Jornal de Fato

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DOMINGO, 6 de junho de 2021

CAFEZINHO COM CÉSAR SANTOS

cesar@defato.com

Patrício Lobo

“O principal desafio na profissão é decidir com justiça e celeridade” Por Maricelio Almeida - FOTOS: assessoria

Após 12 anos atuando em Mossoró, o juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Patrício Jorge Lobo Vieira, foi transferido para a capital potiguar, Natal. A mudança, a pedido, foi motivada por questões de cunho pessoal. Ao longo do período em que exerceu a magistratura na região Oeste, Dr. Patrício Lobo sempre teve o seu trabalho muito bem avaliado. Discreto, optou pela dedicação à atividade jurisdicional sem que os holofotes ofuscassem a sua destacada atuação.

Após 12 anos atuando em Mossoró, o senhor foi transferido para Natal. Como o senhor avalia esse período em que desempenhou suas funções de magistrado na segunda maior cidade do Estado? Inicialmente, eu gostaria de agradecer a você Maricelio, e ao Jornal de Fato, pelo diretor César Santos e demais integrantes, pela gentileza e cordialidade em relação à nossa entrevista e conversa, já que é uma honra poder partilhar um pouco da minha jornada em Mossoró, nesses 12 anos de trabalho aqui na querida região Oeste potiguar. A permanência pelo longo período na região foi de uma riqueza em todos os sentidos, e não apenas profissional. De fato, um aprendizado também no âmbito pessoal e cultural. Mossoró é uma cidade de riquíssima cultura e tradição. É a nossa terra de Santa Luzia e da liberdade. Quem conhece a história de Mossoró e passa a incorporá-la na sua vida, aos seus valores, seguramente, não pode permanecer a mesma pessoa, tampouco esquecê-la. A minha gratidão a Deus, a Mossoró e às boas pessoas que conheci e que me acolheram em mais de uma década de morada. A minha remoção/transferência para a Comarca da Capital efetivou-se a pedido. Os motivos principais foram de cunho familiar, após muita reflexão, e não foi uma decisão fácil, já que, realmente, tornei-me não apenas um mossoroense, mas um tibauense nato. Quais as expectativas do senhor em relação a esse novo momento da carreira, agora na capital potiguar? É um novo ciclo que se inicia. Uma verdadeira reconfiguração funcional, um nítido recomeço, com novos desafios. Sinto-me com a sen-

sação do dever cumprido em relação a missão jurisdicional que desempenhei nesta região, notadamente, Baraúna, Apodi e Mossoró. Mas o ser humano também necessita de desafios para enfrentar, e isso gera um novo estímulo de vida. O novo, a saída da zona de conforto, gera uma inquietação salutar e rompe eventual tendência à acomodação de qualquer profissional. A região metropolitana de Natal concentra a maior parte dos processos judiciais do Estado, é uma demanda processual enorme e, ao mesmo tempo, riquíssima, no sentido de aprendiza-

Dr. Patrício Lobo é o entrevistado da semana da seção “Cafezinho com César Santos”. Na conversa a seguir, ele aborda a sua transferência para Natal, fala com carinho sobre o período em que permaneceu em Mossoró e revela as expectativas na nova Comarca. O magistrado, que também exerceu a função de juiz eleitoral, comenta as peculiaridades do pleito em cidades do interior, defende a urna eletrônica e opina sobre o cenário de polarização vivenciado no país atualmente. Acompanhe.

do do Direito e da busca de soluções para que os mais diversos conflitos entre as partes no processo sejam resolvidas. As expectativas são positivas e desafiadoras. Que ações, projetos, serviços o senhor destacaria desse período atuando na Comarca de Mossoró? Não teria como apresentar um projeto ou serviço específico. Na realidade, as minhas duas maiores preocupações em relação à minha atividade jurisdicional em Mossoró foram a celeridade no andamento das ações judiciais e a qualidade das de-

cisões, buscando decidir os casos com serenidade, presteza e justiça. Sem dúvida, a maior vitória não apenas minha, mas de toda a minha equipe com quem sempre trabalhei e sem a qual nada alcançaria, foi quando conseguimos superar as metas do próprio Conselho Nacional de Justiça, zerando os processos para decisão no gabinete e atualizando os processos antigos. Outro motivo de muita satisfação foi em relação à excelente parceria com as Faculdades de Direito de Mossoró, que permitiram a organização de eventos interdisciplinares envolvendo

