Jeaniene frost beijo eterno das trevas

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Night Huntress World, 02.


Eternal Kiss of Darkness (Beijo Eterno das Trevas)

Jeaniene Frost Uma guerra imortal estava sendo tramada nas trevas... e agora uma mulher tropeçou nas sombras. A investigadora particular de Chicago, Kira Graceling, deveria apenas se manter andando. Mas seu senso de responsabilidade se recusou a deixá-la ignorar os gemidos de dor que vinham de dentro de um armazém pouco antes do amanhecer. De repente ela se encontra em um mundo que ela apenas imaginou em seus piores pesadelos. No centro está Mencheres, um Vampire Mestre de tirar o fôlego que pensava ter visto de tudo. Então aparece Kira - esta destemida, bonita... humana que enfrentou a morte para resgatá-lo. Embora ele queime por ela, manter Kira em seu mundo significa arriscar a vida dela, mas mandá-la embora é impensável. Mas com o perigo se aproximando, Mencheres deve escolher entre a mulher que ele deseja, ou abraçar a mais escura magia para derrotar um determinado inimigo focado em sua destruição eterna.

Créditos:

Equipe Night Huntress de Tradução. Night Huntress [Oficial]


CAPÍTULO UM. Mencheres sentiu o cheiro de sangue mesmo antes de sentir o cheiro natural dos ghouls agrupados no chão do armazém decrépito. Eles não mostraram nenhuma preocupação quando ele entrou. Outra inspiração revelou que era sangue de vampiro a que dois deles fediam. Os outros quatro não tinham aquele aroma acobreado agarrado a eles, mas a partir dos olhares predadores que eles lançaram a Mencheres, eles pretendiam corrigir isso. ― Um vampiro jovem desapareceu dessa área recentemente, ― Mencheres disse como saudação, ignorando o jeito que os ghouls começaram a circular em torno dele. Eles pareciam estar no final de sua adolescência, e a partir da energia nas auras deles, eles eram adolescentes em anos mortosvivos também ― Cabelo louro curto, tatuagens tribais nos braços, conhecido pelo nome Trick, ― ele continuou ― Vocês o viram? ― ― Não é tão inteligente estar fora tão perto do amanhecer, vampiro, ― o ghoul com o maior cheiro de sangue pronunciou lentamente sem responder a pergunta de Mencheres. Em seguida o ghoul sorriu, mostrando que ele havia afiado todos os dentes até ficarem com pontas. Em vez de lhe inspirar medo, a visão irritou Mencheres. Esses ghouls achavam que tinham a vantagem por estar próximo do amanhecer, mas o amanhecer só esgotaria a força de um vampiro novo. Mesmo com o seu nível de poder disfarçado para que se sentisse que ele era apenas um vampiro novato, se os ghouls fossem espertos, eles se perguntariam sobre a falta de hesitação que Mencheres tinha em enfrentá-los. Então, novamente, se eles fossem espertos, eles não teriam matado Trick na mesma área que eles usavam como casa. Só havia levado uma hora para Mencheres rastreá-los. Tal estupidez não era apenas um desrespeito descarado pela lei dos vampiros e ghouls, também colocava em perigo o segredo de ambas as raças. Em outro humor, Mencheres teria matado o ghoul de dentes-de-tubarão sem mais conversa, em seguida prenderia os cinco restantes para punição em público mais tarde. Afinal, Mencheres não precisava da confissão deles para saber que eles haviam matado Trick. Não com o cheiro de sangue do vampiro neles. Os ghouls estavam com sorte por que hoje, ele não estava procurando por vingança sobre o assassinato de Trick. Talvez fosse uma boa coisa que ele tivesse perdido as visões do futuro, Mencheres refletiu. Caso contrário, se ele tivesse previsto que era assim que ele terminaria seus milênios de idade, em conflito com o corrupto Guardião da Lei, Radjedef, ele teria questionado a própria sanidade.


Mas se ele não tivesse perdido as visões, nada disso seria necessário. Raiva queimou nele. Depois de quatro mil anos de vislumbres do futuro, de repente perder suas visões era tão paralisante quanto inesperado. Ele lamentou por muito tempo a frustração de ter visões que algumas pessoas não prestavam nenhuma atenção, mas agora que elas se foram, apesar de todos os seus outros poderes, ele não podia proteger aqueles com quem ele se importava. As recentes palavras acusadoras de um amigo, ecoaram na mente do Mencheres. Por que agora, quando eu mais preciso de você, você é inútil para mim? Radjedef talvez tenha odiado Mencheres por milênios, mas ele era muito inteligente para vir atrás de um inimigo que poderia reagir aos mais hostis movimentos antes mesmo que eles pudessem ser feitos. Agora que as visões do Mencheres se foram, essa era a melhor chance do Radjedef. Como ambos sabiam, Radjedef não hesitaria em usar seu poder considerável como um Guardião da Lei para forjar acusações contra Mencheres por crimes que jamais aconteceram. Radjedef não estava desfamiliarizado em manipular a lei para os próprios propósitos. Isso era algo que ele fazia mesmo antes de se tornar um membro do poderoso conselho de decisões vampírico. Seu antigo inimigo talvez saboreasse o confronto iminente e todos os malditos efeitos colaterais que isso teria sem dúvidas antes que um deles se tornasse o vencedor, mas Mencheres terminaria isso antes mesmo de começar. Era particularmente prazeroso para ele imaginar a frustração que Radjedef teria ao lhe ser negada a oportunidade de pôr em prática seus elaborados planos de vingança. Então quando os seis ghouls puxaram suas facas de prata, sorrindo daquele jeito cruel e antecipado, Mencheres simplesmente continuou lá. Isso ficaria sangrento, mas ele estava acostumado com o sangue. Ou a dor. Ambos haviam sido a companhia dele por mais tempo que esses ghouls sequer pudessem imaginar. Ele lançou um olhar ao céu quase amanhecido, brevemente se perguntando se o sol brilharia na pós vida. Antes que o sol estivesse alto, ou ele ou os ghouls descobririam.

***** Kira desceu a avenida Ashland, a penúltima antes da rua dela. Uma súbita brisa jogou o cabelo dela sobre os olhos. Eles não chamavam Chicago de Cidade dos ventos atoa. Ela empurrou as mechas de volta para trás da orelha e mudou a mochila pesada para o outro ombro. Depois de todas as vezes que ela carregou a mochila indo e vindo do trabalho, Kira pensou que não pareceria mais tão pesada quanto parecia. Mesmo assim, ela tinha sorte pelo chefe dela


permitir que ela usasse o carro da companhia durante as espionagens, e por outro lado, muitas pessoas que viviam e trabalhavam no West Loop não tinham carros. Eles simplesmente não tinham que carregar várias câmeras, filmadoras, binóculos e outras coisas necessárias para uma espionagem como ela tinha. Pelo menos essa foi uma noite produtiva. A espionagem da esposa infiel de seu cliente finalmente estava paga na versão de várias fotos incriminadoras que Kira deixou em seu escritório antes de pegar a Linha Verde1 de volta para casa. Ela podia dormir até o quão tarde ela quisesse hoje, e nem mesmo o seu chefe exigente ia ter alguma coisa a dizer sobre isso. Ser uma investigadora particular significava estar em sintonia com os seus arredores, o que vinha com facilidade para Kira, mas o seu foco se tornou ainda mais afiado quando ela dobrou na próxima esquina. Andar nesse trecho específico da estrada durante a luz do dia era bom, mas agora, isso a fez ficar inquieta. Ela estava feliz que o sol havia começado a nascer. A linha de armazéns degradados deveria ter acabado agora, mas a recessão prolongada tinha retardado as demolições e reconstruções. O trecho de prédios desagradáveis significava que o aluguel em seu prédio mais adiante do bloco era muito inferior ao que seria uma vez que brilhantes novos apartamentos tomassem o lugar das pichações, mas isso também dizia que ela tinha que ser cuidadosa agora. Assaltos não eram incomuns nessa área. Ela estava quase passando pelo último deles quando uma risada áspera a fez girar a cabeça. Veio de dentro de um dos armazéns, e soava mais horrenda do que divertida. Continue andando, Kira disse para si mesma, apalpando o bolso da mochila onde ela guardava uma arma. Você está quase em casa. Aquela risada áspera ecoou denovo, dessa vez, logo em seguida do que parecia ser um grito de dor. Kira parou, escutando atentamente. Se fosse um pouco mais tarde, o barulho dos carros e pedestres teria abafado qualquer coisa vinda dos armazéns, mas com a maioria das pessoas ainda dormia, ela pode ouvir o que soou como um gemido alto. Quem quer que houvesse feito aquele som estava machucado, e quando isso foi seguido por mais daquela horrível risada, Kira soube que os dois estavam ligados. Ela escorregou a mochila do ombro, pegando o celular enquanto andava mais rápido para a segurança de seu apartamento. ― 911, Qual é a emergência? ― uma voz entoou depois que Kira digitou os números. ― Eu quero reportar um Código 37. ― Kira disse. 1

O metrô.


― Pode repetir? ― ― Agressão agravada, ― Kira reformulou, surpresa pelo operador não ter registrado o código policial. Ela deu o endereço de onde o armazém era localizado. ― Parece ser no piso inferior. ― ela acrescentou para ser mais específica. ― Por favor, espere na linha enquanto eu transfiro você para esse setor. ― o operador respondeu. Momentos depois, outra voz perguntou qual era a emergência. ― Eu estou denunciando uma agressão agravada, ― Kira disse, não se importando com o código dessa vez. Ela deu o endereço e a informação denovo, trincando os dentes de frustração quando ela teve que repetir pela segunda vez o que ouviu. ― Então você não chegou a realmente ver a agressão? ― O operador perguntou. ― Não, eu não fui até lá, ― Kira disse rigidamente, não andando mais, agora que já estava perto de seu prédio. ― Certo, ― a voz que agora soava entediada respondeu ― Qual é o seu nome? ― ― Eu prefiro ser anónima, ― Kira disse depois de uma pausa. Ela tinha uma história com a polícia que não era exatamente agradável. ― Nós mandaremos um carro para rondar. ― o operador enfatizou. ― Obrigada. ― Kira murmurou, e desligou. Ela tinha feito tudo que podia, com sorte isso seria o suficiente para quem quer que tenha feito aquele barulho horrível. Mas quando ela começou a caminhar em direção a porta da frente do prédio dela, seus passos vacilaram. Instinto dizia para ela dar a volta e voltar para o armazém. Levaria aproximadamente de quatro a dez minutos antes do carro patrulha chegar, e se o desconhecido ferido não tivesse tudo isso? Nunca tente ser uma heroína, criança. Deixe isso para os tiras. A advertência do seu chefe soou na mente de Kira, mas em vez de fazer ela se sentir melhor, raiva cresceu. Se não fosse pelo seu ex-marido, ela seria um dos ― tiras ― . Ela tinha arrasado na academia de polícia, pegado seu certificado de aplicação da lei, e estava a apenas dois blocos de distância daquele grito, não alguns minutos como o carro patrulha. A voz do Mack, profunda e áspera, soou na mente dela em seguida: Salve uma vida. Foi nisso que seu mentor tinha fé. Se Mack tivesse sido mais


parecido com o chefe dela, Kira talvez estivesse morta. Não ficando nos cantos debatendo sobre ajudar ou não alguém que precisa. Mack não teria hesitado, distintivo ou não. Ela queria ser como quem? Seu velho amigo Mack ou seu aborrecido chefe, Frank? Kira virou-se, voltando para os armazéns e para a fonte daqueles gritos.

***** Mencheres deixou escapar um longo gemido quando a faca de prata cortou seu externo. Quando os ghouls começaram a cortá-lo, ele não tinha feito nenhum barulho, e eles correram suas facas ainda mais lentamente sobre sua carne, tomando o silêncio como desafio. Então ele grunhiu, resmungou, e até mesmo gritou. Isso ajudou, eles estavam mais animados, seus cortes ainda mais profundos. Logo, ele teria que escolher entre usar sua energia para encobrir o fato de que ele era um vampiro Mestre, ou usar o seu poder para se proteger do pior da dor. Ele já tinha perdido muito sangue para continuar fazendo os dois. Mas se seus atacantes tivessem um grão de sentido, revelando a extensão do que ele tinha preso dentro dele, talvez os fizessem correr. Não, ele não podia arriscar isso. Seria dor, então. Mencheres derrubou a barreira mental que ele tinha erguido entre ele e essas implacáveis, certeiras facas. Imediatamente, o corpo dele parecia estar em chamas, a prata causando uma intensa, agonizante reação enquanto o cortava. Com sua barreira contra a dor baixa, um novo problema surgiu. Cada novo corte ou facada despertava o turbilhão de energia nele que ansiava retribuir. Mencheres forçou isso para trás, se concentrando em manter sua aura aprisionada, lutando contra a vontade de matar os ghouls mesmo apesar de seu poder exigir ser liberado. ― Stakes, ― Mencheres disse, chamando-o pelo nome que os outros haviam usado ― Você é inexperiente, ou isso é meramente o melhor que pode fazer? ― O ghoul rosnou para o insulto, cortando uma profunda linha na coxa de Mencheres como resposta. Outro ghoul agarrou o cabelo até a cintura de Mencheres e serrou um grande pedaço na altura dos ombros. A raiva de Mencheres cresceu de novo, escura e mortal, buscando fundirse com seu poder para se dar forma. Ele forçou isso para trás, sabendo que se ele perdesse seu controle por um instante sequer, todos esses ghouls morreriam, e eles ainda não tinham servido para o seu propósito.


― Abaixem as facas, e se afastem dele, ― alguém arfou. Mencheres girou seu olhar em direção ao som com o mesmo assombro que os ghouls tinham. Ele esteve tão distraído pelos próprios pensamentos ― e os ghouls pela tortura ― que uma humana tinha realmente conseguido observá-los? A prova estava de pé do outro lado do quarto, com uma postura clássica para atirar, arma apontada para os ghouls agrupados em volta dele. A mulher tinha olhos selvagens, o rosto pálido, mas ela segurava sua arma com um pulso firme. Isso era uma complicação que ele não precisava. ― Saia agora, ― Mencheres ordenou. O corpo quente e mortal dela seria muito tentador para os comedores de carne resistirem se ela não fugisse de uma vez. ― Ora, ora, ― Stakes se levantou, deixando sua faca cravada na coxa de Mencheres ― Olhe isso, caras. Sobremesa. ― Um som de click revelou que a mulher havia destravado a arma ― Eu vou atirar, ― ela avisou ― todos vocês, abaixem as facas e se afastem dele. A polícia já está vindo... ― A voz dela rachou quando Stakes se moveu para longe de Mencheres. A maior parte do que eles haviam feito a ele esteve bloqueado do campo de visão dela pelo corpo do ghoul, mas quando Mencheres estava completamente exposto ao olhar dela, ela encarou. Os ghouls atacaram. Mencheres sabia que ele não devia fazer nada. Devia continuar amarrado na trave de apoio do edifício, fingindo estar acabado, e deixar os ghouls matarem-na. Afinal, ele tinha um objetivo quando veio a esse lugar, e não envolvia salvar uma humana imprudente. Mas no único segundo que levou para os ghouls alcançarem a mulher, outro pensamento tomou conta de Mencheres, superando sua praticidade. Ela tinha tentado salvá-lo. Ele não podia deixá-la morrer por isso. Poder rasgou por ele, batendo nos ghouls. As cordas ensanguentadas ao redor de Mencheres começaram a se desamarrar sozinhas, chicoteando como serpentes enquanto Mencheres lançava mais do seu poder sobre os seis ghouls. Os golpes eram mais fracos do que o normal devido a perda de sangue, mas os súbitos gritos agudos vindos dos comedores de carne terminaram tão subitamente quanto o ataque deles a ela. Quando todas as


cordas haviam caído, e Mencheres caminhou até a mulher, nenhum dos ghouls podia sequer se mexer. Mencheres chutou Stakes para fora do caminho para revelar a mulher em baixo dele. Ela estava arfando, sangue saindo de sua boca em uma trilha fina, mais derramando da ferida aberta no estômago dela. Sua hesitação tinha custado caro. O ghoul conseguiu feri-la mortalmente antes que ele o detivesse, em meros minutos, a mulher sangraria até a morte. Ela olhou para ele, mostrando a angústia em sua expressão, seguida por um terrível entendimento quando ela olhou para baixo em seu estômago. ― Tina, ― a mulher sussurrou, e então seus pálidos olhos verdes rolaram nas órbitas e ela desmaiou. Mencheres não pausou dessa vez; ele deslizou suas presas sobre o pulso e segurou o ferimento na boca dela. Nenhum sangue fluiu. É claro ― os ghouls haviam drenado todo o sangue dele. Ele carregou a mulher no segundo seguinte, levando-a até o poste onde ele tinha sido tão recentemente açoitado. E então Mencheres pegou um punhado de sangue que empoçava no chão, forçando isso na boca dela. O pulso dela estava irregular, a respiração quase inexistente, mas ele ignorou aquilo, fazendo-a engolir. Sirenes se aproximavam. A polícia estava quase aqui, assim como ela disse que eles estariam. Mencheres pegou outro punhado de seu sangue, esfregando no ferimento no estômago dela. O sangue quente da mulher se misturou com o dele, mas só por um momento. Então o sangramento dela parou, as bordas da carne dela puxando-se umas com as outras enquanto ela começava a se curar por dentro e fora, pelo efeito regenerativo do sangue dele. Duas portas de carro bateram. Mencheres a deixou no chão manchado de vermelho enquanto ele ia até os ghouls. Os olhos deles eram as únicas coisas que conseguiam se mexer enquanto ele olhou para baixo para eles. ― Se vocês tivessem me matado de uma vez, vocês talvez tivessem vivido mais alguns dias, ― Mencheres disse friamente. Então ele flexionou seu poder em uma curta e controlada explosão. Um som de estalo precedeu seis cabeças rolando para longe dos corpos dos ghouls no momento seguinte. Passos se aproximavam do armazém, Mencheres pausou, olhando para a mulher. Ela tinha recuperado a consciência, e estava olhando para ele. Seu olhar pálido estava fixo com horror e choque. Ela havia visto suas presas. Assistiu enquanto ele matava os ghouls. Ela sabia demais para que ele a deixasse aqui. ― Policia, ― uma voz chamou alto ― Alguém ferido aqui? ―


Mencheres pegou a mulher e voou para fora de uma janela quebrada antes que os oficiais tivessem a chance de arfar pela carnificina que eles encontraram dentro.


CAPÍTULO DOIS. Kira sabia que ela não estava sonhando, ou alucinando, ou louca. E essa era a má noticia. Isso significava que tudo o que ela tinha visto era real, o que significava que o homem que a raptou não poderia ser humano. Tão impossível quanto a noção era, esta era a única explicação lógica. Humanos não conseguiriam se recuperar da carnificina que ela tinha visto quando ela finalmente tinha conseguido sua primeira boa olhada no homem amarrado no poste. Humanos não têm presas ou olhos que brilhavam verde fluorescente. E os humanos não podiam arrancar a cabeça das pessoas sem nem mesmo tocar nelas. Mesmo se ela quisesse racionalizar que tudo aquilo foi sua má interpretação histérica de um evento traumático, humanos com certeza não podiam voar. No entanto seu sequestrador voou para longe daquele armazém, em seguida realizou diversos saltos impossíveis de um telhado para outro, levando-a como se ela não pesasse nada. Kira sempre teve medo de altura, de modo que o medo, combinando com tontura, choque, perda de sangue e vertigem provou ser muito para ela. Em algum ponto durante um pulo de telhado ela desmaiou. Agora ela encontravase acordando em um quarto de aparência muito normal, ainda em sua rasgada, roupa manchada de sangue, seu estômago ferido milagrosamente estava curado e seu sequestrador estava sentado em uma cadeira em frente a cama. ― Não tenha medo, você esta segura, ― foram suas primeiras palavras, ditas em uma voz estranhamente acentuada. Apenas os instintos de sobrevivência da Kira a impediram de dizer: ― Besteira. ― Ela olhou para si mesma, mas é claro, sua arma não estava à vista. Não que ela tinha ajudado em alguma coisa contra ele ou qualquer uma das outras criaturas que estavam no armazém. ― Onde eu estou? ― Kira perguntou, saindo debaixo das cobertas que alguém ― ele? ― havia posto em cima dela. ― Em um lugar seguro, ― o sequestrador dela respondeu, conseguindo outro escárnio mental da Kira. Claro. Ela estava tão segura quanto um paraquedista com um paraquedas quebrado. ― Que estranho, ― o homem murmurou no momento seguinte. ― Eu posso sentir o cheiro do seu medo, mas eu não posso ouvir uma palavra dele. ―


Kira tinha lentamente começado a sair da cama, mas ouvindo isso ela parou. Um frio tremor de adrenalina tomou conta dela quando ela olhou para a pessoa que estava mantendo ela em cativeiro. Cabelo liso e comprido, balançando além do peito em alguns lugares, mas estava cortado até os ombros em outros. Á primeira vista, suas feições pareciam algo do Oriente Médio, mas sua pele clara a fez pensar que ele tinha herança mista. A boca estava curvada em um meio sorriso leve, enquanto negras sobrancelhas pairavam sobre olhos igualmente negros. Para onde foi aquele brilho verde sobrenatural? Ele parecia ter mais ou menos 25 anos, a julgar pela falta de rugas ao redor dos olhos. Ele ainda tinha sangue respingado em seu pescoço, mas parecia que ele tinha colocado camisa e calças limpas. Se não fosse o sangue e o cabelo cortado desigual, Kira pensaria que ele era um jovem executivo com quem ela tinha esbarrado no metrô. Mas ela tinha visto ele cortado em pedaços apenas essa manhã, apesar de nenhum sinal de lesão estar visível sobre ele agora. Isso era mais uma prova do que ela pensava dele, isso não podia ser humano. Por que se preocupar com as coisas amáveis nele? Kira se perguntou. Ambos sabiam que ela havia testemunhado algo que provavelmente resultaria em sua morte para que ela não pudesse contar sobre isso para ninguém. ― Fascinante, ― ele disse, quase que para si mesmo. ― Eu não posso ouvir uma palavra do que você esta pensando. ― Instintivamente as mãos de Kira foram para sua cabeça, como se fisicamente ela pudesse impedi-lo de tentar bisbilhotar em sua mente. Seu meio sorriso se curvou ainda mais. ― Isso não ajudaria você em circunstâncias normais, mas como eu já disse, eu não posso ouvir seus pensamentos. ― ― O que você é? ― Ela desabafou. Um alien? Ela sabia que o governo estava mentindo sobre o incidente em Roswell... ― Nada com o que você precisa se preocupar, Tina, ― Ele respondeu com um encolher de ombros. ― Em breve, você pode… ― ― Por que você me chamou de Tina? ― Kira interrompeu em um sussurro de pânico. ― Talvez eu só precise de mais sangue, ― O estrangeiro murmurou. ― Fique longe da minha irmã, ― Kira rosnou, levantando-se. Não importa o que ele era, ele tinha fugido da policia. Isso significa que eles devem


ser capazes de machucá-lo, e se ele tinha qualquer coisa planejada que envolvia Tina, ela encontraria algum modo para feri-lo, também. Ele estendeu sua mão. ― Você interpretou mal. Você disse ‘Tina’ antes de perder a consciência mais cedo. Eu pensei que esse era o seu nome. ― Kira não lembrava disso, mas fazia sentido. Quando ela viu o quão horrível sua lesão era, seu último pensamento foi o de que ninguém estaria por perto para cuidar da Tina uma vez que ela estivesse morta. Um ferimento como aquele devia a ter matado, mas a primeira coisa que Kira havia notado quando acordou era que seu estômago estava curado. Incrivelmente, nem mesmo uma marca permanecia, e ela se sentia bem, embora suas roupas estivessem rasgadas e manchadas de carmesim com o sangue. Isso a fez dar outra lenta avaliação ao seu sequestrador. Ele deve ter curado ela de alguma forma. Será que isso significa que ele estava sendo sincero quando disse que ela não estava em perigo, ou esta criatura tem algo ainda pior planejado para ela? Se ele não tinha más intenções, por que ele não a deixou no armazém com a polícia? O estranho sombrio ficou imóvel, ainda com uma única mão estendida em sua direção. Kira respirou fundo e se sentou na cama. Ela esteve em situações estranhas em seu trabalho vezes o suficiente para saber que ficar histérica nunca ajuda. Verdade, nada sobre ser um investigador particular a havia preparado para isso, mas se ela quisesse mesmo preservar a menor chance de sobreviver, ela precisava manter a calma. ― Meu nome é Kira, ― Se ele pegou seus pertences, ele já poderia saber disso pela sua carteira, de qualquer maneira. ― Eu quero ir para casa agora. Eu não tenho certeza do que aconteceu essa manhã. Quando eu tento lembrar é tudo tão embaçado… ― ― Você esta mentindo, ― O homem disse com um escárnio que de alguma forma conseguiu soar elegante. Aqueles olhos cor carvão se estreitaram. ― Eu não preciso ler a sua mente para saber disso. Eu posso cheirá-lo. ― Kira engoliu em seco. ― Você não fingiria não se lembrar de nada, se fosse você na minha posição? ― ― Eu não sei, ― ele respondeu quase que pensativo. ― Eu nunca estive na sua posição. Eu sempre soube sobre os filhos de Caim, até mesmo quando eu era uma criança. ― Então ele sacudiu sua cabeça como se quisesse limpá-la. ― Por que eu estou dizendo isso para você? Eu devo precisar me alimentar novamente. Venha, vamos acabar com isso... ―


De repente ele estava na frente dela, com as mãos em seu ombros. Como ele poderia ter se movido tão rápido? Seu coração começou a bater mais forte, enquanto uma sensação doentia brotou dentro dela. Acabar com isso como? Era assim que casualmente ele se referia a assassiná-la? ― Não tenha medo, ― o monstro disse suavemente. Seus olhos mudaram, indo para um verde brilhante terrível quando ele a forçou a olhar para ele. Pressão começou a se construir em sua mente. Oh Deus, ele ia arrancar a cabeça dela, como ele fez com as criaturas no armazém. ― Pare com isso, ― Kira disse ofegante. ― Eu tentei te ajudar ― ― ― Eu sei, ― ele interrompeu, escovando os dedos pelo rosto dela. ― Foi muito corajoso. Tolo também, mas corajoso, no entanto. Olhe em meus olhos, Kira. Nada aconteceu essa manhã. Você nunca foi ao armazém. Você nunca me viu. Você foi para casa, caiu adormecida, e nada mais aconteceu... ― Sua voz se aprofundou, até que vibrava com algo mais do que seu sotaque incomum. A pressão na cabeça da Kira se intensificou, mas ela não sentiu que a cabeça estava prestes a ser arrancada de seus ombros. Talvez ele não estivesse tentando matá-la. Ele não tinha levado tanto tempo para matar os outros no armazém. Depois de mais vários momentos olhando para os seus olhos impossivelmente brilhantes, Kira tentou argumentar com ele novamente. ― Isso é exatamente o que eu vou dizer. O que quer que você seja, o que quer eles fossem, eu não quero saber sobre isso. Eu só quero esquecer. ― Uma careta vincou suas feições. ― Impossível, ― ele murmurou. Seu olhos brilhando ainda mais. ― Nada aconteceu hoje de manhã, você voltou para casa, você foi para cama... ― ― Eu entendi, ― Kira disse, piscando. Olhar nos seus olhos era como olhar fixamente em dois holofotes verdes. Ele estava do outro lado da sala antes de ela piscar novamente, olhandoa com a mesma especulação desconfiada que ela lhe deu antes. ― Você é imune ao meu poder. ― Uma risada curta veio dele. ― Este é um dia memorável, certamente. Talvez seja porque eu te dei meu sangue para curá-la. Isso poderia interferir com a minha hipnose em você agora. Assim que isso sair do seu sistema, você será suscetível novamente. ― Isso não soava bem. Parecia longo, como se ela não fosse sair tão cedo, e as coisas estavam formando uma conexão em sua mente. Sangue. Hipnotizar. Presas. Voar. Há apenas uma criatura que tinha todos essas


características em comum, mas esse homem estranho não poderia ser realmente um vampiro, poderia? ― Eu posso me lembrar do que aconteceu hoje de manhã, mas você pode apostar que eu não vou contar a ninguém, ― Kira disse calmamente. ― Você não tem que esperar pelo meu sistema ficar limpo. Eu vou para casa e não vou dizer uma palavra sobre você, o armazém ou qualquer outra coisa que não seja completamente normal. ― Ele a encarou, escuridão substituindo o verde em seus olhos. Então, muito lentamente, ele balançou a cabeça. ― Nesse momento você pode acreditar nisso, mas eu não posso correr o risco de você mudar de ideia mais tarde. ― O som da porta fechando foi o único indicador de que ele havia se movido. Kira correu até ela, mas embora a maçaneta tenha girado, e ela empurrou contra a porta, ela não conseguia abri-la. Algo muito pesado devia estar do outro lado dela. Como ela fugiria dele quando ele se move tão impossivelmente rápido? Mais uma vez, a palavra ‘vampiro’ saltou em sua mente. Com todas as outras características que ela viu, essa parecia estar no topo da lista para o que seu sequestrador era. Então, novamente, não era suposto que os vampiros peguem fogo na luz solar? Ele não fez isso. Já havia amanhecido quando ele a levou do armazém, ainda assim seu sequestrador não havia sofrido nenhum efeito nocivo. Além disso, ela usava um colar com uma cruz, mas aquilo não tinha o impedido de pular sobre metade dos telhados de Chicago esta manhã, também. Isso fazia um enorme buraco em sua teoria ‘vampiro’. Alguma parte de Kira não podia acreditar que ela estava pensando em que tipo de ser sobrenatural que ele poderia ser. Nenhuma dessas coisas deveriam existir, muito menos sequestrá-la! Descrença lutou com a memória de tudo o ela que tinha visto. Mesmo se ela quisesse acreditar que sua longa noite sem sono a fez ver coisas que não eram reais, o seu estômago manchado de sangue e perfeitamente curado era um lembrete de que os seus olhos não estavam pregando peças nela. Ela não tinha imaginado a agonia de sua carne sendo rasgada tampouco. Ou a coisa fria que havia vazado por todos os seus poros, o sentido de desaparecer... e em seguida, o abrupto puxão de volta á vida a tempo de ver seu captor de cabelos escuros arrancando fora a cabeça de várias pessoas quando suas mãos ainda não tinham chegado perto delas. Não importa o que ele era, Kira decidiu. A coisa mais importante era ficar longe dele. Ela começou a rondar o quarto, ignorando o seu mobiliário de luxo. Não havia telefone que ela pudesse ver. Um banheiro em anexo carregado com todas as comodidades, nenhuma delas úteis para propósitos de fuga. Nenhum computador. Ela foi até a janela e encarou com frustração. Claro que


ela ficaria alguns andares para cima, sem uma varanda ou grade. Ela supostamente deveria estar grata por aparentemente não haver um fosso em torno da propriedade, ou lobos latindo ao redor do perímetro. Ela ainda estava em Chicago? Ou quando ela estava inconsciente, ele tinha conseguido levá-la para mais longe? Kira afundou na cama, tocando o tecido do edredom. Frank provavelmente não vai perceber que ela está desaparecida até mais tarde hoje a noite. Seu chefe sabia que ela tinha passado uma noite de tocaia, ele esperava que ela fosse dormir até mais tarde hoje. Tina também não iria tentar ligar para ela até mais tarde, e se Kira não responder, sua irmã iria apenas supor que ela estava trabalhando. Sua única esperança era que o sequestrador tenha deixado a mochila dela no armazém. A polícia definitivamente iria investigar o seu paradeiro, se eles encontrarem os seus pertences no local de um múltiplo homicídio horrível. Ele trouxe a mochila com ele quando a pegou? Ela não conseguia se lembrar. Sua mochila não estava nesse quarto, o que era tudo o que ela sabia. Kira puxou o edredom, querendo rasgá-lo por causa de sua frustração, mas com a sua espessura volumosa, ele provavelmente teria uns mil fios e, portanto, seria mais forte que uma corda. Tudo o que ela faria se o rasgasse seria quebrar várias unhas. De repente, Kira começou a sorrir. Improvisação é uma parte necessária do trabalho, Frank tinha dito isso a ela no seu treinamento para trabalhar como I.P. Ele estava certo sobre isso. Kira foi até o banheiro arrastando o edredom atrás dela.

***** Mencheres fechou seus olhos enquanto engolia. A carne quente pressionando sua boca, o doce pulso vibrando sob seus lábios. Uma nevoa de pensamentos prazerosos cobriu sua mente quando ele enfiou levemente suas presas de novo, mas os pensamentos não eram seus. Eles pertenciam a Selene, a humana de quem ele se alimentava. Sim, me morda novamente. Mais profundo. Ah, tão bom, não pare... Selene estremeceu com um êxtase que Mencheres não sentiu em séculos. Ele recuou depois do seu próximo gole, fechando os furos que suas presas haviam feito com uma gota de seu sangue, enquanto que a felicidade que ele tinha sentido tão brevemente se transformava em cinzas. A paixão da Selene era apenas devida a maneira hábil com que ele havia a mordido, combinando com a leve euforia induzida pelo veneno que todo vampiro tinha nas presas. Ele seria capaz de dar a ela orgasmos mentais arrasadores com sua mordida, se quisesse, mas qualquer vampiro poderia


despertar as mesmas sensações nela. Se a vida havia ensinado algo a Mencheres ao longo dos anos, era que ser um instrumento de prazer não era o mesmo do que ser realmente desejado. Uma vez ele teria zombado isso. Quando ele era um governante humano do Egito, era considerado uma honra compartilhar sua cama, e Mencheres tinha recebido muitas lá. Quando ele se tornou um vampiro, homens e mulheres se reuniram com ele na esperança de que ele fosse transformá-los em vampiros. Mais tarde o seu poder atraiu aqueles que procuravam proteção. Ao longo do tempo, ser sua amante era um símbolo de status entre os vampiros. Mesmo se Mencheres vivesse entre humanos, escondendo o que era, sua riqueza seduzia as pessoas ao seu redor. Depois de viver dessa forma por vinte e cinco séculos, até mesmo as diversões mais sensuais começaram a se sentirem ocas. Mencheres queria mais. Ele achou que tinha encontrado em Patra, a jovem rainha egípcia com quem se casou a dois mil anos atrás, mas aquilo tinha terminado em desastre. Naquela época, ele tinha sido ingênuo o suficiente para acreditar que ele poderia saciar a necessidade de Patra por poder, transformando-a em vampira, compartilhando sua vasta riqueza, e a ensinando os mais profundos e secretos segredos da sua raça, mas não foi o suficiente. Nada do que ele havia feito tinha sido o suficiente, e um pecado que ele cometeu a muito tempo resultou em Patra quase destruindo todos com quem Mencheres se importava, até ela finalmente ser morta ano passado. Quão deprimente como o pensamento era, cada um na sua vida tinha sido atraído para ele com alguma segunda intenção, mesmo aqueles em quem ele confiava. Mesmo aqueles que ele amava. Curiosamente, a única exceção era a humana presa no quarto do andar de cima. Kira tentou salvá-lo, agindo sem a influência de sua herança, status, poder, riqueza, ou carisma. Ela arriscou sua vida sem esperar qualquer coisa em troca. Ninguém Tinha feito uma coisa dessas para ele. Nunca. E como resultado do frustrado e irresponsável ato da Kira, combinando com a sua incapacidade de controlar a mente dela ou ouvir seus pensamentos, ele não tinha sido capaz de parar de pensar nela. Mesmo quando o dia terminou e ele mandou outro vampiro para entregar comida e bebida no quarto dela, Mencheres não podia bani-la de seus pensamentos. Kira. Em grego, seu nome significa ‘lady’2 ― . No celta, significa ‘dark’3 . Qual se encaixa melhor para ela? Sua aparência se encaixa nos dois nomes, seu rosto era delicado e bonito, exceto a mandíbula forte que advertia teimosia. Os olhos de Kira eram verdes pálidos, mas suas sobrancelhas eram escuras, combinando com o tom profundo de seu cabelo antes de se iluminar de ouro 2

Senhora. Treva. Como nós não traduzimos apelidos, vamos manter Dark Lady, mas a tradução seria Senhora das Trevas. 3


nas pontas. Seu cabelo era curto para o gosto de Mencheres, caindo um pouco acima dos ombros, mas era tão exuberante, grosso e ondulado, que praticamente o convidou a enrolá-lo em seus dedos. O corpo de Kira era outro contraste de feminilidade e força. Ela era esbelta ao ponto de ser delicada, mas ela mantinha a postura de um lutador, e seus ombros largos serviam apenas para ilustrar melhor seus fartos seios. Ela havia ajeitado aqueles amáveis ombros largos e aquela mandíbula teimosa quando ela rosnou para ele ficar longe de sua irmã. Mesmo embora Kira soubesse que ele não era humano, ela não hesitou em desafiá-lo sobre a percepção de ameaça para a sua família. Dark Lady, de fato. ― Sim, por favor! ― O choro arrancou Mencheres de seus devaneios. Deuses, ele estava acariciando Selene e inconscientemente enviando correntes de poder para acariciar e estimular suas terminações nervosas. Como ele poderia ter ficado tão perdido em seus pensamentos sobre Kira que ele tinha esquecido que ainda tinha Selene em seus braços? Mencheres puxou seu poder de volta e afastou Selene dele. ― Eu tomei tudo o que preciso. ― Ele disse a ela. Os olhos dela se abriram quando ela se pressionou contra ele. ― Deixeme te dar mais do que sangue. ― Ela ofereceu em uma voz rouca. ― Não, ― Mencheres respondeu automaticamente. Assim que ele pronunciou as palavras, ele se lembrou novamente que ele não precisa recusar. Sua esposa estava morta, então não haveria mais sentenças de morte para qualquer mulher que ele tomasse em sua cama. Se ele quisesse Selene, ele poderia tê-la. Mas era irônico, depois de queimar com constante luxuria pelo tempo em que varias civilizações existiram, agora, quando ele podia se permitir, ele não tinha o desejo. Selene era bonita, disposta, mas ele não a queria. O rosto de Kira pairava por sua mente, mas Mencheres apagou a imagem dela antes que ele pudesse se permitir pensar naquilo. ― Não, ― Ele repetiu a Selene em um tom que não admitia argumentação. Ela saiu depois de um último olhar persistente que ele fingiu não perceber. Selene, como todas as outras, não queria apenas a ele. Ela também queria o seu poder, segurança e o prazer sobrenatural que ele podia dar, mas de alguma forma durante o extenso e forçado celibato de Mencheres, aquele não era mais um acordo aceitável.


Selene tinha saído poucos minutos antes de Gorgon, o único vampiro que Mencheres trouxe com ele a esta casa, entrar na biblioteca. ― Criador, ― Gorgon disse. ― Nós temos um problema com a humana que você trouxe para casa esta manhã. ― Mencheres levantou, já caminhando até as escadas para o quarto de Kira, quando a voz de Gorgon o deteve. ― Ah, criador? Você pode querer ir para fora em vez disso. ―


CAPÍTULO TRÊS. Kira pendia para fora da janela em uma corda improvisada, lembrando-se com os dentes cerrados de não olhar para baixo. Ela tinha levado horas para amarrar a colcha, lençóis, cortinas e cortina de chuveiro juntos, até estar suficientemente longo para chegar até a base da casa. Então, ela fixou-o nos dois cantos da cama, esperando tensamente até depois do anoitecer, assim ela teria menos chance de ser vista. Levou mais de meia hora de conversa mental para que ela tivesse coragem de se levantar sobre o parapeito da janela, e ela teve um momento de puro pânico quando a primeira corda esticou sob seu peso. Mas a corda, a cama como âncora, e seus bíceps aguentaram. Lentamente, Kira avançou para baixo, enrolando a corda entre as pernas para retardar a sua descida. Você está indo bem, Kira disse a si mesma quando ela cuidadosamente começou a descer pelo lado da casa. Com sorte, ela estaria em segurança no chão em apenas alguns minutos. Se ela tivesse mais sorte, não levaria muito tempo para encontrar ajuda. Ela duvidava que ainda estivesse em Chicago, a julgar pela ausência de quase todas as casas ou construções num raio de visão, mas ela havia visto o que parecia ser outra casa além da linha das árvores ao norte. É onde ela tentaria primeiro — supondo que a corda ou a cama não quebrassem subitamente. Quando ela alcançou à borda abaixo de sua janela, Kira soltou um suspiro apertado de alívio. Um andar completo, faltam dois. Até agora, ninguém havia soado o alarme. Fingir ser uma cativa obediente foi trabalhoso, aparentemente. Ela até fingiu comer a comida e beber o refrigerante que o homem de cabelos loiros com a cicatriz que descia pela bochecha tinha trazido, mas na realidade, ela os jogou no vaso sanitário. De jeito nenhum ela estava arriscando ser drogada ingerindo essas coisas. Ela engoliu um pouco de água do chuveiro quando ela se lavou. Isso foi mais que suficiente para mantê-la hidratada e ela duvidou que eles fossem espertos o suficiente para ter drogado aquilo. Kira continuou descendo pela corda, surpresa por seus braços não ficaram trêmulos. Ela tinha perdido muito sangue esta manhã, mas por alguma razão, seus braços estavam firmes, sustentando seu peso com facilidade. Isso era incomum o suficiente para preocupar a Kira, mas ela resolveu se preocupar com isso depois. Tipo, quando ela estivesse longe desta casa e na delegacia mais próxima. Ela conseguiu descer outro andar, prendendo a respiração quando a corda a deixou pendurada diretamente na frente de uma janela. A luz interior brilhou contra o vidro, tornando o interior claramente perceptível a ela. Kira rezou para a escuridão de fora fazê-la quase invisível por contraste. Ela


levemente se balançou para longe do centro da janela, e desceu um pouco mais rápido. Ela deveria arriscar olhar para baixo para verificar o quão longe ainda estava? Não, Kira decidiu. Ela fez bem em chegar até aqui, considerando seu medo de altura. Não há necessidade de arruinar isso olhando para baixo agora. Quando Kira finalmente sentiu a terra firme sob seus pés, em vez de mais vazio e corda, ela quase gritou de alívio. Ela recolheu sua alegria, porém, puxando a corda à esquerda das janelas e prendendo-a no final com um vaso de plantas. Com sorte, ninguém iria encontrá-la até de manhã, e ela teria ido embora há muito até então. Kira começou a correr tão rápido quanto podia na direção onde ela pensou que tinha vislumbrado a outra casa da janela de seu quarto. Estava escuro como breu aqui fora, mas ela tinha certeza que ela estava indo na direção certa. Seu coração batia de alegria e euforia. Ela estava livre! Ela conseguiu correr quase vinte metros antes de bater num muro.

***** Mencheres tinha assistido Kira descer a casa com uma mistura de admiração e diversão. Ela certamente era uma mulher obstinada, fazendo uma corda feita de diversos materiais no quarto ― e eram laços da cortina de chuveiro que ela tinha usado como pontos de âncora para seus nós? ― Quer que eu vá buscá-la? ― Gorgon perguntou, sua voz muito baixa para Kira ouvi-lo. ― Não, ― Mencheres respondeu. Ele estava particularmente curioso para ver se ela ia conseguir descer todo o caminho até o chão. Se a corda se rompesse e ela se soltasse, ele poderia facilmente alcançá-la. Mas, entretanto, assistir a Kira manobrar para o lado da casa foi mais divertido do que qualquer coisa que ele tinha feito nos últimos vários meses. ― Você pode voltar para dentro, ― ele disse ao Gorgon, sua boca se contorcendo quando Kira delicadamente chutou para longe da janela. Ela estava sendo muito silenciosa para uma humana, mas é claro, com a audição dele, ela fez um alvoroço. Gorgon acenou uma vez antes de desaparecer para dentro de casa. Mencheres estava na parte mais escura do gramado, onde ele ficava invisível da visão de Kira, e continuou a observá-la. Ele ficou tenso quando a armação de cama que a corda foi amarrada rangeu em advertência, mas a corda dela aguentou. Quando Kira chegou ao chão, Mencheres sorriu junto com ela. Muito bem, Dark Lady.


Pena que ele não poderia deixá-la completar sua vitória por fugir, no entanto. Uma humana contando a policia histórias sobre criaturas sobrenaturais era a ultima coisa que Mencheres precisava. Radjedef iria apoderar-se disso como prova de que Mencheres tinha quebrado as suas leis. Radjedef. Que estranho que Mencheres não tinha pensado sobre o vingativo Guardião da Lei desde que deixou o armazém esta manhã, mas ele cuidaria dos assuntos relativos à Radjedef mais tarde. Primeiro, ele teria que apagar as memórias da Kira de tudo sobrenatural. Ele poderia passá-la para Gorgon ou outro vampiro em sua linha a hipnotizar, mas cuidar da Kira ele mesmo pareceu o mínimo que poderia fazer para retribuir a bondade que ela havia lhe demonstrado no armazém. Mesmo que agora ela lamentasse aquela bondade. Ele sempre poderia encontrar outra maneira de implementar o seu plano sobre Radjedef depois que as memórias da Kira sobre aquele armazém e ele tivessem ido. Mencheres não via Radjedef a mais de uma semana. Não precisava ter pressa, ele realizaria o seu plano em breve. Mencheres deixou Kira correr alguns passos antes de entrar na frente dela. Ela se chocou com ele com força suficiente para soltar um grito, mas ele absorveu o impacto como se ela fosse uma borboleta. ― São duas coisas corajosas, entretanto, tolas que você fez hoje, ― Mencheres observou. A respiração da Kira estava difícil, mas sua mira estava firme quando ela o socou diretamente no peito. ― Maldição! É você de novo, não é? ― Ele podia vê-la claramente no escuro, mas ela estava quase cega com a falta de luz no gramado. ― Sim, sou eu, ― Mencheres respondeu. Ele não comentou sobre o soco, apesar de não conseguir se lembrar da última vez que uma pessoa tinha realmente o atingido. ― Você estava me observando o tempo todo, não é? ― Kira exigiu. Amargura exalava dela, mudando seu perfume de limão e água do mar para algo mais áspero. ― Por quê? Você pensou que era engraçado, me vendo tentar fugir? ― Na verdade, para ele se divertiu, mas só porque ele sabia que ela nunca esteve em perigo real. No entanto, o desespero furioso no tom dela o fez parar. Ele podia saber que Kira não estava em perigo, mas ela não. Na verdade, ele não disse nada para realmente assegurá-la de que ela não tinha razão para temer, estando ela dentro da casa ou pendurada em uma corda fora dela.


― Eu peço desculpas. ― Mencheres deixou cair as mãos dos ombros dela, onde ele a segurou depois que Kira bateu nele. Ela não tentou fugir quando ele a soltou. Ela apenas permaneceu ali, ofegando e olhando para ele. ― Quem é você? E o que você pretende fazer comigo, desde que está claro que você não vai me deixar ir? ― Mencheres hesitou por um momento antes de dar de ombros mentalmente. Logo ele apagaria a mente dela. O que importava se enquanto isso ela soubesse mais sobre ele? ― A palavra moderna para o que eu sou é ‘vampiro’. ― O coração da Kira já estava disparado, mas com aquilo, ele pulou uma batida. ― Vampiros não existem, ― ela disse, embora ela tenha soado como se suas palavras fossem uma última tentativa de negação, em vez de uma verdadeira declaração de descrença. ― Isso é exatamente o que os humanos devem pensar, exceto que você já viu muito para se agarrar a essa farsa por mais tempo, ― ele respondeu com firmeza. ― Mas você estava fora na luz do sol, esta manhã, e a minha cruz… ― Mencheres estendeu a mão para tocar o emblema pendurado no pescoço de Kira. Simplesmente tocar em prata não iria machucá-lo. Seus efeitos de queimadura e enfraquecimento estavam adormecidos a menos que a prata rasgasse a pele de um vampiro. ― Os efeitos da luz solar, cruzes, estacas de madeira e água benta são pistas falsas deliberadamente plantadas por meu povo ao longo dos milênios. Nossa real fraqueza não é algo que nós permitimos ser de conhecimento comum. ― ― Prata, ― Kira disse. As sobrancelhas dele se ergueram. Ela não pôde ver isso, mas ela deve ter percebido a reação dele, porque ela deu de ombros. ― Isso deve ser o que os outros, ah, vampiros estavam usando em você esta manhã. As facas não se pareciam muito com aço, mas é claro, elas estavam tão sangrentas… ― Sua voz sumiu novamente e ela olhou para longe, mordendo o lábio. Em meio ao silêncio chocante de sua mente, ele pegou uma mudança de seu perfume em algo que refletia uma emoção que ele conhecia bem. Arrependimento.


Ela queria não ter intervindo para ajudá-lo nesta manhã. Mencheres não podia culpá-la, mas para sua surpresa, percebeu que ele estava realmente… magoado. Pelos deuses, ele estava realmente triste com o que uma estranha pensou dele? Ele tinha mais de quarenta e cinco centenas de anos de idade! Talvez realmente estivesse na hora de ele deixar esse mundo. Antes que ele manifestasse outras formas do que deveria ser senilidade4 dos mortos-vivos. ― Aqueles outros homens não eram vampiros, ― Mencheres corrigiu friamente. ― Eles pertencem a outra raça conhecida como ghouls, ou carnívoros. ― Soou como se Kira tivesse engasgado. ― Esta manhã eu andei com ghouls, que comem carne, cortando um vampiro que bebe sangue. É isso que você está me dizendo? ― ― Sim. ― Agora medo afiou o cheiro de Kira, e um tremor fino passou por seus membros, mas sua coluna ficou reta. ― É por isso que você está me mantendo aqui? Para beber o meu sangue? ― Mencheres não conseguia parar de olhar para a sua garganta com seu pulso tentadoramente rápido antes de responder. ― Não. Eu disse a você ― você não tem nada a temer de mim. Eu já teria devolvido você para sua casa, exceto que eu não posso apagar o seu conhecimento sobre essa manhã ainda. Assim que o meu sangue tiver deixado o seu sistema, e eu puder limpar sua mente, você será liberada. Até então, você estará ilesa. Eu te dou minha palavra. ― Aquele tremor diminuiu, mas a sua pulsação não. ― Isso é como um sonho ruim, ― Kira sussurrou. ― Você pode prometer que não me prejudicará, mas outra pessoa me trouxe o jantar, e eu suponho que ele não era humano, também. Se você fala sério quando diz que não quer me prejudicar, você tem que me deixar ir. Se não, eu só estou segura até que um dos outros vampiros à minha volta tenha um apetite. ― Mencheres não conseguia impedir o bufo que lhe escapou. ― A minha palavra é lei entre o meu povo. Ninguém se atreveria a te tocar sem a minha permissão, e eu proibi expressamente. Você está completamente segura de qualquer um que tiver um ― apetite ― em torno de você, Kira. ― Ela ficou em silêncio por vários instantes. Mencheres se concentrou na mente dela, mas ela permanecia frustrantemente evasiva para ele. O cheiro 4

Caduquice.


dela oscilou entre desconfiança e choque, embora, dizendo-lhe tanto sobre sua luta interna para digerir essa informação como seus pensamentos provavelmente diriam. A aflição da Kira era esperada. Considerando que ela tinha começado o dia sem saber nada sobre as criaturas que existiam à parte da humanidade, em seguida tinha sido quase assassinada por algumas daquelas criaturas e agora foi detida contra sua vontade por outras, ela tinha mostrado uma força notável. Mencheres tinha visto líderes de nações reduzidos ao choro incoerente sob circunstâncias menores. ― Mesmo que minha vida não esteja em perigo, eu não posso apenas ficar aqui esperando minha memória ficar maleável novamente, ― Kira disse por fim. ― Eu tenho um trabalho, e, ah, outras responsabilidades muito importantes. Por favor, não entenda mal, estou mais do que aliviada que você não está pretendendo me comer, mas eu não posso apenas sumir por vários dias. Se você me deixar ir, eu irei para casa, eu não vou soprar uma palavra a ninguém sobre nada disto. ― ― É para lá que você estava pretendendo ir quando você fugiu esta noite? ― Mencheres perguntou, estendendo a mão para parar Kira quando ela começou a virar. ― E não minta para mim novamente. ― O rosto da Kira corou quando ela encontrou o seu olhar. ― Eu estava indo para casa de seu vizinho mais próximo para chamar a polícia, ― ela respondeu suavemente. Mencheres tirou a mão do rosto dela. ― E é por isso que eu não posso deixar você ir, enquanto você se lembrar de qualquer coisa que você tenha visto. ― ― Mas isso foi antes, ― Kira disse insistentemente. ― Quando eu ainda pensava que você ia me matar, então sim, a polícia parecia ser minha melhor opção. Mas você provou que eu não posso fugir sem que você saiba, e você pode claramente me dominar a qualquer momento. Eu não consigo imaginar você se esforçando tanto para mentir para mim se você tivesse somente a intenção de me matar. E se você não vai me matar, então você não deve ser o insaciável assassino que a lenda descreve, então eu não preciso alertar a humanidade sobre você. Sim, você matou aquelas pessoas que estavam te torturando, mas isso é um homicídio justificável em qualquer tribunal, por isso não há necessidade de dizer nada a ninguém. ― O tom de voz da Kira cresceu com a sua agitação, e seu pulso acelerou novamente. Mencheres não disse nada, sabendo que ela estava tentando conciliar os fatos em voz alta, mais do que qualquer outra coisa. Sempre era assustador para os humanos quando se davam conta que sua crença na


superioridade da sua raça era falsa. Quando percebem o quão vulneráveis eles realmente são para as outras espécies que dividem o escuro com eles. ― Além disso, ― ela disse, finalmente, soltando a palavra em um áspero suspiro. ― Não importa a quantas pessoas eu diga, quem acreditaria em mim? Eu nunca acreditei em qualquer cliente que costumava falar de coisas estranhas e impossíveis, e eu ouvi mais do que algumas dessas histórias sendo uma investigadora privada… ― Os olhos de Kira se arregalaram justamente quando ela parou de falar no meio da frase. Mencheres não podia ouvir os pensamentos que se formavam em sua mente, mas pela sua expressão, ela estava percebendo que algumas das histórias que ela sumariamente ignorou podem ter sido verdade. Então ela olhou em volta do pátio escuro, como se estivesse enxergando-o com novos olhos, ela suspirou. Mencheres olhava com pena, sabendo que era o momento que a Kira realmente aceitava que tudo isso era real. A pequena parte dela que ainda esperava que houvesse outra explicação, finalmente desistiu. Ele observou esta mesma aceitação em humanos antes, vezes demais para contar, e embora Kira pudesse acreditar que poderia voltar à sua vida normal com essa informação, Mencheres sabia que ela não poderia. ― Você não quer esse conhecimento, ― ele disse, sua voz calma, porém firme. ― Isso vai destruir a sua vida. Você vai ver todas as sombras de uma maneira diferente, e cada som estranho vai te fazer pensar -- é que uma pessoa, ou um monstro? Humanos que não fazem parte da linha de um vampiro ou ghoul não ficam bem com essa informação. O tempo provou isso repetidamente. ― O que ele não disse a Kira era que o tempo também mostrou que tais humanos normalmente acabavam mortos. Eventualmente, aqueles mortais tentam fazer com que alguém acredite neles sobre o mundo sobrenatural, e um humano sem dono espalhando contos sobre os mortos-vivos era uma ameaça para ambas as espécies. Tanto vampiros quanto ghouls reivindicam um certo número de humanos como propriedade, mas esses humanos são especialmente escolhidos, em seguida, retirados de seu próprio mundo. Eles vivem com seus protetores mortos-vivos, com pleno conhecimento de que se espalhassem o segredo sobre qualquer espécie para a sociedade em geral, eles serão eliminados. Tal conhecimento não tranquilizaria Kira, então, Mencheres o manteve para si. Ele realmente não a queria saindo pelas janelas no futuro. ― Você vai me deixar ir ilesa? ― Ela perguntou finalmente, parecendo chegar a uma decisão.


― Assim que remover essas memórias da sua mente, ― Mencheres prometeu. Ela lhe deu um olhar calculado. ― Vou precisar ligar para o meu patrão, dar alguma desculpa sobre a falta no trabalho. Eu não posso me dar ao luxo de ser demitida. ― ― Eu vou cuidar para que sua situação no trabalho seja resolvida. ― Mas Mencheres não a deixaria ligar para o seu patrão, mesmo sob o seu olhar atento. Kira trabalhava para um investigador particular, a linha pode ser rastreada, ou ela pode usar palavras em código indicando perigo que Mencheres pode não reconhecer. Ele gostaria de acreditar que Kira não faria uma coisa dessas sob sua nova aceitação, mas ele estava cansado de confiar na esperança. ― Preciso ligar para a minha irmã. ― Sua voz endureceu, diferente de quando ela falou do seu trabalho. ― Ela não está bem. Não posso deixar que ela se preocupe com meu desaparecimento sem lhe dizer algo. ― Mencheres inclinou a cabeça. ― Vou tomar providências para que você possa falar com ela amanhã. ― Kira respirou fundo e suspirou lentamente. ― Tudo bem. Quanto tempo deve demorar até que você possa apagar minhas memórias? ― Ele calculou mentalmente a quantidade de sangue que tinha dado a Kira. Foram vários goles pelo menos, e seu sangue era muito potente. ― Alguns dias no mínimo, uma semana no máximo. ― Ela estremeceu, mas não respondeu. Novamente, Mencheres ficou impressionado com a sua força. Kira tentou fugir e havia argumentado varias vezes com ele para deixá-la ir, mas ela não implorou ou ficou histérica. Que tipo de pessoa ela era, para ficar tão incomumente forte considerando as circunstâncias tão difíceis? Se ele ainda tivesse suas visões, ele poderia ver o futuro e saber exatamente que tipo de pessoa Kira era. Nada revelava mais o caráter do que ver o culminar de uma vida inteira de decisões acertadas. Mas Mencheres não podia mais ver o futuro. Ele recolheu o seu flash de raiva imediato com aquilo. Reclamar com os deuses sobre o que eles lhe deram ― e depois tomaram de volta — era inútil. ― Tudo bem, ― Kira disse mais uma vez, trazendo a atenção dele para ela. ― Eu não posso acreditar que eu vou passar uma semana com vampiros, mas… tudo bem. ― Mencheres escondeu um sorriso, seu humor ficando mais leve quando ele viu a maneira irônica que Kira balançou a cabeça. Ela não era a única pessoa


surpresa com esta mudança recente de acontecimentos. Uma parte dele também não conseguia acreditar que acabara de se comprometer a estar confinado em casa com a mesma humana que tinha arruinado seus planos esta manhã. ― Você está pronta para entrar agora? ― Mencheres perguntou, oferecendo-lhe o braço. A boca da Kira se contorceu enquanto ela tomava o braço dele depois de um momento de hesitação. ― Eu acho que sim. Diga-me, vampiro, qual é seu nome? ― O que era mais uma coisa para apagar da mente dela? ― Mencheres. ― ― Soa espanhol, ― ela murmurou, olhando para ele o máximo que pôde no escuro. ― Egípcio ― . Outro detalhe que ele teria que apagar dela depois. O que havia na Kira que o tornava tão incomumente falador? ― Ah. ― Ela sorriu então, o primeiro sorriso que ele viu, que não parecia forçado. ― Então, Mencheres o vampiro Egípcio, você é realmente velho, ou você é tão jovem quanto parece? ― Ele lhe deu um olhar de lado enquanto começava a andar de volta para casa, sentindo uma estranha angústia ao perceber a diferença de idade entre eles. ― Eu sou mais velho que a poeira, ― ele respondeu indiferentemente. ― Um vampiro com um senso de humor. Eu realmente não sabia que existia, ― ela brincou com a mesma indiferença. Mencheres não respondeu. Primeiramente, ele estava dizendo a ela coisas que ele não tinha motivo para revelar, agora ele estava brincando sobre sua idade. Que estranho. Ele pensou que seu senso de humor tinha acabado há muito tempo. ― Acho que colocar aquele quarto no lugar vai me dar algo para fazer pelas próximas horas, ― Kira observou com um suspiro. ― Isso não é necessário, você vai… ficar em outro quarto. ― Mencheres quase tropeçou quando ele conteve as palavras que quase haviam saído da sua boca: Você vai ficar no meu quarto. O que o possuiu para se quer pensar uma coisa dessas? Ele não tinha encontrado o seu senso de humor ― ele tinha perdido a cabeça. Senilidade dos mortos-vivos. Não havia muitos vampiros sobrando, que fossem mais velhos do que ele. Talvez isso fosse uma doença, no final das contas.


CAPÍTULO QUATRO. Kira acordou com seu coração martelando, seus braços se debatendo contra um atacante que não estava lá. Por vários segundos de pânico, ela não conseguia distinguir a realidade contra a imagem daquela coisa abrindo sua barriga. Então ela caiu nos travesseiros, ofegando. Apenas um pesadelo, é apenas um pesadelo. Exceto que, era mais que isso. Kira forçou sua respiração a se acalmar enquanto ela contava decrescendo de trinta. Quando ela alcançou o um, o seu coração já havia desacelerado e ela não estava mais arfando. Outra sessão de contagem cuidou da tremedeira das mãos dela. Na terceira sessão Kira conseguiu sair da cama sem ter constantes imagens do rosto do ghoul bombardeando sua mente. Ele está morto, ele não pode mais machucar você, ela lembrava ela mesma disso firmemente. Até porque, apesar das circunstancias serem diferentes, essa não foi a primeira vez que alguém atacou ela, mesmo assim ela sobreviveu. Essas terríveis memórias podem aparecer novamente nos seus sonhos, mas ela não iria dar ao fantasma do seu atacante ― nenhum deles ― poder sobre ela enquanto ela esta acordada. E logo, a sua memória desse recente ataque seria apagada, cortesia de um estranho, formal, e mortalmente poderoso vampiro chamado Mencheres. Entre todos os ataques que ela tinha que tropeçar no caminho do seu apartamento, quem acreditaria que ela esbarraria em uma criatura envolvente que não deveria existir? Ninguém, Kira pensou amargamente. Inferno! Ela viu, estava vivendo a prova disso com seu estômago milagrosamente curado, e mesmo assim ela estava tendo dificuldades em captar que tudo isso era real. Vampiros. Ghouls. Que outras criaturas que não deveriam ser reais existem? Kira estremeceu. Talvez Mencheres estivesse certo. Ela provavelmente viveria uma vida muito mais feliz se ela não se lembrasse de nada disso. O estranho era que ela esperava sair disso viva. Depois do acordo deles na noite anterior, Kira acreditou em Mencheres quando ele disse que iria deixála ir. Poderia ser parte da sedução dos vampiros, mas todos os instintos de Kira diziam que Mencheres era confiável, e os instintos dela nunca erravam ― mesmo quando ela desesperadamente queria que eles estivessem errados. Vampiros que não matavam pessoas inocentes. É uma revelação quase tão inacreditável quanto a existência de vampiros. Ghouls pareciam ser espécies muito mais cruéis, ao menos pelo o que Kira viu. O que aquelas criaturas fizeram com Mencheres foi horripilante, e eles certamente não


mostraram nenhuma misericórdia com ela. Se Mencheres não tivesse parado eles, e então a curado, ela não duraria cinco minutos depois de ter entrado naquele armazém... Kira congelou no meio do caminho até o banheiro quando uma pergunta que estava enterrada em uma avalanche de choque finalmente veio à tona em sua mente. Se Mencheres podia parar aqueles ghouls tão facilmente, porque ele não fez isso antes dela chegar?

***** Mencheres sentiu Gorgon se aproximar antes da sua imagem aparecer através da neblina da água acima dele. Ele deu um sinal mental enquanto se levantava da sua confortável posição no fundo da piscina. Ficar em baixo na água era um dos raros momentos que ele podia aproveitar um silêncio aparente. As camadas da água diminuíam os sons dos mortais na casa, e ficar enclausurado nela se tornou um tipo de meditação. ― Criador, ― Gorgon disse, assim que Mencheres submergiu. ― Sua humana está pedindo para falar com você. ― O olhar de Mencheres moveu-se rapidamente de Gorgon para Kira cuja expressão dizia que ela não tinha se importado com o termo ― sua humana ― . Mais uma vez, Mencheres sondou a mente de Kira, e novamente, ele se deparou com um forte muro. A limitada pista de confusão passava pela sua fragrância, mas as confusas, impressionantes barreiras que o impediam de ouvir os pensamentos de Kira tão facilmente quanto ouvir as batidas do coração dela ainda estavam lá. ― Traga-a para frente, ― Mencheres disse, balançando seus braços contra o lado da piscina. ― Vidros pintados, ― foram as primeiras palavras de Kira assim que Gorgon indicou que ela prosseguisse. ― Eu pensei que você tinha dito que vampiros não tinham aversão à luz do sol? ― Mencheres olhou ao redor da área coberta da piscina com um leve dar de ombros. ― A luz do sol não nos machuca como as lendas alegam, mas uma exposição prolongada drena nossa força, e nós temos tendência a nos queimar com facilidade. ― Porque eu estou explicando isso para ela? Ele se perguntou em seguida. Toda palavra que ele pronunciar para Kira iria apenas ser apagada da memória dela futuramente. Era tão sem sentido quanto falar com o vento.


Ela se sentou a alguns passos da borda da piscina, dobrando suas pernas embaixo dela como se estivesse em um piquenique. ― Por que não tem paredes de verdade em volta da sua piscina? Blocos de concretos evitam bem mais a luz do sol do que vidros opacos. Mencheres deu um pequeno, e severo sorriso. ― Porque às vezes eu gosto das coisas sem levar em consideração se elas me beneficiam ou não. ― Falar com Kira era mais uma dessas coisas que não o beneficiavam e que ele parecia apreciar, porque aqui estava ele, ainda respondendo as perguntas dela, apesar de não ter nenhum sentido nisso. Kira inclinou a cabeça, a abafada luz do sol iluminava o dourado no cabelo dela. Ela estava usando calça jeans e uma blusa de gola que era um pouco apertada demais. Mencheres fez uma nota mental para arrumar mais roupas para Kira enquanto ela ficasse. Ela estava usando uma das roupas de Selene agora, mas os seios de Selene não eram tão generosos quanto os de Kira. O olhar de Mencheres demorou-se nos peitos dela até que Kira cruzou os braços sobre eles com uma irritação óbvia. Ela deu a ele um olhar penetrante enquanto os olhos dele viajaram para cima para encontrar os dela. Ele olhou para longe, quase rindo do seu inesperado abuso. Quantos séculos se passaram desde que ele foi pego cobiçando os seios de uma mulher? Os seios vestidos de uma mulher, na verdade. O seu co-regente, Bones, iria fraturar uma costela rindo se ele soubesse. ― Algumas coisas não devem mudar nunca, ― Kira murmurou sobre sua respiração. Mencheres se encontrou sorrindo. ― Parece que não. ― Kira passou uma mão no seu cabelo, dando a ele mais um feminino, e desaprovador olhar antes da sua expressão ficar séria. ― Por que você não parou aqueles ghouls ontem antes de eu aparecer? Você ― ― ― Quieta, ― Mencheres disse instantaneamente. Gorgon saiu de vista, mas ele ainda podia escutá-la. ― Eu pensei sobre isso, mas não faz sentido, ― Kira continuou, ignorando completamente a ordem dele para ficar calada. Por um segundo de surpresa, Mencheres não soube como reagir. Devem ter passado séculos ao menos desde que um humano ousou ignorar suas ordens. ― Você nem precisou tocar neles para ― uou! ―


Ele saltou da piscina para fisicamente impedir Kira de pronunciar outra maldita frase colocando seu dedo na boca dela. Água pingando nas roupas dela, e seus pálidos olhos verdes se arregalaram enquanto ele se aproximava dela. ― Nunca fale sobre isso novamente, ― Mencheres disse, sua voz suave, mas dura. Ele não podia hipnotizá-la para que ficasse em silêncio, mas se precisasse, ele iria amordaçar Kira para que Gorgon não descobrisse sobre o frustrado plano de Mencheres com os ghouls de ontem. Os batimentos cardíacos dela se aceleraram no momento que ele pulou da água, e continuaram elevados quando ela tirou os olhos do rosto para o resto do corpo dele. Então ela arfou. A sua respiração quente vibrou contra o dedo que ele manteve segurando os lábios dela. Kira arfou novamente enquanto seu olhar ia dos ombros até os pés dele, e então se fixou em um ponto no meio das pernas dele. Abruptamente, o humor sombrio de Mencheres por ela quase contar seu segredo, mudou para divertimento quando Kira parecia não ser capaz de afastar o seus olhos.

***** Quando o vampiro saiu da água para se agachar em frente a ela, o primeiro pensamento de Kira foi, Uh-oh . Ela nem viu ele se mover antes de ficar em cima dela, os olhos negros queimando com advertência, água pingando nela. Aquele único dedo nos lábios dela foi como um mini martelo, e Kira se lembrou que na cadeia alimentar, ele era o predador, e ela era a presa. Ele realmente não gostou desse tópico, então eu vou ficar quieta agora, foi sua decisão lógica. Então ela olhou para baixo ― e esqueceu o que ela ia perguntar para ele. Gotas de água acariciavam o mais duro, firme corpo que ela já viu. O peito, os braços, e a barriga de Mencheres eram cobertos com o mais intrigante padrão de músculos que pareciam muito perfeitos para serem reais. A sua pele clara apenas enfatizava o quão preto o cabelo dele era, pingando em rios negros até os seus ombros. Em algum momento ontem, ele cortou as partes desiguais, então estava no mesmo comprimento agora. O olhar dela se arrastou para mais baixo, revelando que as pernas dele eram tão deliciosamente esculpidas quanto o resto dele. Nada interrompeu a visão dela da firme, e ondulada carne dele, porque Mencheres estava nadando nu. Kira estava surpresa em ver que ele não tinha pelo em nenhum lugar, mesmo no meio das suas coxas... Os olhos de Kira se fixaram ali, se aumentando. Ai. Meu. Se o vampiro ainda não estivesse com o dedo nos lábios dela, ela os teria lambido por reflexo.


― Algumas coisas não devem mudar nunca, ― uma voz profunda registrou, enquanto o dedo dele deixava os lábios dela para levantar seu queixo. Kira relutantemente moveu seu olhar para encontrar os olhos escuros de Mencheres. Eles estavam desprovidos da antiga raiva, e os cantos da sua boca se retorciam. Sua mente distraída finalmente traduziu que ele repetiu a observação restritiva que ela fez mais cedo, e ela riu. ― Culpada, ― ela admitiu, resistindo à urgência de olhar para baixo novamente. Sem duvidas o vampiro não usava um short de natação. Ele sorriu enquanto se sentava. ― Alguém poderia dizer que eu sabia que isso aconteceria. ― Ele se virou, puxando uma toalha branca de uma cadeira que estava próxima e colocou ao redor do seu quadril com uma casual falta de pressa que dizia que a ação era mais por educação do que por modéstia. Kira balançou a cabeça levemente. Pelo menos agora com ele coberto da cintura para baixo, ela poderia ser capaz de manter sua linha de pensamentos. Claro, sua linha de pensamento inicial foi o que o fez se jogar para fora da piscina para silenciar ela. Alguma coisa sobre ontem deixou Mencheres tão assustado, que ele se recusou a discutir isso com ela. Foi simplesmente porque ele esteve tão perto de ser comido por ghouls? Ele não quer se lembrar de quão indefeso ele ficou? Ele não parecia envergonhado por isso ontem quando ela acordou pela primeira vez, mas talvez isso tenha mudado. Uma reação traumática atrasada, ou algo familiar. Ela já experimentou isso antes. De qualquer maneira, era claramente um assunto delicado, e mesmo que todos os seus instintos investigativos estivessem queimando de curiosidade, ela preferia sua liberdade. Estava claro que se manter de bem com Mencheres estava diretamente relacionado com ele deixar ela ir, então ela deixou para trás o assunto da confusa falha dele para conseguir sua liberdade mais cedo. Voltar a sua vida era mais importante do que descobrir porque um vampiro assustador e poderoso tinha quase morrido nas mãos de vários ghouls que ele tinha matado mais tarde sem nem ao menos ter tocado neles. ― Você disse que eu podia ligar para minha irmã, ― Kira o lembrou, mudando de assunto. Ele se levantou com a mesma rapidez e graça que todos os seus movimentos pareciam ter. ― Sim eu disse. Venha. ― Mencheres ofereceu sua mão e Kira a pegou, deixando-o puxá-la até ficar em pé. Ela olhou para sua blusa e calça emprestadas, sentindo elas se aderirem a ela nos lugares que a água da piscina do Mencheres tinha pingado.


