decretados bloqueios comerciais aos produtos com gorduras saturadas, ou sequer declarado um novo normal sem fumo de tabaco devido à pandemia global de doenças cancerígenas, que nos levaria, a todos, a querer saber o que é de facto colocado nos alimentos que ingerimos e o real nível de poluição do ar que respiramos.

Devemos resistir a minimizar esta pandemia decretada que se vive no mundo até porque esse é, aliás, um dos dilemas a que temos assistido — a guerra quase religiosa entre os crentes covidianos e os teóricos da conspiração do outro lado da barricada. Digo apenas que deveríamos agir de forma proporcional ao perigo que representa: o de um vírus em relação ao qual 90% das pessoas é assintomática, que causa menos de 1% de mortalidade, que requer distanciamento, uso de máscara, higiene pessoal e cuidados redobrados com os enfermos e com os mais idosos, especialmente nos climas mais frios e com menos exposição solar. Tudo o que seja para além disto tem-se comprovado desajustado e exagerado, e as consequências começam a ser visíveis na Europa, por exemplo. Há hoje interesses globais que se movem em função da continuação da extensa cobertura mediática da pandemia e consequente temor em quem a segue, e que não são, na sua maioria, desonestos, longe disso. As tecnológicas querem aproveitar a onda do novo normal para abrirem a torneira dos novos serviços digitais às empresas e aos cidadãos. Os jornais e as televisões querem cavalgar a onda do medo para venderem mais assinaturas digitais. E as empresas de vacinas... bem, também fazem o seu trabalho e hão-de descobrir a vacina como fizeram então para a gripe das aves, há pouco mais de uma década. Na altura, comercializaram-na aos milhões para todo o mundo e fez notícia que, na verdade, muitos dos Governos que as compraram nunca as tenham usado até ao fim da sua validade. Até porque essa epidemia, também ela muito noticiosa no seu início, terminou nas nossas preocupações quando chegaram as vacinas, se bem nos lembramos, até por nunca mais nos termos lembrado dela. E ainda hoje, não conheço pessoalmente alguém que, algum dia, tenha tomado a vacina da gripe das aves. Existirão, por certo. Não fazendo julgamentos morais, tudo isto está certo à luz do negócio. Parece-me é que o erro está noutro lado, o do interesse comum, que também deveria fazer o seu interesse vingar. A começar por evidenciar cada vez mais, expondo, alguns destes interesses globais, ao invés de, estar constantemente a assistir passivamente à marcha pouco verdadeira das notícias que noticiam apenas mais e mais infectados. África tem sido, de resto, e na generalidade, logo desde o come-

África tem sido, e logo desde o começo, um exemplo na forma de lidar com este ‘novo’ coronavírus. Se não tem o ‘músculo’ económico da Europa ou dos EUA, lidera na forma de conviver com o vírus

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A China é a maior credora dos países em desenvolvimento com 102 mil milhões de dólares, cinco vezes mais dívida gerada do que o segundo na lista, o Japão

ço, um exemplo na forma de lidar com este ‘novo’ coronavírus que começou na China. Se na resposta económica e por dificuldades estruturais, não consegue naturalmente acompanhar o pacote de ajuda de Trump de 2 ‘bis’ à economia ou a ‘bazuca’ de 1 bilião em estímulos da União Europeia aos seus Estados membros, soube, por outro lado, ajustar medidas sanitárias, controlar e não deixar cair por completo as suas economias e encaminhar as suas populações. E aqui Moçambique destaca-se pelo equilíbrio e ajustamento das medidas tomadas ao longo de meses, sem dúvida. Ainda hoje, há mais controlo de temperatura nos espaços fechados, mais cumprimento do uso da máscara ou um grau de disciplina maior em Maputo do que em algumas cidades europeias e isso, sem dúvida, tem de ser aplaudido. Até por confirmar uma outra realidade, também ela nova. Os países que mais sofreram com crises nos últimos anos (muitos deles africanos) mostraram-se bem mais preparados para lidar com o que vivemos nos últimos meses. Se nos lembrarmos que, em Março, estava a pandemia no pico em Itália e Espanha, a OMS veio logo afirmar que seria em África a ‘catástrofe’, (sim, foi o termo usado na altura sem qualquer motivo que o indiciasse), teve de emendar a mão em Agosto, pela voz da sua directora regional para o continente, Matshidiso Moeti, dizendo que, afinal, África “provou, mais uma vez, a importância de investir em sistemas de saúde, melhorar o acesso equitativo aos cuidados, a prontidão para prevenir e controlar surtos e permitir que as comunidades desempenhem o seu papel na realização de uma saúde melhor”. Mas foram muitos os que se apressaram a decretar a tragédia em África. Para além da OMS, o FMI, o Banco Mundial e as principais empresas de consultoria. Não previram a resposta dos governos africanos, que agiram bem e depressa na maioria dos casos. E continuam a fazê-lo, ao contrário do que se vê na Europa, por exemplo. Num ponto acertaram todos. O que sobraria de tudo isto, a www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

