Revista na Metrópole 2ª edição

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Na Metrópole Na Metrópole

Em ano de eleições municipais, confira a relação dos jovens com a política

Ameaça: Prefeitura pode retirar bancas de jornal da Praça da Sé SAÚDE Único hospital veterinário público do país é ampliado

DESCOBRINDO História do grafite e do Movimento Anarquista em São Paulo

Ano I, Edição II

R$12,99

E mais... Assistência psicológica em escolas infantis

CULTURA Dicas de teatro, filmes e livros 1

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Na Metrópole Editora chefe: Aline Oliveira Revisão/Edição/Diagramação: Aline Oliveira Ludimila Honorato Repórteres: Alexandre Nunes Aline Oliveira Guilherme Corrêa Ludimila Honorato Maday Florencio Talita Alessandra Convidados: Armando dos Prazeres Karina Biondi Thomas Shikida

Universidade São Judas Tadeu Chanceler Profª Alzira Altenfelder Silva Mesquita Reitor Profº José Christiano Altenfelder Silva Mesquita Pró-Reitor de Graduação Profº José Reinaldo Altenfelder Silva Mesquita Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Profº Drº Alberto Mesquita Filho Pró-Reitoria de Extensão Profª Lilian Brando Garcia Mesquita Diretor da Faculdade de LACCE Profº Rosário Antônio D’Agostino Coordenador do Curso Jornalismo Profº Anderson Fazoli Professor orientador Clovis Furlanetto

Na Metrópole Avenida Melo de Freitas, 436 — 5º andar www.nametropole.com.br Telefone: (11) 3725-2210 Nas redes sociais: @_NaMetropole facebook.com/nametropole

Carta ao Leitor Depois das boas vindas que a primeira edição da Na Metrópole obteve, eis que lançamos a segunda. E agora com novidades. Sim, mudamos, e para melhor, tanto no visual quanto no conteúdo. Agora mostraremos São Paulo de forma mais global. Nosso intuito é ampliar seu campo de visão sobre essa grande metrópole brasileira, de modo que haja uma abordagem mais completa da cidade. Assim, caro leitor, você perceberá que o nosso foco de abordagem se expandiu. Enquanto na primeira edição nós publicamos assuntos pertinentes apenas ao Centro de São Paulo, agora nós trazemos informações de outras regiões da capital. Acrescentamos, também, novas editorias. Na primeira edição, a nossa reportagem histórica foi sobre o nascimento da cidade de São Paulo. Agora, traremos ao seu conhecimento a história do movimento anarquista que, através de teoria e prática libertárias, revolucionou os cenários político e cultural da cidade. Expandindo os horizontes, mas não fugindo do Centro, Na Metrópole traz um assunto polêmico e que merece mais atenção: a retirada das tradicionais bancas de jornal da Praça da Sé. Já em Saúde você confere o trabalho de apoio psicológico realizado em escolas da Zona Norte de São Paulo. Ainda na editoria de Saúde, abordamos uma iniciativa da Anclivepa - SP (Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais de São Paulo) de criar um hospital público para cães e gatos de pessoas de baixa renda. Em ano de eleições municipais, vamos saber como está a relação do jovem com a política. Será que os estudantes universitários se interessam pela sua cidade e se preocupam em definir em quem votar? Buscaremos enxergar melhor os porquês do interesse ou desinteresse dos jovens eleitores paulistanos pelas questões eleitorais. Para quem gosta de arte, traremos a história do grafite, seus precursores e pontos marcantes do movimento que traz vida e identidade aos cenários urbanos paulistas. Na Metrópole terá ainda um espaço voltado à cultura e o que acontece na cidade. Recheada de novidades, nossa segunda edição está com a cara de São Paulo: repleta de opções para desfrutar. Assim, com novo formato e mais conteúdo, desejamos que você aproveite nossas dicas e fique por dentro das notícias da capital paulista. Boa leitura!

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CIDADE Twitter dos muros 8

Artigo: As cadeias do Parque da Juventude

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A História do Movimento Anarquista em São Paulo 16

Pingue-Pongue: 20 ANOS DO MASSACRE DO CARANDIRU 26 CAPA - Prefeitura ameaça remover bancas de jornal da Praça da Sé 30 Voto: direito ou obrigação? 35

SAÚDE Primeiro hospital público para cães e gatos é ampliado 38 Psicóloga desenvolve projeto de saúde mental em escolas públicas infantis 41 Crônica: Enfermos do Brasil: a verdadeira drogaria 43 CULTURA Perfil: Warde Marx: a vida como ela é 48

RESENHA CULTURAL Teatro 58 Filme 59 Livro 61

Vide-Verso 65

Crônica: Rumores Urbanos 54

LAZER Guia de Passeios: dicas para visitar e apreciar 55

Jardim Botânico de São Paulo

Parque Estadual do Belém Na ponta da agulha, uma canção

São Paulo em 4 Fotos 66 5

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Vocêdáascartas

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Pensamento em versos Parabéns pelo espaço que vocês reservaram à poesia na seção Vide Verso! Ótima forma de reflexão e arte em meio a informações do dia a dia. Acredito que falta espaço para esse tipo de iniciativa na maioria das revistas que circulam no mercado.

Um centro, vários centros São Paulo é muito grande para ser abordada apenas na sua centralidade. Existem realidades que fogem do cenário habitual; uma capital tão grande merece maior atenção em pontos mais afastados do centro, pois existem vários centros paulistanos. Fujam do comum.

André Dantas Vila Leopoldina, São Paulo

Paola Mendes Brás, São Paulo

Que bom que você gostou, André! Acreditamos que esse tipo de arte é importante para todos. Confira nessa edição a poesia de Mario de Andrade, Garoa do Meu São Paulo.

Obrigada pela sugestão, Paola. Já pensando nisso, expandimos nossa abordagem e como você verá, essa edição traz relatos de outras regiões paulistanas, inclusive uma seção de fotos. Desfrute!

História nas ruas, praças e espaços A dica de visita ao Museu Anchieta me deixou curiosa para saber um pouco mais sobre a história de São Paulo. Não tinha o hábito de visitar pontos turísticos e museus, mas desde quando comecei a estudar Sociologia, passei a incluir nos meus finais de semana passeios desse tipo. Aproveito para indicar que vocês da equipe Na Metrópole criem um espaço de publicação fixo para indicar mais passeios; às vezes fico sem saber de novos lugares para conhecer.

Retrato de mudanças com outro foco Acho um absurdo o Projeto Nova Luz, que levanta tantas discussões contrárias, continuar em vigor. Aliar as mudanças urbanas e seus aspectos sociais em duas reportagens sobre o centro de São Paulo e as atuais políticas de gestão habitacional foi de uma sensibilidade incomum. Pude perceber outros lados de assuntos que parecem repetitivos, mas sobre os quais poucos sabemos de verdade.

Agnes Rodrigues Tucuruvi, São Paulo

Levamos em consideração o seu pedido, Agnes, e trazemos uma seção de lazer com dicas de lugares novos (ou não), mas principalmente interessantes para conhecer. Espero que goste e desfrute de todos eles!

Sofia Lima sobre as reportagens Entre o público e o privado: Limites de uma proposta de revitalização urbana e A realidade que entristece o coração da capital paulistana. Jabaquara, São Paulo

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Twitter dos muros Galerias a céu aberto: grafiteiros postam seus tweets em cores e criatividade nos muros das cidades

Grafiteiros mostram sua mensagem por meio da arte nas paredes / Foto: Alexandre Nunes

Por Alexandre Nunes

A

de artes a céu aberto nas enigmas para os arques paredes, desde grandes metrópoles, ri- ólogos, mas para os os tempos das cavernas, cas em cores e informação. seres daquele contexto foram usadas como eram significantes, pois forma de comunicação Uma breve História representavam uma forentre os homens. Hoje A história do graffiti ma de expressão ou, em dia não é diferente. tem relações bem an- talvez, uma transcrição Alguns dizem que é tigas com as pinturas do momento histórico. simplesmente vandalis- rupestres feitas nas pa- Dessa maneira, temos mo, outros têm como redes das cavernas a a forma mais antiga forma de liberdade de cerca de 100.000 anos de manifestação dessa expressão. Arte ou crime? antes de Cristo, época arte. Há relatos também O graffiti e as inter- em que nossos ances- no Império Romano, venções artísticas au- trais pintavam animais, mas a definição mais mentam no cotidiano caçadores e símbolos. popular diz que o gradas grandes cidades. Muitas dessas repre- ffiti é um tipo de inscriMuros se tornam galerias sentações, até hoje, são ção feita em paredes.

No período contemporâneo, o graffiti como hoje é conhecido surgiu na França em 1968 com as manifestações políticas estudantis que criticavam o autoritarismo e a política das nações dominantes e as consequências da ascensão do capitalismo no país e no mundo. Nessa mesma época, aqui no Brasil, grupos de jovens estudantes e seguidores políticos contrários à ditadura mi-

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litar, influenciados pelos franceses, escrevem frases de protestos contra o regime. O aperfeiçoamento veio dois anos depois, nas ruas da Filadélfia e de Nova Iorque. Muros públicos, fachadas de edifícios e trens viraram espaço de disputas de adolescentes que queriam deixar suas marcas e insatisfações com a sociedade. O que eram apenas assinaturas e pichações vistas como ato de vandalismo evoluíram para pinturas gigantescas, integrando-se à paisagem urbana, a partir de então, colorida. Tempos depois, o Pinturas rupestres: o primeiro contato dos homens com os muros / Foto: arquivo graffiti se associou à música e ao movimento No entanto, alguns ar- Madalena e na Faculdade subjetividade. “O braHip-Hop, tornando-se tistas de rua alegam que de Belas Artes. sileiro tem muito mais produto da cultura jovem. o graffiti é uma arte para do que pinga, futebol e Mas quem o consoli- todos e não pode ficar Os artistas das ruas mulher. Tem uma culdou como parte impor- presa em galerias ou ex- de São Paulo tura, um jeito de ser tante da cultura foram posições pagas para seFrancisco da Silva, 29 próprio que se ele mesartistas como Kheith rem vistas ou compradas. anos, conhecido como mo não enxerga e não Haring e Jean-Michael Nunca, é um grafiteiro valoriza”, diz. Basquiat que usavam o paulista que leva em Nunca é adepto às A revolução graffiti como essência seus trabalhos muito ideias contidas no Macomeça pelo que de suas obras. Basquiat do folclore, aspectos nifesto Antropofágico você consome dizia não ouvir os crítido imaginário brasi- criado pelo moderniscos de arte, porque não leiro, elementos sim- ta Oswald de Andrade conhecia ninguém que bólicos influenciados em 1928. O artista busprecisasse de um crítiFrutos dessa ideolo- pela cultura indígena e ca despertar um sentico para saber o que ela gia, em 2008 acontece- incorporados à picha- mento de autocrítica em é. Graças a esses artis- ram uma série de ata- ção. O uso de cores relação à valorização tas, vários outros grafi- ques, como na 28ª Bienal fortes e muita expres- excessiva da reproduteiros ganharam espaço de São Paulo no Parque sividade compõem uma ção mecânica e de moem galerias e exposi- do Ibirapuera, na galeria estética engajada que dismo estrangeiro em ções por todo o mundo. Choque Cultural na Vila mistura crítica social e detrimento da essência 9

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Crítica do grafiteiro Nunca à invasão cultural norte-americana / Foto: Alexandre Nunes

e raízes brasileiras. “O Brasil tem excesso de desemprego e ao mesmo tempo possui produtos ótimos, como o guaraná, que poderiam ser vendidos lá fora, o que geraria um ótimo retorno para o país. Por isso faço guaraná, oposto na valorização industrial para o bem do povo”, relata o artista. Geralmente, seus personagens são canibais que devoram uns aos outros da mesma forma que a cultura indígena foi engolida pelos colonizadores portugueses. Os índios desenhados por ele nos muros usam “naique”, ironia ao nome original da marca e ao processo de substituição da cultura popular por hábitos norte-americanos e europeus. Incomodado com os processos exploratórios infligidos

ao povo brasileiro até os dias de hoje, Nunca reafirma em suas obras a importância da cultura brasileira frente ao domínio imperialista estrangeiro. Conquistando seu espaço na cidade, o grafiteiro Raoni, 28 anos, nasceu e mora no Butantã. É o criador do grupo de graffiti “Odeio”, que tem como objetivo realçar as culturas da periferia paulistana e protestar contra a alienação da mídia com a influência dos costumes sociais. “A revolução começa pelo que você consome”, diz Raoni em uma crítica às programações de rádio e televisão sensacionalistas, sem nenhum conteúdo cultural. A sua forma de graffiti é o Throw-up (em português, vomitar), estilo que é desenhado e pintado rapidamente com duas

ou três cores diferentes, muitas vezes sacrificando a estética pela velocidade e rapidez. Em algumas de suas obras ele desenha seu personagem conhecido como Invasor de Cérebros. “Essa criatura que inventei tem o poder de entrar na cabeça das pessoas intelectuais e conhecer suas doutrinas e inteligência, aumenta seu nível cultural. Espero que um dia as pessoas também comecem a se espelhar nos verdadeiros artistas da nossa cultura”. Além das artes plásticas, o artista também toca na noite gêneros como o Dub e Sound System, ambos derivados do reggae. Banksy e as novas intervenções da rua Banksy nasceu em 1974, na cidade britânica de Bristol e conquis-

tou o mundo. Seus trabalhos em estêncil não se limitaram ao pequeno distrito, mas foram para as ruas de Londres e vários cantos do mundo. Seu nome é um pseudônimo e além de grafiteiro, o artista também é pintor, ativista político e diretor de cinema. Sua arte de rua é satírica e subversiva, combina humor negro e graffiti, feito com uma distinta técnica. Seus trabalhos de comentários sociais e políticos podem ser encontrados em ruas, muros e pontes de cidades por todo o mundo. Conhecido pelo seu desprezo pelo governo que considera o graffiti um ato de vandalismo, Banksy expõe sua arte em locais públicos e até usa objetos do dia a dia, como uma cabine telefônica, ou até um elefante de verdade grafitado. Suas intervenções e criatividade são referências para artistas de rua do mundo inteiro. Em 2010, ele estreou seu primeiro filme, “Exit Through the Gift Shop”, nomeado ao Oscar em 2011 como melhor documentário. Um exemplo de intervenção artística é o caso de Alexandre Órion. O artista desenhou cerca de 3.000 caveiras no Túnel Airton Senna, em São Paulo,

