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GASTRÔ

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A terra cafédo

Em busca de se emancipar da região Sul, o Sudoeste de Minas se firma como um importante destino para quem quer conhecer a produção do grão com o Circuito Turístico Montanhas Cafeeiras de Minas. É dali, dos 52 municípios, que saem cerca de 7% de toda a produção brasileira

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Fazenda Nova Aliança, em Monte Santo de Minas: propriedade produz café desde 1880 e está na 6ª geração

Carolina Daher

CAROLINA DAhER

Quando se pensa em produção de café mineiro, logo vem à mente o sul do estado. Como se aquele pedaço de território fosse uma coisa só. Mas Minas são muitas, como bem defi niu Guimarães Rosa. E cada pedacinho de terra tem características próprias. “Como é uma região muito extensa, nosso trabalho é empoderar o Sudoeste, porque temos nossas particularidades. Não queremos ser fi lha do Sul de Minas e, sim, irmã”, diz Teresa Lemos, gestora de turismo do Circuito Turístico Montanhas Cafeeiras de Minas. O circuito, criado há uma década, representa 14 dos 52 municípios do sudoeste, entre eles Areado, Guaxupé, Jacuí, Juruaia, Monte Santo de Minas, Muzambinho, Nova Resende e São Sebastião do Paraíso. Como o próprio nome indica, por ali o rei do pedação é o café, mais precisamente da variedade arábica. A área de produção é de aproximadamente 171 mil hectares, o que representa, segundo a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), aproximadamente 7% de toda a safra brasileira. É café a perder de vista.

Além do café, a economia do Sudoeste é baseada em atividades agropecuárias, especialmente pela atividade leiteira e criatório e tem um importante polo têxtil, representado por Juruaia, considerada a Capital da Lingerie. Na cidade, de pouco mais de 10 mil habitantes, existem cerca de 300 empresas ligadas à confecção, que fabricam mais de 20 milhões de peças, muitas exportadas para Europa e Ásia. O café, no entanto, é ainda a principal atividade da região. É em Guaxupé, por exemplo, que está localizada a maior cooperativa de café do mundo, a Cooxupé. Fundada em 1937, ela surgiu como uma cooperativa agrícola de crédito e, nos anos 1950, começou a exportar. Hoje, a maior parte dos grãos seguem para fora do Brasil, tendo os Estados Unidos como o maior consumidor. “No ano passado, das 8 milhões de sacas, exportamos 4,9 milhões”, diz Edir Antônio de Siqueira, analista de comunicação e marketing da Cooxupé. São 17 mil produtores associados, sendo a maioria de Minas Gerais. Para se ter uma ideia da dimensão, o Brasil é o maior produtor de café do mundo e 50% sai do território mineiro. Inclusive, alguns dos melhores grãos do planeta. No Cup of Excellence – Brazil 2021, principal concurso de qualidade do mundo para o produto, o primeiro lugar ficou com o café especial produzido no Cerrado Mineiro. O lote produzido na Fazenda Cachoeira, em Carmo do Paranaíba, recebeu 90,5 pontos do júri internacional em uma escala de 0 a 100 da SCA, Specialty Coffee Association. O segundo lugar, também saiu de Minas e veio da Fazenda do I.P., em Carmo de Minas, e levou a pontuação de 90,14.

Uma das características principais da produção no Sudoeste é exatamente estar nas mãos de pequenos e médios produtores. Dos 17 mil cafeicultores, mais de 90% são familiares. Uma dessas fazendas é a Nova Aliança (@fazendanovaalianca), em Monte Santo de Minas. A propriedade produz café desde 1880 e está na 6ª geração. Hoje, o comando está nas mãos do agrônomo Flávio Pereira de Mello e da advogada Juliana Paulino da Costa Mello. As filhas do casal, no entanto, já estão no negócio, com Marina trabalhando com exportação e Vitória responsável pelo marketing e vendas no mercado interno. “Uma das coisas que mais surpreende os compradores inter-

A advogada Juliana Paulino da Costa Mello e sua filha, Marina, da Nova Aliança (ao lado), comemoram a alta produção: a colheita é de 43 sacas por hectare, enquanto a média nacional varia entre 23 e 27