dívida externa que se agigantou nos últimos meses. Especialmente para com a China. O Corona custou vidas que são sempre de lamentar e deixa uma dívida que não tem igual. Lia, há alguns dias, o professor universitário Kishore Mahbubani, diplomata, antigo ministro e representante de Singapura nas Nações Unidas, a defender que os Estados africanos “deveriam unir-se” para tratar a questão da dívida com a China aconselhando-os a ficar equidistantes do conflito estratégico entre os EUA e o gigante asiático”, lembrando de seguida o caso de quando o Quénia quis pagar antecipadamente empréstimos com juros elevados a um grande banco norte-americano, “em que a consequência foi que o Banco Mundial, instado pelo Tesouro norte-americano, acabou por cortar a ajuda ao Quénia”. De acordo com o Instituto Financeiro Internacional (IFI), a China é, por ora, e com larga vantagem, o maior credor oficial não só dos países africanos, mas também das nações mais vulneráveis. “Entre os credores oficiais bilaterais, a China é o maior credor, tendo aumentado o volume em dez vezes desde 2009, para mais de 102 mil milhões de dólares no ano passado. O Japão é o segundo maior credor, mas com uma exposição cinco vezes menor, de mais de 23 mil milhões de dólares”, lê-se numa análise ao prolongamento da Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI). A dívida pode representar crescimento, desenvolvimento, também, mas propicia o condicionamento do credor face ao devedor, mais uma razão para ter cuidado com o medo que nos impulsiona a gastar, comprando o que julgamos precisar ao fornecedor do costume. Será uma das lições de 2020. Olhar os números, as estatísticas e os valores reais abre caminhos sobre como lidar com tudo isto. Basta procurar, olhar, ler e compreender, apagando os filtros dos interessados em propagar, não a pandemia, mas o temor colectivo ou de quem acha que tudo isto é nada. Ter cuidado sim, connosco e com quem nos rodeia. Viver com medo, não.

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ócio

(neg)ócio s.m. do latim negação do ócio

58 Nesta edição ficamos a conhecer o deslumbre dos montes Namuli na Zambézia

g

e 60 Desta vez, a proposta é um menu de receitas que prometem deliciar as suas refeições

61 A escolha da Adega recai no vinho tinto Barcavelha


Riqueza paisagística da Zambézia

Monte Namuli

O MISTÉRIO

DE NAMULI “porque é que conhecemos

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o nome dos animais, mas não conseguimos indicar o nome das árvores?”. A pergunta persegue-nos desde que subimos ao Monte Namuli (2419 metros de altitude), local de referência histórica e espiritual para o povo macua do Norte de Moçambique. Apenas podemos garantir que é uma árvore sagrada – mesmo desconhecendo a sua identidade. De que outra forma poderíamos explicar a energia que emana à sua volta, a ave que a sobrevoa em círculos cerimoniais e a ventania que se faz sentir apenas na sua cúpula? Para lá chegar é preciso vontade e determinação. O caminho é acidentado – de tal forma que nem é pos-

