Jornal Artefato 04/2018

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Ano 18 - N° 15 - Jornal-Laboratório do curso de Jornalismo da Universidade Católica de Brasília Distribuição Gratuita - julho, agosto e setembro de 2018

Esporte

A luta permanente por patrocínio Pág. 22 e 23

Política

Equilíbrio e reflexão guiam as vésperas das eleições Pág. 3

Ensino

Entrada liberada Desafios enfrentados pelos deficientes no acesso a espaços culturais Pág. 12 e 13

Foto: Mariana Araújo

Afroeducação, obrigatória e negligenciada Pág. 14 e 15

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EDITORIAL

EXPEDIENTE

Nesta primeira edição do segundo semestre de 2018 do Artefato, definimos que a prioridade é mostrar para aqueles que pretendem nos representar na política a lista de desafios e problemas que precisam de respostas e ações. Em outubro, serão eleitos o presidente da República, governadores, senadores, deputados federais, estaduais e distritais. Mais de 28,5 mil candidatos se inscreveram. Os eleitos têm o dever de ouvir e servir à população. A informação é fundamental no processo. Em meio a escândalos de corrupção e falta de credibilidade, além de falhas nos serviços essenciais no país, a parcela mais carente da população é a primeira a sofrer as consequências. É necessário dar espaço para que as vozes dos anônimos sejam ouvidas e propagadas pelos meios de comunicação. Temos a obrigação de levar essas questões à toda sociedade. Da reunião de pauta à edição final, tivemos a certeza de que ainda há muito trabalho pela frente. No momento em que as reações extremistas ganham força, devemos tomar cuidado e analisar as propostas apresentadas. O voto é a ferramenta democrática de transformação. Neste número, o alerta começa com um artigo político sobre a responsabilidade de cada um nas urnas. Há, ainda, uma reportagem sobre a “vaquinha eleitoral´, mecanismo legal para tentar impedir o caixa dois. A reportagem de capa deste número é voltada para as pessoas com deficiência. que estão entre as mais vulneráveis e esquecidas, inclusive no campo da cultura. Este número do Artefato detalha os desafios e os esforços para vencer esses obstáculos. Na educação, estudantes afrodescendentes reivindicam o direito de conhecer a história real da África e seus antepassados. Na economia, trabalhadores mostram a ginástica contínua para administrar salário, contas e impostos. A saída para muitos trabalhadores é a busca pelo sonho de virar seu próprio chefe: é a abertura de empresas. Só no Distrito Federal, mais de 316 mil pessoas foram atrás deste desejo. Com 12,9 milhões de desempregados no país, o caminho para muitos é o da informalidade. O jornal laboratório foi atrás de alguns dos 188 mil moradores do Distrito Federal que trabalham, mas não têm direito a benefícios nem desfrutam de garantias. A saúde pública está diretamente associada às ações coletivas, como a preocupação com a coleta de lixo, e a imunização contra doenças que podem levar à morte, como poliomielite e sarampo. O Distrito Federal simboliza parte dos problemas do país no que refere à mobilidade urbana: transporte público escasso, caro e que não vai a todos os lugares.

Jornal-laboratório do curso de Jornalismo da Universidade Católica de Brasília Ano 18, nº 15, julho, agosto e setembro de 2018 Reitor: Prof. Dr. Ir. Jardelino Menegat Pró-Reitor Acadêmico: Prof. Dr. Daniel Rey de Carvalho Pró-Reitor de Administração: Prof. Júlio César Lindemann Assessor da Reitoria: Prof. Dr. Ir. Lúcio Gomes Dantas Diretora da Escola de Educação, Tecnologia e Comunicação: Prof. Drª. Anelise Pereira Coordenador de Curso de Jornalsimo: Prof. MsC Leandro de Bessa Oliveira Professora responsável: Profa. Drª. Renata Giraldi Professor Auxiliar: Prof. Fernando Esteban Orientação de Fotografia: Prof. Dr Rafael Castanheira Apoio: Iago Kieling, Karyne Nogueira e Lukas Soares Apoio Técnico: Patricy Albuquerque e Sued Vieira Monitora: Verônica Holanda Editores-chefes: criação coletiva Editores de arte: criação coletiva Editores de texto: criação coletiva Diagramadores: Alessandra Miranda, Amanda de Castro, Eugênia Martins, Flávia Brito, Gustavo Elisson, Laryssa Passos, Leopoldo Gomes Costa, Marcus Castro, Mariana Alves, Matheus Nascimento, Nathália Teles, Rafaela Gonçalves e Tuanny Carvalho. Editor de fotografia: Matheus Nascimento Sub-editor de fotografia: criação coletiva Editores de web: Matheus Nascimento Social mídia: Rafaela Gonçalves Repórteres: Alessandra Miranda, Amanda de Castro, Eugênia Martins, Flávia Brito, Gustavo Elisson, Laryssa Passos, Leopoldo Gomes Costa, Marcus Castro, Mariana Alves, Matheus Nascimento, Nathália Teles, Rafaela Gonçalves e Tuanny Carvalho Fotógrafos: Amanda Carneiro, Andressa Gonçalves, Breno Araújo, Daniel Casagrande, Gabriela Fonseca, Hedhuy Tenório, Igor Porto, Kesley Pereira, Maria Luyne, Monicky Yuka, Nathália Vargas , Laís Rocha, Larissa Abreu, Lays Cristina, Rafael Machado, Ribamar Martins Ana Carolina Castro Dos Santos, Carolina Paiva Santos, Felipe Augusto Freitas Cardoso , Gabriela Almeida Silva, Gabryel Jackson Linhares, Geovanna Soares Dos Santos, Julia Eleutério Martins, Liliana Lima Dos Santos, Lucas Campos Almeida Feitosa, Mariana Albernaz Mundim Tavares, Mariana Sousa De Araujo, Maryanna Aguiar Abreu, Nicoly Silva De Sousa, Thalita Cardoso Da Silva e Yasmin Ibrahim De Faria Ilustrações: Freepik.com Tiragem: 2 mil exemplares Impressão: Gráfica Athalaia Universidade Católica de Brasília EPTC QS 7, Lote 1, Bloco K, Sala 212 Laboratório Digital Águas Claras, DF Telefones: 3356-9098/9237 Todas as matérias têm ampliação de conteúdo na web. Acesse nossas redes sociais e site. E-mail: artefatoucb1@gmail.com Jornal online: issuu.com/jornalartefato Facebook: facebook.com/jornalartefato Site: artefatojornal.wordpress.com Snapchat: @artefato Instagram: @jornalartefato

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ARTIGO

A sociedade em reflexão

Leopoldo Gomes Costa

polpudos capitais como justificativa para não terem de surrupiar o dinheiro do povo. A mesma estratégia foi usada por Fernando Collor em 1989. O discurso de quem acaba de entrar na disputa é mudar o que está aí. A estratégia é comum: Acabaram de se matricular no jogo político, logo, querem o espaço de quem já está no poder. Entretanto, é recomendável desconfiar dos possíveis aproveitadores, já que, por almejarem esse espaço, podem utilizar quaisquer argumentos. Com a internet, nos reunimos em grupos de pensamentos semelhantes, entrando em uma bolha, acreditando que nossas opiniões são o mais puro símbolo da verdade, e abominando o oposto. Julgamos o diferente, atribuímos rótulos. Nos indignamos quando somos os alvos dessas mesmas suposições. Arranjamos inimigos. “As bolhas, em um lado positivo, colaboraram para essa mudança na imprensa. Mas temos que tomar cuidado com o lado negativo, que

é a divulgação de mentiras pela rede, a desinformação”, afirmou Juliana Góes. Para ela, o povo brasileiro é visto como “apático” desde cedo, mas essa construção não é real. “Se você for olhar na história que a gente tem, da resistência dos movimentos sociais, é uma história gigantesca. Em 2013 houve uma tentativa, no início, de taxar as mobilizações como atos de vandalismo, como já ocorria na maior parte das manifestações. A mídia foi pressionada a mudar seu discurso, o que gerou mais publicidade para as ideias que se seguiram”. Mesmo que tenhamos no poder um presidente com altíssimas taxas de rejeição, não espere tranquilidade com os resultados da próxima eleição. Seja qual for o eleito, uma união nacional será um desafio. Estamos nos tornando mais críticos ou mais concentrados em nos reunir com nossos iguais? Precisamos manter a tranquilidade e o equilíbrio para os dias que virão.

