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Imagem 24 Benção do casal real do Maracatu Nação Iracema, Dia do Maracatu de março de 2014.
É importante apresentar para os grupos de maracatu, sobretudo, os possíveis efeitos e tensionamentos referentes às utilizações da política de Registro do Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro. Cabe ainda evidenciar para os maracatuqueiros18 esses efeitos frente às suas próprias tradições e demandas atuais emanadas da crescente inserção dos maracatus no mercado cultural, seja assumindo o papel de atração cultural em eventos de diferentes naturezas, ou ainda pela utilização de sua imagem como recurso publicitário – como símbolo cultural da cidade.
Possuímos a percepção da relevância desse trabalho como acréscimo aos conhecimentos já produzidos sobre as caracaterísticas artísticas e sobre o desenvolvimento social nos maracatus cearenses. Como diferencial nessa pesquisa, situamos os maracatus no campo das políticas de registro do patrimônio cultural imaterial e no estudo da patrimonialização dessa expressão cultural. Assim, para compreender as questões referentes à construção das identidades culturais, diante dos maracatus fortalezenses, buscamos nos referenciar nas análises de Benedict Anderson (2008), Stuart Hall (2011), José Jorge de Carvalho (2004), Hobsbawm e Ranger (2002), e Paulo Peixoto (2004). Para o estudo dos discursos sobre a diversidade cultural e das referências culturais
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entendidas como objeto de sentido valorativo e passíveis de patrimonialização, fundamentamos nossas análises em IPHAN (2000), Durval Muniz Albuquerque Júnior (2007; 2011), Maria Cecília Londres Fonsêca (2012), Márcia Sant’Anna (2005), Ricardo Souza (2005), Simoni Toji (2009). Consideramos fundamentais as contribuições desses teóricos para a análise das questões vivenciadas em campo com os maracatus e agentes implementadores de políticas públicas de preservação patrimonial. Não obstante, a fim de investigar e analisar as questões propostas nesse trabalho, recorremos ao uso de fontes e metodologias complementares, na construção de um trabalho
do Patrimônio Cultural, tem-se ainda a dissertação Entre cantos e açoites: memórias, narrativas e políticas públicas que envolvem os penitentes da cidade de Barbalha-CE¸ da historiadora Jana Rafaela Maia Machado, defendida em 2014, resultante da pesquisa com os grupos de penitentes na cidade de Barbalha, no Sertão do Cariri. MACHADO, Jana Rafaela Maia. Entre cantos e açoites: memórias, narrativas e políticas públicas que envolvem os penitentes da cidade de Barbalha-CE. Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Mestrado Profissional em Preservação do Patrimônio Cultural. Programa em Especialização do Patrimônio. Rio de Janeiro: 2014. 18 Nome que se dá a quem participa dos maracatus no Ceará. Em outros estados, a exemplo de Pernambuco, é comum chamar o brincante de maracatuzeiro. A personagem ou papel que o brincante exerce no desfile pode também render outras nomenclaturas, como tirador de loa ou macumbeiro (quem canta as loas), e batuqueiro (integrante do batuque).
multidisciplinar, conforme a proposta do Programa de Mestrado Profissional em Preservação do Patrimônio Cultural, no Iphan. Assim, utilizamos a pesquisa historiográfica, investigando documentos produzidos sobre os maracatus cearenses, bem como a pesquisa etnográfica, realizando visitas aos grupos de maracatu. No campo, estendemos as visitas também aos órgãos que dialogam com os maracatus na organização de suas apresentações carnavalescas e vivências cotidianas.