Ele ofereceu a sua toalha sem a mínima hesitação, sendo que era a única coisa cobrindo-o. ― Por favor, use isto. ― Assim como quando ela estava pendurada pela corda do lado de fora da casa, Kira disse a si mesma para não olhar para baixo. ― Ah, não obrigada, eu acho que você precisa mais disso do que eu. ― A boca dele se retorceu de novo, como se ele estivesse lutando para esconder um sorriso. Kira sentiu aquele toque de surrealismo mais uma vez. Ela não podia realmente estar próxima a uma piscina perto de um vampiro nu, que estava oferecendo a ela a sua toalha para que ela possa secar sua blusa e jeans úmidos, ela podia? Muito do que aconteceu nas últimas trinta-e-algumacoisa horas parecia um sonho. Tudo que ela precisava para fazer esse cenário mais inacreditável seria ter duendes dando cambalhotas enquanto saiam do jardim mais próximo. Ou então, o lindo e desnudo vampiro dar a ela uma massagem sensual enquanto a alimentava com uvas descascadas. Então ela saberia que isso era um sonho. Mas por Mencheres estar amarrando a longa toalha de volta na sua cintura ao invés de jogá-la no chão enquanto ia atrás de frutas e óleos aromatizantes, Kira supôs que isso era a realidade. Uma bizarra, às vezes assustadora, às vezes excitante realidade, mas de qualquer forma realidade. E as memórias dela sobre isso serão apenas temporárias. De certa forma, essa é a parte mais estranha de toda essa coisa. Como ela pode simplesmente não lembrar de nada disso em uma semana? Não sobraria nenhum conhecimento prolongado? Como, ela experimentando algum déjà vu toda vez que ela visse um filme de vampiros no futuro? ― Não há necessidade de você ficar preocupada, ― Mencheres disse serenamente. ― Sua vida irá continuar sem efeitos nocivos dessa experiência. ― ― Você consegue ler minha mente agora? ― Kira perguntou, sentindo seu constrangimento crescer. ― Porque se você conseguir, sobre aquela massagem... ― A sobrancelha dele se levantou. ― Eu ainda não consigo ler seus pensamentos, mas seu cheiro e expressão me permitem supor que você estava pensando sobre seu futuro. Eu gostaria, de qualquer forma, de ouvir sobre a massagem. ― ― Eu tenho , hum, estou com uma dor no meu ombro, ― Kira disse, desviando o olhar. Uma leve risada, ― Os humanos emitem um odor distinto quando eles mentem, e você, Kira, cheira desse jeito agora. ―


Kira se virou com um olhar de desafio. Ele quer a verdade? Tudo bem, então. Mencheres pode ser um poderoso vampiro; mas ela é uma mulher crescida, então ela não vai agir como uma tímida, virgem cega. ― Morto ou não, você deve estar entediado com as mulheres dizendo como você parece com o mais quente, mais exótico sonho molhado que elas já tiveram. Sem duvidas o pensamento de você, uvas, e alguns óleos aromáticos passaram pela minha mente ― e se você derrubar essa toalha novamente, eu vou precisar de um banho frio. ― Kira esperava um sorriso presunçoso em retorno. Talvez um olhar sagaz e uma piscada, também. Mas a expressão de Mencheres podia apenas ser descrita como... surpresa. Então se tornou cautelosamente vazia. ― Você não sabe nada sobre mim. ― Ela se endureceu. Esse era o jeito dele de falar que ela era superficial? Oh por favor, ele ficou se exibindo andando por ai pelado ― e agora ela é vulgar porque ela reparou nele? ― Não se preocupe. Eu acho o Monte Everest fabuloso também, mas isso não significa que eu tenha intenção de escalar ele. ― ― Eu não entendi essa analogia, ― Mencheres murmurou. Kira deixou escapar um suspiro. ― Vamos apenas manter esse assunto na mesma categoria de ― não discutir ― na qual você quer deixar suas ações de ontem. ― Pontos verdes reluziram nos olhos cor de carvão dele, lembrando Kira de que o que ela disse era como puxar a calda de um tigre. Mas por um estranho motivo, Kira não estava com medo de Mencheres. Ele podia ser um predador que a mataria com uma facilidade cómica, mas Mencheres também possuía uma áurea de completo controle sobre ele. Mesmo quando ele pulou da piscina para silenciar ela, ela ficou assustada, mas cada instinto dizia que ele não quebraria sua promessa de não machucá-la. Mesmo assim, se ele não tivesse dado sua palavra sobre isso, Kira estaria apavorada com ele. Toda aquela incrível habilidade combinada com uma força de ferro fazia Mencheres mais do que mortal ― praticamente fazia dele uma força da natureza; Alguém que pode arrancar as cabeças das outras criaturas sobrenaturais sem usar as mãos, que pode curar o machucado letal dela, pode voar, e fazê-la se esquecer de que tudo isso aconteceu? Mencheres pode não amedrontá-la como ele deveria, mas saber que um poder como esse existe é assustador. E se todos os vampiros puderem fazer as mesmas coisas que ele faz, mas se eles não forem tão disciplinados sobre matar humanos como


Mencheres? Os ghouls ontem fariam almoço deles, então certamente, nem todos os sobrenaturais operam sobre um restrito código de moral. Aqueles casos de pessoas desaparecidas com historias estranhas, ligadas a eles brotaram na mente de Kira. E se esses desaparecimentos não fossem apenas ligados a uma atividade humana sinistra, mas a alguma outra coisa? Kira levantou o olhar para ver Mencheres a estudando com uma intensidade palpável. Ele estava tentando ver dentro da mente dela novamente? Ele estava tendo sucesso? Ela quase esperou que ele estivesse. Se ele pudesse ler os pensamentos dela, então apagar a memória dela não podia demorar muito, o que significaria que ela poderia ir para casa. ― Alguma sorte nisso? ― ela perguntou. Ele piscou uma vez antes de se virar. Um escudo invisível pareceu cair sobre ele, cobrindo-o com indiferença como se fosse um terno de três peças. ― Eu não ouço nada. ― Droga. ― Deixe-me ligar para minha irmã, então. E não se preocupe ― você não precisa me lembrar de não dizer nada a ela sobre vampiros. ―


CAPÍTULO CINCO. Kira passeou pelo seu quarto. Tina não tinha respondido quando ela tentou ligar mais cedo, ela só poderia estar fora, mas e se algo aconteceu e sua irmã estava muito mal para pegar o telefone? Kira debateu internamente sobre pedir ao Mencheres para enviar o Gorgon de volta ao apartamento da Tina, para checá-la. De acordo com Mencheres, o vampiro loiro já estava passando em seu escritório hoje para manipular a mente de Frank para acreditar que Kira estava impossibilitada de ir ao trabalho por causa de uma gripe. Kira duvidava que o vampiro poderia fazer seu patrão teimoso aceitar que ela de repente tirasse uma semana de folga, mas Mencheres parecia confiante nas habilidades de Gorgon. Seu instinto não sentia nenhuma ameaça vinda de Gorgon, assim como não sentia com Mencheres, mas talvez isso fosse parte da camuflagem natural de um vampiro. Nada ajuda mais aos predadores do que sua presa pensar que eles são inofensivos. Kira não estava disposta a se arriscar expondo sua irmã a um vampiro, mesmo que Gorgon fosse inofensivo e que aliviaria muito a mente dela se Gorgon relatasse que Tina estava bem. Ela só tem que tentar ligar para a sua irmã mais tarde. Mencheres não parece ser tão cruel ao ponto de só permitir que ela faça uma ligação, independentemente se ela tenha falado com a Tina ou não. Para um sequestrador morto-vivo, na verdade, Menchers estava começando a ser bastante complacente. Ele disse a Kira que ela poderia andar livremente pela casa, piscina e jardim ao redor ― enquanto ela não tente fazer qualquer ligação, e-mails, mensagens de textos sem supervisão, ou tentar fugir novamente. Suas algemas eram revestidas de veludo, aparentemente. Que estranho. Ela esteve em circunstâncias de cativeiro mais duras quando ela era casada. Kira descartou a ideia tão rapidamente quanto tinha chegado. Esse capítulo da sua vida foi encerrado, e tudo o que ela viu na década desde então simplesmente servia para reforçar que ela fez a única coisa que podia. Sobreviver. Às vezes não era nobre ou bonito, mas necessário. Seu estômago roncou, lembrando Kira que ela só tinha uma banana no café da manhã e não comeu nada no dia anterior. Mencheres disse para se servir de tudo que estava na geladeira, realmente soando constrangido, quando ele disse que ela teria que preparar seu próprio alimento. Algemas de veludo, de fato. Kira saiu do quarto, indo para a cozinha. Hora de ver se Mencheres quis dizer isso quando ele disse que ela teria liberdade de andar pela casa.


Ela desceu as escadas, parando no patamar do segundo andar. Seu quarto era no terceiro andar, e apesar de ter mais duas portas no seu corredor, ela não tinha escutado qualquer outra pessoa em seu andar. Se Mencheres estava lá em cima, ele era muito silencioso. Ou o seu quarto era no segundo andar? Além dela, Gorgon e Mencheres, ela não tinha visto qualquer outra pessoa na casa. Eles eram os únicos aqui? Em caso afirmativo, porque Mencheres precisa de um lugar tão grande assim, se fosse normalmente apenas ele e Gorgon? E Mencheres não era a pessoa mais sentimental de todas, ou talvez não vivesse aqui muito tempo. A casa não tinha fotos pessoais ou lembranças que Kira tenha visto, e tinha aquela fria perfeição de casa modelo, que dizia que era habitualmente vazia. Se esta não era a casa principal de Mencheres, porque ele estava aqui agora? E onde ele mora, quando não está aqui? Risadas chamaram a atenção de Kira para longe da curiosidade sobre seu sequestrador misterioso. Ela tinha distintamente uma melodia feminina, corrigindo a suposição de Kira que ela, Mencheres e Gorgon eram os únicos na casa. Kira desceu o último lance de escadas quase que cautelosamente, ouvindo uma risada masculina em seguida. Uma pontada peculiar passou por ela. Aquele era o Mencheres? Se sim, quem era a mulher com que ele estava rindo? A namorada dele? Ou esposa, talvez? O vampiro não usava aliança de casamento, porém quem sabia se isso significava alguma coisa? Talvez vampiros não trocassem alianças. Kira ajeitou os ombros e seguiu os sons. Pelo menos ele vinha de onde ela já estava se dirigindo ― a cozinha. Não havia necessidade de desculpas para ir para lá, a barriga roncando explicaria sua presença. Mas quando Kira pegou o primeiro vislumbre das pessoas aglomeradas em torno da pequena mesa, ela não reconheceu nenhuma delas. A conversa parou quando Kira entrou, e eles olharam para ela. A partir dos alimentos em frente a eles, Kira presumiu que os dois homens e a mulher eram humanos. Mais testemunhas mantidas contra sua vontade? Kira se perguntou. Bom Senhor, Mencheres tinha uma mania de manter pessoas presas por descobrir acidentalmente sobre vampiros? Um tremor passou por ela. Talvez tudo o que Mencheres tinha dito seja mentira. Talvez ele não tenha a intenção de jamais deixá-la partir. ― Oi, ― a loira disse de forma alegre, acenando para o fogão. ― Há alguns ovos e bacon que sobraram, se você estiver com fome. ― ― E aí, ― o homem de cabelos escuros disse seguido de um grunhido amistoso do rapaz de cabelos pálidos, cuja boca estava cheia.


Kira piscou para a saudação. Se esses três forem prisioneiros, eles pareciam bem relaxados sobre isso. ― Obrigado, ― ela conseguiu responder, se dirigindo ao fogão sem mais nada para fazer enquanto ela ponderava sobre este novo acontecimento. Kira olhou ao redor. Sem sinais de Gorgon ou Mencheres, mas isso não significava que eles não estivessem por perto. Ela raspou a sobra de ovos e bacon das duas panelas em um prato, então se sentou na cadeira vazia na pequena mesa. Três pares de olhos a olharam com curiosidade. ― Eu sou Kira, a propósito, ― ela disse, querendo descobrir discretamente se eles estavam sendo mantidos contra sua vontade. ― Nós sabemos, ― o rapaz de cabelos negros respondeu, com um leve sorriso. - Nome Sam, e esta é Selene e Kurt. ― Kira mastigou alguns ovos, tentando parecer casual. ― Você sabe, huh? ― ela comentou uma vez que tinha engolido. ― O que você sabe? ― ― Que você não vai ficar aqui por muito, e que você não está entusiasmada com o tempo que está gastando aqui, ― Selene resumiu com aquele mesmo sorriso ensolarado. Kira engoliu outra mordida de ovos antes de responder. ― E você está, ah, emocionada sobre o tempo que você passa aqui? ― ela perguntou cautelosamente. ― Batendo ponto das nove às cinco, ― Kurt disse, falando pela primeira vez. Os três riram. Kira piscou. Eles estavam aqui de boa vontade? Será que eles não sabem o que Mencheres e Gorgon eram? Mencheres tinha soado tão confiante sobre sua capacidade de hipnotizar os seres humanos sob circunstâncias normais. Seria possível que estes três não tinham ideia que seus outros 'companheiros de apartamento' eram vampiros? ― Então. vocês três são autônomos, então? ― Kira perguntou, querendo mantê-los falando. Mais uma risadinha. ― Pode-se dizer que sim... ― Sam respondeu. Ele se inclinou para trás, equilibrando-se nas duas pernas traseiras da cadeira. Em uma olhada, Kira imaginou que ele estava em seus vinte anos. Todos eles pareciam mais jovens que ela, na verdade. Pensando nisso, Mencheres também parecia, apesar do seu comentário ― mais velho do que o pó ― . Talvez ela estivesse errada. Talvez esses três não fossem humanos. Eles estavam comendo comida normal, sim, mas até


agora a maioria das suposições de Kira sobre vampiros se provaram erradas. Talvez os vampiros comam três refeições por dia como todo mundo, exceto pelo fato deles acompanharem essas refeições com um copo de sangue. Kira olhou-os tão sorrateiramente quanto pode, enquanto empurrava os ovos em seu prato. Selene, Kurt, e Sam pareciam normais em todos os sentidos... mas Mencheres também parecia. Certo, até ele começar a se mover como um raio ou rasgar a cabeça das pessoas. ― Como vocês conheceram Mencheres? ― Kira resolveu perguntar. Selene deu de ombros. ― Eu estava fazendo programa por metanfetamina em Frisco, vários anos atrás, quando Mencheres pegou meu cafetão batendo em mim. Ele o bebeu, então me perguntou se eu queria uma nova vida. Eu concordei. Então Mencheres me levou com ele, me tirou das drogas, e aqui estou. ― Kira tinha ouvido contos muito-mais-sórdidos como detetive, mas ela ficou boquiaberta com a forma casual que Selene retransmitia seu conto de vício em drogas, prostituição e assassinato para uma completa estranha. Antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, Sam começou a falar. ― Eu era um legado. Pertencia ao Tick Tock, mas ele morreu na guerra mais de um ano atrás. Mencheres era mestre do Tick Tock, então ele herdou todos os seus bens quando Tick Tock morreu, eu incluído. ― ― Mestre? Mencheres o considera seu escravo? ― Kira deixou escapar, horrorizada. Sam deu-lhe um olhar. ― Não é mestre dessa forma, senhora. Mestre da linha de vampiros da qual Tick Tock veio. Se você é um humano que pertence a um vampiro, você é considerado sua propriedade, mas posso ir embora quando eu quiser. Não sou o maldito escravo de ninguém, entendeu? ― ― Sou mais parecido com você, Kira, ― Kurt disse, quebrando o momento tenso. ― Não sabia sobre os vampiros, até que tropecei com alguns por acaso, mas eu decidi ficar com eles porque eram mais seguros do que a turma que eu andava antes. ― A mente de Kira girou com essa nova informação. Selene, Sam e Kurt sabiam exatamente o que Mencheres era, mas todos eles ficaram por vontade própria. Ou não? Mencheres manipulou suas mentes para fazê-los pensar que eles tinham escolhido permanecer aqui? Ele estava esperando para fazer o mesmo com ela? E se ela pensasse que a habilidade de Mencheres apagar sua memória fosse seu bilhete para casa, mas na realidade, ela estava dando a ele o poder de trancá-la para sempre? Foi um pensamento tão horrível que Kira sentiu a bile subir em sua garganta. Seus instintos, que tinham sido sua bússola impecável durante os


últimos doze anos, poderiam não ser tão confiáveis quando se tratava de Mencheres. Se os vampiros podem manipular mentes, então se pode supor que eles podem alterar as reações dos instintos de alguém, também. Kira olhou para a cozinha e as três pessoas sentadas nela. Na superfície, tudo estava a imagem da normalidade, mas arranhe a superfície, tudo isso desaparece. Assim como sua confiança nos instintos que asseguravam que Mencheres falava sério quando ele disse que ia deixá-la ir. Kira levantou-se, mal conseguindo evitar que suas mãos tremessem. ― Prazer em conhecer todos vocês, ― ela saiu. Então ela saiu rapidamente da cozinha para ir ao jardim, sentindo como se as paredes estivessem se fechando sobre ela.

***** Mencheres caminhou da piscina até o jardim, atraído pela pulsação de Kira como se fosse um farol. Ela estava no canto mais distante do jardim, sentada nos galhos mais baixos de uma árvore, entre todas as coisas. A brisa trazia o cheiro dela para ele, a fragrância de limão contaminada pelo medo, confusão e raiva. Ele se sentou em um banco de concreto do lado oposto do pequeno jardim, se perguntando o que causou essa mudança brusca no humor de Kira. Ela parecia bem, esta manhã, enquanto ele ouvia os movimentos dela pelo quarto. Então, nada da conversa que ele ouviu entre ela e os outros na cozinha deveria tê-la alarmado, mas Kira tinha ido direto para o jardim e depois permanecido lá nas últimas três horas. Foi a irritação normal pelas circunstâncias que a obrigaram a estar aqui? Ou era outra coisa? Ele não deveria se importar. Foi uma loucura total que ele viesse aqui fora para se sentar neste banco, na esperança de que Kira iria lhe dizer o que a estava incomodando. Afinal, se ele estivesse sendo lógico, ele se preocuparia com questões cruciais, ao invés de uma mulher que não se lembraria dele em breve. A brisa levou o cheiro dela novamente para ele, atormentando-o com a caricia invisível dela em seus sentidos. Então novamente, qual era o mal em um pouco de loucura agradável? Mencheres decidiu, respirando a fragrância de Kira. Neste ponto da sua vida, ele não tinha ganhado o direito de não tomar cada decisão baseado na lógica, fria e insensível? Sua atenção chicoteou para longe de Kira, quando alguma coisa correu pelos sentidos de Mencheres. Algo velho, forte e vingativo. Ele se endireitou, já


enrolando suas emoções de volta a sua concha impermeável familiar até o momento em que ele ouviu Gorgon atender a porta. ― Estou aqui para ver Mencheres, ― uma voz também familiar declarou. ― Guardião, ― Gorgon respondeu, com a quantia necessária de respeito que a posição do seu inimigo garantia. ― Vou avisá-lo que você está aqui. ― A risada rolou de Radjedef como um trovão silencioso. ― Ele sabe, rapaz. ― Mencheres manteve a raiva que tremeluzia nele trancada em níveis indetectáveis. Radjedef só poderia imaginar que o seu tratamento irônico ao seu povo o irritou; se Mencheres lhe desse uma prova, o Guardião da Lei aumentaria seu comportamento insultuoso. Radjedef conhecia as proteções que o seu status lhe dava, e explorava cada uma delas quando se tratava do Mencheres. Se ele não seria considerado o primeiro suspeito no desaparecimento de Radjedef, Mencheres teria acabado com seu velho inimigo milhares de anos atrás. Mas esse era o problema. Sua história era muito longa, todos sabiam disso. E se Radjedef fosse qualquer coisa exceto um Guardião da Lei, Mencheres teria arriscado independentemente. Gorgon entrou no jardim. Radjedef, como esperado, seguiu atrás dele em vez de esperar ser anunciado. ― Criador, você tem um visitante, ― Gorgon disse. ― Obrigado, ― Mencheres respondeu. Gorgon virou-se, voltando para dentro da casa antes que o Guardião da Lei pudesse latir para ele ir embora. Esta não era a primeira vez que Gorgon tinha lidado com Radjedef. ― Menkaure, ― Radjedef disse, chamando Mencheres pelo nome com o qual nasceu. ― Estou surpreso que você não tenha escondido sua localização de mim. ― ― Estou cansado dos nossos jogos, Radje, ― Mencheres disse, usando o nome abreviado que Radjedef havia detestado enquanto era menino. Os lábios do seu inimigo se contraíram tão sutilmente, que ninguém mais poderia ter capturado isso. Mas Mencheres o fez, e deu um sorriso interior. Depois de quatro milênios e meio, Radjedef ainda não conseguia se livrar das suas inseguranças de infância. Se ele conseguisse, eles poderiam se encontrar hoje como amigos ao invés de adversários.


― Ninguém se deleita tanto em jogos como você, ― Radjedef respondeu friamente, tomando um assento próximo de Mencheres sem convite. Sua mão varreu na direção da casa. ― Que acomodações precárias. Você está fazendo alguma forma de penitência por ficar aqui? ― Mencheres levantou uma sobrancelha, entediado. ― É certo que você não viria aqui apenas para zombar da minha residência atual. ― Radjedef sorriu. ― Eu tenho falado com diversas fontes, meu velho amigo. Eles disseram coisas terríveis sobre você. Repetido roubo de propriedade. Assassinato. Prisão. Bruxaria. Quantas leis você acha que tenha quebrado apenas nesse ano? ― ― Se você tivesse fontes confiáveis, você estaria me perguntando isso na frente do Conselho dos Guardiões, não por si mesmo, ― Mencheres respondeu em um tom uniforme. ― Você não pode provar nada disso. Você nunca poderia provar. Encontre um novo passatempo, Radje. Eu ouvi que Wii é muito divertido. ― ― Todo mundo sabe que você matou sua mulher, levantando espectros através de magia negra e enviando-os para ela, ― Redjedef disse severamente. Mencheres apenas deu de ombros. ― Se todo mundo diz isso, então sua prova deve ser fácil de obter. ― ― Você sabe que todos aqueles que presenciaram o assassinato de Patra são leais a você, ― Radjedef disse com um flash de rancor explícito. Quanto a Mencheres usando espectros para matar sua esposa... isso não aconteceu exatamente assim. Mas o fato de que a acusação mais grave que Radjedef podia fazer contra Mencheres era em grande parte verdadeira, e ainda assim não beneficiaria Radjedef em nada, foi quase o bastante para fazer Mencheres sorrir. Quase. ― O que você vai fazer, Radje, quando eu não estiver mais aqui para ser o centro do seu ódio? ― Um brilho surgiu nos olhos pretos de Radjedef. ― Não tenho nenhuma intenção de matá-lo, velho amigo. Isso não me daria o que eu procuro ― e seria muito misericordioso para você. ― ― Eu poderia desaparecer, independentemente se é o que você busca. ― Mencheres murmurou em raro momento de honestidade profunda. Radje sorriu. ― Meu coração se aperta no meu peito com o pensamento. ―


Não tanto como seria se eu enfiasse prata através dele. Mencheres pensou sombriamente. Mas tal pensamento, ao mesmo tempo tentador, carregava consigo repercussões demais. Os Guardiões da Lei são o grupo mais alto das decisões entre vampiros. Mencheres poderia ser capaz de matar um vampiro Mestre com apenas o risco de guerra entre ele e os aliados daquele vampiro, mas se ele matar um Guardião da Lei, todos os vampiros teriam razão para se unir contra ele. Após as últimas poucas guerras que ele havia tido, Mencheres tinha muitos inimigos que adorariam saborear de um erro seu tão estupido, mas ele não permitiria. Não quando Bones e aqueles que ele amava tivessem que enfrentar as consequências. ― Eu estou cansado, ― Mencheres disse. Naquele momento, ele sentiu o peso de todos os seus anos pressionando sobre ele; as incontáveis lutas, a culpa, a fadiga se expandindo implacavelmente impiedosa. De repente, ele desejou que Radjedef soubesse que seus planos para uma vingança elaborada nunca aconteceriam. ― Você deveria ter me golpeado antes, velho amigo. Quando eu ainda tinha o desejo de lhe dar a luta que procura. ― Algo passou pelo rosto do Guardião da Lei, como se somente agora ele percebesse que Mencheres não estava fingindo sua apatia. ― Você nunca vai abandonar seu povo, Menkaure. ― Em meio a sua exaustão mental, Mencheres sentiu um vislumbre de satisfação. Será que Radje finalmente percebeu que suas chances de vingança estavam desaparecendo? ― Isso é verdade, é por isso que eu dei a Bones o dom do meu poder quando eu uni minha linha com a dele. ― ― Poder que deveria ser meu para começar! ― - Radjedef exclamou, mostrando mais emoção do que Mencheres tinha visto nele em séculos. ― Você ainda lamenta por isso? ― Mencheres zombou. ― Era escolha do nosso criador para quem ele dava o seu poder adicional, assim como foi minha escolha dar meu excesso de poder para o Bones. Mesmo agora, Bones cresce mais em sua força, e os poderes de Cat, sua esposa, também. Radje, Radje... ― Mencheres se permitiu um pequeno e frio sorriso. ― Você esperou muito tempo. ― Radje esmagou muito violentamente o banco de concreto embaixo dele. Ele passeou em um passo curto e furioso antes de parar com a mesma brusquidão.


― É mentira, ― Radje disse, o controle perfeito em sua voz agora. ― Você tenta me enganar como sempre fez, mas eu te conheço. Você nunca faria uma coisa dessas. ― Se Radje tivesse feito tal declaração até um ano atrás, teria sido verdade. Mas com a morte da sua esposa, Bones forte o suficiente para levar suas linhas combinadas, Cat transformada no tipo mais raro de vampiro, e sem as visões de Mencheres... ele não tinha razões para ficar. Sua morte poderia acabar com sua guerra fria com Radjedef, negando ao seu inimigo a oportunidade de levar abaixo a linha de Mencheres junto com ele. Por milhares de anos, Radje tinha procurado feri-lo através do seu povo, mas suas tentativas foram prejudicadas pelas visões de Mencheres. Sem as visões, o Guardião da Lei atacaria aqueles que pertencem ao Mencheres sem piedade. Mas Mencheres não tinha a intenção de deixar isso acontecer. Ele deixaria este mundo sabendo que ele tinha garantido a segurança do seu povo e frustrado Radje no percurso. Era algo que ele quase aguardava. Exceto por Kira. Somente ela o mantinha vivo, mas a areia corria cada vez mais rápido através dessa ampulheta também. Logo, as memórias de Kira sobre ele desapareceriam ― e então ele estaria livre para ir. Em seu descanso, Mencheres iria conseguir uma vitória sobre Radje por toda a eternidade. Isso fez seu sorriso ampliar, enquanto olhava para o Guardião da Lei. ― Você me conhece, Radje? Então você deve temer. ― Um ramo estalando chamou a atenção de Mencheres de volta para Kira. Ela desceu da árvore. Ela olhou na direção deles, sua frequência cardíaca acelerada. Adivinhando, sem dúvida, que a sua descida tinha sido ouvida. ― Quem é essa humana? ― Radje disse bruscamente, virando para encara Kira. Mencheres riu. ― Você é tão arrogante que só percebeu agora uma mulher no jardim conosco? ― ― Esse batimento cardíaco poderia ter pertencido a um cão, especialmente por você gostar de se rodear de vira-latas. ― Radje disse friamente. Mencheres enrijeceu pela forma insultante que Radje se referiu a Kira. Então ele se obrigou a relaxar, quando viu os olhos do Guardião da Lei se estreitarem. Muito tarde. Radjedef tinha notado. ― Traga essa humana aqui, ― Radje disse, olhando para Mencheres.


Recusar faria Radjedef ainda mais intrigado sobre quem ela era. Mencheres adotou uma expressão entediada quando ele a chamou ― Kira! Venha. ― Ela lentamente fez seu caminho através do jardim em direção a eles, olhando ao redor, como se procurando possíveis saídas. Mencheres não mostrou nenhuma reação enquanto Radjedef deslizava seu olhar sobre Kira de uma forma que não deixava uma curva de seu corpo de fora. ― Bonita, ― Radje disse, deslizando a palavra. Então, ele sorriu. ― Não tão bonita quanto sua esposa morta, entretanto, não é? ― Mencheres manteve sua expressão vazia e os seus membros relaxados, aparentando estar tão relaxado quanto como estava quando descansava no fundo da piscina. Felizmente, Kira não mordeu a isca do Radjedef. ― Você não fala? ― Radje perguntou, perdendo a paciência. ― Claro, ― Kira respondeu num tom perfeitamente neutro. ― Mas você não estava falando comigo antes. ― O cheiro dela traiu seu nervosismo, mas fora isso, Kira era o retrato da segurança enquanto ela encarava o penetrante olhar do antigo Guardião da Lei. A partir do estreitamento do seu olhar, Radjedef não gostava de sua compostura fria. ― De repente eu acho que estou com sede, ― Radje disse, abaixando sua voz para um ronronar ameaçador. ― Essa humana serve. ― Radejedef se moveu, sua mão se fechando em torno do braço de Kira antes que ela pudesse sequer pestanejar... Então seu corpo inteiro congelou. Mencheres lentamente apertou seu poder em torno do Guardião da Lei até que nada mais se contraiu em seu velho inimigo, exceto sua boca. Os olhos de Kira estavam arregalados enquanto ela se afastava de Radje, mas ela não correu. Esperta. ― Você se atreve a me atacar? ― Radjedef sibilou. ― Se eu tivesse o atacado, você teria perdido a cabeça, ― Mencheres respondeu friamente ― Ainda estou dentro dos meus direitos em te impedir de colocar suas mãos em uma das minhas pessoas sem minha permissão, Guardião. ― O olhar de Radje queimou, com a promessa de vingança, mas ambos sabiam que era inútil. Ele não era forte o suficiente para quebrar o aperto de Mencheres, e as leis estavam ao lado de Mencheres. Ele se permitiu outro momento para desfrutar da indefesa de Radje antes de liberá-lo da pressão do seu poder.


Assim que pôde se mover, Radjedef se afastou de Kira como se ela fosse uma cobra. Então ele se segurou, olhando para ambos. Mencheres sorria. Kira não se moveu desde que ela tinha separado o braço da mão congelada de Radje, mostrando mais atitude do que o antigo Guardião da lei. Desde a expressão furiosa de Radje, antes que ele controlasse seus traços, ele sabia que tinha se exposto para ela. Radjedef agitou a mão em um gesto de desprezo para Kira. ― Já vi o suficiente dela. ― Mencheres olhou para a casa, e Kira se virou sem uma palavra, deixando o jardim. Seu respeito por ela cresceu mais uma vez. Se ela tivesse entrado em pânico antes, ou argumentado com o Guardião da Lei sobre sua provocação óbvia, Mencheres poderia ter sido obrigado a puni-la ― que era o que Radjedef queria. Mas sua postura deixou Radjedef sem nada para fazer exceto ferver em sua própria impotência. As leis que ele poderia ter invocado para punir Kira o impediam de ser capaz de fazer algo agora. E assim uma vez que a Kira esteja segura em sua casa novamente, e Mencheres tenha partido, ambos estariam fora do alcance de Radjedef. Mencheres sorriu novamente ao seu antigo inimigo. ― Você sabe o caminho, Radje. ―


CAPÍTULO SEIS. Dois dias se passaram. Kira assistiu mais TV do que ela viu no último

mês, acrescente tomar banho de sol na piscina, algo que ela não fazia em, bem, ela não conseguia lembrar há quanto tempo. Quem iria pensar que era assim que ela passaria o tempo como uma prisioneira em uma casa com vampiros? Ainda assim, ela não tinha muito mais o que fazer. Toda vez que ela deixava o quarto, ela sabia que estava sendo educadamente seguida por Gorgon, o que era igualmente enervante e chato. Ela não tinha visto Selene, Kurt ou Sam desde aquela tarde na cozinha. Kira esperava que eles não tivessem tido problemas por conversar com ela. Nenhum deles parecia ter medo de suas situações, mas novamente, Kira só tinha visto a superfície da vida entre os mortos-vivos. Muito mais pode estar espreitando nas profundezas, e as chances eram que muito disso não fosse bonito. Kira também não tinha visto Mencheres desde o dia em que ele teve aquele visitante sinistro. Ela tremeu ao lembrar de Radje, como Mencheres o chamou. Era demais para ela pensar que todos os vampiros exalavam uma aura tranquila como parte de sua camuflagem. Assim que ela viu Radje, seus instintos ficaram a mil por hora com alertas de ― perigo, perigo! ― Seu curto período no jardim com ele foi como estar perto de um pit bull enfurecido ― qualquer movimento brusco, seu instinto avisou, resultaria em um ataque cruel. E isso foi antes do bastardo de olhos frios ter tentado mordê-la. Kira estava mais do que aliviada por Mencheres fazer valer seu voto de que ninguém poderia tocá-la enquanto ela estivesse com ele. Quando Radje a encarou enquanto Mencheres, de alguma forma, conseguiu congelá-lo no lugar, ela sentiu ondas de malevolência derramando dele. Ele não queria só mordê-la, ela podia dizer. Ele queria ferir e humilhá-la mesmo que ela fosse alguém que ele nunca encontrou antes. Mesmo que ela esperasse nunca vê-lo de novo, cruzar com Radje tinha aliviado um pouco da ansiedade de Kira. Mesmo o observando de seu poleiro na árvore antes da exibição cruel dele no jardim, algo sobre Radje a desencorajou. Aquilo provou que seus instintos ainda podiam transmitir avisos de perigo, mesmo com vampiros. Isso deu à Kira esperança de que Mencheres não estava apenas mentindo antecipadamente para ela sobre o dia em que ele iria usar suas memórias para escravizá-la. Afinal de contas, ele não devia se importar se Kira gostava ou não de seu cativeiro. Alguém tão rápido e forte como um vampiro não precisava se preocupar com consentimento. Pode ser assustador admitir isso, mas Kira já estava impotente quando se tratava de sua situação. Ela estava apenas se iludindo achando que Mencheres precisaria controlar sua mente para forçá-la a permanecer aqui.


Pelo lado positivo, ela finalmente conseguiu encontrar sua irmã por telefone. Kira disse para Tina a mesma história armada que Gorgon alegou ter dado a Frank ― que Kira estava em casa doente com gripe. Tinha ficou preocupada, mas as duas sabiam que ela não poderia arriscar indo visitá-la. Não enquanto Kira supostamente tinha um vírus contagioso que enfraqueceria o, já comprometido, sistema imunológico de Tina. Kira não deixou de notar que cada risada de Tina terminava com um ataque de tosse e sua voz estava mais grossa, as palavras mais pesadas. Aos vinte e nove anos, Tina já estava no outono de sua expectativa de vida, por mais injusto que fosse. O pensamento era tão deprimente que levou Kira para fora de seu quarto. Ela tinha falado com Tina ontem mesmo, mas agora ela queria falar com ela de novo. Ela precisava se assegurar de que, por enquanto, Tina ainda estava aqui, fazendo parte de sua vida. Kira desceu as escadas, procurando por Mencheres ou Gorgon. Se ela simplesmente pegasse um telefone sem consultar um deles, até onde ela sabia, alarmes iriam tocar. Então eles poderiam não acreditar que ela estava inocentemente tentando encontrar sua irmã e pensar que ela decidiu ligar para a polícia afinal de contas. O aborrecimento a queimou por dentro. Ela podia entender porque vampiros seriam tão protetores de sua existência secreta entre os humanos, mas ela ainda era a única que estava pagando o preço por isso pelos próximos dias. Pelo menos, ela esperava que esse fosse todo o tempo que ainda tinha para pagar o preço por, inadvertidamente, descobrir sobre a existência deles. Ela chegou ao primeiro andar e rapidamente checou a sala de estar e a cozinha. Ninguém por perto. Em seguida, Kira saiu para o pátio, mas a área da piscina estava vazia. O jardim também. Kira voltou para dentro, prestes a checar a lavanderia em seguida, quando uma voz bem atrás dela a fez pular. ― Você estava procurando por alguém? ― Ela se virou, acalmando sua pulsação disparada, para ver Mencheres. Ele não estava aqui há um segundo atrás, como se ela precisasse de um lembrete sobre como ele era incrivelmente rápido. ― Eu devia colocar um sino em você, ― Kira disse sem pensar. Ao invés de ficar irritado ou confuso, Mencheres inclinou a cabeça. ― Perdoe-me, eu não quis te assustar. ― Tão perfeitamente formal. Sempre tão rigidamente no controle da situação ― ― exceto por aquela manhã no galpão. Qual era o verdadeiro Mencheres? Você realmente quer saber? Perguntou uma voz interior. Não, provavelmente ela não queria. Especialmente não nessa situação, quando ela era sua prisioneira mimada.


― Eu queria ligar para minha irmã de novo. ― Uma parte dela odiava pedir permissão para fazer uma coisa tão simples, mas a outra parte a lembrava de que se Mencheres fosse uma pessoa mais cruel, ela nem estaria viva. Investigadores mortos não contam sobre vampiros, Kira pensou ironicamente. ― Certamente, ― Mencheres disse, como se nunca houvesse a chance de que ele iria recusar. Kira soltou a respiração que ela estava prendendo. Que cenário estranho era esse, ser uma prisioneira que era tratada como uma hóspede ― ― na maior parte do tempo. O semblante rígido de Radje brilhou na mente de Kira. Ela não tinha sido tratada como uma hóspede na frente dele. De fato, ela se sentiu mais como um inseto sob o olhar frio e impiedoso de Radje. ― Você está esperando que aquele vampiro retorne muito em breve? ― Kira perguntou, formulando as palavras cuidadosamente. Mencheres ergueu uma sobrancelha. ― Eu presumo que você não esteja falando de Gorgon? ― ― Não, eu estou falando sobre aquele com cabelo liso e escuro que parece um pouco com você. ― ― Radje, ― Mencheres murmurou. ― Não, eu não espero que ele retorne aqui num futuro próximo. ― ― Bom, ― Kira murmurou. ― Ele me dá arrepios. ― Um pequeno sorriso tocou a boca dele. ― Mais uma prova de que sua juventude não a impede de ser sábia. ― Kira sentiu uma resposta na ponta dos lábios. ― Eu tenho trinta e um anos. Na minha espécie, assim que uma mulher tem mais de trinta, ela é considerada no caminho para a meia idade. ― Mencheres riu, impressionando Kira, e o som rolou por sua espinha como uma carícia trêmula. Era a primeira vez que ela o via rir, e sua expressão relaxada combinava com seu sorriso amplo transformando suas feições de atraentes para estonteantes. Deus, você é maravilhoso, ela pensou, feliz pelo vampiro não poder ouvir aquilo em sua mente ― ― ou saber o quanto era difícil para ela não ficar olhando para ele. ― Tola noção humana de que as mulheres só são bonitas em sua primeira etapa de juventude. Minha esposa tinha trinta e cinco em idade humana quando nos casamos, e ela era encantadora... ― De forma abrupta, sua risada desapareceu, aquela aparência familiar de indiferença se assentou sobre seu rosto.


Kira esticou a mão para tocar o braço de Mencheres. ― Radje disse que sua esposa estava morta. Sinto muito. ― Um sorriso estranho e triste tremulou na boca de Mencheres. ― Eu também, mas não pelos motivos que você pensa. ― Uma dúzia de perguntas apareceu instantaneamente na mente de Kira perante aquele comentário misterioso, mas Mencheres mudou de assunto logo em seguida. ― Venha, faça sua ligação agora. A biblioteca deve ser mais confortável para você. ― Você não gosta nada desse assunto, não é? Kira pensou, seus instintos investigativos ainda a motivando a descobrir mais sobre as circunstâncias não comuns que rodeavam a falecida esposa de Mencheres. Mas Kira os barrou. Ela não estava em um caso aqui; ela era uma prisioneira, se bem que uma prisioneira bem tratada. Se ela perguntasse a Mencheres sobre sua esposa, e ele ficasse na defensiva, ele poderia não deixá-la ligar para a irmã. Tina era mais importante do que a curiosidade de Kira. ― A biblioteca está bom para mim, ― foi tudo que Kira disse, e o deixou ir na frente para mostrar o caminho.

***** Mencheres esperou em uma sala adjacente enquanto Kira fazia sua

ligação. Ele a deixou ter a ilusão de privacidade ao deixá-la sozinha na biblioteca, mas os dois sabiam que ele estava escutando. Ele se maravilhou com como a voz de Kira mudava quando ela falava com a irmã. Ela se tornava mais macia, mais gentil, com um tom suave de proteção. O amor de Kira por sua irmã resplandecia a cada sílaba, e por esses breves momentos em que Mencheres ouvia suas conversas, aquele amor era estranhamente reconfortante para ele, mesmo que ele não fosse o alvo de tal amor. Por que uma mulher que, em breve, não teria mais lembrança dele podia afetar seu humor apenas com sua voz era algo desconcertante. Em breve Kira teria ido, e assim que ela fosse, Mencheres pretendia viver somente até ele encontrar outra forma conveniente de conseguir se fazer ser morto. Ele deveria estar passando seus dias finais com os vampiros que ele criou, ou velhos amigos, ou até mesmo pedindo perdão para seu co-regente pela manipulação que havia causado tal ruptura entre ele e Bones. Ao invés disso, ele se viu ficando nessa casa com seus pensamentos ocupados por Kira, mesmo que ele tentasse dar à ela mais espaço possível. Deve ser a novidade que a faz tão fascinante para ele. Kira não sabia nada


sobre ele quando correu em seu socorro no armazém, e o que ela aprendeu sobre ele desde então deve apenas tê-la deixado horrorizada. Porém o olhar que Kira lhe deu no outro dia quando ele se agachou sobre ela perto da piscina estava cheio de calor. Então, ela casualmente admitiu sua atração por ele, como se isso não o tivesse derrubado de onde ele estava. Não fazia sentido. Desde que Mencheres queria mais solidão possível em seus últimos dias, mas não poderia estar completamente sozinho sem levantar suspeita, ele escolheu essa pequena e modesta casa. Fora dado severas instruções a Gorgon e aos humanos para não contar nada para Kira sobre ele, então Kira não poderia saber sobre sua posição entre os vampiros, o quanto eram raras suas habilidades, que sua riqueza ia muito além dos padrões normais da Fortune 500,5 ou qualquer outra coisa que atraíram tantos outros antes dela. O fato de ela o achar desejável baseado apenas nele como pessoa, nada mais, o deixou igualmente seduzido e incrédulo. Se as coisas fossem diferentes, Mencheres poderia tomar uma atitude em relação a atração que ele sentia por Kira, a primeira mulher em milhares de anos ― ― possivelmente a única ― ― a querer ele sem motivos ocultos. Mas seu tempo estava quase acabado. Claro, as lisonjas de Kira também podiam ser uma tentativa de influenciálo a libertá-la. Kira não tinha dado indício de sentir algum desejo por ele desde aquele dia na piscina. Era totalmente plausível que ela tivesse primeiro procurado encantá-lo para que a deixasse ir, percebido que não iria funcionar e, dessa forma, desistiu. Mencheres sentiu uma pontada enquanto ponderava aquilo. Sim. Isso era bem mais provável. ― Tratamento de novo? ― A voz de Kira interrompeu seus devaneios. Soava como se ela tivesse respirado fundo enquanto sua pulsação acelerava. ― Bem, ele realmente ajuda, e eu devo ser capaz de ir com você... eu te disse, eu me sinto melhor e venho tomado antibiótico já por alguns dias... Sim, meu telefone ainda está funcionando em casa... bem, eu caí no sono e esqueci de carregar o celular. Desculpe por perder sua ligação. Vou te ligar amanhã. Prometo. Te amo, Pequena T. ― O som de um clique indicou que Kira tinha desligado, mas Mencheres ficou onde estava. A irregularidade repentina em sua respiração dizia que ela estava lutando contra as lágrimas. Kira não tinha sido propensa a reagir de forma exagerada até agora, então sua irmã deve estar bem doente. Mencheres sentiu uma pontada de culpa, que ele afastou. Qualquer que fosse a condição da irmã dela, não parecia ser recente, e Mencheres não podia deixar Kira partir

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Lista anual feita pela revista Fortune que classifica os 500 maiores dos Estados Unidos entre capitais fechados e empresas públicas, classificados por sua receita bruta após os ajustes feitos pela Fortune para excluir o impacto dos impostos recolhidos.


com as memórias intactas. Com sorte, ela estaria aqui só por mais um ou dois dias. ― Terminei, ― Kira gritou, com a voz mais rouca do que normal. Mencheres se levantou, contente por ela não ter tentado secretamente fazer outra ligação. Isso mostrava cautela e inteligência, duas coisas subestimadas nos tempos modernos, pelo que tinha observado. Quando ele entrou na biblioteca, os olhos de Kira estavam secos; mas uma carranca marcava sua testa, e seu cheiro estava mais intenso com a preocupação. Ele não tinha tentado hipnotizá-la nos últimos dois dias. Talvez tivesse passado tempo suficiente para que ele pudesse apagar suas memórias, mesmo que ele ainda não conseguisse ler seus pensamentos. ― Kira, vou tentar invadir sua mente de novo. Se eu tiver sucesso, você pode voltar para casa essa noite. ― Ela lhe lançou um olhar que era tanto esperançoso como desconfiado. Ele descobriu que tinha misturado os sentimentos sobre isso também. A lógica determinava que quanto mais rápido Kira se fosse, melhor seria para os dois, mas apesar disso, ele sabia que ele iria... sentir a falta dela. A estupidez de sentir falta de uma mulher que não queria nada mais do que esquecer que alguma vez o encontrou era tão enorme que ele acharia engraçado se a piada não fosse com ele. ― Tudo bem, ― Kira disse, se levantando. O brilho cor de esmeralda dos olhos dele se juntou ao verde claro dos dela, forçando ela a não desviar o olhar. ― Kira. ― O nome dela mal era um sussurro, mas uma energia tempestuosa preenchia aquela única palavra. ― Venha para mim. ― Ela o fez, pegando as mãos que ele esticava para ela. A batida do seu coração, a respiração e o sangue correndo por suas veias eram uma sinfonia de sons o chamando. Mas a mente dela permanecia quieta, isolando seus segredos por trás de uma parede que ele não podia penetrar. ― Abra sua mente para mim, ― ele sussurrou, liberando mais de seu poder. ― Eu estou... tentando, ― ela falou, cerrando os dentes, suas mãos flexionando as mãos dele. Aquela parede mental piscou, mas não caiu. Mencheres soltou suas mãos e deu um passo para trás.


― Ainda é muito cedo, ― ele disse, mais perturbado pelo conhecimento de que ele estava aliviado por não precisar dizer adeus para Kira essa noite, do que por sua falta de habilidade em violar sua mente de novo. ― Faz quase cinco dias desde aquela manhã no armazém, ― Kira disse, girando em torno de si de frustração. ― Cinco dias presa aqui. Eu não sei quanto mais posso aguentar. Vamos, me deixe ir. ― Ela não tinha escrúpulo sobre querer esquecê-lo para sempre ― ― ou melhor, nunca o ver novamente. Se ao menos ele sentisse o mesmo desinteresse decidido por ela. ― Sua irmã acredita que você está se recuperando de uma gripe, e seu emprego está garantido. Eu sei que essa situação não é escolha sua, mas vai terminar logo. ― Os punhos de Kira se apertaram e seu cheiro naturalmente doce ficou ácido. ― Minha irmã não está bem. ― ― Ela corre risco de morrer nos próximos dias? ― Mencheres perguntou diretamente. Kira hesitou, mordendo o lábio. ― Não. ― ― Então eu não posso justificar o risco. ― ― Olhe, ela está assustada! ― Kira disse bruscamente. ― E não creio que aconteça com muita frequência com vampiros, mas acontece com o resto de nós. Essas estadias no hospital são difíceis para Tina. Eles batem em suas costas para soltar o muco em seus pulmões, então lhe dão tratamento para ajudá-la a respirar mais facilmente. Ela é minha irmãzinha, eu disse que estaria lá por ela. ― A voz de Kira fraquejou, ficando mais rouca. ― Eu disse a ela que sempre poderia contar comigo. ― Mencheres fechou os olhos. Kira não sabia, mas lealdade era uma das qualidades que ele mais prezava. Ele entendia, muito bem, o senso de responsabilidade que Kira sentia por alguém que ela considerava seu. Ele estudou seu rosto forte e adorável e a curva daquele queixo teimoso. Qualquer manipulação que Kira pudesse ter tentado com ele era justificada. Mencheres teria feito o mesmo se fosse ela. ― Há uma coisa que pode acelerar minha habilidade de apagar sua memória. ― A expressão de Kira ficou esperançosa e ela deu um passo em sua direção. ― O que? O que quer que seja, eu farei. ―


Ela ainda diria isso quando ouvisse o que isso implicava? ― Seu sangue me daria grande poder sobre você. Para humanos com mentes fortes, beber deles é, algumas vezes, necessário antes que eles possam ser hipnotizados. Você tem muita força de vontade, Kira. Talvez mais do que meu sangue em seu sistema esteja me impedindo de manipular sua mente. ― Kira empalideceu enquanto digeria o que tinha que fazer. Mencheres a observava, se mantendo inexpressivo. Será que seu sentimento de proteção por sua irmã era maior do que o medo de oferecer a garganta para um vampiro? Ela engoliu seco, então deu um curto movimento com a cabeça assentindo. ― Ok. Vamos fazer isso. ― Ele estava surpreso por sua rápida rendição. ― Você percebe que isso significa que vou te morder e beber seu sangue? ― ele perguntou, apenas no caso de ela não ter entendido. Kira soltou uma pequena risada. ― Você é um vampiro. Eu não achei que iria usar uma agulha e um canudinho. ― ― Você não está com medo? ― ele a desafiou. Seu olhar verde pálido era firme mesmo que seu pulso estivesse começando a acelerar. ― Você prometeu não me fazer mal. Então eu não tenho do que sentir medo. ― Lealdade. Bravura. Determinação. Os atributos de Kira eram como uma tocha brilhando em seus anos sombrios de crueldade. Emoções há muito adormecidas se ergueram nele e seus olhos brilharam verdes. Ele não podia lembrar da última vez em que encontrou alguém com as qualidades dela, e seu sangue se tornaria parte dele quando bebesse dela. Quando Kira colocou o cabelo para trás e ficou há apenas alguns centímetros de distância, ele descobriu que queria tanto seu sangue dentro dele que não se atreveu a tocála para não a ferir com sua urgência. Ela estremeceu, olhando sobre seu ombro. ― Parece que alguma coisa acabou de roçar em mim... você sente isso? ― Era o poder dele se desenrolando e a envolvendo de todas as formas que ele não podia se permitir. Mencheres o moderou, apenas deixando sua aura acariciar a dela sem aquela energia espiral acariciando ao longo da pele dela como dúzias de mãos. ― Venha mais perto, ― ele disse com a voz grossa, ainda não confiando em si para tocá-la. Fazia tanto tempo desde que ele sentiu algo tão forte por uma mulher. A onda inesperada de necessidade serpenteando por ele fazia sua pele zumbir com a energia. Se isso era o que ele sentia antes de morder


Kira, como seria possuir seu corpo? Fazer aqueles lábios carnudos e vermelhos se separarem com um grito lento e extasiado enquanto ele guiava sua carne profundamente para dentro dela? Um som escapou de Kira, quase um suspiro. Mencheres se controlou, tentando conter a repentina chama de luxúria que resultava nele dar um empurrão em seu poder para o grupo de terminações nervosas mais sensíveis dela. A profundidade de sua resposta a ela era impressionante, como se algo há muito tempo adormecido nele tivesse inesperadamente acordado com um rugido. ― Assim? ― Kira perguntou, inclinando a cabeça para o lado com os olhos fechados. A linha suave de seu pescoço com suas veias pulsando era quase sua ruína. Mencheres apertou os punhos, recuperando o controle com grande esforço. Devagar. Ela nunca foi provada antes. Reconhecer que ele seria o primeiro a reivindicar seu sangue estimulou um instinto primário nele. Ele envolveu Kira em um abraço forte e macio. Sua pulsação disparava abaixo de seus lábios enquanto ele os tocava de leve sobre o pescoço dela. Sua pele era tão macia, seu cheiro se misturando com o dele enquanto a puxava para mais perto. Ela não falou, mas sua respiração vinha em pequenos e instáveis sopros que o aquecia onde tocavam. Seu braço deslizou pelas costas dela, a puxando para mais perto ainda, abafando um gemido ao sentir o corpo dela se encaixar no seu. ― Quanto... você vai precisar pegar? ― ela sussurrou de forma instável, seu coração aos saltos quando Mencheres arranhou sua garganta com as presas. ― Não tenha medo. ― A voz dele era baixa, quase um resmungo, enquanto suas mãos enroscavam na espessa massa de cabelos dela. A fricção sensual dos seios dela contra seu peito, subindo e descendo devido a sua respiração rápida, intensificava seu desejo de explorá-la todinha. Cuidadosamente, de forma implacável e devagar. Mas apesar de ele a segurar mais perto que o necessário, suas mãos permaneciam nas suas costas e na cabeça, a segurando firme ao invés de explorar as curvas tentadoras de seu corpo. Ela suspirou quando Mencheres colou a boca sobre seu pescoço, o sugando com uma pressão lenta e firme. Ele não a tinha perfurado ainda, mas a preparava para a mordida, trazendo aquela veia menor e suculenta para a superfície. Os olhos dele se fecharam com o sabor do néctar cítrico da pele dela. Seu cheio o envolvia, uma mistura de apreensão, hesitação... e algo mais. Excitação.


Uma sensação sombria de triunfo banhou Mencheres. Ela pode não ter conhecimento disso, mas uma parte de Kira concordava que ele a mordesse por motivos que nada tinham a ver com sua irmã. Você quer ser reivindicada dessa forma, ele pensou, chicoteando levemente com a língua pelo pescoço dela mais uma vez. E você será. Agora. Suas presas afundaram na carne dela no instante seguinte.


CAPÍTULO SETE. Tudo em Kira congelou ao sentir as presas afiadas perfurando sua pele, mas ela não estava preparada para o que aconteceu em seguida. Em vez de dor, uma cascata de sensação pura fluiu sobre ela. Um calor doce, delicioso, pareceu espalhar lentamente do seu pescoço, abaixo dos seus ombros, e mais baixo, até que sentiu como se o seu corpo estivesse submerso em chocolate quente. Todas as suas preocupações drenadas para fora com tanta pressa que ela se sentiu tonta, só então percebendo o quão pesado tinha sido seu estresse, agora que ele não estava mais lá para sobrecarregá-la. Algo espesso e sedoso enroscou pelos seus dedos. Depois de um nebuloso momento, Kira percebeu que tinha levantado seus braços e agora estava segurando o cabelo de Mencheres. Ele fez um som profundo, gutural que vibrava contra o pescoço dela enquanto ele engolia. Meu sangue. Mencheres está engolindo meu sangue. Este pensamento deveria assustá-la, ou pelo menos deixá-la preocupada, mas ao invés disto, Kira encontrou-se pressionando para mais perto dele. Fragmentos de prazer picaram nela quando as presas dele deslizaram mais profundo em resposta. O calor se espalhando através dela começou a girar e se concentrar em um só lugar, fazendo-a ofegar com a necessidade súbita e intensa em seus quadris. Suas mãos entrelaçaram mais apertadas no cabelo dele enquanto Kira tinha um desejo sombrio e inexplicável de esfregar seu pescoço contra a boca dele. Prazer apunhalou dentro dela com impacto suficiente para fazê-la ofegar, enquanto as presas dele deslizavam nela novamente. Ela ouviu a si própria gemendo. Sentiu outra varredura vertiginosa de calor. Como poderia uma mordida ser responsável por tanto êxtase? Mencheres ergueu sua cabeça muito cedo, deixando ar fresco em sua garganta em vez da dura e sensual pressão de sua boca. A carícia de suas mãos firmes em suas costas e cabeça também desapareceu, resultando num vazio decepcionante em vez da sensação dele agarrando-a. Ela nem mesmo pensou antes de puxar a cabeça dele para baixo, de volta até o seu pescoço. ― Não pare ― ela ofegou. Um ruído áspero escapou dele quando sua língua deslizou em um longo e lento caminho por todo lugar no pescoço dela onde ele tinha mordido. ― Você não quer realmente dizer isto. ― Como os diabos que ela não queria. Ela precisava de mais desse maravilhoso, desesperado calor inundando tudo através dela. Mais dele


tocando nela. Seus seios roçavam contra a parede de músculos do tórax de Mencheres enquanto ela aumentava seu aperto na cabeça dele, mantendo-o embalado na curva do seu pescoço. As mãos dele se moveram, apertando-lhe os pulsos em uma suave, porém inquebrável contenção enquanto ele levantava a cabeça para longe dela. Aquela necessidade rasgando-a começou a diminuir, deixando para trás uma aconchegante, fraca letargia, como se ela tivesse acabado de emergir de uma banheira de água quente depois de estar respirando óxido nitroso.6 Kira flutuava como se uma onda atordoante a tivesse atingido. Mencheres a ergueu, então ela foi colocada sobre algo macio. Ela abriu seus olhos para descobrir que ele os tinha movido para o sofá. Ela esperava que a boca dele estivesse manchada de vermelho, ou ver trilhas carmesins em ziguezague por seu rosto, mas nada estragaria suas feições notavelmente bonitas. Seus olhos ainda estavam brilhando esmeralda e se encontraram com os dela em uma intensidade que ela não podia denominar. Ela não tinha a menor ideia do que dizer. Os sentimentos desinibidos que a levaram a empurrar a cabeça de Mencheres para seu pescoço, exigindo que ele a mordesse outra vez, haviam desaparecido, deixando Kira despedaçada. Sua reação apaixonada era exatamente o que acontecia com todo mundo que Mencheres mordia? Foi por isso que ele disse que ela realmente não queria dizer aquilo quando pediu para ele não parar? Ou ela não queria que ele parasse porque a mordida do vampiro foi uma desculpa para deixar agir o desejo que ela sentia por ele? Ela certamente não teria deixado sua atração doentia solta em quaisquer outras circunstâncias. Não importa quão bem-intencionadas eram suas ações, ele ainda era seu captor ― seu captor inumano. Ela não estava disposta a complicar ainda mais uma situação já retorcida. ― Está se sentindo melhor agora? ― Mencheres perguntou, nenhuma das frustrações dela estampada no tom dele. Kira olhou para longe, respirando profundamente. Ela percebeu que seu coração não estava mais acelerado. Na verdade, ele tinha o mesmo ritmo relaxado como se tivesse acabado de despertar. ― Tudo bem. ― Então ela se forçou a perguntar: ― Todo esse ‘mais, mais!' seria uma resposta comum quando você morde alguém? Ou será que eu lhe devo um pedido de desculpas? Mencheres se afastou dela antes de responder. ― É muito comum. ― 6

O óxido nitroso por muito tempo foi conhecido como gás hilariante ou gás do riso, pela capacidade que possui de provocar contrações musculares involuntárias na face das pessoas, dando a impressão de que ela está rindo.


Seu tom foi tão rígido que Kira lançou um olhar para ele. Seu rosto estava completamente fechado, tão inexpressivo como uma estátua. Por que você esperaria algo diferente? Perguntou a si mesma. Isso poderia ser uma nova experiência para ela, mas Mencheres deve morder uma pessoa diferente por dia. Provavelmente a única razão para ele não estar bocejando, era porque ele não precisa respirar. Então de repente, ele estava ajoelhado na frente dela, sua mão colocada em torno do seu rosto e olhos verdes brilhando nos dela. ― Nada aconteceu, Kira. Eu não a mordi. Você não veio para minha casa. Você foi para sua casa depois do trabalho na manhã de terça-feira, e você estava mal em sua cama desde então. ― Uma densidade estranha pressionou em sua mente enquanto a voz dele parecia vibrar através dela. Por uma fração de segundos, Kira sentiu-se presunçosa. Finalmente devia estar funcionando! Mas tão depressa quanto tinha começado, um desânimo tomou conta dela. Se for assim, então ela iria esquecer Mencheres. Ela nunca sequer imaginaria que o tinha conhecido... Ela piscou, e aquela pressão insistente desapareceu de sua mente. Os olhos de Mencheres ainda estavam presos nela, tão brilhantes que nem pareciam reais; mas ela já não sentia o desejo de cair dentro de seu brilho. ― Não está funcionando. ― Uma estranha sensação tomou conta dela. Arrependimento? Alívio? Kira deixou ir antes que ela pudesse determinar qual era. Em um piscar de olhos, Mencheres estava do outro lado da sala, de costas para ela. Nada no quadrado dos seus ombros lhe dava qualquer indicação do que ele estava pensando. ― Tentaremos novamente em dois dias, ― ele disse. Isso daria uma semana desde aquela fatídica manhã no armazém. Era o máximo de tempo que Mencheres disse ser necessário para os efeitos de beber o seu sangue se desgastarem. Kira engoliu a pergunta que imediatamente surgiu em sua mente. E se em dois dias, ele ainda não conseguisse apagar suas memórias? E se Mencheres não pudesse fazê-la esquecer tudo o que havia aprendido sobre ele e os outros vampiros. . .. será que ele algum dia iria deixá-la ir?

***** Mencheres jazia no fundo da piscina, os raios de sol do final da tarde brilhavam silenciosamente através do vidro opaco. Ele tinha estado aqui embaixo, na água aquecida artificialmente, por mais de uma hora, mas mesmo


este passatempo normalmente relaxante, pouco tinha feito para acalmá-lo. Ele não parava de pensar sobre como sentiu a pele de Kira em sua boca ontem, o gosto dela e como o cheiro dela assumiu uma fragrância mais rica, mais profunda com sua excitação. Ele sabia que essa excitação era apenas devido à forma como ele a havia mordido. A resposta de Kira tinha sido a mesma que Mencheres tinha encontrado em inúmeras mulheres e homens que ele tinha se alimentado antes. O que foi tão diferente era a resposta dele. Quando Kira gemeu para ele não parar, por um momento, ele ficou tentado. Ele poderia beber dela o tempo todo em que a tinha, drenando apenas uma pequena quantidade de sangue, mas dando-lhe as mesmas sensações incríveis de sua mordida ― e mais. O desejo dele foi tão grande que causou dor física por ter que afastar Kira. Mencheres não conseguia se lembrar da última vez em que quisesse alguém com tanta intensidade. Talvez nunca. E ainda tinha sido mais do que luxúria. Quando ele foi incapaz de penetrar mais uma vez em sua mente, o alívio que o preencheu era inegável. Ele não pode evitar imaginar se a relutância por parte dele teve algum papel em sua incapacidade de apagar a memória de Kira. Sim, havia alguma outra possível razão para a sua incapacidade de alterar os pensamentos dela, mas a verdade era que ele não queria que ela fosse embora. Era um prazer ver o rosto de Kira todo dia. A voz dela era algo que ele se encontrou concentrando em ouvir quer ela falasse com ele ou não, e sua proximidade lhe ocupava os pensamentos muito mais do que ele jamais iria deixá-la saber. Era irônico; ele a tinha em cativeiro, mas era ela que o tinha cativo. Mencheres levantou-se da piscina, abandonando esse exercício fútil de tranquilidade. Uma coisa faria ele se sentir melhor, e não tinha nada a ver com aquecer-se debaixo de água. Ele faria Gorgon puxar todas as informações sobre Kira, discreta e cuidadosamente. Mencheres já havia decidido reivindicar ela como sua, então ela ficaria aos cuidados de Bones uma vez que ele tivesse ido embora. Agora tudo que ele precisava fazer era garantir que Bones soubesse de quem cuidar, uma vez que este dia chegasse. O fato de que isto era um dos poucos itens que ele estava priorizando não lhe passou desapercebido, mas ele não se importou. Ele poderia fingir que Kira não tinha se tornado importante para ele, ou ele poderia aceitar isto e encontrar uma maneira de prosseguir indiferente. Negação nunca tinha ajudado ele no passado. ― Gorgon! ― Mencheres chamou. Ele nem sequer esperou o outro vampiro sair para o deck antes de falar novamente. ― Eu tenho uma tarefa para você. ―

*****


Mencheres podia ouvir Kira andando em seu quarto. Ela esteve fazendo isso nas últimas duas horas. Sem dúvida, ela estava novamente irritada com a sua situação, o quê ele não podia culpá-la. O tempo dela junto a ele tinha sido mais do que qualquer um deles tinha previsto. Ainda assim, no sexto dia desde que ela tinha bebido seu sangue, ele não conseguia pegar nem mesmo os menores vislumbres dos pensamentos de Kira, o quê ele deveria ter sido capaz de fazer até agora. Ele não podia mais fingir que o seu sangue estava apenas tomando um tempo anormalmente longo para sair do sistema dela. Era hora de tomar uma decisão. E ele temia isso. ― Dane-se, ― Mencheres ouviu Kira murmurar antes de fechar a porta e descer as escadas. Ele ficou sentado na sala de estar, mantendo sua expressão serena, como se não tivesse estado sintonizado em cada nuance dela nas últimas horas. ― Preciso ligar para minha irmã, ― Kira disse assim que o viu. Ele levantou uma sobrancelha ante a urgência na voz dela. ― Há algo errado? ― ― Espero que não ― , Kira resmungou. ― Pode ser o telefone da biblioteca de novo? ― ― Sim ― Mencheres respondeu, observando Kira quando ela quase correu para lá. O que ela tinha para estar tão agitada? Quando ela desligou ontem à noite com a sua irmã, Kira estava bem. Preocupada, mas de qualquer maneira calma. Agora, ela agia como se tivesse acabado de andar pelo túmulo de sua irmã. Mencheres ouviu os bipes mecânicos emitidos que sinalizavam Kira discando, então sua respiração tensa enquanto ela esperava. Depois de uma dúzia de toques, Kira soltou uma maldição, então desligou e ligou novamente. Ele veio para a biblioteca bem na hora que Kira murmurava outra maldição e desligava novamente. Seu rosto estava pálido. ― Ela não está atendendo. Algo está errado. ― Mencheres não chegou até ela, mas para sua frustração, sua primeira inclinação teria sido acariciá-la de forma reconfortante. ― Você não teve sucesso ao ligar para sua irmã outras vezes antes, e nada estava errado ― , ele observou. ― Desta vez é diferente. Desde o final desta manhã, eu apenas… senti que algo estava errado. ― Kira lhe lançou um olhar pensativo. ― Você vai achar que isso é loucura, mas às vezes eu simplesmente sei das coisas.


Chame isso de instinto, pressentimento, o que quiser, mas eu tive isto por toda a minha vida. ― Pelo contrário, ele era uma das poucas pessoas no mundo que poderia relatar coisas que iriam acontecer baseando-se em um incomum dom interior. Ou pelo menos, ele costumava fazer isso. ― Se concentre neste sentimento. Foque ― Mencheres instruiu. Ela parecia surpresa com a instrução dele, mas em seguida, sua testa franziu e ela começou a andar com passos lentos. Silêncio e concentração tinham aguçado o dom de Mencheres quando ele ainda era jovem e desacostumado com isto. Então, ao longo do tempo, ele aperfeiçoou sua capacidade de chamar visões à vontade. Ele ainda foi capaz de usar seu poder para localizar pessoas há vários quilômetros distantes, principalmente se ele tivesse provado do sangue desta pessoa. Até que suas visões terminaram abruptamente e tudo que ele viu foi escuridão. Simbolismo foi por muitas vezes uma parte de suas visões, e Duat,7 o submundo onde sua alma iria viajar para aguardar o julgamento do deus Anúbis,8 era um lugar de escuridão uniforme. A morte estava chegando para ele, mas Mencheres iria escolher seu próprio fim. Um que melhor servisse ao seu povo. ― Se eu estiver certa, e algo de ruim aconteceu, Tina estaria em um hospital. Preciso fazer outra ligação, ― Kira disse. Ela foi até o telefone e começou a discar, não esperando para ver se Mencheres se oporia. Ele não disse nada, observando os dedos entrelaçados dela em agitação. ― Hospital Mercy e Centro Médico, ― ele ouviu a voz do operador entoar. ― Eu estou checando para ver se minha irmã foi admitida, ― disse Kira, tomando uma profunda respiração. ― O nome dela é Tina Graceling. Ela também pode estar na sala de emergência. ― ― Um momento. ― A música de espera encheu a linha por alguns segundos e então a voz do operador novamente. ― Sim, Tina Graceling é paciente aqui. Por favor, aguarde enquanto eu a transfiro para a sala das enfermeiras. ―

7

Tuat ou Duat, na religião egípcia, era o nome das doze regiões do Reino dos Mortos, ao longo das quais, a ― Barca de um milhão de anos ― de Rá navegava todas as noites. Cada uma das 12 regiões correspondia a uma das horas da noite. 8 Anúbis é o deus com cabeça de chacal associado com a mumificação e a vida após a morte na mitologia egípcia.


Mencheres não falou nada enquanto Kira foi transferida e outra voz explicou para ela que sua irmã estava em estado crítico, mas estável. Do que ele deduziu, não foi devido a um acidente, mas a uma doença recorrente. ― Obrigada, ― Kira disse antes de desligar. Então ela encontrou o olhar de Mencheres. ― Ela está em cuidados intensivos. ― Sua voz era crua, o cheiro dela girava em torno de medo, agitação e culpa. ― Ela sofreu uma hemorragia e foi levada ao hospital por uma ambulância esta manhã… ― Nada disso deveria importar para ele. A irmã de Kira estava em um hospital, não havia nada mais que ela pudesse fazer para ajudá-la, e uma desconhecida pobre saúde mortal não era realmente uma preocupação para ele. Mas Kira se importava, e por causa disso, ele também. Independentemente de todas as razões pelas quais ela não deveria importar para ele, Mencheres descobriu que ele não podia suportar ver Kira sofrendo. Sim, ele se importava muito, muito mesmo. Ele manteve Kira aqui com a intenção original de proteger o segredo de sua raça, mas com o passar dos dias, a maior ameaça em Kira não era para o mundo dos vampiros, era para ele mesmo. Ela o fez sentir coisas que ele não podia permitir a si mesmo sentir neste momento de sua vida. Não importa o quão difícil fosse, já era tempo dele remover esta ameaça. Ele não tinha outra escolha, se ele pretendesse manter o curso que tinha definido. ― Venha, ― Mencheres disse, estendendo sua mão. A testa de Kira franziu, mas ela a pegou. Bela Lady Dark, ele pensou. Eu gostaria de não ter que fazer isso. Ele tinha Kira trancada em um aperto inquebrável antes que ela pudesse ofegar.


CAPÍTULO OITO. Kira soltou o fôlego de uma vez quando Mencheres aterrissou no estacionamento. Demorou um segundo para que as pernas dela parassem de tremer o suficiente para que ela o soltasse, mas o brilho do hospital tão perto deu a ela a força suficiente para ela começar a caminhar em direção a ele. ― Por que não dirigimos até aqui? ― Ela perguntou, com o coração ainda martelando. ― Isso levaria três vezes mais tempo ― Mencheres respondeu ― Mais, se ficássemos presos no tráfego ― Com certeza não tinha nenhum tráfego no céu, Kira pensou, ainda um pouco deslumbrada pelo vôo recente. Mencheres havia a tomado nos braços e os lançado para o céu noturno antes mesmo que ela pudesse perceber o que ele estava fazendo. A habilidade dos vampiros de voar em um borrão confuso de velocidade era tão emocionante quanto assustador. Ela não achava que algum dia conseguiria esquecer a visão dos prédios em seu ponto de vista se fechando logo acima deles. Superman e Lois Lane, engulam essa. Mas Kira afastou o resto de seu deslumbramento quando ela entrou na brilhante luz do hospital. Em algum lugar nos pisos superiores, Tina estava lutando pela sua vida contra uma doença que não deixava sobreviventes. A atendente do hospital deu a ela um olhar simpático enquanto assinava o cartão de visitante de Kira. ― Você chegou na hora certa. O horário de visita da UTI acaba em trinta minutos ― Kira lançou um olhar cheio de gratidão á Mencheres mesmo que o vampiro não estivesse olhando para ela. Se eles tivessem dirigido ao invés de voado até lá, ela não teria conseguido. ― Somente membros da família são permitidos no cuidado intensivo. Ele é da família também? ― A atendente perguntou. ― Sim ― Kira respondeu de uma vez. Ela não iria retribuir a bondade de Mencheres por trazê-la aqui, o fazendo gastar sapatos aqui em baixo. A atendente deu um simples olhar duvidoso para Mencheres. Kira não podia culpá-la. Ela e Mencheres não se pareciam nem um pouco, com o cabelo castanho aloirado que ela tinha e os olhos claros contrastando com as cores escuras dele e a aparência arábica. ― Carteira de motorista, por favor, ― A atendente disse a Mencheres.


Ele se inclinou sobre o balcão, um flash de verde nos olhos dele foi embora tão rápido que Kira não tinha certeza se realmente tinha visto. ― Já entreguei. Agora, me dê o cartão ― Mencheres apontou em uma voz suave e baixa. A atendente entregou o cartão de visitante com um sorriso vidrado em seu rosto sem nem mesmo escrever um nome nele. Mencheres o pegou e se virou para Kira. ― Vamos ― Kira lançou outro olhar a atendente, que ainda sorria de um jeito congelado, antes de seguir Mencheres até os elevadores. Uma vez que eles estavam lá dentro, ela finalmente encontrou sua voz. ― É assim tão fácil para você controlar a mente das pessoas em circunstâncias normais? Um olhar de um segundo com um mero flash verde? ― Mencheres deu a ela um olhar lateral ― Talvez agora você possa apreciar a raridade da sua resistência ao meu poder ― ― Por que você me deu o seu sangue ― Kira murmurou pensativa, observando as luzes dos andares enquanto o elevador passava por eles ― E possivelmente minha teimosia, ― ela adicionou com um sorriso fraco. Mencheres quase pareceu suspirar ― Existe outra possibilidade. Uma realmente pequena porcentagem de humanos são naturalmente imunes ao poder de controle da mente vampírico. Na minha vida inteira, eu me deparei com apenas algumas dezenas de seres humanos com essa imunidade, mas existem aqueles que tem um tipo de fórmula genética de mutação que previne— ― ― Você nunca me disse isso antes, ― Kira interrompeu, horror tomando conta dela ― Você sabia esse tempo todo que talvez não fosse só o seu sangue que impedia você de apagar minha memória? ― Medo doentio correu por ela. Era esse o jeito de Mencheres dizer que ele nunca a deixaria ir? A porta do elevador se abriu revelando a estação das enfermeiras na unidade de tratamento intensivo. Mencheres não respondeu, o que ela encarou como uma maldita admissão. Mas ela não podia falar mais sobre isso agora. Ela só tinha meia hora para ver a irmã, e isso tinha a prioridade, mesmo sobre os medos dela sobre a nova revelação de Mencheres. O olhar de Kira correu por cada porta clara dos quartos até que ela encontrou o marcado como ‘Tina Graceling’. Então ela


apresentou o cartão de visita para a enfermeira antes de se aproximar do quarto da irmã, nem mesmo olhando para ver se Mencheres a tinha seguido. Tina parecia estar dormindo, seu pequeno corpinho conectado a máquinas que pareciam diminuí-la ainda mais na cama de hospital. Ela estava quase tão pálida quanto os lençóis ao redor dela, sombras escuras circulavam seus olhos e eram o único sinal de cor no rosto dela. Ela parecia tão frágil, tão quebrada, como uma linda boneca que alguma criança havia descuidadamente descartado. Um tubo de plástico transparente tinha sido colocado sobre a boca de Tina, a compressão constante do ventilador soava como um chiado de acordeão. Lágrimas brotaram nos olhos de Kira, fazendo a imagem de sua irmã e todas as máquinas se tornarem um borrão. Tina não estava dormindo, ela estava inconsciente e em um ventilador. Um dos maiores medos de Tina era estar em um Ventilador. Sua irmã havia dito uma vez, que se os pulmões dela se deteriorassem a esse ponto, era o fim da linha. E Tina estava provavelmente certa. Um soluço escapou de Kira antes que ela pudesse evitar. Ela sempre soube que esse dia ia chegar. Ela achava que tinha estado preparada para isso, mas a dor escaldante que passou pelo coração dela, quando ela viu que Tina só estava viva por causa das máquinas, fez os seus joelhos vacilarem. Ela se sentou na cadeira próxima, incapaz de desviar o olhar da sua inconsciente irmãzinha. ― Que doença ela tem? ― A voz suave e profunda de Mencheres assustou Kira por um segundo. Ela tinha quase esquecido que o vampiro estava lá. Ele circulou em volta da cama de Tina, olhando para sua irmã com a habitual expressão oculta. ― Fibrose Cística, ― Kira respondeu ― Ela nasceu com isso ― A ironia disso lançou outra facada de dor em Kira. De acordo com o que Mencheres acabou de dizer, talvez ela também tenha nascido com uma mutação genética, mas embora a dela pudesse roubar sua liberdade, não ia ficar mais mortal até que a matasse, como a de Tina. ― Ela está morrendo, ― Mencheres disse, ainda com aquela expressão indecifrável. ― Não diga isso. ― Kira lançou ao vampiro um olhar preenchido com toda sua raiva impotente sobre a condição de sua irmã enquanto se levantava. Ela sabia que isso era verdade. Todos os seus instintos afirmavam que Tina não iria se recuperar


dessa vez. Ela tinha sentido aquele pavor crescer nela durante todo o dia mesmo quando ela tentava desconsiderá-lo. Os olhos negros dele eram duros ― Como ela está agora, isso é um fato, mas você está preparada para mudar esse fato? ― Ele quis dizer...? Kira olhou da irmã para Mencheres, e em seguida para a máquina ECG que monitorava o pulso fraco da irmã. Um pulso que Mencheres não tinha mais. ― Nada assim tão drástico, ― Mencheres disse com um simples aceno de cabeça indicando o coração no monitor ― Meu sangue curou seus machucados. Ele não pode curar a doença da sua irmã permanentemente, mas poderia curar as complicações que a trouxeram a essa condição. ― Esperança brotou através de Kira enquanto ela olhava para Mencheres. O sangue dele tinha curado ela — de um ferimento mortal, nada menos. Mesmo se não curasse a Fibrose Cística, podia curar Tina o suficiente para tirá-la do ventilador? Talvez até mesmo do hospital? ― Você faria isso? ― levou tudo que Kira tinha não implorar enquanto ela esperava uma resposta. ― Sim. Por um preço ― Seus joelhos falharam outra vez, mas dessa vez, era um tipo diferente de medo. É claro que o preço da ajuda de Mencheres seria que Kira aceitasse perder sua liberdade... Para sempre. Afinal, ele havia dito repetidamente que não a deixaria ir até que pudesse apagar tudo da sua memória sobre vampiros. Seis dias depois e ele ainda não podia manipular suas memórias ou ouvir seus pensamentos. Kira não tinha mais muita esperança de que amanhã faria magicamente alguma diferença. Mutação genética. Imunidade Natural. Ela olhou de volta para Tina. Se o preço dele por ela aceitar seu destino como prisioneira permanente era curar sua irmã o suficiente para dar a Tina outra chance de viver, ela concordaria. Talvez ela não tivesse uma escolha sobre perder sua liberdade, mas ela podia ver que Tina seria beneficiada com isso. Mil vezes, ela havia se perguntado ― Por que ela? ― sobre a condição de Tina, e nem mesmo uma vez ela ouviu Tina ecoar seus pensamentos. Sua irmã tinha aceitado seu destino com uma fria bravura que Kira respeitava a muito tempo. Agora, era a vez de Kira. ― Eu posso adivinhar qual é seu preço, ― ela disse, endireitando os ombros ― E eu irei concordar, se você curar Tina mais do que só essa vez. Faça isso vezes o suficiente para dar a ela um tempo de vida normal. E eu ficarei trancada pelo resto do meu. Uma vida por uma vida ―


Mencheres a encarou por tanto tempo, que Kira se perguntou se ela havia ousado pedir demais. Ele estava zangado pela condição que ela havia adicionado ao preço dele? Divertido? Desdenhoso? Nenhuma das anteriores? Era verdade que Mencheres podia simplesmente prender ela para sempre sem ajudar Tina, mas se ele queria que ela fosse tão dócil quanto Selene, Kurt, e Sam eram, então era isso que ele tinha que fazer. ― Chame a enfermeira ― Mencheres disse. Isso não era realmente uma resposta, mas Kira não pressionou. Ela foi até a estação das enfermeiras e em alguns minutos retornou com a enfermeira de Tina. Mencheres olhou para a mulher e os olhos dele lançaram aquele flash brilhante de esmeralda ― Me traga uma seringa. ― A expressão da enfermeira imediatamente mudou para a mesma expressão obediente e plana que a que registava os visitantes tinha. Mais uma vez, Kira estava maravilhada com o tão sem esforço Mencheres podia controlar a mente de outras pessoas enquanto a enfermeira saia do quarto. Menos de um minuto depois, ela retornou com uma seringa e entregou a Mencheres. ― Saia agora. Você não me deu nada. Você não se lembra de nada sobre mim, ― Mencheres disse a ela de forma indiferente. A enfermeira saiu do quarto sem nem sequer olhar para trás. Kira teria comentado sobre o quão estranho toda essa troca havia sido, mas ela estava muito ocupada concentrada em Mencheres enquanto ele deslizava a agulha em seu pulso e lentamente puxava para trás. O líquido vermelho gotejou na seringa até que ela estava cheia. Ela olhou para trás deles, até a estação de enfermeiras. Nenhuma estava olhando para eles. Kira retornou seu olhar a Mencheres para descobrir que ele a estava encarando. Ele agora tinha a agulha inserida na linha IV. Ela não olhou para outro lugar quando ele pressionou a seringa, transformando o tubo conectado á mão de Tina vermelho com o sangue dele enquanto era absorvido pelas veias dela. Kira prendeu a respiração até que a seringa estava vazia e fora da linha IV. Mencheres a pegou e deslizou até o bolso do casaco. O único traço de que alguma coisa fora do comum tinha acontecido, era o resíduo cor de rosa no fim da linha IV, onde o cateter estava conectado á carne de Tina, seguro com uma fita. ― Fique aqui, ― ele disse antes de sair do quarto. Ela não perguntou onde ele estava indo. Kira se sentou na cama e traçou sua mão em torno do pálido e imóvel braço de Tina. Quanto tempo levaria para


o sangue dele reparar os danos impiedosos que a doença de Tina havia causado? Ele só tinha lhe dado uma única seringa cheia. Talvez isso fosse tudo que ele precisava dar a ela para começar, mas então ele injetaria mais algumas seringas cheias de sangue em Tina no dia seguinte ou algo assim. Talvez ele não tivesse sangue o suficiente nele agora para dar mais. Talvez fosse isso que Mencheres tinha na cabeça, achar um doador desconhecido e se reabastecer... Um som engasgado saiu da garganta de Tina. Tudo em Kira congelou quando ela viu os olhos da irmã se abrirem. Tina piscou várias vezes antes de se engasgar de novo, a cabeça dela se virando. Seus olhos verde-mar cruzaram com os de Kira em questionamento, mas não em confusão. Tina estava acordada — e lúcida. E então o braço flácido que Kira tinha estado acariciando se levantou, e a mão de sua irmã se moveu até o tubo em sua boca. Foi tudo que Kira viu antes que seu olhar se tornasse borrado, e ela despejou uma única palavra. ― Enfermeira! ―

***** Mencheres assistiu Kira se despedir da irmã. O rosto dela ainda estava inundado de felicidade enquanto ela se abaixou para beijar a bochecha de Tina. ― Eu vou tentar vir de novo logo, ― ela murmurou ― Te amo, Pequena T. ― ― Te amo também, maninha, ― Tina respondeu, a voz delicada, mas sem a rouquidão que Tina deveria ter depois do tubo de ventilação ser removido. ― É simplesmente milagroso o quão rápido ela respondeu aos novos antibióticos, ― a enfermeira se maravilhava para Kira enquanto a acompanhava até a saída do quarto. ― Oh sim. Milagroso, ― Kira ecoou, mas ela olhou para Mencheres enquanto falou. Ele deu a ela um leve sorriso. Os efeitos curativos do sangue de vampiro ― especialmente sangue tão velho e poderoso quanto o dele ― pareceria ser de fato milagroso para a enfermeira, que não sabia. Mas Kira sabia. Ela pegou a mão dele assim que ela se aproximou, e então a levou até os lábios. ― Obrigada, ― ela arfou enquanto depositava um beijo nela.


