centro de acolhimento para mulheres com câncer
unidade de cuidados paliativos para o Hospital Pérola Byington
Universidade Estadual de Campinas | UNICAMP
Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo
centro de acolhimento a mulheres com câncer: unidade de cuidados paliativos para o Hospital Pérola Byington
Larissa Silva Grego
memorial do trabalho final de graduação
orientador: Prof. Dr. Claudio Lima Ferreira
unicamp, 2020
“ Someone once asked anthropologist Margaret Mead what she considered to be the first evidence of civilization. She answered: a human thigh bone with a healed fracture found in an archaeological site 15,000 years old. Why not tools for hunting or religious artifacts or primitive forms of communal self-governance?
Mead points out that for a person to survive a broken femur the individual had to have been cared for long enough for that bone to heal. Others must have provided shelter, protection, food and drink over an extended period of time for this kind of healing to be possible.
The great anthropologist Margaret Mead suggests that the first indication of human civilization is care over time for one who is broken and in need, evidenced through a fractured thigh bone that was healed.
This story is told by Ira Byock, an authority on palliative medicine, in his book The Best Care Possible: A Physician’s Quest to Transform Care Through the End of Life. ”
dedico este trabalho ao meu pai.
agradeço a Deus, fonte inefável de amor e misericórdia;
a minha mãe, mulher forte, que me inspira com a sua força;
a minha família, estrutura sempre;
aos amigos, que tornaram essa jornada mais leve;
{ a Letícia, ao Vinicius e ao Erick, por todas as colaborações e apoio }
{ a Juliana, por ter me presenteado com a bela ilustração da capa }
aos meus mentores, por me ensinarem o caminho;
{ em especial ao meu orientador Claudio, por toda disposição e dedicação }
{ a Lucila e a Luciana, por me ensinarem o quão incrível é a pesquisa }
a unicamp, por tranformar minha maneira de ver o mundo;
e a todos os encontros, que compõe o que hoje sou.
sumário
apresentação { 13 }
introdução { 14 }
PARTE 1 | TEMA
_ câncer e cuidados paliativos { 21 }
_ arquitetura e cuidado { 33 }
PARTE 2 | LOCAL
_ são paulo e o acesso a saúde { 41 }
_ levantamento { 47 }
PARTE 3 | PROJETO
_ referências projetuais { 67 }
_ proposta { 85 }
conclusão { 14 }
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS { 99 }
apresentação
Era certo que iria fazer o trabalho final de graduação na cidade em que nasci e vivi por muitos anos. São Paulo. Essa sempre foi a certeza. Com o decorrer dos anos, fui pensando nas diversas possibilidades de projetos e intervenções necessárias para a cidade. Depois de muitas dúvidas, algo inesperado aconteceu. Em março de 2018, meu pai foi diagnosticado com câncer. Esse momento me mostrou espaços e caminhos pela cidade que eu nunca tinha imaginado antes. Era uma outra cidade, porque os objetivos eram outros. Eram novas arquiteturas.
Vivenciar todas as etapas de seu tratamento oncológico, através da ótica dos conhecimentos adquiridos durante minha formação, me fez questionar a qualidade e a eficiência de todos os ambientes em que ele esteve. Desde o ambiente hospitalar público e também as adaptações que tiveram que ser feitas em casa, percebi a incapacidade desses espaços em atender as necessidades vigentes. Identifiquei a falta de luz, de ventilação, de acessos confortáveis para circulação de pessoas e a falta de ambientes que ofereçam conforto, em especial, nos momentos de agudização da doença e no final da vida.
Foi e ainda é um processo permeado por muitos questionamentos. Quem projeta esses espaços? Porque projetam dessa forma? Porque tão precarizada a saúde pública? O quanto a arquitetura contribui em todos esses processos? E, traçando esses caminhos, fui encontrando meu projeto final: trabalhar com espaços de saúde que produzam conforto, qualidade e bem-estar. Buscando por espaços de cura, encontrei um serviço que me chamou a atenção por não oferecer apenas o curar, mas sim o ato de cuidar. Um serviço que oferece um olhar inteiro ao ser o humano, e não apenas sobre a sua doença. Assim, decidi trabalhar com o cuidado paliativo oncológico feminino, devido as altas estatísticas de incidência sobre essa parcela da população. A primeira parte deste memorial explora as temáticas abordadas, como o câncer na população feminina, cuidados paliativos, neurociência aplicada à arquitetura e ambientes restauradores. A segunda parte traz discussões acerca da localização e análises sobre as dinâmicas urbanas existentes. A terceira parte apresenta o início do processo de projeto, as referências projetuais, programa de necessidades e estudos volumétricos.
