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Tabela 1 Entrevistas realizadas

Tabela 1 - Entrevistas realizadas Representantes de maracatus de Fortaleza Representantes de maracatus do interior Pesquisadores

Total

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Fonte: Elaborada pelo autor. 6 3 3

12

Tabela 2 - Utilização de questionários nas entrevistas aplicadas aos representantes de maracatus e pesquisadores acadêmicos

Tipo de questionário Semidirecionado Estruturado

Entrevistas presenciais 10 0 Entrevistas realizadas pela internet 1 1 Fonte: Elaborada pelo autor.

Entre os entrevistados classificados como representantes dos maracatus de Fortaleza e também artistas pesquisadores, citamos os cantores e compositores Pingo de Fortaleza e Calé Alencar, que também pesquisam sobre as histórias e nuances artísticas dos maracatus cearenses. Em suas carreiras, produziram livros, almanaques, documentários, músicas e álbuns musicais que abordam as trajetórias de pessoas e dos grupos de maracatu. Contribuem, ainda, em espetáculos em que se utilizam das linguagens musical, cênica e performática dessa expressão cultural no Ceará. Visitar as sedes e participar de eventos com os maracatus tornou-se fundamental para a coleta de dados e para a efetivação da relação entre o pesquisador e os sujeitos. Essa necessidade, identificada logo na fase preliminar da pesquisa, situou a participação do pesquisador nos ensaios e nos desfiles dos maracatus no concurso oficial, durante o carnaval, e no Dia Municipal do Maracatu22. Acrescentamos a essas visitas os desfiles dos maracatus no projeto "Dia 25 é dia de Maracatu", promovido pela SecultFor23 , e ainda as reuniões dos grupos de maracatu na superintendência do IPHAN no Ceará, e na Associação Cultural das Entidades Carnavalescas do Estado do Ceará - ACECCE.

A partir dos diálogos em campo, percebemos o desdobramento da atuação do pesquisador também como mediador entre o IPHAN, os grupos de maracatu e a SecultFor. No tecer dessa trama, coube-nos estreitar esse diálogo através dos encontros formais na

22 Instituído através da Lei Municipal nº 5.828, de 05 de dezembro de 1984. Fortaleza-CE. 23 O Projeto consiste no desfile de um maracatu em diferentes lugares na cidade, no dia 25 de cada mês, em alusão ao dia 25 de março, dia municipal do maracatu.

Superintendência do IPHAN no Ceará, para discutir as condições e possibilidades de efetivação da candidatura de registro, e, ainda, em encontros informais com maracatuqueiros, nos quais se pontuavam esclarecimentos sobre as políticas de registro do patrimônio imaterial (federal e municipal). Nesses encontros, foram reveladas ao pesquisador as inquietações dos maracatuqueiros frente ao processo de registro dos maracatus, o que se percebe por meio das alegações de que o registro de bem cultural de natureza imaterial representaria o engessamento de suas práticas culturais, e favoreceria o acirramento de tensões já existente entre os grupos. O maior ponto de embate entre os grupos de maracatus consiste, portanto, na manutenção dos recursos de preservação da memória e das tradições individuais e coletivas a partir da efetivação dos registros. Por meio das pesquisas preliminares em bases bibliográficas e retroalimentadas com as informações obtidas entre as entrevistas pudemos compor um glossário com termos elementares sobre os maracatus do Ceará, o que auxilia na compreensão dos nomes de personagens e de situações comuns aos maracatus. Ainda através das observações em campo e contato direto com os maracatuqueiros e agentes formuladores de políticas públicas, identificamos diferentes festas de carnaval na cidade de Fortaleza – diferentes dinâmicas culturais que favorecem a formatação de bailes, festas, cortejos etc., nos quais os maracatus invariavelmente se inserem. Nesses momentos festivos de carnaval se delimitam os espaços sociais e simbólicos ocupados pelos maracatus e pelos blocos, cordões, blocos de sujos, afoxés, escolas de samba e demais formas de expressão existentes em Fortaleza. Além dessas características, a disparidade econômica contribui para estigmatizar o perfil do público que assiste aos maracatus no concurso oficial do carnaval, frente aos foliões que optam por aproveitar este período festivo distante da cidade de Fortaleza.

Seguido esse argumento, de acordo com Ricardo Souza (2005, p. 104), entendemos que o carnaval "cumpre a função de definir as elites; reorganiza-as no movimento de ascensão e queda de grupos sociais, definindo quem pode ser aceito e quem deve ser excluído". Contudo, vimos nos maracatus, invariavelmente, indivíduos de diferentes condições sociais assumindo personagens com ou sem destaque nos desfiles, enquanto os maracatus ainda são vistos, grosso modo, como um espetáculo feito pelos e para os excluídos economicamente na cidade. Nessa ótica, percebemos inquietações dos grupos de maracatu em Fortaleza frente à utilização do dinheiro público na promoção do carnaval oficial da cidade, o que implica na preparação e concorrência aos editais de financiamento público mantidos pela Prefeitura de

Fortaleza (CRUZ, 2010a; 2010b), bem como a supervalorização do principal polo do carnaval na cidade, com o palco para grandes shows de artistas de outros estados, ou seja, o palco que fica na Praia de Iracema. Com isso, relegados às áreas afastadas dos pólos turísticos e da cobertura da imprensa, os maracatus se mantêm segregados como produtos das periferias de Fortaleza, produzidos e consumidos principalmente pela população economicamente menos favorecida, que continua em busca de estratégias e de melhores condições para desfilar no carnaval.