sível chegar de carro. A partir da cidade do Gurué, famosa pelas plantações de chá que a circundam, é uma viagem de 1h30 de motorizada por entre florestas de eucalipto e aldeias encrostadas nas encostas da mítica cordilheira. Chegados ao lugar onde se inicia a caminhada, segue-se um encontro diplomático com a líder tradicional que zela pela segunda montanha mais alta de Moçambique. A antecipação é alta: o Monte Namuli, localizado no Norte da província da Zambézia, encerra em si o mito de origem do povo macua. Ali a montanha é mãe e gerou toda a humanidade. Quando perguntamos à líder o seu nome, responde-nos: “Rainha”. Apelido? “Rainha”. Nome completo: “Rainha”. Tantas perguntas que gostaríamos de lhe fazer – “como é a pegada do primeiro

homem?”; “onde fica a gruta que guarda todas as sementes do mundo?”; entre tantas outras... – mas percebemos, pela parcimónia das suas respostas, que não é altura de o fazermos. Aceitamos. Depois de acertarmos um valor para a cerimónia aos espíritos, a Rainha entrega-nos ao seu filho Silvanisto, que nos levará “até à árvore onde rezam”. Olhamos para o cume de Namuli envolto em nuvens e vislumbramos o contorno de uma árvore solitária bem lá no cimo. Será que alguma vez lá chegaremos? O trilho é inclinado e alterna entre superfícies rochosas, vegetação rasteira e machambas de feijão manteiga. Silvanisto segue descalço à nossa frente, em passo firme. Pedimos-lhe que abrande. Afinal, não temos pressa de chegar, queremos apreciar cada passo. “O caminho faz-se caminhando” – assim escrevia o poeta castelhano Antonio Machado. Ao longo da subida, vamos roendo um pedaço de cana doce que

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Silvanisto corta logo no início para nos entregar, munindo o corpo de forças extras. A temperatura é amena e começamos a antecipar o frio que fará lá em cima. No entanto, verifica-se o oposto – finalmente chegados à “árvore onde rezam”, com o cume de Namuli a escassos metros, somos surpreendidos com um clima acolhedor e reconfortante. Rodeados de uma cordilheira sem fim à vista, detemo-nos para absorver a paisagem e, pouco a pouco, damo-nos conta de um mistério. O ar está completamente quieto, com excepção de uma forte ventania que sopra exclusivamente na árvore, como se fosse um feixe de luz incidindo sobre a protagonista de uma peça de teatro. Que árvore é essa? Qual o seu nome? Sentamo-nos sobre a rocha e inspiramos fundo. Não se pode ter todas as respostas. Tal como a Rainha, talvez seja apenas Árvore. No dia seguinte, com os músculos doridos da aventura montanhosa, voltamos a calçar as botas de caminhada para explorar as quedas de água do Rio Licungo, nas imediações da fábrica UP 4. O verde estridente dos arbustos de chá contrasta com a terra ocre e o granito dos montes que se erguem como uma muralha a toda à volta. Na face das montanhas, desenham-se fios de água que correm como lágrimas, chorando a parca subsistência dos apanhadores de chá. Finalmente descortinamos um majestoso lençol de água caindo com estrondo sobre as rochas até formar uma pequena lagoa antes de voltar a seguir serenamente o seu curso pela encosta abaixo. A beleza é tal que nos deslumbra e comove. É tempo de parar e beber mais um momento. Não sabemos quando se repetirá. texto Cristiana Pereira fotografia D.R.

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O verde estridente dos arbustos de chá contrasta com a terra ocre e o granito dos montes que se erguem... ROTEIRO Como ir

Voe com a LAM até Quelimane e siga de carro até à cidade de Gurué, que dista 350 km da capital provincial. Junto ao mercado, há vários táxis motorizados que levam turistas até casa da Rainha. Ali, siga as formalidades para obter permissão para subir ao Monte Namuli. Onde dormir

No centro da cidade existem a Pensão Gurué e o Motel Monte Verde. Para um ambiente mais familiar, recomenda-se o Centro Polivalente Leão Dehon, a 2 km da cidade. ONDE COMER

O Centro Polivalente Leão Dehon serve refeições caseiras a preços acessíveis. Experimente os produtos da machamba, como chicória desfiada ou pó de moringa preparado em casa. O QUE FAZER

A região do Gurué é um destino privilegiado para turismo de aventura, com destaque para a subida ao Monte Namuli e as quedas de água do Rio Licungo.

