Jornal Laboratorial Contraponto - Ano 19 - Número 121 - Julho/Agosto 2019

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ONTRAPONTO

PEC da morte: (Contra)Reforma da Previdência Por Giovanna Colossi, Maria Clara Vieira e Raul Vitor

Bolsonaro e Paulo Guedes mentem e manipulam dados para gerar um déficit previdenciário capaz de legitimar a proposta da reforma da previdência social

aumento contínuo da expectativa de vida ao nascer foi uma grande conquista da modernidade, ou pelo menos era esse o discurso até começarem a repetir, com expressões graves, que a população está envelhecendo e a Previdência está consumindo o pouco que sobra do orçamento curto de um país em crise. Como uma verdadeira facção criminosa; mídias hegemônicas, governo, economistas, neoliberais e mercado financeiro vêm desde o governo Dilma implementando um discurso mentiroso, criminoso, que pinta a Previdência Social como a nova grande vilã de todos os problemas econômicos do Brasil. Após a instauração do golpe, o governo Temer prosseguiu com a agenda de direita e realizou a primeira proposta de Reforma da Previdência, que prosseguiu no governo Bolsonaro e teve sua primeira aprovação – na CCJ da Câmara dos Deputados – dependendo, agora, apenas de uma comissão especial para então tramitar no Plenário da Câmara e depois no Senado. A PEC 06/2019 prevê mudanças radicais e pesadas para trabalhadores da iniciativa privada, trabalhadores rurais e de determinados servidores públicos. Militares foram inclusos na proposta, mas nada se diz sobre redução dos altos valores de aposentadoria, ou de determinação no aumento de tempo de contribuição. Também é proposto mudar a Constituição para permitir a cobrança da contribuição normal com progressividade para assim distribuir o ajuste fiscal que invariavelmente vai resultar em tributações pesadíssimas ao trabalhador. Outra parte importante do texto é referente a idade e o tempo de contribuição para professores, para servidores com deficiência, para servidores que trabalham em condições prejudiciais à saúde e para carreiras da segurança pública (policiais e agentes penitenciários): “A lei complementar de iniciativa federal também vai fixar os critérios para concessão dos benefícios dos servidores públicos (RPPSs), tais como o rol “taxativo”; os requisitos de elegibilidade; as regras de cálculo, de reajuste dos valores e de acumulação de aposentadorias, pensões e benefícios assistenciais.” (texto retirado do DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socieconômicos) Sem muito rococó, o que o governo propõe é a desconstitucionalização de parâmetros básicos do regime previdenciário dos servidores civis, que, a partir da aprovação da PEC, passarão a ser definidos pelo Congresso através de lei complementar, no caso, pelo mesmo Congresso que já retirou direitos na reforma trabalhista e dialoga para que a reforma da previdência realmente aconteça. Nenhum trabalhador irá dormir em paz sabendo que seu futuro é incerto e não mais garantido na Constituição.

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© Giovanna Colossi

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Cartaz em manifestação contra a reforma da previdência

Outro agravante é a reformulação no financiamento da Seguridade Social. Hoje, um tripé de proteção social que configura a Saúde, Previdência e Assistência Social, pode ser desmantelado para que haja “segregação contábil do orçamento”, isto é, por mais que haja uma ampla base de financiamentos para a Seguridade – contribuição de trabalhadores ativos e patrões, COFINS, contribuição social sobre lucro líquido e renda de loterias – a PEC reforça que apenas a previdência tem caráter contributivo, desvinculada de uma política maior voltada à proteção social dos brasileiros. Muito se fala no Bolsa Família como um dos principais argumentos contra políticas públicas, mas levando em consideração a abrangência da aposentadoria e do programa, a questão da previdência social e rural é mais impactante na vida dos brasileiros. É o maior e mais expressivo mecanismo de redistribuição de renda fundamental no combate à fome, miséria e pobreza. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, a cada R$ 1 real gasto com a Previdência, o PIB aumenta em R$ 0,52. Em termos da previdência rural existe um fator ainda mais significativo, como aponta uma pesquisa realizada pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (ANFIP), por

meio da Fundação Anfip de Estudos Tributários e da Seguridade Social (FAETS), em um levantamento denominado: A Previdência Social e a Economia dos Municípios o qual revela que benefício previdenciário não se limita apenas às famílias que o recebem, ele também é de fundamental importância para a economia dos municípios do interior do país, já que hoje o beneficio recebido pelo INSS supera os rendimentos advindos do trabalho. A previdência rural corresponde a 32% da renda per capita do universo agrário, isso significa que 1/3 da capacidade de consumo da população rural vem da Previdência. Com esse dinheiro, trabalhadores acessam serviços, adquirem medicamentos, utilizam transportes públicos, apoiam a escolarização dos seus netos, compram em mercados e lojas locais e movimentam a economia regional. Sem essa contribuição ocorrerá não só a falência de pequenos municípios, mas a volta de milhões de trabalhadores do campo para a extrema miséria. A medida provisória 871, de 18 de janeiro, que entrou em vigor automaticamente, já demonstrou o que o governo pretende com a Reforma da previdência rural. A medida transferiu de sindicatos para prefeituras a comprovação do tempo de tra-

Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo - PUC-SP

Julho/Agosto 2019


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