Assim, vemos nas estratégias de afirmação das tradições culturais nos maracatus de Fortaleza – frente a tais dilemas e inquietações –, apontamentos onde se percebem processos de ressignificação e espetacularização cultural (GUILLEN, 2006; FONSECA, 2014), na tentativa de tirar os maracatus do espaço de exclusão onde têm sido mantidos até os dias de hoje. A patrimonialização dos maracatus, nesse caso, viria a somar-se a esse processo promotor de visibilidade e de reconhecimento para os maracatus, ainda que os efeitos da patrimonialização possam promover desencontros nas percepções dos maracatuzeiros quanto ao que de fato representa as ações de salvaguarda e a preservação das tradições de cada grupo da cidade.

Desse modo, para ilustrar os caminhos trilhados ao longo dessa pesquisa, estruturamos essa dissertação em três capítulos, nos quais serão apresentados e discutidos aspectos centrais das tradições culturais dos maracatus cearenses. Optamos por problematizar, sobretudo, as relações emergentes dos processos de patrimonialização dessa expressão cultural, centralizando as descrições e análises nos fatores mais relevantes desse processo na contemporaneidade e ainda fazendo uso da documentação que nos remete aos anos 1980 como época exponencialmente importante no processo de valorização dos maracatus em Fortaleza e na sua elevação à símbolo cultural da cidade. No primeiro capítulo: No Ceará tem maracatu, discorremos sobre a existência de maracatus no Ceará e em outros estados do Nordeste como Sergipe, Alagoas, Paraíba e Pernambuco. Consideramos, nesse capítulo, a variedade de hipóteses de surgimento dos maracatus no estado do Ceará, assim como as duas versões principais difundidas entre pesquisadores e brincantes. Tais versões se complementam na construção das narrativas de origem, e na identificação de permanências ente os maracatus contemporâneos e os grupos do passado. Nesse capítulo fazemos, ainda, apontamentos relevantes quanto às características performáticas e sociais dos maracatus, situando as especificidades que justificam o argumento das tradições e práticas culturais específicas dos maracatus no Ceará.

No segundo capítulo: Políticas de preservação e os maracatus em Fortaleza apresentamos e discutimos as políticas de registro do patrimônio cultural imaterial, a nível federal, situando a candidatura dos maracatus cearenses ao referido registro. Para tanto, discutimos as condições de aplicação do registro e as articulações contemporâneas realizadas no sentido de promover a titulação oficial dos maracatus como patrimônio cultural. Neste capítulo, observamos, sobretudo, a articulação do poder público municipal com os maracatus para garantir condições de fomento aos eventos onde se apresentam e na manutenção de ações que fortalezam o maracatu na cidade. No terceiro e último capítulo, Maracatus do Ceará como patrimônio cultural: pressupostos da patrimonialização e do registro, discorremos sobre os percursos históricos e sociais da visibilização e valorização dos grupos de maracatu em Fortaleza, abordando a construção da ideia de maracatu enquanto um símbolo cultural fortalezense, cearense e brasileiro. Trilhamos as políticas de valorização dos maracatus desde os anos 1980 até meados de 2014, através das ações dos órgãos da gestão pública municipal, em Fortaleza; da instalação do Museu do Maracatu em 1984; e, ainda, por meio do crescimento da quantidade de grupos de maracatu e a consequente produção acadêmica sobre os maracatus nos anos 2000. Sobre esses últimos elementos, reservamos atenção específica devido à forma como o universo de produção acadêmica e a proliferação de novos grupos exerce sua contribuição para a construção das versões e mitos de origem dos maracatus, bem como dinamiza a percepção das suas identidades e tradições. Portanto, nesse capítulo, além dos registros documentais e a relatos de entrevistas, fizemos uso das notas tomadas em nossas observações em campo para evidenciar os diferentes entendimentos dos maracatus enquanto patrimônio cultural. É importante ressaltar que este capítulo ressalta a importância de se perceber o patrimônio cultural como categoria de pensamento e de usos políticos estratégicos, que já vinha sendo aplicada aos maracatus do Ceará sob outras roupagens, e agora se investe dos instrumentos legais para cumprir com esta valorização e preservação cultural. Nas considerações finais, além de tecer a síntese sobre o que foi trabalhado ao longo desta dissertação, apresentamos nossas opiniões sobre o envolvimento com os maracatus e seus atores sociais ao longo de dois anos de pesquisa. Apontamos também a importância de se estudar a patrimonialização dos maracatus a partir de dois diferentes aspectos: a construção simbólica de um ícone cultural por meio da ação de folcloristas e pesquisadores acadêmicos, e por outro lado, a patrimonialização iniciada pelo acionamento dos dispositivos jurídicos para a preservação do patrimônio cultural imaterial no Brasil e em Fortaleza. Sugerimos, ainda, o desenvolvimento de pesquisas mais aprofundadas sobre os maracatus do interior do Ceará,

visto a sua importância social e ligação com os grupos da capital, bem como o estudo detalhado sobre o Museu do Maracatu.

Assim, ao longo desse trabalho discutimos relevantes informações sobre os maracatus do Ceará, sobretudo os de Fortaleza, a partir do ponto de vista dos estudos da patrimonialização e das relações entre as políticas públicas de patrimônio e a forja de um símbolo cultural para o estado do Ceará. Revelamos ainda novas fontes e possibilidade de estudo para os maracatus do Ceará, fugindo da linha investigativa sobre as suas origens e conduzindo os estudos para os efeitos contemporâneos de sua organização social. Ainda, por meio da documentação histórica, apresentar e revelar a importância do Museu do Maracatu como elemento chave na afirmação do maracatu do Ceará no cenário turístico e cultural dentro de Fortaleza. Este panorama certamente há de contribuir e provocar essas novas possibilidade de diálogos entre os diferentes atores sociais que protagonizam no universo desse trabalho.

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