Foto: Gabriela Fonseca

O primeiro turno das eleições se aproxima – 7 de outubro. Se houver segundo turno, será em 28 de outubro. As jornadas de junho de 2013 levaram às ruas uma parcela jovem da população, que se dizia cansada da velha política. Hoje assistimos às candidaturas dessas forças, propondo alternativas na forma de governar. É visível a busca por mudanças em ambos os lados. Mas será que estamos vendo uma transformação ou estão utilizando o momento para benefício próprio? A cientista política Juliana Góes disse que o real impacto das jornadas de 2013 ainda não é muito claro, mas existe muita pesquisa na área. “As elites que controlam a comunicação brasileira acabam atrapalhando o processo, pois elas definem o que pode ou não ser noticiado para a população”. Na divulgação das candidaturas, encontramos pessoas de diversos perfis. Temos supostos outsiders, vendendo a imagem de “não-políticos” e usando seus

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MOBILIDADE

Imagem cotidiana de moradores do Distrito Federal esperando o transporte público

Ei, para, olha o sinal Transporte público no DF é um dos mais deficitários do país, GDF rebate Marcus Castro

Moradora do Setor O da Ceilândia, Letícia de Sousa, estudante de biblioteconomia na Universidade de Brasília (UnB), acorda às 5h todos os dias para conseguir chegar a tempo na Rodoviária do Plano Piloto e pegar um ônibus que passe na universidade. A rotina dela não é diferente da maioria dos brasilienses que dependem de transporte público no Distrito Federal.

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“Demoro de 1h30 a 2h para chegar na aula se eu pegar ônibus e metro, quando vou direto de ônibus já demorei de 3h a 5h. Eu sempre chego atrasada”, desabafou a universitária. Em 2018, o instituto norte-americano Expert Market fez um levantamento em 74 dos principais centros urbanos do mundo e avaliou que o transporte público brasiliense está entre os 10 sistemas mais

deficitários perdendo apenas para o Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador no Brasil. O estudo considerou a espera da condução, duração da viagem e custo mensal do transporte de acordo com o salário médio da população. Segundo a pesquisa, o tempo médio de espera do ônibus ou metrô é de 28 minutos e as passagens consomem, em média, 5,77% da renda mensal do


Foto: Larissa Abreu

Alternativas

passageiro. A Secretaria de Mobilidade do Distrito Federal discordou da pesquisa alegando que ela foi imprecisa para a capital. “A pesquisa [nem] sequer leva em consideração elementos importantes e fundamentais para se avaliar um Sistema de Transporte Público de uma região, como por exemplo, a densidade demográfica de cada localidade, o processo de urbanização das cidades, a qualidade da frota, entre outras.” Segundo a secretaria, em Brasília há grandes distâncias entre as regiões administrativas e o centro. Informa ainda que a pesquisa não leva em conta o processo de integração dos transportes que possibilitam mais agilidade para locomoção no DF e entorno.

Estudo feito em nove capitais pela Associação Nacional da Empresas de Transporte Urbano (NTU) revelou que, no ano passado, houve a redução média de 9,6% de passageiros nos transportes públicos. Isso significa que 3,6 milhões de brasileiros desistiram de usar o sistema. Para driblar esse problema de mobilidade, a população busca outras formas de se locomover dentro da cidade. Uber, táxi e bicicletas são as principais escolhas atualmente. As bicicletas estão sendo bem requisitadas por serem práticas, saudáveis e não poluentes. Em 2015, uma pesquisa da Associação Transporte Ativo indicou que 82% dos ciclistas brasilienses utilizam o transporte para trabalhar e 77% para a faculdade/escola. Estudante, Ana Julia Gomes, 16, é uma das pessoas que fizeram a troca. Ela abandonou de vez os ônibus e usa a bicicleta como forma de condução. “É prático, não pego trânsito, sempre chego rápido e é saudável. É muito menos estressante que pegar um ônibus. Só precisa tomar cuidado com as pistas” Uber é também uma alternativa à acessibilidade. O aplicativo de celular que chegou no Brasil em 2014 já está em mais de 100 cidades no país e tem quase 500 mil motoristas parceiros. Morador da Ceilândia Norte Matheus Henrique Leite da Silva, estudante, é um cliente constante: sai de casa com o celular preparado para entrar no aplicativo e contratar uma viagem com comodidade e rapidez, segundo relatou. “Quando você pede ele chega rápido, você vai sentado, no ar condicionado. Não é um transporte precário. Há viagens que são longas e saem a um preço em conta, ainda mais, se você dividir com seus amigos. ”

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SOCIAL

Lixo é para ser cuidado

Reciclagem e coleta seletiva podem ser utilizadas na redução de detritos Tuanny Carvalho

Cacos de vidros, restos de materiais industriais, entre outros tipos de lixo, próximos ao Centro de Referência de Assistência Social (Cras), a quadra de esportes, e a Escola Classe 01 do Riacho Fundo 2. Terrenos abandonados em que há grande demanda de lixo em Ceilândia. No Setor Comercial Sul, o acúmulo da sujeira está a céu aberto, problemas que atraem baratas, ratos e até escorpiões. A coleta de lixo (foto ao lado) é um desafio para os governantes diante das demandas e do aumento contínuo da quantidade produzida pelo s moradores. De janeiro a julho deste ano, foram recolhidas 401.588.64 toneladas de lixo pelo Serviço de Limpeza Urbana (SLU) no Distrito Federal. Segundo especialistas, a falta de conscientização gera acúmulo de lixo nos centros urbanos. Há, ainda, o problema da ausência de cuidado adequado com a decomposição dos resíduos que gera um líquido denominado “chorume”, tóxico que pode contaminar o solo, e piora no período de seca com os maus odores gerados pela degradação natural dos resíduos que é acelerada em função do aumento da temperatura. Queixas Denise Vieira, 42 anos, técnica de enfermagem, é moradora do Riacho Fundo 2 há 19 anos, tem um filho de 8 anos que estuda na Escola Classe 01, e usa a quadra para jogar bola. Recentemente, o filho cortou o pé em cacos de vidro enquanto jogava bola que estava na grama em volta do campo. “Como aqui é uma área de lazer, sempre tem muita gente então deveria haver mais limpeza por aqui.” De acordo com o SLU, a coleta de lixo é feita diariamente e cabe aos moradores e estabelecimentos comerciais, organizá-los conforme os horários definidos. Pelos dados da SLU, os comerciantes que produzem acima 120 litros de resíduos não recicláveis são responsáveis pelo armazenamento do lixo nos contêineres, além da coleta e disposição final em aterro sanitário.

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Foto: Amanda Freitas

Rose Souza, 33 anos, trabalha como gari há 9. Ela reclamou que o preconceito com a profissão é presente e constante. “Muitas vezes a gente quer usar o banheiro e não pode. Até água é negada.” A gari contou que é grande a demanda no Plano Piloto, principalmente nas áreas próximas aos comércios. Segundo ela, a situação se agrava nas regiões em que há pessoas em situação de vulnerabilidade, vivendo nas ruas, pois sem locais para fazerem as necessidades, acabam transformando espaços públicos em banheiro. “É muito lixo pra pouco gari. As pessoas não têm educação, e em determinadas situações é constrangedor”, afirmou. No

entanto, Rose Souza disse que com o surgimento da coleta seletiva melhorou o recolhimento do lixo, pois há a “separação adequada do material”. Desde 20 de janeiro de 2018, os resíduos não aproveitados para reciclagem e compostagem são destinados para o Aterro Sanitário de Brasília (ASB). A engenheira ambiental e mestre em engenharia civil pela Universidade de Brasília (UnB) Beatriz Barcelos faz um alerta aos terrenos abandonados que possuem lixos. “É preciso retirar os resíduos despejados em locais inadequados e sem as devidas condições técnicas. Essas áreas que recebem o lixo de forma clandestina devem ser isoladas e fiscalizadas constantemente


para que não seja feita mais nenhuma disposição, e a população precisa ser conscientizada de não dispor resíduos. Pois, isso não cabe só ao poder público”, afirmou Beatriz Barcelos

Lei

No Brasil está em vigor há oito anos a Lei 12.305/10, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos para definir o manejo adequado dos resíduos sólidos. Por meio da análise em 1.721 municípios brasileiros, a região Sul foi a mais bem avaliada no Índice de Sustentabilidade de Limpeza Urbana (ISLU). A lei, sancionada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2010, tem o objetivo de pôr em prática o hábito de consumo sustentável , reaproveitamento de resíduos sólidos, e a destinação correta daquilo que não é utilizado. O Instituto Lixo Zero Brasil que se trata de uma organização sem fins lucrativos trabalha em prol desta norma mobilizando a comunidade. O diretor da instituição Kadmo Cortes, disse que é necessário informar mais a população. “È possível o uso do redsigner. Pois, há plásticos de shampoos que não dão para reaproveitar devido a fabricação.”