Um gesto tão simples. O mesmo que incontáveis outros ― humanos, vampiros e ghouls ― já haviam feito a ele com o passar dos milhares de anos, mesmo assim, queimou em Mencheres com mais força do que um raio. Tudo tão rápido, o leve toque dos lábios de Kira e a delicada pressão da mão dela haviam ido, o deixando se sentindo frio sem o toque dela. Pelos deuses, essa mortal era tão perigosa para ele. ― Nós precisamos voltar agora, ― ele disse, aliviado que sua voz não tinha traído a emoção se agitando dentro dele. Kira olhou para trás para o quarto de sua irmã e concordou, um pouco da felicidade deixando seu rosto. ― Estou pronta. ― Mencheres não falou enquanto eles pegavam o elevador de volta para o primeiro andar do hospital. E nem Kira. Quando eles estavam no canto mais escuro do estacionamento, ele abriu os braços e ela andou até eles, o calor dela o envolvendo enquanto ele os lançava no céu. Em instantes, eles estavam muito acima do hospital, estavam muito acima de todos os outros prédios também, invisíveis contra a noite com o casaco negro dele se envolvendo em volta deles. O coração de Kira tamborilou contra o peito dele, o corpo dela moldado tão perto dele, que ele mal conseguia pensar em outra coisa. O vento correndo em volta deles levou o cheiro cítrico dela, mas ele sabia que o iria sentir nele mais tarde. Talvez ele não lavasse essa camisa ou casaco novamente, assim não perderia todos os traços do cheiro dela neles. Muito cedo, ele viu a silhueta do destino deles á frente. A boca dele se apertou. Era hora de eliminar a ameaça que Kira representava para ele. Ele não tinha escolha. Mencheres aterrissou no prédio e se soltou de Kira assim que ela recuperou o equilíbrio. Ela olhou em volta do terraço com confusão estampada em suas adoráveis características. ― Onde nós estamos? Aqui não é onde você vive. ― Ele se transformou em aço, prendendo todas as emoções em baixo de uma parede inalcançável ― Não, aqui é onde você vive. ― Kira olhou em volta de novo, seus olhos se arregalando enquanto ela reconhecia a paisagem urbana em torno do prédio dela ― Você quer que eu pegue algumas das minhas coisas antes de a gente voltar? ― ela perguntou em confusão ― Eu não tenho minhas chaves comigo... ― ― Você não vai voltar, ― Mencheres disse em uma voz fria e constante enquanto ele lhe entregava as chaves que ela tinha deixado na mochila no dia


em que eles se conheceram. Então, com um puxão metálico, a porta do terraço rangeu aberta ― Eu ainda não posso ouvir nada da sua mente ou controlá-la, então, é obvio que você é naturalmente imune ao meu poder. Eu te disse no hospital que meu sangue viria com um preço. Meu preço por curar sua irmã é seu silêncio em todas as coisas que você aprendeu na semana passada. Não falar sobre mim, ou eles, para ninguém. ― A boca dela se abriu em descrença, aqueles lábios naturalmente vermelhos o tentando com sua plenitude. ― Mas você disse que enquanto eu soubesse, eu nunca poderia ir... ― ― E você disse que eu podia confiar em você, ― Mencheres interrompeu delicadamente ― Então eu estou confiando em você, Kira, e deixando você ir apesar do que você sabe ― Ela não tinha ideia do quão difícil isso era para ele. Quando Kira ofereceu ela mesma voluntariamente em troca da cura de sua irmã, Mencheres tinha quase aceitado. A chance de vê-la todos os dias, aprender mais sobre ela ― e seduzi-la para a cama dele ― o havia enchido com um propósito faminto e primitivo. Ele queria mostrar a Kira coisas que ela não tinha sequer imaginado, levá-la a lugares dos quais ela só havia ouvido a respeito, e gastar com ela em extravagâncias que envergonhariam uma rainha. Isso não fazia sentido, ele mal a conhecia. Mesmo assim, algo nela o chamava em um jeito que era quase mais poderoso que ele. A última vez que ele sentiu algo tão forte por uma mulher, reinos haviam caído quando ele despertou. Mas a escuridão do submundo se assolava bem atrás dele, zombando dele sobre seu tempo já estar quase acabando. Kira tinha um futuro. Ele não. Ele tinha que libertá-la, tanto para deixá-la viver a própria vida quanto para deixá-lo terminar o que restava dele. Ela veio até ele com aquele forte andar de lutador, que estava em desacordo com sua magreza feminina, e agarrou-o em um forte abraço. ― Obrigada, ― ela sussurrou. Dessa vez, ela beijou a garganta dele, não sua mão, e o toque dos lábios quentes e macios dela estavam quase quebrando o controle dele. Ele tinha que ir. Agora. Em vez de retribuir o abraço, Mencheres alcançou dentro do casaco e tirou uma sacola. ― Pegue isso, ― ele disse, empurrando a sacola até ela ― Sangue morto-vivo não vai se degradar com o tempo. Use um quarto de cada tubo todas as vezes que a condição da sua irmã piorar. Você pode dizer que é um suprimento de ervas e injetar nela, ou colocá-lo em uma bebida forte o suficiente para que ela não sinta o gosto ―


Kira abriu a sacola, os olhos dela brilharam quando ela viu dezenas de frascos cheios com o sangue dele. Ele tinha hipnotizado uma enfermeira para providenciar os tubos enquanto Kira estava ocupada com a irmã. O conteúdo da sacola deveria ser o suficiente para conter a doença de Tina e lhe dar um tempo de vida normal. Como prometido. ― Isso quer dizer... que eu nunca mais vou ver você de novo? ― A voz de Kira soou levemente quebrada quando ela perguntou, causando uma dor cortante através dele. Ela sentia algo por ele também? Ela tinha adimitido desejo antes, mas as emoções dela teriam ido tão fundo assim? Ela iria querer ver ele de novo, mesmo sabendo que com esses frascos, ela não precisava dele para manter a irmã dela bem? Isso não importa, aquela voz obscura sussurrou. O que quer que talvez haja com Kira nunca poderia ser. Tudo que restava a ele era ter certeza de que a morte dele serviria melhor a aqueles com quem ele se importava — e frustraria Radjedef. ― Adeus, Dark Lady, ― Mencheres murmurou. E então ele se lançou para a noite.


CAPÍTULO NOVE. ― Graceling! ― Kira se virou para ver Frank usando sua habitual carranca, enquanto ele passava pelas mesas que os separavam. Seu chefe havia sentido falta dela enquanto ela esteve fora, com certeza, mas não de uma forma romântica. ― Você terminou com aqueles relatórios? ― ― Quase, ― Kira respondeu. A pilha em sua mesa foi reduzida em três quartos desde que ela retornou ao trabalho, quatro dias atrás ― e isso sem contar as coisas novas que Frank derrubou na mesa dela, e que ela tinha terminado diariamente. ― Ótimo. Os clientes não podem ser negligenciados apenas porque você ficou doente, ― Frank disse, derrubando mais uma pilha de papel de alguns centímetros sobre a mesa da Kira. ― Eu preciso destes de volta até o final do dia. ― É uma recessão económica, os empregos são difíceis de encontrar, Kira recitava mentalmente enquanto se obrigava a sorrir. Se o mercado de trabalho estivesse melhor, ela estaria tentada a dizer ao Frank para se curvar, para que ela pudesse devolver os relatórios para ele agora. ― Os terá, ― foi o que Kira disse. Frank tocou a pilha de papel. ― Se tudo estiver pronto até o fim de semana, vou te colocar no próximo caso de pessoa desaparecida que nós tivermos. Eu sei o quanto você quer um desses. ― Era uma tarde de quinta-feira. Kira teria que trabalhar até depois da meianoite e amanhã para conseguir isso, mas Frank estava certo. Ela queria missões mais sérias do que flagrar cônjuges infiéis, espionar pelo computador, ou entregar intimações. O lema do seu antigo mentor soou na mente de Kira: Salve uma vida. Bem, Mack, Kira pensou, relembrando o sorriso da Tina quando ela saiu do hospital anteontem, eu acho que salvei. Talvez se ela fosse designada para um caso de pessoa desaparecida, Kira poderia salvar duas vidas. ― Eu terei tudo pronto, ― ela disse ao Frank. Ele lhe deu a sua versão de sorriso amigável, que ainda tinha um toque mercenário. ― Ótimo, Mackey me disse que eu não me arrependeria em te contratar. ―


E ele me disse que você era um idiota, Kira acrescentou mentalmente. Mack não estava errado sobre o seu antigo parceiro, mas Frank ocasionalmente exibia uma pitada de bondade sob a sua habitual mentalidade exploradora. Ele não tem que deixar a Kira usar o carro da empresa em missões. Ele poderia apenas contratar alguém que tivesse um veículo. Kira sabia que ela mais do que compensou o uso do carro em horas extras não remuneradas, mas ainda assim. Frank merecia um reconhecimento por isso. Sua colega de trabalho, Lily, inclinou-se sobre o espaço entre as mesas delas, assim que o Frank deixou a sala. ― É a primeira vez que você faltou por doença em mais de três anos, e ele tem que se certificar que você se arrependa. ― Lily fez uma expressão chateada. ― Se há um Deus, Frank será castigado com hemorróidas. O ‘dor na bunda’ merece isso. ― Kira lhe deu um sorriso. ― Está tudo bem. Um pouco mais de incentivo me ajudará a terminar tudo. ― Lily franziu, as linhas se aprofundando em sua testa. ― Café não é suposto ser um substituto para o sono. Você tem círculos escuros sob seus olhos, garota. Você precisa tomar cuidado, ou você ficará doente de novo. ― ― Estou bem, ― Kira disse. Ela não podia dizer para a doce senhora que os círculos sob seus olhos não eram pela recuperação da gripe, mas porque pensamentos sobre um vampiro a mantinham acordada. Apesar de ter se passado vários dias desde que ele a deixou ir, Kira não parece ser capaz de tirar Mencheres de sua mente. Isso não deveria ser surpresa. Nos seis dias que ela esteve com Mencheres, ele a mostrou que duas outras espécies existiam à parte da humanidade, salvou sua vida, salvou a vida da sua irmã, a fascinou, a seduziu, a mordeu, e contra os melhores interesses de sua espécie, a libertou. Por que ela não estaria pensando nele? Cada vez que ela viu ou falou com sua irmã, Kira era relembrada sobre o Mencheres, sem falar em toda vez que ela passava por aquele armazém em seu trajeto do metrô até o apartamento dela. Seu impacto sobre a vida dela foi enorme, e agora que ele se foi, Kira sentia um agudo sentimento de perda. Ela ainda não conseguia acreditar que ele realmente a deixou ir. Nos primeiros dois dias, ela esperava que o Mencheres aparecesse do nada e dissesse que ela tinha que voltar. Alguma pequena e retorcida parte dela talvez até quisesse que ele fizesse isso, apesar de seu bom senso saber que isso era seriamente ruim. Qualquer situação em que uma pessoa tinha total poder sobre a outra não era apenas errada, era doentia. A final de contas ela foi prisioneira do Mencheres. Uma prisioneira bem tratada, talvez, e até mesmo por um bom motivo, mas ainda assim. Prisioneira e carcereiro não era a circunstância adequada para uma interação romântica, mesmo uma casual.


Embora Mencheres não parecesse estar interessado em qualquer tipo de interação com ela, romântica ou não, ele a deixou ir, a única coisa que abriu a possibilidade de Kira explorar a atração que ela sentia por ele, vampiro ou não, mas então ele deu todas as indicações de que não voltaria. Se ele quisesse vêla novamente, ele teria dito isso. Ele não teria lhe dado todo aquele sangue, o suficiente para que ela não tenha nenhuma razão para contatá-lo novamente ― não que ela tenha qualquer meio para contatá-lo. Ela não sabia exatamente onde Mencheres a manteve durante aquela semana, e ele não tinha deixado o seu número de telefone antes de se lançar para a noite. Encare, Kira pensou friamente. Você foi rejeitada. Pelo lado positivo, ele era provavelmente muito velho para ela por centenas de anos, e realmente, uma humana e um vampiro? Isso nunca funcionou. Olhe para todos os filmes do Drácula. Ou Buffy. ― Você está me ouvindo? ― A voz divertida da Lily perguntou. Kira puxou pensamentos do vampiro sombriamente atraente de volta para a sua colega de trabalho. ― Desculpe, eu… minha mente viajou, ― ela disse timidamente. ― Eu disse que você precisa dormir um pouco, ― Lily disse. ― Mas como eu sei que você não vai ouvir, deixe-me pelo menos pegar um pouco de café para você. Assim, você será capaz de passar o resto do dia sem cochilar na frente do Frank. ― ― Obrigada, você é um anjo, ― Kira disse com um sorriso agradecido. Ela tinha um longo dia à sua frente ainda, e pensar sobre o Mencheres não faria a pilha de papéis sobre a sua mesa diminuir. Café ajudaria aquela pilha de papel diminuir, no entanto. Copos e copos de café.

***** Oito horas depois, Kira saiu do transporte, colocando seu cabelo atrás da orelha em cansaço. Ele tinha se soltado do seu coque em algum momento durante a sua caminhada do seu escritório para a estação L, e ela não se preocupou em prendê-lo de volta. Pelo menos não era longo o suficiente para obscurecer a sua visão enquanto ela caminhava pela rua. Na verdade, com seu cabelo passando alguns centímetros dos ombros, Mencheres tinha o cabelo mais comprido do que ela… Pare de pensar nele, Kira se repreendeu. Ela rejeitou a primeira das três ruas que levavam para o apartamento dela, aumentando o ritmo. Ela devia ser grata pela estranha reviravolta do destino que a fez cruzar o caminho com Mencheres, porque embora ela tenha quase morrido, ela também ganhou a


capacidade de manter a doença a sua irmã sob controle. Mas ela não estava meditando sobre a doença da sua irmã enquanto continuava pensando nele. Ela se lembrava de como seus olhos negros poderiam brilhar com humor, quão graciosa e furtivamente ele se movia, o quão delicioso ele era nu, e como ela desejava ter gasto mais tempo aprendendo sobre ele, quando ela esteve presa na casa dele. Mencheres era a única pessoa a quem ela confidenciou sobre seus instintos e sobre o quão fortemente ela os seguia. Para a surpresa dela, ele não tinha achado aquilo nem um pouco ridículo ou incomum. Em vez disso, ele a aconselhou a se focar neles. Para ouvi-los. Aparentemente, sua bússola interior não parecia tão estranha para alguém que podia voar e manipular as coisas com sua mente. Embora se ela escutasse seus instintos agora, eles continuariam repetindo a mesma coisa que a esteve incomodando nos últimos vários dias ― que ela tinha perdido algo importante quando Mencheres desapareceu na noite. Havia algo mais que ela poderia ter feito para evitar que ele partisse? Como, dizer para o Mencheres que ela queria vê-lo novamente, ao invés de apenas perguntar se ele estava indo para sempre, sem declarar o que ela realmente queria? Kira estava tão preocupada com seus pensamentos que levou vários segundos para ela ver a silhueta nas sombras na frente do prédio dela. Ela apertou a alça da sua mochila e continuou, fingindo não notá-lo apesar de todos os seus músculos ficarem tensos. Quando ela estava quase na porta principal do prédio dela, uma mão disparou em sua direção. A adrenalina da Kira subiu quando ela se abaixou e deu um forte chute no tornozelo do homem, batendo sua mochila pesada nele em seguida. A formação na academia de polícia, seguida por aulas de autodefesa tornava as ações dela mais reflexivas do que planejadas. ― Ai! ― Seu suposto atacante gritou, cambaleando e pulando em uma perna. ― Kira, mas que diabos? ― Ela se deteve a tempo de chutar a virilha dele. ― Rick? ― O homem se ajeitou, a luz da rua revelando o rosto do seu meio-irmão. ― Yeah, sou eu. Maldição, você me machucou! ― Seu coração ainda estava martelando por pensar que ele fosse um assaltante em potencial com quem ela teria que lutar, tornando a sua voz aguda. ― Já passa da meia-noite, e você está oculto por ai, usando um maldito capuz e pulando em mim. Você tem sorte de eu não ter conseguido uma nova arma ainda, ou eu poderia ter atirado em você! ― ― Eu só estava tentando chamar sua atenção. ― Ele soava mais petulante do que arrependido. ― Você quase passou por mim. ―


Isso era tão parecido com Rick, não pensar antes de fazer algo estúpido. Kira deu um suspiro. Ela não estava afim de dar um sermão no seu irmãozinho agora. ― O que você está fazendo aqui tão tarde? ― Ele olhou ao redor da rua. ― Eu tentei o seu celular por dias, mas você não respondeu. Eu não conseguia me lembrar do número do seu trabalho, então eu pensei em passar por aqui e apenas esperar até você chegar em casa. Não pensei que você demoraria tanto. ― Claro que ela não atendeu seu celular. Mencheres a devolveu quando ele a deixou no seu telhado, apenas com o seu sangue e as chaves do apartamento dela, e ela não tinha conseguido um novo ainda. Ela assumia que ele ainda tinha a sua mochila, também, uma vez que era lá que ele teria pegado as suas chaves. A menos que ele tenha jogado tudo fora logo após se livrar dela naquela noite. ― Entre, ― Kira murmurou. Lá se foi os seus planos de tomar banho e ir direito ao sono assim que ela chegasse em casa. Rick sorria, as covinhas o fazendo parecer mais jovem do que seus vinte e cinco anos. Apesar de tudo, Kira sentiu um pouco da sua irritação diminuir. Talvez Rick tenha apenas se preocupado com ela quando ele não conseguia contatá-la, e esse seja o motivo de ele estar aqui. Besteira, sua voz interna sussurrou. Kira esperava que fosse seu cinismo cansado falando, e não o seu instinto. Seria legal achar que o Rick estava aqui sem segundas intenções. ― Está com fome? ― Ela perguntou, enquanto ele a seguia para o interior do edifício. ― Eu tenho algumas pizzas congeladas que você pode aquecer. ― ― Hum, eu não acho que vou ficar tanto tempo, ― , Rick resmungou, desviando o olhar. Suas esperanças despencaram. Eu te disse, aquela voz interior sussurrou. Kira não entrou no elevador mesmo quando as portas se abriram. Ela deixou cair a mochila e deu ao seu irmão um olhar cansado e duro. ― Eu disse a você, Rick, eu não vou continuar fazendo isso. ― ― Eu só preciso de uns trocados, ― ele disse, agora encontrando o olhar dela. Seus olhos verdes, mais escuros que os dela, se ampliaram


daquela forma suplicante que ele aperfeiçoou. ― Tem sido realmente difícil tentar encontrar trabalho, e… ― ― Talvez se você pudesse passar em um exame toxicológico, seria mais fácil conseguir um emprego, ― Kira disse friamente. Rick balançou uma mão. ― Eu parei, eu juro. Eu só fumo uma erva de vez em quando, isso é tudo. Veja, Joey diz que vai me expulsar se eu não lhe der cem dólares até amanhã. Eu tenho uma entrevista marcada de manhã, e parece realmente bom, mas se eu for contratado, eu ainda não serei pago antes de o Joey me jogar para fora. ― ― Besteira, ― Kira disse, ecoando sua voz interior. ― Já passa da meia noite, de jeito nenhum você vai para uma entrevista amanhã de manhã. Mesmo se você não tiver uma marcada, você vai apenas acabar dormindo além do horário. Você não pode continuar me procurando por dinheiro. Eu te disse antes, eu não tenho um monte, e… ― ― E o que você tem, você dá para a Tina e as contas dela, ― Rick interrompeu amargamente. ― Você não pensa duas vezes antes de entregar um cheque, se for ela pedindo. ― Kira sentiu a raiva subindo, superando seu cansaço. ― Não se atreva. É a doença da Tina que a impede de trabalhar num emprego normal, e não preguiça como você, e ela quase morreu na semana passada. Não que você saiba, pois dificilmente você se mantém em contato com ela. ― Rick abaixou a cabeça, tendo a graça de parecer envergonhado. ― Desculpe, ― ele murmurou. ― Ela está melhor? Ainda está no hospital? ― Graças ao Mencheres, Tina estava ainda melhor do que ela sabia. Em voz alta, Kira disse: ― Ela está em casa agora. Você devia ligar para ela. Ela gostaria de notícias suas. ― ― Yeah, yeah, eu ligo para ela amanhã, ― Rick disse de uma vez. ― Você sabe que eu não sou tão próximo dela como sou de você, mas eu ainda me importo com a Tina, mesmo que ela não seja o meu sangue. ― A filiação deles tornava as coisas mais complicadas. Os pais da Kira foram hippies que defendiam o amor livre, mesmo depois que eles se casaram. Kira e Tina tinham a mesma mãe, mas pais diferentes. Kira e Rick tinham o mesmo pai, mas mães diferentes. Tecnicamente, Rick e Tina não tinham ligações sanguíneas, mas Tina sempre considerou Rick como seu irmão, apesar disso, e apesar de não terem crescido na mesma casa, como ela e Kira. ― Eu juro, esta vai ser a última vez que eu te peço qualquer coisa, ― Rick continuou, dando-lhe mais daqueles olhos de cachorrinho. ― E eu vou te pagar de volta, eu prometo. ―


Se Kira ganhasse um dólar para cada vez que ela ouviu aquilo, ela poderia comprar um carro. Mas numa possibilidade remota de que Rick realmente tenha largado seu vício e estava tentando mudar de vida… ― Esta é a última vez, ― ela lhe disse, puxando a sua carteira. ― Eu falo sério. ― Rick sorriu de uma forma que a fez se lembrar de quando eles eram crianças, e ela estava muito animada para ter um irmãozinho. Aquele que quase apagava a dor da separação dos seus pais, e o seu pai se mudando para outro estado, quando ele se apaixonou por outra pessoa. ― Você é a melhor, mana. ― Kira preencheu o cheque de cem dólares e entregou ao Rick. Ele o embolsou imediatamente, então arrastou os pés, enquanto olhava para fora. ― Você não teria uma nota de vinte para que eu possa pegar um táxi de volta à minha casa, teria? É meio tarde para andar. Você conhece aquele bairro. Além disso, meu tornozelo está doendo. Você chutou muito forte. ― Kira cerrou os dentes. Se ela não tivesse visto onde Rick morava, ela se recusaria terminantemente àquela segunda doação, mas era um bairro assustador. Ela entregou uma nota de vinte, que desapareceu no bolso Rick tão rápido quanto o cheque. ― Te amo, mana, ― ele disse, dando-lhe um beijo rápido. Então ele saiu do prédio, assobiando. Kira chamou o elevador, ignorando aquela voz interior dizendo que ela havia sido enganada por seu irmão mais uma vez.

***** Mencheres silenciosamente pulou para o telhado em frente ao prédio da Kira, sentando-se sobre o piso fresco de concreto. Quão perto ele esteve de matar o irmão da Kira, nenhum deles jamais saberia. Talvez agora você pare com essa loucura de segui-la noite após noite, ele se repreendeu. Quando ele viu o homem estender a mão para Kira enquanto ela se aproximava do seu prédio, ele já havia saltado do telhado, com a intenção de rasgar a garganta de quem quer que a ameaçava, quando o atacante chamou o nome dela. Kira e seu irmão estavam ambos indiferentes à uma forma escura voando para eles, ou como aquilo mergulhou abruptamente para a esquerda quando Kira também chamou o rapaz pelo nome. Se um deles tivesse ficado em silêncio por apenas alguns segundos a mais…


Embora a morte do menino não teria sido uma grande perda, pelo que Mencheres ouviu da conversa deles. O cheiro do garoto confirmou que ele estava mentindo sobre a entrevista, mentindo sobre estar fora das drogas, e mentindo sobre o táxi, como ele provou por descer a rua a pé em vez de ligar para o transporte. Se Mencheres não tivesse ouvido o canalha chamá-la de ― irmã ― , ele teria matado o rapaz por princípios depois que ele enganou a Kira por dinheiro. Pelas palavras dela ― e pelas observações do Mencheres ― Kira não tinha fundos suficientes para sustentar a si mesma, seu irmão desonesto, e sua irmã doente. Ver sua bondade ser aproveitada fez a raiva queimar nele. Você tem sorte por compartilhar o sangue dela, Mencheres pensou sobre o jovem tolo ainda descendo a rua. Ou eu estaria espalhando o seu pela sarjeta essa noite. No minuto seguinte, a janela do apartamento de Kira brilhou com uma luz suave. Mencheres relaxou. Ela estava em segurança lá dentro agora. Ele pegou um vislumbre dela quando ela passou pela janela em seu caminho para o quarto. Mesmo que ela fosse dormir logo, Kira tinha menos de sete horas até ela ter que estar de volta ao seu trabalho novamente. As longas jornadas de trabalho dela o incomodavam. Ela não voltou para casa antes das dez horas até uma noite desta semana, e hoje, ela tinha ficado fora até ainda mais tarde. Não estava certo ela trabalhar até essas horas. Você precisa parar com isso, seu senso comum protestava contra ele. Ali estava ele, empoleirado como uma gárgula em um telhado, encarando uma mulher que implorou para ser livre dele. Havia uma palavra moderna apropriada para as suas ações: ― perseguidor. ― Ele nem se incomodou em fingir que ele só perseguiu a Kira estas últimas várias noites passadas para garantir que ela manteve a palavra de não revelar o que ela aprendeu sobre vampiros. Ele sabia que estava aqui por uma razão ― ele queria vê-la novamente, mesmo se ele não a alertasse sobre a sua presença. Apesar de Kira não estar mais sob seu teto, ela ainda conseguia dominar seus pensamentos em um grau perigoso. Mesmo agora, ele se perguntava o que ela faria se ele aparecesse na sua porta. Será que ela o receberia em sua casa? E se ela recebesse, ele seria forte o suficiente para sair? Ou a proximidade dela, seu cheiro tentador, e a melodia suave de sua voz seriam o suficiente para fazê-lo abandonar todos os seus planos cuidadosos em favor da possibilidade de ficar com ela? Melhor não descobrir. Kira o fez querer viver, o fez querer lutar com Radjedef até o amargo, e sangrento final, independentemente das consequências, e ele não podia se permitir esse tipo de pensamento. Seu pessoal não podia pagar. Eles sofreram o suficiente na última vez que ele deixou as suas emoções por uma mulher influenciar suas ações.


Mencheres se obrigou a se virar, embora o brilho suave em sua janela provasse que Kira ainda estava acordada. Ele tinha que cessar essa loucura. Pelo que ele viu nos últimos vários dias, Kira tinha resolvido voltar a uma vida de trabalho duro e cuidar de sua irmã, semelhante à forma como seu tempo era gasto em tarefas relacionadas com o seu povo. Mas mesmo que isso parecesse solitário ― outra coisa que eles tinham em comum ― esta ainda era a vida dela, e ela não o incluía. Ele se entregou ao abraço do vento quando voou para longe. Esta seria a última noite que ele a seguiu. Tinha que ser, mas ele ainda faria uma pequena coisa antes de expulsar a Kira de sua vida completamente.


CAPÍTULO DEZ. Kira gemeu mentalmente quando ouviu a voz de Frank cortando através do ritmo usual de sons no escritório. Ao lado dela, Lily deu a Kira um olhar simpático. ― Começou cedo hoje, não é? ― Lily murmurou. ― Onde está Graceling? ― Frank chamou. Antes de Kira ter a chance de responder, Frank entrou pela porta. Ela estampou uma fraca versão de sorriso em seu rosto, se preparando para o que tenha o feito procurá-la antes das nove da manhã. ― Eu terminei os relatórios da semana passada e eu devo terminar os novos até o fim do dia. ― Kira disse, se adiantando antes que o Frank pudesse exigir saber uma posição. Frank derrubou alguma coisa sobre a mesa de Kira que por uma vez não era uma pilha de papéis. Ela olhou para as chaves do carro em confusão. ― Eu as deixei aqui? Eu pensei que elas estavam na minha bolsa… ― ― Estes são o meu conjunto de chaves para o carro da empresa, ― Frank disse. Ele sorria. ― Eu estou dando a você. Você merece isso. ― O queixo da Kira caiu enquanto ela ouvia Lily derrubar algo que soou como a xícara de café dela. ― Você esta dando para mim? ― Ela repetiu, olhando para o calendário. Não, não era primeiro de Abril ― a menos que Frank esteja fazendo a brincadeira algumas semanas atrasado. ― Além disso, eu estou te dando um aumento, ― Frank continuou. ― E eu quero você fora do escritório as seis horas toda noite que você não estiver de tocaia. Você trabalha muito duro. ― Uma extravagante boa ação vinda de Frank, Kira poderia acreditar que era a tentativa dele de equilibrar o seu Karma ruim ou algo assim. Três extravagantes boas ações... ou ele estava drogado, ou esta era sua ideia de piada. ― Eu estou esperando o final da piada, ― Kira disse cautelosamente. Frank riu alto e caloroso, confirmando sua suspeita de que ele estava brincando. Ela queria bater nele. Aquele homem tinha um senso de humor verdadeiramente doentio. Então Frank colocou um envelope na mesa dela. ― Abra. ―


Kira rasgou o selo, olhando uma vez para Lily, para receber apoio moral, antes que ela tirou o conteúdo de dentro. Ele continha dois papeis. Um deles era o documento do carro da empresa, assinado por Frank e fazendo dela a nova proprietária. E um cheque de dois mil dólares também nomeado a ela, era o outro pedaço de papel. ― Fiz seu aumento retroativo, ― Frank disse, ainda no mesmo tom alegre que ela só o ouvia usar com clientes. ― Bom trabalho, Graceling. ― Kira apenas encarou enquanto Frank se afastava. Ela estava atordoada demais para sequer dizer obrigado. ― O que diabos acabou de acontecer? ― Lily sussurrou ― Quero dizer, você merece tudo isso, mas o Frank é tão mesquinho, eu não posso acreditar que ele fez isso! ― Nem Kira podia. Frank deve ter sido visitado pelo Fantasma do Natal Futuro ou algo assim. Caso contrário, sua transformação abrupta do mesquinho chefe Scrooge9 ao generoso benfeitor alegre não era nada menos do que milagrosa. Milagrosa. ― Oh, meu Deus, ― Kira sussurrou. ― O que? ― Lily perguntou. ― Eu... nada. ― Kira girou sua cadeira, tomando várias respirações profundas e irregulares. Frank não tinha experimentado uma mudança milagrosa após uma visita do Fantasma do Natal Futuro. Não, ele deve ter experimentado algo mais incomum ― uma visita de um vampiro controlador de mentes em algum momento entre ontem e hoje. Mencheres. Seu coração começou a martelar. O que você está fazendo?

***** Kira colocou outra pilha de pastas na mala do carro que Frank deu e parou para acenar para Lily do outro lado do estacionamento. ― O que você esta fazendo com tudo isso, garota? Não é para você sair do trabalho em horário decente, apenas para você poder trabalhar a noite toda em casa, ― Lily gritou.

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A tradução é avarento, mas está com letra maiúscula, se referindo ao personagem Scrooge, daquele filme de natal, Os Fantasmas de Scrooge.


― Essas são para, hum, um projeto paralelo, ― Kira gaguejou. Um projeto muito paralelo. ― Algumas pessoas chamam namoro de projeto paralelo, também. Você devia tentar ao invés disso, ― Lily gargalhou. Kira quase corou. Se Lily soubesse... ― Boa noite, vejo você amanhã, ― Foi o que ela disse, com outro aceno. Levava aproximadamente o mesmo tempo para chegar a West Loop de carro que quando ela caminhava e pegava a Linha Verde, como Kira descobriu. Ainda assim, era infinitamente mais agradável não precisar carregar a mochila pesada, ou ficar tensa a cada sombra por qual passava ao longo das ruas quando ela trabalhava até tarde. Ela só precisa comprar uma esteira ou ir a uma academia a partir de agora. Assim que ela estacionou o carro na garagem de seu prédio, Kira não pode evitar olhar ao redor. Mencheres estava por perto? O pensamento mandou um estremecimento de emoção por ela. Ou ele hipnotizou Frank no escritório sem que ninguém o notasse? Era possível. Mencheres se move tão rapidamente, ele poderia ter entrado e saído sem Kira, ou ninguém, vê-lo. E por que ele fez isso? Capricho? Tédio? Ou como uma dica de que ele queria que ela o encontrasse? Mencheres sabia que ela trabalhava para um investigador privado. Ele sabia que ela teve casos em que clientes falavam de acontecimentos estranhos que ela tinha rejeitado... mas agora ela compreendia que pode ter sido verdade. Se hipnotizar seu chefe a lhe dar seu carro e dinheiro era a maneira de Mencheres de deixar migalhas de pão no chão para ver se Kira as seguia, funcionou. A chance de vê-lo novamente, não como sua prisioneira, mas como mulher, fez mais tremores de alegria correr por ela. Ela tinha mil boas razões de porque vê-lo seria um erro, mas o instinto as superava, não importando o quanto ela pensasse sobre aquilo. Tudo bem, Mencheres. Eu estou pegando a isca. Duas viagens no seu carro para o seu apartamento depois, e ela tinha todas as caixas de arquivos distribuídos em sua sala de estar. Cada caso tinha algum tipo de ocorrência que poderia ser de natureza sobrenatural, seja de testemunhas histéricas, evidências estranhas deixadas nas cenas, ou rumores de envolvimento de coisas mais estranhas que ocultismo. Kira pretendia passar por todos eles até encontrar algo em comum. Mencheres poderia ter ficado em sua casa a maior parte do tempo em que ela estava com ele, mas ela tinha um sentimento de que quase não sair de casa não era o seu comportamento normal ― ou o comportamento normal da maioria dos vampiros.


Era hora de seguir seus instintos. Com sorte, haveria algo naqueles arquivos, e ela acharia algo que pudesse a levar ao Mencheres. Se isso não funcionar, ela pesquisaria na internet em seguida. Ou ela sempre poderia gravar uma bat-imagem na janela do seu apartamento, com um sinal de Bem-vindo, mas Kira pensou que isso poderia afastá-lo. Ela pegou a primeira pasta. Siga as migalhas de pão.

***** Gorgon apareceu na porta do quarto, mas Mencheres não se preocupou em abrir seus olhos. Ele sabia quem o Gorgon tinha vindo anunciar. Ele o tinha ouvido chegar. ― Diga a ele que eu descerei em seguida, ― Mencheres disse. ― Sim, criador, ― Gorgon respondeu. Mencheres abriu os olhos uma vez que Gorgon fechou a porta. Ele encarou o teto por vários longos segundos, não vendo o seus padrões pálidos, mas tentando ver o futuro, esperando que alguma coisa tenha mudado. Talvez o novo vigor de vida que Kira tinha, de alguma forma, colocado nele, tenha alterado a visão do futuro que ele viu antes. Seu poder se estendeu, levantando o véu que separa o agora do depois, mas em vez de imagens de pessoas, lugares ou acontecimentos, tudo o que Mencheres viu foi uma manta de ébano tão vasta e insondável quanto o universo. O submundo de Duat, esperando por ele. Assim como antes. Mencheres se levantou da cama. Seu destino ainda era a morte, mas ao invés da aceitação que ele sentiu quando viu pela primeira vez o iminente vazio infinito, agora aquilo o irritou. A morte havia se tornado uma amarga derrota em vez de uma maneira atraente e lógica de derrotar Radjedef ao liberar o fardo que ele há muito carregava, e tudo por causa de Kira. Ele apertou sua mandíbula. Quão cruéis os deuses eram por enviá-la para a sua vida. Ela o fez querer viver quando ele não tinha mais tempo. E ainda menos tempo de reclamar sobre o seu destino, Mencheres lembrou a si mesmo. Ele pegou o envelope em sua mesa de cabeceira, antes de sair do quarto. Algumas coisas ele ainda tinha controle, mesmo que o seu futuro não fosse uma delas. Mencheres desceu para o hall de entrada. Um vampiro estava perto da porta, o seu encaracolado cabelo escuro cortado curto e seu corpo magro


envolto em calças pretas casuais e uma camisa pulôver. Por um momento, Mencheres o encarou. Meu co-regente. Meu herdeiro. E o assassino de sua esposa. ― Bones, ― ele disse em saudação. ― Obrigado por ter vindo. ― Olhos castanhos escuros o encontraram com uma frieza que ainda magoava, mesmo que Mencheres soubesse que ele a merecia. ― Você disse que era urgente, ― Bones respondeu, um sotaque britânico colorindo suas palavras, mesmo depois de séculos. ― Eu não confiava nisso para ser transmitido, mesmo através dos membros da nossa linha, ― Mencheres disse, não se incomodando com qualquer gentileza formal. Bones sempre preferiu ir direto aos negócios. Ele estendeu a pasta de papel manilha que continha todas as informações pessoais de Kira. ― Coloque isto junto com meus outros itens de herança. ― Bones arqueou uma sobrancelha quando ele tomou a pasta que era para ser aberta somente no caso da morte de Mencheres. Ele não sabia, mas pegando aquilo, Bones tinha acabado de assumir responsabilidade por Kira uma vez que Mencheres tenha partido. ― Ainda pensando que está prestes a ser murchado, avô? ― Bones perguntou com uma dica de escárnio na voz. ― Impotência de visão não significa necessariamente a morte iminente. Pode ser apenas uma perda temporária. ― Bones sabia que Mencheres tinha perdidos as visões do futuro, mas Mencheres não tinha dito ao seu co-agente que a única coisa que ele via pela frente para ele era a escuridão. Ele também não tinha dito ao Bones que a sua guerra fria com Radjedef estava esquentando. Bones se sentiria obrigado a agir para ajudar com ambas as informações, e Mencheres não queria isso. Ele vai resolver seus próprios problemas no tempo que lhe restava. ― É insensato não estar preparado para qualquer eventualidade, ― Mencheres disse com um dar de ombros. ― De fato. Falando de se preparar para qualquer eventualidade, podemos ter um problema com alguns ghouls. Já ouvi relatos de que alguns vampiros sem mestres desapareceram nas últimas semanas, com gangues ghoul como principais suspeitos. ― Mencheres escondeu um sorriso amargo quando ele voltou a pensar na manhã no armazém. ― Eu tenho ouvido a mesma coisa. ―


― Poderia não ser nada mais do que alguns idiotas precisando de uma lição, ― Bones disse. ― Mas também poderia se Apollyon agitando as coisas com mais da sua podridão sobre minha esposa ser uma ameaça para a nação ghoul. Eu vou verificar isso. Pensei que você iria querer saber. ― Outra razão pela qual Mencheres estava frustrado por sua morte iminente. Bones ser deixado para lidar com esta ameaça sem ele, se ele estiver certo, e Apollyon estar envolvido. Sua morte significa que ele estaria deixando o seu co-agente quando Bones mais precisava dele. Mais uma vez, Mencheres amaldiçoou a escuridão surgindo em suas visões. ― Como a Cat está? ― Ele perguntou, forçando de volta sua raiva contra o seu destino. ― Muito bem, ― Bones respondeu. Seu lábio se curvando. ― Ela disse para mandar a você seus lamentos por não ter podido vir hoje. ― Mencheres deu ao Bones um sorriso seco. ― Sim, tenho certeza que ela lamenta profundamente não poder me ver. ― ― Você apagou a memória dela sobre um vampiro que a raptou e a coagiu a se casar com ele quando ela tinha apenas dezesseis anos, ― Bones disse suavemente. Seus olhos brilhando verdes. ― E então você não se preocupou em dizer para nenhum de nós sobre isso até que o vampiro veio atrás dela novamente doze anos depois, ou nos dizer o motivo pelo qual ele a queria tanto. Esse tipo de traição tende a se prolongar. ― ― Caminhe comigo, ― Mencheres respondeu, não comentando aquilo. Ele saiu para o jardim, parando perto da pequena piscina brilhando, esperando até Bones estar ao lado dele antes de falar novamente. ― O futuro é como a água. Todas as nossas ações fazem ele ondular, alterando seu reflexo. Se eu tivesse dito a você ou a Cat o que estava por vir, você teria alterado suas ações, tornando o reflexo de quem você é diferente do que você estava destinado a ser. Nós todos gostaríamos de mudar o nosso futuro para o caminho mais simples, a linha mais reta, a estrada para o menor arrependimento, ― ― Mencheres parou para sorrir ironicamente ― ― Mas então o resultado final não seria o mesmo. ― ― É fácil falar quando você é o cara que pode ver o resultado final com antecedência, ― Bones respondeu com uma tensão em seu tom. ― O resto de nós tem que se perguntar se aqueles que amamos vão sofrer ou morrer por causa de nossas ações. ― ― Nós todos nos perguntamos, ― Mencheres disse calmamente. ― Mesmo se nós soubermos, nós ainda nos perguntamos. ―


Bones não disse nada. Então ele pegou um pequeno seixo e o jogou distraidamente no reflexo da piscina. ― Eu venho querendo te perguntar algo, avô. Você disse que tinha visto antes mesmo de eu ter nascido que eu seria a pessoa com quem você compartilharia o seu poder. Então, por que você mesmo não me transformou em vampiro? Você estava lá naquela noite. No entanto, você deixou Ian ser meu criador ao invés. ― ― Para te manter seguro. Patra procurava entre o meu povo por aquele que eu profetizei que a assassinaria. Minha esposa achou que seria alguém que eu tinha criado. Você era incomumente forte, Bones, até mesmo como um vampiro jovem. Se eu tivesse te transformado, você poderia ser ainda mais forte ― forte demais para passar despercebido por Patra por tanto tempo quanto passou. Então eu deixei Ian te transformar. Desse modo você ainda seria da minha linha de sangue, por eu ter criado o Ian, mas isso te deu a chance de crescer sem despertar o interesse letal da Patra até que estivesse pronto para derrotá-la. Como eu disse ― Mencheres apontou para a água refletindo na piscina, que ainda vibrava pelo seixo que o Bones atirou nela, ― A menor ondulação pode mudar tudo. ― Bones deu ao Mencheres um olhar indecifrável. ― O poder que você compartilhou comigo aumentou a minha força e me deu a habilidade de ler a mentes dos seres humanos, tudo na primeira noite. Já faz quase um ano e meio desde então. Você não se perguntou se alguma coisa surgiu nesse tempo? ― Mencheres encarou o Bones, sem piscar. ― Eu acho que se você manifestasse mais dos meus poderes, você me diria. ― Um fantasma de um sorriso apareceu nos lábios de Bones. ― Talvez. A menos, é claro, se isso puder causar uma ondulação problemática nos eventos futuros. ― Bones começou a manifestar os poderes da visão? Foi assim que começou com Mencheres quando ele não era muito mais velho que Bones, ele pegava flashes pequenos e indistintos que ele primeiro pensou que fosse apenas imaginação e mais tarde percebeu que eram pequenas partes do futuro. Então, novamente, havia também a possibilidade de Bones estar apenas brincando com ele. Bones sabia que a perda da visão de Mencheres o perturbava, e o lado frio do Bones podia pensar que era uma vingança apropriada manter Mencheres acreditando que Bones sabia algo sobre o futuro, mas não lhe dizer. Assim como Mencheres não contou a ele o que sabia sobre Bones e Cat.


Mas e se Bones não estivesse apenas brincando com ele… ― Então eu só posso confiar no voto de sangue que fizemos quando unimos as nossas linhas, ― Mencheres disse, seu tom endurecendo. ― Apesar do que aconteceu no passado, eu mantive minha promessa de fazer tudo o que era melhor para você a para a nossa linha. ― Bones acenou uma vez para a piscina antes de se afastar. ― Eu não pretendo trair o voto que fiz quando forjamos nossa aliança. Mas mantenha em mente aquelas ondulações, companheiro. Elas podem te surpreender com o que elas trazem. ―


CAPÍTULO ONZE. Kira soltou um forte suspiro quando parou do lado de fora de um clube chamado Around the World. Provavelmente este seria outro desperdício de tempo. Sete noites seguidas indo a bares, clubes e até mesmo cafés onde houveram relatos de acontecimentos inexplicáveis ou sobrenaturais até agora resultaram em nada. Bem, exceto dormir ainda menos do que ela dormia antes, pagar grandes contas para cobrir as despesas, ser abordada por homens e mulheres, e não encontrar qualquer evidência sobre alguma presença vampírica. Além disso, Kira começava a se perguntar se ela tinha visto muita coisa no gesto de Mencheres com o seu chefe. Se ele realmente quisesse vê-la novamente, ele poderia ter deixado um cartão em sua porta. Ligado para ela. Devolvido o celular dela com o numero dele gravado na agenda, algo mais fácil de seguir. Dúvida corria dentro dela. Mencheres sabia onde ela trabalhava e onde vivia, e ainda assim se passou uma semana sem ver ou ouvir nada dele desde que ele hipnotizou o seu chefe. Tudo o que ela tinha a direcionando era uma irritante persistência que dizia que o Mencheres não queria desaparecer de sua vida, apesar de seu desaparecimento muito eficaz. Ou o seu instinto estava errado e as coisas estavam acontecendo exatamente como Mencheres queria. Ele disse adeus, e ele não tinha entrado em contato com ela desde então. Talvez fosse hora dela pegar a dica e parar de persegui-lo. Se este lugar não der em nada, ela teria que reexaminar suas ações. Ela podia estar querendo tanto ver Mencheres novamente que aquilo estava nublando seu julgamento, fazendo-a pensar que seu instinto estava lhe dizendo algo que não estava. Uma última missão de exploração, ela decidiu, entrando no clube. Pena que este era o último lugar em sua lista de estabelecimentos que Mencheres ou outros vampiros iriam. Era um clube de strip, e de algum modo ela não conseguia imaginar o educado Mencheres pagando para ver mulheres tirando a roupa. Quanto a outros vampiros... Bem, eles poderiam hipnotizar as mulheres para elas tirarem as roupas, se eles quisessem. Por que comprar a vaca se você pode obter o leite de graça, como diz o velho ditado. Kira pagou a entrada e foi avisada que a consumação mínima do bar eram três cervejas. Uma vez lá dentro, ela fez uma varredura lenta do interior, que consistia em vários bares, um palco enorme com uma pista, uma área VIP isolada por várias luzes que vertiam do chão ao teto e revestida de tapetes, e uma pequena área de refeições, para sua surpresa. O interior do Around the World era um lugar muito mais sofisticado do que ela esperava, mas ela não


tinha planos de se tornar uma cliente regular. Aplausos sinalizaram que uma dançarina tinha acabado de entrar no palco. Kira decidiu encontrar um lugar para se sentar e pedir uma bebida. Esta era sua última noite de exploração, afinal. Ela poderia muito bem ficar até dar uma boa olhada na clientela do clube. Ainda era apenas 21:00. Provavelmente cedo demais para todos os frequentadores. Uma hora e meia depois, Kira tinha sido abordada por cerca de uma dúzia de homens tentando comprar bebidas para ela, ficar com ela, ou não precisar pagar pela atenção das mulheres em que eles deveriam estar focados. Kira manteve suas recusas rápidas e objetivas, fazendo com que alguns deles comentassem rudemente sobre o que eles pensavam sobre a sua orientação sexual. Ela não se importava. O que quer que os fizesse sentir melhor depois de serem rejeitados. Uma nova explosão de música anunciou a próxima dançarina no palco. Kira olhou ao redor, sua atenção mais focada em ver se alguma das pessoas ao redor do palco tinha aquela intrigante pele pálida ou movimentos muito rápidos, do que na dançarina, quando seus olhos se estreitaram. Aquela dançarina lhe parecia familiar. Se ela parasse de balançar seus cabelos tão selvagemente enquanto dançava no poste, Kira poderia dar uma olhada melhor no rosto dela para ter certeza. Ela se levantou de sua cadeira, aproximando-se do palco. A dançarina executava várias manobras atléticas e eróticas que mostravam sua flexibilidade, mas ainda não deu a Kira uma boa visão de seu rosto. Kira tirou algum dinheiro de sua carteira e soltou um assovio alto, ignorando os comentários de alguns homens perto dela. Se essa garota era quem Kira pensava que era… A dançarina se virou com um sorriso sensual, curvando-se e colocando a coxa com cinta liga muito perto do rosto de Kira. Ela não olhou para a parte inferior da menina, nua e perto o suficiente para Kira se sentir desconfortável. Ela procurou as feições pesadamente maquiadas da garota, comparando-as com as fotografias que ela acabou de ver em um daqueles arquivos de pessoas desaparecidas. Mais velha, sim, e parecia malditamente menos tímida, mas essa era Jennifer Jackson. ― Depressa, ― alguém gritou para Kira. Ela colocou uma nota de vinte dentro da cinta liga em frente a ela. Jennifer piscou para Kira e desfilou para longe, continuando com a sua apresentação. Kira apenas a encarou, não vendo realmente os movimentos explícitos, mas concentrada em se lembrar do que estava nos arquivos da Jennifer.


Desaparecida há três anos quando ela tinha dezessete. Pensava-se que tinha fugido com o namorado mais velho, chamado Flare, nome verdadeiro desconhecido. O registro de Jennifer como uma estudante de ensino médio faltosa e envolvida com drogas reforçou a opinião dos policias de que ela simplesmente deixou a cidade para escapar dos seus pais rigorosos. Os pais de Jennifer discordaram e contrataram Frank dois anos atrás, mas ele não chegou a lugar nenhum. O desaparecimento de Jennifer estava na pilha ‘Arquivo morto’ de Frank agora. Isso foi parar no apartamento de Kira por que na entrevista de Frank com um dos antigos namorados de Jennifer, ele disse a Frank que Jennifer tinha ido procurá-lo pedindo ajuda para escapar de Flare, que ‘não era humano’. Jennifer tinha marcado um encontro com seu antigo namorado do lado de fora da Around the World, mas supostamente nunca apareceu. O interrogatório de Frank com o pessoal do Around the World resultou em todos eles dizendo que nunca viram Jennifer, mas ela estava ali, dançando nua e usando o nome artístico de Candy Corn, e ainda um ano mais jovem do que a lei permite para entrar nesse tipo de lugar. Jennifer poderia realmente ter se escondido em plena vista esse tempo todo? Ou será que ninguém se lembra dela porque Jennifer estava certa, e o namorado dela, Flare, não era humano? Kira tomou uma respiração profunda. Ela só veio aqui para dar uma olhada no mundo dos vampiros, na esperança de isso levá-la ao Mencheres. Não se envolver em um caso de uma menina que poderia ter se tornado uma stripper involuntária por um vampiro. Jennifer tinha pedido ajuda ao seu namorado dois anos atrás. Não soa como se Jennifer quisesse estar nessa situação, mas as coisas poderiam ter mudado. Se não mudaram, e Jennifer estava sendo mantida por um vampiro contra a sua vontade, seria malditamente difícil para Kira ajudar a Jennifer a fazer algo a respeito, como Kira sabia por experiência própria. Salve uma vida, a crença do Mack ecoou em sua mente. Mack não escolheu o caminho mais fácil quando teve a oportunidade há mais de uma década atrás. Se ele tivesse, Kira provavelmente não estaria viva agora. Essa situação estava acima da capacidade dela, sim, mas Kira não podia simplesmente partir, sem sequer tentar ver se Jennifer precisava de sua ajuda. Ela endireitou os ombros e fez sinal para a garçonete que caminhava de topless. ― Com quem eu falo para agendar uma dança no colo particular? ―

*****


Kira sentou em uma das cabines privadas que estavam distribuídas pelo resto do lugar. Após vários minutos, as cortinas escuras se abriram, e Jennifer apareceu, sorrindo sedutoramente enquanto ela se aproximava. ― Oi, linda, ― Jennifer cantarolou, passando as mãos pelas pernas de Kira quando ela começou a mover os seus quadris. ― Eu estava esperando que fosse você esperando por mim… ― ― Jennifer, ― Kira disse calmamente. ― Jennifer Jackson. ― A garota pausou, os olhos vasculhando o lugar. Então ela começou a se ondular como uma cobra novamente, inclinando-se para escovar seus seios contra as pernas de Kira. ― Como você sabe o meu nome? ― ela sussurrou. Esta era uma forma incômoda de manter uma conversa. Jennifer estava nua, exeto pelo extremamente pequeno fio dental, e ela continuava se esfregando e balançando o corpo contra Kira. Kira assumiu que as cabines estavam sendo monitoradas, já que Jennifer continuou a dança no colo, embora ela já imaginasse que Kira não estava aqui apenas pela exitação. Jennifer não parecia ter medo de reconhecer verbalmente o seu nome verdadeiro, embora, então talvez o monitoramento fosse apenas visual. Kira tentou botar uma expressão apreciativa no rosto e ignorar as partes mais suaves de Jennifer pressionando sobre ela enquanto ela falava. ― Eu sou uma investigadora contratada pelos seus pais, ― Kira sussurrou de volta. O rosto de Jennifer se contorceu embora o sorriso congelado permanecesse. ― Eles não podem me ajudar. Nem você pode. Saia antes que te descubram, ou voce pode acabar como eu. ― Pobre menina claramente soava como se estivesse aqui contra sua vontade. A resolução de Kira se reforçou. Alguém tinha forçado Jennifer a desaparecer da vida de sua família quando ela tinha dezessete anos, para se tornar uma stripper. E se a irmãzinha de Kira fosse a raptada tão jovem, e alguém que pudesse ajudar a Tina, não fizesse porque poderia ser muito perigoso? Ela queria se tornar policial para proteger as pessoas que precisassem. Bem, ali estava alguém que realmente precisava, e Kira podia ser a única que sabia o suficiente sobre o que prendia a Jennifer para ajudá-la a fugir. ― Flare fez as pessoas esquecerem que te viram quando você tentou fugir antes? ― Kira perguntou, voltando a agir. Jennifer parou em meio ao movimento de se sentar de pernas abertas nela. ― Quem é você? Como você sabe disso? ―


― Continue dançando, ― Kira assobiou. Jennifer começou a se contorcer sensualmente novamente, mesmo que seu sorriso ensaiado tivesse desaparecido. ― Eu sou alguém que sabe que tipo de criatura pode fazer as pessoas esquecerem o que tinham visto com apenas um olhar, ― Kira disse, sua confiança crescendo quando a expressão de Jennifer passou de suspeita para esperança. Ela iria pendurar um bat-sinal na janela do seu apartamento e acender uma enorme luz por trás da janela para chamar a atenção do Mencheres se ela precisasse. Ou ela colocaria anúncios nos jornais com uma foto dela e um apelo para alguém alto, moreno e morto entrar em contato com ela. Todos exceto o Mencheres pensariam que ela era apenas uma mulher louca e excitada. Mencheres manteve Kira em cativeiro antes, sim, mas ele foi impecável em seu tratamento cortês com ela. Kira não podia imaginar que ele iria tolerar outro vampiro sequestrando uma adolescente de sua família e a forçando a se tornar uma stripper. ― E eu sou alguém com uma arma com balas de prata em minha bolsa, ― Kira continuou. ― Se você vier comigo, Jennifer, eu vou tentar te tirar disso. Eu ― eu conheço alguém que pode te ajudar. ― Pelo quão desesperançosa Jennifer soou antes, ela provavelmente não tentou escapar em anos. Com sorte, Flare não estaria aqui hoje a noite, e quaisquer outros que deveriam manter um olho em Jennifer ficaram relaxados sobre ela. Se ela e Jennifer quietamente se esquivassem pela entrada dos fundos, elas poderiam estar longe antes que qualquer segurança ou funcionário notasse… As cortinas se abriram, e um homem forte entrou. Tanto Kira quanto Jennifer pularam. Um sentimento ruim se aprofundou através dela quando os olhos do rapaz mudaram de qualquer que fosse sua cor para um verde brilhante. ― Olá, ― o vampiro disse. ― E quem seria você? ― A mão de Kira entrou imediatamente na bolsa, procurando a sua arma, mas o vampiro segurou seus pulsos antes de ela segurar o cabo. Jennifer gemeu de medo e se jogou para trás, se encolhendo contra a parede de cortina. O vampiro levantou Kira pelos pulsos que ele ainda mantinha presos, em um aperto doloroso. Merda! Passava pela sua mente de novo e de novo. Ela devia ter pegado a arma na mão antes de começar a conversar com a Jennifer. Talvez então ela poderia ter atirado no vampiro, o incapacitando por tempo o suficiente para ela e Jennifer fugirem.


O vampiro agarrou a bolsa dela num piscar de olhos, arrancando do pulso de Kira forte o suficiente para ela sentir que seu braço estava prestes a ser arrancado do ombro. ― Não se mova, ― Ele disse, seus olhos brilhando verdes. Ela não se moveu, mas não porque o vampiro conseguiu hipnotizá-la, e sim porque se o vampiro pensasse que o controle de mente funcionava nela, ela poderia conseguir uma melhor chance para escapar. O vampiro soltou o pulso dela, fazendo Kira ter esperanças. Ele estava acreditando nela! Agora apenas se afaste e me deixe sozinha enquanto você revira a minha bolsa… Ele não fez, mas Kira conseguiu manter o desapontamento fora de sua expressão quando ele tirou sua arma e verificou o pente de balas. ― Você realmente tem balas de prata nisso, ― o vampiro disse pensativo. ― E você está tentando roubar Jenny daqui. Quem te colocou nisso? ― ― Ninguém, ― Kira respondeu, tentando fixar uma expressão vidrada em seu rosto, embora seu coração martelasse com medo. Aqueles ghouls haviam a estripado em um segundo. Esse vampiro poderia fazer o mesmo. A qualquer momento ela poderia estar olhando para uma ferida letal e horrível antes de ela sequer perceber que o vampiro se moveu. O vampiro franziu a testa, segurando o queixo dela em um aperto forte o suficiente para ela ouvir sua mandíbula ranger. ― Eu disse, quem te colocou nisso? Apenas outro vampiro saberia lhe enviar aqui com balas de prata. Você é o bichinho de estimação de quem, hmmm? Dê-me um nome. ― ― Nenhum vampiro me enviou. Eu sou uma investigadora particular. Os pais de Jennifer contrataram a minha empresa, ― Kira respondeu em um tom tão monótono quanto ela conseguia. Se ela fosse muito, muito sortuda, o vampiro iluminaria os seus olhos com mais verde, diria a ela que ela não tinha visto nada, assumido que apagou a memória dela, e a mandaria embora. Ela poderia redobrar seus esforços para encontrar Mencheres e voltar mais tarde para ajudar a Jennifer… ― Voce é realmente gostosa, ― o vampiro disse, olhando para o corpo dela. Presas brilharam quando ele sorriu. ― Muito velha para trabalhar aqui, no entanto. Meus clientes gostam delas jovens, ainda pura de ouvidos — e de outros lugares. ―


Ele riu de sua piada bruta. Kira não piscou. Isso mesmo, eu sou velha demais para dançar nua, por isso é só me mandar embora. ― Mas voce com certeza é uma coisa sexy, ― o vampiro continuou. Ele agarrou seu pulso novamente, dessa fez com força o suficiente para moer seus ossos. ― E você ainda está mentindo, ― ele sussurrou enquanto puxava Kira para mais perto. O seu hálito cheirava a álcool e fumaça quando ele expirou após uma inalação profunda. ― Não há cheiro de vampiro em você, mas você poderia ter lavado, o que é bastante fácil, e alguém certamente mandou você aqui, ― ele continuou. ― Alguém te falou sobre prata e te alimentou com sangue o suficiente para torná-la imune ao meu olhar, ou você já teria me dito quem é há essa altura. Quem é ele, docinho? E por que essa pessoa quer roubar minha propriedade de mim? Diga ao Papa Flare tudo sobre isso. ― Apesar do medo e da adrenalina correndo por ela, Kira pensou em sua promessa para Mencheres de não contar a ninguém sobre ele. Ela engoliu em seco enquanto seus instintos a alertavam de que ela andava sobre o fio de uma navalha que a separava da vida e morte. ― Eu vim por minha própria conta… ― A dor explodiu em seu rosto, tão rápido que a surpreendeu. Seus olhos lacrimejaram, sua cabeça girou, e sangue enchia sua boca. Como se esperava, ela não tinha visto Flare se mover antes de sentir os efeitos do seu golpe nela. Flare sorriu quando Kira se recuperou do choque. Aquilo lhe lembrou o sorriso que o ghoul havia lhe dado um par de semanas atrás. Logo antes que ele tinha rasgado sua barriga. ― Então você precisa de um pouco de persuasão antes de me dizer quem é, huh? ― Flare perguntou. Ele soava quase exultante. ― Bem, nós vamos precisar de um lugar mais reservado para falar, não vamos? ―


CAPÍTULO DOZE. Mencheres agarrou sua mala fechada, dando uma olhada final ao redor do quarto. Era a última vez que ele veria esse pequeno espaço com a sua decoração desagradável. Ele não pensaria duas vezes em circunstâncias normais, mas dessa vez era simbólico, pela sua decisão. Ele nao iria voltar para esse quarto, ou para essa casa, ou para essa cidade. Ele já permaneceu aqui por muito tempo, relutante com aquela dura conexão final com a humana que ainda assombrava seus pensamentos, mesmo que ele tenha mantido a sua promessa de não seguir Kira novamente. Gorgon entrou no quarto, seus olhos azuis sombrios. O vampiro nórdico podia sentir o humor do seu criador, especialmente agora que a defesa que Mencheres mantinha, deslizou enquanto ele olhava ao redor. Selene, Kurt, e Sam haviam partido no dia anterior. Agora era a hora dele e Gorgon irem... Ele não poderia adiar mais. ― O avião está abastecido? ― Mencheres perguntou. ― Sim. ― Mencheres deu ao Gorgon um sorriso seco. ― Você não precisa vir comigo, meu amigo. Eu te disse várias vezes que você devia se ocupar com outras coisas além das minhas funções domésticas. ― Gorgon sorriu de volta, esticando a cicatriz que corria em sua bochecha. ― E eu te disse que o que eu escolho fazer com meu tempo é problema meu. ― A lealdade de Gorgon era necessária como um membro da linha de Mencheres. Mas sua amizade não. Nem seu verdadeiro afeto e preocupação. Algumas coisas simplesmente não podem ser controladas pelo medo, respeito ou poder. Mencheres não disse isso, mas estava agradecido por ter Gorgon do seu lado, sabendo que o vampiro se importava com ele além das suas obrigações de ligação. Se ele dissesse ao Gorgon o quão útil ele foi durante os últimos séculos difíceis, isso daria ao Gorgon mais determinação para ficar ― o que impediria o Gorgon de voltar ao que ele devia se tornar. ― Por que você se recusa a me pedir liberdade da minha linha? Você sabe que eu te daria. Já passou da hora de você ser seu próprio Mestre. ― Gorgon apertou o ombro do Mencheres. ― Quando você já não precisar de mim, eu irei. ―


Isso seria em breve. A sepultura se aproximava, agora ele querendo ou não. Talvez ele pudesse encenar sua morte para parecer que Radjedef fez isso. O pensamento enviou uma fria satisfaçao através de Mencheres. Você busca o meu fim, Radje, mas quando ele virer, vou garantir que ele te derrube, também. O celular de Gorgon tocou. ― Provavelmente é o piloto, ― ele murmurou, partindo. Mencheres se obrigou a não dar outra olhada ao redor, enquanto ele deixava o quarto e descia o corredor do terceiro andar. O ar ainda estava levemente perfumado com limão, a essência de Kira persistia como se ela fosse um espírito o provocando. Mencheres andou mais rápido, descendo as escadas de dois em dois degraus. Quando ele estivesse livre dessa casa, ele poderia se livrar das memórias de Kira, quebrando a estranha e hipnótica influência que as memórias dela tinham sobre ele. Ele não tinha tempo para esse anseio inútil sobre uma mulher que não estava destinada a ser sua. ― Criador. ― A voz do Gorgon cortou pela casa vazia, preenchida com uma urgência que fez Mencheres se girar no meio de um passo. Ele subiu as escadas sem tocá-las desta vez, voando até o terceiro andar. O semblante do Gorgon era de pedra quando ele estendeu o telefone. ― Você precisa atender isso. ―

***** Kira observou Flare através de um olho e uma névoa de dor. Depois de ele arrastar ela e Jennifer para cima, em uma seção do clube que estava vazia, exceto por outros dois vampiros igualmente abusivos, ele continuou a exigir que Kira dissesse quem era o vampiro que a enviou aqui. Ela se recusou. Os golpes no seu rosto ficaram mais severos, mas ainda assim, ela não quebraria a sua promessa ao Mencheres. Então Flare pegou a mão dela e, lentamente, a esmagou em seu punho, sorrindo o tempo todo. A agonia dos seus ossos se estilhaçando sob aquele aperto impiedoso foi mais intensa do que qualquer coisa que ela já sentiu. Flare manteve a mão fechada sobra a mão quebrada dela, continuando a apertar, enquanto a outra mão começou a levantar a sua saia. ― Você gostaria de ser fodida, enquanto eu aperto a sua mão com mais força a cada estocada, humm, querida? ― Flare cantarolou.


Kira pensou que ia desmaiar de dor, o que teria sido uma pausa bemvinda, mas ela permaneceu consciente. Tudo nela se rebelava contra quebrar sua palavra, mas este animal sabia o que estava fazendo. Pela expressão dele, Flare apreciaria isso, também. ― Mencheres, ― ela arfou. ― Ele não me enviou aqui, mas… Eu conheço Mencheres. ― Flare a soltou tão abruptamente que ela caiu, sua visão escurecida por vários momentos. Quando Kira pôde se concentrar novamente, ela viu Flare trocar um olhar desconfiado com os outros dois vampiros. ― Esta é a porra de um problema, ― o careca murmurou. ― Se ela estiver dizendo a verdade, ― Flare rebateu. A expressão alegre que ele usou nas últimas horas se foi, e ele começou a perambular ― Coloque-a lá. Eu preciso verificar isso. ― O vampiro careca puxou Kira, e a sentou em uma cadeira. Tudo nublou em sua visão por alguns momentos pela agonia de sua mão ser puxada, mas ela respirou fundo várias vezes e se impediu de gritar. Jennifer se debruçou um pouco mais perto da cadeira de Kira, sem tocá-la, mas olhando para ela com uma simpatia silenciosa. Kira ficou em silêncio enquanto Flare começou a fazer uma série de telefonemas, repetindo a várias pessoas que ele precisava urgentemente falar com Mencheres. Ela não tinha ideia de que tipo de respostas Flare estava recebendo, mas de vez em quando ele lhe dava olhares avaliativos. Ela não tinha certeza do do que era pior: a dor ou a sua vergonha por quebrar a promessa que fez a Mencheres. Ainda assim, ela não poderia ter permitido que Flare seguisse com sua ameaça. Pelo que ela conhecia de Mencheres, ele entenderia. ― Finalmente consegui. ― Flare disse com um olhar afiado para ela. ― Ele atenderá o telefone agora. Hora da verdade para você, querida. ― Kira suprimiu um tremor. Flare não precisava dizer que os eventos seguintes determinariam se ela iria ou não morrer. Ela já sabia. A pergunta que pairava em sua mente era se ela poderia ou não suportar o que Flare faria com ela antes de matá-la. ― É o Mencheres? ― Flare perguntou. ― Yeah, desculpe incomodá-lo, mas eu tenho essa humana aqui comigo, que insiste que pertence a você. ― ― Eu disse que eu o conhecia, ― Kira corrigiu na hora, tossindo um pouco de sangue.


Uma mão pesada pousou em seu ombro, cinco dedos apertando em aviso. Mesmo esse rápido movimento enviou mais dor através de sua mão. ― Shhh, ― o vampiro careca disse ameaçadoramente. ― Ela tem cerca de 1,65, cabelos com manchas loiras, bonita. O Nome em sua carteira de motorista é Kira Graceling, ― Flare continuou. Ele ficou tenso no momento seguinte, e sua expressão se tornou desagradável. ― Uh-huh. Certo. Não, ela está em grande parte bem… em um clube chamado Around the World na State Street, Chicago Heights. Por que nós não… ― Flare desligou o telefone. ― Ele desligou, e ele disse que está a caminho, ― ele disse para todos na sala. O vampiro careca soltou o ombro de Kira. ― Merda, mano. ― ― Eu sei porra! ― Flare explodiu. ― Quero dizer, quais eram as chances? ― Kira estava fraca de alívio por ouvir que Mencheres estava a caminho, mas havia muitas entrelinhas acontecendo para ela saber se isso significava que ela estava fora de perigo ou não. E ela estava tendo dificuldades em se concentrar, enquanto a dor enervante continuava a queimar por ela. ― Você pode querer concertá-la, ― o vampiro com dreads disse. ― Se o próprio Mencheres está vindo buscá-la, então ela está mais acima na cadeia alimentar do que apenas um lanchinho de sangue para alguém do povo dele. ― ― Talvez não. Ele deve estar perto, pois ele disse que estaria aqui em vinte minutos, ― Flare respondeu quase tristemente. ― E se você estiver certo, ele vai ficar mais puto se ela disser a ele que eu a ferrei, e ele não puder ver por ele mesmo que não foi ruim. ― Não foi ruim? É verdade, comparado ao que os ghouls haviam feito a ela, Kira estava em ótimas condições, mas o quão cruel foi o tempo que Jennifer teve, se isso era o que Flare considerava como ― não ruim ― ? Jennifer. Mais vergonha passou por ela. Que grande salvadora ela acabou sendo. ― O quão íntima você é do Mencheres? ― Flare lhe perguntou de repente. ― Você fode com ele, ou apenas o alimenta? ― Kira virou a cabeça silenciosamente, se recusando a responder. Se ela leu corretamente o humor na sala, Flare não ousaria mais bater nela até que


Mencheres chegue, e então a deixe com o Flare com raiva por Kira ter quebrado a sua palavra. Mas ela não acreditava que Mencheres faria isso, não importa o quão chateado ele esteja com ela por revelar que ela o conhecia. Embora este dificilmente seja o modo que ela esperava vê-lo novamente. ― Não vai me responder, huh? ― Flare disse, com um brilho em seus olhos. ― Garota esperta, sabe que eu não posso tocá-la com o cachorro grande vindo para buscá-la. Mas eu posso tocar em Jennifer, porque ela é minha…’’ Flare estava atrás de Jennifer em um instante, suas presas cortanto uma pequena trilha vermelha pelo ombro dela. Kira estava de pé antes mesmo de ter a chance de estremecer pelo quanto doía se mover. ― Eu não estou dormindo com Mencheres, ― ela disse com os dentes cerrados. Flare soltou Jennifer. Ela cambaleou para o outro lado da sala, parecendo assustada, mas sem machucados além daqueles dois arranhões vermelhos. Dreads e Careca fizeram barulhos que pareceram suspiros aliviados. ― Isso é um problema a menos, ― Flare murmurou. ― Oh yeah, ― Dreads disse. Então ele riu. ― Sabe o quão morto você estaria se tivesse violentado a primeira mulher que Mencheres teve depois de um longo tempo? ― ― Ele moeria seus ossos para fazer a porra do pão dele, ― Careca brincou, rindo ainda mais. ― Me assustou por um minuto, ― Flare admitiu, não mais parecendo assustado. Kira olhou para longe deles. Talvez se ela se concentrasse muito, ela poderia focar em outra coisa além da risada falsa deles, ou a dor irradiando pelo seu braço. Ela se encostou na parede com seu lado bom, fechando seu olho que ainda funcionava, respirando fundo e tentando mentalmente ir para longe dali. Infelizmente, mesmo após vários minutos de tentativas, nenhuma técnica de meditação que Kira tentou poderia ajudá-la contra a angústia pulsando em sua mão. Se Flare a libertar, ela poderia usar um pouco do sangue nos frascos em sua casa para se curar. Mas ela poderia pegar parte do suplemento limitado, sabendo que pode resultar em roubar da Tina um ano ou mais de vida? ― Você sente isso? ― Flare murmurou.


Kira abriu os olhos a tempo de ver as duas portas do outro lado da sala explodirem, arrancadas das dobradiças por alguma força invisível. Elas bateram no chão com uma pancada que parecia ecoar pela sala. Flare, Careca, e Dreads pularam, se afastando. Em seguida, uma figura alta e obscura entrou na sala, longos cabelos negros balançando com seus passos rápidos, seu olhar cor de carvão se tornando chamas verdes. O coração de Kira pareceu pular uma batida. Mencheres. Seus olhos pareceram encontrar os dela sem parar em mais ninguém na sala. Então Mencheres parou, suas feições endurecendo como areia virando vidro. A fúria que emanava dele era palpável, fazendo seu coração pular uma batida novamente. Era o seu estado machucado a razão da sua ira? Ou Mencheres estava furioso com ela?