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Na Metrópole usando panos úmidos em meio à poluição do lugar, no percurso subterrâneo de 250 metros. Sua moldura: as paredes. O que impressiona é que depois de um mês a Prefeitura resolveu

Descobrindo limpar o trecho, mas somente o espaço onde o grafiteiro fez sua arte, enquanto as demais áreas continuaram sujas e poluídas. O cinza da cidade e a falta de incentivos à

arte para jovens paulistanos fizeram com que o artista interventor Gasper, 32 anos, elaborasse um tipo de arte diferente. Ela é chamada de “Borroco”, bombas confeccionadas com

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tintas de diferentes cores dentro de cascas de ovos, utilizadas após uma omelete. Elas são arremessadas apenas em lugares públicos, onde não há conservação da Prefeitura, nem vida. “Nossa meta é deixar a cidade mais alegre, levar arte onde há trevas. A cidade está abandonada e os incentivos à arte são escassos, precisamos mostrar que a arte brota de todos os lugares e precisa ser vista.”

Cerca de 3 mil caveiras desenhadas na fuleragem do túnel Airton Senna / Foto: Alexandre Nunes

EXIT THROUGH THE GIFT SHOP

Documentário de Banksy conta a história de Thierry Guetta, um imigrante francês em Los Angeles que é obsecado pela arte de rua.

Grafiteiro Raoni protesta contra o resultado das eleições / Foto: Alexandre Nunes

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Opinião

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Artigo

As cadeias do Parque da Juventude *

Por Karina Biondi

É muito comum ouvirmos vozes que atribuem o fracasso das prisões brasileiras a uma “falta de Estado”. Dizem que onde o Estado não se faz presente, outras formas de regulação da vida social entram em cena; que os criminosos ocupam o espaço que deveria ser ocupado pelo Estado; que o vazio de poder provocado pela omissão ou incapacidade do Estado acaba por ser preenchido por outras formas de poder, não estatais, não legais, não legítimas, criminosas. Ao se lançar tais afirmações, esquecese que nunca se está mais dentro do Estado do que numa prisão. É Estado por todo lado! É ele que abre e fecha as celas. É ele quem dita o que se come. Ele define o que entra e o que não entra na prisão. É ele quem seleciona as pessoas que os presos podem ver e aquelas que só os verão quando ele sair. Ele é quem revista minuciosamente as visitantes despidas e revira os alimentos por elas levados. Estado que impede a entrada de jornais e revistas em unidades prisionais paulistas. Estado que mantém os presos longe dos livros, das escolas e das urnas. Há de se duvidar de aparentes vazios. Ainda mais quando o espaço que aparenta estar vazio é um campo de batalhas. Aliás, qual espaço não o é? Basta ajustar o foco, regular as lentes,

para alcançar a escala em que se dão os embates. Ao se apontar para um vazio de poder, o que se está fazendo é revelar a deficiência da visão. Afirmar que há falta de Estado em uma prisão é cometer um enorme equívoco. Se a questão fosse de dosagem, o problema seria mais de excesso do que de falta de Estado. É a sua força que impediu, nas últimas eleições, que presos que não tinham suas condenações em última instância exercessem o direito constitucional ao voto. Dentre os critérios definidos para dizer quem votaria (talvez o critério mais importante) é a ocorrência de rebeliões. Já se rebelou? Então não pode votar! Justamente não podem votar aqueles que já se mostraram – nas rebeliões e motins – descontentes com o Estado.

Isso, definitivamente, é a imagem da presença do Estado e não de sua ausência. Mas há algo que torna isso ainda mais evidente: a Casa de Detenção do Carandiru. Ela foi inaugurada na década de 1920 como um presídio-modelo, com capacidade para 1.200 homens. Ao longo de sua história, chegou a abrigar quase 8.000 presos e ser considerado o maior presídio da América Latina. Em 1992, um episódio daria início a processos que tiveram importantes consequências no universo prisional paulista. Uma intervenção policial com o propósito de dar fim à rebelião instaurada no Pavilhão 9 resultou na morte de 111 detentos, no que ficara conhecido como “Massacre do Carandiru”. Entre o “Massacre” e a desativação do presídio, em 2002, ocorreu um crescimento vertiginoso da população carcerária, simultâneo à transferência desta população para prisões construídas longe dos grandes centros. A partir da desativação da Casa de Detenção, os passageiros do metrô de São Paulo não mais avistaram detentos nas janelas de suas celas, as unidades prisionais deixaram de ser cenário do cotidiano da maioria dos paulistanos, delegacias não mais abrigavam presos que ofereciam

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Na Metrópole perigo aos seus vizinhos. Por mais que o número de presos aumentasse, eles não estavam mais sob os olhos da população paulistana. Eis a ilusão do vazio. Não é porque não vemos, não é porque as coisas ocorrem longe de nossos olhos, que elas não existem. Embora o prédio tenha sido demolido, o universo que a Casa de Detenção guardava não deixou de existir. Pelo contrário, se expandiu e se intensificou. Está mais vivo do que nunca. Daí que a ausência da prisão nesse espaço não significa simplesmente ausência de prisão, mas sim a força em jogo para mantê-la longe de nossos olhos, para escondê-la de nós. O Parque da Juventude, longe de expressar o fim dos horrores da Casa de Detenção, é a expressão da política carcerária do Estado. Se o surgimento da Casa de Detenção do Carandiru trouxe os presos à luz do positivismo, sua desativação leva novamente para a escuridão aqueles que cumprem penas. Não se trata de um retorno à masmorra, embora muitas das práticas punitivas atuais – como o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) – possuam traços semelhantes. Aliás, é no RDD que encontramos a máxima expressão de um novo tipo de poder que recai sobre os prisioneiros. Trata-se, como esboçou o antropólogo Adalton Marques, de um poder contentivo, que não tem mais como centro de suas preocupações exibir punições exemplares, efetuar ortopedia social ou, ainda, controlar essa população.

Artigo Busca-se, agora, contê-la. Conter o som estridente de suas vozes. Conter a imagem aterrorizante de seu sofrimento. Conter o perigo de seu pensamento. Ao preso, não é mais permitido pensar, falar ou ser visto. Se alguma dessas expressões escapa das forças contentivas, o caso é tratado como um vazamento do que deveria estar contido, como um problema de segurança pública. Um dos perigos de se falar em falta de Estado está na evidência e na certeza de seu remédio. Se o problema é falta de Estado, o remédio é mais Estado. Há de se fechar mais, de se revistar mais, de se prender mais, de se isolar mais. A prisão continua sendo remédio para seu fracasso, como já diagnosticou Foucault. A prisão é um fracasso? Deve ser porque não está sendo bem executada. Está deixando brechas. É falta de Estado. A solução? A reforma da prisão, de modo que não deixe brechas. Mais Estado. Mais prisão. E assim caminhamos, por mais de 150 anos. As atuais propostas de reforma são as mesmas que foram colocadas em meados de 1850: classificação dos presos de acordo com os delitos, progressão das penas, trabalho, educação, especialização dos funcionários, transformação dos presos e reinserção deles à sociedade. Nada de novo, a não ser a sugestão de que um serviço privado possa dar conta de todos os problemas. Privatização? O exemplo dos EUA, a maior população carcerária do mundo, não nos basta? Encarcerar se tornou, lá, um negócio lucrativo.

Opinião

Quanto mais presos, mais as empresas ganham. É isso que se quer? Quer-se uma prisão cujo projeto nasceu junto com sua proposta de reforma? De nada adianta fazer ajustes ou dar continuidade à reforma que vem sendo feita há mais de 150 anos. Mas mesmo assim, mesmo que rearranjada, que reformulada, que fracassada, a prisão continua aparecendo como a prática punitiva por excelência. E hoje, mais do que nunca. A questão que coloco é: podemos romper com esse modelo? É viável adotar outras práticas punitivas? É possível que as penas alternativas deixem de ser apenas alternativas? Ou, se considerarmos que a prisão como prática punitiva está inteiramente consonante com o mundo atual, seríamos capazes de uma ruptura radical, não só do modo de punir, mas do modo de enxergar, conceber e de pensar as coisas?

*Karina

Biondi é bacharel em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), mestre em Antropologia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), doutoranda em Antropologia Social na mesma instituição e é autora do livro “Junto e Misturado: uma etnografia do PCC” (Editora Terceiro Nome, 2010).

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A História do Movimento Anarquista em São Paulo Transformações através da reeducação com autodidatismo, responsabilidade, apoio mútuo e ação direta. Momentos não relatados pela grande imprensa Por Talita Alessandra

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palavra anarquia, de origem grega, significa sem governo. Baseado nesse princípio, o anarquismo é um movimento político e social que expressa conceitos libertários. Seus militantes, internacionalistas e apartidários, lutam contra quaisquer formas de poder autoritário, seja o governo representativo, o machismo, o racismo, o nazismo/fascismo ou outras manifestações que oprimam alguma parcela da sociedade. Intelectuais ativistas como os russos Emma Goldman e Mikhail Bakunin, o francês Pierre-Joseph Proudhon, o italiano Errico Malatesta, entre outros, influenciaram os pensamentos e embasaram as ideias e posturas. O movimento cria forma no Brasil a partir de 1890 com a vinda de imigrantes europeus (italianos e espanhóis, em sua maioria), trazidos para substituir os escravos nas lavouras

de café, instalando-se, principalmente, nas regiões Sul e Sudeste. Ao constatarem as péssimas condições trabalhistas, procuraram espalhar entre os companheiros conhecidos no país os ideais revolucionários. Histórias de luta já era rotina em suas terras. Logo encontraram simpatizantes que se aliaram na busca por

formas de resistência à opressão patronal. Além das reivindicações ligadas à questão econômica e de melhores condições de trabalho (como o direito a jornada de oito horas de serviço e férias remuneradas, até então inexistentes), os militantes anarquistas sempre tiveram grande preocupação com a cultura, a política e a educação.