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introdução
O presente Trabalho Final de Graduação do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Campinas tem como principal objetivo desenvolver o projeto arquitetônico de uma Unidade Suporte de Cuidados Paliativos para mulheres com câncer; anexa ao Hospital Pérola Byington - Centro de Referência da Saúde da Mulher. Em atual construção e com conclusão prevista para 2022, a nova sede do Pérola estará implantada no bairro dos Campos Elíseos pertencente ao distrito de Santa Cecília no centro expandido do município de São Paulo. A definição do público alvo foi feita a partir do entendimento dos impactos que os tratamentos oncológicos ocasionam na psiconeurofisiologia das mulheres e também em decorrência do crescente número de casos de câncer no cenário mundial, brasileiro e paulista. Nesse contexto é importante compreender como o tratamento oncológico modifica a percepção das mulheres em suas relações pessoais, nos ambientes que frequentam e em atividades cotidianas, as colocando em uma situação de fragilidade psiconeurofisiológica (Damásio, 2004). Com isso, se evidencia a importância dos ambientes de cuidados paliativos para auxiliar as pacientes em tratamento.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, os cuidados paliativos são práticas assistenciais que buscam a promoção do bem estar em pacientes com doenças crônicas e doenças que possam impedir a continuidade da vida como é o caso do câncer, foco de estudo desse trabalho. Dentre as práticas paliativistas existentes, o esforço deste exercício projetual está pautado na criação de um espaço que ofereça atividades focadas nas dimensões sociais, psicológicas e espirituais do cuidado paliativo às pacientes oncológicas. Atividades como musicoterapia, arteterapia e cuidados pessoais.
Por meio dos estudos de neurociência aplicada à arquitetura objetifica-se o desenvolvimento projetual de ambientes de restauração psiconeurofisiológica, demonstrando assim, que a sensibilidade arquitetônica seja capaz de contribuir com o tratamento oncológico. Processo esse que pode ser muito agressivo contra o corpo e mente das pacientes.
O cuidado paliativo é uma prática necessária em todos os estágios do tratamento oncológico. Ao analisar as necessidades do hospital, proponho que a unidade projetada seja especializada no atendimento de pacientes que estejam na fase final da doença - essas
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instituições são conhecidas como hospice. Além desse espaço, que a instituição ofereça um ambulatório, para que a paciente possa ser acompanhada durante todas as etapas do seu tratamento. Esse espaço em que haja o cuidado necessário a população feminina oncológica de São Paulo que atualmente não tem acesso à infraestrutura e tratamentos adequados durante os processos de agravo da saúde.
O dimensionamento e a localização do equipamento está pautado em observações feitas a partir de levantamentos e análises quantitativas sobre a situação dos cuidados paliativos tanto em escala nacional como estadual. Prática essa obrigatória na Rede de Atenção à Saúde (RAS) a partir da normativa do Ministério da Saúde em 2018, inserindo os cuidados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
Se objetiva desenvolver o projeto arquitetônico de uma Unidade Suporte de Cuidados Paliativos para mulheres com câncer anexa ao Centro de Referência da Saúde da Mulher - Hospital Pérola Byington localizada no bairro Campos Elíseos no município de São Paulo. A pesquisa destaca os importantes estudos sobre neurociência aplicada à arquitetura no auxílio a redução do estresse das mulheres em tratamento oncopaliativo.
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metodologia
Essa pesquisa está pautada em leituras e investigações sobre o tema e o local propostos para a identificação e caracterização das diretrizes de projeto.
Para a realização da pesquisa de caráter exploratório, foram realizados levantamentos e análises bibliográficas sobre neurociência aplicada à arquitetura; ambientes restauradores. Assim como estudos sobre as condições dos pacientes, acompanhantes e profissionais atuantes nos cuidados paliativos.
Somada a grande revisão bibliográfica, foram estudas as diretrizes médicas dos cuidados paliativos que fundamentam as discussões sobre o programa e o partido arquitetônico da edificação.
Também foram feitas pesquisas sobre ambientes análogos para auxiliar no
dimensionamento e conhecimento das dinâmicas de fluxos e necessidades projetuais.