A partir desses apontamentos, na fase preliminar da pesquisa, realizamos visitas à Biblioteca Pública Municipal Dolor Barreira, Biblioteca Pública Estadual Governador Menezes Pimentel, Biblioteca da Superintendência do IPHAN no Ceará, bibliotecas das Universidades Federal do Ceará – UFC, e Estadual do Ceará – UECE, e Biblioteca do Centro Cultural do Banco do Nordeste. Identificamos, nessas instituições, importantes publicações acadêmicas produzidas, sobretudo a partir dos anos 2000, referentes aos maracatus de Fortaleza. Continuamos nossa pesquisa nos arquivos da Coordenadoria de Patrimônio Histórico Cultural – COPHC, e no acervo do Museu da Imagem e do Som, ambos vinculados à Secretaria de Cultural do Ceará. Identificamos nas referidas instituições materiais veiculados pela imprensa local, registros audiovisuais de desfiles de maracatus em diferentes épocas, e de participação em eventos esporádicos. Visitamos, ainda, a hemeroteca digital do jornal "O Povo", consultando jornais datados dos anos 1930 a 1990, possível através da relação de colaboração entre o IPHAN e a unidade gestora do banco de dados do referido jornal. Consultamos também o acervo da Biblioteca Amadeu Amaral, do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (CNFCP), que disponibilizou cópias de jornais indexados ao acervo e dos registros sonoros sobre os maracatus cearenses. Consideramos incluir no delineamento de nossas fontes os registros audiovisuais referentes aos documentários sobre os maracatus cearenses; registros sonoros produzidos por artistas e pelos maracatus cearenses (incluindo-se as loas compostas para os desfiles anuais dos maracatus, e músicas difundidas em fonogramas comerciais); relatórios técnicos produzidos pela Prefeitura de Fortaleza acerca dos concursos carnavalescos ; documentos administrativos referentes aos processos de registro dos maracatus pelo IPHAN e pela SecultFor. Tabalhamos, ainda, com relatos orais coletados em entrevistas através de questionários. Fizemos uso das entrevistas pautados na história oral e depoimentos de campo, compreendendo, como nos direciona o Etnomusicólogo Edilberto Fonseca, que a "transposição para o discurso vocal acaba sempre revelando vestígios dos processos de representação elaborados por quem narra" (FONSECA, 2014, p.15). Entendemos os relatos
orais registrados em áudio19 como documentos que se incorporam ao conjunto de fontes primárias produzidas sobre a temática, permitindo a elaboração de novos produtos que darão suporte à manutenção da memória e estudo sobre os maracatus do Ceará. Para a realização das entrevistas, elegemos indivíduos destacando-os a partir das suas relações de proximidade com os maracatus, maracatuqueiros, brincantes, artistas, e demais envolvidos, seja do ponto de vista acadêmico, de articulação ou político. Dessa forma, através da realização de questionários direcionados e semidirecionados (ver tabela 2), entrevistamos representantes de grupos de maracatu de Fortaleza: Pingo de Fortaleza20 (Maracatu Solar); Calé Alencar (Nação Fortaleza); Francisco Barbosa (Maracatu Rei de Paus); Rodrigo Damasceno (Maracatu Rei do Congo), e Paulo Tadeu (co-fundador dos maracatus Vozes da África e Nação Iracema). Como representantes de maracatus do interior entrevistamos: Ana Souza (Maracatu Nação Tremembé, da cidade de Sobral); Augusto Medeiros (Maracatu Estrela de Ouro, da cidade de Canindé); Paulo Fuísca (Maracatu Uinú Erê, da cidade do Crato)21 . Como estudiosos da cultura dos maracatus no Ceará, destacamos três indivíduos: Danielle Maia Cruz, doutora em Sociologia, que na trajetória acadêmica entre o mestrado e doutorado, estudou as relações comunitárias e a relação dos maracatus com as políticas públicas de fomento em editais carnavalescos na cidade de Fortaleza; Oswald Barroso, doutor em Sociologia, teatrólogo e pesquisador da cultura popular do Ceará ; e ainda, José Soares Neto, bacharel em Direito e primeiro a descrever, em trabalho acadêmico, as condições e relações entre as leis de proteção do patrimônio imaterial com o pronunciamento do registro dos maracatus do Ceará. De forma sistemática, podemos acompanhar essas informações nas tabelas abaixo:
19 Disponibilizamos o quadro de entrevistas no Apêndice 7. Com relação aos registros sonoros na aplicação das entrevistas diretas, em duas situações não se tornou possível, dada à ausência de aparelho de gravação adequado ou das condições do local de realização da entrevista. 20 Pseudônimo de João Wanderlay Roberto Militão. 21 Durante o delineamento dos problemas de pesquisa, consideramos realizar a análise apenas com os grupos situados em Fortaleza, contudo, na intenção de entrevistar representantes dos grupos de maracatu do interior, adotamos a aplicação de questionários estruturados e de entrevista via chat nos casos de Paulo Fuísca e Augusto Medeiros, respectivamente. Entendemos que a realização das entrevistas nesse formato não comprometeu a qualidade das informações recebidas e da sua consequente análise.