Autônomos e autodidatas, construíram seus próprios centros culturais, escolas e sindicatos livres, como as federações ligadas à COB (Confederação Operária Brasileira) e à FOSP (Federação Operária de São Paulo). Alguns dos nomes mais influentes no anarquismo brasileiro foram: Maria Lacerda de Moura, Domingos Pas-

Manifestação Anarquista em 1º de maio de 2001 / Foto: Talita Alessandra

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Na Metrópole sos, Edgar Leuenroth e José Oiticica. A imprensa libertária tem um importante papel com seus impressos. Os livros, jornais, boletins e fanzines anarquistas, muitos produzidos clandestinamente, são os principais veículos de comunicação e divulgação. Dentre as várias publicações lançadas, algumas das primeiras obras foram os jornais A Voz do Trabalhador, produzido a partir do Primeiro Congresso Operário Brasileiro, A Plebe (com grande consolidação), A Lanterna, A Re- levantaram suas bandeibelião, Na Barricada, ras vermelhas e negras. dentre muitos outros. A greve foi deflagrada pelos trabalhadores A Greve Geral do Cotonifício Crespi, Marco na história localizado na Mooca operária paulistana, a (prédio histórico na Rua maior demonstração pú- Javari que hoje abriga blica da luta de classes um hipermercado). dos anarquistas aconteA ação direta que paceu em julho de 1917, rou São Paulo contabilizou, com a paralisação das oficialmente, a morte atividades nas fábricas. de três grevistas em O estopim para a conflito nas ruas (embomobilização foi a morte ra haja registros de que do sapateiro espanhol o número de vítimas teJosé Ineguez Martinez, nha chegado a dez), além de 21 anos, por policiais de vários manifestantes da Força Pública (atual que foram presos. Polícia Militar), durante O fim dessa históuma manifestação em rica greve se deu em frente à fábrica Mari- uma manifestação que ângela, no bairro do reuniu cerca de dez mil Brás, no dia 09 de julho. trabalhadores no Largo O enterro do jovem foi da Concórdia, Brás, com acompanhado por cerca o poder público tendo de 10 mil operários ati- aceitado libertar os mivistas que discursaram e litantes presos, reconhe-

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Acima, o Cotonifício Crespi ainda mantém a fachada centenária de tijolos e conta com uma pequena exposição permanente no interior do espaço, abordando a paralisação de 1917. / Foto: Talita Alessandra

cer o direito de associação e de reunião, além de regularizar o trabalho de mulheres e crianças, em 16 de julho de 1917. Daniel Righi, professor Historiador e Mestre em Educação pela USP, teve contato com o movimento anarquista e punk na adolescência, o qual militou por mais de dez anos, inclusive tendo como tema de sua dissertação de mestrado no ano passado o projeto Cine Educativo, do anarquista João Penteado (1877-1961). O educador falou à Na Metrópole sobre a importância da política libertária à História. “A capacidade dos

anarquistas de se fazerem notar na história do país está relacionada à força que o movimento teve na sociedade, influenciando o rumo dos acontecimentos. Levando isso em conta, as duas primeiras décadas do século XX constituem um período em que o anarquismo representou a principal alternativa para os trabalhadores urbanos, criando as bases para sua organização frente ao avanço do capital industrial” diz Righi, que destaca, além dos sindicatos, as atividades culturais nos bairros operários e as experiências educacionais libertárias ocorridas na mesma época. 17

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O historiador acrescenta uma questão delicada ao longo da trajetória anarquista em povos latinos, que é a convivência com matrizes culturais não europeias. “Os princípios libertários, na medida em que combatem a opressão do ser humano em relação a seu semelhante, apresentam caráter universalista. Mas o anarquismo, como movimento político, nasceu e cresceu na Europa, antes de se espalhar por outras regiões do planeta. É compreensível que os europeus não discutissem conflitos culturais que não existiam em sua terra.” Righi afirma que num lugar como o Brasil, onde há a presença marcante da matriz

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Periódicos anarquistas / Foto: arquivo Biblioteca Social Fábio Luz

afro-indígena, é preciso haver essa aproximação. “Não é possível ser plenamente libertário sem dialogar com essas outras visões de mundo, com esses outros valores sufocados pela imposição da matriz cultural europeia”, completa.

Enterro de José Ineguez Martinez / Foto: arquivo

Repressão em forma de legislação O movimento anarquista sempre foi duramente reprimido pelas forças de segurança pública. O governo do presidente Epitácio Pessoa

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Na Metrópole (1919-1922) começou a editar leis contra os insurgentes, como a Lei de Repressão ao Anarquismo e a Lei Adolfo Gordo, que permitiam a expulsão de estrangeiros, depois substituída pela Lei Aníbal Toledo, ainda mais rigorosa. O governo sucessor, de Artur Bernardes (1922-1926), instaurou uma repressão desmedida, tendo sido responsável por inúmeras prisões, deportações, torturas, censura e fechamento de jornais revolucionários. Muitos presos políticos foram enviados à Clevelândia, localizada no Pará. Tratava-se de um campo de extermínio transformado em colônia penal nos anos 1920. Quase mil anarquistas foram encarcerados lá. Muitos morreram vítimas de maus tratos, má alimentação e outras doenças adquiridas pelas condições precárias do local. A existência da Clevelândia é obscura na história, porém muitos relatos foram conseguidos através de presos, como Domingos Passos, que conseguiram fugir e denunciar a situação (foram registradas aproximadamente 262 fugas). O presídio foi desativado em 07 de janeiro de 1927.

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Existiu no Brasil, entre os anos de 1924 e 1983, o DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), órgão que controlava e reprimia as dissidências políticas, tendo à época, elaborado uma “Relação de Anarquistas”, Anarquistas em solidariedade aos Zapatistas / Foto: Talita Alessandra indicando nomes e informações dos falou em entrevista à vros Imprensa Marginal, ativistas classificados Na Metrópole sobre os a produtora de filmes como “perigosos”. É rumos do Movimento independentes Anarco “Embopossível encontrar, nos atualmente. Filmes, além do Movidocumentos arquivados, ra hoje não tenhamos mento Anarco Punk de movimentação diversos prontuários de uma São Paulo. libertários como Domin- anarquista/libertária tão Tanto na teoria como gos Braz, Florentino de forte e coesa quanto na prática, o movimento Carvalho, Gigi Damia- em outros momentos, anarquista teve imporni, Gusmão Soler, José penso que todas estas tante papel na história Oiticica e Oresti Ristori. iniciativas de luta que paulistana e mundial, persistem sejam imcontinuando ativo e prescindíveis, ainda O Anarquismo hoje combativo até hoje. “Por Um dos espaços cul- mais quando olhamos meio da fortificação de turais mais antigos, ain- para a atual realidade e laços, buscamos a criada hoje ativo em São todos os efeitos do capição de uma rede e apoio Paulo, é o CCS (Centro talismo, com um quadro mútuo que possibilite de Cultura Social), fun- pautado por políticas de maior amplitude e resuldado em 14 de janeiro de repressão e criminalitado no estímulo à cria1933, com objetivo de zação da pobreza e dos ção de uma consciência aprimoramento cultural, movimentos sociais, crítica e embasada na prática pedagógica e de- influências crescentes luta contra as ideologias bates anarquistas. Com da extrema direita em que exaltam a superiorisede na região central, diversos países, dentre dade de alguns seres hudisponibilizam biblio- tantas outras questões manos sobre outros”, diz teca, livraria, além de que afetam o mundo”, a Socióloga anarquista, realizarem constante- diz a socióloga. que acredita na transforMarina integra dimente cursos, palestras mação através da ação. e eventos relacionados versos grupos, como o “Caminhamos rumo à Coletivo Anarcopunk à política libertária. construção de um munMarina Chen, militan- Diversidade, a editora do onde caibam vários te anarquista e Socióloga, e distribuidora de limundos!”, declara. 19

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20 ANOS DO MASSACRE DO CARANDIRU No dia 02 de outubro completou 20 anos do Massacre do Carandiru, maior chacina da história penitenciária brasileira. Esse episódio resultou no assassinato de mais de uma centena de detentos por policiais, sendo que nenhum agente das forças de segurança ficou ferido. Apesar da mobilização de familiares e militantes em favor dos direitos humanos, o processo não será concluído antes de 2013. Todos os réus estão em liberdade. Foi (e continua sendo) uma séria violação do Estado contra a vida e a integridade das pessoas que estavam sob sua custódia. Na Metrópole entrevistou Danilo Dara, membro da “Rede 2 de Outubro – pelo fim dos massacres” e do coletivo “Mães de Maio”. Por Talita Alessandra Foto: arquivo pessoal

Na Metrópole - A Rede Dois de Outubro faz referência direta à data em que ocorreu o Massacre do Carandiru. Como foi a criação do coletivo e quais as principais propostas? Danilo - A “Rede 2 de Outubro” foi criada há cerca de um ano e meio, quando alguns coletivos como a Pastoral Carcerária, o Mães de Maio e a Rede Extremo Sul, e alguns militantes autônomos, começamos a discutir a importância da gente relembrar os 19 anos (à época) e os 20 anos do massacre do Carandiru (agora) atualizando essa discussão e ações contra a continuidade dos massacres. O objetivo era questionar as raízes e as formas de opressão atuais desse sistema genocida. NM - Quais atividades são desenvolvidas pela Rede? Há alguma intervenção junto com a comunidade carcerária? Danilo - As atividades desenvolvidas até aqui foram diversas. Desde uma série de atos em memória e

homenagem às vítimas diretas do massacre, até atividades de discussão e formação em espaços populares, ou até mesmo em universidades. Produzimos alguns materiais, buscando atualizar essa discussão e questionar justamente a continuidade dos massacres atualmente, como o vídeo “Carandiru, o massacre ainda não terminou” e o “Carandiru, 19 anos”. Organizamos diversas atividades de rua de denúncia (desde político-culturais, como foi a saída do “Cordão da Mentira – Quando vai acabar o Genocídio Popular?” até o próprio ato na Sé no dia 02/10/2012) e luta por justiça e transformação dessa lógica, incluindo o escracho popular à figura do Luiz Antônio Fleury. Trocamos ideia também com a comunidade carcerária e com familiares de presos e presas, nessa linha da discussão e formação, mas faltou realmente desenvolver mais atividades junto à comunidade. NM - Vocês organizaram diversas manifestações para lembrar os 20 anos da maior chacina do sistema penitenciário brasileiro. Como foi a repercussão dos atos?

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Danilo - O Massacre do Danilo - A repercussão Carandiru foi, certamente, das atividades da Semana uma das tragédias mais 2 de Outubro foram emblemáticas desse longo até que surpreendentes. período que chamamos Tanto na chamada de “democracia das mídia independente e de chacinas”. Num mesmo esquerda, cuja maioria episódio, o massacre do dos meios ainda insiste em Carandiru revelou de ignorar ou não dá a devida forma bárbara as duas atenção a massacre popular dimensões mais terríveis cotidiano no Brasil, dessa “democracia” e os como na grande mídia seus resultados trágicos: comercial. Esta sim, está o encarceramento em acostumada a estigmatizar, massa (a casa de detenção criminalizar e “(in)justiçar” era o maior símbolo disso cotidianamente a à época) e o extermínio população pobre, preta sumário de jovens pobres e periférica, sobretudo e negros (a grande maioria jovens negros e pobres, do das pessoas foi executada sexo masculino, taxados de “bandidos” todos Danilo Dara durante ato do Mães de Maio / Foto: arquivo pessoal durante o massacre). Sobre o ocorrido, sob os dias. Então, fruto de nosso trabalho e mobilização, conseguimos qualquer ponto de vista humano que se veja, o uma repercussão razoável e pautar algumas que foi cometido naquele dia foi de uma barbárie questões fundamentais sobre a continuidade e inominável, e de forma absolutamente desnecessária o aprofundamento dessa lógica dos massacres, (sob a perspectiva dos trabalhadores). Havia várias que tem configurado um verdadeiro genocídio outras formas de contornar a situação dentro do atualmente no país. Tanto que, inclusive por conta presídio que não ocasionassem o maior massacre de toda pressão, houve algumas sinalizações da história carcerária do Brasil. O que mais políticas e jurídicas no sentido de se retomar o indigna, porém, é saber que de lá pra cá nenhum processo de resgate da memória, da verdade e da dos responsáveis, sobretudo os grandes, foi devidamente julgado e punido; que nesse período justiça em relação ao Carandiru. implodiram a Casa de Detenção para expandir e NM - Como está sendo a divulgação do “Manifesto multiplicar muitos Carandirus mais pelo estado de São Paulo afora (hoje são cerca de 190.000 pelo fim dos Massacres”? pessoas presas no Estado, de um universo de Danilo - A divulgação tem se dado por diversos cerca de 520.000 em nível nacional). As chacinas meios, sobretudo a internet e as redes sociais. Creio e massacres cotidianos, ao invés de retrocederem, que ainda temos alguns detalhes a mexer nele, apenas se multiplicaram e se intensificaram de lá e acho que está faltando uma maior divulgação pra cá. em papel (formato cartilha, algo assim), com a prioridade de distribuição entre familiares de NM - Você acha que a sociedade se preocupa com vítimas, familiares de presos e presas, e a própria a conclusão do caso? comunidade carcerária. Vamos ver se conseguimos Danilo - De forma geral e rotineira, infelizmente fazer algo neste sentido... acredito que não. Nós temos a cada dia mais certeza, NM - Passadas duas décadas dessa tragédia, como ao longo desses anos todos de caminhada, que sem luta cotidiana e sem a pressão popular autônoma, avaliam o ocorrido? nada que possa ser feito para favorecer o direito 27

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à memória, à verdade, à justiça e à liberdade dos trabalhadores e das trabalhadoras acaba saindo do papel de graça. Nada! Há anos ouvimos a ladainha de que estamos “consolidando e aprofundando a democracia no Brasil”, e o que vemos e enfrentamos na prática cotidiana é o espraiamento e aprofundamento do genocídio, com todos seus requintes de crueldade na exploração e opressão dos trabalhadores, os quais, em sua maioria, permanecem inertes, muitos apenas assistindo ou às vezes reproduzindo as versões oficiais que se voltam contra nós mesmos no cotidiano. Vamos ver se agora, depois desse barulho todo que todos nós fizemos, e com a continuidade da luta, se há avanços concretos na retomada e conclusão do caso.

é apenas um dos exemplos dessas estruturas, que perpassam todas as instâncias e esferas do Estado brasileiro, os quais acabam criando as condições e dando a devida cobertura para as polícias militares (sobretudo as repressivas e ostensivas) seguirem promovendo massacres cotidianos. Então, enquanto não se desmontar essa lógica militarizada, da formação dos agentes policiais ao controle externo, autônomo e popular efetivo, das polícias e sua atuação nas comunidades, não dá pra sequer falar em qualquer tipo de democracia efetiva no Brasil.

