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não identificada

Figura 11. Indumentária rosa de comunidade jongueira não identificada. Foto tirada no dia estadual do jongo (Maroun, julho 2011)

Desse modo, a performance do jongo expressa pelo corpo, isto é, pelas corporalidades, representam a memória e a história da resistência de comunidades negras rurais descendentes dos africanos, que foram escravizados no Brasil. Esta representação ocorre especialmente em dois âmbitos diferenciados que, no entanto, complementam-se: os movimentos musculares que os jongueiros realizam nas rodas, tanto com relação à dança propriamente dita, como também em outros momentos e movimentos, tais quais o ritual de entrada e saída do centro da roda, a reverência ao tambor, a forma de parar o canto para se colocar um novo ponto, bem como pela indumentária e/ou pelos adereços que revestem os corpos dos jongueiros, compondo os elementos estruturantes de suas performances culturais. Entre o universal e o particular observamos um conjunto de jongos ressignificados e capazes de “performar,” segundo a especificidade cultural do grupo e a função social que almejam.

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Etnografia do jongo de apresentação

Trazemos aqui uma descrição etnográfica de uma roda de jongo observada na comunidade quilombola de Santa Rita do Bracuí, no dia 22 de maio de 2011, na festa em homenagem à padroeira da comunidade: Santa Rita. Trata-se do jongo de apresentação. Configuração inicial de uma roda, com apenas um tambor inserido dentro da mesma. Jussara se coloca ao lado do tambor e abre a roda de jongo. Luciana Adriano estava na roda, mas não colocou nenhum ponto. Sua única fala aconteceu um tempo depois do início do jongo, quando convidava as pessoas “de fora” para participarem e entrarem na roda de jongo, se assim quisessem. Jussara abre a roda com desenvoltura e muito segurança. Ela foi a liderança jongueira principal dessa roda, ao passo que Luciana Adriano a observava. Ela colocou o ponto de abertura e, no ponto seguinte, que ela mesma puxou novamente, entrou na roda, escolheu um par e assim deu início ao ritual da dança do jongo, momento em que conciliava a dança ao canto. A partir daí, a roda foi evoluindo com seu processo performático próprio. Quem quisesse colocar um ponto, chegava até o tambor e colocava a mão, ao passo que, quando isso ocorria, tanto o canto como a dança cessavam. Com relação à dança, quem está dentro, escolhe o seu par para dançar no centro da roda, como bem exemplifica um dos pontos que foi colocado nessa roda: “é a dança do jongo gente, como é que é, a mulher tira o homem, o homem tira a mulher”. Dessa forma, a partir da abertura, partindo do princípio que o primeiro casal já está no centro da roda, quando um dos dois resolver sair e voltar para a roda junto aos demais, o que permanece se aproxima daquele que quer que seja seu novo par, flexiona o tronco em sua direção e retorna ao centro com o escolhido. Isso vai ocorrendo sucessivamente. Além disso, quando os escolhidos para entrar na roda adentravam-na, em algum momento, que não necessariamente era logo à entrada, aproximavam-se do tambor e faziam reverência. Alguns faziam o sinal da cruz e tocavam o tambor com a mão, outros apenas se aproximavam e faziam a reverência, curvando o tronco em direção ao instrumento. Dentre as crianças e jovens que colocaram pontos, tivemos a própria Jussara, o Patrick, que também bateu o tambor em determinado momento, e o Mec. Este chegou após o início da roda e entrou imediatamente, tocando o tambor

- gesto que significa parar tudo para que o jongueiro que o tocou seja escutado colocando um ponto improvisado por ele na hora que fazia uma crítica à prefeitura de Angra dos Reis. Mec se colocou muito seguro também e todos se animaram com o seu ponto, tornando o coro enfaticamente forte naquele momento. Dona Olga entrou bastante na roda. Ela não colocou pontos. O que ela gosta é de “balançar a saia,” como ela mesma diz. Sempre que entra para dançar, mostra grande entusiasmo. Por outro lado, Dona Celina, que está com problemas de locomoção, e estava fora da roda sentada, de repente, corre até o tambor com uma agilidade e rapidez incoerentes com seu estado de saúde e coloca um ponto de jongo que fazia menção ao seu problema de joelho que não a permitia dançar mais. Quando ela colocou seu ponto, todos riram bastante e a roda ficou bem animada. Também foi um ponto de improviso, criado na hora. Dos velhos jongueiros, apenas estas duas mencionadas anteriormente participaram da roda. A roupa das mulheres era bem demarcada. Todas estavam com suas saias de chita e, ao adentrarem a roda, seguravam-nas e as balançavam no ritmo dos movimentos que faziam com seus pés. Balanço das saias em sincronia com os passos dos pés no ritmo das batidas do tambor compunham o passo básico delas. A maioria estava com a blusa do Pontão de Cultura Jongo/Caxambu. Já os meninos estavam com vestimentas aleatórias. Pelo frio que fazia, a maioria estava de calça e de casacos. Seus passos na roda eram mais livres e o estilo de cada jongueiro variava mais, se comparado com o padrão feminino. Alguns deles, inclusive, dançavam com uma ginga que remete à dança oriunda do ritmo do funk, o que não era observado na performance das meninas. Um ponto de jongo da Serrinha, do Mestre Darcy, também foi cantado, puxado pela Jussara. Nesse momento, muda-se o ritual. O passo passa a ser outro, mais técnico, o chamado “tabeado”. A batida no tambor também passa a ser diferente. A própria dinâmica de entrada na roda se modifica. Agora quem está na roda batendo palma e fortalecendo o coro decide a hora que deve entrar e “corta” aquele que escolher tirar do centro. Ao entrar na roda pede licença a um dos dois, no caso o homem tira um homem e a mulher tira uma mulher. A entrada é

diferente, pois se entra na roda fazendo reverência primeiro ao tambor para, só depois, aproximar-se da pessoa que será substituída na dança.

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