CAPÍTULO TREZE. Mencheres atravessou a sala em direção a Kira, raiva irrompendo dele enquanto ele pegava o rosto machucado dela. Uma aspiração revelou que apesar de ela ter sido gravemente agredida, ela não foi estuprada, o que mudou o destino dos seus captores de uma morte lenta e tortuosa para apenas uma rápida e dolorosa. Então Mencheres viu a mão de Kira ― inchada, sangrando, e deformada ― com lascas de ossos espetando sua pele. Então seria uma morte lenta e tortuosa. Ele sequer olhou para os três vampiros enquanto gentilmente a tomava em seus braços. A julgar pelas auras deles, eles eram muito jovens e fracos para representar qualquer ameaça a ele, mesmo de costas. A boca de Mencheres se contraiu quando ele sentiu Kira recuar para longe de seu toque. Era por causa da dor que ela estava sentindo, ou medo dele? Ele cortou seu pulso com as presas, pressionando o corte ensanguentado na boca de Kira. Ela não tentou virar a cabeça para longe, para seu alívio, embora ela fez uma careta enquanto engolia. Então ela arfou pesadamente. ― Sua mão vai doer enquanto cura. Vai passar rápido, ― Mencheres disse, mantendo seu pulso pressionado contra a boca dela. Embora o ferimento dele fosse se fechar em segundos, ainda haviam gotas de sangue em seu pulso que Kira poderia engolir. Algo se apertou dentro dele quando ele sentiu a sua língua quente deslizando pelo pulso dele. Diante de seus olhos, o nariz de Kira se ajeitou de volta para a sua normal e adorável inclinação, seu olho inchado voltou ao normal, seu lábio se curou, e sua mão se esticou, dedos perdendo aquela retorcida má formação até estarem retos e macios novamente. Mesmo que não fosse necessário mais sangue, Mencheres manteve seu pulso na boca dela, simplesmente porque queria sentir os lábios dela nele por mais alguns momentos. ― Yeah… então você deve ser o Mencheres, ― uma voz atrás dele disse. ― Eu sou o Flare, e esses são Patches e Wraith. ― Ele os ignorou, concentrando-se nos olhos de Kira enquanto a dor deixava o seu olhar e sua respiração ficava regular. Ela fungou, então tossiu enquanto um pouco do sangue restante do seu nariz anteriomente quebrado voltava para as suas vias nasais. Mencheres não um tinha lenço, então ele limpou o rosto de Kira com a sua manga, retirando o pulso de sua boca, finalmente.


― A dor passou? ― ele perguntou. ― Já passou. ― Seu olhar passou por ele antes de se afastar. ― Sinto muito, ― ela sussurrou. ― Eu tentei não dizer a eles o seu nome, mas_ ― ― Mas assim que ela disse, eu não toquei nela novamente, ― a mesma voz interrompeu atrás dele ― Ei, você teria feito a mesma coisa para alguém que invadisse seu território e tentasse fugir com sua propriedade, certo? ― Agora o outro vampiro tinha a sua total atenção. Mencheres se virou, deixando seu olhar pairar sobre Flare. ― Eu faria? ― ele perguntou, arrastando aquelas duas palavras. Kira tinha sido severamente abusada por ser leal a ele, embora ele só tenha proposto a ela não falar dele ou de vampiros para qualquer humano. Ele sabia quanta agonia o ferimento em sua mão deve ter causado, com sua abundância de terminações nervosas. Flare sabia disso, também, e este tolo esperava que ele não fosse vingar o sofrimento dela? ― Se eu fosse torturar um humano por tentar algo que ele não poderia terminar, ― Mencheres continuou, cada palavra mergulhada no gelo, ― então o que você acha que eu vou fazer com um vampiro que desnecessariamente abusou de alguém sob minha proteção? ― A expressão de Flare começou a ficar alarmada. Os dois outros vampiros começaram a se afastar de Mencheres, mas ele os imobilizou com um golpe de sua mente. ― Agora, ouça, ― Flare começou, estendendo as mãos. ― Ela não disse a quem ela pertencia, e eu não conseguia controlar a mente dela para descobrir de outra maneira. ― Mencheres debateu sobre massacrá-los antes que qualquer outra palavra mais inútil chegasse aos seus ouvidos, mas depois decidiu que era melhor não. Kira tinha experimentado violência o suficiente essa noite. Além disso, essas salas eram provavelmente cobertas por câmeras de segurança, e ele não iria deixar nada para trás que pudesse causar um problema para Kira mais tarde. Ele mataria os três outra hora, em um lugar mais privado. ― Eu apenas tentei ajudar uma jovem a voltar para sua família, ― Kira disse. Ela apontou para uma mulher agachada em um canto. ― Ele a sequestrou e a forçou a ser striper aqui. ― Flare deu de ombros. ― Ela queria se envolver no mundo vamp. Ela teve seu pedido atendido. Não posso fazer nada se ela está arrependida agora. ― Outro motivo para matar o tolo. Vampiros jovens que se glorificam em abusar de humanos só porque eles podem, causam ainda mais problemas


quando eles ficam velhos e procuram esportes mais desafiadores. Era uma mentira descarada que ele não tinha nenhum recurso, exceto tortura, para descobrir a quem Kira pertencia. Eles não tinham sequer tentado outra maneira. ― Estamos indo, ― Mencheres disse ao Flare, sua voz desafiando o outro vampiro a se opor. Passos se aproximaram. Mencheres olhou para cima, esperando ver Gorgon, que chegou aqui de carro, ao invés de voando como Mencheres. Mas o vampiro que entrou não era o seu leal amigo. Era o seu inimigo mais antigo. Radjedef sorriu. ― Menkaure, você parece surpreso em me ver. ― ― Radje. ― A voz de Mencheres era meramente um rosnado contido. ― Você me segue agora? Quão vazios seus dias devem estar. ― ― Eu segui a ele, ― Radje disse, acenando em direção ao Gorgon, que apareceu atrás dele na porta. ― Você estava com um pouco de pressa para eu acompanhar, mas para minha sorte, ele não estava. ― ― Minhas desculpas, criador, ― Gorgon disse, soando tanto frustrado quanto arrependido. ― Quem é ele? ― O careca que Flare apresentou como Patches perguntou. Radje ajeitou o corpo até estar em seus 1,82 metros. ― Eu sou um Guardião da Lei. ― ― Não posso acreditar nisso, porra, um policial quando você precisa de um, ― Flare murmurou. ― O que temos aqui? ― Radje perguntou, aproximando-se. Mencheres se moveu como se estivesse entediado, mas ao fazê-lo, colocou-se abertamente entre Kira e Radje. Pelo sorriso de seu velho inimigo, a ação não passou despercebida. ― A mesma humana novamente? Menkaure, eu estou detectando um interesse incomum em você? ― ― Se por interesse você entende vir para recolher minha propriedade, então sim, eu estou interessado, ― Mencheres respondeu friamente. Kira respirou fundo, por ter sido referida como ― propriedade ― , mas Mencheres não se virou para olhar para ela. Ela estaria mais segura se Radjedef acreditasse que Kira não valia mais para ele do que qualquer outro humano que ele declarou sob sua linha. Radje parecia estar meditando sobre a sinceridade de Mencheres. ― Você é muito protetor com seu povo, mesmo com propriedades. Mas há algo


mais aqui, eu acredito. Você. ― Radje olhou para Flare. ― Você indicou que estava feliz por um Guardião estar aqui. Por quê? O que aconteceu com Mencheres e esta humana? ― Flare olhou para o Mencheres antes de falar. ― Uh, eu agarrei aquela humana quando a ouvi dizer para a minha garota que ela tinha uma arma com balas de prata para levá-la para longe de mim. Então ela não quis me dizer a quem ela pertencia sem uns estímulos, mas finalmente ela disse que estava com Mencheres. Liguei para ele, ele veio, parecendo bastante puto conosco por termos batido nela, mas não é legal alguém tentar roubar minha propriedade, certo? ― Mencheres silenciosamente se amaldiçoou por não arrancar as cabeças Flare, Patches e Wraith, logo que ele chegou. Radjedef não teria nada contra ele então. Somente os outros Mestres dos vampiros teriam, se eles escolhessem guerrear contra Mencheres por causa das mortes de Flare, Patches e Wraith. Radje tinha um sorriso malicioso no rosto, enquanto olhava de Mencheres para o Flare, sentindo o cerco se fechando. ― Mencheres te ameaçou? Lembre-se ― Eu sou um Guardião, então você deve me responder honestamente. ― Flare arrastou os pés. ― Na verdade não. Ele estava prestes a sair com ela quando você entrou. ― Radje riu, tão alto e alegre que Kira saltou. ― Oh, seu pobre tolo. Se ele estava partindo sem sequer uma palavra dura para você, ele não tinha nenhuma intenção de deixá-lo viver para ver o próximo luar. Quando o meu velho amigo esta realmente bravo, ele nunca se preocupa com as palavras. Ele apenas mata. ― Mencheres manteve sua expressão impassível, mas ele não se preocupou em negar. Radjedef o conhecia muito bem. ― Essas são acusações sérias contra você, Menkaure, ― Radje continuou, ainda no mesmo tom alegre. ― Como você se defenderá? Você admite que enviou sua humana para roubar a propriedade deste vampiro? ― ― Não, ele não mandou. ― Mencheres virou-se para enfrentar Kira. Ele esteve a ponto de dizer que sim, que ele tinha direcionado todas as ações dela, mas ela tinha falado antes que ele pudesse dizer qualquer palavra. ― Não diga mais nada, ― Mencheres rosnou. Radjedef só poderia impor uma alta punição monetária nele e prejudicar sua posição no Concelho dos Guardiões, mas Kira era muito mais vulnerável aos julgamentos dos Guardiões.


― Eu não vou ficar aqui e deixar você ser culpado por minhas ações, ― Kira murmurou. ― Não… ― Mencheres começou. ― Silêncio! ― Radje rugiu, toda falsa amabilidade se foi. ― Eu sou a Lei, e a menos que você queira que as acusações contra você fiquem ainda mais graves, Menkaure, você não vai interrompê-la novamente. ― Frustração atravessou o Mencheres. Se ele forçasse a Kira a ficar muda com o seu poder, ele estaria diretamente desafiando a ordem do Guardião ― com testemunhas. Radjedef vem esperando por séculos incontáveis por Mencheres cometer esse tipo de erro. Se ela falasse, seu co-regente e as pessoas dele pagariam por isso, não apenas ele mesmo. ― Eu não vejo Mencheres a mais de uma semana, ― Kira continuou, sua mandíbula começando a formar aquela linha teimosa. ― Ele não tinha ideia que eu estava vindo para cá. Eu sou uma investigadora particular, e eu reconheci Jennifer de um dos arquivos do meu trabalho. Ela claramente não estava aqui de livre e espontânea vontade, então me ofereci para ajudá-la a escapar. E sim, eu lhe disse que estava armada. Mencheres só se envolveu quando Flare me pegou e ligou para ele. ― ― Ela esta certa pelo que eu sei, ― Flare murmurou. Patches e Wraith também murmuraram estar de acordo. Radje pareceu desapontado, e Mencheres teve que se controlar para não rugir de dor. Kira não tinha ideia do que ela acabou de fazer. ― Uma vez que ele sabia de suas ações, Menkaure não fez nada para repreender você? ― Radje parecia cético. ― Isso equivaleria a autorizar as suas atividades. ― ― Nós não chegamos tão longe. Estou certa de que Mencheres está muito irritado comigo. ― Kira olhou para ele com aquelas palavras, cega sobre a armadilha que tinha cavado para si mesma. ― Mas você apareceu logo depois que ele chegou aqui, então ele não teve a chance de fazer nada sobre isso. ― Radje soltou um ruído decepcionado. ― Muito bem, Menkaure, a humana te livrou. Você vai matar ela agora, ou quer que eu mate? ―


CAPÍTULO QUATORZE. Mencheres ouviu Kira selar seu destino como se estivesse preso em um sonho terrível. Por vários momentos congelados, ele quase podia ver a morte dela acontecendo diante dele; Radje quebrando o pescoço dela com um movimento simples do seu pulso. Ou abrindo a jugular dela para deixar Kira se afogando em seu próprio sangue quando ele jorrasse pela sua garganta. Qual seria a sensação de vê-la morrer? Isso traria de volta a antipatia que ele sentia pela vida antes de conhecê-la, fazendo-o ver novamente a escuridão iminente em seu futuro como algo bem-vindo? Se Radje fosse qualquer outra pessoa, Mencheres poderia matá-lo. Ele poderia abater cada vampiro nessa sala e esconder tudo o que restou deles. Ele poderia destruir o edifício inteiro para que mesmo se suas ações fossem filmadas, elas nunca pudessem voltar para prejudicar ele ou Kira. Todas essas coisas ele poderia fazer, se não fosse pelo Guardião da Lei com um sorriso falso na frente dele. ― Ah, meu velho amigo, eu acredito que finalmente consegui quebrar seu impenetrável sarcófago, ― Radje disse com satisfação. ― Essa aqui significa algo para você, não é? Que divertido. ― A raiva que crescia lentamente começou a serpentear através dele, pulsando sob sua pele, pedindo para ser libertada para realizar sua vontade. Você ainda pode matar todos eles, a raiva sussurrou. A suspeita cairia sobre ele, mas sem corpos como prova, Mencheres podia evitar que a punição dos Guardiões restantes caísse sobre ele e Bones. Liberte-me, a raiva pediu num murmúrio tentador. Você me manteve presa por tanto tempo... ― Hey, cara, eu não queria que chegasse a isso, ― Flare disse, dando um olhar nervoso entre Radje e Mencheres. ― Se ele disser que vai manter a humana longe de mim e da minha propriedade no futuro, isso é bom o bastante para mim ― ― ― Mas isso não é o suficiente para mim, ― Radje estourou. ― Você apresentou uma denúncia formal de tentativa de roubo de propriedade contra Mencheres ao me informar o que a humana dele fez aqui esta noite. Se você não queria fazer isso, então deveria ter ficado em silêncio. ― ― Eu não sabia que lhe dizer era o mesmo que lhe fazer uma denúncia, ― Flare murmurou. Radje sorriu friamente. ― A ignorância sobre a lei não é desculpa. Humanos e vampiros têm isso em comum. No entanto, os vampiros não são permitidos roubar uns dos outros tão livremente quanto os humanos, e principalmente eu não serei misericordioso com uma humana por roubar de um


vampiro. Morte é minha sentença, então Menkaure, peço-lhe outra vez, você vai punir esta mortal, ou eu vou? ― ― Ele sequestra uma adolescente e a força a ser stripper para ele. ― A voz de Kira estava calma embora seu rosto estivesse assustadoramente branco. ― Isso não é considerado crime para você, mas por eu tentar libertar essa mesma menina, eu mereço uma sentença de morte? Você deveria ter vergonha de se chamar de guardião de qualquer lei. ― Radje nem se dignou a olhar para Kira. ― Sequestrar um humano não reclamado não é um crime. Humanos são nossa comida, eles não têm os mesmos direitos que os vampiros. Menkaure, seu tempo para decidir quem cumpre esta punição está diminuindo. ― Kira não respondeu a isso. Ela não tentou correr, tampouco, embora o vampiro careca tenha agarrado os ombros dela como se esperasse que ela fosse. Mencheres encontrou seu olhar, vendo horror e resignação nadando naquelas profundezas verdes pálidas, mas sem esperança ou súplica. Ela não espera que ele vá ajudá-la. Ela esperava morrer pelo capricho de um homem que não tinha nenhum real interesse por ela. Sua raiva começou a se chicotear mais urgentemente dentro dele, sentindo que Mencheres estava prestes a libertá-la. Kira aceitando friamente seu destino era mais do que ele podia suportar. Não importa se isso fosse terminar com todos eles, ele não poderia deixar Radje condená-la às mesmas trevas que esperavam por ele. Mas ele não deveria deixar o poder malicioso dentro dele livre. Isso havia arruinado sua vida uma vez. Ele não o daria mais uma chance para destruir Bones ou o seu povo novamente. ― Eu mesmo vou realizar a sua sentença de morte, Guardião, ― Mencheres disse, observando como o sorriso de Radje se aprofundou. ― Mas depois, eu acredito que deva trazê-la de volta disso. ― O sorriso de Radje desapareceu. ― A sentença dela é para ser uma punição, não uma recompensa que melhorará sua existência miserável. ― Ele assobiou. ― A sentença dela é a morte, que será realizada por seu crime. Mas como ela é humana, em nenhum lugar está escrito que eu não posso trazê-la de volta como uma vampira após sua punição ser concluída. Esse garoto pode não conhecer as nossas leis, Guardião, ― ― Mencheres deu ao Radje um sorriso frio quando enfatizou a palavra ― ― Mas eu sou perito nela. ― ― Você não transformou um humano em quase uma centena de anos ― Radje disse, mudando para o antigo dialeto egípcio que foi sua primeira língua.


Mencheres permitiu uma expressão perplexa cruzar o seu rosto antes de responder na mesma língua. ― Foi realmente há um século? Ainda mais motivos para transformá-la. Faz muito tempo desde que eu renovei minha linha com sangue novo. ― ― Sua pequena mortal pode não querer ser o seu sangue novo, ― Radje provocou. Ele se virou para Kira. Sua respiração era irregular, e o seu pulso batia forte o suficiente para ser ouvido mesmo com a retumbante música do clube, mas ainda assim, ela não implorava por sua vida. Kira não havia compreendido o recente acordo entre ele e Radjedef. Ela sabia que sua sentença era a morte, o que ela não sabia é que ela poderia ser trazida de volta depois disso. Seus olhos verdes pareciam ainda mais pálidos com a luz refletindo em cima deles quando ela olhou para ele, impotente para controlar qualquer destino que Mencheres escolher para ela. O vampiro careca atrás dela a soltou com um pequeno empurrão em direção a Mencheres. Kira quase tropeçou, mas recuperou o equilíbrio, lançando um olhar sombrio para as outras faces na sala antes de encontrar o olhar dele novamente. Ele não precisava ouvir seus pensamentos para saber quais eram quando ela olhou os vampiros que a rodeavam. Sem esperança, sem adiamento, sem lugar para correr. E ela estava certa. Aquela raiva furiosa correu por Mencheres novamente, exigindo outra solução além de violar a mortalidade de Kira. Mas ele sabia qual era a única outra solução, e ela poderia condenar o seu co-regente por um crime que não cometeu. Mencheres lançou um único olhar furioso para Radje. ― Antes disso, você poderia ter ganhado nossa guerra sem uma batalha comigo, ― ele disse, novamente em um dialeto morto há muito tempo. ― Mas agora, eu não irei quietamente para a minha sepultura. Em vez disso, pelo sangue de Caim, eu vou arrastar você para a sua. ― Radjedef lhe deu um olhar especulativo. ― Eu nunca quis que você procurasse seu próprio fim. Por que você acha que eu venho te seguindo? Depois da nossa última conversa, eu temia que você pudesse se matar antes de me dar o que eu quero. E você vai dar para mim, Menkaure. Logo. ― Mencheres sabia o que Radje queria dele. O deslize do Guardião da Lei em sua casa na outra semana foi o suficiente para entregar a motivação dele, ainda assim, Mencheres não tinha a intenção de deixá-lo obter essa meta. Ele pensou no vazio escuro a sua frente. Ele não tinha ideia de quanto tempo ele tinha antes daquilo o envolver, mas nesse tempo restante, ele descobriria como


terminar com Radjedef. A mortalidade de Kira seria vingada. Ambos sabiam que essa não era uma questão de lei. A única razão para Radjedef exigir a morte de Kira era que ele sentiu que iria machucá-lo. Machucou, e Mencheres pretendia se certificar de que Radjedef sentisse a mesma quantidade da dor dele e da Kira, antes que ele esteja acabado. Seus olhos brilhavam verdes, e ele empurrou sua raiva de volta, mas deixou seu poder se desenrolar. Seu poder encheu a sala, envolvendo cada pessoa que estava nela, fazendo os outros vampiros recuarem e Radjedef estreitar os olhos. Com o seu poder derramando até envolver todo o clube, Mencheres se lembrou da única coisa que o Guardião da Lei sempre quis, mas nunca poderá ter. Então ele se virou de volta para Kira. Ela não falava, não implorava, mas uma única lágrima escorreu pelo rosto dela. Mencheres estendeu a mão, pegando-a antes de ela cair pela linha da sua orgulhosa e forte mandíbula. Logo que ele a tocou, o corpo inteiro de Kira começou a tremer. ― Faça... faça isso rápido. ― Sua voz não era mais que um sussurro, e ela não olhou para ele, mas sua coluna ficou reta. Mais uma vez, sua coragem moveu algo nele. Kira tinha um espírito guerreiro dentro de sua estrutura suave e feminina, por seu verdadeiro valor ser melhor revelado quando sua derrota era inevitável. Sua mão acariciou a bochecha dela, sentindo seu calor envolver seus dedos. Então ele a puxou para seus braços, ouvindo sua frequência cardíaca triplicar quando a cabeça dele mergulhou para a garganta dela. ― Mencheres… ― ― Não, ― ele sussurrou, apoiando um dedo contra seus lábios enquanto ele a segurava em um aperto inquebrável. ― Não me diga se você prefere ficar na sepultura, Kira, pois não importa o que você disser — Eu vou te trazer de volta. ― Então ele enterrou suas presas na garganta dela, exatamente na larga veia pulsante que batia em uníssono com o batimento cardíaco dela. Kira deu um gemido ofegante, suas mãos agarrando os ombros dele convulsivamente. Mencheres retirou seus dentes, permitindo que uma grande quantidade de sangue quente e doce enchesse sua boca por aqueles furos gêmeos. Ele engoliu aquela riqueza, seus dedos se movendo dos lábios de Kira para o espesso cabelo dela. Então ele deslizou suas presas em sua jugular novamente, mais profundo desta vez, penetrando-as até o fim. Kira estremeceu contra ele, as toxinas de suas presas combinadas com a perda de sangue fazendo-a oscilar em seus pés. Seus braços se apertaram ao redor dela, segurando seu corpo e sua macia garganta ainda mais próximos dele enquanto


ele a mordia pela terceira vez, os três pares de furos gêmeos enviando o sangue de Kira para sua boca tão rápido quanto ele podia engolir. Seu corpo inteiro começou a se sentir aquecido, forte, e vibrando com a energia que ele absorvia a cada gole carmesim. Apesar de odiar as circunstâncias, sentir o sangue da Kira jorrando nele, fundindo-os mais perfeitamente do que qualquer ato sexual, causou uma alegria inebriante que explodiu por Mencheres. Ela nunca mais estaria tão próxima de alguém quanto ela estava dele agora, transbordando-o com a força da vida que era drenada dela, unindo-os com um vínculo que nunca poderia ser desfeito. Quando Kira pendeu molemente em seus braços, sua pulsação silenciosa exceto por algumas teimosas e ocasionais batidas, Mencheres se afastou de sua garganta. Os olhos dela estavam fechados, a boca entreaberta, aqueles lábios cheiros e vermelhos, agora rosa pálidos, com nenhuma respiração os agitando. Sua pena de morte, paga. Agora, trazê-la para sua nova vida. Mencheres tirou o colar de prata de Kira, envolvendo sua corrente fina em torno de seus dedos. Então ele enfiou a ponta mais longa da cruz em seu pescoço, rasgando-o. Ele segurou a cabeça frouxa de Kira em cima da ferida e enviou seu sangue para dentro dela. A prata queimava sua carne, curando mais lentamente do que uma ferida feita por qualquer outro material, enquanto a boca de Kira se enchia com o seu — dela — sangue. Ele pôde sentir o corpo dela reagir ao sangue, mesmo que nenhum músculo tenha se movido a princípio. Mencheres inclinou a cabeça dela para trás, enviando aquele sangue para fora de seu pescoço e ainda mais fundo no corpo dela. Ele cavou a cruz dela em seu pescoço novamente, rasgando outro buraco, enviando mais de seu sangue transformado junto com seu poder para dentro dela. Desta vez, ele não precisou ajudar a Kira a engolir o seu sangue; a garganta dela trabalhou mesmo enquanto seu coração caía em silêncio pela última vez. Mencheres a aninhou ao lado do seu pescoço, acariciando seus cabelos enquanto sentia os dentes de Kira o morder no mesmo lugar que ele abriu com a cruz dela. Uma picada afiada depois, e ela rompeu a sua pele, a vida e o poder em seu sangue instintivamente a chamando. Ela fixou seus dentes fortemente na pele dele e começou a sugar enquanto incríveis tremores corriam pelo corpo dela. Ele deixou sua mão envolta no colar cair do pescoço dela, usando-a para apoiar a Kira enquanto ele os deitava no chão. Nenhum dos vampiros falou enquanto Mencheres se sentava com ela em seus braços, enviando mais do seu sangue para ela quando ela rasgou e mastigou seu pescoço com uma fome crescente. A leve dor era maravilhosa, porque em cada gole


desesperado, Kira absorvia vida dele assim como ele tinha feito com ela. Era um escuro modo de vida, sim, mas um mais forte do que a mortalidade que havia desaparecido com o fim da pulsação dela. Viva, Kira. Viva. Quando ela bebeu mais do que o sangue que Mencheres havia tirado dela, ele a afastou, flexionando seu poder para segurá-la quando ela começou a lutar para voltar a sua garganta. Seus olhos estavam abertos, mas cegos, queimando com um tom mais escuro e brilhante de verde, e duas presas se curvavam dos dentes, antes retos e humanos, de Kira. ― Agora descanse, ― Mencheres sussurrou, ainda a segurando. Um último tremor a percorreu, então seus olhos rolaram para trás, e ela caiu contra ele, sua humanidade assassinada, e seu novo corpo vampiro inconsciente, mas em breve se levantando.


CAPÍTULO QUINZE. Kira estava presa em um inferno frenético. Ela podia ouvir a estrondosa explosão do seu edifício desmoronando ao seu redor, sentir a agonia das chamas enquanto elas devastavam seu corpo, e ela rezou para a morte pôr fim à dor. E então a morte veio, refrescando suas queimaduras, quebrando seu corpo com o doce alívio, aliviando o tormento que a queimava de dentro para fora. O frio e lânguido vazio a envolveu, a protegendo do fogo que ainda queimava em volta dela. Ela tinha que estar morta, por que a dor tinha ido embora, mas muito estranhamente, Kira ainda podia ouvir a explosão do seu prédio e sentir o cheiro da fumaça vinda do fogo. Que coisa estranha, que ela ainda pudesse ouvir e cheirar tão profundamente mesmo estando morta. Além disso, ela também podia provar algo incrível. Algo tão rico e suculento, que até conseguiu fazer os sons e cheiros ficarem obscuros. Ela precisava de mais daquilo, o que quer que fosse. Sim. Mais... E então aquele maravilhoso néctar tinha desaparecido, e luzes esmagaram a visão de Kira. O rugido do prédio desmoronando estava de volta com a fumaça sufocante de gás que deve ter começado o incêndio, mas algo mais estava aqui também. Kira choramingou. Ela não deve estar morta ainda. Não ainda, então a qualquer momento ela sentiria o horror de sua carne sendo queimada em seu corpo novamente... ― Kira. ― O seu nome era uma âncora que arrastou sua mente para a realidade. De repente, ela viu o rosto de Mencheres na frente dela, os olhos dele como diamantes negros e sua pele era tão perfeita quanto cristal colorido. Ela não estava presa em um apartamento em chamas. Outra coisa tinha acontecido. Mencheres. Ele a tinha matado… e a trouxe de volta. Aquele estrondo veio por atrás dela de novo, o cheiro de gás se sobrepondo ao escuro e doce cheiro que estava em volta dela. Kira tentou correr do que quer que tivesse feito o terrível barulho de explosão, mas Mencheres a pressionou para baixo. Uma sacudida a atingiu assim que as mãos dele tocaram sua pele. Parecia que o corpo inteiro dele estava eletrificado e enviando correntes diretamente para ela. ― São só os motores do avião, Kira. Você não está em nenhum perigo. ―


Aquela explosão surgiu de novo, tão alta e afiada, aquilo não podia ser os motores do avião. Kira olhou em volta, mas tudo se transformou em um borrão até Mencheres agarrar seu queixo e forçá-la a olhar só para ele. ― Fique parada. Você ainda não se ajustou aos seus novos sentidos. Eles vão parecer esmagadores, mas logo você vai se acostumar com eles. ― Seus novos sentidos. Entre a fervente voltagem que queimava nela vinda das mãos de Mencheres, os sons explosivos em sua volta, aquela potente e oleosa mistura de cheiros, e os flashes de luz que pareciam queimar os olhos dela, a mente de Kira estava agarrada a um único, inacreditável pensamento: Ela não era mais humana. ― Eu sou... você... eu não sou... ― Ela não pôde dizer em voz alta. Ela entrou em choque quando percebeu que apesar de ter usado ar para falar, ela não estava respirando. Quase cegamente, a mão dela seguiu até seu pescoço. Nada além de um silêncio suave sobre seus dedos onde deveria estar seu pulso. Eu sou uma vampira. Mencheres não disse nada, suas mãos ainda em volta do rosto dela. Foi só aí que a visão dela se estabilizou o suficiente para notar o resto dele. Ele ainda estava usando a mesma camiseta que tinha usado da última vez que ela o viu, mas agora, ela tinha largas manchas vermelhas na frente. Seria o sangue dela? E Radje... o cruel vampiro de sorriso falso que ordenou a morte dela estaria aqui também? Kira olhou em volta, mas novamente, tudo começou a virar um borrão. ― Tem algo errado com os meus olhos... quem mais está aqui? ― ela perguntou, começando a ficar em pânico. ― Ninguém além de mim, Gorgon e o piloto está nesse avião. Como eu disse, você está segura. ― Segura? Kira lutou contra uma risada histérica. Ela supôs que estava salva considerando que já estava morta. Mencheres se sentou na frente dela, o olhar sombrio dele era melancólico, uma mão no ombro dela enquanto a outra segurava seu rosto. Ela piscou, notando que ele parecia mais ― vívido. As impressionantes linhas do rosto dele eram mais definidas, luzes acobreadas tornavam o cabelo de Mencheres uma rica sombra de preto, os olhos dele eram coloridos com os menores flocos de prata, e a pele dele... a pele dele era como areia sobre a luz do sol, uma mistura de dourado e creme que parecia eletrificada com o poder faiscando dele.


Mais do que lindo ― Magnífico. Mencheres, seu assassino. Seu salvador. Era muito para Kira processar. ― Não me toque, ― ela sussurrou, desviando o olhar. As mãos dele caíram. Uma sensação de arrependimento correu pelas emoções dela, acabando tão rápido, que Kira não teve certeza se ela sentiu isso ou se foi uma alucinação, como o apartamento infernal foi. Aquela explosão continuou em volta deles. Ela olhou para o lado, as coisas dançaram menos em sua visão dessa vez, para ver que eles estavam de fato em um pequeno avião. Um olhar para baixo revelou que Mencheres não era o único com manchas vermelhas em si. Essa não era a roupa com que ela, ah, morreu, mas ainda estava coberta com algo púrpura que cheirava como algodão doce líquido. Kira fungou sem pensar, seu nariz quase explodiu com o tumulto de cheiros, muitos para distinguir. Acima de todos estava o inebriante, viciante aroma vindo das manchas vermelhas em sua camiseta. Ela agarrou aquilo e enfiou o tecido na boca antes do seu próximo pensamento coerente, choramingando com a dor intensa que queimou em seu peito. E então algo maravilhoso desceu por sua garganta. Rico, embriagante, vibrante, necessário, isso esfriou aquele flash de agonia, acalmando-a de dentro para fora. Ela não tinha notado que tinha fechado os olhos até um impacto de luz e movimento tomarem o lugar do pacífico vazio momentâneo da visão dela. ― O que tem de errado comigo? ― Kira conseguiu perguntar, tentando parar os loucos movimentos enquanto olhava ao redor. As feições de Mencheres se agitaram antes de cristalizarem no momento seguinte. Ele estava em cima dela, o cabelo dele caindo em volta como uma cortina negra. Se ela estava certa, o duro e agitado nivelamento em suas costas era o piso do avião. Ela tinha caído? Ela não se lembrava de ter feito isso. Algo úmido cobria o rosto dela e a boca. Incapaz de se conter, Kira lambeu. Um tremor de prazer passou por ela, quase tão intenso quanto um orgasmo. O que era isso? ― Você está no meio da loucura de sangue, ― a voz dele acariciou os ouvidos dela, fazendo-a tremer novamente. Os sons, visões, cheiros, gostos, texturas... Era tudo demais. Ela sentia como se fosse explodir. ― Isso irá diminuir, ― Mencheres continuou. Kira se encontrou arqueando em direção a sua voz, como se aquilo pudesse tocá-la fisicamente com o mesmo efeito que acariciou seus sentidos. ― Até lá, eu não posso deixá-la ir. Você irá matar, Kira, e irá se arrepender disso ―


― Não… ― ela gemeu, fechando os olhos. Isso não é real, não é real. Mais êxtase se derramou por sua garganta no momento seguinte, mais pesado que água, mais doce que xarope. Ela engoliu avidamente, suas costas arqueando de novo, tentando chegar mais perto de qualquer que fosse a fonte, mesmo que ela não pudesse mover as mãos para agarrá-la. ― Eu vou cuidar de você, ― aquela voz sedosa e profunda prometeu. ― Eu vou te ver superar isso. ― Não é real, não é real, não é real, Kira continuava entoando em sua mente. Nada assim tão intenso podia ser real. E através dos sons explosivos dos motores, a vibração do chão, aquele tumulto de dor e felicidade crescendo e diminuindo dentro dela, o êxtase líquido jorrando pela sua garganta, e os choques que ela sentia cada vez que Mencheres a tocava, ela ouviu a voz novamente. ― Perdoe-me. ―

***** Mencheres observou o rosto de Kira enquanto se deitava ao lado dela na cama. Ela não tinha se movido desde o amanhecer. Os primeiros raios de sol a fizeram cair em um sono profundo, como fazia com todos os novos vampiros. O sono dela havia facilitado o tempo deles nas áreas de desembarque, tais como no aeroporto privado no qual o avião dele tinha pousado e os carros os acompanhando no caminho para a casa dele em Jackson Hole, Wyoming. Mencheres havia escolhido a essa localização com cuidado. Os vizinhos mais próximos estavam ao menos há um quilômetro e meio de distância em todas as direções, e Gorgon tinha cuidado da transferência imediata dos humanos que ficavam lá, assim que eles chegaram. Menos som, tentações, e restrições perto de Kira era melhor enquanto ela lidava com sua nova condição. Embora isso ainda será difícil para ela. Normalmente, humanos que eram escolhidos para se tornarem vampiros passavam por um período prolongado onde eles ingeriam sangue de vampiro em quantidades cada vez maiores. Isso os dava uma amostra de como a nova fome, sentidos, e força fora do comum seriam, fazendo a mudança final menos chocante. Kira não teve tal preparação. Tudo seria esmagador para ela no começo. E ela não tinha escolhido a transformação de livre e espontânea vontade. Esse seria o maior obstáculo que ela teria que superar. Mesmo assim, Mencheres sabia que ele não poderia ter agido de forma diferente. Se era uma escolha entre a morte de Kira ou o desprezo dela por ele, ele sempre escolheria ser o objeto de seu ódio do que o instrumento de sua destruição permanente.


O barulho de cascalho na garagem anunciou que Gorgon estava devolta. Mencheres sentiu uma onda de alívio. Kira havia bebido quase todas as bolsas de sangue que ele havia roubado às pressas de um hospital no caminho do club de strip para o avião. Sangue de animal seria suficiente em circunstâncias desesperadas, mas ele suspeitava que se Kira despertasse de seu sono para se encontrar se alimentado de um veado morto, ela guardaria ainda mais ressentimentos contra ele. ― Ela já acordou? ― Gordon gritou assim que entrou na casa. ― Ainda não. ― Mencheres olhou para os fracos raios de sol penetrando com esforço pelas frestas das cortinas. Ela acordaria logo. No mais tardar ao anoitecer. Gorgon entrou no quarto carregando uma caixa térmica de isopor que ele deixou no chão. ― Isso deve bastar até o amanhecer. Eu vou sair novamente para conseguir mais. Não tem muitos hospitais por aqui, e eu me sentiria mal se pegasse todo o suprimento deles. ― Mencheres se sentiria mal também, porém novamente, o quão longe ele iria para proteger Kira superava sua preocupação sobre os problemas que talvez aquilo causasse para alguns mortais. ― Certifique-se de trazer sangue fresco também. Voe em algumas de minhas propriedades até hotéis próximos se for necessário. ― ― Eu irei. ― Gorgon lançou um olhar à forma adormecida de Kira. Mencheres havia a banhado e trocado suas roupas novamente, cobrindo-a com uma colcha grossa depois. Não era incomum entre novos vampiros sentirem um frio inexplicável enquanto se ajustavam à sua nova temperatura corporal, e mesmo na primavera, era mais frio nessa altitude do que era em Chicago. ― O Guardião estava certo. Você sente algo incomum por ela. Quando está perto dela, seu perfume muda, e seu escudo desliza mais do que eu já vi fazer, ― Gorgon disse calmamente. Mencheres empurrou suas emoções de volta para trás da parede que impedia os outros vampiros de senti-las. ― Depois de tudo que eu fiz a ela, eu acho que isso não importa. ― ― Você não tinha escolha. Uma vez que Kira aceite isso e se ajuste em ser vampira, ela não vai mais estar com raiva de você. ― E então Gorgon sorriu. ― Entretanto isso vai ser divertido de assistir nesse meio tempo. Você nunca teve que trabalhar para seduzir uma mulher antes, teve? ― De fato, Mencheres nunca tinha precisado seduzir uma mulher para sua cama com palavras doces ou perseguição passional. ― Mesmo se eu tivesse,


considerando meu longo período em celibato, isso me faria muito fora de prática, para usar uma expressão contemporânea, ― ele observou secamente. Gorgon riu. ― Como andar de bicicleta, algumas coisas você nunca esquece. ― Mencheres desejou que o único obstáculo entre ele e Kira fosse o desafio de ganhá-la. Se fosse assim, ele iria saborear a oportunidade de ganhar a sua confiança, afeição, corpo e ― se os deuses quisessem ― o coração dela. Mas novamente, aquele véu negro em seu futuro era o verdadeiro obstáculo. ― Eu tenho maiores preocupações no momento, ― foi tudo que Mencheres disse. O sorriso de Gorgon desapareceu ― Radjedef. ― Mencheres suspirou, fechando os olhos. ― Eu sei o que ele quer, e eu devo me assegurar de que ele não consiga achar um jeito de me forçar a dar isso a ele. ― ― Você precisa dizer ao Bones. ― Seus olhos se abriram de uma vez. ― Não. E você vai jurar para mim que você não vai falar. ― Gorgon pareceu consternado, mas assentiu. ― Se você insiste. Ele vai ouvir sobre Kira, no entanto. Eu aposto que aqueles três vampiros no clube já queimaram as linhas de telefone com mensagens de texto e telefonemas sobre isso. ― Sem dúvidas Flare, Patches e Wraith tinham dito aos outros sobre os eventos da noite passada, mas Mencheres não estava preocupado com Bones descobrindo sobre Kira. Ele saberia da importância dela para ele assim que ele abrisse o envelope de herança que Mencheres deu a ele. Agora a única diferença era que Bones ouviria sobre Kira antes disso, mas era indispensável que ele não soubesse sobre o aumento da hostilidade de Radjedef. Cat tinha acabado de escapar de um encontro com a morte através dos Guardiões da Lei por ela mesma. Nem ela nem Bones poderiam arriscar enfurecer outro Guardião por um longo, longo tempo se eles desejavam continuar vivos. Além do mais, essa briga com Radjedef tinha surgido muito antes de Bones sequer ter nascido. Mencheres não tinha a mínima intenção de deixar seu co-regente lutar essa batalha por ele. Essa era a sua vitória. As correntes no quarto mudaram e começaram a se concentrar sobre a cama. Mencheres olhou para Gorgon, que sem dizer nada pegou uma bolsa de sangue na caixa.


Ele levantou a Kira com uma mão e pegou a bolsa de sangue de Gorgon com a outra, se dirigindo ao banheiro. Acordar em uma cama ensopada de sangue faria pouco para aliviar o estresse de Kira por ser uma nova vampira. Então, novamente, acordar em um banheiro ensopado de sangue provavelmente não lhe deixaria muito melhor, mas era mais fácil de limpar azulejo que carpete e lençóis, pelo menos. ― Quer que eu espere, ou saia agora para conseguir mais sangue? ― Gorgon perguntou. Mencheres deu outro olhar para Kira, que tinha começado a se contorcer ― O percursor para seu rugido em consciência com uma fome ardente e louca. ― Você pode partir. Eu vou cuidar dela. ― E ele iria, durante quanto tempo ele ainda tivesse.


CAPÍTULO DEZESSEIS. Kira se sentou na cadeira perto da lareira, ouvindo o crepitar das chamas tão agudo quanto se fossem árvores sendo derrubadas. Mesmo assim, ela queria o fogo. Seu calor era como um casulo suave, e era mais gentil com seus olhos do que o brilho das luzes do teto ou abajures. Ela podia enxergar na completa escuridão agora, mas ela não queria apagar todas as luzes ao ponto de ser lembrada disso. Era ruim o suficiente lidar com os calafrios constantes, presas a esperanto no lábio sem aviso prévio, o tumulto do lado de fora dos bosques, e oh sim, os violentos apagões dos quais ela acordava com sangue escorrendo pelo rosto e um desejo ardente por mais disso. Ela tinha apenas a palavra de Mencheres de que ela não tinha machucado ninguém durante esses apagões. Bem, isso e a caixa térmica de bolsas de sangue rapidamente esvaziando. Mencheres disse para não se preocupar, que Gorgon estaria de volta com mais até o amanhecer. O pensamento aborrecia tanto quanto aliviava Kira. Ninguém precisava dizer a ela que ela era uma ameaça a qualquer um ― ou qualquer coisa ― com um batimento cardíaco agora, mas apesar de seu corpo ansiar por aquele líquido vermelho com uma ferocidade sem limites, a mente de Kira ainda não podia assimilar o fato de que ela estava bebendo sangue. Sangue humano. Ela consideraria isso uma forma de canibalismo, exceto que ela não era mais humana. Ela se inclinou para trás ― e a cadeira caiu debaixo dela, a surpreendendo. O mais surpreendente era que ela não estava esparramada no chão de madeira agora, mas encarando de cima a cadeira quebrada ainda com a manta envolta dos ombros. Ela tinha pulado da cadeira antes de ela cair? Deus, ela era mesmo assim tão rápida agora? Um formigamento em sua pele anunciou que Mencheres havia entrado no quarto. Ele se movia quase sem fazer barulho nenhum; só o perfume dele e o leve sussurro de suas roupas denunciariam sua presença, se Kira não pudesse senti-lo. Ela nem precisou se virar para saber qual a distância que os separava. O quão forte aquela vibração crescia em sua pele, era o quão perto Mencheres estava. Todas as pessoas pareceriam ter sua própria forma de campo de energia em sua volta? Ou isso era exclusivo para vampiros? Kira não queria perguntar. Ela não tinha certeza se podia lidar com mais informações agora. ― Eu não sei o que aconteceu, a cadeira simplesmente quebrou, ― ela disse. Tanta coisa para conseguir um pouco de tempo para ela mesma. Ela não esteve sozinha por dez minutos antes da cadeira se auto-destruir nela.


― Deixe, eu vou cuidar disso. ― Mesmo a voz dele soava diferente do que era antes de ela acordar mortaviva. Era mais profunda, as nuances do seu sotaque mais ricas ― e parecia se enrolar em volta dela como uma névoa espessa e convidativa. ― Eu posso fazer isso. ― Kira se abaixou para pegar o maior pedaço da cadeira quando a madeira se estilhaçou em sua mão. Ela piscou e tentou de novo, mas a mesma coisa aconteceu. Era quase como se a cadeira se desintegrasse tão logo quanto ela a tocasse. ― O que? ― ela começou. Mencheres se moveu para perto dela, perto, mas sem tocar. Sempre que ela tinha um longo período de consciência, como este, ele atendia sua ordem para não tocá-la. Ela sabia que não era o caso durante seus apagões de loucura de sangue, mas ela não podia culpá-lo por isso. É claro, com o cheiro dele e sua aura formigando sobre ela, Mencheres poderia muito bem estar a tocando. Adicionando a voz dele, Kira se sentia consumida só por estar próxima a ele. ― Você não está habituada à sua nova força, ― Ele se abaixou, agarrando um pedaço do braço de madeira. Não se dissolveu em lascas como tinha feito com ela. Ele o segurou em direção a Kira. ― Tente pegar isso, mas muito gentilmente, ― Ela apanhou a madeira ― e ela se desfez em sua mão. Frustrada, Kira girou, só para sentir algo picando seu tornozelo. Ela olhou para baixo. Seu pé direito havia atravessado o chão de madeira. ― Que diabos? ― ela exclamou, retirando o pé. Mais do chão veio junto com ele, deixando um buraco irregular. ― Como eu disse, você está desabituada à sua nova força, ― Mencheres observou, nenhuma repreensão em seu tom mesmo que ela tenha acabado de arruinar sua cadeira e seu piso. ― Essa é outra razão por que você não pode estar perto de humanos até que esteja acostumada com suas novas habilidades. ― Ela não podia nem se inclinar em uma cadeira ou bater seu pé sem causar danos fortes? Adicione isso aos apagões de loucura de sangue a cada hora aproximadamente, e ela tinha sido transformada em uma máquina de morte ambulante!


Os olhos de Kira queimaram como se tivessem sido pulverizados com pimenta, sua visão muito afiada se tornou rosa e borrada. Ela jamais seria capaz de abraçar sua irmã de novo? Ou ela partiria Tina tão facilmente quanto ela tinha arruinado essa cadeira se a tocasse? ― Dane-se você por isso, ― ela engasgou, afastando-se da visão de Mencheres. Então, imediatamente, ela desejou não ter dito isso. Não era justo culpá-lo. Ele tinha feito seu melhor para ajudá-la, tanto antes quanto depois de Radje chegar, quando aquele tira corrupto fez aquele julgamento letal contra ela. Pelo canto do olho, parecia que suas palavras não tinham tido efeito em Mencheres, mas uma onda de tristeza cruzou sua consciência. Kira congelou. Ela não estava triste. Ela estava com raiva e confusa e começando a ficar com fome de novo, mas não triste. Essa tristeza vinha dele? Ela podia realmente sentir as emoções dele agora, como ela podia sentir seu poder e o toque de sua voz? Kira se lembrou das últimas palavras que ela ouviu quando humana: pois não importa o que você disser — Eu vou te trazer de volta. Mencheres estava triste por ser forçado a matá-la ou ele estava se arrependendo da decisão de trazê-la de volta como vampira? Quais eram os sentimentos reais dele? A desprezível atitude anterior sobre ela com Radje ontem? Ou o quão cuidadoso ele tinha sido quando ele chegou ao clube e a curou? Ele não tinha feito o mínimo esforço para vê-la depois que ele a deixou ir, mas então Radje, depois de ordenar a morte dela, indicou que ele podia dizer que Mencheres se importava com ela. Antes, se perguntar o que o misterioso vampiro pensava dela tinha sido a fonte das imaginações ocultas e obscuras de Kira, mas agora, era indispensável que ela soubesse. Mencheres tinha alterado sua existência e se tornado uma figura principal em sua nova vida, mas ela não tinha ideia se ele a considerava nada mais do que uma irritação temporária. Ela olhou para cima até ele, notando que a sua usual expressão impassível estava firme em seu devido lugar. Não importava. Ela queria algumas respostas antes que ela perdesse a cabeça em outro apagão ou a consciência para o amanhecer que se aproximava. ― Por que você manipulou meu chefe para me dar um carro e um aumento? ― ela perguntou quase tensa com a concentração para ver se ela podia sentir qualquer emoção dele. Um leve tom de surpresa flutuou pelo subconsciente dela antes de desaparecer. Kira quase pulou. Aquilo não podia ter vindo dela; ela não se surpreenderia pela própria pergunta!


― Foi você, não foi? ― Ela perguntou, não dando a Mencheres tempo de responder a pergunta anterior. ― Inacreditável, eu posso sentir você agora. ― Tão abruptamente, uma parede pareceu se erguer em volta dele, escondendo tudo de Kira, inclusive o formigamento de sua aura. ― Seria melhor para você se concentrar em administrar sua força e seu consumo de sangue, ― disse Mencheres, com fria indiferença em seu tom. Ela avançou, não se importando de sentir o piso ranger e se dobrar em volta dos pés. ― Não você não vai ― ela explodiu. ― Você não vai fazer uma parede ao redor de você e a única indicação que eu tenho do que você está pensando. Você me matou ontem e me trouxe de volta em uma existência onde tudo é diferente, especialmente eu. Mas o que é quase tão assustador é que eu não sei se isso significa algo para você além de um grande e entediante inconveniente. Então me dê alguma coisa. Podem ser palavras, uma expressão descuidada, um flash de suas emoções, o que for, mas faça isso agora, por que eu preciso de um palpite quanto a onde eu fico com você. ― Se Kira ainda pudesse respirar, ela estaria ofegando com as emoções em redemoinho dentro dela, mas ela estava tão parada quanto o vampiro em sua frente enquanto ela esperava pela resposta dele. Mencheres não perdeu sua máscara impenetrável, ou fez aquela parede invisível ruir, mas pelo menos ele inclinou a cabeça. ― Você estava trabalhando até tarde da noite, e como ficou mais do que provado no dia em que nos conhecemos, não era seguro para você caminhar para ir e vir do seu emprego. ― Por um segundo, Kira não sabia do que ele estava falando. Então ela se lembrou de sua pergunta original, e a desilusão a invadiu. Todo aquele tempo que ela passou procurando por Mencheres tinha sido baseado em sua hipótese de que as ações dele com seu chefe significavam que ele queria ver ela novamente. Quão errada ela esteve. Mortalmente errada, na verdade. Não tinha sido nada mais do que um gesto descuidado feito por pena. Cuidado com o que deseja, ela pensou sombriamente. Ela teve sucesso em sua busca por ver Mencheres de novo, mas isso lhe custou a vida. ― Obrigada, ― ela disse estupidamente. ― Agora, me diga por que você não me deixou continuar morta? ― Mencheres desviou o olhar, seu rosto se tornando ainda mais ilegível se isso fosse possível. ― O julgamento de Radje era um abuso de poder. A única razão de ele ter sentenciado você tão duramente foi por causa da hostilidade dele comigo, então, o mínimo que eu podia fazer era providenciar que você não continuasse morta. ―


Outro gesto de pena, Kira pensou, balançando a cabeça em descrença. Que brilhante realização miserável era saber que sua atual existência se devia a nada mais que o despeito de um vampiro e a pontada de consciência de outro. Se ela simplesmente tivesse ficado longe de Mencheres assim que ele a deixou ir, ela teria um carro novo, um aumento, uma irmã cuja a vida não seria tragicamente curta, alguns amigos, um irresponsável mas de algum jeito adorável irmão, e uma vida social ocasional. Mas não, ela tinha que jogar tudo aquilo fora perseguindo um vampiro que provavelmente não tinha gastado sequer um pensamento com ela desde que a largou naquele telhado. Sua idiota, Kira repreendeu a si mesma. ― Você não precisa temer que tudo de sua antiga vida esteja perdido para você, ― ele continuou, quase fazendo Kira rir ― Em alguns meses, você deve ter força o suficiente após o amanhecer para retornar ao seu emprego. E em pelo menos uma semana ou duas, você já vai ter controlado sua fome e habilidades com os humanos o suficiente para retornar a ver sua família ― ― Você simplesmente não entende, não é? ― ela o interrompeu, imprudência tomando conta dela ― Tudo isso ― isso de repente virando algo mais é ruim o suficiente, mas saber que a única razão para eu não estar em uma sepultura não é por que minha vida significa algo para você, mas por que você achou que isso iria equilibrar algum tipo de balança imaginária de escalas de justiça... bom, é uma droga.10 E sim, eu compreendo a ironia dessa frase. ― Algo úmido desceu pelas bochechas de Kira. Ela passou a mão naquilo, surpresa ao ver um líquido rosa em seus dedos. Seriam lágrimas? Ela ainda podia chorar, mesmo sendo uma vampira agora? Antes que ela pudesse considerar isso, uma dor que estava se tornando muito familiar a atingiu. Ela se curvou, segurando o estômago como se ela pudesse de algum jeito empurrar sua necessidade de sangue de volta para dentro dela. A brisa que balançou seu cabelo era a única indicação que ela tinha que Mencheres havia saído e voltado em um flash de movimento. Ele segurava duas daquelas malditas bolsas vermelhas nas mãos, e o salto interno que Kira sentiu quando ela as viu, a deixou dividida com urgências duelando. Ela queria jogar as bolsas pela janela em repugnância. Ela queria arrancá-las das mãos de Mencheres e as consumir com goles raivosos. Ele segurou uma das bolsas na direção dela, mas Kira olhou para o outro lado. Ela não queria beber mais sangue. Era errado, nojento...

10

Ela fez uma piadinha, por que a sentença original é ― Sucks ― que é uma expressão americana para indicar que algo é ruim, mas ao mesmo tempo, ― Sucks ― quer dizer ― sugar ― que é o que os vampiros fazem.


Duplas picadas de dor em seu lábio inferior disseram a Kira que suas presas tinham saltado de suas gengivas, resultando em uma prévia daquele rico, gosto acobreado temperando sua boca. Mais dor irrompeu através de seu corpo, aquele odiado sentimento de ser queimada de dentro para fora aumentou para um ritmo feroz. Mencheres a tinha nos braços no instante seguinte, segurando a bolsa em sua boca ― Você precisa. ― Ela só soube que tinha rasgado a bolsa quando um alívio inacreditável preencheu o antigo tormento dentro dela. Kira se sentiu começando a flutuar para longe, sua mente entorpecida do ataque de alegria e fome, mas antes que ela se perdesse no escuro, algo atiçou seu subconsciente. Algo que ela esteve muito distraída para assimilar quando Mencheres disse a ela primeiramente por que ele havia manipulado o chefe dela para que a desse seu carro e um aumento. Você estava trabalhando até tarde da noite... Só havia um jeito de Mencheres saber até que hora Kira tinha trabalhado naquela semana. Ele a tinha seguido.

***** Mencheres andou ao lado de Kira nos bosques. O ar era agradavelmente fresco nas horas anteriores ao amanhecer, mas Kira usava um suéter grosso e calças como se estivesse muito mais frio. Ela parecia preocupada com o chão enquanto andava, seus olhos vacilando de vez em quando para os lados quando animais noturnos se assustavam com a presença deles. Ele não disse nada, deixando-a ficar acostumada com o dilúvio dos seus sentidos vindos dos arredores dela. Ela havia acordado algumas horas antes do crepúsculo em seu segundo dia como vampira, insistindo em tomar banho sozinha depois que saciou a fome com as bolsas de sangue fresco que Gorgon trouxe. Como Mencheres a avisou, aquilo não trouxe resultados positivos. Kira arrancou a porta do box quando tentou abri-la, em seguida arrancou a torneira da parede ao tentar desligar a água depois de completar o seu banho sem porta. E então a frustração dela pela inabilidade de controlar sua força resultou em outro ataque de fome, o que não era nenhuma surpresa. Raiva e a urgência em se alimentar estavam unidos para novos vampiros, e com todas as emoções de Kira em um nível de intensidade nunca visto antes, ela seria um enxame de instabilidade nos próximos dias. ― Não parece certo não ver a escuridão, ― Kira disse, finalmente quebrando o silêncio. ― Eu sei que é noite, mas parece como uma sombria e bem definida tarde com um sol que não machuca meus olhos em vez disso. Não existe mais escuridão. Só manchas de sombra. Quanto tempo você levou para se acostumar a não ver mais escuridão? ―


Mencheres tentou se lembrar de seus primeiros dias como vampiro. Foi há tanto tempo atrás, que parecia que a transformação ocorreu com outra pessoa. Ele se lembrava da fome logo que acordou; nenhum vampiro esquecia isso. Mas ele não podia se lembrar de como a verdadeira noite parecia quando ele era humano, então ele não podia lembrar quanto tempo tinha levado para que ele parasse de sentir falta dela. ― Grande parte desses primeiros dias, eu esqueci, ― ele admitiu. ― Por que você é mais velho que a poeira, certo? ― Kira o lançou um olhar inclinado ― Então me diga, soa como um canteiro de demolição aqui fora para você também? Ou você aprendeu a desligar os sons de fundo ao longo dos anos? ― Ele se focou brevemente nos sons que enchiam a floresta. Não, ele não tinha se preocupado em lhes dar a mínima atenção, além de distinguir se eles eram naturais ou uma ameaça que precisava ser eliminada. Ele tinha simplesmente aprendido a desligá-los, como Kira descreveu? Ou ele estava tão cansado que ele não se importava mais se os grilos cantavam, as folhas dançavam, os galhos batiam um contra o outro enquanto avançavam, ou os animais caçando seu sustento ou companheiros achavam sua presa? ― Você aprende a escolher em quê focar sua atenção, ― ele respondeu. Aquilo era verdade. Ele talvez não tivesse prestado nenhuma atenção nos sons da floresta, mas ele podia dizer a Kira cada variação sobre como o perfume dela havia mudado enquanto ela andava ao seu lado. Ou quantas vezes os olhos dela tinham incendiado com esmeralda quando ela captava um vislumbre de algo com um coração batendo por perto. Kira parou de andar, virando o rosto em direção ao topo das árvores. ― Vaga-lumes! Eu não vejo um desde que eu era criança. Tina e eu costumávamos ir para os bosques nos fundos da nossa antiga casa para tentar e pegá-los... ― Mencheres parou também, seguindo o olhar dela até os insetos luminosos espalhados pelo ar. A voz dela tinha outra nota melancólica de lembrança na qual ele não podia se relacionar. Mesmo se ele pudesse lembrar de sua infância, ele não teve irmãos com idade próxima à dele, e sua terra natal não tinha criaturas como essa. Mas essas memórias tinham valor para Kira, prendendo-a a algo perdido de sua juventude. Ele encarou o perfil dela. Sua cabeça estava inclinada para trás, seus lábios cheios ligeiramente separados, a linha pálida de seu pescoço bem visível, o alívio tentador contra a cortina de fundo da floresta. Ela estava tão linda. Quase etérea. Apesar de tudo, ele não conseguia se forçar a desviar o olhar.


Ele talvez não fosse capaz de partilhar a memória dela sobre correr atrás de vaga-lumes quando criança, mas ele podia dar a ela uma nova memória sobre bosques. Uma que ninguém mais poderia fazer igual. Mencheres enviou punhados de seu poder através do chão, os enrolando ao redor dos cachos de vários arbustos de flores silvestres. Uma por uma, ele os fez florescer, até que ele tivesse centenas de flores roxo-pálidas, azuis, amarelas e brancas flutuando acima dos arbustos. Kira não notou. Ela ainda estava olhando para os vagalumes. Lentamente, ele puxou seu poder de volta até que as flores intercaladas aleatoriamente começaram a se reunir em uma grande nuvem. Os olhos de Kira se alargaram quando ela viu a névoa de flores circulando em volta dela no chão. Um arrepio agitou sua carne. ― Eu posso sentir a energia vindo de você. O que você está fazendo com elas? ― Ela não olhou para ele enquanto falava. Mencheres não respondeu, mas ela sentiu o poder dele fluindo em outra onda, agrupando as flores em um cometa traçado que cruzou e mergulhou nos topos das árvores em um confuso balé. Kira fez um som entre um suspiro e uma risada, o rosto dela coberto com maravilha em vez da dor e trauma dos últimos dois dias. Mesmo assim ela não olhou para ele, mas continuou assistindo as flores dançantes. Mencheres estendeu a forma de cometa delas em uma longa faixa. E então enviou aquela bandeira suavemente perfumada em uma série de rodopios altos antes de reunir as flores em um círculo, vários metros acima da cabeça de Kira. Então gradualmente ampliou o círculo e trouxe para baixo em volta dela, circulando-a em uma bainha de flores. Ela encarou os anéis de flores do campo que a rodeavam, estendendo as mãos, mas sem tocá-las. Então ela finalmente olhou para Mencheres, seus olhos verdes se iluminaram com um tom não muito diferente dos vaga-lumes que ela havia admirado antes. ― Deixe-as ir. ― A voz dela estava baixa, o sussurro melódico se entrelaçando em volta dele com sua própria força invisível. Mencheres deixou seu poder cair, libertando as flores para flutuarem para baixo gentilmente até o chão em volta de Kira. E então, algo se apertou dentro dele enquanto Kira caminhava lentamente em sua direção.


CAPÍTULO DEZESSETE. Kira levantou o olhar enquanto diminuía a distância entre eles. Ela tinha ido nessa caminhada com o propósito de confrontá-lo sobre o fato de ele a seguir. Para descobrir se Mencheres foi motivado por suspeita ou pelo desejo de vê-la novamente, mas agora isso não era necessário. Ela podia sentir o desejo dele por ela. Ele penetrava para fora daquela parede que ele construiu ao redor de si com correntes cada vez mais amplas, até ser uma força tangível, invisível, mas em todo lugar. E aquilo incendiou uma fome dentro dela que quase a fez cair de joelhos. Ela queria tocar a pele dele, provar sua boca e enrolar as mãos em seus longos cabelos enquanto ele a pegava em seus braços com algo mais do que proteção. Uma pulsação aumentou dentro dela enquanto se aproximava, quase a curta distância, impaciente para senti-lo rodeá-la com seu corpo ao invés de apenas seu poder. ― Kira. ― A voz dele era baixa e ele respirou depois que disse isso, como se inalasse o nome dela. Ela esticou as mãos que quase doíam para se conectarem com a pele dele. Mencheres as pegou, mas ele a segurou para longe dele, sua aura de necessidade se transformando em frustração. ― Você não quer isso realmente. ― Ela quase riu pelo absurdo da afirmação. Ele não podia sentir a dor que crescia dentro dela, forte demais para ser chamada de desejo, forte demais para ser mera luxúria? Se ela podia sentir as emoções violentas dele ultrapassando as barreiras, ele não podia sentir as dela também? ― Eu quero isso. Você. Tudo. ― Ela aproximou seu corpo ruborizado do dele enquanto falava, apesar de ele ainda manter as mãos dela longe dele. O contato com o corpo dele, mesmo coberto por roupas, era o suficiente para enviar um choque elétrico através de Kira. Ela fechou os olhos enquanto um gemido saia de sua garganta. Com o poder dele a arrepiando em cada lugar onde eles se tocavam, ele estava tão bom que quase machucava. Um ruído áspero também saiu dele, tão intenso e primitivo, que mais calor a inundou dentro de seus quadris. Kira tentou libertar as mãos, que ele segurava, com toda sua força incontrolável, mas Mencheres a segurava sem esforço, nem ao mesmo mudando sua postura. Ele baixou a cabeça, o cabelo dele roçando seu rosto e pescoço como sensuais toques de seda.


― Isso não é o que você sente. São seus novos sentidos, ― ele disse, com a voz baixando para quase um murmúrio. ― Eles fazem você sentir coisas que podem não serem reais. ― ― Eu sentia isso por você antes, ― Kira o interrompeu, a necessidade fazendo seu tom de voz parecer rude. ― Mesmo quando você me manteve prisioneira, mas especialmente depois que você me deixou ir. Não me diga que o que estou sentindo não é real e nem ao menos finja que você não me quer também. ― Ela não se importou com o quanto desafiante aquilo soou. Com a mesma desinibição e clareza sincera que ela só sentiu antes em sonhos, tudo que Kira sabia era o que queria, e que ele sentia a mesma coisa sobre ela. Ela tentou libertar as mãos de novo. Dessa vez, Mencheres a soltou enquanto seus olhos se transformavam de preto para verde brilhante. Em seguida ele a puxou para si. Suas terminações nervosas saltaram em resposta frenética ao choque do corpo dele contra o dela. Ela teve tempo de enroscar os dedos nos cabelos dele antes que a boca dele se inclinasse sobre a dela. O golpe que ela sentiu com esse contato parecia ir direto para seu núcleo, enviando uma onda de choques através dela. A língua dele entreabrindo seus lábios para explorar sua boca com paixão desenfreada. Ele tinha gosto de especiarias, rico e impetuoso, exótico e intoxicante, a preenchendo com calor. O jeito erótico com que a língua dele acariciava a dela apenas aumentou quando as presas de Kira irromperam, derramando sangue dele de forma não intencional. Ao invés de se afastar, Mencheres a beijou mais profundamente, a envolvendo mais forte, a erguendo até que seus pés estivessem fora do chão e apenas os braços dele a mantivessem de pé. Seu desejo inicial parecia apenas um vago sussurro de saudade. Com Mencheres a segurando contra ele e a língua devorando sua boca, ela ardia por ele. As mãos dela deixaram o cabelo dele para descerem pelas costas, as unhas inquietas o arranhando. Aqueles músculos firmes se moviam debaixo da palma de suas mãos, a provocando com o atrito da pele que estava tão perto, mas ainda negada a ela pelas roupas dele. Kira não queria tecido entre eles. Ela queria sentir a pele dele na sua. A pulsação constante entre as pernas aumentavam para um pulsar que exigia ser saciado. Ela tentou dizer isso a ele, mas sua boca continuou a dominar a dela com uma insistência faminta e sensual. Ela não podia falar. Ela mal podia pensar. Algo macio roçou por suas costas e pernas. Então, de algum modo, seu blusão e jeans se foram, e Mencheres estava no chão com ela em cima dele. Ela não parou para pensar nos botões que pulavam da camisa dele em sua


própria harmonia antes do tecido escorregar para longe dele. Tudo com que ela se importava era a incrível explosão que sentiu quando suas peles se encontraram. Como o peito dele era duro, macio e firme contra seus seios e como parecia que, de repente, ele tinha uma dúzia de mãos, porque ela o sentiu acariciando cada parte dela. As sensações que a bombardeavam eram tão intensas quanto quando Kira acordou da primeira vez como uma vampira, somente dessa vez, elas não eram assustadoras. Sua pele fervia, seu corpo tremendo com a necessidade e estremecendo com êxtase apenas pelo fato de senti-lo. Um gemido alto se libertou quando Mencheres escorregou sua boca dos lábios dela para a garganta, arranhando a pele dela com suas presas proeminentes. Ao invés de a morder, ele lambeu e sugou o ponto sensível onde as presas dele a tinham perfurado duas noites antes. A eletricidade que sentia da boca dele permeou um caminho de necessidade cega, que chegava a doer, de seu pescoço até seus quadris, fazendo tudo dentro dela se apertar. ― Eu quero muito você, ― ela arfou, se esfregando contra ele. Mencheres se afastou da garganta dela com um gemido que parecia ecoar por todo ele. Ela agarrou o cabelo dele, desesperada para ter sua boca nela novamente, e então sentiu a felicidade que doía de ter ele se moldando a ela antes de beijá-la mais uma vez. Seu desejo aumentou para um nível dolorido. Kira enrolou os dedos no cabelo dele, quase os arrancando em sua impaciência de trazer a boca dele para mais perto. Quando a mão dele escorregou para cima de suas coxas, ela soltou um gemido sufocado devido ao rastro de formigamento que ele deixava. Em seguida ele cobriu seu sexo, a palma da mão sensualmente esfregando contra seu clítoris com carícias firmes e circulares, seus dedos a devastando com habilidade mesmo sobre a calcinha. Um calor derretido explodiu por Kira assim como suas terminações nervosas mais baixas pareciam ter sido atingidas por um raio. A sensação era tão intensa, tão violenta que a impressionou. Ela gritou perante o aperto convulsivo e súbito dentro dela, o êxtase explodindo por ela em ondas incontroláveis que ondulavam de seu núcleo e se espalhavam para o resto do seu corpo.

***** Mencheres se alegrou ao sentir o orgasmo de Kira. A doçura intoxicante da boca dela, o êxtase torturante da pele dela contra a dele, o corpo dela estremecendo em cima dele enquanto gritos roucos vibravam contra sua boca


― era uma lembrança que ele iria rever muitas vezes no futuro, por mais curto que aquele futuro possa ser. Mas ele já tinha tido mais do que devia. Se ele fosse honrado, ele teria aliviado as necessidades de Kira sem colocar as mãos nela. Ele tinha usado seu poder para esses propósitos no passado com outros vampiros novos que ele criou, mas sempre a distância, onde era impessoal. Todos os desejos dos vampiros eram impressionantes demais para controlar de início, e luxúria não era exceção. Mas quando Kira disse que o queria, quando ela reagiu por ele... Mencheres não pôde meramente satisfazê-la com seu poder. Ele tinha que ter suas mãos e boca nela, senti-la próxima a ele, não importa que fosse tão doloroso quanto era magnífico. Com a maior relutância, ele encerrou o beijo, lambendo os lábios para saborear o gosto de Kira uma última vez. Então ele enviou seu poder para reunir o blusão e a calça que ele tinha, apressadamente, despido dela antes. A cabeça dela caiu no ombro dele, aqueles lábios carnudos e macios exigindo sua pele. Um tremor passou por ele enquanto a língua dela o tocou, provocando e acariciando a pele do seu ombro até o côncavo da garganta. Ah, deuses, se as coisas fossem diferentes. ― Kira. Nós devemos parar. ― Mencheres se forçou a sentar, para ajeitá-la até que seu adorável rosto estivesse olhando para ele em confusão ao invés de estar pressionado em sua carne. ― O que há de errado? ― Tudo sobre ela era uma tentação para esquecer seus princípios. Seus seios excitados contra o sutiã, a calcinha de renda mostrava mais do que escondia, e seu cheiro cítrico era mais doce e mais almiscarado com a luxúria. Ele fechou os olhos. Se ele ao menos se permitisse imaginar que ela tinha um gosto tão bom quanto o cheiro... ― Não podemos fazer isso. Você está debilitada pelos seus novos sentidos. Mais tarde, você poderia muito bem ficar brava comigo por ter tirado vantagem da sua condição se eu a possuísse. ― Kira emitiu um som entre uma zombaria e uma risada descrente. ― Você está pretendendo parar apenas porque acha que eu não sei o que quero? ― Ele tentou lembrar das coisas que tinha dito para as outras pessoas que ele criou quando ele estava em uma situação parecida, mas ele nunca as quis com a mesma necessidade violenta que o arranhava agora. Era difícil formar palavras lógicas quando sua atenção era mantida distraída pelo cheiro de Kira


em sua pele, o quanto ela estava perto dele e o quanto encantadora ela parecia em suas minúsculas roupas de baixo. ― Isso não é o que você escolheria por sua própria vontade não influenciada, ― ele tentou encorajar. Se isso fosse ainda mais difícil, ele chamaria de tortura. Kira ficou de pé com um único pulo, agarrando suas calças e blusão que estavam no chão próximo a ela. ― Inacreditável. Você sempre pensa pelas outras pessoas? Ou isso é algo que você reservou apenas para mim? ― O tom ácido de sua voz foi inesperado. Ela acreditava que ele a recusou por falta de desejo? A simples ideia seria motivo para rir se, no momento, ele não estivesse sofrendo tão fortemente. ― Eu tive experiência com vampiros novos. No momento, seus novos sentidos estão direcionando suas ações ao invés de sua força de vontade. Supondo que você queira o que diz nessas circunstâncias é o equivalente a… ― ― Você realmente faz a cabeça das outras pessoas por elas, ― Kira interrompeu, enfiando as calças. ― Uau, isso deve irritá-las. Também me deixou furiosa. Parabéns, você venceu. Agora eu não quero mais você. ― ― Você nunca se ofereceu para mim antes disso, ― Mencheres repreendeu, sua fachada controlada se quebrando sob o peso de sua frustração. ― Você ficou sob meu teto por uma semana quando nos conhecemos, e mesmo assim, o tempo todo, você só falou do seu desejo de partir. Nenhum desejo por minhas atenções. ― Ela andou com passos largos, seu jeans não fechado totalmente porque ela o rasgou quando o colocava. ― Quando nos encontramos pela primeira vez, eu pensei que você ia me matar, então, quando eu soube que não ia, você ainda estava me mantendo prisioneira. Eu não estava para entrar em um caso indecente de síndrome de Estocolmo dizendo para quem me prendeu o quanto ele me deixava excitada ― embora, se você lembrar, eu disse algo desse tipo um dia. Então, quando você me deixou ir, que era a única coisa que fez com que fosse possível para mim agir sobre o que eu sentia por você, você simplesmente desapareceu. Eu pensei que você não se importava nada comigo. Se não fosse pelo que você fez com meu chefe, eu nunca teria ido procurar por você... ― Kira parou abruptamente, se virando e enfiando o blusão em seguida. Ele também rasgou devido a sua força, ficando pendurado nela como um poncho por causa dos rasgos. Mencheres pulou, agarrando o braço dela e a virando. Algo se torceu dentro de seu peito. O que era isso?


― Você veio procurar por mim? Quando? ― Ela deixou escapar um riso áspero. ― Logo na noite em seguida a que você hipnotizou meu chefe. Eu fui a todos os lugares dos meus arquivos de casos antigos que poderiam ter uma associação paranormal. Você sabe por que eu estava no clube de strip naquela noite? Eu não estava lá investigando um caso de pessoa desaparecida; encontrar Jennifer foi um acidente. Eu estava lá procurando por uma conexão para você, porque eu queria te ver de novo sem aquela coisa toda de captor/capturada entre nós. ― Por um bom momento Mencheres não pôde falar. Ela esteve no clube naquela noite procurando por ele? Também passou outras noites procurando por ele? Kira poderia realmente ter sentido a mesma atração inexplicável e insistente por ele como ele sentiu por ela? Desafiava a razão que ela o teria procurado por algum outro propósito. A personalidade dela não era compatível aos humanos que se amontoavam ao redor dos imortais meramente pela busca de emoção, às vezes perigosa, da companhia de um vampiro, e ela não precisava dele para mais nada. Ele garantiu isso quando lhe deu todo o sangue que ela iria precisar para a irmã antes de ele a deixar. Ela o encarou, a luz da lua refletindo nos olhos verdes dela. ― Diga alguma coisa. Mesmo que seja para me dizer que eu fui uma idiota por te perseguir e que eu mereci terminar como uma vampira por causa disso. Pelo menos isso é melhor do que o silêncio. ― A honestidade nua dela era tão diferente do discurso normal e prudente dele. A razão o advertiu para dizer a Kira que ela estava certa. Que um humano mergulhando sozinho no mundo dos vampiros sem um protetor geralmente acabava sofrendo sérias consequências, mas ele não podia expressar aquela afirmação. Nem podia dizer a Kira a outra coisa que seria melhor para ela acreditar, mesmo que fosse uma mentira: que ele se importava com ela do mesmo jeito que se importava com outra propriedade. Sob o peso do olhar dela, porém, toda sua lógica fria desmoronou e ele se viu respondendo com a mesma honestidade crua que ela demonstrou para ele. ― Eu sou Mestre de uma grande linha de vampiros e humanos, e, sim, com frequência penso pelas pessoas. Além disso, traí quase todos que amo, incluindo participar do assassinado de minha esposa e ocultando informação importante do meu co-regente. Meus outros pecados são numerosos demais para listar, e eu tenho uma certa ameaça de morte em meu futuro, então assim que você for capaz de controlar sua condição, Kira, seria bom para você me esquecer. ― Ela continuou olhando para ele com aquele olhar penetrante e equilibrado, sem repulsa ou choque em seu rosto. Mencheres esperou, aguardando que a qualquer momento suas palavras penetrassem e a reação


dela mudasse, mas os minutos se passaram e a expressão dela ainda não tinha alterado da contemplação pensativa. ― Estou ficando com fome, ― ela disse finalmente, se virando e começando a voltar pelo bosque em direção a casa. Ele olhou para ela recuando com espanto. Onde estavam suas censuras? A flagelação de sua pessoa que tantos outros seriam rápidos em lhe dirigir se ele tivesse dito o mesmo a eles? Além disso, ele não tinha sentido um ataque de fome chegando para Kira, mas talvez ela o estivesse acobertando. Ou aprendendo a antecipar seus desejos. Ele balançou a cabeça e seguiu atrás dela, deixando sua camisa para trás, no chão. Ele já tinha lembranças demais dessa noite sem uma lembrança palpável para se atormentar. A despeito daquilo, ele lambeu os lábios mais uma vez, absorvendo o gosto de Kira e lembrando de como se sentiu ao estremecimento de prazer dela em cima dele. Se ele soubesse que ela tinha procurado por ele, que seu desejo não era totalmente baseado em seus sentidos novos e incontroláveis, ele teria tido forças para recusá-la antes? Não. A resposta ecoou por todo ele, seguida imediatamente por outra pergunta sarcástica. Agora que ele sabia dessas coisas, ele teria forças de ficar longe dela?