Foto: Lays Cristine

Coleta Seletiva Aposentado, Antenor Vieira (foto acima), 52 anos, morador do Riacho Fundo 2, separa o material reciclável para a coleta seletiva feita pela cooperativa e elogia o trabalho. “É muito bom porque tá conscientizando à população a separar o lixo.” Os sacos de recicláveis devem ser entregues para a coleta seletiva nos dias e horários corretos. Mário Uerles, 23 anos, é coletor da cooperativa Coopere que atua no Riacho Fundo 1 e 2, trabalha desde quando começou a coleta e teve que fazer o curso de capacitação do SLU. “O foco é recolher tudo aquilo que é reciclável. E o que não for ser jogado no aterro.” A determinação do SLU é ampliar o serviço da coleta para 100% da região do Distrito Federal com a contratação de novas empresas de limpeza urbana, por meio da licitação que está em andamento. No total, 11 cooperativas e 17 organizações contratadas governo do Distrito Federal prestam serviços para a coleta seletiva e a coleta de materiais recicláveis (papel, papelão, plástico, isopor, metal) que não devem ser misturados ao lixo comum das residências ou local de trabalho. Após o recolhimento dos materiais recicláveis, os sacos de lixo seguem para os galpões de triagem. Atualmente o Distrito Federal conta com cinco galpões espalhados pela região. Cada catador recebe em média 187 kg por dia de material reciclável provenientes da coleta feita pela empresa. Aproveitamento médio de 36%. O serviço atende 52% das cidades do Distrito Federal, tais como Águas Claras, Candangolândia, Ceilândia, Cruzeiro, Guará, Itapoã, Lago Norte; Lago Sul, Paranoá; Park Way; Plano Piloto; Riacho Fundo I, Riacho Fundo II, e São Sebastião. Águas Claras, Ceilândia, Cruzeiro, Guará, Itapoã, Lago Norte; Lago Sul, Paranoá; Park Way; Plano Piloto; Riacho Fundo I, Riacho Fundo II, São Sebastião, SCIA/Estrutural, SAI, Sobradinho I, Sudoeste/Octogonal; Taguatinga, Varjão e Vicente Pires, são as demais regiões que passaram a ter o serviço este ano.

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SAÚDE

Vacinar ou não, eis a questão A taxa de imunização entre crianças com menos de 5 anos caiu no país

Foto: Secretaria de Saúde/RS

Flávia Brito

Especialistas defendem que o metódo é o mais eficiente na busca pela erradicação e controle de doenças contagiosas

Ao mesmo tempo que o Brasil registra o retorno de doenças, como sarampo, poliomielite e malária, aumenta também a resistência à imunização por meio da vacinação. Lívia Medeiros, vendedora de 27 anos e mãe de Breno, de 3, resolveu não vacinar o filho. Decisão contrária tomou Cleide Silva, dona de casa, 25, que é favorável à vacinação e imunizou a filha Laura, de 2 anos. Lívia e Cleide simbolizam comportamentos que se tornaram frequentes no país. Cresce o índice de pais que não vacinam os filhos por medo. Em 2017, a taxa de vacinação caiu, com 85,2% das crianças vacinadas, de acor-

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do com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo especialistas, o ideal é 90% de imunização. Pelos dados do Ministério da Saúde, metade das crianças de 1 a 5 anos foram vacinadas ao longo deste ano. O Programa Nacional de Imunização está em vigor no Brasil desde 1973. A erradicação de algumas doenças fez com que o brasileiro se esquecesse da gravidade dessas doenças e se descuidasse da vacinação, segundo especialistas. No entanto, apenas a varíola foi extinta do Brasil. Doenças como sarampo, malária e poliomielite ainda não foram totalmente erradicadas. Foi o que ocorreu com o sarampo, tão contagioso que se dez pessoas

estiverem infectadas, nove devem adoecer. Tendência Nas redes sociais, aumenta a quantidade de grupos em redes sociais contra a vacinação. É o caso da comunidade “O lado Obscuro das Vacinas”, do Facebook, que reúne mais de mil membros. No grupo, as pessoas relatam os temores ao vacinar as crianças e se afirmam contra qualquer tipo de vacina. E alguns pais, defendem que seus filhos não precisam da proteção “artificial” da vacina. O maior receio do grupo antivacina são os efeitos colaterais existentes. Alguns relatam sangue nas fezes dos bebês, vômito e


fraqueza logo após a imunização. Procurados pelo Artefato, os integrantes não quiseram se pronunciar a respeito da contrariedade as vacinas. Oposição Para Cleide Silva, o horário de funcionamento dos postos e a demora no atendimento dificultam a vida dos pais que trabalham. As unidades funcionam apenas de segunda à sexta em horário comercial. Mesmo com essas dificuldades, a dona de casa nunca deixou de levar Laura, de 2 anos, para tomar suas vacinas. “É a forma de proteger e imunizá-la contra essas doenças que estão voltando”, contou. São mais de 1.234 casos de sarampo confirmados no Brasil. Sete pessoas morreram nos últimos meses, dos quais quatro em Roraima e três no Amazonas. Para a técnica de enfermagem Jurciclene Lima, a imunização é fundamental. “É importante vacinar as crianças, para que elas se previnam das infecções causadas pelas doenças”, afirmou. Jurciclene Lima disse que ela nunca deixou de vacinar o filho Bruno. “Ele está com 13 anos e uma saúde perfeita, inclusive tomou a vacina de HPV nesse último mês”. Doenças que voltaram a aterrorizar a população brasileira como poliomielite, sarampo, malária e a febre amarela são doenças com sintomas graves, algumas como o sarampo e a poliomielite são contagiosas, podendo passar de pessoa para pessoa por meio da saliva e fezes.

Revolta da vacina Em 1904, o centro do Rio de Janeiro foi tomado por estudantes e rebelados que enfrentaram tropas do governo em um embate que deixou 30 mortos. O episódio, conhecido com Revolta da Vacina, foi uma reação à campanha de imunização obrigatória contra a varíola, coordenada pelo sanitarista Oswaldo Cruz. Na época, havia 1.800 infectados por varíola. Oswaldo Cruz enviou ao congresso um projeto para a obrigatoriedade da vacina, porém devido à grande manifestação com mortes e confrontos entre policiais e manifestantes, o governo desistiu do projeto. Anos depois, o Rio de Janeiro foi atingido por uma das maiores epidemias de varíola já vista, fazendo com que o povo recorresse à imunização.

A opção pela não imunização pode levar à morte, alerta especialista A pediatra Ana Flávia de Cássia destacou que não vacinar as crianças pode levar ao retorno de algumas doenças. “As consequências da não vacinação vão desde mortes evitáveis pelo o ressurgimento de doenças antes ditas como erradicadas no Brasil. A vacinação é essencial para impedir a volta das enfermidades. ” Atualmente no Brasil existe uma baixa imunização de adultos e muitos só se imunizam diante de campanhas, epidemias e surtos. Para o especialista em imunologia Antônio Macedo, há ausência de informações. “O principal motivo da diminuição vacinal é a falta de acesso em algumas regiões do país e informações erradas. ”

Sarampo Dos 12 meses aos 5 anos incompletos A primeira dose aos 12 meses (tríplice viral) e uma dose aos 15 meses (tetra viral).