Referente as condições dos pacientes, acompanhantes e profissionais soma-se a entrevista com a médica Laura Frontana, chefe de cuidados paliativos do Hospital Pérola Byington, feita no dia 22 de maio de 2020 que, devido a pandemia de coronavírus, foi realizada por videochamada. Por meio desse contato, foi possível verificar a real necessidade de expansão dos cuidados paliativos no hospital. Salienta-se que, devido ao isolamento social atual, não foram realizadas as pesquisas de campo e visitas a espaços referenciais, anteriormente programadas e fundamentais para o desenvolvimento do projeto.
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justificativa
No contexto global, os cuidados paliativos são uma premissa da Organização Mundial da Saúde. Prática ainda restrita em países de baixa e média renda, onde vivem 78% das pessoas que necessitam desse tipo de cuidado. No Brasil, apenas 26% das instituições com atendimento oncológico não apresentam os serviços de cuidados paliativos (ROCHA, 2018) enquanto em São Paulo 31% dos hospitais avaliados na Rede de Atenção Oncológica do Estado de São Paulo não estão em conformidade com a legislação vigente devido a falta da oferta dos serviços de cuidados paliativos (MADI, 2017). Dos 20 milhões de pacientes que necessitam de cuidados paliativos no cenário global, um terço sofre de câncer. Comparando este fator as estatísticas de mulheres com câncer, desde a escala global até a regional, se possibilita a compreensão do grande impacto dessa doença na população feminina e a necessidade de se pensar espaços de acolhimento que atendam essa demanda.
No Hospital Pérola Byington, edificação escolhida para a implementação do edifício suporte a restauração psiconeurofisiológica de pacientes oncopaliativas, a prática existe em duas modalidade intra-hospitalares, sendo ela do tipo enfermaria e ambulatório. De acordo
com os dados levantados, anualmente, cerca de 1600 mulheres dão entrada no Hospital Pérola Byington para iniciarem seus tratamentos oncológicos. Desse número, cerca de 25 % chegam com estágio avançado da doença, momento esse onde as práticas paliativas devem ser especialmente ofertadas. Somada as estatísticas, em entrevista realizada com a doutora Laura Frontana, corrobora-se a necessidade do hospital em oferecer um espaço que atenda a essa parcela do hospital através da instalação de um hospice e também de uma unidade ambulatorial. Portanto, quero dimensionar a minha arquitetura para atender a essa demanda.
Os dados expressam a necessidade dos cuidados paliativos associados ao tratamento do câncer. Principalmente no cenário brasileiro, por ser uma prática relativamente nova, possui um caráter ainda muito pontual no sistema público de saúde. A partir da compreensão das questões levantadas, pode-se perceber a relevância da criação de um espaço público e eficiente para o cuidado paliativo oncológico feminino, a fim de oferecer uma arquitetura que contribua com o tratamento assim como a proposição de espaços de estudo, especialização e usos que conectem o espaço ao seu contexto.
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parte I tema
_câncer e cuidados paliativos
_o câncer em mulheres
Câncer é o nome popular dado as neoplasias, que são um conjunto de mais de 100 doenças resultantes da multiplicação celular descontrolada de um organismo com capacidade de se dispersar e invadir outros órgãos (Brasil, 2013). O seu desenvolvimento pode advir de inúmeros fatores internos, como desregulação hormonal, condições imunológicas e mutações genéticas; e também fatores externos, como exposição a ativos cancerígenos, sendo essa exposição excessiva ou não dependendo do organismo que a recebe (INCA, 2020).
As alterações ocorrem em genes específicos denominados proto-oncogenes e não apresentam risco por estarem inativos. Responsáveis pelo início do desenvolvimento do câncer, esses genes quando ativados passam a ser chamados de oncogenes. Com os oncogenes ativados, a célula então passa a ser chamada de célula cancerígena (ABC do Câncer, 2011). Existem inúmeras características que diferenciam os tipos de neoplasias. Como por exemplo a capacidade ou não de se dispersar para outras partes do corpo, conhecida por metástase e
também a velocidade da multiplicação celular (INCA, 2020).
Para além da compreensão morfológica é importante entender a construção histórico-social dos significados do câncer. No Brasil do século XX, as imagens e significados vinculados ao câncer deturpavam a imagem do paciente oncológico. O doente era associado a pobreza e a sujeira física e moral. Portanto, tornavam-se inimigos da sociedade, pois, além de não serem ativos para a produção de riquezas, geram gastos ao poder público e à filantropia (Tavares e Trad, 2005).