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SOKO CAFÉ

g virgílio tem o sonho de tra-

balhar em França, numa patisserie, e o dom de converter coisas banais, saídas da terra, em pratos memoráveis celebrados por diplomatas e presidentes. Virgílio Macheque, nascido no paupérrimo Chamanculo, Maputo, ingressou no orfanato aos 11 anos e, das artes que ali aprendeu, foi a cozinha que o seduziu. “Gosto de pegar nas coisas normais e transformá-las em agrados para as pessoas”, diz. Desse prazer nasceu o chef que hoje lidera a cozinha do Lichinga Hotel by Montebelo, a melhor da cidade e palco das suas criações. Debutante no ofício em 2006, volvida meia dúzia de anos arriscou: “Inventei filetes de peixe escama com molho de malambe (fruto do embondeiro). E os clientes gostaram”. E Virgílio, com confiança renovada e energia redobrada, não mais travou a imaginação. “Quando invento um prato, é sempre o Director (do Hotel) o primeiro a provar. Nunca recusou nenhum”, garante. Ruben Santos confirma e o menu reafirma. As suas criações –

Virgílio, o cozinheiro “fusão da cozinha portuguesa com especiarias indianas, para dar um toque especial a doces e salgados, como o cardamomo e a estrela-de-anis” –, converteram-no num embaixador informal de Niassa. “Um momento alto foi o menu de degustação para o embaixador do Japão quando visitou Cahora Bassa”, recorda Virgílio, desfiando as propostas do arrebatamento nipónico: “Cestinhas de frango com molho rosé; bife de novilho au vin e bacalhau confitado com puré de abóbora”. A consagração sobreveio há três anos, na convocatória

“Inventei filetes de peixe escama com molho de malambe (fruto do embondeiro). E os clientes gostaram”

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presidencial do Niassa para fazer o almoço a bordo do avião presidencial numa das visitas de Filipe Jacinto Nyusi à remota província. Virgílio esmerou-se e afirmou a moçambicanidade gastronómica acrescentando valor às tradições: “Fiz filetes de peixe tchambo (tilápia) do Lago do Niassa com molho de malambe. E o próprio Presidente pediu”, confidencia o chef, “frango à Zambeziana com ntolilo (folha de batata doce) salteado em cebolada”. Um regalo. Virgílio, mestre da fusão, inscreve a multiculturalidade no menu do Lichinga Hotel, na Avenida Filipe Samuel Magaia, no qual ressaltam o fillet mignon com chips de ba-

tata doce e molho verde, e o bife de lombo com esmagado de inhame. “São os pratos mais nossos”, diz. O último, que o chef Virgílio pariu na Gorongosa, em 2009, apresenta um naco alto, tenro e suculento na selagem primorosa, guarnecido por puré fofo e alvo desse tubérculo tropical cuja doçura é mitigada por vinagre balsâmico e discretas especiarias. Espuma de abóbora remata o empratamento, dando cor e contemporaneidade, constituindo-se, também, como assinatura do chef Virgílio. texto Elmano Madail fotografia Jay Garrido

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Casa Ferreirinha Barca-Velha Tinto 2008 Castas 50% Touriga Franca, 30% Touriga Nacional, 10% Tinto Cão, 10% Tinta Roriz Cor Rubi profunda Notas de Prova Aroma intenso e de excelente complexidade, com saliência para os frutos vermelhos vivos, especiarias como a pimenta e o cravinho, apontamentos balsâmicos a cedro, resina e caixa de tabaco Teor Alcoólico 14%

Casa Ferreirinha Barca Velha 2004 Castas Tinta Roriz, Tinto Cão, Touriga Franca, Touriga Nacional Cor Rubi profunda Notas de Prova É um vinho preparado para evoluir por muito tempo em garrafa, com grande estrutura, robusto e com muita personalidade e carácter, com elegância e complexidade aromática Teor Alcoólico 13,5%

Dona Ferreirinha Barca Velha 2000 Castas Touriga Franca, Touriga Nacional, Tinta Roriz, Tinto Cão Cor Vermelho vivo, profundo e muito intenso Notas de Prova Predominam os aromas de fruta muito madura (amora, ameixa, cassis), de flores (violetas), de especiarias (baunilha, pimenta), balsâmicos (cedro) Teor Alcoólico 13,5% www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