Escracho público do ex-governador Antônio Fleury Filho / Foto: arquivo pessoal

NM - A desmilitarização das polícias no Brasil é NM - Como o grupo avalia a recente onda de suficiente como solução? Qual a importância dessa violência policial em São Paulo? ação? Danilo - Falar da situação atual no calor da hora, Danilo - A desmilitarização das polícias no Brasil em meio à nova onda de barbárie, é sempre muito é algo que nós da Rede de Familiares e Amig@s de difícil. Todos os dias tem chegado diversos casos Vítimas do Estado Brasileiro exigimos há tempos, e situações absurdas pra nós do movimento Mães como algo absolutamente necessário na esteira da de Maio e da Rede 2 de Outubro. Esses momentos desmontagem das estruturas repressivas que foram recentes, como foram os Crimes de Maio de 2006, incrementadas pela ditadura civil-militar (1964- os Crimes de Abril de 2010 na Baixada Santista, e 1989) no Brasil, e que não foram desmontadas agora os crimes de junho e julho de 2012, em todo com a chamada redemocratização (1989 até os dias o Estado, tem sido ocasiões reveladoras de uma atuais). Ao contrário, essas estruturas e essa lógica dinâmica estrutural e cotidiana que tem a violência perversa de opressão apenas se aperfeiçoaram do Estado como seu principal elo. A violência de lá pra cá, voltada à contenção e repressão das sistemática deste estado penal e seus agentes classes populares: trabalhadores pobres, pretos e perpassa o terror disseminado em praticamente periféricos. A Rota, criada na época da ditadura, todas as esferas da vida, sobretudo da população 28

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pobre e negra. Com certeza há muitas semelhanças entre esses crimes de 2012 e todo o contexto de maio de 2006. Ambas as ocasiões foram anos eleitorais, com crescente medidas de opressão e tensão dentro do sistema carcerário paulista, já extremamente expandido; tensão somada ao aperto e desacertos de fortes achaques policiais; levando à quebra desse “equilíbrio precário” por parte de organizações criminosas de “fora” e as organizações de “dentro” do Estado, muitas vezes atreladas entre si; mortes de policiais sendo revidadas por outros agentes do Estado, na mesma base de 1 policial para cada 10 civis mortos... Em maio de 2006 houve uma concentração muito grande de mortes entre os dias 12 e 20 daquele mês, gerando mais de 500 mortes, sobretudo de jovens pobres e negros. Agora em junho e julho de 2012 temos recebido informações de cerca de 200 mortes, num período por outro lado mais estendido, o que prolonga também a sensação de pânico e terror vividas comunidades “alvos preferenciais”. Aonde isso vai chegar, se e quando isso vai retroceder? Isso vai depender da nossa capacidade popular de se organizar, questionar e resistir a este genocídio que vitima sobretudo

Opinião

jovens pobres, pretos e periféricos. Se a gente não se unir, o cenário será cada vez mais trágico. NM - Qual a opinião da Rede sobre o sistema carcerário atual? Existe alguma alternativa viável? Danilo - Creio que a opinião da Rede sobre a lógica atual dos massacres e sobre o sistema carcerário atual ficou muito bem analisada, para um bom começo de conversa, no Manifesto Pelo Fim dos Massacres. Estamos discutindo internamente melhorias nessa análise e, por hora, não teria nada a acrescentar. Uma série de propostas concretas alternativas estão colocadas no próprio manifesto. NM - Gostaria de acrescentar algo? Obrigada pela entrevista. Danilo - Gostaria de agradecer a você e a todos os leitores pelo espaço, e pela oportunidade da gente chegar até aqui trocando essa ideia importante. Precisamos seguir conversando e tomando cada vez mais atitudes, coletivas, frente a esse genocídio popular em curso.

Contato Rede 2 de Outubro - Pelo Fim dos Massacres rede2deoutubro.blogspot.com

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Prefeitura ameaça remover bancas de jornal da Praça da Sé A gerência municipal de São Paulo emite multas sem aviso prévio baseando-se na legislação de 1986 que determina produtos indevidos para a venda

Por Ludimila Honorato

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prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, tem sido alvo de críticas e recusas desde que se candidatou à viceprefeitura, em 2004, quando foi acusado de enriquecimento ilícito. Hoje, o paulistano tem sofrido com as diversas proibições decretadas pela Prefeitura como, por exemplo, o veto ao tráfego de motos com mais de uma pessoa, cuja justificativa é a de que o “carona” pode ser um assaltante. Mais recentemente, as tradicionais bancas de jornal da Praça da Sé foram alvo das limitações da gerência municipal. A primeira tentativa de retirar esses comércios da capital paulista foi durante o mandato da ex-prefeita Marta Suplicy (2001-2004). Com o Projeto Belezura, que visava revitalizar o centro da cidade de São Paulo, a então prefeita tentou remover 100 bancas, mas não conseguiu. De acordo com a declaração, esse tipo de estabelecimento

não poderia ficar em locais públicos. Já nessa época, a Banca Debellis, presente há mais de 90 anos na Praça da Sé, recebeu uma proposta para ser transferida para outro bairro, porém as opções para mudança eram distantes do local de origem. Desse modo, a transferência não aconteceu, não houve insistência por parte da Prefeitura e nenhuma banca foi retirada. Agora, parecendo

dar continuidade ao projeto criado por Marta Suplicy, Gilberto Kassab deu início a cassações contra as bancas de jornal. A perseguição começou em 2009, quando 75 delas foram intimadas à remoção. A justificativa é a de que as bancas atrapalham a visibilidade, a circulação de pedestres e causam insegurança por, talvez, servirem de escudo ou proteção para assaltantes. Ricardo Lourenço, presidente do Sindicato

dos Vendedores de Jornais e Revistas de São Paulo (SINDJORSP), disse em entrevista à Na Metrópole que, naquela época, o sindicato se mobilizou juntamente com os jornaleiros e fizeram manifestações em frente à Câmara Municipal e ao gabinete do prefeito. “Dissemos que não são as bancas que causam insegurança. As bancas não podem ser retiradas, elas são cultura para São Paulo”, afirmou

Jornaleiros organizam manifestação em frente a Câmara Municipal de São Paulo / Foto: divulgação

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Banca Central conseguiu liminar depois de gastar cerca de 12 mil reais com advogados / Foto: Ludimila Honorato

o sindicalista. Ricardo declarou que até agora cerca de 1.000 bancas foram removidas em toda a cidade. A Na Metrópole conversou com os responsáveis pelas bancas que mais foram ameaçadas com multas e cassação. Todos eles se mostraram indignados e sem motivação para continuar com o trabalho, o que, segundo relatos, resultou no fechamento de uma banca na extensão da Praça da Sé.

A Banca Central, que está no local há aproximadamente 57 anos, foi uma das primeiras que teve a sua TPU (Termo de Permissão de Uso) cassada e a que mais sofreu com multas, ameaças e despesas com o processo. O senhor Beto, sócio da dona da banca, disse que a situação é tão complicada que tem medo de falar abertamente, sem autorização do advogado, enquanto Gilberto Kassab estiver na Prefeitura, pois as ameaças podem aumentar.

“Estão tirando as nossas raízes, a gente perde a vontade de trabalhar, de fazer as coisas com a família, isso afeta tudo na vida da gente”, declara Beto, referindo-se às limitações impostas às bancas. O jornaleiro que veio de Pernambuco está em São Paulo há 24 anos e além de trabalhar na banca, faz apresentações musicais tocando bateria. “É outra forma de ganhar meu dinheiro. Se a

banca fecha, a gente fica sem ter de onde tirar o dinheiro”, conta Beto. A Prefeitura alega que o excesso de produtos causa poluição visual e a maioria das multas é emitida por venda de produtos indevidos. No entanto, a determinação de tais produtos está descrita na legislação de 1986 pela qual só é permitido vender, basicamente, jornais e revistas. Indignado com essas determinações, Ricardo 31

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Lourenço disse que hoje em dia é impossível uma banca sobrevier apenas da venda de jornais e revistas. Entre os itens vetados, estão canetas, isqueiros, refrigerante, água e no caso de produtos alimentícios, somente são permitidos os que contêm até 30g.

e foi sutilmente movida mais para cima, no sentido da Catedral da Sé. O senhor Paulo trabalha para o dono da banca, a qual está na Praça há cerca de 60 anos. “As multas são caras, em torno de R$300 a R$400 e o pouco que a banca tem para vender, além dos jornais, eles

PROCENTRO: positivo ou negativo? Com uma proposta de revitalização, o Programa de Reabilitação da Área Central do Município de São Paulo (PROCENTRO) foi implantado a fim de promover o desenvolvimento social e econômico da região,

Banca Queiroz foi alvo de multas por venda de produtos indevidos / Foto: Ludimila Honorato

Beto disse que a banca paga aluguel do ponto e impostos e já gastaram mais de 12 mil reais com dois advogados - 5 mil apenas com o primeiro que não é do Sindicato. A situação da Banca Central é estável, visto que conseguiram a liminar por meio de advogado particular; no entanto corre risco se a pressão continuar. A Banca Queiroz não sofreu tanto com a ação da Prefeitura, mas recebeu algumas multas

querem proibir”, declara o funcionário. Ele disse que proibiram a recarga do Bilhete Único e que a porcentagem que uma banca recebe por recarga é de, mais ou menos, 0,8%. Paulo falou do PROCENTRO, uma projeto desenvolvido em parceria com nove secretarias e uma Subprefeitura, a da Sé. Segundo ele, o programa está contribuindo para que as bancas sejam retiradas, tendo em vista a “limpeza” da cidade.

bem como dar suporte e condições para atividades compatíveis com o Centro, promovendo a inclusão social. A princípio, o intuito é positivo e o Programa já concluiu obras na região central como a de recuperação do Solar da Marquesa de Santos e a de reurbanização da Praça Roosevelt. Porém, embora o PROCENTRO preveja a reabilitação central de São Paulo, os jornaleiros afirmam que se trata de um forte poder que

apoia a causa da retirada das bancas. Isso é um dos motivos pelos quais eles desacreditam numa reversão do problema. 90 anos em risco Alguém já imaginou vender jornais em cima de caixotes de maçãs? Assim começou a Banca Debellis, quando o senhor Lourenço Debellis chegou da Itália e iniciou com a venda dos impressos na Praça da Sé. Dos caixotes, a estrutura evoluiu para uma armação de metal e, atualmente, tem um tamanho médio se comparada às demais bancas da região. Anos depois, o senhor Lourenço ganhou uma medalha de honra ao mérito por ter uma das cinco primeiras bancas da cidade. Angela Debellis faz parte da terceira geração da família e expressou tristeza diante de toda a situação enfrentada pelos jornaleiros. Disse que há cerca de dois anos a banca foi intimada à remoção sem direito a qualquer transferência. “Simplesmente nos propuseram a retirada da estrutura antes que a Prefeitura se encarregasse de remover tudo de madrugada, sem nosso consentimento”, declarou a neta de Lourenço Debellis. Mariangela Debellis, dona da banca, está impossibilitada de

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Capa Foto: arquivo pessoal

À esquerda, Lourenço Debellis com a banca que veio após a venda em caixotes de maçã

trabalhar por motivos de saúde e, por isso, quem coordena o comércio é Messias, um amigo da família. Nos finais de semana é Jefferson Rodrigues, filho do Messias, que permanece

na banca. Até agora, a Banca Debellis não conseguiu a liminar, mas obteve um Mandado de Segurança que lhes garantem trabalhar sem o risco da cassação. Messias acredita que a

banca ainda atua devido às forças políticas que, mesmo que mínimas, parecem ajudar. O vereador José Américo elaborou uma proposta para cessar as cassações, no entanto o projeto encontra-se parado.

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Angela declarou que a atual dificuldade enfrentada é conseguir os boletos para efetuar o pagamento dos impostos e da TPU. “Já entreguei cópias da referida documentação pessoalmente na sede da Subprefeitura da Sé e agora estamos no aguardo de uma resposta positiva para colocarmos os pagamentos em dia”, contou. Com o projeto Cidade Limpa, Kassab proibiu faixas e outdoors, alegando que tais artifícios deixam a cidade feia. Para os jornaleiros, o que prejudica a beleza da Praça da Sé é o cenário de pessoas em situação de rua que, não tendo onde morar, nem mesmo

Banca no início dos anos 2000, quando recebeu proposta de transferência / Foto: arquivo pessoal

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onde satisfazer suas necessidades fisiológicas, o fazem na praça. “A ação na Cracolândia não ajudou em nada, apenas espalhou os usuários e agora tem mais mendigos e pessoas viciadas aí na praça”, declarou Jefferson Rodrigues. Ele ainda contou que a base policial localizada na Praça não reage diante das brigas que frequentemente ocorrem entre os moradores de rua.

o então presidente do Sindicato, Ricardo Lourenço - que se candidatou este ano para vereador de São Paulo está afastado até 2013. Segundo ele, “o vice Jose Antonio Mantovani está fazendo uma péssima gestão porque tem uma visão divergente da visão da diretoria do Sindicato”. A Na Metrópole entrou em contato com Mantovani, mas não obteve resposta. Os jornaleiros contam com a boa gestão do futuro prefeito da E agora, como fica? cidade, de modo que Por motivos de seja descartada qualquer campanha eleitoral, tipo de perseguição

às bancas. Ricardo Lourenço disse que o Sindicato vem lutando na Câmara há oito anos, mas sem muito sucesso. “A preocupação é grande. Se o Sindicato não se organizar, o prefeito pode acabar com as bancas, mas nós estamos unidos e firmes na situação”, declarou Lourenço. As bancas da Praça da Sé têm mais de cinco décadas, ou são quase centenárias - como é o caso da Debellis. “As bancas de jornal são parte da história, não só de São Paulo, mas de todas as cidades que contam com essa prestação de serviços”,

declarou Angela Debellis, e mesmo com o advento da internet há quem ainda faça uma ida ao jornaleiro como um momento de distração no dia. A Prefeitura quer acabar com essa história e usa argumentos arcaicos para tal. As bancas “enfeiam” a cidade, porém o que se acredita ser mais viável realizar é uma ação que melhore as condições de vida dos moradores de rua.