Mesmo com os avanços tecnológicos, e com diversos tipos de câncer curados e/ou controlados, ele ainda é uma doença de causas desconhecidas e com alta taxa de mortalidade. Tais condições, perpetuam essa narrativa histórico-mítica acerca da doença e ao somar as características fisiológicas da doença, como a possibilidade de mutilações e dor, gera um impacto psicoemocional negativo fazendo com que as pessoas sintam medo, angústia, raiva e ansiedade (Salci e Marcon, 2010). Afetando também os familiares e as pessoas próximas ao paciente.
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_ tipos de câncer abordados
Dos inúmeros tipos de neoplasias existentes, as que serão abordadas neste memorial são as tratadas pelo Hospital Pérola Byington.
• mastologia • Mastologia é o nome científico para câncer de mama. Atualmente a doença se configura como um problema epidemiológico e é a neoplasia maligna com maior ocorrência em mulheres na maior parte do mundo. A mais recente estimativa de números de casos globais aponta que cerca de 2,1 milhões de casos e 627 mil mortes foram ocasionadas pela doença (Bray et al., 2018). O câncer é classificado de acordo com a célula de origem e também se ele tem a capacidade de se espalhar ou não. Sendo então classificado em in situ quando as células
cancerosas ficam apenas na camada em que se desenvolveram e invasoras quando elas têm a capacidade de se espalharem nos outros tecidos além do original (ACS, 2020).
• câncer do colo do útero • O útero é composto por duas partes o corpo e o colo, parte que conecta o corpo do útero a vagina (Bussolotti, 2009). Esse câncer tem sua origem em lesões persistentes ocasionadas por alguns tipos de papilomavírus humano (HPV). Essas alterações são tratadas quando descobertas em exames rotineiros e são curáveis na maioria dos casos (INCA, 2019). De acordo com as estimativas foi o quarto câncer com maior incidência, com 570 mil casos novos em 2018. Esse valores representam um risco estimado de 15,1/100 mil mulheres (Bray et al., 2018).
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Figura 1 - Mutação e Câncer (Fonte: ABC do Câncer, 2011) Ilustração de Mariana F. Teles, 2011
• câncer do endométrio•
O corpo do útero é composto por duas camadas a interna, chamada de endométrio e a externa, muscular, conhecida como miométrio - responsável pelas contrações durante o parto (Oncoguia, 2020). O câncer do corpo do útero pode ter diversas origens, sendo o endométrio - revestimento interno do útero - a origem mais comum (INCA, 2019).
• câncer de ovário •
A segunda neoplasia ginecológica mais comum é o câncer de ovário (INCA, 2020). Em 2018, foram estimados cerca de 295 mil novos casos, valor que corresponde a 1,6% de todos os cânceres, sendo o oitavo em maior incidência global (Bray et al., 2018). É uma das neoplasias mais letais devido a demora do aparecimento dos sintomas, dessa forma, 75% dos casos são diagnosticados já em estágio avançado (Bussolotti, 2009).
• câncer de vulva e vagina • O câncer de vulva é um dos casos raros, apresentando menos de 1% das neoplasias malignas da mulher (Sallum et al., 2011). Além de raro, o tumor tem um desenvolvimento lento e pode ser tratado em estágios iniciais, pré-cancerosos (Bussolotti, 2009). Aproximadamente 90% dos diagnósticos de câncer de vulva são do tipo carcinomas epidermóides, chamados também de células escamosas por se parecerem com verrugas.
_ tratamentos
Existem muitas abordagens para o tratamento do câncer como a quimioterapia, radioterapia, cirurgia oncológica e também existem novas possibilidades sendo estudadas e implementadas, como a imunoterapia. Cada tipo de câncer demanda um tipo específico de tratamento. Para melhor entender os processos de tratamento das neoplasias, os decrevo a seguir:
•
cirurgia •
A cirurgia oncológica é o tipo de tratamento indicado para remoção total do tumor e consiste na retirada cirúrgica do câncer do corpo do paciente. A cirurgia tem por finalidade a cura ou o controle dos sintomas da doença (INCA, 2020). É identificada como curativa quando existe a possibilidade de extração total do câncer ou paliativa, quando ajuda a amenizar a dor e a controlar os sintomas que comprometem a qualidade de vida do paciente.
• quimioterapia •
A quimioterapia é um tipo de tratamento sistêmico e medicamentoso utilizado para combater especificamentes as células tumorais primárias. Os medicamentos - antineoplásicos ou quimioterápicos - aplicados por via oral ou venosa, são misturados ao sangue e são transportados até as células cancerígenas e afeta também as células saudáveis, provocando efeitos colaterais
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(INCA, 2020). É administrado em sessões regulares que variam para cada tipo de paciente e tumor.