Poliomielite Dos 2 aos 6 meses A primeira dose aos 2 meses, uma dose aos 4 e uma dose aos 5 meses todas da VIP (Vacina Inativada Poliomielite).

Dos 5 aos 29 anos Se não tiver recebido as duas doses, devem receber as duas com um mês de intervalo. Pessoas de 30 a 49 anos Devem tomar uma dose da vacina tríplice viral.

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POLÍTICA

Nem só o voto elege

Candidatos precisam de recursos e a opção de muitos é partir para a “vaquinha virtual”

Amanda de Castro

O financiamento coletivo, conhecido também como “crowdfunding” (em tradução livre: “vaquinha eleitoral”), é um dos destaques nas eleições deste ano. A Lei nº 13.488/2017 e a Resolução do TSE nº 23.553 permitem doações de pessoas físicas para pré-candidatos, via plataformas online de empresas regulamentadas e autorizadas pela Justiça Eleitoral. Desde o dia 15 de maio, as doações podem ser realizadas. Para isto, cada candidato deve contratar empresas que oferecem o serviço. O uso pleno dos recursos inicia no dia 16 de agosto, quando a campanha eleitoral dá a largada oficial. “Eles devem ser empregados efetivamente na realização da campanha política e toda logística necessária. Desde a produção de material gráfico, aluguel de espaço físico a contratação de pessoas”, informa o advogado e membro da comissão Eleitoral da OAB/DF Cleiton Souza. Exemplo Militante político desde a infância e ativista no

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centro acadêmico, o sociólogo Leandro Grass, 33 anos, é candidato a deputado distrital pelo partido Rede. Para ele, o financiamento coletivo permite planejar a campanha e medir o apoio dos eleitores. “Facilita bastante o planejamento e potencializa candidaturas comuns, que, se dependessem dos partidos ou das empresas, jamais conseguiriam viabilizar isso.” A nova modalidade surgiu após a Reforma Eleitoral de 2015, que proibiu doações empresariais a políticos, como uma alternativa para arrecadação de recursos. Até o momento, o recordista em arrecadação no Distrito Federal é Marivaldo Pereira, 33 anos. Com uma história de luta, que começa com a mãe diarista, o candidato ao Senado pelo Psol defendeu o sistema como forma de combate à corrupção. “No antigo modelo, algumas empresas financiavam campanhas não com intuito de doação, e sim de investimento. Assim, candidatos e candidatas entravam no poder público devendo favores para essas empresas. Com o crowdfunding eleitoral, a campanha convida pessoas e empresas que realmente acreditam nas propostas divulgadas.”

Normas É necessário que, antes, a candidatura seja homologada pela Justiça Eleitoral. Caso não tenha sido confirmada, o montante será devolvido ao respectivo doador. Por medidas de segurança, é obrigatória a identificação do CPF de cada doador para uma eventual devolução ou para a prestação de contas. Porém, pode ocorrer outra eventualidade é o valor arrecadado ultrapassar o limite estipulado para cada cargo pretendido. Se ocorrer, o restante será transferido ao partido político. Transparência Para evitar fraudes, como a lavagem de dinheiro, alguns critérios foram estabelecidos. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o limite total de doação é de 10% do rendimento bruto que a pessoa física obteve em 2017. Também foi definido um limite diário de R$1.064,10, com o objetivo de facilitar o monitoramento e controle. Caso o doador pretenda repassar algum valor acima, a transferência deve ser diretamente na conta de campanha do candidato. Além disso, a legislação garante o acesso público a dados, como o CPF, o valor da quantia e a data e forma de pagamento. A publicitária Ádila Rocha contribuiu financeiramente para a campanha da candidata a deputada federal Thaynara Melo (Rede). Segundo ela, a “vaquinha eleitoral” facilita o aperfeiçoamento da democracia. “É um passo na longa caminhada de não mais terceirizar o exercício da cidadania, de resgatar o protagonismo dos cidadãos e de diminuir a influência do poder econômico.”


Candidatos Candidatos total - 28.596 Candidatos presidente da republica - 13 Candidatos governador - 199 Candidatos para senador - 357 Candidatos para deputado federal - 8.423 Candidatos para deputado estadual - 17.692 Candidatos para deputado distrital - 968 Fonte: TSE

Vagas Vagas para presidente da RepĂşblica - 1 Vagas para governador - 27 Vagas para senador - 54 Vagas para deputado federal - 513 Vagas para deputado estadual - 1.035 Vagas para deputado distrital - 24 Fonte: TSE

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CULTURA

Acesso restr

Deficientes esbarram em dificuldades para frequentar espaços cultura

Gustavo Elisson

Apesar de a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) ter sido sancionada em 2015, a falta de acessibilidade ainda dificulta o acesso de pessoas com deficiência em vários espaços, inclusive culturais. Segundo o último censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem 45,6 milhões de Pessoas com Deficiência (PCDs). Só o Distrito Federal, reúne cerca 574 mil pessoas. Tão alardeada como educação e integração, a cultura não pode ser desfrutada plenamente pelos deficientes. Aqueles que têm dificuldade de locomoção reclamam da falta de infraestrutura adequada. Quem não escuta ou enxerga se queixa da ausência de audiodescrição e intérpretes. Surdo, o estudante Célio Ramos Marinho, 29 anos, contou que é comum ir ao cinema e não encontrar filmes nacionais legendados. Ele também reclamou da falta de intérpretes de libras em teatros e cinemas. “Eu não consigo entender algumas atrações. É como se estivessem fazendo mímica.” Fiscalização Para o diretor da Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Deficiência (Apabb), Francisco Djalma Oliveira, falta fiscalização e cumprimento das leis. “É necessário fiscalização nesses espaços por parte dos órgãos públicos competentes para que seja cumprida a lei. E no caso do não cumprimento a aplicação das penalidades cabíveis.”

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Segundo Oliveira, outro ponto é que entidades e conselhos de representação das pessoas com deficiência colaborem com o poder público. “A sociedade civil deve se apropriar dessas questões e cobrar uma aplicação mais rigorosa da lei para que não haja mais casos de descumprimento. ”

“Eu não consigo entender algumas atrações. É como se estivessem fazendo mímica” Célio Ramos

Casos Surdocego desde os 4 anos, após um tumor no cérebro comprometer o ouvido direito e o nervo ótico, o auxiliar administrativo Seiti Kleffer, de 28 anos, conta que já deixou de frequentar alguns espaços culturais por conta da falta de acessibilidade. “Eu acabo não frequentando, às vezes, prefiro

ter acesso a filmes em casa.” Questionado sobre as dificuldades que encontra ao frequentar esses espaços, Seiti criticou a falta de audiodescrição e mobilidade. “Como a minha deficiência é visual, parte das dificuldades que eu tenho está relacionada à falta de audiodescrição.” Como exemplo, Seiti Kleffer descreve que busca filmes dublados, mas há “coisas que acontecem nas cenas” que não dependem somente da fala dos personagens. “No teatro, muitos não fazem a descrição correta do que está acontecendo. Também tem o fato de alguns locais possuírem muitos obstáculos e escadas bem íngremes. ” Cadeirante há 8 anos, o estudante de publicidade e propaganda Rodrigo Leão, contou que as dificuldades começam no estacionamento, pois não consegue sequer encontrar vagas nos espaços culturais. “Existem as pessoas que não respeitam e param na vaga de deficiente”, acrescentou o universitário, explicando que quando tem o assento específico, falta espaço para o acompanhante. Exemplo Para o ator e filho de pais surdos, Danilo Cardoso, existe uma preocupação por parte dos gestores de políticas culturais em colocar em seus editais que os projetos tenham acessibilidade, mas segundo ele, ainda são movimentos pontuais. “Alguns editais exigem que a produção tenha acessibilidade e outros não.