Nova estrutura da Banca Debellis que desde a década de 1920 está no mesmo local / Foto: Ludimila Honorato

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Voto: direito ou obrigação? Jovens universitários paulistanos expõem as causas de seu interesse ou desinteresse pelas eleições

Por Aline Oliveira

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m dos assuntos mais discutidos nos últimos meses tem sido o exercício da democracia, afinal estamos em ano de eleições municipais. Segundo pesquisa do Tribunal Superior Eleitoral – TSE, São Paulo é o Estado com o maior número de cidadãos aptos a votar, com 31.253.317 eleitores, dados de julho deste ano. Porém, existe uma divergência de opiniões entre os que se interessam pela política e aqueles que manifestam um acentuado desinteresse pelo assunto. Esse desinteresse tem aparecido, sobretudo, entre a faixa de eleitores mais jovens, que têm usado a internet, mais especificamente das redes sociais, para expor suas opiniões e preferências políticas. A Na Metrópole entrevistou quatro universitários de diferentes áreas e idades para compor um retrato dessa parcela dos cidadãos paulistanos. “Não me interesso muito pela política. Às vezes busco um pouco de conhecimento, mas não é um assunto que me chama a atenção. Para decidir

em quem votar, não faço nada. Às vezes dou uma pesquisada pela internet, mas não acho nada que me ajude a decidir”, conta Letícia Menezes, 19 anos. A estudante de Arquitetura e Urbanismo relata ainda que na primeira vez que votou, nas eleições presidenciais, acabou escolhendo o mesmo candidato

O que pensa sobre o voto obrigatório “Acho bom, mesmo nunca sabendo em quem votar. Para escolher um candidato, é necessário que toda a população vote, ainda que o voto seja branco ou nulo”. Letícia Menezes, 19 anos

que sua mãe, pois estava em dúvida. O papel da propaganda eleitoral A propaganda eleitoral gratuita, que poderia ajudar aqueles que ficam indecisos na hora de escolher um candidato, acaba por não contribuir efetivamente, pois o espaço nos veículos de comunicação - como o rádio e a televisão - não é usado para debater as propostas, e, muitas vezes, afasta ainda mais o eleitor. Para Moisés Barel, Mestre em Comunicação Social com ênfase em Propaganda Política, Marketing Político e Jornalismo Político, são veículos que contribuem muito pouco para o esclarecimento em torno de questões políticas. “Quando a gente se depara com os programas eleitorais, a maioria dos candidatos faz daquilo um palanque eletrônico, mas não para debater ideias; sim um palanque estético, no qual alguns até falam sobre ideias críveis, realizáveis; outros falam sobre coisas e ideias 35

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fantasiosas”, declara Barel. Ele ainda explica que atualmente o grande canal para debater o assunto é, de fato, a internet. No entanto, essa mídia não é usada em sua potencialidade pela grande maioria dos jovens, o que gera uma sociedade cada vez mais apolitizada. Assim, em vez de se sentir atraído pela participação nos rumos do país por meio do voto, uma parcela do eleitorado não se vê propensa a discutir ou buscar maior conhecimento da questão. É o que diz Ralph Paraiso, 25 anos, estudante de Engenharia Civil. “Não me interesso pelo assunto, apesar de saber da importância de conhecer os processos políticos e governamentais. Costumo acompanhar as propagandas transmitidas pela TV, geralmente para rir um pouco”.

O estudante explica que mesmo assim, procura votar em pessoas que já demonstraram, em governos anteriores, boa liderança e que tenham realizado benfeitorias à sociedade em geral. E no caso de eleições onde os candidatos são desconhecidos, procura saber as propostas apresentadas. O mesmo ponto de vista é exposto por Vanilson Moreira, 30 anos, que cursa Geografia. Ele conta que primeiro faz uma avaliação do histórico político do candidato, depois do partido, e por último, das propostas.

A influência da internet Se de um lado a televisão e o rádio não atuam efetivamente como canais de aprofundamento e debate político, por outro lado a internet tem aparecido como a grande responsável pelas manifestações de opiniões e assuntos de interesse público. E o afastamento por parte dos jovens tende a diminuir. Sobre esse ponto, Moisés Barel diz que o hábito enraizado de alienação política tende a mudar quando uma parcela mais politizada da juventude vai atrás desse tipo de conteúdo nas redes sociais; aqueles que são mais engajados politicamente tentam fazer com que outros jovens também se sintam atraídos a votar. O que pensa sobre o voto obrigatório A partir do momento “Na minha concepção o voto deve se sustentar obrigatório, em que uma parte mantendo a maioria da população ativa nas decisões de sua cidade, estado, ou nação; não ficando assim restrito o voto significativa da sociedade aos interessados nas campanhas de seus candidatos”. demonstrar maior grau de Ralph Paraiso informação e consequente

O que pensa sobre o voto obrigatório “Em um país como o nosso, onde não há um sentimento de pátria e nem interesse por política, ele deve ser obrigatório”. Vanilson Moreira

capacidade de avaliar melhor o cenário social e político no qual se insere, será possível um avanço em termos sociais no Brasil. A falta de interesse que ainda existe entre alguns jovens se relaciona com a formação política que receberam – ou não – desde cedo, na época do ensino regular (fundamental e médio). Camila Lima, 19 anos, estudante de Engenharia com modalidade em Projetos, conta que na escola não havia muito espaço para reflexões sobre politica, e quando alguém falava, falava mal. Para ela, é indispensável que se tenha conhecimento e capacidade de avaliar os candidatos. “Para ficar mais informada, pesquiso em sites na internet. Política é útil, a gente tem que fazer alguma coisa. Não usar rede social para dizer que vai ao banheiro e etc. Se não tem tempo, organiza alguma coisa pela rede social”, expõe Camila, que usa a

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Na Metrópole internet tanto para falar com seus amigos quanto para falar sobre doação de animais, assunto que desperta sua atenção. E o mensalão? Amplamente abordado na mídia, o julgamento do mensalão impacta diretamente na opinião pública, o que pode gerar tanto a apatia quanto a indignação política. Moisés Barel analisa que essa cobertura midiática pode gerar uma repulsa em quem é mais politizado, despertando uma vontade de mudar. No entanto, o Professor e Jornalista também destaca que a parcela maior é de pessoas apáticas, pois em casos como este a mídia oferece o entretenimento em maior escala que propriamente o desdobramento desse caso. “Porque a mídia esta pautada no conteúdo para falar o que o povo quer, não esta a fim de discutir. A politica é necessária, mas a maioria das pessoas não está a fim de discuti-la, querem o

Discussão entretenimento chulo, raso [...]. E a novela vai gerenciar discussões sociais; o futebol vai gerenciar discussões sociais; programas de auditório a mesma coisa. E a politica quando envolve discussões sociais, infelizmente não é pela questão qualitativa, mas é pela questão do pão e circo. Isso também acontece, acontece muito e é um problema”, afirma. Voto obrigatório: positivo ou negativo? Surge uma questão polêmica quando se fala em voto obrigatório, pois o direito de atuação dentro de um regime democrático passa a se aproximar mais de um dever, fazendo com que a escolha seja feita sem maiores critérios. Às vezes, até mesmo ganha forma de protesto por parte de quem vai às urnas. Diante desse fato, o eleitor age mais por obrigação que por uma motivação de mudança, seja nas esferas municipal, estadual ou nacional.

O que pensa sobre o voto obrigatório “Sou contra, pois não há interesse de todos os eleitores em votar”.

Política

ELEIÇÕES MUNICIPAIS Após disputar o segundo turno das eleições municipais de São Paulo com José Serra, Fernando Haddad vence a disputa pela prefeitura da cidade. Sua vitória leva ao poder o Partido Trabalhista (PT), que há oito anos não chefiava o executivo paulista. A votação teve números equilibrados. Serra obteve 44,4% dos votos válidos, Haddad recebeu 55,57%, segundo dados do jornal Folha de S. Paulo do último dia 30 de outubro. A porcentagem recebida pelo petista equivale à escolha de 33.873.720 eleitores. O futuro prefeito é professor universitário e ex-Ministro da Educação, cargo que ocupou até janeiro deste ano. Teve sua campanha apadrinhada pelo exPresidente da República Luís Inácio Lula da Silva, que, assim como fez com Dilma Rousseff, angariou votos valendo-se do carisma pessoal e alto índice de aprovação que recebeu dos brasileiros.

Camila Lima, 19 anos

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Saúde

Na Metrópole

Acontece

Primeiro hospital público para cães e gatos é ampliado O atendimento é exclusivo para animais cujos donos tem baixa renda

Por Guilherme Corrêa

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ocalizado no Tatuapé, Zona Leste de São Paulo, o Hospital Público Veterinário é o primeiro do Brasil a oferecer serviço gratuito. Administrado pela Anclivepa – SP (Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais de São Paulo), o hospital foi inaugurado em julho deste ano e atende cães e gatos de cidadãos que não dispõem de recursos para pagar os tratamentos veterinários de seus bichos de estimação.

Dentre os casos atendidos estão os de atropelamento, intoxicações, entre outros problemas de saúde que os animais apresentem. Renato Tartalia, diretor do hospital, considera um privilégio participar dessa iniciativa. “Sou extremamente orgulhoso do trabalho que realizo aqui. Nossas decisões podem mudar a vida de centenas e até milhares de pessoas”, declara o médico.

Nova unidade do hospital veterinário / Foto: Guilherme Corrêa

Animal em observação após pequena cirurgia / Foto: Guilherme Corrêa

Tartalia é veterinário e quando a ideia de abrir um hospital público para cães e gatos surgiu na Anclivepa, ele se prontificou a ser o responsável pelo atendimento, pois já tinha planos, juntamente com outras pessoas, de montar um abrigo para animais abandonados. O resultado do hospital foi positivo e devido à grande demanda do serviço, a Prefeitura de

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Na Metrópole

Acontece Saúde

Dona Dirce e seu cachorro Bob, o qual já se recupera no hospital / Foto: Guilherme Corrêa

São Paulo abriu nova unidade, a 200 metros do primeiro. No novo espaço serão atendidos casos clínicos, cirurgias e procedimentos de laboratório, enquanto a primeira unidade atenderá casos de emergência, ultrassom e Raio-X. Com a ampliação do hospital, Renato Tartalia acredita melhorar o atendimento em 20% a 25%. “Esse hospital é maravilhoso, salvou o meu cãozinho. Ele estava péssimo quando o encontrei na rua com pneumonia. Eu dou graças a Deus por esse lugar existir”, conta a senhora Dirce, dona de Bob, que já está em fase de recuperação. Tartalia conta que ele e sua equipe do Anclivepa

estão empenhados na criação de campanhas educacionais voltadas aos donos dos animais, incentivando a vacinação e também a castração de cães e gatos. O serviço gratuito é exclusivo para animais cujos donos estão devidamente cadastrados nos Programas Socias da Prefeitura do Município de São Paulo (Bolsa Família e Renda Mínima). As unidades funcionam de segunda a sexta, das 7h às 19h. A primeira está à Rua Professor Carlos Zagotis, 3 e a segunda na Rua Serra do Japi, 168 - ambas no Tatuapé.

Gatos também são atendidos / Foto: Guilherme Corrêa

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Sociedade

Saúde

Psicóloga desenvolve projeto de saúde mental em escolas públicas infantis Método de conversas terapêuticas é trabalhado com os pais das crianças

Por Maday Florencio

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om o intuito de contribuir com uma melhora na saúde pública da sua região, Vilma Florencio da Silva, psicóloga formada pela PUC-SP e psicanalista pelo Instituto Sedes Sapientiae, teve uma ideia inovadora. Adaptou os tratamentos mentais feitos em postos de saúde durante dez anos ao ambiente escolar como creches, escolas de educação infantil primária e, até mesmo, para o ensino médio. O projeto das Conversas Terapêuticas surgiu a pedido das próprias professoras e coordenadoras das escolas de educação infantil da região que encaminhavam crianças consideradas com problemas psicológicos. “Quando vi as listas enormes de crianças encaminhadas para o posto pensei: será que tem tanta criança doente assim?”, afirmou a psicóloga. Pensando na

Vilma desenvolve as conversas terapêuticas com os pais de alunos / Foto: Maday Florencio

oportunidade de ir até as escolas e falar sobre isso com o corpo docente, Vilma buscou com o projeto ajudar os pais a lidarem com a criança, investigar o ambiente em que elas vivem e entender também como estão estruturadas as famílias, fazendo com que os pais pensem melhor na própria dinâmica familiar. As principais reclamações da equipe escolar em relação às crianças são indisciplina,

agressividade, problemas de aprendizagem e também a sexualidade precoce. Indo às escolas, a psicanalista pôde explicar às professoras o que era normal e o que era patológico.

