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1 Primeiras iniciativas para desenvolvimento do projeto

donos de lojas da Galeria. Gostou logo da ideia e a apresentou em uma reunião com os outros. Depois de um mes, mais ou menos, recebemos a notícia da aprovação. Todos os alunos e eu ficamos muito contentes.

Começou então uma nova etapa. O tamanho da maquete teve que ser ampliado pois a parede que nos indicaram, situada na frente da galeria, exigia um painel maior.

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Lembremos ao leitor que os primeiros tempos da década dos anos 90 do século passado registraram uma série de acontecimentos, que acabaram contribuindo para aquele sentimento, expresso por Sílvia Matos no início de suas notas manuscritas, de que não havia respeito pelo ser humano, pelas ideias de liberdade, pela natureza e pela democracia. O primeiro presidente eleito diretamente nas urnas, após o período de exceção iniciado em 1964, foi Fernando Collor. Logo após sua posse determinou um confisco nas contas bancárias, de poupança e de certas aplicações financeiras, pensando assim combater a hiper inflação existente naquela época. Esse plano fracassou e deixou uma insegurança enorme em toda a classe média. Além disso, após acusações de seu próprio irmão, Collor se viu envolvido em denúncias de corrupção. Em meio a muitas manifestações dos chamados caras pintadas, aliadas a uma certa ineficiência administrativa e ao modo autoritário de exercer a presidência, Collor acabou perdendo apoio no congresso e teve seu impeachment aprovado, sendo afastado da presidência em dezembro de 1992. A famosa CPI dos anões do orçamento instalada em outubro de 1993 ajudou a criar aquele ambiente de insegurança mencionado no manuscrito.

A partir de agora apresentaremos o detalhamento de todas as fases do planejamento, da produção artística e dos trabalhos executados que permitiram a montagem do Painel em frente à Casa do Lago na UNICAMP.

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Capítulo 1

Primeiras iniciativas para desenvolvimento do projeto

Em seu manuscrito preparado no final de 1993, Sílvia Matos escreve

A melhor ideia deste projeto é aquela de que todos trabalhem e criem obras individuais, formando um trabalho conjunto, para provar que o homem, cada um, dando aquilo que ele sabe e pode, junto com os outros, pode criar um mundo melhor. É importante a individualidade para a formação e o enriquecimento do conjunto.

Para mostrar que a ideia deste texto não é nova, transcrevemos novamente parte do manuscrito de Sílvia, agora datado de abril de 1994.

19 de abril de 1994: conversando com Marinho, meu filho, na gozação, me veio a ideia de escrever um livro com fotos de todas as etapas da feitura do painel. A gozação foi tipo: “Veja o painel, compre lembranças e leia o livro”. Por que não? É um trabalho sério e esta experiência certamente vai servir para outras pessoas. Assim, pensei à princípio no título: Painel Vida em Expansão, Uma aventura a 52 mãos.

No dia 21 de abril de 1993 Sílvia escreveu que as dimensões do painel seriam ampliadas e que o mesmo passaria a ter as medidas 4,00 metros por 2,50 metros, sendo dividido em 170 quadrados

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iguais, cada um deles com lado de 25 centímetros de comprimento. Dizia ainda que os alunos estavam começando seus projetos, trabalhando em um certo número de quadrados, que variava de dois a dez. Os alunos mais novos, que eram menos experientes, ficavam com dois blocos e ela ficaria com os blocos correspondentes aos círculos gerados pelo pingo de água. Todo mundo deveria fazer um desenho de seu projeto no tamanho original.

Existe um documento de Maria Laura T. Mayrink-Sabinson (LALAU ou LAU), datado de outubro de 1995, intitulado A Experiência de Fazer um Painel de Cerâmica, onde ela recorda, com muita elegância de estilo, seus sentimentos durante aquela fase de seu aprendizado de arte. Veja o texto integral no apêndice C. Vamos transcrever algumas partes desse depoimento ao longo destas notas.

Até 23 de Março de 1994 o painel, para mim, era uma ideia. Até então eu só tinha trabalhado em argila quando preparamos uma exposição de máscaras, no fim do meu primeiro ano de Ateliê, em 1992. Eu não tinha a menor, minimíssima ideia do que fosse preparar um painel de argila!!! Essa (santa!) ignorância foi a principal responsável pela falta de modéstia (ou de juízo?) que me levou a pensar que minha contribuição individual ocuparia nove quadros de 25cm x 25cm–desenhei em carvão o que trabalharia: a pomba no meio das folhagens. Pacífica. mãos à obra!

Ver o projeto do painel no chão, montado com os desenhos-projetos de cada um. Sílvia estudando onde colocar o quê. Um painel em duas dimensões. Impressionava... mas não muito!

Agora estava chegando a hora de planejar a montagem.

Conforme Lalau escreveu, Sílvia colocou no chão do Ateliê um papel com as medidas exatas do painel em tamanho natural. Fez depois as divisões em quadrados correspondentes às placas de cerâmica que seriam colocadas. Em seguida, depois de algum estudo, utilizando os desenhos-projetos de todos, com linhas mais fortes, fez a marcação dos espaços que caberiam a cada aluno ou aluna participante, colocando ainda o nome de cada “dono” ou “dona” do espaço. A seguir veja foto da Sílvia e Walma, uma aluna, preparando o

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mapa do painel e uma imagem do mapa de distribuição obtido.

Com o mapa pronto, os participantes do projeto deveriam começar literalmente a por a mão na massa.

Antes de qualquer coisa, era necessário que a argila fosse batida. Para isso, Sílvia aconselhava os alunos a fazer isso fora do horário das aulas.

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Para ter o material necessário, Sílvia comprou uma tonelada de argila, conforme prova a nota fiscal abaixo. Note a data de compra: 16 de março de 1994.

Notemos que, na primeira nota, o preço por quilo dessa argila comprada era de CR$ 286,00. Em 14 de abril do mesmo ano, na

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compra de mais argila para o trabalho, o preço do quilo da mesma foi de CR$ 585,00. Isso mostra a fúria da inflação nesse período. Confira isso na segunda nota

Esses dados, que apontamos agora, mostram como as pessoas se sentiam inseguras naquela época. A situação da inflação seria controlada aos poucos, quando Fernando Henrique Cardoso, ministro da economia do presidente Itamar Franco, substituto de Collor, apresentou o chamado Plano Real. O Real, nova moeda nacional, começou a circular em 1 de julho de 1994.

Curiosidade dessa situação de transição econômica. Veja na nota as observações manuscritas “ URV do dia - 1.084,13 “, “40, 60 URVs “. Estava em vigor a regra de adaptação da nova moeda Real. Uma informação extra que também aparece é “Gasolina = 4 URVs “. Na primeira nota, aquela de 16 de março, essas anotações não apareciam.

As anotações de Sílvia, feitas no dia 10 de maio de 1994, começam da seguinte forma

Notemos que os valores estão em dólares, ainda refletindo as dificuldades relacionadas com a inflação daquele tempo.

Em seguida ela observa que, como o painel agora estava sendo pensado para a parede da Galeria Pattaro, e antes fora projetado para as dimensões de 3,20 m por 2,20 m, o orçamento teria que crescer. Para o novo tamanho de 4,00 m por 2,50 m a argila ne-

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