Jornal ID 122 Junho/Julho 2021

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Câncer de mama na mulher idosa CONCLUSÃO X

Além disso, as alterações nas células epiteliais mamárias demonstram atrofia do tecido ducto-lobular fazendo com que os lóbulos mamários, em sua involução, sejam semelhantes aos lóbulos da menina na pré-puberdade. A diferença é que na mulher idosa, o tecido atrófico ducto-lobular contém células epiteliais que passaram por modificações, como repetidas exposições a carcinógenos e a alterações do sistema de reparação do DNA, causando aumento do potencial de transformação. Ademais, a interação do microambiente (formado por fibroblastos e adipócitos) modula a capacidade de desenvolvimento tumoral. Assim, as células senescentes formam um ambiente inflamatório, promotor de tumor, propiciando maior chance de câncer no tecido mamário e maior freqüência de metástases nos linfonodos axilares. Outro fator, é que na senescência, existe diminuição da resposta imune, promovendo a proliferação de células tumorais, levando a aumento da probabilidade de câncer.

Mecanismos sociais relacionados

Os programas de rastreamento populacional foram realizados até a idade de 74 anos. Embora a partir de 2010 tenha havido aumento dos exames de rastreamento na idosa, este ainda é inferior ao das outras faixas etárias. O monitoramento clínico da mulher idosa é claramente insuficiente e dogmas como “quanto mais idosa, mais lenta a progressão do câncer”, ou “câncer de mama na idosa não mata”, contribuem para agravar o problema. A mortalidade pelo câncer de mama aumenta com a idade e, diferentemente de dogmas populares, a maior causa de mortalidade na mulher idosa com câncer de mama é o próprio câncer, e não as comorbidades. Algumas comorbidades podem contraindicar certas terapias, como quimioterapia, radioterapia e cirurgia. Em algumas situações, a hormonioterapia pode ser o único tratamento. Além disso, pode ocorrer a não aderência ao tratamento, quando a mulher não tem condições de seguir o tratamento, ou quando não existe um responsável por cuidar da paciente. Uma metanálise da Cochrane (Fennessy et al.-2018) demonstrou que omitir cirurgia para pacientes idosas com câncer de mama e boas condições cirúrgicas, leva a aumento na taxa de progressão da doença, de intervenção terapêutica e de mortalidade. O tratamento com hormonioterapia com Tamoxifen é inferior à cirurgia (com ou sem hormonioterapia). Fig.5 a e b.

Alguns fatos observados em relação à mulher idosa: o pico da incidência do câncer de mama nesta população vai de 70 a 79 anos (sendo 1 em cada 5 cânceres) e, nos Estados Unidos, cerca de 37% das mortes por câncer de mama ocorrem após os 75 anos de idade. Na mulher idosa a mamografia tem maior sensibilidade, especificidade, taxa de detecção de câncer e VPP. O risco de radiação é muito baixo e diminui com a idade, sendo que o risco de câncer de mama fatal, induzido por rastreamento mamográfico aos 80 anos é de menos de 1 / 1 000 000. Trabalho de Destounis et al., em um levantamento de 763 256 mamografias de rastreamento, realizadas entre 2007 e 2017 demonstrou que 10% das pacientes tinham mais de 75 anos, com média de idade de 80,4 anos. Foram detectados 643 cânceres em 614 pacientes, sendo a taxa de detecção de 8,4/1000, taxa esta superior à observada na população geral e representando 16% de todos os cânceres detectados. Nestas, 82% das malignidades eram câncer invasivo, dos quais 63% eram grau II ou III (demonstrando que o câncer na idosa pode ser de maior grau, como na mulher mais jovem) e 93% foram passíveis de serem tratados cirurgicamente. Outros trabalhos mostraram também que mulheres idosas que fazem mamografia periodicamente têm maior chance de diagnóstico em estadios menores, em relação às que fazem esporadicamente, ou não fazem. A mamografia digital demonstrou aumento da especificidade, da taxa de detecção do câncer e do VPP e menor taxa de reconvocação. Ainda faltam estudos sobre a tomossíntese, mas presume-se que também deverá mostrar melhores resultados. O benefício do rastreamento na mulher idosa é igual ao da mulher jovem; permite maior chance de detectar tumor em estágio inicial; oferece opções terapêuticas menos agressivas; maior sobrevida e menor risco de morrer pela doença. Com o aumento da expectativa de vida, o benefício do rastreamento deve aumentar. Deve-se considerar individualmente cada mulher e sua saúde de um modo geral. A decisão de quando parar o rastreamento não deveria ser baseada somente na idade.

Alegações dos detratores do rastreamento mamográfico na mulher idosa

1) pode trazer mais malefício (como o overdiagnosis) do que benefício; 2) o exame clínico deve ser avaliado como uma alternativa e 3) o efeito da mamografia na mortalidade é incerto. O overdiagnosis é inerente ao rastreamento, pode ocorrer em 1 a 10% dos casos e sabe-se que o benefício supera seu risco até a idade de 90 anos, sendo portanto, uma alegação desnecessária, frente ao benefício.

Conclusão

A decisão de continuar o rastreamento mamográfico após os 75 anos não deve se basear apenas na idade. Deve-se levar em conta a saúde geral da mulher, sua expectativa de vida e os mecanismos sociais de suporte a esta mulher.

TABELA: RECOMENDAÇÕES SOBRE O RASTREAMENTO MAMOGRÁFICO NA MULHER IDOSA

Fig.5A. 82 anos. Paciente hígida, submetida a hormonioterapia neoadjuvante, por recusa da família em submetê-la a cirurgia. A resposta ao tratamento no início foi favorável.

Bibliografia:

Fig. 5B. No decorrer do tratamento houve progressão da doença, com o aparecimento de mais dois linfonodos comprometidos na axila homolateral.

Métodos de Imagem na Mulher Idosa

A mamografia é o método mais comum, sendo considerada o padrão-ouro; a ultrassonografia é útil, auxiliar à mamografia, especialmente na mama densa e para guiar procedimentos intervencionistas; a ressonância magnética apresenta seu maior benefício nesta população, na paciente com câncer oculto na mama.

A idade é fator suficiente para parar o rastreamento mamográfico?

Os programas de rastreamento mamográfico foram até os 74 anos e mostraram redução de 20% da mortalidade. Após esta idade, temos apenas estudos observacionais e modelos matemáticos.

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JUN / JUL 2021 nº 122

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Autora Selma di Pace Bauab Médica Radiologista – diretora da Clínica MamaImagem – São José do Rio Preto


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