O Barca-Velha 2011 é equiparado a um “leão” cujo apogeu será daqui a 20 anos

O vigésimo Barca Velha De 2011 até sempre

começou com o 1952, idealizado pelo enólogo Fernando Nicolau de Almeida ao serviço da Casa Ferreirinha como espécie de “terroir blend”, tal como acontece com os Portos Vintage, em que o resultado final é um mosaico do melhor que cada local tem para dar. O grupo Barca Velha é tanto ou mais exclusivo do que o Porto Vintage que, neste último, cada década de história viu acontecer três a quatro declarações ditas clássicas, enquanto ao longo de quase 70 anos de carreira houve apenas 20 lançamentos da marca suprema do vinho português. Liderança que, em rigor, divide com a marca Mateus Rosé, a primeira orientada para o mercado global e que origina a fundação da Sogrape, em 1942. A marca Barca Velha é inspirada no local do Douro Superior, no norte de Portual – para lá do que se conhecia como Alto Douro – com o mesmo nome, junto ao Vale Meão, onde de facto nasceu. Fernando Lobo Guedes, filho do fundador foi o grande timoneiro da empresa, levando para diante, com grande energia e empenho, o projecto Sogrape. Morreu em 2018, quando já era secundado pela terceira geração da família. Hoje é Fernando Guedes, neto do fundador, que lidera o grupo empresarial. O enólogo Luís Sottomayor assina o Barca Velha 2011, o mais disruptivo de sempre em toda a nobre e longa série deste vinho de excelência. Como o fez? Apoiado no grande ano no Douro que foi 2011, construiu um vinho incrivelmente poderoso e ao mesmo tempo elegante, como só aquela região consegue produzir e como só um grande enólogo consegue fazer. A prova deste vinho único mostra, além de juventude a toda a prova, apesar dos seus quase nove anos de idade, um equilíbrio desarmante. Estrutura muito bem urdida, assente em taninos muito finos, autêntico trabalho de ourives, vestida por uma acidez correctíssima. A base, afinal, do que reconhecemos como frescura de um vinho e que aqui foi elevada ao máximo expoente. Pode beber-se já, com muito prazer, mas felizes mesmo serão os que o provarem daqui a 20, 30 ou 40 anos quando atingir o apogeu máximo..

Casa Ferreirinha BarcaVelha Tinto 2011 Castas

45% Touriga Franca, 35% Touriga Nacional, 10% Tinto Cão, 10% Tinta Roriz COR

Cor rubi profunda Notas de prova

Aroma intenso e de excelente complexidade, com saliência para os frutos vermelhos vivos, especiarias como a pimenta e o cravinho, apontamentos balsâmicos a cedro, resina e caixa de tabacoTeor alcoólico

14%

texto Fernando Melo fotografia D.R.

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memórias do idai

“Memórias do Idai” uma viagem uma verdadeira viagem no tempo sob o comando de histórias humanizadas vividas na província de Sofala é o que nos propõe a obra “Memórias do Idai”, a mais recente antologia de crónicas do País que funciona como uma máquina do tempo, conduzindo o leitor ao conhecimento de vivências que marcam a passagem do devastador ciclone Idai naquele ponto do País em Março do ano passado. O livro resulta de um concurso literário instituído pela Editora Fundza para celebrar o primeiro aniversário da passagem devastadora do ciclone Idai.A Faculdade de Letras e Ciências Sociais da Universidade Rovuma, na cidade de Nampula, foi o local escolhido para a primeira apresentação desta colectânea de 26 crónicas de igual número de autores. Entre anónimos e notórios da praça, a obra alia a nostalgia, o drama e a tragédia. Natália Viagem foi a con-

a um passado ainda presente vidada especial do evento. Co-autora do “Memórias do Idai” e umas das três mulheres no total dos 26 seleccionados do concurso literário que deu posteriormente vida à obra, através da crónica intitulada “A dor da perda nunca morre para quem sobrevive”, conta a história de uma mãe do distrito de Búzi que tudo fez para salvar os seus três filhos, mas foi vencida pela fúria do ciclone. A co-autora, mais habituada a escrever sobre experiências pessoais em redes sociais, diz ter abraçado o concurso “como um desafio”, desta vez não para escrever a sua própria história, mas a de uma mãe destruída pelo Idai. “Eu estou habituada a escrever sobre a minha vida e apesar de ser formada em jornalismo acho que contar a história de alguém que vive com a dor