CAPÍTULO DEZOITO. Kira se forçou a baixar a caneca apesar de que ainda havia um gole nela. Ela a escorregou sobre a mesa para Gorgon. ― Terminei. ― Talvez as palavras fossem as mais difíceis que ela pronunciou, porém vinha acompanhado de orgulho, mesmo com os gritos de fome que exigiam ela agarrar aquela caneca de volta e lamber cada gota dela. Gorgon sorriu para ela. ― Apenas seu quinto dia imortal. Você é das fortes, não é? ― Kira permitiu que um sorriso tenso cruzasse seu rosto. ― Anos de dieta fazem muitas mulheres fortes quando se trata de controlar nosso apetite. Quem podia imaginar que dizer não para sobremesas iria ser treinamento para se tornar uma vampira? ― Gorgon riu, pegando sua xícara e despejando o sangue que restou na pia. Kira notou que ele nunca bebia das bolsas que comprometiam a totalidade de suas refeições, mas ele desaparecia por várias horas cada noite. Ela esperava que ele variasse seus doadores, ou que seus vizinhos mais próximos não fossem anêmicos. Em seguida ele arremessou uma garrafa de água do refrigerador para Kira. Ela bebeu, fazendo careta para como era o gosto agora, mas já tendo sido avisada de que beber água era importante durante suas primeiras duas semanas como vampira. Parecia que seu corpo queimava todo o sustento que recebia do sangue sem deixar alguma coisa para evitar que ela parecesse como uma uva deixada muito tempo no sol. Kira não perguntou como era possível que ela pudesse beber ou comer, mas não mais ter necessidade de ir ao banheiro. Alguns mistérios sobre vampiros ela ainda não estava preparada para que fossem explicados. O lado positivo, ela nunca teria que lidar com menstruação novamente, mas ter a maternidade arrancada dela era duro. Ainda assim, Tina tinha superado a mesma incapacidade de engravidar devido a sua doença. Kira não se deixaria cair em depressão por causa de seu estado similar de não poder ter filhos, especialmente porque ela sempre poderia adotar, no futuro, quando ela chegasse a um acordo com tudo que sua nova existência implicava. ― Agora. ― Gorgon se virou, segurando uma caixa de ovos. ― Vamos tentar isso novamente. ―


Kira olhou a caixa de ovos com uma mistura de frustração e determinação. Uma regra simples para novos vampiros era que se eles não pudessem lidar com caixas de ovos sem quebrar os ovos, eles não poderiam estar por perto de humanos sem correr o risco de, inadvertidamente, esmagálos com um toque casual. Nos últimos dias, Kira tinha demolido mais caixas de ovos e tido as mãos cobertas em mais gema do que ela queria lembrar. Ela ainda sentia como se tivesse aquela substância pegajosa impregnada entre as unhas não importando o quanto ela lavava, mas ela estava ficando melhor. Ela conseguia não arrancar mais portas, ou deixar buracos ao invés de pegadas no chão, e a última caixa de ovos com a qual ela lidou teve um ovo quebrado quando ela terminou. Kira caminhou até Gorgon, repetindo ― suave, suave ― em sua mente enquanto ela estendia a mão para a caixa. Quando ela conseguiu tirá-la das mãos abertas de Gorgon sem nenhuma meleca de ovo se espalhando por suas mãos, ela deu risada. ― Há! ― Parecia que a quinta vez era um encanto. O sorriso de Gorgon era orgulhoso. ― Agora, se você puder abri-la e tirar alguns ovos sem quebrá-los, você está quase pronta para estar por perto de humanos novamente. ― Bem devagar, Kira abriu o recipiente e tocou o topo de um ovo. Ele não quebrou, para o seu alívio. Agora tudo que ela tinha que fazer era tirá-lo. Em sua visão periférica, ela notou Mencheres chegar. Era como ela o via na maioria das vezes ultimamente ― pelo canto do olho. Ele não a estava evitando completamente, mas parecia que ele sempre estava ocupado fazendo alguma outra coisa ao invés de passar o tempo na mesma sala que ela. Isso não era feito de uma forma rude. Ao invés disso, quase parecia que Mencheres queria evitá-la, mas que não conseguia ficar totalmente longe. A motivação por trás de sua presença 'lá, mas não bem lá' aguçou sua curiosidade. Será que esse, reconhecidamente, Mestre vampiro muito velho e sofisticado realmente estava se sentindo envergonhado sobre o que aconteceu entre eles? ― Tire o ovo, ― Gorgon a despertou. Kira colocou três dedos ao redor da forma oval e fria, pressionando tão suavemente quanto pôde para erguê-lo. O ovo tremeu mas não explodiu. Pense em Tina, ela se motivou. Isso não era um ovo; era a mão de sua irmãzinha, e ela ia apertar sua mão sem machucá-la quando a visse novamente... O ovo saiu da embalagem inteiro. Gorgon gritou. Kira quase pulou de emoção, mas esmagar o chão iria arruinar o momento. Ela olhou para cima, o ovo aninhado em sua mão, para ver Mencheres a observando. Ele tinha uma


expressão contente no rosto que rapidamente ficou indiferente quando seus olhos se encontraram. Ainda bancando o Sr. Indiferente, hum? Ela pensou, voltando a atenção para a caixa de ovos. ― Vou tentar mais um, ― ela disse para Gorgon. Ele sorriu. ― Vá em frente. ― Enquanto ela pegava outro ovo com a mão livre, seus pensamentos voltaram para Mencheres. Depois da confissão dele na floresta, Kira refletiu se ele era realmente desprezível como fez parecer. Afinal de contas, ela era a última pessoa a pensar ― Ohhh, sexy! ― quando um homem admitia ser um bastardo cruel e controlador. Ela tinha passado por aquele tipo de relacionamento antes, então ela sabia que não tinha nada romântico ou sexy nisso. Mas apesar de Mencheres ter pintado uma figura feia dele mesmo, refletindo, suas ações eram um contraste com suas palavras. Quando a manteve com ele naquela primeira semana em que se conheceram, ele saiu de seu próprio caminho para dar a ela mais liberdade possível. Então ele a deixou ir apesar do risco para o sigilo de sua raça, acrescido o fato de dar a Kira os meios de tratar a doença de sua irmã para que Tina tivesse uma expectativa de vida normal. Então quando Flare a pegou, Mencheres foi até ela e a curou sem a mínima hesitação. Perante o ultimato de Radje, Mencheres fez a única coisa que podia fazer por ela: Ele a trouxe de volta da morte. Desde que ela acordou no avião pela primeira vez, ele não tinha estipulado uma condição ou limitação para ela que não fosse unicamente para prevenir que ela matasse pessoas inocentes. Ela tinha completa liberdade para fazer o que queria, incluindo ligar para qualquer pessoa, verificar seus e-mails, ou mesmo fazer compras online para que ela pudesse ter algo além de roupas emprestadas para vestir. E Mencheres tinha afirmado repetidamente que assim que ela estivesse no controle de sua fome e sua nova força, ela estava livre para ir. Novamente. ― Quase lá, ― Gorgon disse de forma encorajadora quando Kira começou a retirar outro ovo. Uma pequena rachadura apareceu na superfície branca. Ela apertou os lábios, mas continuou. Depois de alguns segundos, o ovo estava em sua mão, uma pequenina rachadura em forma de zig-zag danificando sua superfície lisa, mas seu interior ainda seguramente contido. ― Coloque-o de volta sem esmagá-los e eu acho que você conseguiu, ― Gorgon disse, piscando para ela. Kira dividiu sua atenção entre devolver aqueles ovos para seus recipientes e em tudo que Mencheres não disse ou fez. Ela sentiu a necessidade dele na outra noite, mas apesar de ela praticamente ter exigido que ele fizesse sexo com ela, ele se recusou alegando que ela podia estar sob


a influência dos novos sentidos. Então ele disse a ela coisas terríveis sobre si quase como se quisesse que ela o censurasse. Mencheres não age como alguém que tivesse pouca consideração pelos outros. Ele tinha um poder extraordinário, mas ele não ostentava. De fato, ela só o tinha visto usá-los quando era para beneficiar outras pessoas. Se ela fosse ele, ela usaria aqueles poderes o tempo todo. Como teletransportar sangue ou água para ela enquanto estivesse sentada com a bunda relaxando ― e que Deus ajudasse a todos se Kira algum dia tivesse a habilidade de mover objetos quando alguém a fechasse no trânsito. Não, havia muito mais em Mencheres do que o jeito que ele tão duramente se descreveu. Apesar de seu conselho para ela esquecê-lo assim que recuperasse o controle de sua nova condição, ela não tinha intenção de fazer isso. Com o canto do olho, Kira observou Mencheres ir para a próxima sala com seus passos deslizantes de costume, sua postura ereta e suntuosa, seu traseiro preenchendo a parte de trás de suas calças com uma sensualidade que era pecaminosa. Não, ele não ia assustá-la assim facilmente. Ela iria despi-lo daquela casca que tinha construído ao redor de si quando dizia respeito a ela. E então ela veria se a ligação entre eles, a mesma que Mencheres parecia tentar evitar tão arduamente, era tão forte quanto ela suspeitava. Kira colocou os ovos de volta em seu berço de papelão, sorrindo pelo seu feito e já planejando seu próximo movimento. O jogo começa.

***** Mencheres ouviu a porta de seu quarto se abrir, mas ele não abriu os olhos. A água quente na banheira era tranquilizante. Ele estava relutante em quebrar a paz temporária de estar mergulhado nela por algo tão trivial como Gorgon deixando sua roupa lavada. Mesmo que ele tivesse dito a seu amigo que ele podia cuidar de suas próprias tarefas domésticas, Gorgon insistiu em fazê-las. E, na verdade, poderia levar alguns minutos para Mencheres descobrir como operar uma máquina de lavar moderna. Ele geralmente tinha uma equipe grande de humanos e vampiros em cada casa em que ele ficava, então outros tinham que lidar com tais tarefas para ele. Talvez Gorgon pensasse que seus esforços agora evitariam a necessidade de substituir todo o guarda-roupa de Mencheres mais tarde.


Mas então, um barulho de batida o fez abrir os olhos. Ele olhou através do véu da água da banheira para ver Kira emoldurada pelo batente da porta, seus dedos finos batendo na moldura. Ele tirou a cabeça da água logo em seguida, um alerta soando sobre ele. ― Há algo errado? ― ― Não, ― ela disse, entrando no banheiro para se encostar na bancada. ― Gorgon saiu para dar uma volta ― o que eu presumo ser para encontrar seu jantar ― e eu estava me sentindo um pouco solitária. ― Seus olhos verdes eram claros e sinceros, mas Mencheres preferiu duvidar da verdade em sua afirmação. Kira nunca tinha entrado em seu quarto antes, sem falar em surpreendê-lo enquanto estava no banho. Ela tinha um método para suas ações. Que método, ele não sabia. Ainda. ― Solitária? ― ele repetiu, erguendo uma sobrancelha. Ela deu de ombros. ― Todo mundo que eu conheço está dormindo a essa hora, e há um limite para o quanto uma pessoa pode assistir de TV sem ficar louca. Já que estou mal conseguindo lidar com minha fome e força, eu pensei que seria uma boa ideia conversar com você ao invés de me estressar medindo meus passos pelo chão até Gorgon voltar. Eu estava errada? ― Aquele olhar sincero de novo, mas com um toque de desafio dessa vez. Mencheres sentiu a boca se contorcer para um sorriso. Ela o estava desafiando a dizer para ela sair com a implicação de que isso faria seu progresso admirável regredir. Ele estava curioso para ver até onde ela pretendia levar isso. ― Por favor. Fique. ― Ele se sentou contra a borda da grande banheira, entrelaçando os dedos atrás da cabeça. O olhar de Kira se demorou em seu peito antes de ir para baixo, para a água da banheira, parou, e então um leve sorriso surgiu em seu rosto. ― Bolhas. Em uma escala de um a dez, um banho de espumas seria a última coisa que eu esperaria de um vampiro mau e mais velho do que a poeira para se satisfazer. A única coisa que me surpreenderia mais seria se você tivesse um patinho de borracha. ― Ele tentou esconder um sorriso novamente, mais forte dessa vez. ― Brinquedos de banho são reservados apenas para os vampiros mais velhos e mais letais. Eu tenho um século inteiro e uns mil homens para matar antes de alcançar esse marco sagrado. ―


Kira riu, um riso rouco e feminino que fez as coisas apertarem dentro dele, lembrando Mencheres do motivo de ele não ter passado muito tempo na presença dela nos últimos dias. Um formigamento se iniciou em sua virilha, a silenciosa exigência do seu corpo o encorajando a enviar seu sangue para lá. Ele ignorou, satisfeito por ter controle sobre tais coisas ao invés de seus quadris fazerem o que querem. ― Então como estou indo? ― Kira perguntou, se apoiando para sentar na bancada. Ela rangeu ao primeiro toque de suas mãos, mas ela não exerceu força o suficiente para que ela quebrasse. Novamente, um progresso admirável. Ele fechou os olhos. Talvez fosse mais fácil continuar ignorando os desejos de seu corpo se ele não continuasse olhando para ela. Era tormento o suficiente ter o cheiro dela preenchendo o cômodo, o provocando com sua proximidade. ― Você está progredindo muito bem. Em alguns dias vamos te mostrar como se alimentar de humanos. Quando você for capaz de fazer isso sem assistência, você não terá que permanecer aqui. ― ― Eu não quero me alimentar de humanos, ― ela disse de uma vez, aquela leveza de antes em sua voz desaparecendo. ― Vou ficar com o sangue ensacado. Aquecido e em uma caneca, eu posso fingir que é um café bem espesso. Morder a pele de alguém... não, eu não quero fazer isso. ― Mencheres não abriu os olhos. ― Você deve, mesmo que não seja seu método preferido de alimentação. Se a fome bater em um lugar onde sangue ensacado esteja indisponível, é melhor saber como se alimentar sem ferir um humano do que mutilar ou matar algum por falta de experiência. ― Ele podia quase ouvir ela mordendo o lábio. ― Você tem razão, ― ela disse finalmente. Mencheres não se incomodou em dizer a Kira que uma vez que ela provasse sangue direto da veia, era duvidoso que ela voltasse para sua alternativa ensacada. Não havia comparação no gosto entre sangue fresco e bolsas de plasma. Mesmo a energia derivada do sangue fresco era mais potente do que do substituto. ― Aquele policial corrupto, Radje, o que ele tem contra você? ― Kira perguntou, a mudança de assunto o surpreendendo o suficiente para que abrisse os olhos. Ele quase teve lembranças nostálgicas. Mesmo que ele pudesse resumir milhares de anos de antagonismo entre ele e Radjedef em uma curta explicação, ele não queria. Porém, desde que sua antiga rixa resultou em Kira perder sua mortalidade, não era justo se recusar a responder.


― Radje veio de uma linha de governantes onde cada herdeiro era atribuído um determinado número de anos para reinar sobre os seres humanos. No começo de cada reinado, o herdeiro era transformado em um vampiro, garantindo a chance de imortalidade, mas também garantindo que o herdeiro não tivesse filhos vivos. Consortes eram providenciados para a esposa do herdeiro, e dos filhos que gerassem, um era escolhido como novo herdeiro. O sistema foi honrado por muitas gerações, até Radje. Ele foi severo depois de abrir mão de seu tempo de reinado designado. Quando seu sucessor morreu misteriosamente antes de terminar seu reinado, a responsabilidade de escolher um novo herdeiro caiu para Radje. Ele atrasou nomear outro e ao invés disso procurou retomar o poder. Um herdeiro foi escolhido apesar das objeções de Radje, mas então ele se recusou a ceder o controle, citando preocupações sobre a capacidade do novo herdeiro para governar. Quando foram feitos ataques contra a vida do herdeiro, o criador de Radje intercedeu e usando de força o removeu do reino. Mais tarde, ao invés do dom de um poder que inicialmente era previsto para Radje, foi dado por seu criador para o novo herdeiro. Radje queima de ódio desde então. ― Kira o encarou, seu rosto refletindo simpatia, compreensão, e um toque de raiva. ― Você era o outro herdeiro, o que ele tentou matar. ― Mencheres inclinou a cabeça. ― Sim. ― Aquele olhar verde não vacilou. ― E qual foi o dom que você conseguiu ao invés de Radje? ― ― Ele iria variar dependendo do indivíduo, mas o que eu recebi foi força adicional, a habilidade de ler as mentes dos humanos, visões do futuro e o poder de localizar e controlar pessoas ou objetos com o pensamento. ― Ela emitiu algo parecido com uma risada. ― Oh, essas coisas triviais. É culpa dele, mas uma vez que ele é cruel demais para admitir isso, não é de se espantar que Radje te odeie. Grandes guerras mundiais foram travadas por ciúmes menores. ― Sim, e se ele dissesse a Kira quantas das guerras travadas entre humanos durante os séculos foram originadas por rixas derramadas entre outros vampiros Mestres, ela ficaria impressionada. ― Então, antes de você se tornar um vampiro, você era um tipo de líder? ― Mencheres lhe deu um leve sorriso. ― Algo do tipo. ― ― Não é para menos que você é acostumado a pensar por outras pessoas, ― ela murmurou. ― Assim como os políticos hoje. ―


Ele sufocou a risada devido a ironia no tom de voz dela. ― 'O poder absoluto corrompe absolutamente' ― ele citou. Ela pulou da bancada, estremecendo enquanto o chão rangia quando colocou os pés, mas parecendo aliviada quando o azulejo permaneceu intacto abaixo dela. ― E Radje pegou sua amargura e se tornou uma versão de policial vampiro. Parece uma escolha estranha. ― Mencheres ergueu um de seus ombros levantados em um meio dar de ombros. ― Guardiões da Lei estão na posição de mais alto regulamente entre vampiros. Foi negada a Radje uma forma de poder, então ele assumiu outro. ― Kira parecia pensativa. ― Eu queria ser uma policial. Não deu certo. ― Ele ficou intrigado. Ela tinha provado ser uma mulher bem determinada. O que tinha sido o suficiente para detê-la de seu objetivo? ― O que aconteceu? ― Ela lhe deu um olhar. ― Se você quer que eu te conte, então eu vou colocar meus pés na sua banheira. Vou precisar de algo para me relaxar nessa viagem nos caminhos da memória. ― Agora ele estava realmente intrigado. Mencheres inclinou a cabeça para o lado da banheira. Kira tirou os sapatos antes de, cuidadosamente, se sentar na borda plana. Ele moveu as pernas para permitir a ela mais espaço, mas não era necessário. Ele tinha deliberadamente escolhido uma banheira grande para envolver todo seu corpo quando ele descansasse debaixo d'água. Kira soltou um ruído de satisfação quando seus pés, então as panturrilhas, desapareceram na água. Mencheres manteve o olhar no rosto dela, não nas adoráveis coxas que estavam nuas e próximas devido ao jeito que ela ergueu a barra do vestido bem acima dos joelhos. ― Eu te disse que tenho pressentimentos sobre coisas. Quando eu tinha dezessete anos, eu tive um pressentimento sobre o irmão mais velho da minha amiga, e aquele pressentimento era perigo. Na superfície não havia razão para isso. Pete era atlético, popular, veio de uma família de policiais e ele mesmo se tornou um policial logo depois de se formar no colegial. Eu acho que o único motivo para Pete me notar era porque eu o evitava sempre que saia com sua irmã. ― Mencheres não pôde conter uma bufada leve. ― Claro, não tinha nada a ver com sua inteligência ou beleza. ― Ela lhe deu um olhar atravessado. ― Pete tinha montes de garotas espertas e bonitas atrás dele. Mas ele começou a jogar charme para cima de


mim, e eu ignorei aquela sensação de alerta sobre ele porque eu ainda não tinha aprendido a confiar nos meus instintos. Nós começamos a namorar. As coisas eram boas no começo, mas então o ciúme de Pete começou a me preocupar. Ele odiava quando eu passava tempo com meus amigos. Não podia suportar outro cara olhando para mim. Logo antes da formatura eu terminei com Pete. Ele estava começando a me assustar. ― No quarto, o telefone celular de Mencheres começou a tocar. Ela olhou por cima. ― Você precisa atender? ― ― Pode esperar. ― Ele pensou na pasta de papel manilha que tinha dado a Bones. Ela continha todas as informações sobre Kira ― detalhes que Gorgon reuniu e que Mencheres se recusou a olhar com a noção de que quanto menos ele soubesse sobre Kira, mais simples seria tirar ela de seus pensamentos. Agora ele não deixaria nada, nem ao menos o toque indicando que era Bones ligando para ele, interrompê-lo de ouvir sobre essa parte do passado de Kira. ― Minha mãe contraiu meningite bacteriana um pouco depois que terminamos. Antes que Tina e eu soubéssemos, ela simplesmente se foi. Nós estávamos devastadas. Pete apareceu e ajudou com o funeral, cuidou das coisas ― ele foi incrível. Ele se desculpou por tudo de antes, disse que percebeu seus erros e que até queria se casar comigo. Eu não tinha certeza, mas... o Departamento de Crianças e Famílias estava farejando Tina. Ela tinha só dezesseis anos, meu pai não era pai dela e seu verdadeiro pai não a queria. Se eu me casasse com Pete, Tina teria o que eles consideravam, um 'ambiente familiar estável', e ela não iria para um lar adotivo. Então, mesmo tendo acabado de completar dezenove anos e ainda tendo dúvidas, eu me casei com ele. ― Ela fez uma pausa para dar a Mencheres um sorriso seco. ― Como você pode imaginar, Pete não mudou milagrosamente. Sua possessividade ficou pior. Logo eu não tinha mais amigos, faculdade foi adiada e a única família que eu via era Tina porque ela vivia conosco. Eu era miserável, mas decidi esperar até Tina completar dezoito anos antes de eu deixá-lo. Acho que Pete suspeitou o que eu pretendia. Seus ataques de raiva pioraram e ele começou a bater em mim. ― Mencheres não disse nada, mas em sua mente, ele já estava ordenando a Gorgon para tirar uma cópia das informações que ele reuniu sobre Kira para que ele pudesse encontrar esse Pete e matá-lo. Sim, ele conhecia o tipo. Não, eles nunca mudavam. ― Eu tentava esconder os ferimentos de Tina porque ela já estava lidando com inferno suficiente por causa de sua doença. Então um dia, quando eu estava limpando o sótão, eu encontrei alguns sacos com pó branco e uma


pilha de dinheiro enfiada em uma caixa. Não precisava ser um gênio para descobrir o que Pete estava fazendo. Eu liguei para o parceiro dele, esperando que ele interferisse, mas foi um erro. Pete negou, disse que eu era louca, seu parceiro queimou a informação e Pete me bateu até me deixar inconsciente. Ameaçou me matar se eu desse um pio sobre o dinheiro ou as drogas para alguém novamente. Depois disso, pessoas estranhas começaram a aparecer na casa toda hora. Eu sabia que Pete estava distribuindo ou pior, e me deixava apavorada por causa de Tina. Eu tinha que tentar conseguir ajuda novamente, não importando com o que ele me ameaçasse. Havia um velho policial, Mack Davis, que eu conheci no meu casamento. Pete disse que ele estava com Assuntos Internos. Então eu fui vê-lo. ― Sua voz mudou do tom sem interesse e sem emoção que ela usou em sua releitura para algo mais suave e mais rico. Só aquilo disse a Mencheres que Mack Davis não tinha falhado com ela. ― Mack acreditou em mim. Armou algo para pegar Pete sozinho porque ele sabia que com a longa linhagem de policiais na família de Pete, provavelmente alguém avisaria Pete se Mack fosse pelos canais normais. Em um mês, Mack teve toda a prova que precisava desde vídeo, gravações e coisas que eu dei a ele para ir direto ao promotor. Pete e outros dois policiais envolvidos foram presos por distribuírem drogas. Eu fui uma das testemunhas principais no julgamento de Pete. O juiz o sentenciou por trinta anos, mas Pete foi morto na prisão dentro de um ano de encarceramento. ― Kira fez uma pausa para olhar direto nos olhos de Mencheres. ― Eu sabia como ex-policiais eram tratados pelos detentos quando testemunhei contra ele. Eu até sabia, lá no fundo quando fui ver Mack pela primeira vez, que isso resultaria na morte de Pete. Mas apesar de uma parte de mim ainda o amar, eu fiz do mesmo jeito. A família de Pete me chama de assassina, mas eu não o matei. Ele escolheu seus atos, e aquilo selou seu destino. Eu me arrependo da morte dele, mas não me arrependo de salvar a mim e minha irmã. ― Ela desviou o olhar, depois, com um dar de ombros auto-depreciativo. ― Depois que eu vi como um bom policial como Mack podia reverter o dano que tantos outros maus causaram, eu fui para a faculdade, consegui um diploma em justiça criminal e fiz a academia de polícia. Arrasei, mas apesar de ter meu certificado em aplicação da lei, nenhuma agência de polícia iria me contratar. Alguns dos amigos de Pete e dos outros policiais votaram contra mim. Então ao invés de ser uma oficial de polícia, Mack me conseguiu um emprego para treinar como investigadora particular. Não é muito além de perseguir esposas traidoras e uma tonelada de papelada, mas tem um potencial mais tarde por fazer uma diferença nas vidas das pessoas. Mack morreu há um ano atrás. Sua fé era salvar uma vida, a cada chance que ele tinha. Ele terminou salvando muito mais do que uma, e agora é meu objetivo fazer o mesmo. ―


CAPÍTULO DEZENOVE. Tantas emoções passaram por Mencheres. Satisfação de que o homem que abusou de Kira estava morto. Admiração por sua coragem de gelo em uma idade tão jovem. Gratidão pelo humano que tinha intercedido por ela. Raiva pelos policiais que negaram um emprego a Kira por lealdade a aqueles que desonraram a lei. Acima de todas as emoções, porém, estava a empatia. Ele sabia a agonia que ela tinha sentido por ser a causa da morte de alguém que uma vez amou, mesmo se Kira não tivesse sido o real instrumento. Sim, ele estava bem familiarizado com a dor de fazer aquela escolha, então tendo que carregá-la até o fim amargo e sangrento. Poucas pessoas saberiam como era pesado carregar esse fardo. De todas as pessoas nas proximidades daquele armazém há três semanas atrás, Kira ser aquela que seguiu a voz dele e entrou por aquela porta tinha que ser mais do que coincidência. Tinha que ser destino. Mas com aquela escuridão que se aproximava esperando por ele, Kira poderia ser destinada a ser a causa de sua morte? Em tão pouco tempo, a posição dela em sua vida havia crescido para uma de grande importância. Ninguém em dois milênios havia sido responsável por tal grande mudança em suas ações, pensamentos e sentimentos. Frio bom senso foi o que o manteve vivo através desses longos anos cheios de guerra, mas sempre que estava perto de Kira o bom senso o deixava. Se ele procurar impedir aquela ameaça escura e vazia, sua melhor chance era afastar Kira dele. Aqueles governados pela emoção ao invés da razão eram muito mais fáceis de matar, como ele bem sabia. No entanto, olhando para Kira, ele não se importava com a razão ou morte. Ou seu telefone, que começou a tocar de novo. Mencheres deslizou pela água na compulsão inflexível que leva mariposas várias vidas de razão, frias armações e, soubessem o que ele não sabia, que a destruição.

direção dela, guiado pela mesma a dançar com as chamas. Ele teve por fim, vazio. Talvez as mariposas alegria da chama valia o preço da

Ele pretendia descobrir. Os olhos de Kira escureceram para um tom mais rico de verde enquanto ele se aproximava. Ele colocou as mãos, uma de cada lado dela, se apoiando na borda da banheira enquanto ficava de joelhos. As pernas dela roçavam seu peito, a água escorrendo dele molhando as pontas de seu vestido, mas ela não se moveu. Ao invés disso, o cheiro dela resplandeceu com desejo enquanto ela, devagar, olhava o corpo dele com atenção.


― Eu quase posso sentir seu olhar em mim, ― ele murmurou, o calor envolvendo seus quadris enquanto ele enviava seu sangue, aquecido pelo banho, para lá, finalmente. ― Se você esperava que eu não olhasse, Mencheres, você se subestimou. ― A voz dela era rouca, se deliciando com as sílabas de seu nome como se estivesse as acariciando. Ele se moveu para mais perto, saboreando o gemido dela quando suas peles se encontraram. Ela escorregou os braços ao redor do pescoço dele, os dedos separando seus cabelos em várias mechas enquanto olhava fixamente para seus olhos. ― Não vai decidir parar no meio do caminho de novo, vai? ― Ele desceu a boca para o ouvido dela, lambendo uma vez o lóbulo delicado antes de responder. ― Eu estava separado da minha esposa por mais de nove séculos e proibido por lei de deitar com outra pessoa. Depois da morte dela, ninguém me tentou o suficiente... até você. ― Um ruído de espanto escapou enquanto Kira se afastava para olhar para ele. ― Você não faz sexo a mais de novecentos anos? ― Ela engoliu seco. ― Se você está tentando dizer que quer que as coisas vão devagar, esperar até nos conhecermos melhor… ― Ele riu, a puxando para dentro da banheira com ele. ― Não. Estou te avisando que não vou ter piedade. ― Ele a beijou com toda fome reprimida que o havia enfurecido na maior parte de um milênio. Os braços de Kira se apertaram ao redor dele, o gosto da boca dela era intoxicante, o carinho de sua língua uma extravagância sensual. Água espirrou da banheira quando ele tirou seu vestido e o colocou de lado. Seu sutiã e calcinha foram igualmente descartados, até que nada interrompesse a suave maciez da pele dela junto a dele. Ela gemeu enquanto passava as mãos pelo corpo dele. Ele escorregou a boca da dela, beijando aquele belo maxilar antes de descer para a plenitude de seus seios. Ele encheu a boca com um de cada vez, sugando seus mamilos até a respiração profunda de Kira se tornar gritos, e as unhas dela arranharem suas costas. Os toques dela se tornaram mais frenéticos, e ela enrolou as pernas ao redor da cintura dele. A sensação dela ao redor dele era magnífica, cada volta insinuante de seu corpo inflamando, mas ele não iria apressar esse momento. Primeiro ele queria explorá-la totalmente. Ele acariciou seus seios enquanto sua cabeça afundava na água. Aquele adorno apertado de cachos provocou sua boca antes de sua língua separar


suas profundezas. Luxúria guarnecida com intolerável intensidade ao prová-la pela primeira vez. Sua maciez escorregadia era viciante, o encorajando a mover a língua mais rápido, profundamente, até mais de seu mel saborear a boca, e os gritos dela tinham um som urgente e ritmado. O prazer dela só aumentou sua necessidade avassaladora e dolorosa, apertando tudo dentro dele com exigência voraz. Ele tinha que estar dentro dela. Tinha que… ― Mencheres se atirou da banheira com um rosnado, apenas seus séculos de longa amizade o impediram de eliminar, com força letal, o vampiro que interrompeu. Gorgon estava de pé na soleira da porta do banheiro, sua expressão era amarga. ― Se não fosse caso de vida ou morte, acredite, eu não teria interrompido, mas você precisa ver isso. Agora. ―

***** Se Kira ainda pudesse corar, suas bochechas teriam ficado vermelho fogo. Ficando no banheiro e nunca mais colocando os olhos em Gorgon parecia um bom plano para ela, mas as palavras ― vida e morte ― fizeram isso impossível para ela atender ao seu constrangimento. Mencheres havia fechado a porta do banheiro murmurando uma desculpa quando ele saiu para ver qual era o motivo pelo qual Gorgon os interrompeu, então ela teve um momento particular para retomar seu equilíbrio rompido ― e uma toalha ― antes de segui-lo. ― Eu tentei ligar, ― Gorgon estava dizendo enquanto ia para o computador de Mencheres, entre todas as coisas. ― Bones também tentou. Ele me ligou depois que não pôde te encontrar. Quando eu desliguei com ele, eu corri para cá o mais rápido que pude. ― Mencheres ficou de pé com os braços cruzados, ainda nu, água pingando no carpete abaixo dele. Kira percebeu que ele tinha uma tatuagem nas costas de um símbolo que ela não reconheceu, mas ela não aproveitou o tempo para admirá-la quando sua atenção se fixou no que Gorgon estava fazendo. ― Você não pode me dizer o que é tão urgente enquanto está preparando o computador? ― Mencheres rosnou. ― Aquele clube de strip tease da outra noite foi incendiado, ― Gorgon disse enquanto seus dedos se moviam rapidamente pelo teclado. ― Aqueles três vampiros estão mortos, e também vários humanos. Mas esse não é o verdadeiro problema. ― ― Jennifer era um dos humanos mortos? Jennifer Jackson? ― Kira perguntou, surpreendida pela forma fria com que Gorgon descreveu as mortes. ― Seria melhor se ela tivesse, ― Gorgon murmurou.


Kira engasgou com a resposta dele. Mencheres a puxou para dentro do círculo de seus braços, seu cabelo molhado caindo nos ombros dela, a boca suavemente tocando sua têmpora. ― Essa notícia, embora importante, poderia ter esperado, ― ele disse para Gorgon com um tom de voz duro. Gorgon olhou para cima depois de mais alguns rápidos movimentos de seus dedos no teclado. ― Isso não pode. ― O site de um canal de notícias de Chicago preencheu a tela do laptop, um segmento de vídeo do noticiário das onze horas no centro da página. Os olhos de Kira se arregalaram na imagem congelada com a manchete de VAMPIRO RESPONSÁVEL POR INCÊNDIO CRIMINOSO? Não foi a manchete que a espantou. Foi se ver na imagem, sua cabeça para trás, a boca de Mencheres junto a sua garganta. ― Oh meu Deus, ― ela sussurrou. Gorgon clicou play e a voz da apresentadora do noticiário fluiu, falando sobre a cena de horror dos corpos queimados que os bombeiros encontraram quando atenderam ao chamado. Surpreendentemente o incêndio tinha acontecido um dia antes de ontem, não na noite passada, mas o que tinha sido descoberto a tempo para o noticiário das onze foi a filmagem de segurança. O único aparelho recuperado na cena, danificado, mas alguns segmentos ainda eram visíveis. ― ... não tem os nomes dos participantes envolvidos, ― a apresentadora falou com a monotonia de uma voz sombria e profissional. ― A polícia ainda está no processo de procurar suas identidades, mas como você pode ver, parece haver uma bizarra imitação de um ritual de vampiro ― isso mesmo, eu disse vampiro ― acontecendo. Vamos assistir a sequência, Robert. ― Mencheres segurou Kira com mais força enquanto ela assistia, sem palavras, enquanto sua morte passava na tela. Quando ela viu Mencheres tirar seu colar e usá-lo para cortar sua própria garganta, sua mão se fechou convulsivamente sobre sua cruz. Ele deve ter substituído a corrente, ela pensou, se sentindo paralisada. Ela nunca tinha notado um momento em que o colar não estava com ela, mas ela esteve extremamente confusa pelo desejo de sangue naquele primeiro dia... ― Você vai se arrepender disso, ― Mencheres disse na tela para Radje depois que ela terminou de beber de seu pescoço, e seu corpo estava imóvel. O Guardião da Lei cruzou os braços. ― Você está me ameaçando? ― Parecia que a tela havia se apertado para mostrar um close do rosto de Mencheres. ― Eu prometo a você. ―


A imagem desapareceu para mostrar a apresentadora do noticiário novamente. Ela pedia a qualquer um com informação sobre a identidade das pessoas no vídeo para entrar em contato com o departamento de polícia de Chicago Heights, CrimeStoppers,11 ou a sede de notícias. Kira ainda não parecia poder formar qualquer palavra. Minha irmã deve ter visto isso, ela se encontrou pensando de uma forma congelada e imparcial. Ou seu irmão. Ou seu chefe, ou Lily, qualquer outra pessoa do seu escritório ― inferno, ― os policiais que estavam no julgamento de Pete anos atrás devem tê-la reconhecido. Em menos de cinco minutos, todas as suas chances de retornar de alguma forma a sua antiga vida foi incendiada com a mesma eficiência cruel como o fogo que destruiu o clube de strip tease. ― Radje, ― Mencheres falou com raiva. ― Esse é um crime imperdoável, mesmo para ele. ― Gorgon olhou para ele fixamente. ― Os Guardiões da Lei estão alegando que você matou aquelas pessoas e queimou o clube. ―

***** Mencheres olhou para Gorgon, absorvendo aquela informação. Seus braços ficaram ao redor de Kira, sentindo o tremor que passou por ela. ― Essa foi toda a gravação recuperada? ― ela perguntou com uma voz áspera. ― O vídeo daquela noite tem vários dias. Não havia fitas mais recentes disponíveis, talvez uma que mostrasse o verdadeiro assassino e incendiário? ― Mencheres não precisou ver Gorgon balançar a cabeça para saber a resposta. Ele achou que as salas no clube eram filmadas. Radje obviamente também, e o Guardião da Lei teria garantido que nada que o incriminasse fosse deixado na cena. Não, Radje só tinha deixado as imagens que pareciam muito incriminadoras para Mencheres para qualquer um em seu mundo que as visse. ― Nenhuma gravação foi encontrada com data depois dessa, e o que você viu foi uma versão resumida. O clipe todo não está no site da estação de notícias, mas está no YouTube e em vários outros lugares. ― ― Me mostra, ― Kira disse de uma vez. Gorgon olhou para Mencheres. Ele lhe deu um assentimento que mal pôde ser percebido. Depois de alguns cliques, a versão do YouTube começou a passar. Era significantemente mais longa, começando quando Mencheres

11

É um programa separado do sistema de números dos telefones de emergência, que permite que um membro da comunidade forneça informação anônima sobre atividade criminosa.


chegou para curar Kira e terminando com ele carregando seu recente corpo morto para fora da sala. A parte fria dele pôde admirar a esperteza de Radje. Salvo em fita para o mundo todo ver a ameaça velada de Mencheres aos três vampiros que feriram Kira, seu claro descontentamento com a sentença do Guardião da Lei e sua ameaça aberta a Radje no final. Brilhante. ― Olhe os comentários. ― A voz de Kira estava vazia. ― Eles estão criticando minha morte. ― Ele procurou o comentário abaixo da caixa de vídeo. Frases como ― Meu Deus isso é tão falso! ― Deveria ter mais sangue ― Pior atriz de todas ― e ― Que merda é essa com os olhos brilhando de maneira falsa? ― foram todas que ele leu antes de fechar o laptop com uma pancada de sua mente. Kira puxou seu braço dele e Mencheres a soltou. ― Eu preciso... eu não sei. Eu deveria ligar para Tina. Se ela acordar amanhã e vir isso, ela vai pirar, mas o que eu devo dizer? ― ela murmurou enquanto começava a andar. ― Você devia se vestir, ― ele disse, moderando sua voz para retirar a raiva e amargura que sentia por Radje. ― Sim. Vestir. ― Kira vagou para fora do quarto, ainda claramente abalada. Mencheres não podia culpá-la. Ele sabia que Radje tinha sabotado mais do que a vida dele com esse feito maléfico. Ele encontrou o olhar azul de Gorgon. ― Isso é ruim, ― Gorgon disse, afirmando o óbvio. ― Com Flare, Patches e Wraith mortos, mais o clube de strip queimado, a maioria dos vampiros que verem esse vídeo vão acreditar na declaração de Radje que você cumpriu suas ameaças. ― Essa não era a verdadeira preocupação, como Gorgon sabia. Matar três vampiros sem Mestre e uns poucos humanos não levantariam o interesse do Conselho dos Guardiões. Deixar para trás evidência de vampiros para qualquer humano baixar da Internet? Isso preocuparia todos os vampiros. ― Certamente, seria mais fácil acreditar que eu fiz isso do que acreditar que um Guardião da Lei colocou em risco o sigilo da raça desse jeito. ― A boca de Mencheres se contorceu. ― E nem eu tenho prova adequada da minha inocência. As únicas pessoas que sabiam que eu estava aqui durante o incêndio são você e Kira. ― Os mesmos envolvidos no crime. Radje escolheu bem seu ataque. ― Nós precisamos partir, ― ele afirmou. ― Radje pode ter apostado que eu estava cuidando de Kira em seus primeiros dias, longe da maioria do meu pessoal e de qualquer álibi para o incêndio, mas ele também deve ter espiões


nos observando. Mesmo agora, Guardiões ou Executores poderiam estar vindo. ― Gorgon lhe deu um olhar sombrio. ― É melhor se nenhum de nós fosse trazido perante a qualquer Guardião até você ter meios de provar que Radje fez isso. Radje quer algo de você, mas ele não tem interesse em mim ou Kira, e nós somos os únicos que poderíamos apoiar sua alegação de inocência. ― Sim, os dois seriam os primeiros alvos de Radje. Mencheres calculou as chances deles se ficassem juntos. Ele não gostou das probabilidades. Seria melhor se eles se separassem enquanto ele reunia seus aliados. Caso contrário, se um deles fosse capturado, todos seriam capturados, e a verdade poderia nunca ser levada a público. ― Vá, ― ele disse suavemente para Gorgon. ― Não me diga para onde. Fique escondido até esse assunto terminar. ― Gorgon o abraçou pelos ombros. ― Você tem aliados que irão insistir que os Guardiões escutem você. Quando o dia em que você precisar de mim chegar, eu estarei lá. ― Mencheres tocou brevemente as mãos do amigo, o gesto abrangendo as palavras que ele não tinha tempo de dizer. ― Vá, ― ele repetiu. Gorgon saiu sem falar nada ou olhar para trás. Sábio. Tempo era crucial, e o que não podia ser carregado em uma mão não valia o atraso de levar. Ele, rapidamente, colocou algumas roupas, pegando somente seu celular, laptop e seu casaco. Junto com Kira, aquilo era tudo que ele pretendia levar.


CAPÍTULO VINTE. Kira acordou ao som de pessoas gritando e o som do vento soprando forte e rápido de um trem que se movia em alta velocidade por perto. Ela se levantou com pressa em um instinto cego de sobrevivência para sair do caminho do trem que se aproximava, mas braços firmes a agarraram. ― Não tema. Você está segura. ― Mencheres. Quantas vezes ela tinha ouvido essas palavras dele? Muitas, pelo que parecia. Ela se despertou o suficiente para notar que estavam em uma sala vazia com várias peças de equipamentos grandes empilhadas contra as paredes. As máquinas zumbiam com seu próprio som interno enquanto em algum lugar acima deles, o ritmo dos gritos seguidos pelo som de um trem de carga que subia e descia. ― O que… ― ? ― Kira conseguiu dizer. Ele deu uma olhada para o teto. Estamos debaixo de uma montanha russa. Big Thunder Mountain, acredito que é chamada. Por um segundo, Kira não sabia se ria ou perguntava se ele estava brincando. Disneylândia? Era aqui onde Mencheres decidiu que seria o lugar seguro para eles fugirem depois de partir com tanta pressa? Ele não tinha contado a ela para onde eles estavam indo quando ele voou com eles para longe da casa, e adormecer ao amanhecer a impediu de ver para onde eles estavam indo depois de várias outras paradas e partidas. ― Primeiro banho de espumas. Agora parques da Disney. Você está destruindo todo mito horripilante sobre vampiros que já ouvi. ― Mencheres deu de ombros. ― É um marco fácil de encontrar, e vamos encontrar pessoas aqui. E também, você precisava de um lugar seguro para descansar. Esses parques temáticos têm labirintos debaixo deles, com muitas salas não usadas como essas para manter a limpeza e o funcionamento do parque longe dos olhos dos visitantes. ― Kira digeriu a informação. Ela não sabia que havia alguma coisa debaixo da Disneylândia, o que provavelmente significava que muitas outras pessoas não tinham ciência disso também. Era mais seguro do que dormir em um carro ou em um banco de parque, com certeza. ― Quem estamos encontrando? ― ― Meu co-regente e sua esposa. ― Mencheres respondeu.


― Co-regente. ― Suas sobrancelhas se ergueram. ― Isso significa que ele é um sócio em uma grande corporação de vampiros que vocês dois administram? ― A boca dele se curvou. ― Em essência. ― ― E você confia nele? ― Kira sentiu as emoções dele vacilarem entre tristeza e determinação, uma combinação estranha para se sentir perante sua pergunta. ― Eu confio que ele fará o que é melhor para nosso povo e que ele irá falar a verdade sobre suas intenções, quais quer que sejam, ― ele respondeu finalmente. ― Por que isso soa como se você não estivesse me dando uma resposta direta a minha pergunta? ― ela murmurou. O sorriso fraco de Mencheres se aprofundou. ― Porque você é perceptiva. ― Ela deu uma olhada para baixo para ver que estava deitada no casaco dele, várias toalhas, blusões de nylon com capuz e outros itens macios com várias logomarcas de personagens Disney. Eles era a única coisa que a separavam do chão duro de concreto. Ela balançou a cabeça. Sua primeira viagem para Disneylândia era como uma vampira se escondendo sob uma montanha-russa com outro vampiro. De repente, as aventuras de Alice no país das Maravilhas pareciam normais em comparação a isso. Mencheres esticou a mão para ajudá-la a se levantar. Kira a pegou, acostumada a energia natural emanando dele. Nas primeiras vezes ela tinha sentido algo que parecia um leve choque, mas agora, ela apreciava as sensações de formigamento que tocar Mencheres provocavam. O poder pulsante dele certamente tinha vantagens inesperadas. Depois da noite passada, Kira sabia que sua língua parecia um vibrador ligado na velocidade de Oh Inferno Sim. A mão dele apertou a dela e de repente a boca dele estava tocando levemente seu pescoço enquanto ele inalava o ar. O cheiro de Mencheres também se intensificou, aquela rica colônia natural de especiarias escuras se aprofundando e aumentando. Algo se apertou dentro dela. ― Você me tenta mais do que pode imaginar. ― A voz dele era baixa, mas ressoando. ― Quais quer que sejam seus pensamentos nesse momento, continue pensando neles. Eles deixam seu cheiro adocicado da forma mais sedutora. ― Kira quase suspirou com as sensações que corriam por ela. Ele nem precisava beijá-la para que ela se sentisse excitada. Apenas estar perto dele era suficiente para fazer ela o querer.


Ela passou a mão que estava livre pelo braço de Mencheres. ― Quanto tempo temos até que a gente deva encontrar com aquelas pessoas? ― Muito mais do que uma pergunta sobre o encontro deles estava em suas palavras. A boca dele escorregou por seu pescoço de novo, a fazendo tremer com o formigamento adicional. ― Você merece algo melhor que isso, ― ele disse suavemente. Kira podia sentir a luxúria dele brigando com o senso de honra ― ― e ela queria que a honra perdesse. ― Pode ser uma sala de equipamentos suja, mas pela primeira vez, estamos sozinhos, ― ela sussurrou de volta. ― Não vamos desperdiçar isso. ― A boca dele provocou sua pele enquanto mais ondas de formigamento viajavam por seu corpo. Ela soltou um gemido baixo. Ela sabia que era o poder dele a acariciando com mil toques invisíveis, alguns dos toques incrivelmente íntimos. As presas dele apareceram por vontade própria e um tremor passou por ela. ― Isso é um sim? ― Kira conseguiu dizer. Os lábios dele se inclinaram sobre os dela. A boca dela se abriu imediatamente, acariciando a língua dele com a sua e correspondendo à urgência do beijo. Ela gemeu de novo enquanto aqueles toques fantasma aumentavam, as sensações aumentaram ao sentir as mãos dele começaram a passar sobre ela também. Ela alcançou os botões da camisa dele, a rasgando porque esqueceu de suavizar sua nova força. Mencheres se despiu sem tiras as mãos dela, todas as costuras se separando e se afastando de si até os pedaços que restaram caírem no chão. Kira sentiu suas próprias roupas caírem da mesma maneira, até os dois estarem nus com suas roupas arruinadas aos seus pés. Um som primitivo escapou dela quando sentiu o tamanho dele, duro, pressionado contra sua barriga. Então um aperto de desejo, quase dolorido, a inundou quando colocou sua mão sobre ele e o sentiu crescer ainda mais. Depois de todos os inícios e paradas, as interrupções, ela o queria dentro dela agora. A necessidade era grande demais para perder tempo com preliminares. ― Me possua. Não espere, ― ela disse com uma voz áspera assim que ele libertou seus lábios para traçar, com sua boca devastadora, o caminho até o pescoço dela. Em seguida, os dedos dele encontraram suas partes mais profundas, a fazendo gritar devido a sensação. Ele a acariciava bem mais lentamente do que ela o acariciava, o ritmo mais rápido dela arrancava gemidos profundos e roucos de Mencheres, o que aumentava o desejo dela.


― Você ainda não está pronta. Eu vou te machucar, ― ele falou com a voz rouca. Ela sentiu a necessidade dele como se fosse uma coisa viva tentando rasgar seu caminho para sair dele. A intensidade, a força alarmante do desejo dele aumentava sua impaciência. Sim, era como ela se sentia. Como se ela fosse morrer se ele não estivesse dentro dela agora. ― Querer você machuca ainda mais, ― Kira disse com uma voz sufocada. Um ruído áspero veio dele no momento em que ela sentiu seu cuidadoso controle se quebrar. Ela sentiu a frieza da parede em suas costas no momento seguinte, Mencheres separando suas pernas e a erguendo. A boca dele exigiu a sua em um beijo tórrido enquanto sua carne dura e grossa pressionava contra seu núcleo. Suas terminações nervosas se eletrificaram perante aquele toque íntimo, então um grito a arrebatou quando sua estocada a queimou por dentro como um ferrete. Ela estava molhada, mas não o suficiente, não para o tamanho dele. Mesmo assim, Kira apertou os braços ao redor dele e arqueou o corpo em sua direção, sua necessidade rivalizando com a dor inicial que ela sentiu. ― Mais, ― ela gemeu contra a boca dele. Os músculos das costas dele se dobraram contra as mãos dela, então outra estocada abrasadora o trouxe para mais fundo dentro dela. Ela gemeu com o êxtase combinado com um lampejo de dor, mesmo assim, ela não queria que ele parasse. Nada tinha sido tão incrível como Mencheres explorando sua boca com a língua e seu corpo exigindo o dela ao limite. Outra estocada fez sua cabeça cair para trás enquanto o prazer inundava aquelas pontadas iniciais de dor. Ela sentia cada milímetro da parede contra suas costas, cada investida da língua dele, mãos e poder enquanto aquela rigidez se movia mais profundamente para dentro dela. Seus lábios retorcidos com uma compulsão que ela não podia controlar, o encorajando a ir mais fundo, até que ele emitiu um urro e se enterrou completamente com uma firme arqueada dos quadris. Ela não precisava respirar, mas Kira estava quase arfando com o bombardeio de sensações. A pele de Mencheres crepitava com a energia, cada toque enviando mais formigamento através dela, até seu corpo parecer que estava vibrando com o mesmo poder pulsante que o dele continha. Aquela plenitude dentro dela era impressionante, fazendo cada terminação nervosa latejar mesmo que a urgência faminta exigisse mais. Ele afastou a boca da dela, a olhando fixamente nos olhos enquanto ele, vagarosamente, saia de dentro dela. Seu dedo traçou os lábios dela enquanto


a outra mão a segurava para o alto, mantendo seus quadris juntos. Profundamente, o prazer de fusão óssea percorreu o subconsciente de Kira enquanto ele se impulsionava novamente para frente, quase a fazendo gritar com o esmagamento de êxtase a preenchendo. ― É isso que eu sinto quando estou dentro de você. ― A voz dele era baixa, os olhos iluminados com o verde que cegava. ― E você vai sentir na mesma proporção, eu prometo. ― Uma cortina caiu sobre suas emoções em seguida, até as sensações de Kira serem somente dela. Ela enroscou as mãos nos cabelos dele, prestes a lhe dizer para derrubar aquela parede para que não houvessem barreiras entre eles, mas um aperto de prazer a agarrou antes que ela pudesse falar. Esse prazer limpou sua mente de pensamentos, arrancando dela um grito ao invés de palavras. Mencheres começou a se mover devagar, sua boca se entreabrindo enquanto ele olhava fixamente para ela enquanto seus corpos se mesclavam. Outro aperto de prazer a dominou, fazendo com que ela gritasse o nome dele enquanto aquelas sensações arrebatadoras dentro dela se apertavam. Ele sorriu, tão belo e sensual, só de olhar para ele já era outra forma de êxtase. As mãos de Kira saíram dos cabelos dele para suas costas, ficando mais excitada a cada flexionada de seus músculos que significavam outra incrível estocada dentro dela. A boca dele se fechou sobre a dela novamente, de alguma forma seu beijo era mais rico e mais misterioso. Suas línguas se torciam juntas com a mesma suavidade dos movimentos dele dentro dela, o aumento na excitação de Kira fez seu corpo capaz de receber facilmente ele por completo. As mãos dele viajaram por ela inteira quando ele começou, devagar, a aumentar o ritmo. Os gemidos dela foram sufocados pelo beijo, se juntando aos ruídos roucos que Mencheres emitia enquanto se moviam juntos. Cada nova estocada aumentava a intensidade dentro dela, a espalhando até que seu corpo todo palpitasse ao invés de apenas seus quadris. Até mesmo a pele dela arqueava com um belo tormento exigindo mais contato com a dele, a fazendo se agarrar a ele com mais ardor enquanto suas pernas se envolviam nos quadris dele. Ele apertou firme a parte de trás das coxas dela, a segurando mais perto enquanto suas estocadas se intensificavam. As ondas de prazer caindo como uma cascata de seu núcleo e ela gritando contra sua boca, as presas dela cortando os lábios dele enquanto sua cabeça começou a sacudir com a urgência crescente. A mão dele se enroscou no cabelo dela, mantendo sua cabeça firme, enquanto seu beijo ficou mais ardente, sua boca roubando a dela com uma fome que era muito poderosa para ser contida.


As unhas dela se fincaram nos quadris dele enquanto ele começou a se mover mais rápido, quebrando sua razão com o ritmo incessante. A pressão sensual cresceu até que parecia que ela iria explodir se ele não parasse ― ― e ela não queria que ele parasse. Ela o queria além do limite, para além da queda livre. Mencheres libertou sua boca com um grito que ecoou dentro da pequena sala. Seu ritmo aumentou de repente, para um nível que teria assustado Kira se não fosse pelo êxtase explodindo dentro dela. Seus olhos se fecharam enquanto seus quadris finalmente entraram em convulsão com o imenso êxtase, a inundando com uma sensação boa demais para ser chamada de prazer. Palavras saíram da boca de Mencheres em um idioma que ela não entendeu. Ela o agarrou com força enquanto o orgasmo continuava a vibrar dentro dela, a chocando com sua intensidade. Ela queria que ele sentisse a mesma coisa que ela estava sentindo. Para que ele deixasse ir a última gota de controle. ― Goze dentro de mim, ― Kira gemeu, sua voz quase rude. ― Eu preciso sentir você gozar agora, Mencheres... ― Outra enorme quantidade de palavras que ela não reconheceu saíram roucamente dos lábios dele, mas então ele a beijou com uma paixão que combinava com a exigência que queimava seu corpo. Ela se agarrou ao redor dele, movendo junto, sua mente escorregando da realidade para dentro de puras sensações. Ela sentiu o tremor profundamente dentro dela, o estremecimento que passou do corpo dele para o seu. Ele flexionava e contraia ao mesmo tempo em que um grito áspero saia rasgando da garganta dele. Mencheres arqueou o corpo, estocando dentro dela tão poderosamente que ela arfou. A cabeça dele caiu para trás, o cabelo escuro esvoaçando atrás dele enquanto emitia outro longo gemido. O gemido combinava com os espasmos que ecoavam dentro dela, o clímax dele trovejava através de seus quadris com vibrações poderosas e ritmadas. Seus braços envolveram o pescoço dele enquanto ela saboreava os tremores que ainda o abalavam. Um profundo senso de pertencer a preencheu, como se algo há muito tempo inquieto dentro dela tivesse encontrado seu lar. Por um momento prolongado, ela nem quis falar, com medo de que palavras quebrassem a sensação de coisa certa que ela sentia. Então ela olhou além do rosto de Mencheres para ver a pilha com suas roupas diretamente abaixo deles. De fato, vários metros abaixo deles.


― O que? ― ela arfou. Uma olhada ao redor confirmou o que seus olhos tinham dito primeiro. Que não era mais a parede roçando contra suas costas. Era o teto. Uma risada baixa o fez se agitar enquanto que a distância até o chão começou a dissipar, seus corpos flutuando para baixo mais devagar que uma pena sendo levada pelo vento. ― Você achou que eu te deixaria cair? ― ele perguntou com a voz rouca, beijando sua garganta com uma perfeição lenta que levou embora seu lampejo de ansiedade. Ele os colocou no topo da pilha macia de roupas sem nem uma vez olhar ao redor para ver onde ela estava. Isso a deixou em cima de Mencheres, seus joelhos afundados no colchão de tecido ao redor deles, o cabelo dele emoldurando seu rosto como seda negra. As mãos dele deixavam um rastro ao longo de suas costas com carícias firmes e macias, parando na parte arredondada de seus quadris. ― Eu ouvi a expressão subindo pelas paredes, mas eu nunca pensei que fosse experimentá-la, sem falar em algo assim, ― ela murmurou, sua boca se curvando no que provavelmente era um sorriso sonhador. Ele sorriu de volta, um largo sorriso espontâneo que a lembravam de como Mencheres era ainda mais maravilhoso sem sua expressão normalmente impassiva. Ela acariciou seu rosto, passando os dedos por suas maçãs do rosto elevadas, aquelas sobrancelhas grossas e escuras, aquela boca carnuda, e seu nariz orgulhosamente inclinado. ― O que você está pensando? ― ela perguntou, se inclinando para frente para roçar os seios contra o peito dele. ― Que eu ficaria assim com você para sempre, se eu pudesse, ― ele respondeu, com o sorriso murchando um pouco. Será que a sombra que passou pelo rosto dele se devia a falta de tempo porque eles tinham que encontrar seu co-regente em breve? Ou por causa da armação de Radje envolvendo Mencheres em assassinatos que ele não tinha cometido? Ela não queria perguntar. Ela queria manter esse momento entre eles, sem outras pessoas ou coisas os atrapalhando, ainda. ― Por que você se fechou para mim para que eu não pudesse te sentir? ― ela perguntou, descansando os cotovelos nos ombros dele. O olhar dele foi para seus seios, comprimidos agora contra a parede de seu peito. ― É um amante pobre aquele que garante o prazer de sua senhora meramente por deixá-la se alimentar de seu próprio prazer, ― ele respondeu com um sorriso insinuando nos lábios.


Kira deu risada. ― Eu não acho que você precise se preocupar com isso. Jamais. ― ― Então, da próxima vez, ― ele respondeu, com sua voz ficando mais profunda, ― nós vamos compartilhar isso juntos. ― Um ímpeto de antecipação a preencheu, a fazendo querer transformar a próxima vez em agora mesmo. Mas outro aperto dentro dela, um mais temível, a fez olhar ao redor do quarto alarmada. Além das máquinas, do casaco de Mencheres e da parafernália da Disney sobre a qual eles estavam deitados, a sala estava vazia. E ela estava ficando com muita fome. Mencheres não tinha pegado a geladeira com sangue quando eles saíram com pressa da casa algumas horas antes do amanhecer. Ela tinha ficado tão chocada com o vídeo de sua morte, a acusação de assassinato contra Mencheres e o incêndio que nem se lembrou de pedir para ele trazer aquilo. A única coisa que ela insistiu fazer foi ligar para Tina, mas na pressa deles, tudo que Kira conseguiu transmitir para sua irmã foi que ela estava segura e para Tina dizer para seu irmão não acreditar em nada que visse na TV. Não era nem de perto o suficiente como uma explicação, mas teria que resolver por enquanto. ― Por favor, me diga que você enfiou algumas bolsas de sangue no seu casaco antes de sairmos, ― ela disse, se mexendo desconfortavelmente enquanto o aperto em seu estômago aumentava. ― Eu te disse que chegaria o momento em que você não seria capaz de prover suas preferências alimentares. Esse momento chegou mais cedo que o esperado. ― A mente de Kira se revoltou com o pensamento mesmo que seu estômago roncasse em necessidade mais uma vez. Ela engoliu a seco. Se ela recusasse, tentasse esperar até eles chegarem a um hospital ou banco de sangue, ela poderia ser jogada no mesmo apagão estúpido de fome que a tinha dominado nos primeiros dias como vampira. E se Mencheres não estivesse do lado dela quando aconteceu, ela poderia ter matado alguém. ― Como devo proceder a respeito disso? ― ele sussurrou. Sem chance de ela querer passar por isso sozinha. Ele indicou a pinha abaixo deles. ― Vamos nos vestir com algumas dessas roupas e subir para o nível do parque. Há centenas de adultos lá para escolher. ― Assim dizendo, Mencheres gentilmente a colocou de lado e se sentou, pegando uma camiseta debaixo dele e a escorregou por cima da cabeça. Ele escolheu um par de calças e a vestiu da mesma forma descuidada, completando o encobrimento de seu corpo nu magnífico, para o desânimo de


Kira. Porém, ela não podia reclamar. Se não fosse por ela, eles poderiam passar mais tempo fazendo amor no que era, agora, sua sala favorita no mundo. Em seguida ele escolheu um chapéu na pilha, torcendo seu longo cabelo escuro em um nó e colocando um boné de beisebol da Disney sobre ele. O efeito em sua aparência foi surpreendente. De alguma forma, em poucos segundos, Mencheres foi de uma aparência de um homem notável e elegante em seus vinte e tantos anos para um turista muito mais jovem que podia ter a identidade verificada se tentasse comprar uma cerveja. ― Você é como um camaleão, sabe disso? ― Kira disse. Ele levantou uma sobrancelha. ― Disfarces são habilidades necessárias para vampiros. Não é apenas uma questão de trocar de roupas; é também de assumir uma nova personalidade. Nossos rostos foram publicados não somente nos noticiários de Chicago, mas também espalhados por toda Internet. Não precisamos arriscar que algum humano aqui nos reconheça, apesar de que nosso tempo aqui não será prolongado. ― ― Você não disse muito sobre qual é nosso plano quando partimos antes, então, claro, eu desmaiei ao amanhecer. Eu nem ao menos sei como você conseguiu nos trazer do Wyoming para o sul da Califórnia. Você não pode ter voado o caminho todo. ― Ele deu de ombros. ― É fácil o suficiente forçar pessoas a nos transportar quando precisamos ir assim que eu estava certo de que não tínhamos sido seguidos. ― E com os poderes hipnóticos de Mencheres, nenhum desses motoristas lembraria de sua atuação como motoristas de táxi. Aquele pensamento fez Kira pausar. Ela tinha agora aquela mesma habilidade de hipnotizar pessoas? Ou era algo que ia crescendo nela com o tempo? Outro aperto em seu estômago a lembrou de que não teria o luxo de sentar aqui ponderando a extensão de suas novas habilidades. Ela fuçou na pilha de roupas até encontrar uma camiseta e calça de moletom, parando para, discretamente, limpar o que restou da paixão deles com um dos pedaços rasgados das suas roupas anteriores. Então ela enfiou o cabelo dentro de um chapéu como Mencheres tinha feito. Era inacreditável perceber que, em breve, ela aprenderia como realmente morder alguém e beber seu sangue... tudo isso enquanto usava um boné do Pateta e uma camiseta da Minnie. Sua vida tinha sido amaldiçoada por Radje de todas as formas possíveis, mas no momento, Kira não estava pensando naquilo. Por incrível que pareça, ela estava feliz, mesmo que aquela felicidade não fizesse sentido à luz das terríveis circunstâncias em que ela e Mencheres estavam.


Ele acariciou a bochecha dela quando ela levantou, a olhando com um interesse mais do que casual para sua boca. Kira lambeu os lábios. Se ao menos ela tivesse dito para Mencheres colocar alguns sacos de sangue em seu casaco antes de deixar a casa dele. Então ela teria sido capaz de passar a próxima hora ou mais aprendendo o que o fez gemer mais alto ao invés de descobrir como morder alguém. Ele inalou, seus olhos brilhando verdes. ― Eu amo seu cheiro, ― ele quase murmurou. ― Eu o amo ainda mais agora que está por todo meu corpo. ― A fome evidente no tom dele fez as coisas se apertarem mais abaixo, no seu interior, mas infelizmente, seu estômago se recusou a ficar no assento de trás do seu desejo crescente. Lá se foram seus planos para mais explorações de teto. ― Vamos agora, ― ela disse. ― Ou eu não vou querer ir mais, e isso vai ser perigoso para qualquer pessoa que entre em contato comigo mais tarde. ― Maldita necessidade dela para se alimentar tantas vezes. Isso ia diminuir com o tempo, lhe asseguraram isso, e ela não podia esperar. Seria um alívio quando tudo que ela precisasse fosse uma xícara de sangue ensacado por dia, e só. ― Sim. Agora, ― Mencheres murmurou. Seus lábios roçaram os dela para um último beijo, quase fazendo Kira decidir esquecer de se alimentar, mas então ele parou, e eles saíram da barulhenta sala de equipamentos juntos.


CAPÍTULO VINTE E UM. Foi preciso apenas alguns flashes do olhar de Mencheres para fazer os funcionários que eles encontraram esquecerem que duas pessoas não autorizadas passeavam na parte de baixo do parque. Quando eles chegaram às escadas que levavam até o nível do parque, os olhos de Kira já mudavam de cor para verde e suas presas começavam a saltar de seus dentes superiores. Era a primeira vez dela por perto de mortais depois de sua transição. O sangue deles a estaria chamando ainda mais alto do que o normal por causa de sua fome. Sua mão apertou a dele até que ela teria quebrado seus ossos se seu poder não o tivesse protegido automaticamente. ― Não me deixe machucar alguém. ― A voz dela era rouca, suas presas crescendo ainda mais. Ele ergueu o queixo dela. ― Você não vai. Você é forte o suficiente para lidar com isso. A princípio vai parecer irresistível na multidão, mas não foque nas batidas dos corações. Concentre-se nos outros ruídos. Vai ajudar. ― Kira conseguiu fazer um curto movimento com a cabeça, assentindo. Suas presas se retraíram um pouco e um pouco do brilho verde deixou seus olhos enquanto ela exibia sua determinação. Ele esperou até que quase nenhum traço de verde esmeralda estivesse em seu olhar brilhante antes de abrir a porta. Um arbusto podado na forma de um elefante escondia a porta lateral da vista dos turistas enquanto eles saiam. Apesar do sol já ter se posto, o parque ainda estava cheio. O horário estendido de verão fazia com que tivesse tanta atividade no parque depois do escurecer. Um tremor passou por Kira, e seus olhos brilharam verdes novamente, mas Mencheres não parou. Ela precisava aprender a se controlar no meio de uma aglomeração de mortais. Era bem antes do que ele deixou outros vampiros enfrentarem uma multidão, mas esse duro curso intensivo era necessário. Mais cedo, enquanto Kira dormia, ele tentou ver o futuro novamente, mas nada tinha mudado exceto que a escuridão assustadora parecia estar mais perto. Seu tempo estava se esgotando e Kira precisava estar pronta para quando ele se fosse. Por isso que ele, deliberadamente, jogou fora as bolsas de sangue que havia trazido em seu casaco antes de ela acordar, e por isso que ele não a deixou simplesmente se alimentar de um dos empregados debaixo do parque. ― Baixe sua cabeça, ― ele a orientou.


Ela inclinou a cabeça, escondendo o brilho verde em seu olhar de alguma pessoa curiosa ao seu redor. Eles passaram pela Frontier Land na New Orleans Square, onde ele conseguiu um par de óculos escuros para Kira. Ela lhe lançou um olhar agradecido enquanto o arrumava no rosto. Agora qualquer brilho verde de seus olhos poderia ser disfarçado ou, provavelmente, tomado por um efeito dos óculos. Sua confiança pareceu crescer enquanto eles continuavam a andar cautelosamente pela multidão, mas apesar de Mencheres saber que ela ainda lutava com a fome, ele não podia senti-la. Kira foi transformada em vampira através de seu sangue e poder, então ela era parte dele e podia sentir suas emoções sempre que seus escudos estivessem baixados. Ele, porém, podia apenas captar vislumbres dos sentimentos dela do mesmo jeito que fazia antes; através do cheiro, das expressões, do tom de voz e linguagem corporal. Tudo isso lhe dizia que apesar da fome continuar a crescer, a força de Kira também crescia, combinando o desafio de ser empurrada para dentro desse banquete vivo ao redor dela. ― Eu apenas... escolho alguém, então encontro uma moita ou um canto na parede para me esconder atrás? ― ela sussurrou. Aquilo seria suficiente, mas ele queria que ela aprendesse a se alimentar até mesmo mais a vista do que aquilo. Ele lamentou a falta de tempo para mostrar isso a ela de forma mais gentil, mas a habilidade de Kira sobreviver sozinha era de primordial importância. ― Nós o faremos aqui, ― ele disse, apontando para a estrutura acima deles no morro. Ela parou de andar. ― Você quer que eu morda alguém durante um passeio pela Haunted Mansion?12 ― Ela perguntou, incrédula. Ele deu de ombros. ― É mais escuro lá dentro do que na maioria dos lugares nesse parque, e os outros humanos ao redor de você estarão distraídos demais pelo passeio para prestar atenção no que você está fazendo. ― Ela começou a andar novamente, mas ela balançou a cabeça. ― Justo quando eu pensei que nada mais podia ser mais esquisito, ― ela murmurou

***** Kira se mantinha perto de Mencheres enquanto eles prosseguiam pela primeira parte do passeio na Haunted Mansion. Eles foram colocados dentro de uma pequena sala circular. Então o teto e os retratos começaram a se alongar sobre eles enquanto uma voz imitando assombração falava sobre os vários 12

Mansão Mal Assombrada.


prazeres macabros que aguardavam os visitantes. Alguns mais do que outros, Kira pensou secamente. Ela tentou focar na voz gravada. Ou no chiado das várias máquinas, na música ambiente e sons das salas além. Qualquer coisa exceto nos corpos cheios de sangue ao seu redor. Essa sala era apertada, com pessoas encostando umas nas outras a cada segundo. Se ela se concentrasse, ela podia abafar todos aqueles batimentos cardíacos tentadores sob a agitação do resto da atração barulhenta. Quando as portas da sala se abriram, ela ficou aliviada. Eles fora para uma sala bem maior, com um tipo de correia transportadora13 onde caricaturas de vagões chamados Doom Buggies14 eram sistematicamente enchidos com convidados. Muito mais fácil se controlar aqui, sem estar em uma sala pequena delimitada com o equivalente a uma refeição de cinco pratos. Mencheres ignorou a ordem da fila para ir até o atendente do passeio. Um flash quase imperceptível dos olhos dele mais tarde e o funcionário estava todo feliz em colocá-los sentados com uma pessoa que fazia o passeio sozinha, ao invés de dar a Kira e Mencheres seu próprio carrinho. Ela descobriu que não podia olhar para o rapaz que o funcionário indicou para eles acompanharem no Doom Buggy. Somente a firme pressão da mão de Mencheres em seu braço, a guiando para dentro do assento coberto, evitou que ela fugisse completamente. ― Hey, ― o cara disse em cumprimento quando Kira sentou perto dele, Mencheres do outro lado. Ela não conseguiu responder. Culpa e fome competiam dentro dela. Ela podia realmente morder esse rapaz e beber seu sangue? O atendente puxou uma barra de segurança de metal, verificou para garantir que estava travada, então eles foram para a próxima parte do passeio. Uma voz gravada vinha dos auto-falantes dentro do carrinho enquanto o narrador continuava a falar com uma voz monótona. Não estava escuro para os olhos dela dentro do passeio, mas com os vários pontos de sombra, Kira sabia que os outros convidados teriam dificuldade em ver o que acontecia dentro desse, apropriadamente, chamado Doom Buggy ― exceto pelas vezes em que o passeio deliberadamente girava os carrinhos. ― Eu não acho que posso fazer isso, ― ela sussurrou para Mencheres enquanto o cara ria e acenava para seus amigos quando o passeio fez o carrinho girar para, brevemente, ficar de frente um ao outro. O olhar dele estava firme. ― Você deve. ―

13

Aqueles cordões colocados para manter uma fila em zigue-zague muito utilizado em parques de diversões. 14 Carrinhos da Morte.


A dor se espalhando por todo o corpo dela com uma intensidade que aumentava. Mencheres estava certo. Ela era uma vampira agora. Ela ainda podia não estar acostumada a ideia, e certamente ela não tinha pedido por isso, mas não mudava os fatos. Ou ela aprendia como tirar o sangue de alguém sem fazer mal ou ela arriscaria matar alguém mais tarde quando a necessidade crescesse além do seu controle e não houvesse uma máquina de vender plasma convenientemente por perto. Mencheres se inclinou para frente, chamando a atenção do rapaz alegre. Seus olhos brilharam verdes antes de ele falar. ― Incline-se para trás com ela no canto. Não diga nada. Você não sente medo. ― Aquele olhar familiarmente complacente se apossou do rosto do rapaz enquanto ele colocava um braço ao redor de Kira e os inclinava para o lado do carrinho. Ela quase arfou. Com metade do corpo dele pressionado ao dela, a pulsação parecia abafar todos os outros ruídos ao redor deles, focando sua atenção para aquele ritmo firme e delicioso. ― A mão é mais seguro até você ter mais experiência. Em seguida, avançar para o pulso, depois para o pescoço ― mas nunca morta a jugular a não ser que você queira matar, ― Mencheres instruiu com uma voz calma. O passeio entrou em um falso salão de baile com imagens de dúzias de fantasmas dançando, vestidos com trajes do século XVIII. Kira olhou para eles ao invés de olhar para o rosto do rapaz enquanto ela puxava devagar sua mão para a boca, se lembrando de não empregar mais pressão do que ela tinha usado para lidar com aqueles ovos. Se alguém pudesse vê-los, tudo que iriam perceber era um casal aconchegado no canto do Doom Buggy, a mão do homem sobre a boca da mulher como se estivesse pedindo silêncio. Seus óculos escondiam os olhos brilhantes e a mão do rapaz bloqueava as presas da vista de alguém quando elas saltaram devido a pulsação vibrante no polegar dele se aproximando de sua boca. Ela fechou os olhos, repetindo para si mesma ― delicadamente, delicadamente ― enquanto pressionava as presas na veia que saltava contra seus lábios. O sabor parecido com manjar dos deuses imediatamente encheu sua boca e lavou seu último vestígio de excitação. O que ela engolia era mais rico que chocolate, mais macio que creme e se espalhava como um calor delicioso por ela toda. Sua mente, nebulosamente, meditou que isso não era nada parecido como quando ela se alimentava daquelas bolsas. Aquilo sempre tinha um gosto levemente ácido e a deixava com um senso de falta de justiça, mas isso parecia perfeitamente natural. Como se ela fosse parte de uma antiga


cadeia de vida que estava às voltas com o sagrado e misterioso, sombrio e belo. Depois do quarto gole, os olhos de Kira se abriram de forma agitada. O rosto do rapaz foi a primeira coisa que ela viu. Ela se preparou para um olhar de acusação, mas seus olhos estavam semi-cerrados e um sorriso de puro êxtase envolvia seu rosto. Ele pressionou mais o corpo contra o dela, até que sua cabeça deitasse no ombro dela e seu corpo fosse uma forma insistente contra seu lado direito. Uma olhada para o colo dele revelou que ele estava gostando um pouco demais disso. O olhar de Kira voou para Mencheres, mas ao invés de ciúme ou censura, sua expressão era vagamente divertida. Cuidadosamente, Kira retirou as presas, surpresa quando Mencheres agarrou a mão do garoto antes que ela ao menos pudesse perguntar o que fazer em seguida. ― Uma forma de curar os furos é cortar sua língua com uma presa e prendê-la sobre os ferimentos antes de você remover a boca, ― ele disse. ― Ou você podia passar o polegar pela sua presa e pressionar seu sangue contra os dois buracos. Em qualquer escolha, a intenção é evitar mais perda de sangue e roupas manchadas. ― Ela achou irônico que o passeio os lavasse para um cemitério poético enquanto ela seguia as orientações de Mencheres. Ela optou por cortar seu polegar ao invés da língua, o colocando sobre os furos gêmeos que ela fez quando Mencheres ergueu a mão dele. Segundos mais tarde, quando ela verificou, aqueles ferimentos de furos estavam completamente curados e assim também estava o corte em seu dedo. As pessoas ao redor dela pareciam pessoas novamente. Quem podia pensar que se alimentar de um humano faria ela se sentir mais conectada a sua humanidade perdida ao invés de menos? ― Abaixe seus óculos, ― Mencheres disse suavemente. ― Então olhe dentro dos olhos dele e lhe diga que ele não lembra de nada do que aconteceu, exceto do divertimento do passeio. ― Ela lançou um olhar para Mencheres. ― Eu já posso... fazer isso? ― Ela se sentia muito melhor, até mesmo mais forte, mas não como alguém que podia alterar a memória de uma pessoa com um mero olhar e comentário. A boca dele se torceu em um sorriso. ― Sim, você já tem essa habilidade. ― Kira tentou evocar a hipnotizadora dentro dela enquanto escorregava os óculos pelo nariz, direcionando seu olhar para o rapaz que ainda se inclinava contra ela com um sorriso sonhador.