“... professores estavam discriminando algumas crianças e elas tinham dificuldade de crescer por isso”

Com o grupo de orientação aos pais, verificou-se uma mudança nos lares das crianças. “Elas conseguiram ser mais crianças à medida que os adultos foram organizando o ambiente para elas”, diz Vilma. Há casos em que os problemas com pais e mães são mais graves. Alcoolismo, depressão com tentativa de suicídio e desemprego são situações consideradas graves e, por isso, encaminhadas 41

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Saúde

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Sociedade

ao posto de saúde. “Esses pais possuem certa intolerância com os filhos e dificuldade de entender o outro, pois não conseguem entender a si mesmos”, declarou a psicanalista. As Conversas Terapêuticas trabalham os conflitos de pais e familiares que cuidam das crianças e jovens. Esses conflitos primeiramente são internos, mas quando as pessoas permitem-se conversar com outras, elas externalizam. No grupo feito com os pais, as pessoas podem expor suas angústias, podendo ser ouvidas e refletir sobre seus problemas na medida em que compartilham seus casos com o grupo e com Vilma que dá a eles uma possibilidade de se ouvirem. Após dez anos de realização deste trabalho, as professoras e pais já começam a ter outra visão sobre as crianças. Assim que enxergam um problema, as professoras não dão diagnóstico e encaminham para um tratamento, mas trabalham o diálogo sem a pretensão de ameaças ou humilhações, passando mais confiança às crianças. Na escola de educação infantil Ênio Corrêia, localizada

na Zona Norte, a coordenadora Marerci Aparecida conta que conheceu o trabalho da psicóloga em reuniões de escolas públicas. “Essa parceria entre saúde pública e educação foi algo que sempre buscamos.

maneiras de lidar, cada uma do seu jeito, com seus conflitos. “Criamos um laço de confiança de não conversar com mais ninguém o que é dito no grupo, e isso é bacana” afirma a psicóloga Vilma, que se baseou em psicanalistas como Freud e

“Eu até brinco com eles que psicólogo não é para tratar de loucos, mas sim para não ficar louco”, explica ela. De acordo com Vilma, as conversas terapêuticas tem um caráter preventivo no sentido de ajudar as crianças a

Durante as conversas, todos são ouvidos e direcionados a lidar com os filhos / Foto: Maday Florencio

Estou no Ênio há três anos e achei muito bacana o trabalho”, afirmou Marerci. Ela aponta também que os pais estão muito perdidos na hora de educar os filhos, mas com o auxilio das conversas terapêuticas isso tem mudado. “O comportamento dos filhos e atitude dos pais em relação à escola melhorou muito”, disse a coordenadora. Nesta troca de experiências em grupo, as pessoas encontram

Winnicott para seu trabalho. “Nesta dinâmica do contato, a pessoa traz sua história para a roda, e o que pude perceber é que há casos em que os professores estavam discriminando racialmente algumas crianças e elas tinham dificuldade de crescer por isso”, declara. O maior desafio encontrado pela psicanalista é lidar com pais que não estão abertos a este tipo de trabalho, por falta de informação ou por serem jovens demais.

desenvolverem seu potencial para que não tenham transtornos emocionais. Como esse é um projeto em que ela mesma teve a ideia, Vilma diz que gostaria de ver outros profissionais fazendo este trabalho também. “Não fará sentido se isso parar em mim e não progredir com outras pessoas”, contou ela, informando que o número de escolas que solicitam este tratamento é muito grande.

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Crônica

Opinião

Enfermos do Brasil: a verdadeira drogaria Por Alexandre Nunes

Em uma época em que a medicina brasileira foi privatizada, a procura pela saúde é grande. Nessa hora, o povo prefere levantar a mão para o céu e pedir às divindades ajuda para não precisar de um auxílio médico, porque sabe que a doença não espera, é mais veloz que a solução hospitalar. Como em outros setores, pessoas com mais poder aquisitivo têm prioridade. O alcance à alta medicina pode até dar mais dias de vida e o remédio para as suas doenças. Os planos de saúde são os principais responsáveis pela degradante situação do sistema de saúde brasileiro. Privatizaram a saúde pensando nas melhorias. As pessoas pagam uma fortuna para essas empresas, já pensando no dia em que irá precisar usálo, mas quando esse dia chega, além da doença que o paciente já tem, ainda vai obter uma enorme dor de cabeça. Enfrenta a demora do atendimento, filas

para fazer tudo, consultas em hospitais longe das residências dos usuários, dentre outros caos. As empresas jogam a responsabilidade aos médicos e clínicas; esses especialistas devolvem a culpa para os planos de saúde e nesse meio está o paciente com necessidades que não podem esperar. Até greve de médicos já vimos em São Paulo! Profissionais da Associação Paulista de Medicina (APM), do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp), do Conselho Regional de Medicina (Cremesp) e da Federação dos Médicos do Estado (Femesp), acusam as operadoras dos planos de remuneração abaixo da solicitada e afirmam que os reajustes dos planos não são repassados aos profissionais.

Criticam a pressão das operadoras para reduzir pedidos de internações e de exames mais caros, defendem a inclusão de cláusula de reajuste anual no contrato, conforme instrução normativa da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Segundo a APM, até agora nenhuma empresa atualizou os contratos existentes. Do outro lado, as operadoras se defendem. A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), entidade que reúne 15 grupos de operadoras, com uma carteira de quase 24 milhões de assegurados. Também destaca que não é de sua competência a negociação de reajustes que cada operadora trata diretamente com os médicos. Lembro-me da história de um professor amigo que precisou agendar consulta nesse sistema de plano de saúde, uma pessoa calma que ficou extremamente irritada, e com razão. Como todo o processo se torna terceirizado, 43

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Opinião

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Crônica

foi agendada a consulta para o mês seguinte, em um grande hospital da cidade de São Paulo, isso com o apoio de profissionais da área de nutrição. Horas antes da visita ao médico, ligaram cancelando. Passadas duas semanas, o convênio não tinha respostas do que ia acontecer, falou apenas que estava tudo encaminhado. E o paciente já estava com mais de 30 dias na dieta específica para os exames. Ninguém deu satisfação do que aconteceu. Nesse caso, de quem é a incompetência? Do convênio que não liberou ou do pessoal da

nutrição que se adiantou ao aval do convênio e já fez todos os procedimentos? Porque tomaram essa atitude, sendo que a dieta altera toda a vida do paciente? A funcionária não teve nem coragem de telefonar para avisar do cancelamento do exame. Pediu para outro setor. O paciente precisou de um tempo para se refazer dessa confusão e começar tudo de novo: pedidos, dieta etc. Se o serviço funciona assim para quem teve este tipo de enfermidade, imagina como é para os outros que tem problemas mais graves! Esse caso reflete o tamanho

do problema do sistema de saúde brasileiro, essas são histórias que refletem o cotidiano dos hospitais com sistema particular. Nos públicos nem se comenta, as dificuldades são ainda piores. O sistema terceirizado confusão, tanto nas consultas quanto nos agendamentos, cada um passa a culpa para o outro, seja hospitais, médicos, convênios, atendentes, ninguém assume sua parcela da culpa, quem sofre mesmo são os enfermos do Brasil, que morrem esperando sua senha nas filas, depois chamam as farmácias de drogarias.

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Warde Marx: a vid

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Na Metrópole

vida como ela é

Sem saber, Waldemar de Azevedo Marques Júnior começou a traçar o destino de sua vida aos dez anos de idade. Do teatro amador ao palcos como diretor. Ele produz, dirige e atua. Além de tudo, educa. Da estranheza à admiração pelo maior dramaturgo brasileiro: Nelson Rodrigues. Ambos conduzidos pelo mesmo instinto: o humor. Este, porém, peculiar. As cortinas se abrem. Warde Marx entra em cena. Por Ludimila Honorato

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Cultura

Perfil

ATO 1 WARDE GUERREIRO “Eu comecei de um jeito que hoje eu sei que foi o jeito errado: eu comecei pelos filmes, e não gostei!” Foi assim quando as cortinas se abriram para Waldemar de Azevedo Marques Júnior (vulgo Warde Marx) conhecer as obras de Nelson Rodrigues. E como um bom contestador que adora discutir e entender tudo, Warde foi do contra. — Nelson é maravilhoso, Nelson é um gênio — diziam os tais entendidos. — Eu não vejo essa maravilha toda, não... — contradizia o iniciante. — Tá, mas porquê ele é gênio? — questionava, ao que as pessoas respondiam que gênio é gênio e não se discute. E discutir era tudo que ele queria! Alegre, extrovertido e sagaz, Waldemar como não gosta de ser chamado - adotou um nome pelo humor e, posteriormente, gostou de Nelson Rodrigues (já pelos motivos certos) também pelo humor, embora muitas vezes oculto e compreensível apenas pelos fortes.

Na Metrópole

Não, ele não é seguidor das ideias marxistas, mas judaizou o sobrenome Marques “não só pelo Karl Marx, mas, principalmente, pelos irmãos Marx que era uma família de comediantes judeus também” que faziam um humor que o fascinava. Warde foi apenas uma redução que alguém fez e ele gostou. Adotou. E quer mudar de nome, registrar-se como Warde Marx Waldemar de Azevedo Marques Júnior. Nome grande, mas nada que se compare ao de D. Pedro II. Ator, diretor, dramaturgo e professor - não necessariamente nessa ordem, Warde Marx também é pai e nas horas vagas... Bom, o que são horas vagas para quem trabalha de domingo a domingo? Com essas e outras atividades cotidianas, nada mais justo do que ser um guerreiro. As cortinas se abrem. No canto esquerdo uma mesa, um homem sentado numa cadeira com o dedo já calejado pelos infinitos autógrafos concedidos. Warde Marx se aproxima. AUTOR - Seu nome? WARDE - Warde. AUTOR - Warde... Esse nome tem origem alemã... WARDE - É...

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Na Metrópole AUTOR - E significa guerreiro. WARDE - É isso mesmo. O tal autor ainda disse que Warde, Waldemar, é tudo da mesma raiz, significa guerreiro. “É, é isso mesmo, Waldemar é guerreiro”, declara Warde Marx com um sorriso no canto da boca.

ATO 2 O CHAMADO PARA A ARTE (CÊNICA)

Aos dez anos de idade, Waldemar - como ainda era chamado - leu toda a obra infantil de Monteiro Lobato, 17 livros, um por semana. Leu pela segunda vez, a mitologia o fisgou, e ele começou a procurar tudo que podia sobre o assunto. Aos 12 anos leu os

Perfil

Cultura

fascículos do primeiro volume (de três) da série Mitologia publicada pela Editora Abril. Conheceu desde a antiguidade até a arte contemporânea. E quase 40 anos depois, já com o nome de Warde Marx adotado... Warde entra numa galeria em Firenze (Florença, Itália) e se depara com O Nascimento de Vênus, do italiano Boticelli. Ele para em frente ao quadro, extasiado, apaixonado. Murmura: WARDE - Demorei, mas cheguei... Ele senta em um banco localizado em frente ao quadro e se põe a namorar com os olhos aquela Vênus. A sala, antes vasta de pessoas atraídas para a Itália pelo verão, se esvazia, mas apenas para Warde que contempla um Boticelli a sua frente.

Warde Marx se emprenhou no estudo do teatro e da história da arte. Hoje leciona na Universidade São Judas Tadeu e na Fundação das Artes de São Caetano do Sul / Foto: Ludimila Honorato

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Na Metrópole

Perfil

No livro Minotauro, de Monteiro Lobato, Pedrinho sonha com uma musa que conta histórias de mitologia, sobre a criação do universo, e cita Prometheu, o titã que roubou o fogo dos céus e levou aos homens. Acorrentado na montanha por ter traído os deuses, ele urra: Cairá Zeus e teu trono nos céus, o tridente de Posseidon será quebrado, e os homens fará do fogo a arma mais fabulosa da face da terra. Aos dez anos de idade, Warde leu essa frase e disse: “eu queria dizer isso um dia”. Naquele momento ele estava traçando seu futuro, sem saber.

Foto: Ludimila Honorato

Cultura

Warde Marx estudou e atualmente leciona História da Arte. Entrou em contato com algumas peças de teatro pela leitura. Aos 14 anos escreveu, dirigiu e interpretou uma peça que parodiava o grito do Ipiranga. O humor sempre esteve presente em sua vida. Fez várias oficinas de direção dramaturgia, corpo, voz. Do teatro amador foi para os palcos e para os bastidores, como diretor. Resolveu se profissionalizar. Se formou, então, na Fundação das Artes de São Caetano do Sul em 1988 e dois anos depois foi chamado para dar aula de história do teatro brasileiro. Aceitou. Mais tarde fez especialização em teatro na Universidade São Judas Tadeu. Na ECA/USP pesquisou a vida da atriz Maria Della Costa e, assim, concluiu seu mestrado. “As pessoas me perguntam se eu fiz teste vocacional. Quando eu fiz teste vocacional, eu já estava direcionado para as coisas que eu ia fazer, exceto uma: o teste disse que eu ia ser professor. Eu falei: Absurdo! (risos)”. Mas ele adora o que faz! “Eu ganho a vida fazendo o que eu gosto”.