Foto: Gabriela Fonseca

trito

turais

É necessário que haja uma disponibilidade, sensibilidade e um olhar empático para essas novas demandas da sociedade.” Em seguida, o ator acrescentou: “É preciso levar em consideração que não é barato colocar um intérprete de libras traduzindo todo um espetáculo, não é barato promover a audiodescrição ou confeccionar um folder em braile, mas a gente não pode se submeter ao aspecto econômico e esquecer do aspecto humanitário e da vida das pessoas.” Para Cardoso, é fundamental mudar o quadro atual. “É nosso papel enquanto cidadãos cobrar que a cultura seja entendida como um direito, e um direito para todas as pessoas, inclusive aquelas que necessitam de auxílio para ter uma fruição em plenitude diante das obras e eventos públicos”, afirmou. Inclusão O Festival Internacional de Teatro de Brasília – Cena Contemporânea, deste ano em agosto e setembro, apresentou uma programação com iniciativas para inclusão de pessoas com deficiência na cultura com interpretação simultânea para a Língua Brasileira de Sinais (Libras), para surdos e a apresentação de uma peça teatral com audiodescrição, para deficientes visuais.

Como denunciar Presenciou alguma situação de violação de direitos humanos relacionados à pessoa com deficiência? Disque 100 e denuncie. O Disque Denúncia ou Disque 100 atende graves situações de violação que acabaram de ocorrer ou que ainda estão em curso, acionando os órgãos competentes, possibilitando o flagrante. O serviço funciona diariamente, 24 horas por dia, incluindo sábados, domingos e feriados. A ligação é gratuita.

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EDUCAÇÃO

Afroeducação, disciplina para a vida Professores no Gama se tornam referência, utilizando artes e jogos

Mariana Alves

Exemplo Em uma escola tradicional da rede pública do Gama, os professores João Camargo e Valdeci Moreira usam os instrumentos das artes cênicas e do Teatro Negro como forma de resgate e valorização

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arte começou ser caracterizada como matéria menor. Estudantes do Ensino Fundamental, em muitas escolas, não têm referência do que é arte, não tem referência do que é teatro, mesmo estando no Gama.”

da memória afro brasileira nas escolas públicas do Gama. Camargo, professor e arte educador, disse que abrir diálogo em qualquer sala de aula é um desafio. “A nossa escola [no sistema atual] é racista. O crime é praticado praticamente todos os dias, mas existe um acordo nas escolas em que preferem abafar os casos, para evitar exposição. É aí que entra o professor de arte para levantar essa bandeira.”

Dados Foto: Arquivo Pessoal

Negro, morador da periferia do Novo Gama e com orgulho de sua história, aos 16 anos, Hebert Dantas da Silva (foto) se coloca no mundo como mais um estudante que cresceu com a imagem estereotipada de que a África se resumia à escravidão. O estudo da memória afro-brasileira e africana é conteúdo obrigatório no currículo escolar brasileiro, mas na prática nem sempre está presente nas instituições escolares. Porém, no Gama, cidade a 30 quilômetros do Plano Piloto, há professores que se esforçaram e conseguiram incluir com elementos lúdicos, como pesquisa histórica e artes, a disciplina como tema obrigatório no colégio público CEF 03 e colhem os resultados da dedicação. No entanto, a maioria dos estudantes ainda se queixa do esquecimento do tema. Para Herbert, a ausência da disciplina em sala de aula leva ao agravamento de situações de racismo e preconceito. Segundo ele, a escola falha por conivência com um “passado opressor”. “Nossos antepassados não são escravos, há reis, sabe? Guerreiros”, reagiu. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 53% da população brasileira se considera preta ou parda. Em um ano sobe para 6%, o número de brasileiros que se declaram pretos. Essa amostra representa cerca de 17,8 milhões de pessoas, segundo o instituto.

Por meio de jogos e criação de cenas, João ajuda os alunos a buscarem suas próprias identidades. A prática lúdica parte, em várias ocasiões, das próprias vivências pessoais do estudantes. Para Camargo, o desafio cotidiano é que ensino da arte ainda disputa atenção com outras matérias consideradas de “maior” importância. “Os estigmas passam por nós desde a década de 1970, onde a

Pelos dados da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), coletados entre 2011 e 2015, negras e negros correspondem a 57% para a população do Distrito Federal atualmente DF e entorno tem cerca de 4,3 milhões de habitantes. Herbert foi aluno de João Camargo, em 2016 no CEF 03 do Gama. Segundo ele, as aulas eram dinâmicas, com variados movimentos que levaram ao desenvolvimento de cenas de teatro. O método de didático é baseado na exploração do conteúdo de história e cultura africana por meio de pesquisa, fotos, vídeos, espiritualidade, ancestralidade somado às experiências dos alunos, principalmente negras e negros. “O João Camargo [professor] foi fundamental para que eu me descobrisse através da arte. O teatro é uma ferramenta pra eu contar minha história, é a forma de eu me expressar como negro na sociedade”.

“Tenho orgulho de ser preto” Herbert Dantas


Foto: Ribamar Martins O arte educador Valdeci Moreira defende a cultura como método pedagógico e fislosófico .

Foto: Arthur Pereira

Residência Valdeci Moreira, 45, mestre em teatro comunitário e arte educador, desabafou que está desanimado com o ambiente hostil que a escola proporciona para tratar das temáticas negras. “Ninguém quer falar, a verdade é essa. Ninguém quer levar um negro, levar um pai de santo vestido a caráter pra dentro da escola.” A Lei 10.639/2003, que determina a obrigatoriedade da inclusão de conteúdos sobre a História da África e dos africanos no Brasil, completou 15 anos. A prática pedagógica na abordagem dessas matérias tem como principal obstáculo o olhar eurocêntrico-tradicional institucionalizado na cultura racista do país. Para Caio César (foto à esquerda), 35, professor de geografia e pesquisador no campo das masculinidades negras, é importante colocar a afroeducação como protagonista da própria pedagogia. “Acredito que trazendo ao centro do debate nossas vivências, nossas contribuições e nossos valores dentro de uma sociedade que, historicamente, nos nega isso. Mostrar que nós sempre tivemos papel ativo e positivo na construção deste país.” A reportagem do Artefato procurou a Secretaria de Educação do DF em busca de respostas sobre as queixas e dificuldades relatadas para a aplicação da lei. Até o fechamento desta edição não obteve resposta. Ao trazer a afro-eucação para o debate, o professor Caio César estimula o interesse dos alunos pelo tema

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EMPREENDEDOR

Dono e chefe ao mesmo tempo Mais de 316,2 mil brasilienses realizaram o sonho de montar o próprio negócio

Eugênia Martins

Foto: Carol Castro

Nos últimos anos, 316.298 brasilienses decidiram ser chefes deles próprios. No Brasil, 12 milhões de pessoas devem se tornar microempreendedores individuais até 2019, segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). A maioria tem acima de 35 anos e menos de 65. Professor da Universidade Católica de Brasília (UCB) Igor Gomes, especialista em Gestão de Pessoas, especialista em Inovação e Competitividade pela University of Miami, mestre em Marketing pelo Emerson College (Estados Unidos), disse ao Artefato que não basta desejar abrir um negócio, é preciso ter conhecimento e preparar-se. “[É necessário] realizar uma pesquisa de mercado para mapear as oportunidades e preparar-se adequadamente. O empreendedor deve focar em algo que ele

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tenha paixão ou experiência profissional. Se o negócio for viável financeiramente, é um bom indício de que poderá obter sucesso”, ensinou. Números Dados do Sebrae e estudos de Igor Gomes mostram que 33,2% dos investidores individuais têm de 35 a 45 anos. Os adultos com idade de 45 a 55 anos representam 25,03% e que têm de 25 a 35 anos equivalem a 19,65%. Os demais se dividem entre adultos acima de 55 anos (13,87%) e com menos de 25 anos (4,23%). Os idosos com mais de 65 anos representam 4,22% dos investidores individuais. O mesmo levantamento indica ainda que a maioria de 56,83% optou por abrir negócios na área de serviços, outros 30,19% escolheram aplicar o dinheiro no comércio e

apenas 5,8% na construção civil e indústria. Diferenças Há diferenças no enquadramento empresarial, conforme o tamanho da empresa e dos rendimentos anuais. Andréia Ramos Pinto, dona de uma loja de presentes no Guará (foto acima), escolheu ser enquadrada como empresário individual (MEI). “Eu precisava trabalhar, não podia sair e deixar minhas filhas sozinhas em casa, então montei meu negócio em casa mesmo”. Andréia começou com vendas para os amigos até montar a loja física. Atualmente ela conta que tem uma boa renda. Apesar do receio se daria certo, ela foi adiante e diz ter sido a melhor opção para sua vida. “Não precisei fazer empréstimo. O que foi difícil foram as documentações, abrir a loja legalmente e contratar funcionários”.