― Então, ah, nada aconteceu exceto, um, você gostou do passeio, ― ela gaguejou. Bom, aquilo era uma patética tentativa de hipnose. Ela teria que fazer melhor para isso colar. O rapaz se sentou, aquele vazio deixando seus olhos enquanto o carrinho iniciou sua viagem por um conjunto de espelhos onde a voz automatizada informava que logo eles veriam se um dos fantasmas da mansão tinha se juntado para um passeio no carrinho deles. Mencheres esticou a mão e puxou Kira para ele, seus braços a rodeando em um abraço solto. ― Aquilo funcionou? ― Kira falou em tom de espanto como se estivesse revelando um segredo. Ele ainda tinha aquela expressão vagamente divertida. ― Claro. ― Ela estava impressionada com como tudo tinha acontecido suavemente quando o rapaz se virou para ela com um sorriso. ― Olhe. Você tem um fantasma sentado no seu colo. ― Ela olhou para os espelhos que revestiam a parede em frente para ver a cena de um homem rechonchudo, usando óculos, amontoado sobre ela no carrinho. A visão dos três com seu risonho passageiro fantasma apenas acrescentou ao surrealismo que Kira sentia. Sua primeira vez se alimentando como uma vampira de verdade foi agraciada por um falso fantasma. O passeio começou a ficar mais lento enquanto a próxima sala revelava a plataforma de desembarque com sua grande correia transportadora. Um funcionário soltou a barra de segurança na frente deles e os três saíram do carrinho. O rapaz acenou para seus amigos com a mesma mão que Kira tinha mordido antes de ele se afastar, nunca percebendo que esteve envolvido em um verdadeiro evento sobrenatural no falso passeio assombrado.


CAPÍTULO VINTE E DOIS. Mencheres e Kira estavam quase de volta ao Big Thunder Mountain, quando ele sentiu uma mudança de poder no ar em torno dele. Por um instante, ele ficou tenso, mas então ele reconheceu aquela onda de energia. Bones. Tão típico dele estar adiantado. ― Meu co-regente estará aqui em alguns instantes, ― ele disse a Kira. Ela tirou os óculos escuros como se acabasse de lembrar que ela não precisa mais deles. Os olhos dela não se ascenderam nem uma vez depois de sua alimentação, e sua postura estava muito mais relaxada. Ele esperava que ela reconhecesse a sabedoria em renunciar aqueles sacos de plasma no futuro. O sangue fresco não apenas teria um gosto melhor e a deixaria mais forte, como também saciaria mais a fome dela. Ele viu Bones e Cat cortando pela multidão, do outro lado da montanharussa. Seu co-regente não parecia feliz. ― Maldição, avô, ― foram as primeiras palavras de Bones, enquanto ele se aproximava. ― Você deixou para trás uma ruína de corpos queimados, vampiros mortos, pessoas desaparecidas, Guardiões ameaçados, e evidências em vídeo da existência de nossa raça. Então você sai de férias. Você realmente tem um desejo de morte. ― O queixo da Kira caiu. Mencheres apertou a mão dela, notando que o afiado olhar marrom do Bones seguiu o gesto. ― Não mais, ― ele respondeu friamente. ― Eu sabia que o estabelecimento estava sendo monitorado; apenas um tolo não esperaria que aquelas salas estivessem sendo filmadas. Sim, eu pretendia matar aqueles três vampiros, mas ninguém mais, e certamente não deixando para trás uma fita com as minhas ações documentadas. Eu não fiz isso. ― ― Você ia matar Flare, Patches e Wraith? ― Kira perguntou, choque evidente em sua voz. ― Eu não acreditei no Radje quando ele disse isso… ― Mencheres olhou para ela. ― Eles torturaram você. É claro que eu ia matá-los. ―

***** Cat limpou a garganta no silêncio tenso que se seguiu. ― Ah, antes que isso vá mais longe, vamos pelo menos nos apresentar para a sua amiga. Eu sou a Cat, e este é meu marido, Bones. Nós somos parte da pequena família estranha com presas do Mencheres. ―


Kira sacudiu a mão da Cat estendida para ela depois de responder com o seu nome. Bones sacudiu a mão da Kira também, mas com um olhar muito mais especulativo do que o que a Cat deu a ela. Mencheres encontrou o olhar impassível do seu co-regente, não respondendo à pergunta silenciosa que Bones dirigiu a ele. ― Normalmente eu acreditaria em você, porque você é a pessoa mais paciente e calculista que eu já conheci, ― Bones disse, voltando ao tema original. Seu olhar voltou para Kira. ― No entanto, neste caso, estou tentado a acreditar na afirmação do Radjedef de que você estava motivado a agir sem o seu usual planejamento cuidadoso. ― ― É seguro falar sobre isso aqui? ― Kira perguntou, apontando para as famílias que passaram por eles em direção à Frontier Land. Mencheres deu ao Bones um olhar desafiador. ― É, se vocês não foram seguidos. ― Bones bufou. ― Eu fui cuidadoso, avô. ― ― Essa coisa de 'avô' é muito estranha, considerando que você parece mais velho do que ele, ― Kira murmurou. Uma sobrancelha escura subiu ao mesmo tempo em que Cat ria. ― Você sabe, eu nunca percebi, mas ela está certa. Especialmente agora, com seu boné de beisebol e toda essa roupa da Disney. Um visual absolutamente diferente para você, Mencheres. Acho que ninguém iria te reconhecer assim. ― ― Sim, você está cheio de surpresas, não é? ― Bones concordou, com outro olhar significativo para Kira. ― Você disse para ele que não foi você que incendiou o clube. Se ele não quer acreditar em você, nós deveríamos apenas partir, ― Kira disse calmamente, mas com uma discreta dureza em seu tom. ― Tenho certeza que você tem outros amigos que estarão dispostos a ouvir o seu lado da história. ― Mencheres sentiu uma onda de orgulho quando Kira ajeitou os ombros e retribuiu o olhar duro do Bones. Ela poderia querer falar com ele mais tarde sobre a sua intenção letal para os três vampiros miserável, mas tudo o que Kira mostrou agora era a sua firmeza ― e sua incapacidade de ser intimidada. Ela era uma mulher forte. Forte o suficiente para sobreviver a este escuro mundo humano e desumano uma vez que ele tenha partido. ― Isso pode ser verdade, ainda assim eu não vejo qualquer um deles aqui, ― Bones respondeu, gesticulando para o parque. ― Nem vai ver. Eu vou encontrá-los sem você, ― Mencheres afirmou calmamente.


Ambas as sobrancelhas do Bones subiram. ― Realmente? E por que isso? ― ― Quanto menos você souber sobre os meus planos para Radjedef, mais estará garantida a segurança da nossa linha se eu não tiver sucesso, ― Mencheres respondeu, seu tom endurecendo quando a expressão do Bones obscureceu. ― Você sabe, eu realmente poderia apreciar uma bebida, ― Cat disse, mais uma vez quebrando a tensão. ― Kira, se importa em me acompanhar enquanto eu procuro algum gim e tônica? ― Kira olhou para Mencheres. ― Não vou demorar muito. ― Tanto o divertiu quanto o tocou que Kira se sentisse protetora com ele. Há quanto tempo ninguém sentia a necessidade de protegê-lo dos outros? ― Gim e tônica, huh? ― Kira perguntou enquanto se afastava com a Cat. ― Eu tenho uma má notícia para você. Eu não acho que esse parque serve álcool. ―

***** A previsão da Kira acabou sendo verdadeira, e sua nova companheira escolheu um lemon slush em vez disso. Ela estava prestes a voltar para o Mencheres, mas Cat acenou para uma mesa e bancos próximos. ― Talvez nós devêssemos dar aos rapazes alguns minutos sozinhos. Assim eles podem queimar um pouco do excesso de testosterona. Senta comigo? ― Kira ainda podia vislumbrar o Mencheres através da multidão, mesmo que todo aquele ruído ambiente tornasse difícil para ela ouvi-lo. Ela olhou para a ruiva, cautelosamente, mas o sorriso de Cat era suave, desprovido do disfarçado antagonismo do seu marido. Cat deslizou seu lemon slush pela mesa quando Kira se sentou. ― Açúcar suficiente para fazer um dentista chorar, mas é bom. ― Kira tomou um gole para ser educada, mas então foi incapaz de sufocar sua careta com o gosto. Aquilo era como serragem úmida. ― Desculpe, não é o meu preferido, ― ela conseguiu dizer, deslizando aquilo de volta. Cat tomou outro gole, não ofendida. ― Certo, você é uma novata. Nada além de sangue vai ter um gosto bom pelas suas primeiras duas semanas. Então o seu paladar vai se ajustar. ―


Kira sabia que a mulher em frente a ela era uma vampira, sua falta de batimentos cardíacos a entregou no instante que elas se conheceram. Ela se perguntava o quão velha Cat era. O formigamento que Kira sentiu quando ela apertou a mão de Cat era muito menor do que a vibe que Bones exalava. ― Terrível, ser transformada sem escolher isso, ― Cat continuou, ainda observando Kira com aqueles olhos cinza claros. ― Eu vi o vídeo. Aquele Guardião da Lei era realmente um bastardo. Eu não culpo você ou o Mencheres por estarem putos ― e se você me perguntar, aqueles outros três vampiros mereceram também. Torturar você? Sequestrar uma adolescente e obrigá-la a ser stripper para eles? Queimem baby, queimem. Mencheres fez um favor ao mundo ao se livrar daqueles lixos. ―

***** Kira soltou uma risada quando entendeu tudo. ― Bom policial, mau policial, certo? ― Ela acenou na direção do Bones. ― Ele chega agindo todo hostil, mas você suaviza as coisas ao me levar para um agradável bate-papo. Era para eu ficar impressionada com a sua simpatia e confessar os crimes do Mencheres? Desculpe, tente novamente. Algo mais original desta vez, eu espero. ― Um sorriso apareceu nos lábios da Cat. ― Eu fui tão óbvia? Deus, eu sou péssima em sutileza. Eu sou péssima em fazer rodeios, também, então como você é obviamente uma mulher inteligente, vamos cortar a merda e ir direito ao ponto, vamos? ― ― Sim, vamos, ― Kira murmurou. ― Não foi o Mencheres. Eu estive com ele o tempo todo em Wyoming desde que nós deixamos aquele clube há uma semana. Sim, ele poderia ter escapado, enquanto eu estava inconsciente do amanhecer até tarde, mas a estação de notícias informou que o fogo começou após a meia-noite. E Mencheres esteve comigo todas as noites, do momento que eu abria meus olhos até o amanhecer, por isso não poderia ter sido ele. ― ― Veja, essa é a coisa verdadeiramente assustadora aqui. ― Cat se inclinou para frente, sua voz baixa, mas mais intensa. ― Mencheres claramente tem uma coisa por você. Aquela fita e vendo em primeira mão como ele age em torno de você comprova isso. Normalmente, eu diria viva e deixe amar, mas a última mulher de quem Mencheres gostou era uma puta má e assassina. Ele não conseguia se obrigar a matá-la até que ela quase destruiu a todos ― e eu quero dizer todos ― próximos a ele, eu e Bones especialmente. Então você vai entender se a visão de ver o Mencheres com olhos brilhantes para você enche de medo o meu coração e de qualquer outro que viveu o que aconteceu da última vez que o homem esteve atraído por uma mulher. ―


Kira fechou os olhos, ouvindo novamente a entonação plana na voz do Mencheres quando ele lhe disse que tinha participado na morte de sua esposa. Ele ainda estava carregando a culpa do que quer que tenha acontecido? Ela já tinha suposto que as circunstâncias tenham sido justificadas ― se Mencheres fosse um assassino casual, ele teria matado Kira no primeiro dia que eles se conheceram. A descrição da Cat sobre a ex dele apenas confirmou a especulação de Kira. Mencheres claramente não teve uma escolha sobre matá-la se ele queria que ele mesmo e aqueles por quem ele se importava sobrevivessem. Assim como Kira não teve escolha sobre entregar o seu marido por tráfico de drogas, sabendo o que o esperava na prisão. ― Então você está preocupada que eu possa ser outra cadela má e assassina? Talvez quem tenha manipulado o Mencheres para incendiar e matar aquelas pessoas apenas para vingar o que aconteceu comigo, é isso? ― Ela perguntou, abrindo os olhos. ― Você foi torturada e morta. ― Os olhos da Cat brilharam verdes por um segundo. ― Eu tenho sido torturada e quase morta, e deixe-me te dizer, eu jurei uma vingança sangrenta contra todos envolvidos nisso. Se você encorajou o Mencheres a incendiar aquele lugar e matar aqueles vampiros, eu entenderia, mas parece que ele ficou super-protetor. Ele tende a perder a cabeça por uma mulher com quem ele se importa. De qualquer maneira, vocês dois precisam parar de correr e lidar com as consequências antes que este problema fique ainda pior. ― ― Não. Foi. O. Mencheres, ― Kira cerrou os dentes, sua frustração crescendo. ― Foi aquela vergonha de policial chamado Radje. Ele armou para o Mencheres porque ele quer alguma coisa dele. Você não prestou atenção nessa parte da fita? Se você e o Bones forem realmente amigos, você pode parar de suspeitar do Mencheres, e você tem que começar a ajudá-lo a provar que realmente fez isso. ― ― Se foi o Radje, onde está aquela jovem dançarina? ― Cat perguntou. ― Jennifer, a que você tentou ajudar? Ela não está entre os mortos, e ela não voltou para a polícia ou a família dela. Não é estranho que a pessoa que você originalmente tentou tirar do clube possa ser uma das poucas pessoas que fugiu do fogo? ― Kira se levantou, enjoada por discutir o mesmo ponto. ― Radje obviamente sabe como fazer um bom trabalho armado. Não pareceria tão convincente se Jennifer acabasse morta, não é? Se por uma vez você olhar para esta situação com a ideia de que o Mencheres não fez isso, você pode ficar surpresa com o que mais você notar. E você pode querer uma vingança sangrenta contra essas pessoas que torturaram você. Mencheres admitiu que pretendia matá-los também, mas eu não sou assim. Eu poderia matar em


legítima defesa, mas não em vingança. O meu objetivo é salvar vidas, não destruí-las. ― Kira se virou, sentindo aqueles olhos cinzentos perfurando suas costas enquanto ela se afastava. Ela duvidava que Cat tenha realmente ouvido uma palavra que ela disse. Parecia que ela e Bones estavam convencidos sobre o que aconteceu antes mesmo de chegarem. Se estes eram os aliados mais próximos do Mencheres, então eles tinham uma chance melhor de derrotar Radje sem eles.

***** ― Não, ― Mencheres disse pela terceira vez. Bones correu a mão pelos cabelos em frustração. ― Vou aceitar a sua palavra de que você não fez isso. Seus aliados provavelmente vão, também. Mas você tem muitos inimigos que estão aproveitando isso, espalhando a versão do Radje sobre os eventos por todo lugar para reunir uma oposição contra você. Se a maioria das pessoas acreditar que você não teve nada a ver com esse incêndio criminoso, então entregar a Kira para os Guardiões da Lei para que ela possa apoiar a sua declaração do seu paradeiro é a sua melhor chance. Você sabe disso. ― ― O que eu também sei é que Radje vai matá-la ou usá-la, e os outros Guardiões não serão capazes de protegê-la, porque eles não vão suspeitar dele, ― Mencheres respondeu inexoravelmente. ― Você não vê que se escondendo com ela o faz parecer ainda mais culpado? ― Bones rosnou. ― Você está alegando que ela e Gorgon são o seu álibi, ainda assim todos vocês estão se recusando a se apresentarem aos Guardiões para responder a acusação do Radje. ― ― Radje está exigindo principalmente a presença dela, além da minha própria. Não parece incomum? Por que ele não estaria tão eloquente em exigir a presença da outra testemunha? ― ― Sim, é incomum. ― A voz do Bones estava afiada. ― Eu acredito que Radje está tramando algo. Mas você está arriscando muito por não entregá-la. Você poderia ser condenado em ausência se continuar a desafiá-los. Kira tem uma chance se ela for entregue a um Guardião em quem você confie. Não precisa ser o Radje. Ainda assim você se coloca em um risco absurdo se você continuar a agir como se fosse culpado. Avô. ― Aquele tom afiado amaciou. ― Por favor, não faça isso. ― Mencheres abruptamente se virou e olhou na direção da barraca de bebidas. Kira e Cat não estavam mais sentadas na mesa próxima a ela. Ele ampliou os seus sentidos e encontrou uma onda de energia desumana por trás


de um poste de ferro. Mencheres fixou o olhar lá, vendo Kira por trás dele. Ela se encolheu quando ela encontrou o seu olhar, então fingiu amarrar o seu sapato em uma imitação pobre de que não esteve escudando escondida. ― Você foi tão descoberta, ― ele ouviu Cat observar informalmente quando ela apareceu por trás da Kira. ― Mencheres, ― Bones cutucou. ― Não tenho nada mais a dizer sobre este assunto, ― ele respondeu, observando Kira desistir do seu falso amarrar de sapatos. ― Radje está exigindo que eu me entregue para testemunhar? ― Kira perguntou a Cat. Ela já tinha ouvido demais. Mencheres lançou um olhar duro para o Bones, antes de começar a ir na direção do olhar dela. ― Uh-huh, ― Cat estava dizendo. ― E Mencheres apenas disse ‘inferno não’. Eu te disse que ele é irracional quando se trata de uma mulher com quem ele se importa. Ah, ele está vindo. Parece irritado, também. ― Kira não virou, mas seus ombros ficaram tensos. Mencheres lançou um olhar de advertência para a Cat, que ela respondeu com um sorrisinho. ― Você não é nada parecida com como ela era, a propósito, ― Cat continuou para a Kira, ignorando o seu olhar furioso. ― E acredite em mim, eu digo isso como um elogio. ― Mencheres sabia sobre quem Cat estava falando. Raiva queimou nele com a menção da sua traidora mulher morta. Ele sempre está sendo julgado pelas ações da Patra, não é? Os pecados dela continuaram a assombrá-lo, um fantasma que ele nunca poderia colocar para descansar? ― Só porque alguns de nós cometemos um erro no amor uma vez, não significa que estamos condenados repeti-lo, ― foi o que Kira respondeu logo antes de Mencheres alcançá-la. A mão dele deslizou pelas costas dela ao mesmo tempo em que as palavras dela diminuíam a raiva dele, aliviando uma culpa que ele não sabia que carregava. Sim, seu coração uma vez foi dominado por uma mulher que ele sabia que tinha a capacidade para um grande mal. Ele advertiu a Patra que suas ações negras a levariam à sua destruição. Ela escolheu seguir nesse caminho, independentemente, determinada de que ela poderia alterar o seu destino. A morte de Patra havia chegado assim como Mencheres tinha previsto ― uma faca de prata torcida em seu coração pelo vampiro que Mencheres amava como um filho, com quem ele dividiu o seu poder, e elevou ao status de co-regende em sua linha.


Mas só porque aquele amargo destino lhe tinha acontecido, não significa que ele estava amaldiçoado para sempre a amar aquela que o trairia. Sua mão deslizou para baixo pelas costas da Kira mais uma vez. Cat estava certa. Kira não era nada como a Patra, ainda assim ela tinha capturado suas emoções ainda mais firmemente do que a sua antiga esposa traidora tinha. Este pode ser o fim de sua vida, mas ele veria que foi bem vivido. ― O nosso tempo com eles acabou, ― ele disse a Kira. Bones deu a volta para ficar ao lado da Cat. ― Há mais que ainda precisa ser decidido… ― ― Acabou, ― Mencheres repetiu em um tom mais duro. Então ele colocou uma mão sobre o ombro do Bones, encontrando aquele olhar marrom obstinado do seu co-regente. ― Proteja a linha. Até que isto esteja resolvido, ela é sua. ― ― Você não pode fazer isso, ― Kira disse, choque em seu tom. Ela deve ter percebido do que ele estava desistindo com aquelas palavras. ― Moça esperta, você devia ouvi-la, ― Bones murmurou. ― Isso não é permanente. ― Mencheres tirou a mão do ombro do Bones e a colocou nas costas da Kira novamente. ― Radje falhou em me derrotar em todas as suas muitas tentativas anteriores. Ele falhará novamente agora. Eu simplesmente preciso de tempo. ― Bones abriu a boca, mas Cat tocou em seu braço. ― Não se incomode. Você não desistiria da sua namorada também, se você fosse ele. Mencheres avise-nos do que você precisar. Nós bancaremos os desinformados sobre o seu paradeiro com os Guardiões enquanto isso. Kira, prazer em conhecê-la. Bones… vamos embora. ― Bones lançou um longo olhar para sua esposa. O cheiro dele ainda serpenteava com frustração, mas então ele ergueu um ombro em consentimento. ― Tudo bem, Kitten. Avô, eu sinceramente espero que você saiba o que está fazendo. Kira, talvez da próxima vez, nós vamos nos encontrar em melhores circunstâncias. ― Então os dois vampiros se viraram e partiram, a beleza impressionante deles era a única coisa que fazia qualquer um lançar um segundo olhar enquanto eles passavam. Aquela energia no ar esvaziou um pouco, o ar se preenchendo com as vibrações mais suaves que os mortais exalavam. Kira enfrentou o Mencheres, seu maxilar definido naquela linha teimosa. Ele limpou sua expressão de volta para uma máscara impassível enquanto


esperava que ela discutisse sobre a recusa dele em entregá-la ao Radje ou a outro Guardião da Lei. Então, inesperadamente, as mãos dela agarraram o colarinho da camisa dele. ― Abaixe aqui, ― ela disse. Ele se inclinou quase cautelosamente, mas a sua hesitação acabou quando Kira fechou os lábios sobre os dele. Ele saboreou a sensação da boca carnuda dela, então o deleite da sua língua, quando ela abriu os lábios. Um calor lento começou a crescer dentro dele. Faltavam tantas horas para o amanhecer… Ela quebrou o beijo deles para encarar os olhos dele. ― Quanto tempo temos antes de encontrarmos seu próximo grupo de aliados? ― ela sussurrou. Um brilho de esmeralda apareceu em suas profundidades verdes, ficando mais escuro e brilhante. Ele parou de acariciar o rosto dela para enrolar a mão em torno das dela. ― Até amanhã, ― ele disse com a voz grossa. ― Bom ― . As presas da Kira já tinham começado a se alongar com o desejo. ― Então vamos voltar para a sala agora. ― Poder tomou conta do ar no momento seguinte, fazendo Mencheres girar na direção da fonte. Bones corria pelas multidões, muito rápido para ser observado pelos humanos como mais do que uma lufada de vento, Cat bem atrás dele. ― Executores, ― Bones anunciou quando os alcançou. Seus olhos brilharam verdes. ― Cerca de uma dúzia deles atravessando os portões principais do parque agora. Não sei como eles conseguiram me seguir, mas eles devem ter seguido. ― Era lamentável, mas não era um choque completo para o Mencheres. Bones era inteligente e cuidadoso, mas um vampiro não se tornava um Executor antes dos quinhentos anos de idade e completar um processo rigoroso de treinamento. Eles não eram os soldados por trás do poderoso corpo governante de todos os vampiros porque eles eram comuns. Foi por isso que Mencheres tinha escolhido o parque. Seria um lugar relativamente mais fácil de escapar. ― Vá, ― ele disse com um grunhido. ― Se você lutar contra eles, você pode ser condenado pelos Guardiões junto comigo. Parta daqui e me renuncie como um tolo que não quis ouvir sua insistência para me entregar. ― ― Eu não vou, ― Bones rosnou.


Mencheres lhe deu um olhar rápido e duro. ― Fazer coisas que nem sempre você quer fazer é o preço que vem com ser o Mestre de uma linha. Agora, proteger nosso povo e vá. ― Ele empurrou Bones e Cat para longe dele, então, com uma explosão de seu poder, ele os empurrou pelo ar para longe do parque. Kira deixou escapar um ruído chocado e alguns humanos olharam para cima em confusão, sem dúvida, sua mente rejeitando o que sua visão tinha acabado de ver de relance. ― Precisamos ir também, ― Kira disse, puxando a sua mão. ― Vamos lá, faça-nos voar para longe daqui. ― Ele iria, mas não agora. ― Espere. ― Uma dúzia de vampiros Mestres das classes de elite dos Executores Guardiões se enfileirou na entrada do Frontier Land. Ao lado dele, Kira apertou mais forte sua mão. ― Eu não serei a causa de mais nenhuma morte, Mencheres. É minha escolha, e se você não vai nos levar para longe daqui, eu escolho me entregar. ― Ele soltou a mão dela da dele com um leve puxão do seu poder. Então ele abriu os braços para os Executores. ― Se você me quer, aqui estou eu. ―


CAPÍTULO VINTE E TRÊS. Kira viu a dúzia de vampiros descerem sobre eles como se fosse algo saído de um pesadelo. Eles passavam pelas pessoas no parque como se elas nem estivessem lá, com um único propósito que a fez debater entre atropelálos e se dar por vencida. Ela não poderia aguentar se uma luta eclodisse e deixassem os visitantes inocentes do parque ― ― homens, mulheres e crianças ― ― na linha de fogo onde eles podiam se ferir. Ou pior. Ela engasgou algo nesse sentido para Mencheres, mas ele escapou de suas mãos frenéticas e sua resposta aos Executores a atordoou. ― Se vocês me querem, aqui estou. ― O desafio aberto em sua voz disse que ele não tinha intenção de ir calmamente. Oh Deus, ele não podia estar querendo lutar com eles! Não aqui com todas essas famílias ao redor! Kira soltou um ruído horrorizado enquanto os vampiros avançavam, homens e mulheres, puxavam lâminas brilhantes de suas bainhas em seus cintos e aceleravam o ritmo. Algumas pessoas pararam para olhar, mas Mencheres nem sequer vacilou. Ele apenas ficou lá parado com os braços abertos e os pés firmemente plantados. ― Mencheres, ― um dos Executores gritou, ― pela ordem do Conselho dos Guardiões, você virá conosco. ― Um sopro de ar mudo seguido por múltiplas rajadas de faíscas encheram o ar no instante seguinte enquanto todas as luzes se apagaram naquela parte do parque. Até mesmo as luzes de emergência implodiram com pequenos estalos, mergulhando Frontier Land nas sombras para Kira, mas na escuridão para qualquer humano. Ao redor deles vários sons de brinquedos sendo parados com o ruído de rangidos. Várias pessoas arfaram. Algumas crianças começaram a chorar, mas apesar de olharem Mencheres com cara feia, os Executores não reagiram. Eles continuaram vindo. Kira tentou correr para eles, tentando evitar um confronto mortal ao se entregar quer Mencheres goste ou não. Mas depois de dois passos, ela descobriu que não podia se mover. Seu corpo parecia que tinha sido, de alguma forma, envolvido em um bloco de concreto até o pescoço. Porém, ela ainda podia virar a cabeça, então ela o fez, bem no momento de ver Mencheres lhe olhar com uma carranca de censura. ― Isso não é necessário. Nenhum sangue será derramado essa noite. ―


Em seguida o poder inundou o ar como uma onda gigante, Mencheres de pé no centro dele. Todos os Executores começaram, abruptamente, a diminuir a velocidade; seus movimentos rápidos e precisos começaram a ficarem lentos. Ao mesmo tempo, os humanos ao redor deles, adultos e crianças também ficaram lentos, recuando em perfeita sincronia. Logo a área estava livre de todos, exceto Mencheres, Kira e os Executores, cuja aceleração agora tinha sido reduzida para a velocidade de um rastejar. ― Nos... liberte, ― exigiu aquele que estava mais perto de Mencheres, com um rosnado estrangulado. Em resposta, ele fechou os punhos. Outra onda de poder foi liberada, resultando em todas as facas de prata que os Executores seguravam sendo arrancadas de suas mãos para aterrissar em uma pilha aos pés de Mencheres. Então como um todo, os Executores foram arremessados na noite, passando a altura da montanha russa mais próxima, antes de serem atirados contra o chão. O impacto quebrou o concreto e enviou uma onda de choque que tremeu toda aquela parte do parque. Gritos vieram do perímetro mesmo que poucas pessoas pudessem ver o que aconteceu. Da mesma forma abrupta, aquela dúzia de vampiros foi lançada ao ar novamente, dessa vez batendo uns contra os outros parecendo participantes em algum tipo de teatro de fantoches kamikaze. ― Vocês vieram me prender por um crime que não cometi, ― Mencheres disse calmamente abaixo deles. ― Digam a Radjedef que eu irei me apresentar ao Conselho dos Guardiões... assim que eu tiver provas de quem realmente cometeu esses atos. ― Em seguida os Executores foram arremessados para cima antes de caírem no chão de novo, e de novo e de novo. Kira estava chocada demais com a rotina de saltos macabros, que cada vez fazia mais concreto se soltar, para notar que Mencheres estava parado perto de seu cotovelo. ― Nós devemos partir. ― Quase entorpecida, ela fez que sim com a cabeça, colocando os braços ao redor do pescoço dele enquanto ele a segurava contra si. Então Mencheres subiu como um foguete para cima, os Executores ainda caindo solidamente no chão abaixo deles.

***** Mencheres manteve um braço ao redor de Kira enquanto ele os impulsionava em direção ao céu. Ele manteve metade de sua concentração nos Executores abaixo, tentando atordoá-los o máximo possível com repetidos


impactos, mas logo seu poder sobre eles se partiu quando a distância entre eles cresceu. Assim que ele sentiu aquela ruptura mental, Mencheres direcionou todo seu foco em impulsioná-los mais alto no céu, mais longe do que ele teria ousado quando Kira era humana. Depois de vários segundos, o ar congelava e as luzes abaixo deles se tornaram turvas. Ainda assim, ele não relaxou. Ele conhecia a impetuosidade dos Executores. Eles iriam se recuperar rapidamente, então iriam atrás deles. Logo em seguida ele sentiu outro aumento de poder nas correntes abaixo deles. Ele se focou nisso, enviando uma explosão concentrada de força descendente em direção a fonte de tal poder. Ele foi recompensado por um grito abafado e a abrupta dissipação de energia de quem o perseguia. O Executores provavelmente se recuperaria antes de atingir o chão. Se não se recuperasse, agora haviam montanhas abaixo deles ao invés de milhares de humanos inocentes reunidos em um parque de diversões, e um pouso difícil não mataria um vampiro. Mais dois pontos de poder vinham atrás deles nas correntes de ar. Mencheres balançou a cabeça raivosamente enquanto usava mais de sua força para entregar um par de impactos de alta potência que os fez cair em direção a terra. Matá-los no parque teria sido muito mais fácil, mas Radje queria que Mencheres os matasse. Matar nem que fosse um Executores iria garantir que todos os Guardiões se unissem contra ele. Ele não podia fazer isso, mas isso não significava que ele iria permitir que capturassem ele ou Kira. A única surpresa foi que Radje não tinha vindo com os Executores para ajudar na tentativa de trazê-lo. ― Frio... muito frio, ― Kira murmurou. O gelo começou a cobrir os dois, mas ele não podia arriscar ir mais baixo. Foi preciso uma grande quantidade de seu considerável poder para mantê-los nessa velocidade e nessa altura. A maioria dos Executores não seriam capazes de atingir essa altura e velocidade. Essa era a melhor chance que eles tinham de fugir sem ter que matar aqueles que os perseguiam. Uma vasta extensão de azul escuro corria ao lado de luzes intermitentes abaixo deles. Mencheres lançou um olhar especulativo. Talvez houvesse outro jeito de se livrar dos Executores sem esgotar sua força nessa altitude ou com aquelas rajadas de poder necessárias para desviar seus perseguidores. Mencheres os virou em direção àquela contínua extensão de azul, diminuindo a altitude até que o gelo não mais começasse a cristalizar na pele de Kira. Ao mesmo tempo, ele sentiu uma carga de mais três Executores vindo abaixo deles. Ele os deixou chegarem mais perto. Mais perto, mais perto...


Ele enviou uma tripla explosão de poder que os fez girar em direção as montanhas. Uma espiada ao redor com seus sentidos revelou que os outros Executores não estavam por perto. Satisfeito, Mencheres envolveu Kira com os dois braços e lançou seus corpos como uma bala em uma linha direta para baixo em direção àquela convidativa plataforma cor anil. ― Mencheres, não! ― ela gritou. Seus corpos atingiram o oceano como um torpedo momentos depois.

***** O golpe do impacto sacudiu Kira, enviando uma forte dor através de seu corpo. Por poucos segundos ela ficou atordoada. Então a dor se dissipou, sendo substituída então, por um inexplicável ataque de pânico. Ela tinha que se lembrar que não havia motivos para ter medo. Ela não precisava mais respirar, mas uma parte dela ainda queria gritar enquanto Mencheres os empurrava para mais fundo no oceano. Ele era mais lento debaixo d'água do que nos céus, mas ainda era tão rápido que ela sentia como se estivessem sendo puxada para baixo por uma grande corrente invisível. A água a rodeava com um abraço cada vez mais apertado, a pressão aumentando até ela se sentir claustrofóbica. Nada, exceto líquido, estava ao seu redor, porém ele se comprimia contra ela com a força de um punho sendo lentamente fechado sobre seu corpo. Então a aceleração parou e ela estava flutuando lateralmente através das profundezas. A água se abria ao redor deles com as explosões poderosas que Mencheres usava para os impulsionar para frente, cortando horizontalmente o fundo do mar como se seus corpos tivessem se transformado em um único torpedo. Finalmente aquela sensação de aceleração parou. Kira se agarrou com mais força a Mencheres, esperando outra explosão de movimento a qualquer momento, mas ele permaneceu imóvel. Ela não estava nem ciente de que estava com os olhos fechados com força até que o sal fez seu olhar arder quando os abriu. Mencheres os tinha suspensos nas sombras mais profundas que ela já viu como vampira, somente o brilho cor de esmeralda dos olhos dele fornecia uma bem vinda forma de iluminação. Kira esfregou os olhos, mas não ajudou com o ardor. Ele aliviou a pressão que fazia para segurá-la até a manter perto dele apenas com um braço. Ele olhou para cima, em seguida olhou para ela e balançou a cabeça. Ela supôs que aquilo significava que eles não poderiam ir para a superfície nos próximos minutos, que, apesar de ela saber que as chances eram mínimas, ainda era o que ela esperava que aconteceria. A pressão apertada em volta dela aumentava o sentimento de que estava sendo sufocada


― ― mesmo que ela tivesse ficado horas sem uma única respiração por dia na semana passada. A escuridão também aumentava seu desconforto, o que não fazia sentido. Recentemente ela lamentava por nunca mais ver a escuridão, porém aqui estava um substituto decente ao redor dela, e ela odiava isso. Quão rapidamente ela se acostumou a habilidade de ver tudo ao seu redor com clareza cristalina. Kira não estava usando um relógio, mas ela bateu na parte de cima de seu pulso com, o que ela esperava ser, um olhar de questionamento. Mencheres ergueu dois dedos em resposta, quase a levando a tentar xingar debaixo d'água. Duas horas aqui embaixo? Se ela visse um tubarão, com certeza ela gritaria, apesar de ela agora também ter dentes afiados. Algo acariciou suas costas. Kira se virou com um grito silencioso, mas não havia nada além do azul escuro até onde ela podia ver. Aquela carícia veio novamente, dos seus ombros até a parte inferior das costas em um carinho firme e tranquilizante. Ela relaxou. Mencheres. Ela se virou para olhar para ele, o rosto dele iluminado pelo seu olhar brilhante. O cabelo flutuava ao redor dele em uma nuvem negra, a camiseta subindo para revelar aquele abdómen plano, perfeito e musculoso. Os traços marcantes de seu rosto pareciam quase assustadoramente belos contra o plano de fundo daquela tela de anil infinito, as correntes debaixo d'água movimentando seu cabelo. Ele era tão maravilhoso... e a quantidade de poder que ele era capaz de exercer era assustadora. Ele tinha derrubado Bones e Cat para fora do parque tão facilmente quanto sacudir um fiapo da camisa. Então ele desarmou aqueles Executores. Moveu pessoas para fora do caminho do perigo. Repetidamente bateu os Executores contra o chão tão facilmente quanto uma criança quica uma bola ― ― tudo sem tocar nenhum deles. Então ele os levou para os limites do céu antes de mergulhá-los nas profundezas do oceano enquanto fazia tudo parecer fácil. Kira não podia nem começar a compreender a magnitude das habilidades dele. Ela já estava desconcertada com como ela podia controlar a mente de qualquer humano com um flash de seu novo olhar brilhante, e que aquilo era nada comparado ao que Mencheres podia fazer. Ele a observava, o rosto dele com sua expressão usual contraída, mas lascas de inquietação assombravam seu subconsciente. Não eram emoções dela. Eram dele. Será que Mencheres acreditava que sua exibição de cair o queixo iria assustá-la? Em nível de habilidades, eles eram monstruosamente desproporcionais. Ele era facilmente mil anos mais velho que ela também, o que já era difícil de assimilar. E mais, ele tinha aquela tendência infeliz de pensar pelas outras pessoas, como ele tinha admitido antes e provado mais uma vez quando não a deixou se entregar para os Executores.


Porém, apesar de todo seu poder surpreendente, Mencheres ainda tinha uma consciência forte. Poder absoluto corrompe absolutamente, ele falou para ela uma vez, de forma irônica, porém ele, repetidamente, provava o contrário com suas ações. Apesar de todo o poder desigual entre eles, Mencheres o mantinha em um nível de igualdade emocional com ela, sempre dando a ela a liberdade de aceitá-lo ou rejeitá-lo. Sua praticidade a avisou de que suas diferenças eram grandes o suficiente para romper com eles, mesmo que eles não estivessem em sério perigo por causa de Radje, dos Executores e dos outros Guardiões da Lei. Porém seu instinto disse que Mencheres era para ser dela. Kira se pegou sorrindo a esse pensamento. Mencheres, dela. Ela esticou a mão através da água que os separava, acariciando o rosto dele, sentindo a centelha de seu poder contra a pele. Meu. Parecia a coisa certa. De fato, parecia mais certo do que qualquer outra coisa antes disso. Ele a puxou para seus braços, as emoções fortes demais para ela nomear, roçando contra seu subconsciente. De repente, a ideia de duas horas no oceano desse jeito não era desagradável. Não se ela pudesse abraçá-lo e sentir tudo que ela ainda não tinha se permitido dizer para si.


CAPÍTULO VINTE E QUATRO. Mencheres examinou a fila de casas no vale abaixo deles. Uma leve brisa desordenou seu cabelo enquanto ele estreitava o foco em cada residência, procurando uma que não continha um coração batendo. Ao lado dele, Kira estava em silêncio, mas um leve tremor passou por ela. Eles ainda estavam molhados e estava mais frio aqui, muito mais distante da costa da Califórnia do que onde eles entraram no oceano horas antes. ― Lá, ― ele disse, ficando de pé. Kira se levantou, emitindo um som de alívio. ― Eu sei que é errado entrar na casa de alguém enquanto eles não estão, mas não posso esperar para tirar esse sal seco de mim. Coça. ― Ele lhe lançou um olhar divertido enquanto começavam a ir em direção a residência vazia. ― A casa tem uma placa de VENDE-SE nela. Duvido que alguém a ocupe. Aliviaria sua consciência se mais tarde eu providenciasse para ter recursos enviados para os proprietários para cobrir nossa breve estadia? ― ― Na verdade, aliviaria, ― ela respondeu. ― Isso ainda não faz com que arrombar e invadir esteja tudo bem, mas então eu me sentiria menos como uma ladra. ― ― Considere isso feito. ― Foi um gesto pequeno o suficiente para apaziguar a sensibilidade dela, mesmo que ele não pretendesse que os moradores ou os corretores de imóveis ficassem a par de que alguém tinha estado na casa. Porém, eles tinham quatro horas antes de ele se encontrar com seu aliado, e ele não pretendia passar esse tempo com Kira molhada, fria e miserável. Eles estavam no gramado da casa cinco minutos depois. Mencheres queimou as luzes do sensor de movimento com um estalido de sua mente assim que eles se aproximaram da casa, então ele desabilitou as linhas para o alarme antes de destrancar a porta lateral. Ele podia ter escolhido uma vizinhança mais modesta para procurar casas vazias. Casas que poderiam não ter sistemas de segurança, mas essa era mais perto de seu ponto de encontro. E Kira merecia um pouco de um ambiente luxuoso para compensar pela sala de equipamentos suja na qual ela acordou ontem. A tranquilidade da casa vazia acenou cordialmente. Kira não era a única que ansiava por descansar algumas horas. Ele tinha esgotado uma grande parte de sua energia entre os Executores, a altura em que ele voou, os navegando pelo oceano e então voando até aqui. Ele também precisava se


alimentar, mas isso podia esperar até mais tarde, quando eles estivessem a salvo com seu aliado. ― Você poderia ser o melhor assaltante de bancos do mundo se quisesse, ― Kira observou enquanto ela entrava pela porta que ele abriu. Bom. Alguns sistemas eram mais sofisticados do que os outros. A casa também estava mobiliada, mas tinha um sentimento vazio que mostrava que estava semanas desocupada. ― Não me dá prazer roubar, ― ele respondeu com um dar de ombros. ― Algumas vezes é necessário, como esperar aqui, ou quando eu bebo de humanos que sem conhecimento me oferecem suas veias. Ou quando eu forcei aqueles motoristas a nos carregar até nosso destino. Mas tirar quando a mesma coisa pode ser comprada ou dada livremente... não, não é meu estilo. ― Kira lhe lançou um longo olhar antes de se virar. ― Eu vou procurar um chuveiro e espero que a água esteja ligada para que eu possa tirar esse sal de mim. ― Assim dizendo, ela subiu pela escadaria de mármore brilhante em direção ao segundo andar. Mencheres a olhou por trás, avaliando se havia significado extra por trás de suas palavras. Muita coisa pode ter mudado entre eles depois que os Executores apareceram no parque. Obviamente ela ficou chocada com as coisas que ele fez, mas então ela o segurou nas profundezas escuras do oceano com ternura enquanto eles esperavam para garantir que nenhum dos Executores os encontraria. A voz de Kira também aprofundou-se ligeiramente quando ela disse que estava procurando por um chuveiro. Ele não podia dizer se o cheiro dela também tinha mudado; ela ainda tinha o cheiro forte do oceano para ele captar alguma fraca nuance de desejo. Mas os olhos dela podem ter brilhado um pouquinho com o tom verde esmeralda antes de ela se virar. Ele pretendia descobrir se estava certo. A água foi ligada quando Mencheres deu o primeiro passo na escada. Ele a subiu devagar, ouvindo o farfalhar de roupas molhadas sendo removidas, então um som suave de satisfação que Kira fez quando entrou debaixo do jato de água. Ele seguiu aqueles sons enquanto continuava a ir em direção ao segundo andar, pisando nas mesmas pegadas úmidas que ela fez no mármore, atraído em direção ao banheiro onde ela estava. O banheiro com a porta aberta. Mencheres tirou sua camiseta molhada, a deixando no chão. Seus sapatos e calças molhadas seguiram o exemplo, o celular imprestável dentro


dela fazendo um baque suave ao bater contra o mármore. Então ele andou nu para o banheiro. O vapor o envolveu quando ele entrou no box fechado. Kira estava debaixo do jato de água, de costas para ele, seu corpo suavemente brilhante. O peso da água transformava o cabelo dela em um tom topázio mais escuro enquanto o arrastava para baixo, cobrindo seus ombros. Ela se recostou em seus braços sem hesitação, desencadeando nele um sentimento de alívio profundo. Até aquele momento ele não tinha percebido o quanto uma rejeição dela o arrasaria. As mãos dele quase tremeram enquanto escorregavam pelas curvas insinuantes do corpo dela. Minha Kira. Minha bela e forte Dark Lady. Ele a beijou na nuca, o jato de água correndo por seu rosto. Ela emitiu um leve gemido. Tentou se virar, mas ele a manteve onde estava. Na sua impaciência de antes, ele negligenciou em explorá-la do jeito que ele queria. Devagar. Meticulosamente. Até ela se retorcer por ele. Mencheres abriu os braços de Kira, a abraçando contra a parede do box com o corpo levemente inclinado para frente. As mãos dele a acariciaram pela frente enquanto ele mergulhava a boca ao longo de suas costas, apreciando os pequenos e agudos suspiros que vinham dela. Seu poder a abraçou também, procurando por todas as curvas do corpo dela que suas mãos ainda não tinham alcançado. Quando sua boca mergulhou no declive da parte inferior das costas dela, ele deixou suas barreiras caírem para que Kira pudesse sentir sua fome. Sua antecipação e desejo enquanto ele afastava suas nádegas para mergulhar a língua ao longo de seu vale. Ela estremeceu, emitindo um som áspero. Ele abriu mais as pernas dela, se ajoelhando e procurando por seu doce centro. Sua próxima lambida o encontrou e ele a pressionou mais. Ela se inclinou mais ainda, com a espinha arqueada. Uma longa onda passou por ela. ― Por favor, ― Kira arfou. ― Eu preciso te tocar. ― Os joelhos dela tremeram enquanto a língua dele serpenteava mais profundamente dentro dela. Ele inalou, deleitando-se com seu cheiro, seu gosto e os tremores que ele sentia vibrando contra sua boca. Seu poder a manteve de pé enquanto as mãos continuavam a acariciá-la, a umidade em sua língua aumentando assim como os gemidos de Kira cresciam para soluços. Ela se inclinou para trás, balançando de êxtase, o provocando a enfiar a língua mais rápido e mais fundo dentro dela. Um triunfo primitivo o preencheu enquanto os sucos dela cobriam sua boca mesmo que a água ainda caísse em cascata ao redor deles.


― Agora, agora, agora, ― ela apenas gritou, deixando a parede para agarrar as mãos dele. Mencheres se levantou em um movimento ágil, a penetrando em uma única investida. Um grito saiu rasgando por ela, mas não era um grito de dor, e suas paredes apertavam ao redor do membro dele em êxtase ao invés de tensão. Um gemido gutural saiu dele enquanto ele agarrava os quadris dela e começava a se mover com investidas lentas e profundas. Ela estava tão apertada, mas tão molhada, cada aperto inundando seu corpo com um prazer quase insuportável. Sua boca se juntou ao pescoço dela enquanto ele trazia sua excitação contra ele, suas costas friccionando o peito dele e aquelas nádegas deliciosas provocando seus quadris. A cabeça dela caiu para trás quando ergueu os braços para envolvê-lo por trás, seus quadris combinando o aumento do ritmo dele. O prazer correu por todos os nervos de seu corpo. Ele crescia assim como os gritos dela se tornavam mais altos, o aperto da carne dela ao redor dele era mais forte. A intensidade aumentou até parecer que ela ia queimar de dentro para fora, a pele tão apertada e aquecida, mesmo o jato contínuo de água do chuveiro era dolorosamente erótico. Ele não conseguia parar de se mover mais rápido, conduzindo Kira com uma fome desenfreada que exigia resposta dela. Exultação o preencheu quando ela gritou e espasmos apertaram seu membro. O aperto interior estático dela apenas aguçou o prazer dele, fazendo todo seu corpo pulsar em uma cadência que correspondia. Ele queria enterrar sua semente dentro dela, mas ainda mais que isso, ele queria sentir aquele doce aperto de seu orgasmo em volta dele novamente. Agora mesmo. Ela não tinha parado de tremer de sua libertação quando Mencheres saiu de dentro dela, a girando para olhar para ele, sua boca cobrindo a dela para capturar seu gemido. A língua de Kira acariciava a dele quase febrilmente enquanto ele a penetrava novamente, os tremores que restavam de seu clímax vibrando ao longo de sua carne com uma sensualidade sem fim. Ele a ergueu, usando seu poder para deslizá-los do chuveiro para o quarto antes de colocá-la na cama. Outra longa e profunda penetração fez as pernas dela se enrolarem ao redor da cintura dele enquanto as unhas fincavam em suas costas. Mesmo através da névoa de desejo, ele sentiu um flash de clareza. Era aqui onde Kira pertencia ― em seus braços, compartilhando cada emoção que ondulava através dele com intensidade devastadora. Então ele se perdeu no gosto de sua boca, no roçar de sua pele, no forte aperto de seus braços e no abraço apertado e molhado que inundava seu corpo com um prazer indescritível. O nome dela saiu de seus lábios em um gemido enquanto sua boca escorregava por seu corpo abaixo, se deleitando com o cheiro e sabor de sua pele sedosa. ― Não pare, ― Kira encorajou, tentando puxá-lo de volta para cima.


― Quero sentir você gozar de novo, ― ele apenas murmurou. Ela deu uma risada abafada. ― Então volte aqui e me dê mais alguns minutos… ― oh! ― O grito saiu com violência dela enquanto ele cravava as presas entre suas pernas, bem no coração de sua sensibilidade. Uma satisfação profunda o preencheu enquanto a carne macia de Kira se contraiu debaixo de sua boca quase que instantaneamente. Então ele se levantou e a penetrou, um gemido escapando dele ao senti-la convulsionando ao redor dele. As costas dela arquearam enquanto aqueles tremores continuavam dentro dela. Ele se moveu mais rápido, beijando sua garganta, seus lábios e o maxilar enquanto ele deixava seu controle escapulir. Aquele batimento forte dentro dele crescia até que parecia que sua pele ia se rasgar do prazer que espumava dentro dele. O prazer o atingiu repentinamente, o arrastando para sensações que intensificavam até que explodiu em um clímax que o fez agarrar Kira com força o suficiente para machucá-la. Por longos momentos, ele a encarou enquanto as últimas ondas se esvaiam devagar de seu corpo. Os olhos dela era mais verdes do que ele já tinha visto e suas unhas ainda estavam fincadas em seus ombros. ― Não posso acreditar que você me mordeu lá, ― ela disse finalmente. ― Mas o que eu realmente não posso acreditar é no que senti. ― Um sorriso curvou os lábios dele. ― Há benefícios em ser um vampiro. Esse é um deles. Eu vou apreciar te mostrar os outros. ― ― Não posso esperar, ― ela murmurou. Então sua expressão mudou, perdendo seu torpor ardente para se tornar séria. ― Há algo que eu preciso te dizer. ― Ele se afastou, deixando a felicidade do abraço dela para se inclinar contra a cabeceira da cama. Kira também se sentou, puxando a coberta ao seu redor ou por frio ou por uma tentativa de colocar outra barreira entre eles além do espaço que agora os separava. ― Estou ouvindo, ― ele respondeu. Dúzias de séculos ocultando suas emoções fizeram seu rosto ficar inexpressivo e sua voz neutra enquanto suas paredes se erguiam, evitando que Kira sentisse sua agitação interna. O olhar dela era firme. ― Eu estou apaixonada por você. Sim, é muito cedo. Sim, ainda há muito que não sei sobre você, mas isso não é paixão tola ou desejo. É real, e é algo que vem crescendo dentro de mim desde antes de você me deixar naquele telhado. ―


Mencheres estava atordoado. Ele sentiu a boca abrir, mas não pôde formar palavras. O bom senso imediatamente rejeitou a declaração dela. Ela não podia amá-lo. Kira tinha um coração limpo. Não um coração puro ― o coração de ninguém era ― mas se ela tivesse visto toda a escuridão em sua vida durante o curso dos anos, ela iria fugir dele. O olhar dela permanecia igual. ― Diga alguma coisa. Eu não me importo com o que, apenas fale. ― ― Sou um assassino. ― As palavras saíram sem pensar, mas eram verdadeiras. Ela merecia saber o que ele era, mesmo que isso provavelmente a afastasse. A boca carnuda e adorável dela se contraiu. ― Eu sei disso. Eu vi você arrancar as cabeças daqueles ghouls no dia em que nos conhecemos, lembra? ― ― Não só isso. ― Mencheres encontrou o olhar dela, esperando que ele se tornasse repulsa por suas próximas palavras. ― Muitas vezes. Mais do que posso me lembrar. ― ― Quantas dessas vezes tiveram a ver com se proteger ou proteger seu pessoal? ― ela perguntou, sem mudança em sua expressão. As sobrancelhas de se juntaram. Ela o surpreendeu mais uma vez. ― Isso importa? ― ― Sim, ― ela respondeu com ênfase. ― Seu mundo opera com regras bem diferentes. Eu posso não ter visto muito dele, mas essa parte é clara. Você está se chamando de assassino insensível, Mencheres, mas eu te vi proteger ou salvar vidas que não deveriam importar para você se você fosse uma pessoa fria como diz. Eu devo saber. A minha foi uma daquelas vidas que você salvou, e naquela hora, você nem ao menos me conhecia. ― ― Eu arranjei para minha esposa ser morta. Eu a vi morrer e não fiz nada para impedir. ― Sua voz era monótona. Kira tocou seu rosto. ― Cat me disse que ela tentou te matar e a todos próximos a você. Então você não teve escolha. Nem eu tive quando entreguei Pete. ― Ele afastou as mãos dela. Era muito difícil dizer essa próxima parte com ela o tocando, mas ela precisava saber exatamente quem era que ela achava que amava. ― Eu matei Patra muito antes daquele dia. Você me perguntou se eu já tirei uma vida sem ser para proteger a mim ou meu pessoal. A resposta é sim. Antes de Patra se casar comigo, ela amava outra pessoa. Eu matei seu amante


e não foi em defesa própria. Eu era um vampiro e ele era meramente humano. ― A memória daquele assassinato se ergueu dentro dele, como tinha feito tantas vezes nos últimos anos enquanto Patra avançava lentamente para mais perto de seu destino. O corpo quebrado de Intef no chão, seu sangue ensopando o corpo pálido e os rostos espantados dos guardas de Mencheres enquanto olhavam para ele. ― Eu disse para Patra que seu amante foi assassinado pelos romanos. Nos casamos alguns anos depois, mas eventualmente, uma das testemunhas contou meu segrego. Eu tentei explicar as circunstâncias por trás de sua morte, mas ela não se importou. O que eu fiz causou o ódio de Patra por mim, e aquele ódio é o que guiou sua tentativa de destruir a mim e a meu pessoal. Todas suas ações podem ser colocadas aos meus pés. ― ― Você o matou por ciúme? ― Kira perguntou, sua voz era áspera. Os olhos dele se fecharam. ― Naquele dia, os humanos estavam em guerra. Soldados feriram Patra o suficiente para que eu tivesse que transformála ao invés de meramente curá-la. Então fui buscar seu amante como tinha prometido. Eu não sentia ciúme real com respeito a Intef. Ele era uma das muitas distrações que Patra tinha desejado durante seu desagradável casamento, apesar de que ele tinha uma forte influência sobre ela porque ela queria ele transformado em um vampiro também. ― ― Você não estava preocupado que o transformando arruinaria as coisas para você? Você devia gostar dela até então, ou vocês dois não, ah, estavam envolvidos ainda? ― Mencheres abriu os olhos para lançar um olhar penetrante para Kira. ― Nós não éramos amantes ainda. Paciente eu seria, repartir eu não iria; Eu gostava de Patra, mas eu não estava cego por sua natureza. Ela era atraída por poder e riquezas. Eu tinha os dois, Intef nenhum. Eu sabia que logo ela me escolheria ao invés dele. ― ― Então… se não foi ciúme? ― A voz dela foi sumindo. ― O poder de mover coisas com minha mente pode ser influenciado por minhas emoções. É por isso que requer absoluto controle, que é também porque meu criador sabia que Radje teria sido uma escolha ruim para ele. Eu não tinha encontrado Intef antes daquele dia, mas quando eu fui buscá-lo, eu ouvi seus pensamentos. Ele estava usando Patra para conseguir poder, vendendo seus segredos aos seus inimigos. Foi ele quem enviou os soldados Romanos para matá-la, os mesmos que a feriram tanto que eu tive que transformá-la. Eu ouvi tudo aquilo e minha raiva liberou meu poder. ― A boca


de Mencheres se apertou em uma linha amarga. ― Ele estava morto antes que qualquer um do meu pessoal pudesse falar algo para me impedir. ― Rosa cintilou nos olhos de Kira. ― Você estava errado em matá-lo, ― ela disse com suavidade. ― Mas você sabe disso e você cumpriu uma sentença de novecentos anos de culpa por isso. Eu acho que é punição o suficiente ― e você não é responsável pelo que Patra fez. Se essa é a desculpa que ela usou para todo o sofrimento que causou, especialmente considerando que ele tentou fazer com que ela fosse morta, então eu chamo isso de papo furado. A morte daquele homem está em suas mãos, mas tudo que ela fez está nas dela. ― Mais uma vez Mencheres se viu na rara posição de estar sem palavras. As pessoas não o amavam se o conheciam. Elas o respeitavam, eram leais a ele, o temiam, o odiavam, o invejavam, tinham desejo por ele, precisavam de coisas dele, ou sentiam uma combinação de várias dessas coisas. Mas ninguém simplesmente o amava ― especialmente ninguém como Kira. Ela escorregou as mãos pelos braços dele, se aproximando. ― Por toda sua experiência, estou achando que isso é uma coisa com a qual você não é muito familiarizado, então deixe-me ajudar, ― ela murmurou. ― Para começar, não é preciso semanas ou meses para saber que o que você sente é amor. Outra, isso é algo que mesmo com todo o seu poder, você não pode controlar. Você não tem que corresponder meus sentimentos, Mencheres, mas você não pode me convencer a mudá-los. Eu te amo. ― Seu sorriso era irônico. ― Lide com isso. ― Ela puxou a cabeça dele para baixo em seguida, sua boca se movendo sobre a dele com tanta gentileza que ele podia ter sido um humano que ela estava tentando não machucar. Ele ainda não podia reunir as palavras para responder a sua incrível declaração, mas isso... isso não requeria palavras. Ele a beijou com tudo nele que não conseguia formar em palavras, baixando a barreira que evitava que Kira sentisse suas emoções. Os braços dela se apertaram, as presas cresceram e seu corpo se moldou ao dele. Uma necessidade poderosa cresceu dentro dele, mais forte que desejo, mais profunda que possessividade. Ele deixou Kira sentir tudo isso enquanto ele rolava para cima dela, puxando os cobertos que eram a única barreira entre eles.


CAPÍTULO VINTE E CINCO. A limusine preta esperava logo a frente deles na rua em que Mencheres disse que ela estaria. Kira suspirou mentalmente em alívio. Eles estavam atrasados. Graças a Deus o amigo dele tinha esperado por eles. Ela alisou a frente de sua toga improvisada, imaginando se ela parecia tão confiante quando Mencheres parecia em sua roupa combinando. Entretanto, enquanto ele parecia ser capaz de vestir qualquer coisa, até mesmo um lençol, e manter o ar elegante, Kira tinha certeza de que ela parecia uma rejeitada de festa de fraternidade. Se eles tivessem pensado em colocar suas roupas ensopadas com água do mar na lavadora e secadora, eles teriam algo mais para vestir. Mas Mencheres provou ser insaciável, e também, para o leve espanto de Kira, ela também. Ela não estava certa se isso era devido ao seu novo vigor como uma vampira ou por Mencheres fazer amor como se ele tivesse inventado o ato. Se ela já não estivesse morta, o número de clímaxes que ele a fez chegar provavelmente a teria matado. E sentir o prazer dele ao mesmo tempo? Ela tremeu. Uma boa coisa Mencheres finalmente ter lembrado sobre o encontro. Ela não teria. Claro, aquilo significou que eles tiveram que sair às pressas e a casa, apesar de mobiliada, não tinha roupas adicionais. Kira estava prestes a colocar suas roupas molhadas e manchadas de alga quando Mencheres puxou um lençol limpo de outra cama e adaptou um sarongue para ela, fazendo um para ele mesmo com outro lençol. Graças a Deus haviam poucas pessoas nas ruas agora, menos de uma hora antes do amanhecer. A janela da limusine baixou quando eles se aproximaram, revelando um homem bonito com longo cabelo castanho e uma barba bem aparada do outro lado da janela. ― Mencheres, ― O estranho disse. ― Se alguém além de você tivesse me feito voar para o outro lado do mundo apenas para me fazer ficar esperando enquanto você estava, obviamente, se demorando na cama, eu faria meu motorista atropelá-lo. Duas vezes. ― ― Vôo longo? ― Mencheres perguntou em resposta, abrindo a porta para deixar Kira entrar. Ela prestou atenção na beirada de sua toga enquanto se sentava no assento oposto ao estranho moreno, cujo olhar se agitava sobre ela como se a estivesse medindo. ― Muito longo, ― ele respondeu. ― Eu também fui parado duas vezes no aeroporto para verificações de segurança 'aleatória'. Só porque eu tenho cabelo escuro longo e uma barba, eu sou constantemente confundido com um terrorista em potencial. Suponho que seja pior quando você voa em voo


comercial. Eles devem tentar fazer uma busca pelas cavidades do corpo todas as vezes. ― A boca de Mencheres se curvou em um sorriso enquanto ele entrava na limusine. ― Aquelas salas de procura corporal privativas fornecem uma fácil oportunidade de se alimentar. ― Então ele se sentou perto de Kira, colocando a mão em seu ombro. ― Essa é Kira Graceling. Kira, Vlad Tepesh. ― ― Uma grande honra, ― Vlad falou lentamente, estendendo uma mão marcada com uma forma de cruz que pareciam antigas cicatrizes. A testa dela franziu mesmo enquanto ela apertava a mão oferecida a ela. Aquele nome soava familiar. Aonde ela tinha ouvido antes... ― Oh! ― Kira exclamou. Seus olhos se arregalaram. ― Você não é o Drácula de verdade, é? ― ― Será que ninguém pensa em alertar as pessoas antes de me conhecerem? ― Vlad resmungou, lançando um olhar irritado a Mencheres. ― Apesar de eu suspeitar que o que fez esse detalhe escorregar de sua mente foi a mesma coisa que também o fez se atrasar. ― ― Você está sendo rude, ― Mencheres disse em um tom reprovador assim como Kira se mexeu em seu assento. Era verdade que aparecer atrasado vestindo nada mais do que lençóis não requeriam muita imaginação para descobrir o que os segurou. ― Está tudo bem, Mencheres. Apesar de que se você tivesse me dito que eu estava para encontrar tal vampiro lendário, eu teria agarrado a melhor cortina de seda para vestir ao invés disso, ― ela respondeu, encontrando o olhar verde acobreado de Vlad com uma sobrancelha arqueada. Vlad a recompensou com um sorriso instantâneo. ― Eu posso ver porque ele gosta de você. Embora, para ouvir Radje, Mencheres não apenas gosta de você. Ele está tão apaixonado que está assassinando vampiros por sua causa, desafiando as tentativas dos Guardiões em trazê-lo e no geral, agindo de forma ainda mais enlouquecida do que ele estava no início de seu relacionamento com Patra, que ela queime em paz. ― Kira dirigiu o olhar para Mencheres. Esse era um tópico embaraçoso por mais de uma razão ― e será que ninguém era sensível sobre vomitar a esposa morta de Mencheres na frente dele? ― Você sabe que eu não teria sido tão tolo a ponto de me deixar ser pego em uma gravação em um lugar que, mais tarde, eu voltaria para, supostamente, colocar fogo, ― Mencheres disse. Ah por favor, seu tom indicava uma pesada ironia.


O lábio de Vlad se contorceu. ― Não, você é muito cuidadoso sobre vídeo. Ouvi que todas as câmeras na Disneylândia foram estouradas ontem depois de um relato sobre um extremista muçulmano ter estourado as luzes e então detonado uma pequena bomba antes de escapar. ― ― Extremista muçulmano? ― Kira repetiu, seu queixo caindo. De todas as besteiras de perfil racial... ― Ninguém foi ferido, ― Vlad continuou. ― Embora as famílias que foram abaladas conseguiram um reembolso de seus bilhetes de entrada. ― ― Bones foi seguido por Executores, ― Mencheres disse, dando de ombros. ― Foi um incidente infeliz. ― Vlad resmungou de um jeito que fez Kira pensar que ele e Bones não eram próximos, mas aquilo dificilmente era sua preocupação. Uma onda de letargia se apoderou dela. O amanhecer devia estar se aproximando. Ela queria ligar para Tina antes de adormecer, mas agora não havia tempo. Isso não iria garantir a sua pobre irmã que ela estava bem se Kira desmaiasse no meio de uma frase enquanto conversava com ela. ― Vamos precisar de um lugar seguro para ficar nos próximos dias, ― Mencheres disse. ― Obviamente, todas as minhas residências seriam o primeiro lugar em que os Guardiões procurariam por mim, as casas do meu pessoal e hotéis sendo em seguida. Mas você não é da minha linha e seu pessoal temeria sua fúria mais do que a dos Guardiões caso algum deles revelasse que você estava me ajudando. ― ― Eu já escolhi um lugar para você. ― O olhar de Vlad se tornou astuto. ― Mas você deve querer mais do que isso de mim, para me fazer vir até aqui. Acomodações secretas podem ser arranjadas por telefone. ― ― Eu vou estabelecer um lugar seguro e neutro para encontrar Veritas, ― Mencheres respondeu. ― Um em que nós possamos facilmente escapar caso ela não esteja disposta a vir sozinha. Eu quero você lá como testemunha do que for dito entre nós. ― Os olhos de Vlad pareceram ganhar um tom mais verde. ― Veritas? Por que, de todos os Guardiões da Lei, você assumiria que ela seja a mais complacente a sua causa? Eu sei que vocês compartilham o mesmo criador, mas Veritas quase matou Cat por interferir em um duelo no último Outono. ― ― Eu a conheço a maior parte da minha vida, ― Mencheres respondeu. Vlad rosnou. ― Você podia dizer o mesmo sobre Radjedef. ― ― Quem é o vampiro que te criou, Mencheres? ― Kira perguntou. ― Eu vou encontrar com ele ou ela? ―


― Não desse lado da sepultura, ― Vlad murmurou. Mencheres lançou a Vlad um olhar suavemente reprovador antes de se virar para ela. ― Tenoch foi meu criador. Ele era um vampiro extremamente poderoso e respeitado e ele morreu há quase seiscentos anos atrás. ― ― Como ele morreu? ― Kira perguntou antes de se lembrar que causas naturais não seriam uma possibilidade. ― Oh, ah, não importa, ― ela gaguejou. ― Tenhoch morreu pela mesma coisa que mata a maioria dos vampiros extremamente velhos e poderosos, ― Vlad disse. ― Suicídio. ― ― Isso nunca foi provado, ― Mencheres revidou em um tom duro. ― Tenoch tinha ainda mais poder do que você, porém eu tenho que acreditar que ele foi derrubado por um mero quarteto de vampiros Mestres? ― Vlad perguntou em um tom igualmente inflexível. ― Aqueles que não conhecem os detalhes podem acreditar na mentira, mas você e eu sabemos que eram apenas quatro vampiros contra ele, não cinquenta como foi relatado. Tenoch armou para si mesmo. Se ele realmente quisesse viver, ele poderia têlos matado. Porém Tenoch estava cansado. Ele tinha perdido as âncoras que mais apreciava e que o seguravam a esse mundo, e a maioria de seu pessoal não precisava dele. Ele queria morrer. Ele apenas fez parecer um assassinato para que seu pessoal não sofresse pela culpa. ― O rosto de Mencheres estava de volta com aquela máscara impassível novamente, as paredes ao redor dele se fechando como um campo de força. ― Sinto muito por ter perguntado, vamos mudar de assunto, ― Kira disse, pensando que era cruel da parte de Vlad pressionar a questão. Se Vlad estivesse certo em sua descrição das circunstâncias, então realmente soava como se Tenoch tivesse cometido suicídio. Alguns humanos deprimidos faziam coisas similares, como apontar uma arma descarregada para um policial como forma de suicídio conhecida como Morte por Polícia. A morte era ruim o suficiente, mas suicídio acrescentava uma dor a mais para aqueles deixados para trás. Uma coisa que Tenoch aparentemente tentou evitar ao fazer sua morte parecer uma emboscada por inimigos... Seu olhar se voltou para Mencheres enquanto o terror deslizou por sua espinha. A expressão dele era impenetrável, seu olhar escuro insondável ao encontrar o dela. O armazém. Os ghouls. Eles o estavam abatendo, mas Mencheres nem tinha se movido para se defender antes de ela chegar, mesmo que ele pudesse ter matado todos eles a qualquer momento ― ― Não! ―


Kira se lançou sobre Mencheres. Ele a pegou, a segurando muito perto, mantendo os braços apertados ao redor dela. Ao mesmo tempo, ela pôde sentir o sol nascer, sugando toda sua força. Ela tentou lutar contra a influência daqueles raios, para ficar acordada tempo o suficiente para exigir saber por que ele tinha feito isso, mas mesmo antes que ela pudesse falar, a escuridão veio até ela.


CAPÍTULO VINTE E SEIS. ― Ela parece muito preocupada. ― Mencheres olhou por cima de forma recém-adormecida de Kira para encontrar o olhar firme do Vlad. ― Eu tenho que explicar algumas coisas assim que ela acordar, ― ele respondeu secamente. ― Você, explicando-se a uma vampira com menos de duas semanas de idade. ― Vlad balançou a cabeça. ― Pelo que eu vejo, Radjedef está correto em suas afirmações de que você está imprudentemente apaixonado. ― ― Isso te faz se perguntar se as outras alegações dele sobre mim são verdadeiras também? ― Mencheres desafiou. O sorriso do Vlad estava frio. ― Não. Mas eu estou me perguntando por que de repente Radje decidiu te perseguir tão brutalmente? A animosidade de vocês existe há muito tempo, mas nenhum de vocês tem agido abertamente sobre isso. Ele nem sequer apoiou a Patra durante a guerra dela contra você. Isso é o que os seus outros aliados estão se perguntando também. Por que um Guardião de repente arriscaria tudo por uma briga tão antiga? ― ― Radje não apoiou a Patra porque ela queria me matar, e ele me quer vivo, ― Mencheres respondeu, deixando a Kira mais confortável em seus braços. ― O porquê disso agora é que ele teme que se tardar, eu poderia fugir dele, levando comigo uma coisa que ninguém mais pode dar a ele durante mil anos. ― As sobrancelhas do Vlad subiram. ― E o que é isso? ― ― Meu legado de poder. ― Mencheres soltou um gemido suave. ― Muitos vampiros se enfureceram quando eu o passei ao Bones, mas nenhum deles mais do que o Radje. Ele pensa que é o poder dele, que eu injustamente roubei, mas se não fosse por mim, Tenoch teria dado a outra pessoa. Tenoch sabia que não podia confiar em Radje com um poder tão incrível sobre os vampiros. Claro, Radje não concorda com isso. ― Vlad soltou um grunhido. ― Confesso que eu fui um dos vampiros que pensou que poderia ser o beneficiário daquela herança. Afinal, você e eu éramos próximos, e eu era o último vampiro que Tenoch criou, embora ele tenha te deixado cuidando de mim, juntamente com o resto dos membros dependentes da linha dele, quando ele se suicidou poucas semanas após me criar. ― ― Eu tive orgulho de te chamar de um dos meus até que chegou o momento de você se tornar seu próprio Mestre, ― Mencheres disse em uma


voz grossa pelas memórias. ― Você sabe que eu ainda me importo com você. O destino escolheu o Bones como o meu herdeiro. Eu simplesmente obedeci a escolha dele. ― A boca do Vlad ficou tensa. ― Sim, o destino tem um senso de humor esquisito, não é? ― Então o usual sorriso cansado do Vlad voltou ao seu rosto. ― Eu não tenho queixas. Você salvou a minha sanidade mais de uma vez nos meus primeiros anos quando eu perdi a minha mulher, e em seguida o meu filho para a morte. Você sempre teve a minha lealdade e gratidão por isso. Sim, eu vou ficar como sua testemunha no seu encontro com a Veritas, espalhando por ai o que aconteceu, se for necessário. Você, no entanto, terá o trabalho mais difícil. Você terá que fazê-la vir. ― Mencheres descansou a cabeça contra o interior da limusine. Convencer a aliada membro do Conselho dos Guardiões a encontrá-lo secretamente, para que o Mencheres possa acusar outro Guardião da Lei de mentir e trair sua raça? E então se assegurar de que Veritas concorde em apenas deixá-lo partir após o encontro deles? Sim, essa parte seria um desafio.

***** Kira acordou com um espasmo afiado em seu estômago. Ela olhou ao redor, mas é claro que ela não estava mais na limusine com Mencheres e o outro vampiro infame. Na verdade, ela estava sozinha. O quarto não tinha janelas, mas era claramente um quarto, pois o fato de ela estar deitada em uma cama provava isso. Os sons em volta dela tinham um alto eco, e as paredes não pareciam gesso ou concreto. Elas pareciam rocha altamente polida, na verdade, e o ar tinha um cheiro estranho. Não desagradável, apenas desconhecido. Outro golpe em seu estômago levou a curiosidade de Kira para longe dos seus arredores. Ela não tinha comido nada desde que se alimentou daquele rapaz no passeio da Mansão Assombrada. Quase um dia atrás, seu estômago a lembrou com insistência cada vez maior. Ela se levantou da cama, notando que agora ela estava vestindo uma camisola de cetim marrom em vez do lençol amarrado na cintura. Mencheres deve ter mudado suas roupas, mas agora ele não estava em nenhum lugar à vista. Kira fez uma rápida inspeção do quarto, que felizmente tinha um armário antigo no canto, com roupas masculinas e femininas. Ela vestiu um casaco de lã e calças com um pedido mental de desculpas a quem quer que as roupas pertencessem, mas aquele estrondo em seu estômago estava começando a ficar sinistro.


Uma vez vestida, ela deixou o quarto em busca do Mencheres. Para sua surpresa, o corredor em que ela entrou era muito alto, com mais daquelas paredes estranhas ao redor. Ela passou mais três portas no seu caminho para o início do que parecia ser uma escadaria estreita. Quando ela começou a descer, Kira encarou. A escadaria era de pedra polida, cortada em degraus, e ela levava à uma sala impossivelmente grande, com um enorme teto convexo. Ainda assim, nem uma única janela estava à vista, e aquelas paredes cinzentas brilhantes estavam por todos os lados. ― Ah, você está acordada, ― uma voz com um leve sotaque disse em algum lugar fora do seu campo de visão. Kira entrou mais na sala, desapontada por aquela voz não pertencer ao Mencheres. Vlad estava sentado em um dos três conjuntos de sofás na sala enorme, um notebook aberto na frente dele, sua mão vagarosamente acariciando a barba do seu queixo. ― Mencheres está aqui? ― Kira perguntou, aquela questão mais urgente para ela do que até mesmo os dolorosos ruídos começando a crescer em seu estômago. ― Não, mas ele deve retornar em breve. Você levantou mais cedo do que esperávamos. O Sol ainda vai levar duas horas para se pôr. Com fome? ― Uma pontada de dor passou por ela, ao mesmo tempo em que ela conseguia dizer: ― Um pouco, ― num tom que não estava tremendo. ― Sem problema, vou mandar alguém até você, ― ele respondeu. Alguém? ― Hum, se você tiver algum sangue ensacado, seria melhor. ― Vlad soltou uma risada curta. ― Sangue ensacado? Você ainda não tirou as rodinhas laterais? Claro, quando eu fui transformado, não havia nenhum sangue ensacado. Criminosos ou soldados inimigos eram jogados entre os novos vampiros durante aqueles primeiros dias. ― Aquilo apenas mostrou quão faminta ela estava, já que tal imagem mental não arruinou o seu apetite. ― Se eu puder evitar tratar pessoas como comida, essa é a minha escolha, ― ela respondeu, irritando-se um pouco com o comentário sobre as ‘rodinhas laterais’. O olhar indiferente do Vlad a examinou. ― Você acha que está honrando os humanos por não se alimentar deles, mas você na verdade está ferindo eles. O sangue animal não será suficiente em longo prazo, e o suprimento de sangue está sempre baixo, porque os humanos não doam o suficiente. Aqueles sacos que você bebe podem significar a diferença entre a vida e a morte para alguns humanos em uma sala de emergência, e se você os tiver, eles não terão. ―


Ele enfatizou as três últimas palavras erguendo desafiadoramente a sobrancelha. Kira se encontrou pensando que todos os atores que representaram o Drácula no cinema tinham errado. Vlad não era um cara com um elegante rosto pálido e com um sotaque Euro-lixo, nem era um aristocrata velho com garras e uma aparência monstruosa. Não, Vlad era um homem notável, com cerca de trinta anos e uma presença convincente que tinha uma visão brutalmente honesta sobre as coisas. Uma que ele não tinha vergonha de compartilhar, ao que parecia. E ele tinha razão. Suas preferências de alimentação não devem pôr ninguém em perigo, e se ela manter sua dieta limitada a bolsas de plasma, elas iriam. ― Você está certo, ― ela disse. ― Eu gostaria que você enviasse quem quer que você tenha como doador, então. Eu estou com tanta fome que isso está começando a me preocupar. ― Ele sorriu, fazendo aqueles severos traços ficarem repentinamente charmosos. ― Claro. ― Então ele falou em seu celular, pedindo a alguém chamado Mordred para ‘enviar o Lewis para cima.’ Kira permanecia onde estava, insegura. Ela devia se sentar? Ou havia uma sala especial em que ela devia se alimentar? A cozinha parecia a escolha óbvia, mas nesse estranho esconderijo de vampiro sem janelas, com paredes de pedra, pisos, e ecos, quem sabia se havia uma cozinha? ― Estamos no subsolo? ― Ela Perguntou. ― Não exatamente. Nós estamos no lado de uma montanha. Isto costumava ser uma antiga estação de mineração, mas está deserta há muito tempo. Eu reformei há algumas décadas para um ambiente mais confortável, e ainda assim privado. ― Se ainda houvesse túneis abandonados da mina debaixo deles, isso explicaria os ecos. ― Onde Mencheres foi? ― ― Fazer uma ligação importante. Ele não pode usar o meu celular, ou então a nossa localização será facilmente rastreada, por causa da pessoa para quem ele vai ligar. ― É verdade, Mencheres queria se encontrar com a outra Guardiã da Lei, aquela com o nome em latim para a verdade: Veritas. Com sorte, Veritas faria jus ao seu nome e não tentaria emboscar o Mencheres se ela concordar em uma reunião. Kira se perguntou se o outro motivo por Mencheres não estar aqui ainda era porque ele estava enrolando. Ela não tinha intenção de simplesmente esquecer o fato de que ele teria tentado cometer o suicídio-por-ghouls.