• radioterapia • Diferente da quimioterapia, a radioterapia é um tratamento local, ou seja, atua diretamente no tumor. São utilizadas ondas eletromagnéticas que impedem o crescimento celular ao alterarem a estrutura da matéria viva; através de ondas invisíveis, indolores e administradas por dois tipos de método: o interno e o externo (INCA,
2020). Podem ser usados em conjunto ou não a depender do tipo de câncer. No método externo existe uma distância entre o equipamento e o paciente; já no interno a fonte de radiação é colocada dentro da área a ser tratada, o que possibilita o enfoque na área afetada (Oncoguia, 2014).
• novos tratamentos • Com o avanço das tecnologias foi possibilitado o entendimento do câncer a nível molecular. “O The Cancer Genome Atlas” (Wang, Z; et al., 2016) é
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Figura 2 - Conjunto de ilustrações dos efeitos colaterais da quimioterapia (Fonte: artinspiring)
perda
de peso anemia náusea
estomatites baixa imunidade problemas no fígado
uma importante iniciativa que sequenciou o genoma de mais de 30 tumores, viabilizando a individualização do tratamento de acordo com o tipo de mutação genética; esse tratatamento é conhecido como terapia alvo (Kaliks, 2016).
Outra área de estudos que avança é a imuno-oncologia e o desenvolvimento de imunoterapias. A partir da compreensão das interações do sistema imunológico com as células tumorais é estudada a possibilidade de produção de estímulos do sistema imunológico do paciente oncológico a combater as
células cancerígenas (Kaliks, 2016).
• efeitos colaterais • As neoplasias apresentam inúmeros sintomas e efeitos desgastantes ao corpo e a mente dos pacientes. No processo de tratamento do câncer, as terapias que ainda apresentam características muito invasivas, como a radioterapia externa e a quimioterapia, que afetam áreas além do câncer, também afetam o paciente. Nas ilustrações a seguir são apresentados alguns efeitos colaterais do tratamento quimioterápico.
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Figura 3 - Conjunto de ilustrações dos efeitos colaterais da quimioterapia (Fonte: artinspiring)
diarreia fraqueza micção prejudicada
hemorragias disfunção sexual falhas no coração
_câncer e cuidados paliativos
_o que é cuidado paliativo
Segundo a Organização Mundial da Saúde, o cuidado paliativo é uma prática assistencial promovida a pacientes que possuam alguma doença que ameace sua vida, sendo essa prática feita por uma equipe multidisciplinar. O objetivo do cuidado paliativo é prevenir e aliviar o sofrimento durante todas as fases de doenças graves, para pacientes que estejam sofrendo devido os efeitos colaterais dos tratamentos, para os sobreviventes e incluso as pessoas que venham a morrer (OMS, 2020).
O tratamento paliativo reafirma a vida e a morte como processos naturais e integra ao cuidado físico do paciente aspectos psicológicos, sociais e espirituais. Respeita o processo de finitude de cada pessoa ao oferecer um sistema de apoio ao paciente que o propicie viver ativamente o máximo possível e também ajuda as famílias a dar suporte ao paciente. É uma prática que por meio de
uma abordagem interdisciplinar atende as necessidades clínicas e psicossociais tanto do paciente quanto dos seus familiares (INCA, 2020).
Pode ser oferecida em diversas modalidades e ambientes, incluindo os espaços hospitalares, centros de saúde, domicílios e hospices, como é o caso em que se inclui esse projeto. Ao retirarmos o paciente das intervenções indesejadas e de práticas invasivas, respeitarmos o processo particular de cada ser humano e afeta também diretamente os custos gerais do sistema de saúde, diminuindo os gastos com práticas que não são mais desejáveis ao processo (INCA, 2019).
_origem
O cuidado é uma preocupação antiga da humanidade assim como o cuidar para aqueles que não tem a possibilidade da cura. É uma história que se confunde com a história dos lugares que abrigavam os enfermos, conhecidos
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aspectos socieais e familiares aspectos psicológicos aspectos físicos aspectos espirituais e religiosos
cuidados
Melhorando a qualidade de vida de pacientes com doenças graves
Para aqueles que estão entrando na fase final da doença
Modelo de assistência ao final da vida
Os Princípios Básicos dos Cuidados Paliativos, segundo a OMS:
1. Promover o alívio da dor e outros sintomas desagradáveis;
2. Afirmar a vida e considerar a morte como um processo normal da vida;
3. Não acelerar nem adiar a morte;
4. Integrar os aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao paciente;
5. Oferecer um sistema de suporte que possibilite o paciente viver tão ativamente quanto possível, até o momento da sua morte;
6. Oferecer sistema de suporte para auxiliar os familiares durante a doença do paciente e a enfrentar o luto;
7. Abordagem multiprofissional para focar as necessidades dos pacientes e seus familiares, incluindo acompanhamento no luto;
8. Melhorar a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso da doença;
9. Deve ser iniciado o mais precocemente possível, juntamente com outras medidas de prolongamento da vida, como a quimioterapia e a radioterapia e incluir todas as investigações necessárias para melhor compreender e controlar situações clínicas estressantes.