Warde é professor, ator, diretor e dramaturgo

ATO 3 - (FINAL) O ENCONTRO COM NELSON RODRIGUES Warde Marx assiste à uma apresentação de um grupo de teatro amador do ABC, uma peça de Nelson Rodrigues, “A Senhora dos Afogados”. Durante a peça, quase dorme. WARDE - Meu Deus, como alguém pode gostar de Nelson Rodrigues?! Frustrado, ele resolve ir para os livros. Lendo, percebe algo estranho. WARDE - Tem alguma coisa errada, porque eu estou gostando do que estou lendo!

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Na Metrópole O dramaturgo, então, encontrou verdadeiramente o Nelson Rodrigues, aqueles que poucos conhecem, aquele que verdadeiramente o atraiu. Depois de ler as peças, ler sobre Nelson e as análises, Warde chegou a uma conclusão: “O que eu mais gosto no Nelson é uma coisa: eu acho muito engraçado o Nelson”. A diferença é que o humor de Nelson Rodrigues não é para dar risada. Na verdade, Nelson ri do seu público. Warde afirma que não se trata de comédia, mas de humor particular, que escandaliza as pessoas. Nelson Rodrigues foi escritor, dramaturgo e jornalista - não necessariamente nessa ordem também, não muito diferente de Warde, que dá aula para turmas de jornalismo. O marco da renovação do teatro brasileiro se dá em 1943 com o lançamento de “Vestido de Noiva” no Rio de Janeiro, mas foi em São Paulo, a partir de 1949, que essa renovação começou de fato, quando um grupo de teatro amador trouxe “Vestido de Noiva”.

Perfil

Cultura

essencialmente crítico. Gosta de psicologia e de fugir do óbvio. No teatro, vê as representações. Na vida real, busca a ironia, o humor por trás das representações sérias que as pessoas posam para a sociedade. O mesmo humor de Nelson Rodrigues, a mesma sagacidade, a mesma particularidade. — Você se vê um Nelson Rodrigues com essa percepção de humor? — Sim, mas não totalmente. Sim no sentido de: eu às vezes me divirto com o espanto do outro. Poder fazer a mágica, ver a surpresa do outro, tirar o coelho da cartola na frente do público. Isso vale pro palco, pra sala de aula, isso vale pra tudo.

“Nunca se fez tanto teatro, no Brasil ou em São Paulo, como se faz hoje em dia”. Teatro amador, teatro coletivo, teatro de R$10 a R$100 reais (ou mais). Grande quantidade e várias qualidades. Em São Paulo, há companhias que produzem dezenas de peças por semestre. Teatros de esquerda, teatros da Broadway, teatros de várias vertentes religiosas, teatros infantis. Teatros em hospitais, em escolas, em escritórios, na rua. Uma infinidade. Warde Marx se encontrou nesse mundo. Rigoroso com as peças que produz, as apresentações começam exatamente no horário determinado, nem mais nem menos. Ele garante que é uma maneira de educar o público. Para ele que conhece, falta programa de formação de público. Musical, tragédia grega, drama, drama psicológico, drama político. Warde experimenta de tudo e tem uma visão crítica do mundo que se manifesta por um humor 53

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Opinião

Crônica

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Rumores urbanos *

Por Armando dos Prazeres

O espaço urbano constitui, grosso modo, o lugar da troca de experiências humanas. É, nesse sentido, o ambiente da comunicação interpessoal e social, onde o homem propaga e se contamina de fluxos ininterruptos de estímulos visuais, sonoros e verbais nele existentes. A ação do homem no espaço urbano produz, mais do que nunca, contatos de toda a ordem, que atuam em cadeia na memória do indivíduo: táteis ou físicos, acústicos, imagéticos, gustativos e olfativos. A cidade torna-se, então, um ambiente onde a comunicabilidade encerra uma gama de materialidades e sensorialidades, produzidas e retidas no indivíduo, que determinam sua dinâmica enquanto espaço social e cultural. Os modos de andar dos transeuntes, acelerados ou compassados, com seus gestos delineadores de alguma individualidade; a velocidade dos automóveis e o rugir de suas buzinas clamando fluidez no trânsito; os murmúrios de vozes evocadas em massa ou flagradas isoladamente; os pregões dos ambulantes a anunciar seus produtos; as edificações seculares e modernas que emparedam as ruas, alterando a rota do sol e do ar. Trata-se, ora, de marcas expressivas da cidade que se misturam às informações mediadas pelas páginas do jornal, pelas ondas hertzianas do rádio e, hoje, pelas conectividades digitais portáteis. Tudo isso traduz a relação tempoespaço do ambiente urbano e de sua interação com o indivíduo. Um espaço-tempo de texturas e cores múltiplas, que se movimentam a cada percurso traçado pelo homem, variando seu caminho particular e fazendo variar a dinâmica global da cidade. Comunicar-se com e no espaço urbano é a um só tempo traçar uma nova rota cultural para si e cravar uma outra rota na dinâmica cultural da cidade. Assim, a cultura da cidade move-se a cada novo movimento que nela se desenhe. Suas marcas expressivas se enfeitam desse constante nascer e morrer de pegadas, cuja matriz geradora não se vê com nitidez, mas reaparece matizada 54

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nessas superposições de camadas de vozes, sirenes, densidades, volumes e colorações que se derramam ad infinitum sobre o espaço urbano. Avenidas, ruas, becos, vias e vielas, abrem-se para o trânsito de línguas multiformes, carregadas de informalidades, gírias e erudições, tão díspares quanto complementares entre si. Organismo vivo, a língua que habita o espaço urbano metamorfoseia-se de acordo com a dinâmica de seus fluxos humanos, materiais e políticos, para prover-se de uma força que transcenda os mecanismos de controle e amordaçamento da palavra. Escapatória e fluida, essa língua adquire os contornos do corpo em movimento que a profere na caminhada pela rua, na travessia do trem, na vertiginosidade do metrô, no vai-e-vem dos automóveis e dos ônibus. Essa língua se nutre, em grande medida, desses deslocamentos ininterruptos e deles incorpora os caracteres visuais, acústicos e verbais que vai encontrando no caminho. Essa língua, que viaja entranhando-se ao corpo, comunica-se com outros sistemas da cultura, tanto no seu território urbano quanto em outras paragens distantes. Quer permanecer no ambiente desconhecido e dele impregnar-se de dicções, ritmos e sintaxes a ela estrangeiras, pois tais elementos traduzem-se como marcas operatórias da cidade na memória coletiva dos seus habitantes. Estabelecidas as trocas, variados sistemas de signos entram em ação mútua, revelando modos de ver, de sentir e de ser em um determinado ambiente urbano. Nessa engrenagem sígnica, na qual variados sistemas semióticos entram num transe intercambiável de comunicação, desponta a linguagem poética que, libertária e dialógica por natureza, confere à língua formas de pensar e sentir de uma sociedade.

*Armando Sérgio dos Prazeres é mestre em Comunicação

e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e graduado em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). É professor na Universidade São Judas Tadeu e idealizador e produtor do Festival 2 Minutos de Áudio e Vídeo na mesma instituição.

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Guia de Passeios

Lazer

CONHECER SÃO PAULO - DICAS PARA VISITAR E APRECIAR

JARDIM BOTÂNICO DE SÃO PAULO Por Aline Oliveira

Vista do Orquidário, que abriga plantas tropicais da Mata Atlântica, conservadas em elevadas temperaturas e umidade do ar. Foto: Aline Oliveira

Vista da paisagem que circunda o percurso da trilha, e esculturas que ocupam o espaço. Foto: Aline Oliveira Lago das Ninfeias / Foto: Aline Oliveira

Localizado próximo ao Parque do Estado, Espaço Geofísico da Usp e Zoológico, o Jardim Botânico de São Paulo possui uma área de preservação e conservação que totalizam 360 mil (36 ha) metros quadrados e abriga uma reserva biológica com vegetação remanescente da Mata Atlântica.

Possui um extenso roteiro de visitação, que intercala instalações, áreas verdes nativas, áreas de conservação e áreas de percurso. Ao todo, são 31 pontos indicados. Ótima dica para sair de rotina e entrar em contato com a natureza e o lado verde ainda preservado na cidade de São Paulo.

Sua história se relaciona à preservação da área do Parque Estadual das Fontes do Ipiranga, com mata nativa, ocupada por sitiantes e chacareiros no século XX e adquirida em 1917 pelo governo que a denominou como Parque do Estado. Anos depois, já em 1928, foi implantado um Jardim Botânico, oficializado apenas dez anos mais tarde.

Aberto de terça a domingo (além de feriados), o Jardim Botânico está localizado na Avenida Miguel Stéfano, 3.031 - Água Funda Zona Sul - São Paulo. Os ingressos custam R$ 3. Estudantes pagam R$ 1 e crianças de dez anos, adultos acima dos 65 anos e portadores de necessidades especiais não pagam a entrada. 55

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Lazer

Na Metrópole

Guia de Passeios

Parque Estadual do Belém Por Ludimila Honorato

Inaugurado no dia 23 de junho deste ano na Zona Leste da capital, o Parque do Belém possui uma área de 210mil m² destinada ao lazer, esporte e à cultura. Localizado onde era a Febém do Tatuapé, o espaço é parte da iniciativa de descentralizar esse tipo de reformatório, como aconteceu com a Febém do Ipiranga, onde hoje é o Parque das Fontes do Ipiranga, e o Carandiru onde é o Parque da Juventude. O espaço abriga uma unidade do programa Fábricas de Cultura, um projeto da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo que oferece atividades gratuitas para crianças e jovens. O local propicia a iniciação artística nas área de música, teatro, circo, dança, xadrez, multimeios e artes plásticas. Além disso, conta com um biblioteca com mais de dois mil

Ciclovia e pista de cooper têm 1.500 metros / Foto: Ludimla Honorato

títulos. Nos finais de semana, são oferecidos espetáculos culturais para toda a comunidade. No Parque Belém há uma extensa área verde, ciclovia, pista de cooper e skate. Há espaços destinados à diferentes atividades e pessoas como, por exemplo, o playground para as crianças e os aparelhos de exercícios para a terceira idade.

Situado na Avenida Celso Garcia, 2.231 - Belém, o Parque é aberto de domingo a segunda, das 7h às 18h, e o acesso é gratuito.

Fábricas de Cultura: iniciativa que propõe diversas atividades gratuitas aos joevns da região / Fotos: Ludimila Honorato

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Na ponta da agulha, uma canção No centro da cidade, lojas especializadas mantém viva a tradição dos discos de vinil Por Aline Oliveira

Numa época em que o CD já foi ultrapassado, novas tecnologias e mídias surgem desenfreadamente e aumentam as possibilidades de compartilhamento de arquivos, sobretudo de músicas, permanece viva a cultura dos Discos de Vinil. E ela tem lugar certo em São Paulo: a região central. Um dos polos para quem procura esse tipo de manifestação cultural é a Galeria Nova Barão, próxima ao metrô República. No local é possível encontrar diversas lojas especializadas na atividade de compra e venda de discos, alguns deles, raridades. “Tim Maia na fase Racional é muito procurado. Tem temática diferente e som muito bom. São poucas cópias, porque foi de produção independente”, diz Elienai Santos, proprietária, juntamente com o marido, de uma das lojas situadas na região, a Disco 7 Vinil.

O som ambiente dá o tom a quem visita a loja / Foto: Aline Oliveira

Elienai conta que o início, há doze anos, foi difícil. Carlos, seu marido, estava há cinco meses desempregado, vendendo discos na Praça do Correio de forma independente. Por sofrer com a fiscalização, ele decidiu abrir um espaço e manter seu próprio negócio. A primeira loja ficava na Rua Marconi x Sete de Abril, de onde saíram após três anos, no momento em que o edifício foi desapropriado. Há nove anos estão na Galeria Nova Barão, (acesso pelas ruas Rua Sete de Abril e Barão de Itapetininga). Em decorrência da localização privilegiada, a loja atende a um Entre os diferentes estilos musicais, é possível encontrar discos que custam apenas R$2,00 / Foto: Aline Oliveira público variado.

“Trabalhamos com clientes que são desde estudantes de música a colecionadores. Alguns são artistas ligados ao ramo, como os DJ´s. A clientela fiel é formada pelos frequentadores que se tornam amigos e vêm sempre em busca de ‘novidades’”, conta Elienai. Por estar no centro de uma cidade tão rica e ampla em cultura, a atividade abrange um número ainda maior de clientes. “São Paulo é uma grande metrópole que recebe e grega todas as culturas que aqui se instalam, sem preconceito. O único lugar do Brasil onde é possível sustentar a família de seis pessoas comercializando algo que não é mais produzido, é São Paulo”, enfatiza a comerciante.