Um jovem de cabelos marrom dourados entrou na sala do lado oposto que Kira havia entrado. Ele se curvou para o Vlad, o que lhe pareceu estranho, então ele se ajoelhou. ― Não eu, Lewis. Ela, ― Vlad disse, com um aceno descuidado para Kira. ― Você já fez isso antes? ― Ela assumiu que a pergunta era para ela, já que Lewis parecia um profissional. ― Uma vez. ― ― Use a mão, então. Menos chance de erro lá. ― Mesma coisa que o Mencheres me disse, Kira pensou ironicamente. Tudo isso era do Vampiro 101? Se for assim, o que havia nos Cursos Avançados de Vampiro? Lewis sorriu para ela enquanto se aproximava, estendendo a mão. Kira olhou ao redor. O chão era de pedra, então ela não arruinaria nada, se ela derramar algumas gotas. ― Vamos, um, sentar-nos, ― ela disse. Vlad apenas assistiu do seu lugar no sofá, diversão decorando seus traços definidos. Kira ajeitou os ombros. Ela poderia fazer isso sozinha. Não se preocupe. ― Você quer ser apagado primeiro? ― Ela perguntou ao Lewis enquanto eles se sentavam. ― Huh? ― Ele respondeu, confuso. Algo como uma tosse saiu do Vlad, que ergueu a cabeça. Vampiros não precisam tossir. Isso foi um riso abafado? ― Você sabe. ― Os olhos de Kira brilharam verde para o Lewis, e suas presas pareceram saltar das suas gengivas. ― Ser hipnotizado para você não sentir ou se lembrar disso. ― Lewis pareceu ainda mais confuso. ― Se é isso que você quer. ― Eu não vou pedir ajuda ao Drácula, ela jurou para si mesma. Eu não vou. ― Yeah, eu me sentiria melhor sobre isso. Então, ah… olhe nos meus olhos. ― Outro som estrangulado veio da direção do Vlad. Agora Kira tinha certeza que era uma risada. Ela decidiu ignorá-lo. Lewis obedientemente a encarou, e Kira tentou fazer a sua voz soar confiante. ― Você não sente nada. Você não está com medo. ―


― Eu estou, ― foi a resposta imediata do Vlad. ― Se você contar para ele em seguida que os lobos são os filhos da noite,15 eu poderia me machucar de tanto rir. ― ― Eu estou tentando me concentrar, ― ela cerrou os dentes, aquelas dores dentro dela piorando. Então, tão delicadamente quanto pôde, ela levou a mão do Lewis à boca, procurando a mesma veia pulsante, entre o polegar e o pulso, que ela tinha mordido ontem. Suas presas quase doíam com a necessidade enquanto ela lentamente as deslizava lá dentro, um pequeno gemido escapou dela quando a primeira gota quente encontrou a sua língua. Kira esqueceu o Vlad depois disso. Esquecida de tudo, exceto a felicidade controlada da alimentação, sem danificar a frágil mão que segurava. Quando sua fome diminuiu, ela percebeu que seus olhos tinham fechado em prazer… e quando ela os abriu, Mencheres estava na sala.

***** Mencheres entrou em silêncio, sabendo o que estava acontecendo antes de ver Kira. Embora a entrada da casa fosse quase impossível de ver do lado de fora da montanha, uma vez lá dentro, as vozes ecoavam. Então ele a assistiu se alimentar de um humano com uma mistura de orgulho e excitação. A expressão dela era tão sensual quanto a sua alimentação ― e sua viagem ao hospital para garantir essas três bolsas de sangue não foi necessária, ao que parecia. Então os olhos dela se abriram e se fixaram direto nos dele. Por um momento, ele sentiu como se todos os outros na sala desaparecessem. Se eles estivessem verdadeiramente sozinhos, ele teria se jogado em cima dela e a beijado até as unhas dela cavarem deliciosamente profundo em suas costas. Seu poder serpenteava dentro dele, querendo tocá-la também. Tudo sobre a Kira o fazia despertar. Ele só esteve afastado dela por algumas horas, ainda assim aquele tempo rastejou e queimou em seu subconsciente, até ser quase doloroso. Ela afastou a boca da mão do macho, fechando os buracos como ele tinha mostrado a ela antes que mais do que as duas gotas livres caíssem no chão. Então ela levantou, vindo na direção dele com seu olhar ainda verde deslumbrante. ― Antes que vocês dois cheguem muito longe, o que Veritas disse? ― Vlad perguntou.

15

Frase de um filme antigo do Drácula.


Mencheres balançou a cabeça para limpar as imagens de todas as maneiras diferentes que ele iria ter a Kira, tão logo ele a tivesse de volta ao quarto. ― Ela virá, ― ele respondeu brevemente. ― Amanhã. ― ― À tarde ou à noite, certo? ― Kira perguntou, sua expressão sensual sendo substituída por uma de teimosia. ― Não de manhã? ― Ele sorriu levemente. ― Não, não de manhã. ― Como se ele não tivesse previsto aquele argumento. ― Bom. ― A expressão dela não mudou, entretanto. ― Eu vou tomar um banho. E então, depois disso, Mencheres, nós precisamos conversar. ― Ficou claro pelo tom dela, cheiro e linguagem corporal que ele não foi convidado para participar de suas atividades no banheiro dessa vez. Ele não estava surpreso. Ele sabia que ela iria confrontá-lo sobre os ghouls. Ele apenas esperava que o Vlad possa não estar ao alcance da voz quando ela fizer. Ele imaginava que isso não importava. Quaisquer que seus planos fossem antes do fim da sua vida, eles mudaram. Ele teria que ser forçado a entrar na sepultura agora ao invés de abraçar isso, como ele pretendia antes. Morte significa separação da Kira, algo deplorável para ele. Isso pode vir em breve, independentemente, mas não mais com a sua ajuda. Kira saiu da sala depois de murmurar um ‘obrigada’ ao jovem, que se curvou diante do Vlad antes de se afastar. Mencheres trocou um longo olhar com Vlad. Seu amigo tinha uma curva compreensiva nos seus lábios. ― Pelos sons disso, você está em apuros, ― Vlad falou lentamente. Ele deu de ombros. ― Eu previ isso. ―


CAPÍTULO VINTE E SETE. Mencheres esperou no quarto em que tinha deixado Kira dormindo horas antes. Mesmo que a casa escondida dentro da montanha fosse extremamente espaçosa, só tinha um chuveiro, a água bombeada de um interior bem mais profundo na parte de trás da moradia. O chuveiro era no nível mais baixo e os sons eram fracos, mas ele ouviu Kira terminar há 10 minutos atrás, porém ela ainda não estava de volta. Depois de outros 10 minutos, Kira apareceu, vestida novamente no mesmo suéter e calças que ela tinha vestido antes, o cabelo ainda úmido. Ela lhe um olhar longo e medido antes de sentar na cama e então disse uma palavra. ― Por que? ― Ele não se importou em fingir ignorância sobre o que ela estava perguntando. ― Por muitas das mesmas razões que meu criador teve, eu imagino. Minha linha não precisava mais de mim com meu co-regente para cuidar dela, Radje começou a querer começar outra briga e eu estava cansado. Além disso, minhas visões do futuro desapareceram exceto para mostrar a escuridão se aproximando, então eu sabia que meu fim estava perto. Eu decidi encontrar esse fim mais cedo do que mais tarde, antes que Radje fizesse aparecer acusações contra mim que fariam meu co-regente cair na rede também. ― Kira continuou o encarando. ― Você esqueceu de mencionar que você estava retorcido de culpa sobre a morte de sua esposa. ― Ele sorriu fracamente. ― Na verdade eu não percebi isso até recentemente, mas sim. Isso também é verdade. ― Ela baixou o olhar. ― Eu arruinei seus planos, não foi? Eu fui de encontro ao armazém, então você salvou nós dois ao invés de deixar os ghouls terminarem o serviço. Depois daquela semana em que estivemos juntos e você me deixou ir... você estava planejando deixar alguém te matar de novo? ― Abaixo deles, Mencheres ouviu Vlad rosnar um palavrão, mas ele o ignorou e manteve a atenção em Kira. ― Sim. Eu ainda pretendia, assim que outra oportunidade aparecesse. ― Um tremor passou por ela, mas ela manteve a cabeça abaixada, olhando para a parte do cobertor que ela amassava e desamassava na mão. No andar abaixo deles, algo quebrou contra uma parede. Nenhum deles reagiu a isso.


― E agora? ― ela perguntou, sua voz tão macia que ele mal podia ouvila. Ele esperou para ir até ela. Para pressioná-la a ele e prometer que eles nunca iriam se separar, mas isso seria uma mentira. Ao invés disso, ele deu a Kira a mesma honestidade sincera que ela mostrou a ele durante o tempo em que passaram juntos. ― Não, eu não quero morrer agora, mas a morte vem para mim sem levar isso em consideração. Eu te disse antes que eu não ia ficar muito tempo nessa terra, Kira. E não é por escolha, mas meu destino permanece o mesmo. ― A cabeça dela se ergueu rapidamente ao ouvir isso, seus olhos brilhando com lágrimas cor de rosa não derramadas. ― Papo furado. Eu não acredito que você esteja destinado a morrer mais do que qualquer outra pessoa esteja. ― Ele estava acostumado com suas visões sendo questionadas. Poucos acreditavam nelas até que tivessem as visto acontecer, e mesmo assim, alguns ainda duvidavam. ― Minhas visões nunca estão erradas. ― Com que frequência ele desejou que elas estivessem. ― Você já ouviu sobre profecia auto-realizável? ― ela perguntou, pulando da cama para ficar em pé na frente dele. ― É quando pessoas acreditam tão profundamente em algo que eles fazem coisas para fazê-la acontecer. Talvez você viu essa escuridão no seu futuro porque alguma parte de você já decidiu jogar a toalha, mas sua consciência não tomou conhecimento dessa decisão ainda. Então quando você olhou, você viu morte em seu futuro porque, subconscientemente, você já decidiu se matar. ― Ele balançou a cabeça. ― Eu olhei novamente depois que eu quis viver. Nada mudou. A escuridão ainda estava lá, ainda mais perto dessa vez. ― ― Mas isso não significa que seja inevitável. Ok, você mudou de ideia sobre se matar, mas porque você viu a morte quando você olhou antes, você está esperando vê-la novamente. E então você vê, e ai nem se importa em lutar para viver, fazendo a morte muito mais fácil de chegar até você quando Radje fizer alguma coisa. É apenas mais da mesma profecia auto realizável que você precisa enxotar, droga! ― Mencheres quase sorriu. Ninguém já tinha dito a ele para enxotar suas visões antes. ― Eu gostaria que fosse simples assim. ― ― É. ― Ela cruzou os braços. ― Você confia cegamente em suas visões, mas quando você perdeu a habilidade de ver fora a escuridão da qual


você está falando? Há alguma outra coisa que pode estar acontecendo. Culpa de sobrevivente. Você está todo bagunçado por causa do que aconteceu com sua esposa. Você se culpa por cada morte que ela causou e mais a sua parte na morte dela, então você pode não ver um futuro para si porque você não acredita que mereça um. ― ― Minhas visões não podem ser alteradas devido a estresse emocional, ― ele respondeu. ― Quem disse? ― Kira respondeu bruscamente. ― Apenas porque nunca aconteceu antes, não torna impossível. Depois que Pete morreu, eu fui a sessões de terapia em grupo para ajudar a lidar com o que aconteceu. Um cara cuja família morreu em um acidente de carro depois que outro carro passou em um sinal fechado de repente não podia ver mais a cor vermelha. Simplesmente não podia ver! E você ainda se culpa por, provavelmente, dúzias de assassinatos que sua esposa cometeu, mais a morte dela, porém você não acha que isso poderia congelar ou alterar suas visões? A mente é uma coisa extremamente poderosa, e quando é paralisada por sofrimento ou culpa, ela pode bagunçar quase tudo. ― ― Kira... ― Mencheres não sabia o que dizer. Ele esperava alguma forma de negação da parte dela sobre o destino dele. Tristeza também, mas esse franco desafio de que o que ele tinha visto não ia acontecer era um tanto surpreendente. ― Você passou pelo inferno, ― ela continuou naquele mesmo tom teimoso. ― Eu tenho certeza de que eu nem sei a metade disso, mas eu sei que isso teria despedaçado a maioria das pessoas. Quase despedaçou você também, porque você ia se matar, mas estou te dizendo que você não está condenado a morrer logo. Eu sentiria isso se você estivesse, do mesmo jeito que fiz com Pete, Tina, minha mãe e até eu mesma naquela noite com Radje. Porém, todos os meus instintos estão me dizendo que você e eu somos a longo prazo, o que significa que você estará por perto. Não importa qual escuridão você esteja vendo agora. ― Ela quase o fez ficar sem palavras novamente. Kira mal tinha 30 anos de idade. Como ela podia achar que seus instintos eram mais acurados do que mais de quatro mil anos de suas visões? ― Eu nunca estive errado antes, ― ele disse. ― Nunca. ― ― Então essa será sua primeira vez, ― ela respondeu, tocando o rosto dele. ― Ou você vai perceber que interpretou mal o que viu. Eu estou certa, Mencheres. Eu sei disso com toda minha alma. Do mesmo jeito que eu sei que você me ama, mesmo que você esteja tendo problemas em dizer. ―


Por um longo momento, ele só pôde encará-la, capturado por seu olhar verde claro como se ele fosse um humano enlaçado pelo brilho hipnótico de um vampiro. Algo se libertou dentro dele, uma pressão liberada que ele não sabia que tinha construído, e o alívio que ele sentiu só era combinado pela certeza fluindo através dele de que ela estava certa ― ― sobre parte do que ela disse. ― Eu realmente amo você, ― ele disse roucamente, as palavras não eram uma representação adequada do que ele sentia por Kira. Ela era tudo que faltava em sua vida, tudo que o fazia querer dizer essa palavra dura e implacável que, de alguma forma, era bonita mais uma vez por causa dela. Ela sorriu, o impressionando com a alegria que tal gesto podia gerar dentro dele. ― Você vê? Eu te disse que eu estava certa. ― ― Isso não significa… ― ― Shhh, ― ela contestou, colocando o dedo nos lábios dele. Ele não pôde evitar sentir divertimento. Ninguém tinha o feito ficar em silêncio com um ‘shhh’ em milhares de anos, porém Kira o fez sem a menor hesitação. ― Eu não quero você olhando o futuro de novo, ― ela prosseguiu. ― Não ainda. Você é um vampiro super poderoso, mas você não é um deus. Até você trabalhar as coisas que te fizeram sentir que seria melhor estar morto, todas elas, você não pode confiar no que acha que está vendo. ― Ele ainda não achava que Kira estava certa sobre profecias autorealizáveis, culpa de sobrevivente ou má interpretação quando se tratava de sua visão de morte iminente, mas ele estava disposto a prestar atenção no conselho dela. Afinal de contas, suas visões pararam abruptamente depois da morte de Patra. Ele pode ser muito mais forte do que Kira em nível de poder, mas emocionalmente, ela pisava em chão mais firme. Os eventos nos últimos anos tinham provado muito a ele. Ele tinha procurado a própria morte ― algo que ele jurou que nunca faria depois da dor de descobrir o suicídio de Tenoch, porém ele quase seguiu os passos de seu criador. Somente a bela e incrível mulher na frente dele evitou isso quando seu caminho se cruzou com o dele naquela manhã. Destino. Seria possível o seu não ser somente escuridão afinal de contas? ― Diga-me novamente qual era o credo do seu mentor? ― ele pediu, apesar de lembrar a sua resposta de antes. ― Salve uma vida, ― Kira disse suavemente. Mencheres a puxou para seus braços. ― Você fez, ― ele sussurrou antes de sua boca exigir a dela. ― Você salvou a minha. ―


***** Kira escorregou uma mão preguiçosa ao longo das costas dele, seu toque o estimulando apesar das últimas várias horas apaixonadas. ― Essa é uma tatuagem bem interessante. O que é? ― ― Um shenu,16 ele respondeu, rolando de lado para olhar para ela de frente. ― A palavra moderna é ‘cartucho’ ― Ela ainda traçou a tatuagem apesar de não ser capaz de vê-la mais. ― O que ela diz? ― ― É meu nome de nascimento, Menkaure, na antiga escrita egípcia. ― O rosto dela ficou perturbado. ― É disso que Radje te chama. ― Ele a acariciou desde a perna nua até a parte inferior das costas, e a expressão dela relaxou mais uma vez. ― Seu nome foi dado por causa daquele Faraó? ― ela perguntou A mão dele parou. ― O que você sabe daquele Faraó? ― ― Quando eu estava te procurando depois que você hipnotizou meu chefe, eu procurei no Google 'Mencheres', achando que poderia me levar até você na chance improvável de que você tivesse uma página no Facebook ou alguma coisa. ― Kira fez uma pausa para dar risada. ― Você não tinha, claro. Tudo aquilo que apareceu sob seu nome eram links e artigos sobre um Faraó de tempos atrás que também era chamado de Mencheres, mas ele passou por Menkaure a maior parte do tempo. ― Ela lhe lançou um olhar curioso. ― Você foi um descendente dele? Por isso que você pegou um de seus nomes? ― Ele saiu da cama, ficando de pé na frente dela. Era a hora de ela saber tudo sobre ele, até mesmo as partes mais antigas de seu passado. ― Menkaure tinha muitos nomes dependendo da tradução. Mycerinus, Mykerinus e Mencheres, entre outros. Eu recebi essa tatuagem no primeiro dia a ser nomeado para meu reinado quando eu tinha 22 anos de idade, apenas seis meses antes de eu me tornar um vampiro. Eu não sou um dos descendentes daquele Faraó sobre o qual você leu. Eu sou aquele Faraó. Eu apenas usei o nome Mencheres depois que deixei o Egito. ― A boca de Kira se abriu e fechou, como se ela, de repente, tivesse esquecido como falar. Ele esperou. Depois de tudo que ela tinha passado, ele não temia que essa revelação fosse muito para ela.

16

Moldura decorativa arredondada ou elíptica com o nome de um deus ou rei, na Egiptologia.


― Mas aquele Faraó era de muito, muito, muito tempo atrás, nos tempos antigos. Ele tem uma pirâmide no Platô de Giza. Aquele não pode ser você! Você disse que era mais velho do que poeira, mas… ― ― Eu nasci em 2553 a.C., ― ele respondeu, observando sua expressão passar rapidamente de negação para confusão e para espanto. ― Eu te disse que Radje e eu viemos de uma linhagem de governantes que designavam um sistema para seus herdeiros reinarem sobre seus assuntos humanos. Aquela foi a linhagem dos Faraós da primeira dinastia até a décima terceira. Radje e eu estávamos na Quarta Dinastia. Radje é o diminutivo para Radjedef, como você sabe, mas Radjedef era geralmente mais conhecido como Djedefre na história do Egito. Ele era o meio irmão de Khafre, meu pai. Meu pai e Radjedef eram os filhos de Khufu, o Faraó que construiu a Grande Pirâmide no Egito. ― Kira ainda não parecia ter absorvido adequadamente essa informação. ― Radje é seu tio? E você e sua família fizeram as pirâmides? As pirâmides? ― Ele deu de ombros. ― Elas foram designadas para os Faraós afastados viverem com conforto entre seu povo, dado como morto enquanto um novo Faraó reinava. Mas elas eram muito dispendiosas. Nossos herdeiros, mais tarde, fizeram o Vale dos Reis como uma solução mais eficiente. Todas as passagens subterrâneas e os túneis conectados. ― ― Você percebe que isso é um pouco demais para assimilar, ― ela interrompeu, balançando a cabeça. Mencheres ergueu uma sobrancelha. ― Um mês atrás, você não acreditava em vampiros. Agora você é uma, além de ser amante de outro vampiro, e você está escondida na casa da montanha de um dos vampiros mais famosos da ficção. Eu tenho plena confiança de que você vai lidar com essa última revelação com a mínima dificuldade. ― Ela ainda balançou a cabeça, mas a descrença deixou sua expressão. ― Mais velho do que a poeira, ― ela murmurou. ― Quem diria que você estava exagerando para menos? ― Ele foi até o pé da cama, lentamente engatinhando de volta enquanto escorregava seu corpo sobre o de Kira dos pés até o peito dela. Quando seus rostos estavam alinhados, ele parou, deixando sua aura, assim como sua pele, a acariciar. ― Eu pareço muito velho para você agora? ― ele murmurou. ― Muito diferente da pessoa que você amava antes de saber disso? ― Os olhos dela já estavam brilhando verdes e seus lábios carnudos se entreabriram. ― Não, você não parece muito velho. ― A voz dela era rouca. ― Ou muito diferente. Você parece meu. Quem quer que você era, quem quer que você seja... você é meu. ―


Mencheres sorriu, suas presas se alongando completamente. ― Assim você falou, então será decretado. Por toda a eternidade. ―


CAPÍTULO VINTE E OITO. O Grand Canyon estava brilhante e cheio de cores com os raios do pôrdo-sol. Cor de ferrugem, laranja, vermelho escuro, azul e prata pareciam se intercalar em um mural sem fim que era inspirador. Se Kira não estivesse tão preocupada com o que a próxima hora podia trazer, ela teria ficado girando em círculos para tentar memorizar a toda a beleza impressionante ao redor dela. Mas, claro, essa não era uma viagem de excursão, mesmo que eles estivessem em uma das atrações turísticas mais visitadas da América. O Grand Canyon também era um bom lugar caso eles precisassem correr por suas vidas. As várias cavernas, fendas e esconderijos só eram superados pela grandeza do desfiladeiro. Qualquer aspirante a Guardião da Lei ou Executores não saberiam se procuravam por eles nos céus ou abaixo, assim foi o que Mencheres tinha explicado. Kira estava de pé entre Vlad e Mencheres, a brisa colorindo a fragrância natural do ar com os diferentes aromas emanando dos dois vampiros. Uma mistura de sândalo e especiarias escuras de Mencheres era intercalada com os aromas mais incomuns de canela e... fumaça de Vlad. ― Olhe, ― Mencheres disse, apontando para o sul. Ela fixou o olhar naquela direção, mas tudo que viu foi uma adolescente caminhando por uma trilha a uns duzentos metros abaixo de onde eles estavam. Ela deve estar a frente do seu grupo de turistas, apesar de que Kira ficou surpresa de que passeios acontecessem a noite. Talvez ela devesse ir lá embaixo e hipnotizar o grupo para voltar de onde estavam vindo, para que não houvesse nenhum espectador humano inocente que pudesse se ferir caso as coisas ficassem feias com a Guardiã da Lei ― ― Mencheres, ― a adolescente gritou. ― Vim sozinha como prometi. ― ― Aquela é Veritas? ― Kira falou como se tivesse acabado de descobrir um segredo. A poderosa Guardiã da Lei de quem Mencheres e Vlad tinham falado com tons tão cautelosos? Ela nem parecia ter idade suficiente para dirigir um carro! A jovem e bonita loira olhou direto para ela e mesmo com a distância, Kira pôde ver um brilho verde nos olhos dela. Não era humana, sem dúvida. Vlad nivelou o olhar com o de Kira. ― Você vai aprender rapidamente que as aparências são o jeito mais incerto de julgar alguém no nosso mundo. Como por exemplo, eu. ―


Ele ergueu a mão para Veritas, e a mão explodiu em chamas azuis. Os olhos de Kira se arregalaram. Nem os dedos de Vlad e nem a palma da mão mostravam o menor sinal de queimadura. As chamas envolviam a manga da camisa, mas de alguma forma aquele material não pegou fogo. Então quando Vlad abaixou a mão, as chamas imediatamente se apagaram sem nem uma faísca ou cabelo chamuscado para contar história. ― Agora eu sei por que você cheira a fumaça o tempo todo, ― Kira murmurou, acrescentando pirocinese a sua lista mental de habilidades que alguns vampiros eram capazes de manifestar. ― Veritas, ― Mencheres gritou. ― Eu agradeço por vir. ― A voz dele era calma e confiante, mas Kira sentiu a tensão de Mencheres arranhando seu subconsciente. Ele estava preparado para um ataque, pronto para fazê-la sair do caminho ao menor indício de uma emboscada. A Guardiã loira aumentou o ritmo enquanto vinha na direção deles, agora se movendo com uma graça e velocidade pelo caminho íngreme que era óbvio que ela não era humana. Quando ela estava há uns quinze metros, Kira pôde sentir a energia crepitando para fora dela. Poder que ela só tinha sentido até agora em tal magnitude em Mencheres. ― Você tem uma hora para defender seu caso, Mencheres, ― Veritas disse com um tom afiado. ― Essa é toda a generosidade que a memória de nosso criador e nossa longa parceria irão comprar para você. ― Isso não soa promissor, Kira pensou. As feições de Barbie de Veritas eram uma máscara de raiva, e a energia serpenteando ao redor dela era distintamente desagradável. Mencheres não estava intimidado pela atitude da Guardiã da Lei. Ele curvou a cabeça de um jeito respeitoso e prosseguiu detalhando em termos eloquentes e convincentes como ele estava em Wyoming com Kira e Gorgon enquanto ocorriam o incêndio no clube e os assassinatos. Ele contou a Veritas que ela podia puxar seus registos do telefone celular para determinar que as chamadas foram feitas de Wyoming, não Chicago, e que ele nunca deixaria para trás evidências da existência de sua raça para os humanos encontrarem, como foi provado quando ele destruiu as câmeras da Disneylândia. Ele encerrou com desculpas por derrubar os Executores, mas disse que sentiu que era o único jeito de proteger Kira dos propósitos corruptos de Radje mais tarde. Kira quase quis aplaudir quando ele terminou. Se isso fosse um discurso de campanha, ele teria ganho cada voto. Exceto um.


― E você se desculpa por ter matado um Executor também? Ou isso era, também, indigno de sua observação em seu zelo para defender sua nova amante? ― Veritas quase cuspiu em Mencheres. A expressão dele escureceu. ― Qual Executor? Eu não matei nenhum deles. ― ― Josephus o perseguiu pelos céus junto de outros seis, mas, mais tarde, ele foi encontrado morto no chão, ― Veritas respondeu. Seu olhar o sondou. ― Você é acusado de matar um Executor Guardião. Nem mesmo seus muitos aliados serão capazes de influenciar o conselho a ter misericórdia, não importa o quanto eles sejam poderosos. ― Ela lançou um olhar mordaz para Vlad quando fez esse comentário, mas Kira estava ultrajada demais para ficar em silêncio. ― Kira... ― Mencheres começou. ― É verdade, ― ela contestou, mais para Veritas do que para ele. A expressão da loira não mudou, mas Kira não deixou que isso a parasse. Ela estava farta de pessoas assumindo que Mencheres fez coisas horríveis sem nem uma vez se importar em considerar que outra pessoa possa estar envolvida. ― Deixe-me adivinhar, você acredita na alegação de Radje de que Mencheres fez todas essas coisas porque ele perdeu a cabeça por minha causa, certo? E eu sou apenas uma cadela maligna que gosta de incitá-lo a matar? Alguém poderia pelo menos me conhecer antes de pensar isso? Eu pensei que o sistema judicial humano era confuso, às vezes, mas seu sistema de vampiros é pior. Pelo menos nós temos inocente até que se prove culpado. Não culpado e sentenciado antes de nem ao menos se incomodar em olhar todos os fatos. ― ― Kira! ― A voz de Mencheres era mais dura. ― Você ousa insultar as leis? ― Veritas exigiu, esticando a mão para Mencheres depois de parecer que ele simplesmente lançou uma mordaça invisível na boca de Kira. ― Não interfira. Deixe-a falar, ou saia agora, ― Veritas rosnou. Os lábios de Kira foram liberados da repentina imobilidade. Ela lançou a Mencheres um único olhar seco que prometia severas consequências se ele fizesse isso de novo, então dirigiu-se a fumegante Guardiã da Lei. ― Eu sou totalmente a favor de suas leis para buscar justiça contra quem quer que tenha matado aquele Executor e vazado o vídeo, mas eu tenho que dizer que não estou impressionada com o pouco trabalho investigativo que tem sido feito. Radje diz que Mencheres incendiou aquele clube, então as pessoas


simplesmente acreditam, não importa que eu estava louca pelo desejo de sangue naqueles primeiros dias e Mencheres estava ocupado cuidando de mim. Então um Executor termina morto depois de perseguir Mencheres, então obviamente, Mencheres o matou. Nenhuma outra explicação é considerada mesmo porque, se a sentença é tão severa por uma morte, por que Mencheres não matou todos? Isso não faz sentido, especialmente se você acredita que ele se tornou, de repente, abalado por uma mulher que gosta que ele mate pessoas por ela, como Radje continua alegando. ― Veritas pegou Kira pelo colarinho, seus olhos azul cor do mar perfurando os dela. ― Talvez Mencheres agiu sem o seu conhecimento. Talvez ele te forçou a participar. Somente nesse momento eu estou te oferecendo a chance de admitir a verdade sem medo de perseguição. Você tem a palavra de uma Guardiã de que você não será acusada. Mencheres fez essas coisas? Ou ele saiu do seu lado durante a noite do incêndio ou depois que os Executores os perseguiram, para ser capaz de cometer esses crimes? ― ― Não para todas as perguntas, ― Kira respondeu firmemente. ― Não foi ele. ― O olhar de Veritas ainda alfinetava o dela. ― Você está disposta a jurar por seu sangue de que ele é inocente? De pagar com sua própria vida se ele for considerado culpado de cometer ao menos um desses atos? ― ― Sim, ― Kira disse, mesmo enquanto Mencheres explodia, ― Ela não foi acusada de nada, você não pode esperar que ela pague com a vida baseada na decisão do conselho sobre mim! ― ― Posso, ― Veritas disse, libertando Kira. ― E eu vou repetir os votos dela ao conselho assim que eu retornar, então se você tem culpa para confessar, Mencheres, e você quer poupá-la, faça isso agora. ― Mencheres lançou um olhar tão atormentado a Kira que o medo deslizou por sua espinha. Ele não iria confessar algo que não tinha feito, ia? Claro que não. Ele estaria se condenando a morte apenas no mero acaso de que os outros Guardiões decidiriam contra ele... ― Não, ― ela engasgou, segurando os braços dele. ― Eu sei que você acha que vai morrer de qualquer jeito, mas suas visões estão erradas, Mencheres! Elas estão paralisadas e retorcidas pela culpa que você sente por coisas que nem ao menos foram sua culpa. Esse não é o único jeito que você pode me salvar. Vamos, se Veritas não suspeitasse, de alguma forma, que algo mais estava acontecendo, ela não teria aparecido aqui. Você não fez nada disso! Não ouse dizer que fez! ―


Lágrimas escorriam de seus olhos e ela o apertou com mais força até ouvir ossos estalarem nos braços dele, mas o medo a fez incapaz de soltar. Mencheres estava para escorregar de suas mãos para sempre, ela podia sentir isso. ― Não confie no que aquelas malditas visões dizem, ― ela sussurrou. ― Confie em mim. Nós podemos derrotar Radje de outro jeito, eu sei disso. Deixe-me provar para você. ― Os olhos dele, tão escuros e insondáveis, olharam fixamente nos dela. Muito delicadamente ele pegou suas mãos e as tirou de seus braços com um movimento de seu poder. Então ele as trouxe para os lábios. ― Eu te amo, ― ele respirou contra a pele dela. ― Não, por favor, ― ela implorou, o pânico aumentando dentro dela enquanto lágrimas continuavam a escorrer por suas bochechas. Mencheres olhou para Veritas atrás de Kira. ― Eu não tenho nada a ver com o incêndio, as mortes daquelas pessoas ou a morte do Executor, ― ele disse em um tom claro. ― A mesma pessoa que me acusa é o responsável. Radjedef. ― O alívio inundou Kira de uma maneira tão forte que ela pensou que seus joelhos fossem ceder. Todos os seus instintos gritavam que Mencheres tinha estado a pouco de assumir toda a culpa. Parte dela queria jogar os braços ao redor dele enquanto a outra parte queria estapeá-lo por quase fazer algo tão generosamente e letalmente estúpido. ― Nunca mais me assuste assim de novo, ― ela ordenou com a voz trêmula. A boca dele se curvou em um sorriso amargo. ― Ao invés disso, eu me apavorei. ― Kira sabia o que ele queria dizer, mas ela acreditou em tudo que ela disse sobre encontrar um jeito de derrotar Radjedef. A expressão de Veritas quando olhou para ela apenas confirmou isso. A Guardiã da Lei parecia apreensiva, mas pensativa, aquela luz inicial acusando raiva tinha sumido de seu olhar. ― Mencheres, se você continuar tentando jogar sua vida fora, eu mesmo vou te matar, ― Vlad murmurou. ― Você pode não ser mais tão necessário para o seu pessoal com Bones compartilhando seu governo, mas você é necessário para seus amigos. Lembre disso da próxima vez em que você ouvir o canto de sereia da sepultura. ― ― A maioria dos Guardiões acreditam que você matou aqueles vampiros e colocou fogo no clube, ― Veritas disse, falando pela primeira vez em um bom


tempo. ― Houve, porém um problema encontrado com o corpo de Josephus. A cabeça dele foi arrancada, mas uma inspeção mais de perto revelou que ele também pode ter sido esfaqueado nas costas. ― ― Não seria óbvio se ele fosse? ― Kira perguntou, franzindo a testa. ― Não, ― Mencheres respondeu. ― Quando um vampiro é morto, o corpo se decompõe para sua idade real. Josephus tinha várias centenas de anos de idade. Teria restado pouco dele exceto pele seca e ossos. ― Não era uma imagem bonita de imaginar, mas corpos mortos quase nunca eram. Kira ainda não entendia o significado do ferimento à faca ser suspeito, a menos que os outros Executores revelassem que Mencheres deixou todas as facas deles no parque. Apesar de que Josephus podia ter pegado sua própria lâmina antes de persegui-los e mais tarde ser morto com ela... ― Ai está, ― Vlad disse, soando satisfeito. ― Vampiro ou ghoul, Mencheres não usa facas para matar. Ele simplesmente arranca a cabeça de alguém fora com seu poder. Radje teria precisado de uma faca contra um Executor, e o elemento surpresa também. Explica porque o ferimento de Josephus estava nas costas. Pobre bastardo provavelmente nunca viu acontecer. ― Um flash daquele dia no armazém agitou a memória de Kira, e ela fez careta. Mencheres tinha decapitado todos os ghouls com um mero pensamento, mais rápido do que teria sido para ele pegar uma das facas. Por que Mencheres usaria facas quando sua telecinese era de longe uma arma mais rápida e mais mortal? ― Radje deve ter arrancado a cabeça de Josephus depois que ele estava morto para parecer que eu tivesse feito, ― Mencheres pensou. ― Esperto. Ele não deve ter pensado que alguém fosse procurar por um ferimento a faca ou que a evidência de um fosse permanecer. Com uma morte de um Executor sendo jogada em mim, a maioria dos meus aliados iriam desaparecer. Ele já sabe que eu procurei a morte antes. Isso me deixaria em uma posição muito mais desesperada para lhe dar o que ele quer primeiro. ― ― O que ele quer, além de você ser morto? ― Kira resmungou. ― Meu poder. Cain foi o pai de nossa raça, amaldiçoado por seu Deus para sempre andar na terra como um fugitivo em punição por matar Abel. Mas Cain alegou que sua sentença era muito grande, e seu Deus teve pena, marcando Cain para que ninguém pudesse matá-lo. Dessa forma Cain se tornou o primeiro vampiro, dependente de sangue para alimento, mas além da morte mortal e possuindo incrível poder. Cain então fez sua própria raça para substituir a família da qual ele tinha sido expulso, mas somente para um de


seus filhos ele deu uma porção de seu incrível poder. Enoch foi o primeiro beneficiário e, muitos séculos depois, Enoch passou o legado do poder de Cain para seu herdeiro, Tenoch, que então o passou para mim. ― As sobrancelhas loiras de Veritas se ergueram. ― Como Radjedef poderia conseguir isso de você agora? Você deu aquele legado de poder para Bones quando fundiu sua linhagem com ele. ― ― Então eu fiz, e Bones não pode legar o poder para ninguém até que ele o domine completamente. Eu levei várias centenas de anos para fazer isso. Radje não tem intenção de esperar esse tempo todo. Ele me quer para legar todo o poder que resta em mim. É o único jeito que ele pode garantir de finalmente possuir o legado de Cain. ― ― Mas se você legar todo o seu poder... ― A voz de Kira sumiu. Ele deu um suspiro triste. ― Provavelmente vai me matar. Ou Radje irá, assim que eu estiver enfraquecido depois de dar o poder a ele. Se eu viver depois de lhe passar meu poder, eu sou a evidência de duplicidade. Se eu estiver morto, Radje pode ocultar seu novo poder adicional e poucos saberiam que ele o tem. ― O rosto de Veritas estava muito solene. ― Você espera que o Conselho dos Guardiões acredite em suas acusações de conspiração, assassinato, exposição da raça e chantagem contra outro Guardião. Tudo baseado em conjecturas quando sua própria adesão as nossas leis tem sido irregular na melhor das hipóteses. ― ― Irregular? Ele não fez nada errado, ― Kira disse frustrada. ― Rumores dizem que Mencheres conjurou espectros para encontrar e matar sua esposa. Magia negra é expressamente proibida na lei, mas, claro, todos aquele que testemunharam a morte de Patra e as mortes de seus guardas são leais a Mencheres e não irão confirmar isso. ― Ela lançou um olhar afiado a Vlad enquanto falava. Ele piscou para ela, sua boca se curvando em um sorriso maroto. ― Esses mesmos rumores mencionam como Patra invocou um exército do túmulo para atacar de emboscada a mim e meu pessoal? ― Mencheres reagiu. ― Ela enviou zumbis atrás de vocês? ― Kira perguntou, incrédula. ― Sim, ― Mencheres respondeu curtamente. ― E qualquer coisa do túmulo não pode ser morta por meios normais. Até mesmo minha telecinese foi inútil contra eles, para magia de sepultura não está sujeito o poder dos vivos, como Patra bem sabia. ―


― Você podia ter apresentado uma queixa formal ― Veritas começou. ― O que levaria semanas para investigar, ― Mencheres interrompeu. ― Deixando a mim e a maioria do meu pessoal morto por eles porque Patra teria conjurado outra forma de magia de sepultura para acabar conosco depois que uma falhasse. Foi somente um palpite de sorte que nos salvou daquela vez, mas já era muito tarde para as dúzias que foram derrubadas. ― O queixo da Guardiã da Lei ainda estava fixado em uma linha dura. Kira quase podia sentir a tensão entre os três, e sua luta só iria ajudar Radje. ― Eu entendo sua reverência pela lei, Veritas, ― Kira disse. ― Você é uma boa policial. Mas se, hipoteticamente, Mencheres conjurou aquele feitiço contra sua esposa, então ele sabe um jeito infalível para matar Radje. Ele também sabe que ninguém está disposto a testemunhar contra ele, seja por lealdade ou por medo. Porém Mencheres se recusa a usar seu poder imbatível contra alguém que está retirando todos os batentes para derrubá-lo. ― Kira se inclinou para mais perto, e sua voz diminuiu. ― Se ele usou aquele poder antes, foi apenas em defesa própria e, quase toda lei permite liberdade para auto-defesa. Ele não o está usando agora apesar de que seria o jeito mais rápido de vencer, então isso não prova seu extremo respeito pela lei? ― Veritas encarou cada um deles por um longo tempo, seus olhos azuis muito mais velhos do que sua aparência adolescente. Kira permaneceu absolutamente imóvel. Rezando para que a Guardiã da Lei visse através do castelo de cartas de Radje. ― Eu posso estar inclinada a acreditar em vocês, mas o resto do Conselho dos Guardiões vai requerer provas, não conjecturas, não importa o quão convincente sejam, ― Veritas disse finalmente. E no tempo em que levasse para eles juntarem aquela prova, Radje estaria ocupado armando mais para Mencheres, matando sabe-se lá quantas mais pessoas inocentes. Kira apertou os dentes. Ela ajudou a pegar um policial desonesto uma vez com Pete. Talvez ele pudesse fazer isso novamente com Radje. ― Eu sei de um jeito para derrubar Radje, ― ela disse. Três olhares se viraram em sua direção. ― Mas nós teremos que voltar para Chicago para ajeitar algumas coisas primeiro. ―


CAPÍTULO VINTE E NOVE. Kira andava pela Linha Verde de Trânsito de Chicago como se fosse sua primeira vez. Essa era uma rota bem familiar para ela ao longo do Loop, mas agora, tudo era diferente. A grande quantidade de cheiros era avassaladora, até mais dominante do que o barulho do vagão disparado contra os trilhos. Além dos aromas fortes de álcool, urina, suor, perfumes e mau hálito, os cheiros persistentes no carro também eram como impressões digitais de emoções. Claro, ela também podia sentir o cheiro de sangue, seja em pontos do vagão ou persistente em algumas das pessoas que entravam e saiam em seu caminho para a próxima estação. Ela tinha se alimentado novamente recentemente, então aquele cheiro não lhe despertava a fome tanto quanto o reconhecimento. Sangue era parte de sua vida agora, não mais uma escolha assim como ela decidir não respirar quando era humana. Às vezes, Kira não podia acreditar quão pouco tempo tinha passado desde que ela acordou como vampira pela primeira vez. Parecia que fazia tanto tempo, da mesma forma que o tempo desde que ela encontrou Mencheres pela primeira vez. Calendários, datas e relógios simplesmente não eram um jeito preciso de medir algumas coisas. A voz anunciou que a parada para a Rua Clintos era a próxima. Kira colocou a bolsa no ombro e se levantou, não precisando se segurar na parte de trás do banco ou no ferro para se equilibrar. Quando o vagão parou, ela saiu, indo agora pelas ruas familiares que levavam ao apartamento de Tina. Muitas vezes antes, Kira tinha andado essa parte do Loop Oeste depois de escurecer com sua atenção focada em qualquer beco ao lado dela ou longos pontos de escuridão onde as luzes da rua não penetravam. Ou para o som de passos a seguindo de perto. Agora ela percorria as ruas sem olhar para lugar algum exceto em frente, seus passos rápidos e confiantes. Nenhum ponto de escuridão, armas, becos ou estranhos furtivos não poderiam mais fazer mal a ela. Todos pela rua tinham batimento cardíaco, os fazendo vulneráveis a ela, não o inverso, se eles escolhessem atravessar seu caminho com intenção maliciosa. Ela chegou ao edifício de Tina um pouco mais rápido do que chegaria em circunstâncias normais. Não podia atrair atenção indesejada ao correr pelas ruas com velocidade sobrenatural, afinal de contas. Ela usou sua chave para entrar, então escolheu as escadas ao invés dos elevadores para evitar algum vizinho de Tina que a pudesse reconhecer se ela subisse com eles. Kira já sabia que sua identidade tinha vazado nos noticiários nos últimos dias. A última vez em que ela ligou para Tina, sua irmã tinha desligado sem falar. Ela não


achou que Tina estivesse brava com ela. Ela presumiu que o telefone de Tina estivesse monitorado, o que significava que seu celular provavelmente também estava. Kira não se incomodou em ligar para seu irmão, ele quase nunca tinha um número funcionando. As escadas estavam vazias, permitindo a Kira se mover mais rápido, de uma forma que estava se tornando natural para ela. Ela chegou ao 14º andar em poucos minutos, colocando o cabelo para trás da orelha de forma automática antes de entrar no andar. Porém, assim que estava do lado de fora do apartamento de Tina ela parou. Dois batimentos cardíacos estavam do lado de dentro, não um. Kira inalou o ar próximo a porta, mas ela não podia distinguir nada muito útil. Ela nunca tinha sentido o cheiro de sua irmã como uma vampira apesar de que a fragrância cítrica mais forte ao redor da entrada provavelmente pertencesse a Tina. Quem estava lá com sua irmã? E quem quer que seja representava um problema? Ela não podia se dar ao luxo de ir embora agora. Ela arriscou demais para vir aqui. Kira bateu, mais uma vez alisando o cabelo para o lado enquanto esperava. Primeiro ela ouviu passos, um batimento cardíaco do outro lado da porta e então uma respiração profunda antes da porta abrir. Tina estava do outro lado, ainda loira e delicada como sempre, mas com um brilho mais saudável em sua feição do que da última vez que ela a viu. Kira sorriu. O sangue de Mencheres tinha trazido sua irmãzinha de volta, e agora ela tinha o tratamento para a doença de Tina correndo por suas veias. ― Hei, ― Kira disse. ― Posso entrar? ― Os olhos azuis de Tina estavam arregalados, e seu cheiro ― sim, era aquela combinação cítrica que Kira tinha sentido do lado de fora da porta, como laranjas e cravos-da-índia ― azedou um pouco assim como sua pulsação acelerou. ― Está tudo bem? ― Kira perguntou, de forma tensa. Será que era um policial no apartamento com Tina? Bom Deus, eles tinham mandado alguém depois que Kira ligou da última vez? ― Kira? ― Tina disse de forma cautelosa, como se ela não acreditasse bem em quem estava vendo. ― Quem é, T? ― ela ouviu o grito do seu irmão de dentro do apartamento. ― Rick está aqui? ― Kira perguntou, balançando a cabeça. ― Oh, Tina, você não o deixou se mudar para cá, deixou? ―


― Quem é? ― Seu irmão apareceu por trás do ombro de Tina. Seus olhos estavam vermelhos e pelo vinco em sua bochecha, ele parecia que tinha acabado de acordar. ― Kira, puta merda! ― ele disse, seus olhos se arregalando quando a viu. ― Você está em um problemão, cara. Tipo assim, enorme, ― Rick finalizou. ― Oi, Rick, ― Kira disse com uma voz seca. ― Joey finalmente te colocou para fora? ― Tina se afastou silenciosamente. Kira entrou, uma farejada revelou que Rick cheirava a maconha, alguma outra droga, cigarros e álcool. Uma olhada mostrou que ele fez do sofá de Tina uma cama. Parecia que ele estava lá por dias. Latas de cerveja vazias, um cinzeiro transbordando de pontas de cigarro e um par de sacos de batata frita amassados completavam o cenário. Kira queria bater nele, e não só por transformar o apartamento de Tina num lixo enquanto ele se sentia em casa. ― Você está fumando perto de Tina? Ela tem Fibrose Cística e acabou de sair do hospital há poucas semanas atrás depois de quase ter morrido, mas seus malditos hábitos de nicotina são mais importantes do que os pulmões dela? Você não poderia ao menos ir lá para fora para deixá-la respirar um pouco de ar limpo em seu próprio apartamento, Rick? O rosto dele ficou vermelho. ― Você é procurada pelos malditos policiais, pelo FBI e talvez mais, mas você vai ficar puta comigo por fumar? Cara, você tem coragem… ― ― Oh, cala a boca, ― Kira o repreendeu. Para sua surpresa, Rick parou de falar. Imediatamente. Sua boca se abria, mas nada saia dela. Então seus olhos saltaram e suas mãos começaram a se agitar como se estivessem pegando fogo. Kira girou, esperando ver alguém atrás dela, mas não tinha ninguém lá exceto Tina. Ela simplesmente fechou a porta e ficou a encarando. ― Seus olhos... ― ela sussurrou. Kira falou um palavrão. Ela manteve um controle perfeito sob suas emoções o caminho todo até aqui, mas cinco segundos na companhia de seu irmão a fez derrubar seu disfarce de pessoa normal para lançar a ele adagas sobrenaturais com o brilho verde de seus olhos. Agora ela tinha que consertar essa bagunça; ― Rick, sente-se. Encontre um lugar feliz em sua mente ou coisa do tipo, ― ela o orientou.


Rick se sentou no chão, seus movimentos frenéticos se tranquilizando e uma expressão de paz acalmando suas feições. Kira se viu grata por não ser uma vampira quando estava crescendo e tinha que ser babá dele para seu pai e sua nova esposa. Ela podia ter tirado vantagens horríveis de suas habilidades de controle de mente. Rick tinha sido um porre mesmo quando era criança. Então ela se virou para Tina, que tinha os olhos fechados enquanto uma única lágrima escorregava por suas bochechas. ― Não, Kira, ― Tina disse, balançando a cabeça com seus olhos fechados bem apertados. ― O que quer que você fez com ele, não faça comigo. Eu sabia. Eu vi aquela gravação no YouTube, e mesmo que eu não quisesse acreditar... ainda assim, que você nunca teria se envolvido em algo daquele tipo, então você desapareceu. E mesmo que você tivesse, a cruz da mamãe. Você nunca teria deixado alguém arrancá-la de seu pescoço e usá-la daquele jeito se fosse somente uma encenação. Você não tira aquele colar desde que ela morreu, então quando eu vi aquilo, eu sabia que tinha que ser real... ― A mão de Kira se fechou sobre a cruz em seu pescoço. Tinha a chocado saber que Mencheres a usou para cortar seu próprio pescoço e a alimentar com seu sangue, mas nunca passou por sua cabeça que Tina veria aquilo e seria capaz de determinar que não era uma encenação. Porém, Tina estava certa. Ela não tinha tirado seu colar, não desde que ela o desenganchou do pescoço da mãe e colocou ao redor do seu um dia antes do funeral dela. ― Tina... ― Ela não estava certa sobre o que dizer. Ela não tinha antecipado dizer isso tão cedo para a irmã. Eventualmente, sim, mas não essa noite. Rick, ela não achava que algum dia fosse contar. ― A polícia encontrou um monte de frascos de sangue em seu apartamento. Eles me perguntaram se eu sabia que você estava nessa coisa de bancar o vampiro, seu eu já tinha visto aquele cara do vídeo antes ou se eu sabia onde vocês estavam. ― A voz de Tina estava confusa. ― Eu disse a eles que não sabia nada, mas eu reconheci sim aquele cara daquela noite no hospital em que eu sai do respirador. As enfermeiras ficavam dizendo sobre como foi um milagre eu me recuperar daquele jeito. E também, eu nunca me senti tão bem ultimamente. Então, quando eu vi a gravação, ele, o que aconteceu, e você desaparecida... de repente, eu sabia porque eu estava melhor. ― Oh Deus, Tina tinha pensado em tudo. Kira brigava com o que fazer. Um brilho de seus olhos e Kira podia fazer Tina esquecer tudo, mas apesar de que com Rick ela não ter tido escolha, Tina podia ser capaz de lidar com isso.


― Eu o encontrei por acidente, ― Kira disse, tentando resumir as últimas poucas incríveis semanas da maneira mais curta possível. ― Vi coisas que me deixaram saber que ele não era humano, mas ele não podia me fazer esquecer como podia fazer com a maioria das pessoas. Quando eu te disse que estava gripada, aquilo não era verdade. Ele me manteve com ele, esperando que eu caísse em seu poder e que ele pudesse apagar da minha mente o que eu tinha visto, mas isso nunca aconteceu. Então ele me deixou ir, mas eu senti algo muito forte por ele, eu procurei por ele. Isso me levou ao clube. Você viu o que aconteceu lá. ― Tina não disse nada, mas seu rosto ficou pálido. Porém, sua pequena constituição estava firme. ― Ele colocou fogo no lugar? Matou aquelas pessoas? ― ― Não, ― Kira respondeu imediatamente. ― Foi armado para ele pelo bastardo que ordenou minha morte. Eu posso estar longe por algum tempo, mas eu queria te ver de novo e te contar... bem, eu não pretendia te contar isso, mas eu queria te contar que você não precisa se preocupar. Eu estou bem, melhor do que bem, e assim que isso se resolver, eu estarei de volta em sua vida do jeito que era antes. ― Tina finalmente encontrou o olhar de Kira. Outra lágrima escorregou por sua bochecha. ― Eu fiquei tão assustada. Eu pensei que você tinha ido para sempre por ser outra coisa agora. Eu não sei o que tudo isso significa, e é difícil até de acreditar, mas quando eu ouvi você ficando puta com Rick, eu soube que ainda era você ai dentro. ― Kira sentiu seu próprio olhar ficar úmido. ― Claro que ainda sou eu. Não é nada parecido com os mitos, Tina. Eu não mato pessoas. Eu não me escondo em uma cripta durante o dia. Você pode ver que eu ainda estou usando a cruz da mamãe, então eu não recuo de objetos religiosos também. A maioria do que você ouviu é errada, de fato. ― Tina ainda parecia um pouco impressionada, mas Kira lembrou de como ficou espantada no início também, e ela teve mais provas do que Tina tinha visto. ― Você tem presas? ― Tina perguntou, parecendo fascinada e ao mesmo tempo hesitante. ― Sim. ― Kira sorriu tristemente. ― Eu ainda estou tentando me acostumar com elas. ― ― E o cara... você e ele... ―


― O nome dele é Mencheres, e eu o amo, ― Kira respondeu suavemente. ― Ele é incrível. Eu não tenho tempo para lhe dizer o quanto, mas ele realmente é. Você vai encontrá-lo em breve, prometo. ― Tina olhou por sobre seu ombro, como se Mencheres fosse aparecer como mágica atrás dela, na porta. ― Isso vai ser, ah, um pouco estranho, ― ela disse com um certo embaraço na voz. ― Quero dizer, você é minha irmã, então você não parece algo diferente, mesmo que agora você seja. Mas ele é todo diferente. Ele até mesmo se parece com um vampiro, com aquela coisa alta, escura e quente acontecendo. Ele mora em uma daquelas casas assustadoras? ― ― Não, os dois lugares em que eu estive eram bem normais, ― Kira respondeu enquanto pensava, tirando a casa que eu não vi. A grande e triangular no Platô de Giza. O olhar de Tina se dirigiu para um ponto atrás de Kira. ― Você não pode contar para Rick. Ele te ama, mas ele se voltou contra você assim que os policiais o questionaram. Contou a eles tudo que você fez desde os 10 anos de idade. Se ele souber sobre isso, ele irá até a polícia, os noticiários, qualquer lugar. ― ― Não, eu não vou dizer ao Rick, ― Kira suspirou, seguindo o olhar de Tina até seu irmão. Rick cantarolava para ele mesmo enquanto estava sentado, parecendo muito mais relaxado do que quando ela o tinha visto totalmente chapado. ― Ele não vai nem se lembrar que eu estive aqui. Mas você vai. Se quiser. ― A expressão de Tina estava firme apesar de ainda estar pálida. ― Eu quero. Você pode confiar em mim. ― ― Eu sei que posso, Pequena T, ― Kira disse, a chamando pelo apelido que usava desde que elas eram crianças. Ela foi até a irmã, sentindo Tina tremer um pouco enquanto ela colocava os braços ao redor dela. Então sua irmã relaxou quando nada mais aconteceu exceto um abraço, sem nunca saber que Kira repetia para si mesma ― cascas de ovos ― em sua mente para que, inadvertidamente, não a apertasse com muita força. ― Eu tenho que ir, ― ela disse finalmente, soltando Tina. ― Eu tive que sair escondida de Mencheres quando ele estava fora cuidando de negócios para poder te ver. Ele não teria deixado, então eu tenho que voltar logo. Ele vai surtar se voltar e eu não estiver. ― Tina tocou o braço dela. ― Ele te mantém sem sair? ― ― Ele não é nada parecido com Pete, ― Kira disse suavemente, sabendo de onde vinha a preocupação de Tina. ― Ele só tem medo de que algo aconteça a mim por causa dos outros vampiros que estão atrás dele. Por


isso que eu não pude sair para te ver até que ele saísse. Mas assim que as coisas voltarem ao normal, eu posso ir aonde eu quiser. ― ― Espero que sim, ― Tina disse. ― Não me ligue ou mande e-mail. Eu acho que a polícia tem meu telefone e talvez até meus e-mails grampeados ou algo do tipo, mas tenha cuidado. ― ― Eu terei. ― Kira foi até Rick, encarando seu irmão. Se ela pudesse ajudá-lo com sua doença tão facilmente como Mencheres ajudou Tina. ― Você nunca me viu essa noite, ― ela disse finalmente, o verde brilhando de seus olhos. ― Você esteve dormindo. Quando você acordar daqui há algumas horas, você vai saber que Tina e eu te amamos e sempre vamos amar. Você irá a um encontro de Narcóticos Anônimos e conseguirá um padrinho, porque você percebe que há mais na vida do que ficar bêbado ou drogado. Você vai saber que há mais para você do que seu vício, Rick, e que você pode vencer isso. Oh, e você não vai mais fumar na frente de Tina, ― ela finalizou. Kira não podia fazer seu irmão ficar limpo e permanecer limpo, mas talvez, apenas talvez, essa orientação subconsciente o colocaria no caminho em direção a recuperação. No final das contas, somente Rick poderia salvar sua própria vida. Tudo que Kira podia fazer era tentar lhe dar um empurrão. Então ela se virou, deu um último abraço em Tina, e saiu do apartamento. Ela pegou as escadas novamente para descer, contando os andares e sentindo falta de Mencheres mesmo que fizesse só algumas horas desde que ela o viu. A escadaria estava em silêncio exceto pelo barulho de suas botas contra os degraus, mas depois que ela desceu meia dúzia de andares, um formigamento do ar roçou como uma teia de aranha invisível na pele de Kira. Ela hesitou apenas por um momento antes de retomar seu ritmo. Só mais seis andares até ela chegar no nível da rua. Aquela sensação de teia de aranha aumentou, mas Kira alinhou os ombros e continuou a descer, ignorando o sinal de SAÍDA a sua direita que a levaria para dentro do sexto andar do edifício. Os vampiros se chocaram contra Kira antes de ela alcançar o quarto andar.


CAPÍTULO TRINTA. O novo celular de Mencheres tocou. Ele olhou, por vários segundos, os números que mostravam ser Bones ligando, antes de atender. Foi o tempo que levou para ele se recompor para que sua voz não traísse as emoções se enfurecendo dentro dele. ― Sim? ― ― Eu acabei de desligar uma chamada com Radjedef, ― Bones começou sem preâmbulos. ― Eu disse a ele que não tinha ideia de como te encontrar e toda aquela besteira, mas ele me deu um número para repetir para você. Disse que você precisa entrar em contato com ele 'antes que seja tarde demais'. Que diabos ele quer dizer com isso? ― Seu poder se agitou dentro dele, procurando alguém para matar, mas a única pessoa em quem Mencheres queria soltar aquela força letal não estava aqui. ― Mais ameaças sobre o Executor morto, sem dúvida, ― ele respondeu friamente. ― Me dê o número ― e então envie um e-mail em massa imediatamente para nosso pessoal passar para frente a suas propriedades também, repetindo o número e a mensagem. ― ― Eu farei isso, mas pare de mentir para mim, ― Bones disse em um tom franco antes de repetir o número. ― O que Radjedef fez agora? Deixe-me te ajudar. ― ― Quando você insinuou a possibilidade de que manifestou mais dos meus poderes no ano passado, sentir a localização de uma pessoa era parte desses poderes? ― Mencheres perguntou, ignorando a outra pergunta. Bones ficou em silêncio por um momento. ― Não, ― ele disse finalmente. ― Então você não pode me ajudar, ― Mencheres suspirou. ― Mas você pode ajudar nosso pessoal não se chocando contra o Conselho dos Guardiões. Envie esse e-mail. Continue negando qualquer conhecimento sobre como chegar até mim. Renuncie a mim se for necessário. É isso que eu peço a você. ― Uma bufada exasperada soou do outro lado da linha. ― Agora eu sei o quão frustrada minha esposa se sente quando eu tento mantê-la fora das coisas para sua própria proteção. ― ― Estou contente por você ter a Cat, ― Mencheres disse calmamente. ― Você acredita que eu agi como agi no passado apenas para assegurar os


poderes dela para a nossa linhagem, mas eu vi que você iria amá-la. Isso, mais do que outro motivo, foi porque eu interferi. ― ― Por que eu sinto como se você estivesse se despedindo de mim? ― Bones perguntou, suas palavras acentuadas com tensão. Mencheres fechou os olhos, precisando de outro momento antes de poder falar novamente. ― Você me fez muito orgulhoso, ― ele disse finalmente. Então ele desligou mesmo enquanto Bones começou a bravejar uma exigência de saber onde ele estava. Quando seu celular tocou de novo com o mesmo número piscando, ele não respondeu. Ele esperou uma hora, tempo suficiente para o e-mail de Bones circular ― e Bones o iria enviar, não importa o quanto furioso ele estava. Então Mencheres ligaria para Radje e ouviria o Guardião da Lei definir os termos para a libertação de Kira que Radje não tinha intenção de cumprir. Ele sabia sem nenhuma dúvida que Radje a tinha. Se outros Guardiões da Lei tivessem pego Kira, seriam eles a contatarem Bones, não Radje. A única pergunta era se Radje foi esperto o suficiente para manter Kira viva. Bones ligou mais cinco vezes nos próximos vinte minutos. Mencheres ignorou cada ligação. Exatamente sessenta minutos depois que desligou a ligação com Bones, Mencheres ligou para o número que Bones tinha dado a ele, para Radje. ― Sim, ― Radje respondeu depois de vários toques. Ele parecia furioso. ― Estou aqui, ― Mencheres declarou. ― Menkaure, eu estou desapontado com seu co-regente. Parece que ele mentiu para um Guardião quando disse que não tinha como te encontrar, ― Radje falou manso, perdendo seu tom hostil. Ele quase sorriu. ― Bones foi super zeloso em tentar entregar sua mensagem. Ele enviou seu número para todo nosso pessoal e suas propriedades, desejando que eles o passassem para todos que conheciam na tentativa de encontrar alguém que pudesse me encontrar. Você pode perder seu tempo procurando por aquela lista de milhares para ver quem foi sucedido, ou nós podemos conversar. ― Radje soltou uma risada curta. ― Esperto. Isso explica todas as ligações recentes desligadas na minha cara e ameaças anônimas. Seu pessoal é muito leal a você. E agora eu preciso mudar esse número. ― ― Você tem o que eu quero, ― Mencheres disse, muito preocupado com Kira para responder as usuais palhaçadas de Radje. ― Eu tenho o que você quer. Ou discutimos uma troca, ou eu encerro mais do que essa ligação. ―


― Eu não sei do que você está falando, ― Radje disse com inocência fingida. ― Não precisa fingir, ― ele respondeu bruscamente. ― Se eu fosse ao conselho para te acusar de pegar Kira, eles só iam me prender em um piscar de olhos, e você é muito cuidadoso para admitir qualquer coisa por telefone que eu pudesse gravar e passar para eles mais tarde. Você não tem plateias exceto eu, e eu estou ficando impaciente. ― Um assobio baixo soou. ― Por que, Menkaure, você soa como se tivesse perdido sua mais nova vampira. Eu gostaria de poder ajudar, mas eu não a vi desde aquela noite em que você a transformou. ― Radje ainda não estava arriscando no caso de sua conversa estar monitorada, pessoalmente ou por aparelho eletrônico. O poder de Mencheres palpitou dentro dele com ondas borbulhantes e letais que só tinham em comum seu medo por Kira. Se Radje a tivesse matado... ― Você sabe que faz tempo que quero sair desse mundo, ― ele disse em um tom congelado. ― Eu posso realizar isso de duas formas. Uma é ir direto ao Conselho dos Guardiões para assumir responsabilidade por todas as acusações feitas a mim. Minha sentença será a morte, e a justiça deles será rápida. Ou, eu posso ir até você e me trocar pela liberdade em segurança de Kira. Eu farei uma dessas coisas nas próximas 24 horas. Qual vai ser? ― Radje estava em silêncio. Mencheres esperou enquanto sua crescente raiva e medo faziam as paredes tremerem ao redor dele. Radje tinha alegado que ele estava irracionalmente apaixonado por Kira por seus próprios propósitos, mas ele nunca realmente acreditou nisso. Radje deve ter adivinhado que ele gostava dela, mas sua ignorância aos verdadeiros sentimentos de Mencheres significariam que o Guardião da Lei não pensou em manter Kira viva como chantagem? E se ele a tivesse matado para estimular Mencheres a se precipitar na tentativa de continuar colocando o conselho contra ele? Mencheres sabia que eles não deviam ter voltado a Chicago como ela insistiu. Eles podiam ter conseguido provas contra Radje de outro jeito. Se ele não tivesse concordado com o plano de Kira, ela ainda estaria com ele agora... ― Se você vai se entregar, como um Guardião e sua única família viva, eu insistiria você vir até mim, ― Radje disse finalmente. ― Eu odiaria que você morresse cercado por tropas quando eu poderia lhe dar conforto antes de sua morte. ― Mencheres fechou os punhos enquanto o alívio o tomou. Radje ainda estava sendo cauteloso em seu discurso, mas seu significado estava claro. Kira estava viva, e Radje a estava oferecendo em troca do poder de Mencheres ―


― e morte. Radje nem ao menos estava fingindo que deixaria Mencheres viver depois. ― Então a morte que eu já procurei agora irá ser usada na troca por um do meu povo. Diga-me, se você não tivesse pegado Kira, quem mais você teria usado contra mim para seus propósitos? ― ― Como um Guardião, eu nunca chantagearia ninguém, mas se eu fosse buscar alguém para usar contra você, Menkaure, não seria difícil. Você nunca é limitado para aqueles de quem você gosta, ― Radje respondeu com uma satisfação cruel. ― E você nunca se deixou gostar de nada exceto poder. Mesmo com todos os meus muitos arrependimentos, eu não trocaria minha vida pela sua, tio, não importa se isso me garantisse outros 4 mil anos. ― ― Eu cansei dessa conversa, ― Radje falou de forma precipitada. ― Eu te vejo amanhã, meia-noite no topo da praça do Banco da América, em Atlanta. Venha desarmado e sozinho. ― ― Eu exijo evidência de que não estarei agindo em vão, ― ele reagiu. ― Suas palavras não são o suficiente. ― Radje deu risada. ― Se eu tivesse pegado Kira, eu não iria levá-la a lugar algum perto de você. Você iria simplesmente matar a mim e meus guardas com aquele formidável poder que você tem. Eu assumo um grande risco em te encontrar sozinho para lhe trazer perante o conselho, mas eu me consolo ao saber que se algo acontecer a mim, ações serão feitas mais tarde para assegurar sua punição. ― Ou, se você não se comunicar com os guardas de Kira na hora marcada, eles vão matá-la, Mencheres completou cinicamente. Ele tinha suspeitado isso. Radje pode ser cruel, mas não era tolo. Não, Kira estaria bem longe do lugar onde Mencheres encontraria Radje. O único motivo para o Guardião da Lei não temer que Mencheres a encontrasse antes era porque seu poder de localizar pessoas tinha desaparecido junto com suas visões. Estou vindo, o obscuro submundo de Duat parecia sussurrar para ele. Não ainda, Mencheres disse a ele. ― Eu confio que você vai encontrar outro jeito de me dar a prova que eu exijo. Eu te vejo no telhado da Torre a meia-noite de amanhã, ― ele declarou e desligou. Vlad andou até o outro lado da sala, suas mãos atrás das costas, seu olhar duro. ― Você não pretende realmente ir sozinho, pretende? ―


― Para Radje? ― Mencheres lhe deu um sorriso amargo. ― Oh sim. ―

***** Kira podia ouvir Radje falando com Mencheres em uma das outras salas do antigo complexo em que ele a tinha presa. Imagens de serpentes emplumadas, guerra e guerreiros estavam entalhadas nas pálidas paredes de pedra ao redor dela, nesse templo parcialmente em ruínas, fornecendo o estranho plano de fundo perfeito para os planos distorcidos do Guardião da Lei. Kira quase podia imaginar que ainda ouvia os gritos dos sacrifícios ecoando através das ruínas da antiga grande cidade Maia. Algemas de ferro em seus pulsos e tornozelos estavam presas a parede atrás de Kira. As algemas machucavam sua pele, que se curavam em um padrão repetitivo cada vez que ela se mexia, mas as algemas não eram responsáveis pela dor queimando dentro dela. Sua fome era. Ela não tinha se alimentado desde antes de ir ver sua irmã. Depois que o trio de vampiros a sequestrou do edifício de Tina e a trouxeram aqui de avião para esse local enorme em ruínas, Radje tinha drenado, sistematicamente, todo seu sangue com múltiplos cortes de uma faca de prata. Não porque ele era cruel, ele explicou com um sorriso frio, mas desse jeito, ela estaria muito fraca para se libertar. Radje ainda teve a coragem de dizer para Kira que ela não tinha motivo para temer que algum de seus guardas a molestasse enquanto ela estava em posição indefesa presa a uma parede. Afinal de contas, ele era um Guardião da Lei e Guardiões não perdoam certas atividades desrespeitosas. Kira se perguntou se o pavão pomposo acreditava realmente em alguma coisa que saia de sua boca ou se ele achava que ela era estúpida o suficiente para acreditar nele. Ela tinha visto os olhares que alguns dos mercenários que Radje tinha dentro dessa estrutura antiga lançavam para ela, e nenhum deles eram respeitosos. Kira não precisava dos seus instintos para lhe dizer que os guardas de Radje estavam meramente ganhando tempo enquanto seu mestre lhes desse o Ok. Ela sabia que Radje não tinha intenção de deixá-la viver, e ele pouco se importava se aqueles homens calejados tivessem alguns momentos de entretenimento até que eles a matassem como ordenado. ― Você tem motivos para se alegrar, ― Radje disse, entrando na sala onde Kira estava. ― Mencheres concordou em trocar ele por você. Ele realmente deve estar cansado da vida. Ou ele pretende armar uma armadilha para mim com os outros Guardiões amanhã a noite, mas tudo que eles veriam é eu, me arriscando para trazer um criminoso condenado. ― ― Com certeza você pensou em tudo, ― Kira respondeu em uma voz nítida, esperando que ele saísse para que ela não tivesse mais que ouvir seu auto engrandecimento.


Radje a fuzilou com o olhar, seus olhos escuros ficando verdes. Seu cabelo longo e negro estava trançado em um estilo que, de alguma forma, ainda conseguia parecer masculino, e aquelas tranças balançavam quando ele chegava mais perto dela. ― Você é lamentavelmente jovem demais para entender quanto tempo eu esperei, porém, agora, pelo menos, é o momento de eu reivindicar meu poder. ― ― Você não quer dizer roubar o poder de Mencheres? ― ela corrigiu. Ele abriu os braços de uma forma irritada. ― Aquele poder era para ser meu. Até mesmo os deuses concordam. Por que mais Mencheres repentinamente iria ansiar pela morte? Por que mais suas visões e habilidade de rastrear pessoas iriam falhar? Se todas essas coisas não tivessem acontecido, eu não poderia agir contra ele desse jeito. Você vê? O destino interviu pelo meu sucesso! ― Seu bastardo narcisista, Kira pensou, mas ela não cutucou o temperamento, já instável, de Radje dizendo isso em voz alta. Ela sabia porque todas aquelas coisas tinham acontecido com Mencheres, e elas não tinham nada a ver com o destino dando uma mãozinha para o desejo de poder de Radje. Foi o valer de séculos de culpa reprimida, arrependimento e sofrimento se aproximando de Mencheres, tudo unido em uma parede de escuridão que ele não podia ver através e ele não achava que tinha força para destruir. Se Radje tivesse uma consciência, ele estaria familiarizado em como demônios interiores podiam ser fortes. Mas, claro, o Guardião da Lei desonesto era vazio demais por dentro para saber alguma coisa sobre isso. ― E você vai me deixar ir depois que conseguir o que quer de Mencheres? ― ela perguntou, apenas conseguindo conter a maior parte do seu escárnio da questão. Nada alterou na expressão de Radje. ― Claro. Ninguém acreditaria em qualquer coisa que você contasse, e mesmo que alguém acreditasse, não haveria prova alguma. ― Exceto pelo seu novo poder, Kira adicionou mentalmente. Só um idiota acreditaria que Radje não a mataria para proteger aquele segredo de ser contado. Inferno, ela apostava que os mercenários que guardavam esse lugar tinham seus dias contados também. Ela podia adivinhar que o único motivo pelo qual Radje estava fingindo que deixaria ela ir era para que Kira não gritasse algum aviso para Mencheres quando ele exigisse falar com ela antes de dar a Radje seu poder. Mencheres não daria a Radje coisa alguma até que ele soubesse que ela estava viva. O Guardião da Lei saberia disso.