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Figura 4 - Diagrama de avaliação multidimensional (DAM) adaptado (CARVALHO, 2012, p.43)
Cuidado Paliativo
de fim de vida
Cuidado Hospice
Figura 5 - Diagrama explicativo das fases dos cuidados paliativos Fonte: Heartland Hospice
como hospice. Essa prática foi propagada por diversas organizações religiosas, como por exemplo em 1879, Dublin, com as As Irmãs de Caridade que fundaram o “Our Lady’s Hospice of Dying” e em 1905 na cidade de Londres, com a Ordem de Irmã Mary Aikenheads abre o “St Joseph’s of Dying”. Somente no século XIX é que se tem registros do aparecimento de instituições laicas que também promoviam o mesmo serviço.
O Movimento Hospice Moderno foi introduzido pela inglesa Cicely Saunders, assistente social, enfermeira e médica. A experiência de cuidar de David Tasma até sua morte, foi a motivação para que ela iniciasse o investimento em uma nova forma de cuidado. Assim, ela funda o “St. Christopher’s Hospice em 1967 que não apenas promovia o cuidado e assistência a pessoas enfermas, mas também fomentava o desenvolvimento de ensino e pesquisa na área, recebendo bolsistas de vários países.
No Brasil a prática é introduzida na década de 80 e tem um crescimento significativo a partir dos anos 2000, através da consolidação dos serviços existentes e do começo de outros. Devido a extensão do território brasileiro e as grandes demandas dessa prática em nosso país, ainda há muito o que ser feito em termos de implantação de serviços para que no futuro todos possam se beneficiar desse modo de cuidar (ANCP, 2012).
_ modalidades abordadas
Das muitas modalidades existentes de cuidados paliativos, o Pérola
Byington oferece o atendimento do tipo ambulatorial, onde acontece o acompanhamento dos pacientes em estágio onde a doença tem pouco impacto sobre a vida do paciente. E uma enfermaria, que consiste numa ala de um hospital geral que tem seus própios leitos e equipe especializada em Cuidados Paliativos. As modalidades a serem abordadas pelo projeto serão a do tipo ambulatorial e o do tipo hospice. A ambulatorial presta os serviços voltados aos casos de baixa complexidade. No caso dos cuidados paliativos, a parte principal a ser abordada é a psicológica, pois são nesses tipos de consultas atendidas nas unidades ambulatoriais em que os pacientes sabem de seus diagnósticos e há a necessidade de se discutir questões profundas (ANCP, 2012).
O hospice é uma unidade destinada ao internamento para pacientes que esgotaram todas as possibilidades de tratamento curativo ou prolongamento da vida, que apresentam sofrimento de moderado a intenso e que escolhem pela manutenção de conforto e dignidade nesta fase final da vida. O paciente é indicado neste tipo de modalidade quando se encontra com expectativa de vida avaliada sendo menor ou igual a seis meses (ANCP, 2012).
A intenção do projeto é realocar os ambientes já existentes no Hospital Pérola Byington ao novo projeto, a fim de ampliar o acesso as pessoas que precisam desse atendimento e suprir a demanda existente. Atualmente, o hospice não é um serviço oferecido pelo hospital e essa falta acaba sobrecarregando o atendimento emergencial.