a problemática da saúde mental, ocasião em que conseguimos reunir estudantes, profissionais do Direito, da Psiquiatria, da Enfermagem, Psicologia e Serviço Social, representantes da classe política e professores universitários, debatendo assuntos extremamente delicados e que, seguramente, trouxeram algo positivo para a comunidade mossoroense. O senhor sempre teve uma atuação destacada, com um trabalho muito bem avaliado. A que o senhor atribuiria esse reconhecimento? Eu fico muito grato pelo reconhecimento, recebo-o com humildade e alegria, mas partilho-o com a minha equipe de trabalho com quem passei mais de uma década nessa missão. Sempre busquei um tratamento respeitoso com as partes, os profissionais do Direito que atuavam na Vara, servidores e terceirizados, e sempre estimulei a equipe para o mesmo mister, implementando ações integralmente voltadas à eficiência do serviço público, tantas vezes, tachado injustamente de ineficiente. Sempre buscamos combater isso, mostrando que é possível, mesmo com uma estrutura pequena, respeitando nossas limitações, prestar um serviço com celeridade, firmeza e qualidade. Somos limitados, certamente, como profissionais e seres humanos, além das limitações estruturais, mas sempre buscamos trabalhar muito, no mais das vezes, a um custo elevado, já que tempos preciosos a serem dedicados a família foram direcionados, muitas vezes, à apreciação de processos, para que as partes recebessem a justiça que entendiam devidas em um tempo razoável. O senhor atuou também como juiz eleitoral na cidade. Como o senhor avalia essa experiência? Exatamente. Coordenei eleições estaduais em Mossoró e Baraúna, e ainda recebi para processo e julgamento inúmeras ações de eleições municipais na época. Foi um período muito rico, em todos os sentidos. Toda a minha formação é originária da Justiça Eleitoral, já que, antes da Magistratura, fui servidor dos Tribunais Regionais Eleitorais de Pernambuco e da Paraíba, o que me rendeu uma experiência muito importante no trabalho em terras potiguares. As eleições no interior são singulares, diferente das capitais e dos grandes centros urbanos. As paixões geram brigas, ofensas, intrigas, disputas ardentes e alguns conflitos sérios, exigindo uma atuação firme, mas, ao mesmo tempo, extremamente equilibrada do juiz. O que exige muita capa-

cidade de diálogo com os envolvidos no pleito... No período em que atuei nesta região, sempre procurei o diálogo prévio entre candidatos, partidos, representantes de coligações, advogados, promotoria, fazendo inclusive audiências públicas com a participação da sociedade, da CDL e o apoio dos órgãos e profissionais da imprensa. A atuação sincronizada com a experiente equipe de servidores dos nossos Cartórios Eleitorais foi fundamental. Essa rede de cooperação, com campanhas educativas à população, fiscalizações, acordos para fiel cumprimento da legislação, além de algumas decisões judiciais mais firmes, entre tantos desafios, foram essenciais para que as eleições transcorressem na mais perfeita normalidade. Logicamente, houve casos pontuais que exigiram atuação mais forte da Justiça Eleitoral, com o apoio das forças policiais, mas, no geral, o desiderato foi atingido, permitindo-se eleições tranquilas para que os cidadãos e cidadãs pudessem exercer a liberdade de voto adequadamente. Enquanto ex-juiz eleitoral, como o senhor enxerga a possibilidade de implantação do voto impresso nas eleições 2022? Eu sou um defensor da urna eletrônica. Inclusive, tive o prazer de, quando então servidor da Justiça Eleitoral de Pernambuco, ter ministrado treinamentos a mesários, época da primeira utilização das UEs no Brasil. Todos os procedimentos realizados até a hora da totalização são implementados com extrema transparência e segurança. Logicamente, vivemos em um Estado Democrático de Direito. O Brasil é um país que deve valorizar o pluralismo em todos os seus matizes, inclusive no âmbito das opiniões divergentes, sem que tudo seja polarizado. É direito de cada eleitor ou eleitora defender uma posição que entende cabível em relação à questão do voto impresso ou não. Isso é debate entre o parlamento e a sociedade. Uns defendem que seria um retrocesso, ao passo que outras pessoas sustentam que permitirá uma maior fiscalização, diante dos riscos de potencial fraude em relação à impossibilidade de recontagem de votos. É um tema delicado. A princípio, entendo pela permanência do sistema atual, mas estou estudando e lendo mais sobre o tema para que possa opinar adequadamente. O importante é que tenhamos um sistema cada vez mais seguro e que permita a fidelidade e segurança do voto do eleitor e da eleitora brasileiros.

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