O livro resulta de um concurso literário da Editora Fundza para celebrar o 1º aniversário Idai www.economiaemercado.co.mz | Outubro 2020

é sempre desafiante” disse a jovem escritora à E&M. “Memórias do Idai” divide-se em três grupos temáticos: o primeiro, intitulado “Prelúdio”, é composto por cinco crónicas onde os autores retratam momentos de prenúncio de um acontecimento o segundo, denominado “Desespero”, composto por oito crónicas, em que os autores retratam a condição de desânimo da população; o terceiro, do qual Natália Viagem faz parte, denomina-se “Drama” e é composto por sete textos em que os autores retratam a situação trágica, catastrófica e fatal do ciclone. Já no último grupo intitulado “Esperança” e composto por seis crónicas, os autores mostram como, apesar da destruição, é possível a crença emocional na vida e num recomeço. A estimulante viagem proposta por “Memórias do Idai” dá asas à imaginação, tornando o leitor participante, ainda que sem sair do seu ponto de leitura, de uma história que vive na memória colectiva dos moçambicanos.

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ferrari f8 Tributo

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A nova fábrica ‘verde’ desafiando a pandemia, o fabricante alemão de automóveis começou a produzir uma nova Classe S, um dos seus maiores criadores de dinheiro. Mas será que consegue alcançar o Tesla numa altura em que o futuro é ‘verde’? Nenhuma pandemia iria impedir a Mercedes-Benz de revelar o seu carro de luxo emblemático no início de Outubro, juntamente com uma fábrica de última geração para o construir. O Classe S domina o segmento mais alto do mercado de carros de luxo e é o veículo mais rentável da Mercedes. E esta última versão, a primeira remodelação completa em sete anos, é crucial para a empresa, uma vez que recupera de uma queda acentuada nas vendas que empurrou a marca alemã para o vermelho durante os primeiros seis meses deste ano. Ola Källenius, o chefe executivo da empresa-mãe da Mercedes, a Daimler, disse que os executivos tinham

decidido não deixar que a pandemia - que interrompeu as linhas de abastecimento, fechou fábricas e as vendas deprimidas - perturbasse o lançamento num edifício colossal cinzento, em forma de cunha, que faz fronteira com terrenos agrícolas em Sindelfingen, um subúrbio de Stuttgart. “Do ponto de vista empresarial, é muito importante para nós”, disse Källenius numa entrevista recente. Os críticos podem considerar a Classe S, que terá um preço de base superior a 100 000 dólares nos Estados Unidos, como um iate terrestre para plutocratas, uma exibição discordante de riqueza no meio de uma vaga de desemprego crescente. E não é um veículo eléctrico, cujas vendas subiram durante a pandemia. “A indústria automóvel está na transformação mais profunda da sua História”, disse Kretschmann no evento de lançamento da nova fábrica. “Isto é um desafio para um campeão como a Daimler”. Os painéis

“A indústria automóvel está na transformação mais profunda da sua História”

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da Mercedes solares no telhado da fábrica, conhecidos simplesmente como Fábrica 56, fornecem cerca de 30% das suas necessidades eléctricas. Nos dias de sol, qualquer energia solar excedente é armazenada numa série de baterias usadas de automóveis. As clarabóias reduzem a necessidade de iluminação artificial. É o ponto de partida para o que lá se produz, a versão híbrida do novo Classe S que pode percorrer 100 quilómetros ou 60 milhas apenas com bateria, de acordo com a Mercedes. A nova frota de automóveis da Mercedes será “neutra em termos de emissões” até 2039. “Sabemos como fazer um carro de luxo”, disse o Sr. Källenius. Mas não há garantias de que saibam fazer um eléctrico e por isso os investidores estão cépticos. A bolsa de valores de Nova Iorque avalia a Tesla em quase dez vezes mais do que a Daimler, apelidando-a (a Tesla) da Toyota dos veículos eléctricos, ao mesmo tempo que não dá quase nenhum valor ao futuro eléctrico da Daimler. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2020




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