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_ estatísticas
cuidados paliativos câncer
8.5 milhões de casos oncológicos em mulheres no ano de 2018 (OMS, 2020)
316.140 mil
novos casos de câncer em mulheres no Brasil em 2020. (INCA,2020)
80 mil
novos casos de câncer de mama são esperados na capital do estado de São Paulo em 2020. (INCA,2020)
1.600
novos casos de câncer são recebidos anualmente pelo hospital Pérola Byington. (Portal Hospitais Brasil, 2015)
Pérola Byington
26% das instituições com atendimento oncológico avaliadas não apresentam os serviços de Cuidados Paliativos (Rocha, 2018)
31% dos hospitais avaliados na Rede de Atenção Oncológica do Estado de São Paulo não estão em conformidade devido a falta da oferta dos serviços de Cuidados Paliativos (Madi, 2017)
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modalidades de cuidados paliativos são oferecidas: ambulatorial e enfermaria. (Portal Hospitais Brasil, 2015)
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UMA DAS PRIORIDADES DA OMS NA LUTA CONTRA O CÂNCER (OMS, 2020)
Mundo Brasil São Paulo
_ distrito Santa Cecília
_ localização do projeto
baixa incidência
abaixo da média
média
acima da média
alta incidência
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Figura 6 - Mortalidade por neoplasias (câncer) por cem mil habitantes. Fonte: Rede Nossa São Paulo
_arquitetura e cuidado
_ cérebro, corpo e ambiente
A arquitetura está sempre em nosso cotidiano. Construções, cidades, vizinhanças, espaços públicos, privados; estamos imersos em espaços produzidos pelo desenho humano. Esses lugares, além de abrigarem nosso corpo físico, abrigam também sensações, emoções, memórias. São responsáveis por mediar o mundo e nossa consciência, internalizando o mundo e exteriorizando a mente (Pallasmaa, 2013). Essa interação entre corpo, arquitetura e mente é o campo de estudo da neurociência aplicada à arquitetura. Através desse estudo, nos é possibilitado mensurar os possíveis impactos psiconeurofisiológicos que o design gera no ser humano (Edelstein e Macagno, 2011).
Essa relação é cíclica. O cérebro percebe o mundo a partir de um determinado contexto. A criação de novos
produtos, arquiteturas e espaços reconfiguram o contexto e esse novo cenário estimula o cérebro a uma nova percepção de mundo (Zuanon, 2014). Por ser constantemente estimulado pelo ambiente o cérebro reage aos estímulos e esses estímulos, ao longo do tempo, reestruturam e remodelam a estrutura cerebral (Faria e Zuanon, 2019). A essa capacidade de remodelação é dado o nome de neuroplasticidade.
Essa relação de coinfluência entre ambiente e cérebro é fundamental para pensarmos na qualidade do ambiente que se projeta. Os projetos arquitetônicos deveriam ser desenhados para dar suporte a natureza dinâmica e heterogênea da resposta cerebral ao ambiente. E em particular atenção aos espaços de saúde, onde são realizadas tarefas cognitivas complexas sob pressão, enquanto pessoas em situação de fragilidade são atendidas (Edelstein e Macagno, 2011).
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_ o corpo doente, estresse e a relação com o ambiente
Como exposto anteriormente o diagnóstico do câncer é culturalmente visto como uma doença devastadora; e somada a essa compreensão cultural, ela também é responsável por uma série de consequências físicas e mentais. Dentre esses fatores, o recorte desse estudo será o estresse. Segundo Neme e Lipp (2010), em mulheres com câncer, a maior fonte de estresse tem origem nos atritos entre a paciente com seus familiares. O enfrentamento contínuo dessas situações gera uma sequência de esforços cotidianos, o que aumenta a probabilidade da paciente desenvolver estresse crônico. O organismo constrói o estresse com os mesmos caminhos cerebrais que constrói as emoções. Para entender como funciona o estresse é preciso entender algumas regiões e processos do cérebro. No nosso cérebro existe um processo chamado de interocepção, esse processo cerebral é responsável pela percepção dos estados do nosso corpo (Ceunen et al., 2016;), ou seja, é o processo responsável pelo controle de ações internas, como nossos recursos energéticos, batimentos cardíacos, e muitos outros (Barrett, 2018).
Essa rede interoceptiva é responsável por fazer predições sobre nosso corpo e compara essas expectativas resultantes das predições, com o input sensorial mandado pelo corpo. Quando existe uma comparação entre a expectativa e o parâmetro recebido, o cérebro atualiza o modelo preditivo que tem do
corpo. Em concomitância a essa rede existe outra parte também importante que é a que representa as sensações internas do corpo, a rede de controle (Barrett, 2018).