Fotos: Carolina Daher

Pinga e cerveja de café

O café é tão presente na vida dos moradores do Sudoeste de Minas, que por ali ele não se contenta em ficar apenas nas xícaras. O técnico agrícola e tecnólogo em café henrique Palma Neto é o inventor da pinga de café (@agropalmbrasil). E não pense que é uma bebida aromatizada com essência de café; ela é feita com grãos de café especiais

Diogo Miranda/divulgação

fermentados. A ideia surgiu há dois anos. “Somos pioneiros, essa receita é exclusiva e não existe em mais lugar nenhum do Brasil”, diz. No ano passado, a primeira produção ficou em 300 litros. Já a cervejaria artesanal zugbier (@zugbier) lançou a cerveja de café, a zugCoffee, em estilo larger escura. O produtor, Antônio Augusto Netto de Faria, é um engenheiro eletricista que em 2014 começou a produzir sua própria cerveja. “Uso os grãos daqui de Guaxupé”, diz. O resultado é uma bebida com forte gosto de café e uma cor avermelhada. nacionais é que independentemente de ser um ano com muita ou pouca chuva, conseguimos manter o mesmo padrão e qualidade”, diz Marina. Outro fator que chama atenção na Nova Aliança é a alta produtividade. A colheita é de 43 sacas por hectare, enquanto a média nacional varia entre 23 e 27. “O que fazemos é agir na hora certa”, explica Juliana. Localizada há mais de 1 mil metros de altitude, por ali a colheita é tardia, começa em junho e vai até setembro. Exatamente por essa característica, as cerejas amadurecem mais lentamente e desenvolvem mais açúcares, o que torna o café naturalmente mais adocicado. Dos 250 hectares, 160 são usados para o plantio, que é livre de

defensivos agrícolas. A fazenda possui a certificação mundial Rainforest Alliance, que garante uma gestão sustentável. Só a casa sede, construída em 1914, já vale a visita. O casarão mantém as pinturas originais nas paredes, que são verdadeiras obras de arte.

Pelo mesmo caminho, trilham os negócios da Fazenda Ouro Verde (@carruacafe), localizada na divisa entre Minas e São Paulo. Parte dos 120 hectares do cafezal fica em Muzambinho (MG) e outra em Caconde (SP). De lá saem 4 mil sacas por ano, das variedades Catuaí vermelho e amarelo, Bourbon e Mundo Novo. À frente da propriedade, que tem no mercado a marca de café Carruá, está o casal Elaine e Alfredo Gonçalves. A 1.100 metros de altitude, toda a colheita é feita de forma manual, o que garante um cuidado diferenciado aos grãos. A fazenda também está localizada dentro de um espaço demarcado batizado como Região Vulcânica. Com vegetação predominantemente de Mata Atlântica e temperatura entre 17º e 20º graus, o terroir se faz perfeito para o cultivo de café. Os visitantes podem fazer um passeio completo pela fazenda e viver a experiência do pé à xícara. O ponto alto é passar pela sala de provas, onde a Q-grader

Diogo Miranda/divulgação

Café na roça

Quitandas de encher os olhos. De canudinho de doce de leite a torresmo de barriga, tem de tudo um pouco no Café na Roça – Sombra e Água Fresca (@cafenaroca_sombraeaguafresca), localizado na BR 491, na altura de Guaxupé. à frente do negócio estão as irmãs Mariana (à esq.) e Ana Emília Palos. O local, com direito a uma charmosa mercearia de interior, fica localizado no sítio dos pais das proprietárias, onde elas cresceram. Dá para sentir o cheirinho de casa de vó, com os bolos e pães de queijo sempre saindo quentinhos do forno. Mas nada faz mais sucesso por ali que a coxinha de massa de mandioca. São mais de 20 sabores, que se revezam diariamente. As mais queridas pelos clientes são a de camarão; costela; palmito e queijo. As diferentonas, como a de pernil com provolone; e fraldinha com mostarda, merecem ser experimentadas. O horário de funcionamento é das 8h às 19h.