Além do MEI, existe também a Sociedade Limitada (LTDA). Essas empresas têm o capital dividido por quotas, e cada sócio tem uma parte da empresa. Quanto maior a quota, maior é a influência de cada sócio. Exemplo Venâncio Henrique da Silva se uniu a Guilherme Alves (foto ao lado) e Guilherme Borges e o investidor Higour Brendon, os quatro se tornaram sócios, e trabalham com a venda de vaporizadores, também conhecidos como “vape” - produtos do segmento de tabacaria voltados para o público adulto. Após se encantar com o “vape”, Venâncio chamou os amigos pensando em transformar o produto em negócio. O grupo fez os cálculos de investimentos, possibilidades de lucro e perspectivas. Foi aí que os quatro decidiram abrir o próprio negócio. “Chamei meus amigos de confiança, apresentei a proposta, conversamos por umas duas semanas, analisando o mercado e iniciamos nossos atendimentos no final de fevereiro”, afirmou Venâncio.

“A potencialidade de crescimento no empreendimento é, sem dúvidas, maior do que a de crescimento dentro de grandes empresas. ” O grupo trabalha a semana inteira, menos domingo, com atendimento presencial e virtual. Os sócios se dividem entre atendimento via Whatsapp, entregas e questões relativas à administração, tesouraria, estoque e parcerias. A rotina é exaustiva, reconheceu Venâncio, mas válida. “É outra visão de trabalho. Ter o próprio negócio é gratificante. ”

Foto: Geovanna Soares

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EMPREGO

No caminho da informalidade Dos 316 mil desempregados no DF, 188 mil não têm benefícios nem garantias

Pessoas buscam na informalidade a oportunidade para escapar do desemprego

Foto: Kesley Pereira

Alessandra Miranda

Raissa Alves, 25 anos, busca emprego há mais de dois anos. O mesmo ocorre com Érika Miranda, 28, formada em administração. Ambas relatam desalento e falta de perspectiva. No país, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 12,9 milhões de pessoas encontram-se desempregadas. O caminho para uns é a insistência pelo emprego com carteira assinada, mas a estimativa é que 22,9 milhões de trabalhadores brasileiros atuem na informalidade. No Distrito Federal, o cálculo é que sejam 316 mil pessoas desempregadas e 188 mil optaram pelo trabalho informal, segundo o Sistema Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED). É o caso de Silvia Maria Fidélis da Costa, 41 anos, que se viu obrigada a trabalhar como autônoma após sua demissão do Ministério do Planejamento. Sem oportunidade de emprego e correndo risco de ser despejada de casa com três filhos pequenos

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e uma neta, decidiu que era hora de buscar alternativas. Silvia Fidélis resolveu vender doces na Rodoviária do Plano Piloto, onde trabalha há cinco anos. “Entreguei muitos currículos durante o tempo que passei desempregada e não arrumei emprego, então a opção era vir trabalhar vendendo doces. É melhor trabalhar aqui dignamente do que estar fazendo coisa errada.”

“Para a polícia, a Agefis e o governo, não passamos de bandidos, vagabundos” Silvia Fidélis

A ambulante disse que fala em seu nome, mas que muitos dos colegas pensam da mesma forma: “Para a polícia, a Agefis e o governo, não passamos de bandidos, va-

gabundos”, disse a vendedora. Vagner Frederico, funcionário da Agência de Fiscalização do Distrito Federal (Agefis), costuma atuar em conjunto com a Polícia Militar. “Infelizmente sabemos que muitas pessoas estão aqui porque não tem outra opção, mas é preciso fiscalizar.” Segundo o fiscal, em caso de confronto, agressão e desacato, é feita a apreensão da mercadoria e os produtos são levados para o depósito. Para a retirada, é preciso pagar multa que varia de R$1,040 a R$ 3.000. Desafios Determinada a conseguir um emprego com carteira assinada, Rayssa Alves disse que a pouca experiência e a falta de oportunidade são desafios. Mãe da Lívia, de 5 anos, ela reclamou que as chances diminuem para quem tem filhos. “A dificuldade e o preconceito são grandes, principalmente quando você vai a uma entrevista e te perguntam se você tem filhos. Se você


fala que ‘sim’, perde sua vaga ou fica em segundo plano sempre”. Érika Miranda passa pela mesma situação. Dois anos após concluir o curso de administração, ainda tenta entrar no mercado de trabalho. “Eu fico um pouco chateada, a gente se forma e não consegue um emprego porque não tem ‘quem indique’ na sua área”, reagiu. “Também fazem exigências como curso disso e daquilo, especialista em alguma área. É difícil.” Oportunidade Logo depois de ser demitida da empresa em que trabalhou por dez anos, Vera Lúcia Carnaúba, 51 anos, iniciou a busca por um emprego de carteira assinada. Segundo ela, foram dez meses enviando currículos e à espera de respostas. A oportunidade surgiu quando Vera Carnaúba recorreu a conhecidos em busca de ajuda. Assim, com um amigo indicando aqui e ali, ela conseguiu ser contratada como recepcionista em uma clínica de cardiologia, na Asa Norte. “Foi um tempo muito difícil, no início não fiquei preocupada. Sempre tive facilidade em aprender o serviço, mas fiquei apreensiva com minha idade, por ter lugares com preconceito em relação a isso”, afirmou a recepcionista, detalhando que há restrições às pessoas consideradas “mais velhas”. Não disse a partir de que idade.

As habilidades ajudam na busca de emprego, diz especialista A psicóloga Benedita Castro ressaltou que o processo de inserção no mercado de trabalho é o período em que a maioria das pessoas se tornam propensas a desenvolverem algum distúrbio emocional. Segundo ela, o importante é manter o foco e não desistir. “Às vezes, é preciso repensar sua vida profissional, identificar pontos fortes, reconhecer suas habilidades e capacidades. Nessas circunstâncias, pode-se desenvolver habilidades que não se sabia, favorecendo as chances de retorno ao mercado de trabalho”, recomendou a especialista. Pelos dados da PED, o mercado de trabalho ainda está em crise, mesmo depois da superação da recessão econômica de 2015 e 2016. Em 2018, o desemprego foi maior entre mulheres de 16 e 24 anos e pessoas negras. A coordenadora da pesquisa pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Adalgiza Lara, relatou que, no ano passado, o número de desempregados reduziu, mas a baixa confiança na economia, as incertezas na política e no mercado de trabalho fizeram muitas pessoas buscarem outras possibilidades. “Essas pessoas precisam sobreviver e vão em busca do trabalho informal porque sabem que há consumo de seus produtos, sejam roupas, marmitas ou frutas. Quanto mais serviços elas oferecerem, maior o número de pessoas que trabalham por conta própria.”

Serviço O site da Secretaria do Trabalho disponibiliza um espaço chamado “Agência Virtual” que facilita a vida de quem procura por emprego no DF. A plataforma permite a busca por vagas de emprego e o cadastro do seu currículo em terminais online. Para se cadastrar é necessário o nome e o CPF do interessado. Através dos dados, o trabalhador tem acesso ao banco de vagas disponíveis do dia. Além da Agência Virtual, é possível fazer cadastro diretamente na agência do trabalhador de sua preferência. Conselho Para aqueles que buscam aprimoramento do currículo, a Escola do Trabalhador do Distrito Federal oferece 21 cursos profissionalizantes online gratuitos, com certificado eletrônico emitido pela Universidade de Brasília (UNB). Os cursos são gratuitos com um total de 40 horas.