Quando a pessoa se encontra em uma situação de estresse crônico, acontece um desequilíbrio desse sistema. Se o cérebro prediz por muito tempo que estamos sem os recursos necessários para realizar as atividades, isso acaba por remodelar as estruturas da rede interoceptiva, gerando uma mudança no comportamento futuro dela. Essa mudança afeta diretamente a capacidade do indivíduo de calcular os recursos necessários para se autorregular e se manter vivo e predispõe o indivíduo a uma série de doenças, como o câncer. Para o enfrentamento do estresse Neme e Lipp (2010, apud Rowland, 1990) destacam que as variações individuais, culturais e sociais são importantes durante esse processo, pois, cada indivíduo possui uma maneira de perceber e avaliar o mundo e portanto, cada indivíduo tem seus recursos para enfrentar a situação de estresse. Com o propósito de buscar o restabelecimento das funções do sistema interoceptivo destruídas pelo estresse, existem estudos de como o ambiente pode auxiliar na promoção desse tipo de recuperação. Essas pesquisas evidenciam como alguns parâmetros do design podem contribuir na redução do estresse e, consequentemente, na reestruturação psiconeurofisiológica, a fim de que se possa manter o equilíbrio interno, ou seja, a homeostase.
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mudando o mundo através de exteroações
exterosensações do mundo
percepção combinada do corpo no mundo
mudando o corpo através de interoações
interosensações do corpo
-
internamente (por exemplo, visceromotoras, autonômicas) e direcionadas externamente (por exemplo, esquelomotoras).
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Figura 7 - Exemplo modificado e altamente esquemático para ilustrar que as informações interoceptivas e exteroceptivas são simultaneamente integradas para informar representações perceptivas e seleção de ações em relação a ações dirigi
das
Fonte: KHALSA, 2018
exterocepção interocepção
mundo corpo
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Figura 8 - No hospice de Houston, Texas, a paisagem restauradora externa inclui um rio metafórico composto de pequenas pedras, com trampolins que permitem às pessoas atravessar um ‘rio’.
_ ambientes restauradores de saúde
Nos anos 80, emerge da área da psicologia ambiental - conceito entendido como o conjunto de relações do homem com o meio em que se insere, que determina, contextualiza e qualifica as suas relações com o espaço e seu bem estar (Bernardi apud Nogueira, 2007) - e dos Estudo Pessoa Ambiente (EPA) o conceito de ambientes restauradores; abordagem que estuda as conexões inconscientes entre corpo e arquitetura. Na teoria, o estresse é compreendido como uma resposta psicofisiológica frente a um estímulo estressor, e a pessoa deve responder a esse estresse com seus recursos. Somada a compreensão anterior do funcionamento biológico do estresse, compreendese necessária a restauração psiconeurofisiológica para que se possa regenar o equilíbrio homeostático afetado pelo estresses (Felippe e Silveira, 2019).
Tais estudos foram a premissa para um olhar crítico as edificações de saúde construidas no período moderno, sendo então nomeada por ‘máquinas de cura’ devido a sua alta funcionalidade em detrimento de se pensar no usuário da edificação (Lopes e Medeiros, 2004).
Já em uma abordagem fenomenológica, o ambinte arquietônico hospitalar é lido como um lugar em que afeta aos usuários. Comumente implica inúmeras sensações de desconforto, como medo e ansiedade, provocados pela falta de controle e incertezas em que o paciente se encontra (Dijkstra e Andrade, 2018).
Além do olhar do paciente, cada usuário deve ser pensado, pois, cada
um tem uma necessidade que difere do outro. Os pacientes estão doentes e precisam descansar ou talvez possam ter seus amigos e familiares por perto. E também temos a equipe de saúde que precisa trabalhar de maneira eficaz e satisfatória no mesmo ambiente diariamente.
Somados os diferentes olhares, cada espaço também deve ser pensado de forma particular para cada usuário. Diferentes espaços no ambiente de saúde têm funções diferentes e devem apoiar o paciente de diferentes maneiras. Nos corredores, os pacientes precisam encontrar o caminho e ser capazes de se movimentar com segurança; nas salas de espera, os pacientes tendem a se sentir estressados e a lidar com sentimentos de incerteza; e nas áreas de tratamento, os pacientes geralmente precisam lidar com procedimentos dolorosos (Dijkstra e Andrade, 2018). Para que um ambiente seja suportivo (Ulrich, 1991) e restaurador ao paciente, é preciso pensar as diferentes funções e momentos dos procedimementos vividos na edificação.
Dentre as estratégias de projeto que possibilitem a redução de estresse, Ulrich (2008 apud Felippe e Silveira, 2019) aponta quatro variáveis físicas que podem melhorar a qualidade do ambiente: a redução do ruído, a exposição a natureza, a qualidade e a intensidade da iluminação artificial diurna e a presença de espaços dedicados à família do paciente, que pode favorecer a quantidade e a qualidade do suporte social. Na imagem, observa-se o paisagismo como estratégia a fim de promover a restauração psiconeurofisiológica.
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