Fotos: Carolina Daher

Teresa Lemos, gestora de turismo do Circuito Turístico Montanhas Cafeeiras de Minas: “Como é uma região muito extensa, nosso trabalho é empoderar o Sudoeste, porque temos nossas particularidades. Não queremos ser filha do Sul de Minas e, sim, irmã”

O casal Elaine e Alfredo Gonçalves está à frente da Fazenda Ouro Verde, localizada na divisa entre Minas e São Paulo: toda a colheita da marca Carruá é feita de forma manual, o que garante um cuidado diferenciado aos grãos (especialista em avaliar os atributos de um café especial) Paula Tristão Santini ensina o processo de avaliação e classificação de cada lote. “A altitude influencia muito, porque quanto mais frio, mais tempo o café fica no pé. Ele demora mais a amadurecer, mas ganha em qualidade”, explica Paula. A fazenda ainda conta com forno de farinha de milho artesanal, que rende lindas fotos e uma experiência única. Para fechar, dá para levar vários produtos vendidos na lojinha local.

Essas duas fazendas não são as únicas a abrir suas portas para visitação. Outra que recebe turistas é a Capoeira, em Areado. A vista é de tirar o fôlego. Da varanda, o olhar se perde diante do cafezal que se desdobra no horizonte. A proprietária Maria Helena Contreras é embaixadora do Projeto Florada, da marca Três Corações, que tem como objetivo valorizar o trabalho das mulheres cafeicultoras do Brasil. “É muito triste quando uma mulher recebe uma propriedade e precisa vendê-la porque não sabe como lidar com a terra. Estamos aqui para mostrar que somos capazes de produzir alguns dos melhores cafés do mundo”, diz ela, que todos os anos

Maria Helena Contreras, embaixadora do Projeto Florada, que busca valorizar o trabalho das mulheres cafeicultoras do Brasil: “É muito triste quando uma mulher recebe uma propriedade e precisa vendê-la porque não sabe como lidar com a terra” A Q-grader (especialista em avaliar os atributos de um café especial) Paula Tristão Santini: “A altitude infl uencia muito, porque quanto mais frio, mais tempo o café fi ca no pé. Ele demora mais a amadurecer, mas ganha em qualidade”

Fotos: Carolina Daher

ALGUMAS CURIOSIDADES SOBRE O CAFÉ NO BRASIL E EM MINAS

SUDOESTE

O Brasil é o maior produtor de café do mundo. A cada três xícaras consumidas no planeta, uma é brasileira. A cada três xícaras consumidas no planeta, uma é brasileira. Minas Gerais é responsável por cerca de 50% de toda produção nacional.

realiza o Encontro da Mulher do Café na propriedade. A última edição atraiu mais de 300 participantes. “Há MINAS 15 anos, quando chegamos aqui não tinha um único pé de café, começamos o negócio do zero”, diz. Maria Helena, que é farmacêutica, lembra ainda que muitos duvidaram que a fazenda seria capaz de produzir cafés especiais, já que está localizada a 700 metros de altitude. No Sudoeste Mineiro, a produção é de aproximadamente 171 mil hectares, “Eu podia até não ter altitude, mas tive o que representa, segundo a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), atitude.” Atualmente, a área de plantio aproximadamente 7% de toda safra brasileira. é de 85 hectares e exporta para Alemanha, Inglaterra, Japão e Argentina. Para Na mesma região, são 17 mil cafeicultores, sendo 15 mil familiares. quem se interessar em conhecer como A produção prevista para 22/23 é de 3.450.000 sacas. funciona a colheita e o benefi ciamento dos grãos, a Capoeira oferece visitas que A Cooxupé, localizada em Guaxupé, é a maior cooperativa podem ser agendadas pelo Instagram (@ de café do mundo. No ano passado, das 8 milhões fazenda_capoeira_cofee). Há ainda uma de sacas, 4,9 milhões foram para exportação. pequena cafeteria, que funciona dentro de uma carretinha de trator, com produtos Se a Cooxupé fosse um país, ela seria produzidos por mulheres de toda região. o 7º maior produtor de café do mundo. O passeio ainda inclui uma farta mesa mineira, com vários tipos de quitandas, como pamonha, bolo de laranja, pão de queijo e rocambole de doce de leite. Tudo regado a café, claro. z

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