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ECONOMIA

Paga mais quem ganha menos Estudos mostram que trabalhador gasta pelo menos 30% da renda em impostos

Rafaela Gonçalves

Com renda mensal de R$ 1.200,00, três filhos e responsável pela mãe que sofre de Mal de Parckinson, a empregada doméstica Keyla Bueno, 38 anos, faz contorcionismos com o orçamento para que consiga pagar contas e manter as despesas em ordem. Ela é chefe de família, pois a filha mais velha, de 21, está grávida e depende da ajuda da mãe. O filho do meio, de 14, embora more com o pai, recebe pensão alimentícia. “Estou fazendo doces para ter uma renda extra e conseguir fechar as contas no final do mês”, contou Keyla Bueno. A doméstica é um exemplo entre tantos brasileiros que fazem contas diariamente para tentar não entrar no vermelho. Sem propriedades e fora da parcela de pessoas que declaram imposto de renda, Keyla é um dos muitos brasileiros que trabalham aproximadamente 153 dias no ano apenas para pagar tributos de forma direta e indireta. Mas nem imagina quantidade de encargos que saem do seu bolso. “Olha só quantas contas”, disse a doméstica, mostrando vários boletos à reportagem do Artefato. “Cuido de muita gente. Muitas pessoas dependem de mim.” Tributos O modelo de tributação do Brasil faz com que um cidadão pague cerca de 30% da sua renda em impostos de forma direta e indireta. Para especialistas, é um dos sistemas mais injustos do mundo, gerando obstáculos ao desenvolvimento econômico e pesando no bolso do trabalhador. A carga tributária brasileira é comparada aos países com alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), como Noruega, Austrália e Suíça.

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Porém, nos países desenvolvidos a progressividade do sistema tributário e a taxação do capital estão na base da construção do bem-estar Social. No entanto, no Brasil os repasses nem sempre se convertem em serviços públicos de qualidade. Segundo a cientista social e economista Cleide Martins, o Código Tributário é o principal responsável pela desigualdade social, onde ficamos atrás apenas da África do Sul. “Um exemplo disso é o ICMS, que é igual para todos os níveis de renda, portanto demonstra claramente quem paga mais tributos no país.”

“A desigualdade da renda é o aspecto mais pungente das disparidades sociais” Floriano de Sá Neto

A maioria dos impostos é cobrada pelo consumo e não sobre a renda, sendo assim quem ganha mais paga menos e quem ganha menos acaba pagando mais. Isso reduz o poder de compra da população e aumenta a concentração da riqueza. Grandes Fortunas O Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) é o único entre os sete tributos

federais previstos na Constituição que ironicamente nunca foi implementado. A controvérsia está em um item relevante: fixar o valor do que seria considerado “grande fortuna” no país. Há um projeto de lei complementar que define a regulamentação para as grandes fortunas, mas as negociações estão paradas há quase 30 anos. Reforma Tributária Existem várias propostas inseridas no projeto de Reforma Tributária, em tramitação no Congresso, baseada na unificação e simplificação dos impostos, que poderia encerrar com a guerra fiscal entre estados. São mais de 80 tributos, numerosas normas e 27 legislações distintas somente para o ICMS, essa simplificação é importante para que a população em geral possa compreender o que está pagando, pois a quantidade de tributos confunde até os especialistas. Mas não para por aí, somente a simplificação não traria efeito direto no bolso do consumidor, já que a proposta não prevê redução. Desafios O presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), Floriano de Sá Neto, disse que o desafio da Reforma Tributária é enfrentar as desigualdades sociais e de renda. “A desigualdade da renda é o aspecto mais pungente das disparidades sociais em nosso país”, afirmou. Determinados a levar adiante a proposta de reforma, Anfip e a Fenafisco, que reúne


Foto: Rafaela Gonçalves

entidades sindicais dos auditores da Receita Federal e nos estados, propõem o Manifesto da Reforma Tributária Solidária, no qual especialistas fazem um diagnóstico dos impostos no Brasil. “Não estamos propondo apenas a simplificação dos tributos, que também é importante. Mas, uma verdadeira revolução do sistema para enfrentar os problemas crônicos desse modelo tributário, que é a regressividade, que beneficia e sempre beneficiou os mais ricos e faz os mais pobres pagarem mais impostos”, disse Floriano Sá Neto. O presidente da Anfip defendeu “É preciso mudar o nosso modelo de impostos para um sistema progressivo, significa diminuir a tributação no consumo [alimentação, remédios, vestuário] e tributar mais a renda e a propriedade. Metade do que se cobra de imposto no Brasil é sobre o consumo, comprimindo, assim, a renda das classes média e baixa”.

A empregada doméstica Keyla Bueno, 38 anos, organiza as contas para poder pagá-las nas datas corretas.

Impostos diretos e indiretos Diretos Para entender melhor os principais encargos, é preciso diferenciá-los. São considerados impostos diretos, os que os governos - federal, estadual e municipal - arrecadam diretamente dos cidadãos sobre o patrimônio e renda dos trabalhadores. IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física) – Descontado diretamente na folha de pagamento, é arrecadado pelo governo federal. Trabalhadores de baixa renda são isentos, mas há um teto mínimo para contribuição. Para aqueles que pagam, o percentual fica entre 15% e 27%, de acordo com faixa salarial. IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores) – É arrecadado anualmente pelos governos estaduais e deve ser pago pelos proprietários de veículos automotores. Varia entre 1% a 3% do valor do veículo. IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano) – Arrecadado pelas prefeituras. A cobrança anual incide sobre a

propriedade de casas, apartamentos, terrenos e salas comerciais. Cada prefeitura tem um sistema de cobrança, onde o imposto, variável de acordo com a localização e tamanho do imóvel. Indiretos Os impostos indiretos são os que incidem sobre produtos e serviços consumidos pela população. Cobrados de produtores e comerciantes, acabam atingindo indiretamente os consumidores, pois estes impostos são repassados para os preços destes produtos e serviços. ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) – Arrecadado pelos governos estaduais, incide sobre a comercialização de produtos e serviços. A alíquota varia de acordo com o que é comercializado. No geral, sobre os produtos de necessidade básica incidem impostos baixos ou são isentos. Já produtos e serviços voltados para os consumidores de renda um pouco mais

alta possuem impostos mais elevados. ISS (Imposto sobre Serviços) – Arrecadação dos governos municipais, que incide sobre a prestação de serviços no município como educação, serviços médicos, serviços prestados por profissionais autônomos, entre outros. IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) – É arrecadado pelo governo federal e incide sobre a comercialização de produtos industrializados (aqueles que sofrem transformação, beneficiamento, montagem, renovação e acondicionamento).

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ESPORTE

Pátria Amada, Brasil Do hino nacional à realidade, atletas aguardam apoio e efeitos da MP 846 Nathália Teles

O percurso para que um atleta alcance o alto rendimento começa na infância e passa por desafios e muito esforço, além da busca permanente por investimentos. Neste ano, houve ainda uma surpresa a mais: os recursos que eram destinados ao esporte, por ordem do presidente Michel Temer, passariam para a segurança pública. A iniciativa estava na Medida Provisória (MP) 841 que define a retirada de recursos da Loteria Federal destinados à saúde, cultura, educação, assistência social e ao esporte, para redirecionar ao Fundo Nacional de Segurança Pública. Após a repercussão negativa, a regra que valeria a partir de 2019, foi revogada pelo Presidente, onde ele lançou a MP 846 que determina voltar com o valor arrecadado das Loterias para o Ministério do Esporte. A decisão foi desaprovada pelos setores esportivos e amedronta os que defendem mais investimentos. O presidente da Federação Metropolitana de Judô (Femeju), Luiz Gonzaga Filho, a situação do esporte é muito crítica e os atletas sobre com o abandono do governo. “Estamos passando por uma situação crítica no Brasil. O governo não quer manter, não dá apoio ao jovem e ao esporte que é o caminho de um grande país”, afirmou Luiz Gonzaga. “O presidente lança a MP841 querendo tirar investimento do esporte para poder investir em segurança pública, então, falar de apoio do governo, eles dão, mas é muito pouco.” Em discurso no plenário do Senado, o senador e ex-jogador de futebol, Romário (PSBRJ), condenou a gestão do esporte e a crise, além de alertar que a desordem compromete o futuro profissional dos jovens. “Tanta omissão levou o país a patinar na mesmice esportiva, no desperdício da verba pública e