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Companhia de teatro encena de forma sarcástica e bem humorada peça de Gil Vicente Por Maday Florencio

A peça “Inês”, do diretor Archileu Nogueira Neto, encenada pela Companhia dos Ícones, consegue dar um caráter bem divertido e cômico para a história de Gil Vicente, “A farsa de Inês Pereira”, uma das histórias mais bem humoradas do autor português que se preocupou em satirizar os costumes coloniais – mas ainda modernos – de homens e mulheres. A encenação está em cartaz no Teatro Anhembi Morumbi, região leste de São Paulo. Embalada por uma trilha sonora ao vivo, a história escrita em 1523 foi a resposta de Gil Vicente ao reino de Portugal que o desafiou a contar uma história com o tema: “mais quero um asno que me carregue do que um cavalo que me derrube”, frase mencionada ao final da peça pela personagem. A obra retrata a ambição de uma criada da classe média portuguesa do século XVI que para sair do marasmo de sua vida decide se casar primeiramente com um marido rico. Este, no entanto, mesmo sendo aceito pela mãe da moça, acaba sendo ignorante e inculto, não agradando Inês. Um tempo depois ela insiste em arrumar outro marido, mas dessa vez escolhe um jovem forte e charmoso. Porém, não demora muito para se decepcionar, pois ele se torna um covarde opressor,

e Inês fica chateada quando ele sai de casa. No entanto, a protagosnita logo se reanima ao saber que ele morreu, ficando livre para escolher quem quisesse. A história chega ao fim quando a jovem encontra um velho milionário. Muito ingênuo, a deixa sair para se divertir sem sua presença, e nesse momento o tema da peça vem à tona. É relevante observar que nessa montagem o diretor coloca em cena um ator para o papel principal, deixando claro o ar de sátira e comédia. Como a intenção da peça é divertir, não vá esperando um final de cinema. A peça se torna divertida justamente pelo descompromisso com a formalidade e a valorização das relações conjugais, situação em que o público rapidamente se identifica.

Inês: Gil Vicente por ele mesmo Quando: de 16/08 até 22/11/12 (consultar o horário da apresentação na bilheteria do teatro) Onde: Teatro Anhembi Morumbi, Rua Dr Almeida Lima, 1176, Mooca, São Paulo Ingressos: R$ 100,00 (inteira), R$50,00 (meia) – antecipados: 80,00 (inteira), R$40,00 (meia) Faixa etária: 12 anos Duração: 80 min. Cia dos Ícones Ficha técnica: Alessandro Ramos, Charles Murray, Irineu Justino, Ivan Cápua, Jeferson Santos, Marcelo Santos, Marcelo Hessel, Miriam de Castilho, Roberto Cezzaretti, Sandra Maurami, Sergio Portella, Tatiana Ramos, Thiago Reis, Tony Ravan. Tel: (11) 3477-2411 Site: www.ciadosicones.com.br

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Boca noir Por Thomas Shikida

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Lançado no final de setembro, o filme foi baseado no livro “Boca do Lixo”, escrito pelo protagonista da história, Hiroito de Moraes Joanides. A história se passa nas décadas de 50 e 60 e retrata a zona da Boca do Lixo, região de prostituição no centro de São Paulo. A película, produzida com baixo orçamento, consegue retratar bem a época em que a história se passa, mas não mantém o ritmo até o fim. A trama é toda centrada em Hiroito, interpretado por um Daniel de Oliveira muito à vontade no papel. Logo no início, o personagem deixa clara sua paixão pela prostituição. Em família, a relação com o pai é conflituosa a ponto de ser acusado de assassiná-lo, fato que sempre negou. Essa turbulenta fase é culminada com Hiroito se fixando como homem forte na região da Boca do Lixo. Veja bem, ele não é levado a uma vida de crimes. Ele escolhe essa vida. Esse pode ser o grande diferencial e o maior atrativo do personagem.

Ao final, fica a impressão de que a vida de Hiroito foi como a obra. Um início interessante, com um fim melancólico. Na média, o filme se salva pelas boas atuações e pelo apuro técnico na primeira metade. Mas se o protagonista, que escreveu o livro na última vez em que foi preso, por sete anos, pretendia se justificar e talvez conseguir redenção, pode ter alcançado isso na literatura, mas Na Boca conhece Alaíde, passou longe disso no cinema. prostituta que se tornará sua esposa. Ela é interpretada por FICHA TÉCNICA Hermila Guedes, atriz que dá força Diretor: Flavio Frederico à personagem, mas não é ajudada Elenco: Daniel de Oliveira, pela montagem do filme, que a Hermila Guedes, Milhen Cortaz, tira e coloca em cena de maneira Paulo César Pereio, Jefferson abrupta. O elenco do filme ainda Brasil, Juliana Galdino, Cláudio conta com Milhem Cortaz, em seu Jaborandy, Maxwell Nascimento, já tradicional papel de ‘bandido Camila Lecciolli, Leandra Leal cafajeste’, e Paulo César Peréio, Produção: Flavio Frederico, Pablo tão canastrão como um delegado Torrecillas, Rodrigo Castellar corrupto que chega a ser autoral. Roteiro: Flavio Frederico, Mariana A mistura do figurino, da Pamplona competente trilha sonora e da Fotografia: Adrian Teijido excelente fotografia consegue dar Trilha Sonora: Eduardo Bid um tom noir à primeira parte da Duração: 101 min. história. No entanto, quando surge Ano: 2010 a passagem de tempo e chegamos País: Brasil à década de 60, subitamente tanto Gênero: Drama fotografia como figurinos parecem Cor: Colorido mudar e se modernizar demais. Distribuidora: NOSSA As atrizes parecem mulheres Classificação: 16 anos contemporâneas usando um penteado ‘retrô’. Essa mudança chega junto com a decadência de *Thomas Shikida é cinéfilo e aluno do 4º ano de Hiroito, se afundando nas drogas Jornalismo na Universidade São Judas Tadeu. e perseguido por mídia e polícia, sendo preso várias vezes. 59

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Abraham Lincoln: O Caçador de Vampiros mergulha no íntimo e primitivo subconsciente dos telespectadores

Timur Bekmambetov e Tim Burton trabalham juntos nessa adaptação do livro de Seth Grahame-Smith que traz ao público uma versão sombria da vida de Lincoln

Por Guilherme Corrêa

Luz, câmera e muito sangue jorrando pela passagem da vida secreta do 16º Presidente dos Estados Unidos na produção de Tim Burton que trouxe às telas de cinema de todo o mundo o romance de Seth. A produção vem sendo questionada, pois a história de Abraham Lincoln diz que ele lutou com muita política e justiça para ser o novo presidente dos EUA. No entanto, o filme traz a realidade alternativa do que ele realmente fez: lutou contra as criaturas das trevas, os vampiros. Presidente de dia. Caçador de vampiros à noite. A trama conta como foi a infância e a adolescência

de Abe (como é apelidado tanto no filme quanto no livro) e a grande razão para tornar-se importante. O bom da direção é o mergulho na “mente desumana”, porque sempre há algo de vampiro no subconsciente das pessoas, algo íntimo e primitivo. É importante notar que apesar de se tratar de fantasia, o filme não deixa de ser uma crítica à abolição da escravatura nos Estados Unidos e no mundo todo, lembrando que Abraham Lincoln queria a liberdade para os negros e que o povo entendesse que somos todos iguais. O fato é que foi declarado o fim da “escravidão”, o que parece não ser bem o caso retratado na

obra cinematográfica de Timur. A trilha sonora oficial do filme se encaixa muito bem com o som de Linkin Park, com a música “Powerless”, que é importante para entender as fraquezas e derrotas de Abe. Vale lembrar que os leitores do livro ficarão chocados e felizes ao mesmo tempo por um simples fato: a adaptação cinematográfica não segue a mesma história do livro. É muito diferente, mas ambas são interessantes. Vale conferir os dois. FICHA TÉCNICA Diretor: Timur Bekmambetov Elenco: Dominic Cooper, Mary Elizabeth Winstead, Alan Tudyk, Rufus Sewell, Benjamin Walker, Anthony Mackie, Jimmi Simpson, Laura Cayouette, Robin McLeavy, Jaqueline Fleming, Erin Wasson Produção: Timur Bekmambetov, Tim Burton, Jim Lemley Roteiro: Seth Grahame-Smith, Simon Kinberg Fotografia: Caleb Deschanel Trilha Sonora: Henry Jackman Duração: 105 min. Ano: 2012 País: EUA Gênero: Terror Cor: Colorido Distribuidora: Fox Film Estúdio: Tim Burton Productions / Abraham Productions / Bazelevs Production Classificação: 12 anos

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JORNALISMO LITERÁRIO Por Talita Alessandra

Livro-reportagem escrito pelo jornalista Josmar Jozino, conhecido por abordar em suas publicações o submundo do crime, como em sua premiada obra Cobras e Lagartos, ganhador do prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos em 2005. Casadas com o Crime, lançado em 2008 (Ed. Letras do Brasil), é baseado em histórias reais de mulheres que convivem com a criminalidade, seja através de suas próprias atuações ou pelas ações de seus maridos. O livro conquistou menção honrosa do Prêmio Vladimir Herzog em 2008. O autor investiga e relata com propriedade e humanismo tanto a vida particular dessas moças como a realidade do sistema carcerário. Um dos pontos positivos é a pluralidade dos perfis. É apresentada desde uma pessoa muito simples com poucas opções e recursos financeiros até uma professora universitária rica e influente. É evidenciado que o amor pode caminhar junto com o crime independente do ambiente em que as personagens estão inseridas. A escolha por essa relação é complexa e vai muito além de conclusões simplistas, como é bem argumentado nas páginas. Embora a temática seja pesada, a leitura é rápida e prazerosa. Jozino, pioneiro na cobertura das questões de segurança pública e do crime organizado em sua atuação como repórter, se destaca também enquanto importante escritor do gênero com sua trilogia (Cobras e Lagartos, Casadas com o Crime e Xeque-Mate).

Por Aline Oliveira

O Olho da Rua é uma seleção de 10 reportagens realizadas pela jornalista Eliane Brum e publicadas na revista Época. Guiados por um olhar mais sensível e atento aos detalhes, os textos permitem ao leitor se transportar para o cenário do cotidiano das personagens da vida real que têm uma parte da trajetória narrada. São histórias de pessoas comuns, abordadas de maneira mais próxima e intensa. Para quem gosta de literatura, mas não deixa de lado a realidade, o livro alia a informação jornalística à reflexão e emoção despertadas pelo tom literário de sua narrativa. Além disso, permite conhecer de perto o contexto social em que se inserem os brasileiros que tiveram seu dia a dia acompanhado pelas reportagens. Alguns deles saem nas páginas de jornal diariamente, mas não têm seus maiores dilemas esmiuçados pelo imediatismo da cobertura jornalística factual. Essa lacuna permite ao Jornalismo Literário um amplo leque de histórias da vida real, narradas por quem viu e sentiu de perto os dramas desses brasileiros que se apresentam para quem busca a notícia onde ela surge – no olho da rua. É o terceiro livro da jornalista, premiada nos principais prêmios de jornalismo brasileiro, entre ele o Esso e o Vladimir Herzog.

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Mario de Andrade - Garoa do meu São Paulo Garoa do meu São Paulo, Timbre triste de martírios Um negro vem vindo, é branco! Só bem perto fica negro, Passa e torna a ficar branco. Meu São Paulo da garoa, Londres das neblinas finas Um pobre vem vindo, é rico! Só bem perto fica pobre, Passa e torna a ficar rico. Garoa do meu São Paulo, Costureira de malditos Vem um rico, vem um branco, São sempre brancos e ricos... Garoa, sai dos meus olhos

Vida e obra Mário Raul de Morais Andrade nasceu em São Paulo em 1893. Formado em Ciências e Letras, aos vinte e quatro anos de idade, passou a colaborar com a escrita de críticas de arte nos Jornais Folha da Manhã e O Estado de S. Paulo, além de trabalhar, anos depois, na redação da revista Klaxon, nascida no período pós – Semana de Arte Moderna de 1922. Atuou em diversos órgãos culturais, dedicando-se à pesquisa do folclore brasileiro. Lecionou nas áreas da música e das artes plásticas nacionais, além de ser cronista, crítico literário, poeta e ficcionista. Sua obra mais reconhecida foi Macunaíma, romance publicado em 1928.

Mario de Andrade foi um dos precursores do Movimento Modernista Brasileiro, que perpetuou o pensamento de vanguarda cultural. Com a Antropofagia, fez ao lado de amigos também ligados à arte – compondo o “Grupo dos Cinco”, uma nova identidade da cultura nacional diante das imposições europeias que prevaleciam na época. Faleceu aos 51 anos, em São Paulo.

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Na Metrópole Zona Norte Os trilhos do metrô riscam o chão. No céu, a chuva iminente

Zona Oeste Fim de tarde no Memorial da América Latina

Zona Leste Ipês que caem na calçada anunciam a Primavera

Zona Sul A Oca escondida entre as palmeiras do Parque do Ibirapuera Fotos: Aline Oliveira 66

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