― Então Menkaure a tomou como sua amante, ― Radje disse como se estivesse refletindo, seu olhar passou por ela de um jeito que a fez desejar um banho mais do que sangue. ― Eu posso sentir o cheiro dele em você. ― ― Me dê sabão e água e eu posso concertar isso, ― ela respondeu logo. Ela não gostou do brilho avaliador começando a aparecer nos olhos de Radje, ou da referência obviamente explícita ao cheiro de Mencheres nela. Quando mais cedo Radje a deixasse sozinha, melhor. Ao invés disso ele chegou mais perto, parando a centímetros de Kira. ― Quando eu coloquei um sentinela na residência de sua irmã, eu me perguntei se era fútil. Eu senti que Menkaure tinha uma afinidade por você, então eu não esperei que ele deixasse você voltar com medo de uma armadilha. Se ele não se importava aonde você ia, então talvez, capturar você não iria me beneficiar em nada. Porém meus guardas ouviram você dizer a sua irmã que você teve que sair escondida de Menkaure para vê-la. É por isso que eu soube que você seria útil para mim viva. ― Kira reprimiu um tremor enquanto aquele brilho perturbador ficava mais forte nos olhos de Radje. ― Diga-me, ― ele quase murmurou, ― quanto Menkaure afirma que gosta de você? ― A última coisa que ela faria era dizer a Radje que Mencheres a amava. Ele só faria coisas ainda mais terríveis com ela para irritar Mencheres, mas ela também não podia fingir que não significava nada para Mencheres. Isso seria uma mentira óbvia demais. Mesmo que Radje acreditasse que Mencheres tinha um desejo de morte, ele ainda concordava em trocar a si mesmo por ela. ― Nós não tivemos muito tempo juntos, mas o tempo que passamos juntos foi promissor, ― Kira disse com um tom evasivo na medida em que conseguiu. Raiva e fome competiam dentro dela. Ela queria esmagar o sorriso no rosto de Radje... e ela daria cada centavo que tinha por uma bolsa de sangue agora. ― Você sabe como os gregos costumavam chamar Menkaure? ― Radje perguntou com uma casualidade fingida. ― Eros, por causa do deus da luxúria. Como Faraós, nós éramos considerados deuses por nosso povo. Tenho sido um Guardião da Lei por quase três mil anos, mas antes disso, quando eu passei meu tempo procurando meu próprio prazer, como Menkaure fez... minhas noites eram gastas em um mar de carne que eu nunca seria capaz de contar todas as mulheres que tive. ― A raiva queimava ainda mais dentro de Kira, mas ela tentou mantê-la baixa e seus escudos emocionais levantados. Não era suficiente para Radje armar para Mencheres e arruinar a vida dele. Agora ele tinha que tentar


destruir seu relacionamento com ela também, embora pretendesse totalmente matar Mencheres assim que o visse. ― Bom para você. Com todas aquelas lembranças, soa como se você pudesse dirigir um filme pornô chamado Deuses Selvagens, ― ela respondeu, sua voz quase soando normal. ― Menkaure viveu desse jeito por mais de dois mil anos até ele se casar, ― Radje disse de forma afiada, como se Kira fosse muito estúpida para descobrir que Radje não era o único nadando em um mar de carne. Kira soltou um suspiro para fazer efeito. ― Faz sentido. Todas as coisas que ele podia fazer na cama fritaram meus circuitos ― e com aquele poder dele, eu quero dizer isso de forma literal. ― Radje lhe deu um olhar desdenhoso. ― Não eram só mulheres. Menkaure teve outros homens também. ― Ela deu de ombros o máximo que as algemas de metal permitiram. ― Então ele experimentou em seus selvagens dias de vampiro jovem. Muitas pessoas fazem isso. Porque, teve uma vez na faculdade comigo e minha amiga depois de umas doses de tequila… ― ― Você é estúpida demais para compreender qualquer coisa que eu disse? ― ele interrompeu. Kira lhe lançou um olhar duro, sua raiva finalmente escapando. ― Eu entendo muito. Como o quanto você é tão obcecado em odiar Mencheres que você se sujeitou a isso. Vá em frente, conte-me mais, mas eu não me importo. Qualquer que seja o inferno que Mencheres criou no passado, eu acho que ele mais que compensou com mais de nove séculos de celibato, então você não está me virando contra ele com suas piadinhas sujas. No momento, tudo que você está fazendo é me entediando. ― Ela viu o punho dele vindo, mas como ela estava presa a parede, tudo que ela pôde fazer foi aguentar. A dor explodiu do lado do seu rosto, seguida por um estalo em seu pescoço que ela pôde sentir e ouvir. Por longos e agonizantes segundos, ela não pôde ver. Então a dor perdeu a força e sua visão clareou para que Kira pudesse ver cada detalhe de Radje limpando o sangue dela em sua mão na camisa dela. ― Vamos ver o quanto você está entediada depois que eu pegar o poder de Menkaure e matá-lo, ― Radje disse bruscamente. ― Se você acha que ele vai encontrar um jeito de me derrotar, ele não vai. Menkaure sabe que ele já está morto. Se ele não estivesse, ele teria lutado comigo de forma mais dura. ―


Ele saiu da sala com a ordem para um dos guardas se certificar de comer na frente dela enquanto n達o lhe desse nada. A boca de Kira se apertou em uma linha raivosa enquanto ela lutava para conter aquela fome abrasadora dentro dela. Ela tinha uma tarefa para cumprir, e ela precisava de uma mente clara para cumpri-la. E um pouco de tempo sem guardas a observando.


CAPÍTULO TRINTA E UM.

Mencheres descansava no fundo da banheira. A água tinha esfriado há muito tempo, mas ele não quis aumentar a temperatura. Ele não queria se mover para não perturbar a sua concentração. Pelas últimas horas, ele encarou aquela parede de trevas iminente em sua mente, tentando derrubá-la tijolo por tijolo. A localização da Kira estava além dela, se ele ao menos conseguisse encontrar uma maneira de romper suas defesas inquebráveis. Mas tudo o que aconteceu foi a escuridão se aproximando cada vez mais perto, até parecer que ela já o havia engolido. Ele repetiu as palavras da Kira em sua mente como se elas fossem um talismã que poderia guiá-lo. Você já ouviu falar em profecia auto-realizável? … Quando você perdeu a capacidade de ver além da escuridão?… Culpa de sobrevivente … você pode não ver um futuro para si, porque você não acredita que merece um. Nada daquilo devia importar agora. Ele pode não acreditar que merece um futuro, mas ele sabia que Kira merecia. Aquilo seria o suficiente para fazêlo desistir de toda a culpa que poderia o estar bloqueando antes. Kira o amava, e ela acreditava nele de uma forma que ninguém mais acreditou, nunca. Apenas aquilo devia ser o suficiente para capacitá-lo a derrubar aquela parede de escuridão dentro dele. Apesar de ele canalizar cada fibra do seu corpo para destruir a parede para descobrir a localização da Kira, antes que fosse tarde demais para resgatá-la e partir para se encontrar com o Radje, a escuridão não se moveu. Ela parecia ficar mais densa ao invés, e quando o alarme disparou no relógio que Mencheres programou, ele sabia com grande pesar que Kira estava errada. Isto não era uma barreira que ele causou dentro de si mesmo, não importa o quão forte a fé dela queimava por ele. Isso não era culpa de sobrevivente, profecia auto-realizável, ou a má interpretação do que ele viu. Isso era Duat, o submundo obscuro sem céu ou terra, e ninguém havia derrotado a morte após ser marcado pelo barqueiro. Mencheres levantou da banheira, agora sem se preocupar em se secar, ele colocou suas roupas. Um propósito calmo repousou sobre ele. A escuridão eterna o esperava, mas antes de ele entrar em Duat, ele deveria curvar a escuridão aos seus propósitos primeiro. Havia ainda uma maneira de salvar a Kira. A expressão do Vlad era nebulosa enquanto ele esperava por ele do lado de fora do banheiro. Ele não fez pergunta alguma, mas sabia que Mencheres


não tinha sido capaz de quebrar a parede dentro dele. De outro modo, ele estaria com pressa para sair, para que eles fossem recuperar a Kira. ― Talvez nós possamos… ― Vlad começou. ― Eu sei outro modo, ― Mencheres o interrompeu. Seus lábios curvados em um sorriso cínico. ― Embora você possa não querer ficar para ver. ―

***** Calor a consumiu por dentro mesmo antes de Kira abrir os olhos. Sua boca secou, seus membros doeram, e de alguma forma ela tinha um estômago cheio de fogo. Por alguns momentos confusos, ela não conseguia se lembrar onde ela estava, ou porque ela estava algemada a uma parede. Então as memórias a inundaram. Aqueles três vampiros a atacando no prédio da Tina. Radje a trazendo para aqui. Mencheres, marcando um encontro com Radje esta noite, para trocar a vida dele pela dela. Ela não se moveu ou fez qualquer outra coisa para mover as algemas de metal e alertar os guardas de que ela estava acordada. Eles não a deixaram sozinha desde de ontem a noite, para o seu horror. Claro, Radje esteve lá, então talvez os guardas devem ter ficado mais cuidadosos por causa dele. Ela os ouviu nas outras salas. Eles tinham humanos com eles, e aqueles batimentos cardíacos aumentaram a fome dela incrivelmente. Embora o prédio parecesse ser fechado para o público, as ruínas eram uma atração turística, dando aos guardas uma fácil fonte de comida. Mas nenhum guarda estava na sala agora. Radje talvez não estivesse lá também. Talvez ele estivesse a caminho de Atlanta para encontrar o Mencheres. Que horas seriam? Quanto tempo a manhã a manteve adormecida? Kira olhou ao redor, tentando ver se algum raio de sol entrava na sala anterior a dela. Ela não podia esticar o seu pescoço o suficiente para ver alguém, ou eles não estavam lá, mas não parecia estar escuro ainda. Ela ainda tinha tempo. O ritmo acelerado daqueles batimentos cardíacos a chamavam com uma sedução hipnótica, aquilo queimava o seu estômago, a lembrando que ela também não tinha muito tempo. Se ela não pudesse controlar a sua fome, isso a levaria a desmaiar pela loucura de sangue novamente. Mencheres está contanto com você, Kira se lembrou. Ela podia fazer isso. Ela não podia decepcioná-lo. Tão quietamente quanto pode, ela puxou a algema de ferro em volta do seu pulso. Ela estalou de uma forma alarmantemente alta, fazendo com que seus olhos se movessem nervosamente para a entrada da sala, mas ninguém veio. Kira cerrou os dentes e tentou novamente. Os ferros ainda estalaram de


uma maneira que soava como um alarme para ela, mas pelos sons na outra sala, os guardas estavam ocupados com os humanos. Quem saberia o quanto isso duraria? Ela tinha que se apressar. Kira sentiu o ferro começando a se mover da parede. Ela ficou eufórica, mas ao mesmo tempo, escutou um dos guardas resmungar, ― Você ouviu isso? ― Ela fechou os olhos e soltou o corpo bem na hora. O guarda entrou, ondas de sua aura aumentando enquanto ele se aproximava. Uma grande mão segurou seu rosto, muito lentamente para o seu gosto. A mesma mão pegou o seio dela em um forte aperto, mas Kira se obrigou a não reagir. ― Ainda apagada, ― ele murmurou. Alívio a inundou enquanto ela o ouvia voltar aos outros na outra sala. Ela abriu um pouco os olhos, cuidadosa para o caso de ele pretender voltar, mas ninguém estava na sala. Ela devia ser capaz de puxar os ferros da parede, mas eles eram barulhentos demais para que ela pudesse se livrar deles sem alertar os guardas. Kira analisou suas mãos e pés algemados. Ossos quebrados fariam bem menos barulhos do que ferros barulhentos. Tudo que ela tinha que fazer era evitar gritar. Ela lembrou da agonia que sentiu quando Flare destruiu sua mão. Mais fácil falar do que fazer, mas ela não tinha escolha. Kira cerrou os dentes, se preparando. Então ela lentamente, e impiedosamente puxou a mão para baixo, forçando não o ferro da parede, mas sua mão por dentro do círculo, que era muito mais estreito para ela passar. Chamas de dor dispararam pela sua mão enquanto seus ossos se esmagavam, soando como se alguém estivesse moendo grãos de café para a refeição matinal. Ela estremeceu, e lutou para não fazer nenhum som. Quando sua mão se livrou da algema, ela ficou torcida e deformada por alguns segundos; doeu ainda mais enquanto ela curava. Então, ao mesmo tempo em que as chamas na sua mão cediam, as do seu estômago pareciam aumentar. Ela estava louca por sangue. Ela já havia gastado mais da sua já limitada reserva por ter se machucado e curado, e ela ainda tinha uma outra mão e dois pés pela frente. Kira deu uma olhada na sala onde os guardas estavam. Você pode fazer isso, ela disse a si mesma. Radje pensava que ela era apenas uma medíocre vampira nova, indefesa contra essas algemas e os guardas dele. Ela lhe mostraria o quanto ele a subestimou ― e Mencheres. Ela olhou para a sua outra mão. Então, com os dentes cerrados, Kira começou a puxar.


***** Mencheres sentou de pernas cruzadas dentro do círculo, suas mãos nos seus joelhos, sua atenção focada no sol do fim da tarde. Seu rosto para o oeste, na direção de onde a morte vinha. Diretamente a sua frente estava uma faca de prata e um copo vazio. Vlad estava a vários metros do perímetro do círculo, sua mandíbula flexionou e o cheiro de fumo emanava dele. ― Isso é loucura. ― Mancheres pegou a faca de prata. ― Eu te disse para não assistir. Você escolheu apesar disso, mas não deve interferir. Você arrisca mais do que a sua vida se fizer. ― ― Nós vamos até o Radje, ― Vlad rosnou. ― Você vai segurá-lo com o seu poder, e eu vou queimá-lo até que ele te implore para dizer onde a Kira está. Este é um plano viável. Não uma tentativa de conjurar um deus do submundo com um bizarro ritual de magia negra, que provavelmente vai te matar. ― ― Radje não é tolo, ― Mencheres respondeu. ― Ele sabe que se revelar onde Kira está, eu vou matá-lo tão logo eu a recupere. Ou Radje se recusará a relevar a localização dela por tempo suficiente para passar do tempo limite que ele determinou que os guardas a guardem, e então eles vão matá-la. Ele é ousado demais para não ver isso acontecer, e mesmo que eu dê a ele o que ele quer, ele ainda vai matá-la. ― ― Kira ainda pode escapar. Ela é mais forte do que qualquer um deles imagina. Você não precisa fazer isso. ― Mencheres quase sorriu. ― Sim, eu preciso. Na verdade, eu sei que isso já estava predestinado. ― Duat e o deus do submundo estavam além da ponta da faca da prata. Ele a pegou, assistindo a lâmina brilhar na luz do luar. Então ele pegou o copo vazio com a outra mão. ― Registada em seus nomes, conhecidas por seus corpos, gravadas por suas formas são as horas, ― Mencheres começou a recitar do Amduat em sua língua nativa egípcia. ― Misteriosos na sua essência, sem a imagem secreta de Duat sendo conhecia por nenhuma pessoa. Essa imagem é feita em tinta assim com isso no segredo do Duat, na ala sul da Câmara Secreta. Ele que sabe partilhar das oferendas no Duat. Ele que estará satisfeito com as oferendas aos deuses seguidores de Osíris. Todos os desejos lhe serão oferecidos na Terra. ― Quando Mencheres terminou de falar, ele apunhalou a lâmina no seu peito, diretamente no seu coração. A prata queimou com a agonia ardente que


parecia preencher todas as suas veias em um instante. Dá última vez que ele tinha feito um ritual de magia negra, ele tinha usado aço ao invés de prata. Mas para conjurar o barqueiro do submundo, Mencheres precisava de um pagamento maior do que seu sangue e os ossos dos camaradas assassinados. Ele precisava do conhecimento dos símbolos sagrados desenhados no sangue que jorrou da ponta da morte. ― Aken, ― ele entoou. ― Barqueiro dos mortos, governante de Duat. Eu vos conjuro. ― Ele forçou o seu sangue para fora da ferida em seu peito, segurando o copo em baixo. Seu sangue fluiu em um fluxo constante e doloroso, que parecia ácido saindo dele. Quando o copo estava cheio, Mencheres mal podia se mover pela dor, mas ele precisava, mesmo que o menor dos movimentos da lâmina pudesse destruir seu coração e matá-lo. Ele não podia usar o seu poder para manter a lâmina imóvel, ou fazer o que precisava ser feito em seguida. Seu poder era inútil dentro desse círculo. Ele mergulhou seu dedo dentro do copo, cobrindo-o com seu sangue. Apesar do perigo que empurrar a lâmina traria, ele se curvou e começou a desenhar o primeiro dos doze símbolos que acordaria Aken. Assim que completou o primeiro símbolo, sombras começaram a se formar dentro do círculo. Akhs, as almas condenadas do submundo. Se ele não fosse forte o suficiente para completar o ritual, desenhando os doze símbolos, os akhs o consumiriam, varrendo sua alma para Ammut, a deusa Devoradora. A escuridão na sua visão parecia zombar dele. Este seria o infinito Rio da Morte de onde o barqueiro viria, se Mencheres tivesse sucesso? Ou esta seria a infinita escuridão de Duat, onde ele estaria condenado como um dos eternamente sem descanço akhs? Sua falha foi decidida há tempos atrás, e ele passaria a eternidade preso nas sombras que agora o circulavam? ― Mencheres, ― Vlad disse, ignorando o aviso para não interferir. ― Pare isso agora. ― ― É tarde demais, ― ele cerrou os dentes, mergulhando novamente seu dedo no copo de sangue. Mesmo aquele pequeno movimento parecia enviar ainda mais fundo a faca em seu coração. Ele tentou se concentrar no liquido carmesim enquanto ele desenhava o próximo símbolo, tentando ignorar a dor excruciante e a devastadora compulsão de puxar a faca de uma vez. Se ele puxasse a faca, os akhs em volta dele se tornariam corpóreos e o devorariam. Mas quanto mais ele demorava para desenhar os símbolos, mais poder os akhs sugavam. Eles se alimentavam de dor, e a lâmina no peito do Mencheres era um banquete para eles. Quanto mais fortes eles ficassem, mais sólidos se tornariam.


Mencheres mergulhou novamente seu dedo no copo. O sangue de Kira era parte dele, sua essência misturada junto com o sangue de outros doadores de quem ele se alimentou. Esse não seria o mais perto que ele chegaria dela novamente. Ela acreditava nele o suficiente para arriscar sua vida com Radje, uma pessoa que já havia sido responsável por sua morte uma vez. Ele pode ter falhado com ela aquela primeira vez, quando ele tomou sua mortalidade, mas ele não falharia com ela agora. Ele desenhou o terceiro símbolo mesmo enquanto as sombras dos akhs começaram a se contorcer mais rápido em volta dele. Mencheres mudou de posição para fazer com que os símbolos o circundassem, a dor que aquilo causou quase o fez ter uma convulsão. Ele controlou aquilo e lentamente desenhou o quarto círculo. Todos tinham que ser precisos, um erro anularia o ritual e o condenaria. A prata no seu coração parecia ganhar tentáculos, tentando destruí-lo com a sua terrível vontade própria. Ele cerrou os dentes, concentrando-se nas linhas do próximo símbolo que desenhou. Faltavam sete antes que ele terminasse. A dor continuava a queimar dentro dele com ondas impiedosas. Enquanto as sombras dos akh aumentavam a sua dança sinuosa em volta dele, eles perdiam sua aparência vaporosa para formar nubladas formas humanas, bocas abertas no que pareciam ser resmungos. Vlad murmurou algo, mas Mencheres não ouviu. Ele estava muito focado em manter sua mão firme enquanto os trovões e dor quebravam o seu corpo. Quanto mais a lâmina ficasse em seu coração, mais ela o machucaria, despedaçando tanto a sua habilidade de desenhar quanto o instigando a acabar com isso tirando a lâmina mais cedo do seu peito. O ritual não fora projetado para o executor obter sucesso. Ele era designado ao fracasso, por isso Patra nunca usou isto contra ele quando ela tentou matá-lo com mágica. Seis símbolos faltavam. Pelos deuses, ele só estava na metade. Ele jamais terminaria a tempo. Mencheres continuou desenhando independentemente, sua visão quase embaçada graças a toda a dor e os giros dos akhs em volta dele. Eles se solidificavam a cada momento e continuavam a se alimentar da sua dor. Quando eles estivessem sólidos, eles se alimentariam de sua carne. Não demoraria agora. Uma convulsão quase atrapalhou o Mencheres em seu cuidadoso desenho que ele fazia à sua frente. Sua mão se agitou, parando o movimento dele, mas evitando por centímetros que ele borrasse um dos outros símbolos. Ele fechou os olhos, tomando preciosos segundos para que tentasse transformar a dor novamente em algo gerenciavel, mas ela só continuava a se espalhar. Seus olhos se abriram em medo. Quanto mais ele se concentrava em


ignorar a dor, mais ela crescia, assim como os akhs, que agora claramente lembravam pessoas ao invés de figuras disformes. ― Kira estará morta ao nascer do sol se você não terminar isso, ― Vlad encorajou, soando quase rouco em sua agitação. Mencheres focou toda a sua atenção no desenho do oitavo símbolo, deixando a dor fluir livremente pelo seu corpo. Aquilo o balançou, tremendo a lâmina, enviando mais impulsos agonizantes para os seus membros, mas ele apenas se concentrava em manter sua mão firme. Todo o seu corpo começava a tremer, o sofrimento crescia em uma intensidade que ele desejava a morte para que a dor cessasse. Ele só precisava de um tremor maior para empurrar aquela lâmina mais profundamente. Uma mancha sequer em um símbolo terminaria tudo. É inevitável, a escuridão sussurrava sedutoramente. Porque ele deveria sofrer tentando continuar com algo que pode vir a não dar certo? Kira. Morta ao nascer do sol. Ele lutou para manter sua visão e suas mãos firmes. Rosnados vinham dos akhs agora, ficando mais altos enquanto eles sentiam sua vitória se aproximando. Mencheres se obrigou a não olhar para eles, mas a finalizar o desenho do nono símbolo. Aqueles rosnados ficaram mais altos, as pontas dos dedos deles o arranhando enquanto o círculo no qual eles voassem em volta dele ficava mais estreito. Ele não olhou para cima. Ele continuava desenhando mesmo que a dor dentro dele crescia de uma maneira que tudo o que ele queria era torcer a lâmina no peito para se libertar de tudo aquilo. ― Depressa… ― Vlad rosnou. A mão do Menchers se moveu e sua visão nublou assim que ele começou a desenhar o décimo símbolo. Os akhs batiam nele agora, as mãos deles estapeando ás suas costas, braços e ombros, tentando alcançar a lâmina. Ele arqueou o quanto pôde, a angústia daquele movimento fazendo a sua visão desaparecer completamente por um momento. Ele se obrigou a continuar desenhando, usando sua memória para formar as linhas, até que muito fracamente, ele pudesse ver de novo. Sua visão estava reduzida somente a um espaço pequeno, mas naquele espaço, ele podia desenhar o décimo símbolo. Presas afundaram em suas costas, cortando sua carne. Ele deu um grito rouco. Os akhs estavam sólidos o suficiente para começarem a se banquetear. Ele ignorou aqueles dentes o dilacerando enquanto ele terminava o décimo primeiro símbolo. Então, usando toda a sua força para mantê-los longe da lâmina em seu coração, Mencheres começou a desenhar o último símbolo. Agonia explodiu nele, escuridão nadando em sua visão, e sua mão tremeu enquanto os akhs o rasgavam, mas ele continuava a desenhar. O rosto de Kira


surgiu em sua mente, sua boca carnuda com um sorriso. Ele se focou nisso com os seus últimos pensamentos conscientes. Deixe os akhs o devorarem. Deixe a lâmina deslizar profundamente em seu peito. Deixe a escuridão de Duat chegar. Ele não pararia de desenhar o símbolo que levaria à segurança da Kira. Um grande rugido encheu os seus ouvidos enquanto Mencheres desenhava as últimas linhas do símbolo. Então a negritude o chamou, abafando aquele rugido dentro de uma manta eterna de escuridão.


CAPÍTULO TRINTA E DOIS. Mencheres estava sentado dentro do círculo, a faca ainda em seu peito, os símbolos terminados ao redor dele e o copo ainda em sua mão. Tudo aquilo era igual, porém ele sabia que não estava mais no mesmo plano de existência. A ausência de dor foi seu primeiro indicador. O vazio absoluto em torno do círculo, a ausência de tudo exceto a escuridão penetrante, foi o próximo. Então o círculo foi penetrado quando um barco fino flutuou através dele. Uma figura alta de pé no leme, com o corpo e o rosto de um homem, porém os chifres enrolados de um carneiro saindo de sua cabeça. Mencheres se curvou tanto quanto a faca em seu peito permitia. ― Barqueiro, ― ele disse. ― Senhor de Duat. ― Quando Mencheres endireitou o corpo, Aken esticou a mão e arrancou a faca do seu peito como se fosse uma flor no chão. Os enormes chifres se aproximaram da cabeça de Mencheres quando Aken se curvou para lamber a lâmina. Todo o tempo, os olhos amarelos de Aken queimavam dentro dos dele. ― Você pagou sua moeda de sangue para me chamar, Cainenite. O que você procura? ― Faziam milhares de anos desde que Mencheres tinha sido referido como Cainenite, mas o deus do mundo dos mortos provavelmente não estava familiarizado com como aquela palavra tinha sido substituída com a mais atual: ― vampiro. ― Afinal, milhares de anos eram uma mera ninharia de tempo para os deuses. Mencheres se curvou novamente. ― Eu procuro outra Cainenite chamada Kira. Ela se levantou de meu sangue e sua essência ainda permanece em mim. Use meu sangue para encontrá-la e me diga onde ela está. ― ― Me dê seu nome, ― o barqueiro ordenou. Nomes detinham poder. Aken ligaria seu acordo com o dele. ― Menkaure, ― ele respondeu, usando aquele com o qual tinha nascido. O barqueiro lhe deu um sorriso desdentado que mais parecia a boca aberta da sepultura. Novamente, ele lambeu a faca que ainda tinha um pouco do sangue de Mencheres a cobrindo. ― Ela está longe daqui, ― Aken relatou. Aquele sorriso se alargou. ― Vai levar tempo para chegar até ela. ― O sol estava alto no céu quando ele começou esse ritual, mas ele ainda podia não ter tempo suficiente. Se Radje e Kira estivessem localizados em


lados opostos do mundo, ele não teria tempo de chegar aos dois. Tampouco Mencheres confiava em mais alguém para proteger Kira. Sem dúvida de que Radje deixou instruções para os guardas a matarem imediatamente se houvesse um ataque. ― Diga-me onde ela está, ― ele disse. O barqueiro tocou a testa de Mencheres. Imagens de uma cidade decrépita alastrada constituída por templos e monumentos desmoronados, cercada por uma vasta floresta explodiu na mente de Mencheres, combinado com flashes de Kira algemada a uma parede e guardas andando em torno de um grande templo rodeado por pilares. Seu maxilar se apertou. Ele reconheceu aquelas ruínas. Kira estava em Yucatán, México, em algum lugar dentro do Templo dos Guerreiros no complexo da antiga cidade Maia, Chichén Itzá. E ele estava em Chicago, a mais de mil milhas de distância, com um encontro marcado com Radje em Atlanta a meia-noite ou ele ordenaria a morte de Kira. Aken deixou cair os dedos da cabeça de Mencheres e colocou a faca de prata na frente dele. ― Uma vez chamado, meu barco não retorna a Duat vazio. Derrame o sangue de um substituto digno nesta lâmina, ou eu virei para você. ― ― Combinado, ― Mencheres falou em um tom irritado. Então o barqueiro pilotou seu barco para fora do círculo e desapareceu na escuridão do Rio da Morte. Assim que ele se foi, o círculo se dissolveu, atirando Mencheres de volta em seu próprio tempo. A expressão espantada de Vlad foi a primeira coisa que ele notou, o rosto de seu amigo curvado próximo ao seu. ― Eu não acredito nisso, você não está morto. ― Vlad agarrou os braços de Mencheres e o colocou de pé. Por um momento, Mencheres na verdade sentiu tontura como efeito da travessia entre dois mundos se agarrando a ele. Mas então sua mente clareou o suficiente para ele notar que o sol não estava mais tão dolorosamente brilhante como antes. ― Quanto tempo eu estive fora? ― ele perguntou. ― Depois que aquelas coisas rasgaram metade da sua carne de você, você deitou como se estivesse morto por mais de uma hora, ― Vlad disse, resmungando. ― Se eu nunca ver qualquer criatura levantada pela magia negra de novo, vai ser cedo demais. ― Mencheres agarrou os braços de Vlad. ― Eu preciso de um avião. Agora. ―

*****


Kira havia acabado de tirar seu último pé do gancho de ferro do tornozelo quando ouviu alguém vindo. Se vampiros pudessem suar ela estaria coberta de suor. Suas mãos podem ter doído quando ela as puxou para se soltar, mas esmagar seus pés tinha sido quase mais do que ela podia suportar. Foi preciso toda sua força de vontade para não vagar por ai gritando na máxima capacidade de seus pulmões de dor. Libertar seus pés levou mais tempo também. Especialmente adicionando todas as vezes em que os guardas iam perambular lá dentro e ela tinha que, abruptamente, fingir estar dormindo enquanto se agarrava com força aos ferros do pulso e esperava que os guardas não olhassem de perto para eles. Ela ficou tensa em um momento de indecisão, a dor ainda subindo por sua perna enquanto seu pé se curava. Ela devia fingir ainda estar algemada e esperar que o guarda não olhasse para os ferros de perto ― ou tudo? Mas então Kira ouviu a batida cardíaca acompanhando aqueles passos. Quem quer que estivesse vindo para a sala era humano. Ela se preparou para soltar todo o poder que tinha em seu olhar para calar a pessoa se Radje tivesse humanos como guardas assim como os vampiros aqui, mas então seu queixo caiu quando viu quem entrava lá dentro. Somente o conhecimento de que ela se entregaria evitou de Kira suspirar o nome dela. Jennifer Jackson, a jovem garota que Flare tinha forçado a entrar para o strip tease. A mesma garota que desapareceu do clube depois que Radje o incendiou e matou aquelas pessoas. Os olhos de Jennifer estavam arregalados quando ela deslizou para dentro da sala. Nenhuma luz, provavelmente ela não podia ver muito. Kira estava dividida. Se os guardas viessem procurando por Jennifer, eles descobririam que Kira tinha escapado de suas algemas. Se ela dissesse alguma coisa para fazer Jennifer sair, eles ouviriam também. A pulsação de Jennifer estava tão tentadoramente perto, seu batimento cardíaco soava como o sino do jantar. Mais dor torceu suas entranhas e suas presas nasceram de suas gengivas. Só alguns metros separavam Kira de mais sangue que ela poderia começar a beber. Jennifer respirou fundo, seu rosto iluminado por um pálido brilho verde. Kira saltou silenciosamente através da sala, cobrindo a boca de Jennifer. O contato com sua pele quente e pulsante era quase sua ruína. Uma avalanche de necessidade bateu nela, cobrindo Kira como lava ardente. Ela tinha que beber de Jennifer, mas só um pouco. Ela pararia antes de tirar muito... Você vai matá-la. Seus instintos gritaram um claro aviso que mesmo sua mente podre de fome não podia negar. Ela olhou para Jennifer, forçando sua atenção para


longe daquela pulsação batendo a apenas alguns centímetros de sua boca, tentando ouvir os guardas sobre o som do coração disparado de Jennifer. Ela estava muito longe de confiar em tirar até mesmo uma gota. Se ela começasse a se alimentar, ela não pararia até que Jennifer estivesse morta. Você precisa de força para fugir, sua fome a tentava. Tirar uma vida vale por todas as outras que você vai salvar mais tarde se você puder retornar para Mencheres. Os guardas provavelmente vão matar Jennifer de qualquer forma... Kira balançou a cabeça, forçando aquela fome para baixo com uma força que nenhum vampiro novo normal teria. Ela não iria matar uma garota inocente, mesmo que isso significasse uma chance melhor de fugir. Radje tratava a vida com tanto desprezo. Ela não. Jennifer pode morrer de qualquer jeito, mas não seria por sua mão. Não enquanto ela ainda tivesse um pingo de controle nela. Kira colocou o dedo nos lábios em um gesto pedindo silêncio, então lentamente removeu a mão da boca de Jennifer. Quanto mais cedo ela não a estivesse tocando, mais fácil seria não afundar as presas na veia mais próxima de Jennifer. Jennifer não falou, mas lágrimas deixaram seus olhos brilhantes. Ela agarrou sua mão quando Kira tentou afastá-la, a segurando com uma força surpreendente. Leve-me com você, Jennifer moveu os lábios sem emitir som. Kira balançou a cabeça. Encontrar um jeito de passar pelos guardas seria difícil o suficiente sozinha. Tentar fazer isso com uma humana mais lenta, mais barulhenta e mais fraca? Ela nunca conseguiria. Jennifer olhou de relance para trás, para a entrada aberta que levava a sala onde os guardas estavam, então olhou novamente para Kira. Eu conheço uma maneira de sair, Jennifer mexeu a boca. Ela hesitou. Jennifer podia estar falando a verdade. Se ela estava aqui desde a noite do incêndio no clube, ela pode estar bem familiarizada com o desenho do templo ou as extensas ruínas além. Kira só tinha dado uma breve olhada no templo majestoso, com suas centenas de pilares, guerreiros de pedra e degraus íngremes antes dos guardas de Radje a empurrarem para uma pirâmide escondida dentro da pirâmide externa. Isso tinha sido um labirinto de corredores, galerias internas e salas parcialmente destruídas que seria muito difícil navegar sem alertar os guardas da fuga dela. Mas Jennifer também podia estar mentindo por medo de ser deixada para trás. Kira não podia culpá-la por isso, mas ela também não podia arriscar levar


Jennifer. Ela ainda teria muito mais chance sozinha, mesmo que Jennifer estivesse dizendo a verdade. Ela balançou a cabeça dizendo não novamente, de forma mais enfática. As lágrimas que brotavam dos olhos de Jennifer se espalharam por suas bochechas. Por favor, ela pediu em silêncio, aflição e desespero crescendo em suas feições. A voz de Mack soou na mente de Kira, tão forte e clara como tinha sido quando ele estava vivo. Salve uma vida. Ela não podia fazer nada para ajudar os humanos na outra sala com os guardas, mas aqui estava uma pessoa que ela podia ser capaz de salvar se tentasse. Kira agarrou Jennifer. De jeito nenhum elas conseguiriam se ela se limitasse a velocidade humana de Jennifer; ela teria que carregá-la. Silenciosamente, ela implorou para ter forças de fazer isso sem ceder àquele impulso irresistível de se alimentar. Tudo o que sua fome via era um monte de artérias suculentas nos braços dela, mesmo que sua mente reconhecesse uma garota apavorada e traumatizada que precisava de ajuda. Mostre-me, Kira mexeu a boca. Jennifer apontou, e Kira se lançou para o lado oposto da sala, por onde Jennifer tinha entrado.

***** Mencheres tamborilava um dedo no descanso de braço dentro do jato Falcon 20. Era o único sinal visível da tensão fervendo dentro dele. Tinha se passado quatro horas desde que Aken disse a localização de Kira e menos de três dessas horas tinham sido passadas voando. Foi preciso uma hora para chegar na empresa mais próxima de aluguel de jatos particulares em Chicago e forçar os humanos a levar Mencheres e Vlad para um vôo não programado imediatamente, mas então mais preciosos minutos se passaram enquanto abasteciam e preparavam a aeronave. Então ele não podia forçar os pilotos a forçar o avião em sua velocidade máxima porque o avião só podia viajar quinze mil milhas antes de ter que reabastecer ― quase a distância exata de Chicago para o centro norte da Península de Yucatán, onde as ruínas de Chichén Itzá estavam. Se o avião queimasse mais combustível indo mais rápido do que sua velocidade de quase cinco mil milhas por hora, eles iriam ficar sem combustível antes de alcançar seu destino. Mas agora, era hora de notificar outros de onde Kira estava, apenas no caso de ele falhar em resgatá-la a tempo.


― Eu preciso do seu telefone, ― Mencheres disse a Vlad. Ele entregou o telefone. Mencheres discou para Bones primeiro, olhando pela pequena janela para a escura vastidão de água abaixo deles. O Golfo do México. Eles estavam a menos de uma hora de Chichén Itzá. ― Tepesh, ― Bones atendeu seu telefone, não se importando em dizer alô. ― Você sabe onde Mencheres está? ― ― Estou aqui, ― Mencheres respondeu calmamente, mesmo que ele sentisse tudo menos calma. ― Maldição, ― Bones perdeu o fôlego. ― Da última vez que falei com você, eu pensei… ― ― Eu pensei o mesmo, ― ele interrompeu com uma pitada de ironia. ― Mas parece que aquele destino em particular não era para mim. ― Sua escuridão ainda pode encontrá-lo, mas não da forma de ser pego na armadilha de um dos akhs da Devoradora porque ele falhou em completar o ritual. ― Onde você está? ― ― Em um avião a caminho de Chichén Itzá na Península de Yucatán. É onde Radje tem Kira. Eu preciso que você venha aqui. Se eu conseguir libertála, alguém ainda vai ser necessário para forçar um dos guardas a confirmar para Radje que tudo está bem quando eu encontrar com ele mais tarde. ― ― Você precisa dele para isso? ― Vlad parecia levemente ofendido. ― Eu sou duas vezes mais velho e duas vezes mais capaz. ― ― Ligue para Veritas e diga a ela onde Kira está, ― Mencheres continuou, não se dirigindo ao comentário de Vlad. Ele e Bones sempre tinham sido em contradição um com o outro, sem dúvida devido a natureza similar deles. ― Diga a ela para vir, mas para não informar os outros Guardiões. Eu não posso arriscar que isso chegue a Radje. ― ― Você ainda está tentando me manter do lado bom dos Guardiões para o caso de você não retornar disso, ― Bones disse em tons ásperos. ― Sim, ― Mencheres respondeu logo. ― Nossa linhagem deve ser protegida, não importa o que. ― ― Avô, eu... ― Bones parou, sua voz se detendo. Mencheres sorriu levemente. Bones pode chamá-lo de avô porque ele fez o vampiro que mais tarde transformou Bones, mas Mencheres sabia que ele não era o único que sentia que o relacionamento deles era mais de pai e filho. ― Não precisa ser dito. Eu sei. ―


Então ele desligou, encontrando o sarcástico olhar cor de cobre esverdeado de Vlad. ― Por que você e Cat se importam tanto com aquele camponês de rua, eu nunca vou saber. ― ― Porque nós vemos mais nele do que você se importa de olhar, ― Mencheres respondeu. ― Você era pior na idade dele. Eu lembro, eu estava lá. ― ― Se você queria enviar Veritas e Bones, por que não ligou para eles a tempo de chegarem com a gente? ― Vlad perguntou, mudando de assunto. Mencheres olhou para fora da janela novamente. ― Veritas estará mais interessada em obter provas contra Radje do que em salvar a vida de Kira. E agora Bones e Cat terão a oportunidade de fazer as pazes com ela ao passar isso pessoalmente. Veritas é uma aliada valiosa, mas eles têm uma história com ela para superar. ― ― Você vai precisar manter vários guardas vivos. Você não sabe para qual deles Radje deve ligar mais tarde. ― Mencheres lhe lançou um olhar medido. ― É por isso que eu precisava mais do que apenas você aqui quando eu sair para encontrar Radje ― porque eu não posso levar Kira comigo. ―


CAPÍTULO TRINTA E TRÊS. Kira correu pela selva com Jennifer agarrada a ela. O sol havia se posto, mas aquilo apenas deixou a visão da Kira mais sombria, ao invés de mergulhála totalmente na escuridão, como parecia para Jennifer. Ela tinha os braços em volta do pescoço de Kira, o que trouxe a sua garganta a meros centímetros da boca da Kira. O constante pulsar do corpo de Jennifer pressionado ao dela era quase o suficiente para fazê-la delirar com necessidade. Aquela dor queimante nela era tão constante que ela não se lembrava mais quando não a havia sentido. Kira correu mais rápido, tentando fazer mais do que apenas iludir os guardas que ela podia ouvir a perseguindo. Ela tentava esquecer a sua fome, aquela coisa irracional e constante que a fica instigando a satisfazê-la com a pessoa perto da sua boca. Você não pode evitar, a sua necessidade gritou para ela. Não é sua culpa. Você é uma vampira nova, ninguém poderia resistir a isso. Eu posso, Kira disse para a sua fome. Ela não era apenas uma nova vampira. Ela era uma nova vampira que tinha alguns dos incríveis poderes de Mencheres correndo em suas veias. Foi por isso que Kira acordou horas antes do que os guardas esperavam que ela acordasse. Por isso ela podia ficar quase dois dias sem se alimentar e não ficar louca pela fome. Por isso ela podia esmagar todos os ossos das suas mãos e pés sem fazer um único som, e por isso ela conseguia evitar cortar a garganta da Jennifer agora. Mencheres disse que ela precisaria de poder extra se Kira fosse se deixar ser sequestrada por Radje. Ele se recusou a concordar com o seu plano, não importando o quanto Vlad e Veritas tenham insistido que Kira estava certa, e essa era a melhor maneira de conseguir uma prova irrefutável do envolvimento do Radje ao resto do Conselho dos Guardiões. Então apesar de ter sido objetiva, Kira tinha deixado o Mencheres extrair um pouco do poder que Radje havia desejado durante milhares de anos, embora em uma pequena dose. Então tudo o que Kira tinha que fazer era esperar ser sequestrada quando ela foi ver Tina, encobrindo esse novo poder para que Radje e os guardas fossem enganados com um falso poder de segurança, nunca sabendo que Kira tinha um pouco do legado de Cain correndo em suas veias. Agora ela estava usando o poder para carregar Jennifer dentro de uma densa mata fechada mexicana com quem sabe quantos vampiros atrás dela. Se ela tivesse somente a energia de um novo vampiro, esses guardas a teriam capturado há um tempo, mas ela tinha uma força e velocidade que eles jamais puderam prever. Ela confiou em Mencheres para quebrar aquela barreira em sua mente e encontrá-la, mas seria melhor para os dois se ele não tivesse que lutar através do templo para chegar até ela. Radje deixou ordens para matá-la


e aos outros humanos se alguém atacasse. Kira não pode ficar algemada a uma parede e esperar que Mencheres fosse forte o suficiente para evitar que cada guarda seguisse aquela ordem, enquanto ela esperava inutilmente, esperando ser salva. E se Mencheres não pudesse encontrá-la pelo seu poder, então ela precisaria salvar ambos. Ela teria conseguido escapar. Agora ela tinha que ficar longe o suficiente para Mencheres as encontrar. Ou para os guardas admitirem ao Radje que a haviam perdido enquanto ele ligava para oferecer provas ao Mencheres de que ela estava viva. Seria prova suficiente para que os outros guardiões fritassem o Radje. Kira usou esse pensamento como um incentivo extra para ir mais rápido, enquanto ela continuava a correr pela selva. Apenas fuja deles por algumas horas. Mencheres teria a sua prova dessa maneira. Ela podia fazer isso. Então Kira ouviu algo na selva à sua frente. Algo não animal ou natural. Ela diminuiu, afastando Jennifer dela ao mesmo tempo em que fazia sinal para ela ficar quieta. Um dos vampiros devia ter ultrapassado ela. Eles tinham se separado para procurá-la, Kira tinha ouvido pelos seus gritos ocasionais, mas a maioria deles estava bastante atrás. De alguma forma, aquele a ultrapassou. Talvez ele possa voar. Isso explicaria. Ela não tinha esperança de fugir dele, não carregando a Jennifer. Se ela pretendesse passar por ele, teria que encontrar um meio de matá-lo.

***** A Península de Yucatán estava abaixo deles, os restos da antiga cidade Maia de Chichén Itzá, tentadoramente perto. Mencheres levantou e instruiu os dois pilotos a pousarem na primeira estrada vazia ou adequadamente longa e larga o suficiente para eles pousarem. Ele não podia permitir que os pilotos pousassem no aeroporto, não enquanto Radje poderia ter espiões como uma precaução extra, esperando por Mencheres ou alguma de suas pessoas. Outro brilho do seu olhar, e os pilotos começaram a procurar por uma pista incomum. O avião era pequeno o suficiente para não precisar de muito para pousar com segurança. Ele estava quase voltando para o seu assento quando sentiu uma dor em sua mente que ele não sentiu em muitos meses ― e não esperava experimentar novamente. Mencheres congelou em descrença, muito surpreso para responder mesmo que uma parte dele tenha registado que Vlad perguntou o que estava errado. Imagens encheram sua mente, algumas mais nítidas do que as que ele estava acostumado, mas inconfundíveis. Kira correndo pela selva, uma mulher presa em seus braços. Um vampiro aguardando à frente, outros mais atrás, porém se aproximando dela. Kira


colocou a mulher no chão, virou-se e correu em direção ao vampiro, agarrandose com ele enquanto ela lutava para arrancar a faca de prata dele… Ele virou para os pilotos. ― Devagar, ― ele ordenou, seu olhar um pouco verde. ― Voem sobre Chichén Itzá. Quando estiverem a nordeste dela, desçam o mais baixo que puderem. ― ― O que você está fazendo? ― Vlad exigiu. Ele se virou, determinação e surpresa girando dele dentro. ― Kira não está no Templo dos Guerreiros em Chichén Itzá mais. Ela está na floresta ao norte dele. ― Vlad começou a sorrir. ― Você viu isso? ― ― Sim. ― A voz do Mencheres ficou grossa pela emoção. ― Em uma visão. ―

***** O vampiro deu uma joelhada no estômago de Kira. Dor explodiu por ela, mas ela manteve seu aperto na faca dele. As presas dele penetraram no ombro dela, rasgando sua carne, mas enquanto aquele golpe queimava dentro dela, Kira se lembrou que ele não podia matá-la daquela maneira. E ela tinha presas também. Ela o girou até estar em cima do vampiro. Todo o treino na academia de polícia, mais muitos anos de aula de defesa vieram à tona, misturados à sua força sobrenatural, o poder do Mencheres e a fome que ainda queimava dentro dela. Ela deu uma cotovelada no rosto do vampiro, sentindo ossos quebrando em ambos, mas ela não hesitou em continuar batendo o mesmo cotovelo no rosto dele, uma e outra vez. O quarto golpe dela o cegou. Então os joelhos dela esmagaram as costelas dele antes que ela se abaixasse, usando suas presas para arrancar a faca da mão dele. Antes que ela pudesse pensar, Kira enfiou aquela lâmina no peito do vampiro o mais forte que ela pode. Seu grito instantâneo foi interrompido quando ela torceu a lâmina com força, sentindo toda a força dele de repente sumir. O corpo dele ficou mole, a sua cabeça caiu para trás, e a luz verde apagou-se dos olhos dele. Kira suprimiu sua urgência de se lançar para longe dele em repugnância. Ela não tinha tempo de se recriminar pela necessidade de matá-lo. Ela arrancou a lâmina do peito do vampiro, agarrando-a com força enquanto ela se virava para pegar a Jennifer. Com todos os sons da floresta, inclusive o ruído de um avião sobrevoando-as, Kira não podia usar os batimentos e a respiração da Jennifer para localizá-la. Isso era uma coisa boa, entretanto. Significava que os outros vampiros não podiam também.


Impaciência, raiva e desespero inundaram Kira inesperadamente, quase sobrepujando a ardência que ela sentia pela sua fome. Ela correu mais rápido na direção que ela deixou a Jennifer. Será que algum vampiro a alcançou? Seria por isso que os seus instintos estavam ficando selvagens de repente? Maldição, Jennifer já tinha passado por muita coisa! Se um daqueles guardas a tivessem achado e machucado ela novamente, Kira iria matá-los em seguia. Seu aperto na faca aumentou enquanto ela mergulhava, se machucando por entre a vegetação densa. Aquele desespero ficava mais forte, batendo forte dentro dela junto com a sua fome dolorosa. Sons a faziam virar a cabeça de um lado para o outro, e ainda ecoavam a frente dela, onde Jennifer supostamente estava. Medo correu pela sua coluna. Os guardas. Eles conseguiram cercá-la. Kira diminuiu. Ela podia ter um pouco dos incríveis poderes de Mencheres a alimentando, mas ela não seria capaz de dar conta de todos. Sua única chance era um de cada vez, e até mesmo aquelas probabilidades eram baixas. Ainda assim, ela não iria soltar a faca e desistir. Ela deu a volta, se direcionando aos sons mais próximos a ela, se sentindo quase consumida pelo desespero dentro dela. Lá! Seu subconsciente parecia gritar. Bem ali! Ela sentiu uma explosão de eletricidade, tão repentina e devastadora quanto um raio. Kira congelou tão abruptamente que parecia que ela tinha corrido em direção a um muro invisível de concreto. Por um segundo, ela estava entrando em pânico, olhando para baixo para ver se ela havia sido atravessada por múltiplas armas, para explicar o porquê de ela não conseguir se mover. Mas então algo mais correu pelo seu subconsciente, substituindo aquele desespero anterior com ondas de alívio e paciência. Foi então que ela percebeu que ela não estava sentindo as emoções dela. Eram as de Mencheres. Ele estava ali. Braços fortes a envolveram em seguida, girando-a em um abraço que crepitou com um poder familiar. A paralisia de Kira desapareceu, permitindo que ela se virasse e o encarasse. Os olhos do Mencheres flamejaram em esmeralda, sua expressão feroz enquanto ele a encarava. Ela puxou a cabeça dele antes que ela pudesse pensar, se glorificando com a intensidade da paixão enquanto Mencheres a beijava como se fosse a última vez que ele pudesse fazer isso. Muito rapidamente ele se afastou, lembrando a Kira que eles estavam cercados de guardas inimigos, e que agora não era o momento de ela mostrar a ele o quanto sentiu sua falta. Mencheres acariciou seu rosto antes de se afastar, e então abriu seus braços. Ondas de trovão invisível sacudiram a selva. Os olhos de Kira se arregalaram e tudo ficou silencioso com uma brusquidão que era assustadora.


Mesmo os sons dos pássaros e animais cessaram, deixando somente o farfalhar das incontáveis folhas e árvores para quebrar o repentino e impressionante silêncio. Um peso parecia pressioná-la, as vibrações do poder dele engrossando o ar em uma densidade que era palpável. ― Ai estão vocês, ― Mencheres murmurou. Aquele peso diminuiu, e os animais recomeçaram suas caças e chamados noturnos. A abundante sensação do seu poder permanecia no ar, apesar, e Kira não deixou de notar que seus perseguidores haviam ficado em silêncio no mesmo momento que ela sentiu como se tivesse sido atingida por um raio. ― Você, ah, deu conta de todos? ― Ela perguntou. Um pequeno sorriso cruzou o rosto do Mencheres, relaxando a ferocidade em sua expressão apenas por um momento. ― Sim, eu os peguei. ― Então sons lentos e misturados passaram por eles. Um por um, os guardas do Radje caminhavam em direção a eles, formando um círculo. Seus passos eram perfeitamente sincronizados, mas o medo em suas expressões dava a impressão de que eles não controlavam suas próprias ações. Uma luz azul assustadora passou pela floresta, centenas de metros à frente. Kira olhou para o Mencheres, mas ele não parecia assustado, e o toque de emoção que ela sentiu dele era uma determinação gelada e alívio, não medo. Então ela não disse nada enquanto a luz se aproximava. Depois de alguns momentos, Vlad Tepesh apareceu por entre os galhos, seus cabelos negros se movendo com seus passos, uma de suas mãos em chamas azuis apertava a garganta de um vampiro que ele trouxe com ele. ― Olá, garotos, ― ele falou lentamente enquanto entrava no círculo dos vampiros guardas que agora estavam parados. As chamas em suas mãos brilharam mais, espalhando-se pelo vampiro que ele segurava, até que o corpo do guarda estava envolto. Vlad o lançou no centro do círculo, nem um fio da sua roupa queimado embora o vampiro gritando estivesse retorcido em um mar de chamas. ― Então, ― Vlad disse com uma crueldade prazerosa. ― Quem quer falar, e quem quer queimar até a morte? ―


CAPÍTULO TRINTA E QUATRO. Mencheres não estava surpreso que só fosse necessário matar alguns dos guardas antes que o resto ficasse ansioso para contar tudo o que sabiam sobre o resto do seu contingente, suas localizações, qual deles era suposto que Radje fosse contatar, e tudo mais que ele perguntasse. Radje não havia escolhido mercenários mais velhos e maduros que precisariam de mais incentivo, porque eles perceberiam que o seu destino era a morte de qualquer maneira, por suas participações nesses crimes. Ele escolheu jovens vampiros tolos, que ele mesmo transformou secretamente. Alguns que fariam suas tarefas sem perguntarem muito, e poderiam facilmente desaparecer quando Radje não precisasse mais deles. Kira ficou com a garota humana que Mencheres reconheceu do clube, somente ao avistar. Era óbvio que ela não se preocupava em testemunhar os interrogatórios agressivos, mas ela nunca questionou a necessidade deles. Ela queria voltar para checar os outros humanos no templo onde ela foi prisioneira, mas Mencheres pediu paciência. Eles tinham que ter certeza de que não restava nenhum guarda nas outras partas de Chichén Itzá que alertariam Radje da presença deles. Seus sentidos não captaram mais do que dezessete vampiros que haviam perseguido a Kira na floresta, mas ele não queria correr riscos. Somente após aqueles ainda vivos revelarem que eles eram a guarda inteira do Radje que havia sido enviada para perseguir a Kira, Mencheres se arriscou a voltar com Vlad e Kira às ruínas do templo. Foi arrogância ou paranóia que fez com que Radje deixasse tão pouco do seu pessoal para guardar a Kira? Ele temia que um número maior pudesse traí-lo se um de seus auxiliares fosse dedo duro, e chegasse ao conhecimentos dos Guardiões o que ele havia feito? Ou ele realmente acreditava que Mencheres se preocupava tão pouco com Kira ao ponto de não esperar que ele tomasse nenhuma medida possível para salvá-la, sabendo que Radje não a libertaria como de acordo? Radje pode ter acertado ao pegar ninguém além da Kira. Só pelo conhecimento que a vida dela estava em perigo, isso deu forças ao Mencheres para terminar o ritual de conjurar o Aken. A localização de nenhuma alma era invisível ao barqueiro dos mortos, embora Radje pudesse nem saber sobre o ritual de conjurar Aken. Poucos na sua raça sabiam sobre as magias mais negras. A única razão de Patra saber executar aqueles feitiços que ela usou foi porque Mencheres ensinou a ela quando eles estavam juntos ― um erro pelo qual ele pagou caro.


Sim, algum conhecimento era melhor ser tratado como perdido para o mundo. Ele olhou para a lua. Ele teria que partir na próxima hora para se encontrar com o Radje. Uma onda familiar de energia alcançou os seus sentidos. Somente dois dias atrás existia apenas um vampiro que ele podia sentir dessa maneira. Mas agora que ele havia divido uma porção do seu poder com Kira, ela estava irrevogavelmente presa aos seus sentidos também. ― Bones está aqui, ― Mencheres declarou. Vlad levou uma sobrancelha enquanto ele pregava um guarda nas paredes do templo com facas de prata. ― Ele devia estar mais ao sul do que nós quando nós partimos. Você ligou para ele há menos de duas horas atrás. ― Kira apareceu na entrada, sua expressão triste e furiosa. ― Encontrei seis corpos aqui, mas pelo que Jennifer disse, existem ainda mais pessoas mortas. Os guardas despejam os corpos nas selvas em turnos á noite. ― Vlad enfiou outra faca de prata no pulso do guarda. Mencheres o manteve imóvel agora, mas assim que ele partisse, isso ajudaria a prendê-lo. ― Vampiros como você me deixam puto, ― Vlad murmurou. ― Deixando uma trilha de corpos para os humanos ficarem desconfiados quando não há necessidade de matar para se alimentar. Você já teve uma vila de colonos armados com tochas e forcados queimando sua casa e gritando ‘morte ao vampyre!’? Eu já, e é irritante além da imaginação. ― ― Você conhece aqueles velhos Romanos. ― A voz do Bones veio pela entrada do templo. ― Muito malditamente irracionais. ― ― Você prometeu que não iria começar com ele… ― A voz da Cat, falando mais suave do que o Bones havia falado. Mencheres ignorou ambos os comentários para escorregar seus braços em volta da Kira. ― Eu tenho que partir logo. Você ficará a salvo com os três aqui. ― O olhar verde dela penetrou o dele. ― Eu diria para você não ir, porque Radje é muito perigoso, mas você só repetiria o mesmo argumento de necessidade de prova irrefutável que eu usei para convencê-lo a deixar o Radje me sequestrar da casa da minha irmã, não é? ― ― Como eu já havia dito antes, você é sábia, ― Mencheres murmurou. Uma estranha alegria o preenchendo, e excitação misturado com o fato de que ele não se sentia… ele não conseguia se lembrar há quanto tempo. Suas


visões não o haviam abandonado. O lampejo de Kira na selva provou isso, e, se elas não tinham, então ele teria uma chance no futuro, afinal de contas. O que fez a diferença? Teria sido completar o ritual que, certamente, devia tê-lo matado? Ou Kira estaria correta, e a parede de escuridão bloqueando sua visão foi criação dele mesmo? Talvez o toque do deus quando Aken mostrou a ele onde Kira estava, tenha removido esse bloqueio. Ou, ele teria conseguido derrubar ele mais cedo, mas não via os frutos daquilo imediatamente. Ele não sabia. Tudo o que ele sabia era que agora, apenas um obstáculo ficava no seu caminho para uma vida com a Kira. Radjedef. Mencheres pretendia remover esse obstáculo. ― Eu sinto o cheiro de Radjedef aqui, ― uma voz que ele não esperava afirmou na sala fora da deles. ― E algo mais também. Velho, e… familiar. ― ― Veritas, ― Mencheres disse, surpresa enfeitando seu tom. ― Ela pegou uma carona com a gente, ― Cat anunciou, suas sobrancelhas levantando enquanto ela entrava na sala e via o Vlad pregando os guardas na parede. Vlad parou para dar a ela um sorriso torto. ― Eu a receberia com um abraço carinhoso, Cat, mas como você pode ver, estou um pouco ocupado. Bones, sinta-se a vontade para usar essas facas restantes nesses três guardas. ― ― Em tempos como este, você deve sentir falta das suas lanças de madeira, ― Bones observou enquanto ele começava a juntar as facas, dando um olhar gelado aos guardas que estavam esperando no canto. Vlad rosnou. ― Eu sinto sempre. ― ― Trouxe algo para você, ― Cat disse a Kira, segurando uma sacola de shopping. ― Não pensei que eles a manteriam alimentada enquanto tivessem você. ― Mencheres deu a Cat um olhar de gratidão enquanto Kira abria a sacola para revelar várias bolsas lacradas de sangue. Ela teria se recusado firmemente a se alimentar de alguns daqueles humanos que estavam presos, dizendo que eles já haviam sofrido o bastante. Agora ele não teria que leva-la até um hotel que estava próximo das ruínas para Kira saciar a sua fome ardente em convidados não suspeitos. ― Obrigada, ― ela disse a Cat. Então ela virou a sua atenção para Veritas, que verificou a sala com eficácia silenciosa. ― Você sentiu o cheiro de Radje. Seus guardas podem confirmar que receberam ordem dele para me sequestrar. Eu posso certamente atestar que


Radje me manteve lá contra a minha vontade, e não disse nada disso para nenhum dos Guardiões. Isso é prova suficiente de que ele é um canalha? ― Ela perguntou com um tom inflexível. ― Para mim é. ― Veritas aproximou-se dos guardas, dando a eles uma avaliação crítica. Então ela se virou, farejando novamente, franzindo. ― Mas para o resto do concelho, do qual alguns são amigos próximos de Radjedef, isso é apenas uma prova circunstancial sustentada por testemunhos questionáveis. ― ― Você não pode estar falando sério, ― Kira começou. ― Mesmo que o concelho estivesse satisfeito, eu ainda iria até Radje, ― Mencheres interrompeu sua resposta furiosa. Ele acariciou o rosto dela. ― Não somente por evidência. Por recompensa. ― O nariz da Cat se enrugou, enquanto ela farejava próximo a ele. ― Não querendo ser rude, mas que cheiro é esse? Parece que você se banhou em corpos mortos ou algo parecido. ― ― Eu notei isso também, ― Kira disse. Seu olhar ficando nublado. ― Me preocupou. ― Vlad continuou segurando os guardas, seu rosto ficando cuidadosamente impassível. Bones levantou uma sobrancelha para Mencheres, aguardando. Ele não disse nada, mas o olhar de Veritas se estreitou. Ela caminhou na direção dele, inalando profundamente perto do seu peito, tão perto da cabeça dele quanto ela poderia alcançar sem flutuar. ― Exatamente como você soube onde Kira estava? ― Veritas exigiu. ― Por uma visão, ― Mencheres respondeu. Isso era parte da verdade. Apenas não inteiramente. ― Eu sabia que você podia ultrapassar aquele bloqueio na sua mente, ― Kira murmurou, lhe dando um aperto no pulso. Veritas inalou novamente, então ela deu um passo para trás, seu olhar verde mar ficando duro. ― Você cheira a Aken. ― Vlad praguejou. Cat e Kira perguntaram, ― Quem é esse? ― ao mesmo tempo. Mencheres não disse nada, sustentando o olhar de Veritas. Ela reconheceu o cheiro do senhor do submundo. Só havia uma maneira de Veritas poder fazer isso ― se ela tivesse anteriormente conjurado o Aken também.


Parece que ele não foi o único com quem Tenoch compartilhou os segredos do ritual. Ele e Veritas estavam empatados. Conjurar o barqueiro era um ato de magia negra e uma transgressão nas leis dos vampiros. Se ela confrontasse Mencheres sobre esse crime, ela teria que confessar o dela mesmo. ― Agora você sabe a outra razão porque eu tenho que ir até ao Radje, ― Mencheres disse de forma calma. Veritas reconheceu o impasse deles com uma inclinação de cabeça. ― Eu sei. Eu nem sempre fui uma Guardiã. ― Então seu olhar endureceu novamente. ― Você deve se apressar. O barqueiro não tarda, e o barco dele nunca parte vazio. ― ― Sobre o que vocês dois estão falando? ― Kira perguntou. Ele beijou o topo da cabeça dela. ― Eu contarei quando retornar. ― Cat limpou a garganta. ― Eu sei que perdi um monte de subtexto aqui, mas eu entendo ‘pressa’. Nós três viemos em um dos jatos novos do meu tio. Você sabe que o governo tem acesso aos aviões mais rápidos disponíveis, então se você está com pressa, você pode pegar meu transporte. Você terá que se apertar na parte das armas, então não é confortável, mas é rápido. ― Mencheres considerou a oferta dela. Ele preferia ficar longe de qualquer coisa envolvendo os governantes humanos, mas seu tempo estava ficando curto. ― Eu tenho um avião, mas precisa de combustível. ― Cat sorriu. ― O meu não precisa ― e eu mencionei que ele era rápido? ―


CAPÍTULO TRINTA E CINCO. O edifício do Banco da América se elevava imperialmente sobre o resto dos arranha-céus na paisagem urbana de Atlanta. Luzes refletiam as vigas de aço banhadas a ouro, que se cruzavam em uma grade aberta projetada para formar, de todas as coisas, uma pirâmide brilhando no topo. Mencheres estava no telhado ao lado, na Torre Symphony, encarando o arranha-céu de mais de trezentos metros. Quão apropriado Radje ter escolhido este lugar. A inimizade deles começou nas areias do planalto de Gizé, mas acabaria aqui, dentro da reluzente pirâmide construída não por Antigos faraós, mas pela indústria humana. Ele voou algumas outras dezenas de metros e pousou no exterior da torre, deslizando entre as vigas em seu interior convexo. Luzes dos prédios abaixo dele empalideceram contra o brilho dramático do ouro, que projetava uma teia de metal no espaço. Nessa altura, o vento sacudia fortemente suas roupas e cabelo quando Mencheres avistou seu velho inimigo de pé sobre uma viga, doze metros acima dele, de costas para Mencheres, olhando para a cidade abaixo dele. ― Você se lembra quando o edifício mais alto era a pirâmide de Khufu? ― Radje disse, sem se virar. ― Precisou de milhares de homens e dezenas de vampiros para construí-lo. Eu costumava me sentar no topo e olhar para o povo, maravilhado com quão menores eles pareciam daquela grande altura. Agora olhe. Os mortais fazem estruturas que achatariam o feito mais magnífico de Khufu, e eles as erguem em menos de um ano. Como o mundo mudou. ― Mencheres não olhou para as dezenas de edifícios impressionantes para os quais Radje apontou, mas para o homem que esteve em sua vida desde seu nascimento. Quando Tenoch se matou, Radjedef se tornou a última pessoa que conheceu Mencheres desde antes de ele ser um vampiro. Ele e Radje eram os últimos da Quarta Dinastia de Faraós ainda vivos. Lastimável que a inveja insaciável de Radje e sua sede de poder os tenha trazido a isso. ― O mundo mudou, é verdade, e o passado está enterrado sob mais do que as areias do tempo, ― Mencheres respondeu. ― Eu estou contente em deixá-lo descansar lá. ― E ele estava. O peso que ele tinha carregado enquanto se focava em seus antigos pecados não fizera nada mais do que sobrecarregá-lo e pôr em perigo o seu povo. Aquele até mesmo quebrou o seu poder, destruindo suas visões e, finalmente, sua vontade de viver. Não mais. Ele cometeu erros ― sim, muitos ― mas aqueles ele não podia mudar. O seu futuro ainda não estava escrito, no entanto. Como Kira tinha


provado, havia mais nele do que apenas o limbo, não importa o quanto seu desespero o havia enganado a acreditar em nada exceto a escuridão eminente. ― Menkaure, ― Radjedef disse, virando-se para enfrentá-lo. ― Está na hora de terminar isso. ― ― Sim, ― ele respondeu com firmeza, pensando nos milhares de anos de amargura, sangue, e conflitos entre eles. ― Mais do que na hora. ― Mencheres pulou para uma viga na frente do Radje. A próxima rajada de vento levou uma amostra de decadência e magia misturadas com o cheiro do Guardião da Lei, em vez de apenas os odores normais da cidade. Mencheres inalou enquanto a boca do Radje se curvava em um sorriso cínico. ― Você veio sozinho como combinado, mas eu não acreditei em você se render tão facilmente. ― Mencheres soltou uma risada curta. Radje havia se coberto com um feitiço de essência de sepultura, a única coisa que neutralizaria a telecinese do Mencheres contra ele. Radje foi cauteloso até o fim, mas isso não seria suficiente. ― Sua preocupação me lisonjeia, tio, ― ele disse levemente. O olhar de Radje o sondou, cuidadoso e esperançoso. ― Você não é o único a quem Tenoch ensinou as artes negras. Agora, tire suas roupas. Em seguida as atire no lado do edifício. ― Mencheres fez um som de escárnio quando ele começou a tirar seus sapatos, calças e camisa. Quando ele estava nu, ele jogou tudo para o lado após uma olhada para se certificar de que ninguém estava em baixo. As roupas não iriam ferir qualquer humano; os sapatos iriam, por causa da altura. ― Você pensou que eu iria usar uma escuta? Esse é um truque humano, Radje. ― ― Vire-se, ― Radjedef disse imediatamente. Mencheres fez, mostrando suas costas e sufocando seu desprezo quando ele sentiu Radjedef rudemente mexendo nos seus cabelos, procurando por quaisquer dispositivos eletrônicos. ― Você sabe que vampiros não podem esconder escutas por baixo da pele. Você está satisfeito que eu não tenho qualquer meio para registrar algo falado entre nós? ― Radjedef o avaliou, o vento açoitando as tranças apertadas do seu cabelo quando ele inalou para captar o odor de Mencheres. ― Você cheira impaciente, Menkaure. Você está realmente tão ansioso para morrer? ―


Ele encontrou seu olhar. ― Dê-me a minha prova de que Kira está viva, e deixe-nos terminar esse negócio entre nós. ― Radje tirou o seu celular, discando. Mencheres esperou, pensando em como ele odiou lavar todos os traços do cheiro de Kira antes de encontrar Radjedef, mas isso foi necessário. Qualquer sugestão dela, Veritas, os guardas de Radje, ou o barqueiro iriam alertar o Guardião da Lei da sua derrota, e Mencheres não queria que ele soubesse disso. Ainda não. Kira. Sim, ele cheirava impaciente. Ele estava há muito tempo sem ela. Mesmo antes daquela fatídica manhã no armazém, uma parte dele ansiava por ela. A mesma parte que reconheceu ela quando eles se encontraram, e depois atormentou Mencheres quando ele tentou esquecê-la. ― Shade, leve o telefone para a prisioneira. Force-a a falar nele, ― Radje disse secamente quando o seu guarda respondeu. Após alguns segundos, Mencheres pôde ouvir Shade dizendo para Kira falar, então Radje estendeu seu telefone, e sua voz encantadora flutuou sobre a linha para ele, mesmo com o turbilhão de ventos. ― Mencheres? ― ― Eu estou aqui, ― ele disse, encontrando o frio olhar expectante de Radjedef. ― Eu te amo. Agora, coloque Radje de volta no telefone. ― As sobrancelhas de Radje levantaram, mas ele segurou o telefone mais próximo de sua orelha. ― O quê? ― ― Veritas está aqui, ― Kira disse claramente. Os olhos de Radjedef se arregalaram. ― Há uma vaga aberta para Executor desde que você matou Josephus, ― ela continuou. ― Veritas disse que o treinamento leva séculos, mas eu vou fazê-lo. O mundo vampiro pode sempre aproveitar outra boa policial. ― Radje largou o telefone e pulou da lateral do prédio. Mencheres o seguiu, sua telecinese incapaz de parar Radje, mas sua velocidade livre da essência de sepultura que revestia seu inimigo como um escudo invisível. Ele o alcançou pouco antes do Guardião da Lei bater na parede do prédio ao lado. Mencheres lançou os dois para cima, mas mesmo enquanto ele fazia, Radje se retorcia em seus braços para encará-lo. Fogo se alastrou pelo estômago de Mencheres no instante seguinte. Aquele fogo se espalhou em um arco brutal para cima, mas ele não afrouxou seu aperto, mesmo quando ele sentiu Radje correr sua faca de prata para cima. Ele estava quase lá. Quase… Mencheres jogou Radje nas vigas de aço dourado da pirâmide falsa. Metal se partiu quando o corpo do Guardião da Lei se chocava contra aquilo, abrindo um buraco dentro da brilhante estrutura intrincada. Mencheres voou


através dela, arrancando a faca do seu estômago, se lançando para Radje quando o seu tio estava prestes a saltar para o lado novamente. Os dois se enrolaram no ar no interior da torre, quebrando mais aço em torno deles com sua luta. Radje deu uma joelhada no estômago de Mencheres, que ainda se curava, fazendo-o se dobrar, mas, novamente, ele não o soltou. Ele levou Radje para trás em direção ao objeto que seu tio não poderia ver ― a viga de aço dobrada com uma ponta afiada que saia do buraco que o corpo de Radje tinha feito na estrutura. Radje gritou enquanto a viga o empalava através do esterno. Ele tentou se jogar para longe, mas Mencheres o tinha em um aperto impiedoso. Seus olhos encontraram os do Guardião da Lei por um segundo que parecia congelado no tempo, antes de Mencheres arrancar mais várias vigas douradas com o seu poder, enviando elas para dentro do corpo de Radje. O feitiço de essência de sepultura funcionava apenas no portador para anular a telecinese dele. Radje tinha negligenciado revestir essa estrutura, além do corpo dele. Mais uivos vinham de Radje quando aquelas ásperas lanças de metal se alojavam, fixando seus braços, pernas, peito e estômago. Mencheres os torcia com outro pensamento, enrolando o metal ao redor de Radje e através dele, segurando-o em uma fusão inquebrável de aço e sua força. As luzes brilhantes do prédio brilharam no rosto do Guardião da Lei quando seu sangue deixou vermelhas as vigas folheadas a ouro ao redor dele, mais sangue pingando no chão a quase quinze metros abaixo. Mesmo com os gritos de Radje, o vento chicoteando de diferentes direções, e o ruído da cidade ao seu redor, Mencheres ouviu a voz de Kira abaixo deles. Ela estava gritando seu nome no celular que Radje derrubou em sua tentativa de fugir. Ele enviou uma corda de seu poder para baixo, enrolando-a ao redor do telefone para fazê-lo flutuar até a sua mão. Ao mesmo tempo, ele arrancou outra viga de aço, enviando-a diretamente para a garganta de Radje. Gorgolejos substituíram os gritos cheios de ódio do Guardian Lei, sua voz quase inaudível sobre o lamento do vento. ― Estou aqui, ― Mencheres disse para o telefone, interrompendo os gritos desesperados de Kira. ― Graças a Deus! ― Ela ofegou. ― Eu podia ouvir gritos, mas eu não poderia dizer se eles eram seus ou dele… ―


― Eles eram dele, ― ele respondeu, lamentando a dor que aquilo deve ter causado a ela. ― Tudo está bem. Radjedef não pode mais nos prejudicar. ― ― Estou pegando um avião agora, ― ela disse, sua voz ainda afiada com ansiedade mesmo que alívio fosse notável nela também. ― O no qual você voou está reabastecido e esperando. Eu estarei lá nas próximas horas. Eu te amo. ― Mencheres encarou os olhos de Radjedef quando ele respondeu. ― E eu te amo, minha adorada. Estarei esperando por você. ― Uma confusão de sons depois, e a voz da Guardiã da Lei encheu a linha. ― Ele está vivo? ― Veritas perguntou. ― Não, ― Mencheres respondeu, a viga de aço impedindo que Radje fizesse qualquer som que Veritas pudesse ouvir sobre o vento. ― Ele tentou fugir. Eu tive que matá-lo. ― ― Não importa. Este telefone estava no viva-voz, antes, então todos os Guardiões ouviram a cumplicidade de Radje em sequestrar Kira e usá-la como chantagem contra você. Eles também ainda ouviram o depoimento dos guardas alegando a cumplicidade de Radje na morte de Josephus e em vazar um vídeo que expôs a nossa raça para os humanos. Você foi inocentado de todas as acusações, Mencheres. ― ― Obrigado, ― ele respondeu imediatamente, martelando outra viga na garganta de Radje quando ele tinha curado o suficiente para começar a amaldiçoar audivelmente. ― Eu devo ir agora, antes que humanos tropecem nessa cena. ― Veritas saberia o motivo real para sua pressa. O barco do barqueiro nunca voltava vazio, e Mencheres não tinha intenção em ser aquele a enchê-lo. Ele desligou a ligação com Veritas, então puxou a viga da garganta de Radje, mas manteve as outras onde estavam. Depois de poucos segundos, o buraco aberto no pescoço do Guardião da Lei se curou até somente sangue restar para indicá-lo. O olhar de Radje estava verde com ódio fervendo. ― Foi tudo um truque? Você nunca perdeu suas visões? Nunca pretendeu procurar sua morte? Você planejou tudo isso? ― Mencheres não pode evitar sua risada irônica. ― Nada disso foi um truque, exceto essa noite. Você quase venceu, tio, mas de alguma forma o destino me deu tudo que eu tinha perdido… e ainda mais. ―


― O que agora? ― Radje sibilou. ― Você pretende arrancar minha cabeça? ― Mencheres lançou seu poder da grade despedaçada ao redor deles para o telhado da Torre Symphony, onde ele esteve mais cedo, esperando dar meianoite. Ele o enrolou ao redor da faca de prata que tinha deixado lá, a mesma do ritual que ele tinha feito mais cedo, e a fez flutuar em sua direção. Ele pegou aquela faca com uma mão, notando o medo no olhar de Radje quando ele a viu. ― Eu não tomo nada de você, ― Mencheres disse, cortando o peito de Radje com aquela faca e cobrindo os dois lados dela com o sangue do Guardião da Lei. Imediatamente, a cúpula iluminada em torno deles desapareceu no infinito negro de Duat, um barco solitário flutuando na direção deles em um rio obsidiana.17 ― Ele toma, ― Mencheres concluiu, acenando para o barqueiro. Radjedef gritou quando a figura com chifres de Aken apareceu. Mencheres soltou Radje para recuar, retirando as vigas de aço do Guardião da Lei e as empilhando em um monte abaixo. Aken agarrou Radjedef com uma mão longa quando ele tentou fugir, aquela enorme boca aberta num terrível sorriso sem dentes. Ninguém pode fugir do governante do submundo, Mencheres pensou sombriamente. Nem mesmo ele. Um dia, ele seria o transportado para estar diante de Anúbis, seus pecados pesados em frente a Ma'at18 para ver se a Devoradora o esperava, ou a paz do seu descanso eterno no Aaru. Mas não hoje. Radjedef ainda estava gritando quando Aken o colocou no barco. A cabeça de chifres do barqueiro acenou para Mencheres. ― Um substituto aceitável, Menkaure. Diga-me, você encontrou sua escuridão? ― Um arrepio percorreu Mencheres. ― Minha escuridão? ― ― Kira, ― o barqueiro disse, pronunciando o nome dela como os antigos celtas fariam. Mencheres começou a rir. Ele entendeu totalmente errado o simbolismo. Suas visões mostravam escuridão surgindo cada vez mais próximas, destinada a consumi-lo. Ele achava que era a morte porque o seu desespero não podia 17

Pedra negra vulcânica. Deusa da justiça e equilíbrio da mitologia egípcia, que julgava as almas que chegavam no Salão de Julgamento Subterrâneo. 18


prever nada mais, mas não era a morte. Era ela. Kira. Céltico para ― escuridão. ― ― Sim, eu a encontrei, ― ele disse a Aken. Sua memória daquela infinita escuridão iminente, preenchendo cada aspecto do seu futuro, de repente era a imagem mais bonita que Mencheres tinha já contemplado. Ele se afastou do barqueiro. O vazio negro desapareceu, substituído pelo brilho da pirâmide danificada ao seu redor e as luzes da paisagem urbana adiante. O corpo de Radjedef, murchando lentamente, jazia agora na parte inferior da estrutura, sem vida, sua alma no barco do barqueiro em sua jornada de volta a Duat. Mencheres tinha sua própria jornada também, mas a sua era com Kira, para o futuro deles.

FIM…


A série Night Huntress World continua em um livro ainda sem nome e data de lançamento, fiquem ligados na comunidade para maiores informações.

Créditos:

Equipe Night Huntress de Tradução. Night Huntress [Oficial]


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