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no comprometimento da carreira de nossos atletas.” Romário é candidato ao governo do Rio de Janeiro e o apoio ao esporte está entre suas plataformas políticas. Apesar de o governo ter feito muitos investimentos no esporte devido às grandes competições que o país recebeu nos últimos anos, como a Copa do Mundo de Futebol e as Olimpíadas, o plano do governo não gerou lucro e nem beneficiou a população com o legado deixado por esses eventos, a infraestrutura esportiva. “Quando estamos em épocas de grandes eventos há um investimento maior por parte do governo. Um exemplo são as Olimpíadas do Rio até um mês antes das estavam injetando [dinheiro] para ver se conseguimos formar campeões, mas depois das Olimpíadas o que aconteceu? Tiraram tudo. Está tudo sucateado. Os centros olímpicos, o Mané Garrincha, e acabou também o investimento. Como vai ser nossa Olimpíada lá em Tóquio?”, desabafou o árbitro internacional e coordenador técnico da Femeju, Oswaldo Navarro.

“O esporte é o caminho de um grande país” Luiz Gonzaga Filho


Dura realidade O árbitro internacional e coordenador técnico da Federação Metropolitana de Judô (Femeju), Oswaldo Navarro, disse que Brasília é um “grande celeiro de atletas”, mas o motivo da capital não ser referência no esporte é um dilema. De acordo com ele, muitos atletas deixam o DF em busca de condições melhores para se desenvolverem no esporte. “Existe muito ‘paitrocínio’, pais que patrocinam o filho, a gente não tem atletas com grandes patrocínios aqui em Brasília. Então, a gente faz os atletas nas categorias de base e eles vão embora, ou seja, a gente está exportando os nossos atletas para os outros clubes mais fortes, na qual consegue investir pra mandar esses garotos pra importantes competições ou até mesmo para seleção”, relatou o árbitro que acompanha atletas. A judoca bicampeã sul-americana Isadora de Sousa Pereira, de 23 anos, é um exemplo do que ocorre em Brasília. Ela começou no esporte ainda criança por influência de sua família, ao longo dos anos começou a competir e tomou gosto pela coisa. Após bons resultados aqui em Brasília, a atleta recebeu um convite do clube mineiro, Minas Tênis Clube, e sem hesitar deixou a capital. “O principal motivo que me fez sair de Brasília foi a questão financeira. Quando o atleta chega à um alto rendimento ele precisa de todo um preparo, com psicólogos, nutricionistas, academias, materiais, e é muito difícil esse tipo de investimento em Brasília. Lá [no Minas Tênis Clube] eu conseguia isso, de certa forma, tanto que cheguei a ser campeã pan-americana, sul-americana e quase fui disputar o mundial”, disse a judoca. Questionada sobre o apoio do governo e as dificuldades enfrentadas, Isadora de Sousa Pereira acrescentou que: “[Os programas do governo] são eficazes, eles não atendem uma demanda muito grande de atletas, mas os poucos que ele atende é uma dor de cabeça a menos para os atletas”, observou.

O esporte na minha vida representa superação, principalmente. É uma coisa que eu amo o judô e realmente é uma coisa que tem que superar todos os dias. - Isadora de Sousa Pereira, judoca bicampeã sul-americana.

Destaque Nascida no Distrito Federal e de origem simples, Leila do Vôlei cujo nome de batismo é Leila Gomes de Barros, ex-jogadora da seleção brasileira de voleibol, atribui suas conquistas a esporte embora tenha sido obrigada a deixar a família muito cedo para se dedicar ao voleibol. “Sou filha de um mecânico que cursou até a terceira série. Todas as oportunidades que tive na vida foram por meio do esporte. Na infância, eu praticava esporte nas escolas públicas onde estudei, em Taguatinga. Deixei minha casa em Brasília, aos 17 anos, atrás do sonho de me tornar atleta de ponta. Anos depois, entrei para a seleção brasileira, e ganhei duas medalhas olímpicas”, contou a ex-atleta olímplica que obteve o título de “Melhor Jogadora Brasileira de Voleibol de 2000”. Durante sua carreira, Leila acumulou prêmios nacionais, internacionais e individuais. Em 2015, ela assumiu a Secretaria de Esporte e Lazer, onde ficou até abril de 2018. Segundo ela, enquanto exerceu função pública, defendeu a importância do esporte na sociedade. “O esporte é muito maior que o alto rendimento. É formação do cidadão consciente dos seus direitos e deveres, sabendo respeitar as regras, a hierarquia, aprendendo a ganhar e a perder. Sem contar que contribui de forma direta com a educação, saúde e segurança.”

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SEGURANÇA

Atenção, o perigo está nas ruas Na tentativa de reduzir as estatísticas, mulheres se resguardam com aplicativos específicos Laryssa Passos

O sentimento de insegurança toma conta das mulheres no Distrito Federal. Os aplicativos se tornaram cada vez mais presentes no cotidiano feminino, como o Uber, 99Pop e Cabify. E há os destinados só para elas. É uma forma de buscar mais segurança. São veículos dirigidos por mulheres e para mulheres. O desafio é dar mais condições de proteção para usuárias e motoristas. A Polícia Civil informou que o primeiro trimestre de 2018 foi marcado por altos índices de feminicídio no Distrito Federal. Houve um aumento de 8% nos casos de feminicídio, comparado ao mesmo período de 2017 - violência que atinge

Foto: Matheus Nascimento

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principalmente mulheres de 18 a 35 anos. Em 2017, uma adolescente, de 16 anos, foi agredida no Guará II, e uma jovem, de 18, estuprada em Taguatinga. Experiências Estudante de arquitetura, Rebeca Macêdo Nery, 20 anos, trabalhou um mês e meio no aplicativo Uber e disse que foi uma experiência positiva. “Nunca sofri assédio. Mas uma vez fui surpreendida por um passageiro que ofereceu dinheiro para dirigir o seu carro até a casa dele. Já aceitei corridas com passageiros bêbados, que me deu muita insegurança.” O aplicativo de táxi Femitaxi chama a atenção. Lançado em 2016, reúne motoristas e passageiras mulheres. O app também oferece uma função para o transporte de crianças, facilitando a vida dos pais que também podem monitorar o serviço via câmera de celular da taxista. Com um histórico de motoristas homens que se enganaram com o caminho e demoraram demais no trajeto, Maria Alcimar B. T. Aguiar, 40 anos, funcionária pública prefere os aplicativos específicos para mulheres. “Em todos os

casos eu relatei ao aplicativo e valor foi ajustado ao que deveria ser cobrado.” Recém-formada em Relações Internacionais, Anna Carolina dos Santos, de 23 anos contou que sempre foi bem tratada Nos aplicativos, embora tenha vivido momentos de tensão. “Estive com motoristas que tinham a direção perigosa e alguns que não estavam dispostos a tratar bem os clientes. Mas foram só duas vezes, as outras vezes consegui chegar em casa com segurança.” Pânico A empresa Uber informa que tem mais de 20 milhões de clientes e 500 mil motoristas no país. Recentemente, foi lançado o “botão do pânico”, a nova ideia oferece opções de segurança: compartilhar a localização atual com amigos, entrar em contato com a polícia e acessar a central de segurança do próprio serviço. O botão de segurança por enquanto só está disponível para passageiros, mas a empresa promete que logo mais estará disponível para os motoristas. A insegurança também atinge os homens. Rodrigo Diego, 33 anos, que é motorista do aplicativo 99Pop, teve o celular roubado enquanto trabalhava. “Um homem entrou pela porta de trás com uma faca e o outro ficou em pé apontando uma arma para mim. Pensei em dar ré e fugir, mas não tinha como. Eles levaram apenas meu celular de trabalho porque não acharam dinheiro. Agradeci a Deus.”


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