Em louvor dos fanáticos

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Em louvor dos fanรกticos Lawrence Durrell



O trabalho de um editor de província pode não ser particularmente invejável em qualquer país que seja, mas o meu amigo Lejoie, que dirige os destinos do maior jornal da Provença, consegue fazê-lo parecer cheio de variedade e interesse. Ele traça o seu caminho sinuoso, com engenho e tacto, por entre os terrenos movediços da diplomacia e da política editorial — sempre jovial, incansável e bem-disposto. E, sendo francês, tem olho para o que é descaradamente ridículo, e a vida de província é cheia dele — até mais não poder. Apesar disso, não é fácil lidar com eficácia com todas as diversas facções que assediam um diário de província e o seu director — para (por exemplo) sarar as feridas de um presidente de câmara cujo nome saiu erradamente grafado por duas vezes seguidas, para apresentar um delicado caso de aumento de salários sem ir contra a política governamental, para criticar uma exposição tão honestamente quanto possível dentro dos limites do justo comentário… [«Senhor: sinto dever protestar veementemente em nome da povoação de Plages (200 almas) contra as aleivosias levantadas nas vossas colunas contra o nosso artista maior.»] Talvez seja a própria dificuldade do trabalho que fez de Lejoie — como ele diz — um «estudioso do fanatismo nas horas vagas»; eu não sabia com exactidão o que ele queria dizer com isto até um dia ter referido, entre numerosos franceses excêntricos que perpetraram obras de arte, o nome do Carteiro Cheval. Deliciou-se ao perceber que eu nunca tinha ouvido falar desse homem estimável ou do seu Palácio Ideal, construído em obediência a uma visão. – Como trabalho feito nas horas vagas é, por certo, único — disse


nostalgicamente Lejoie. — O homem era um carteiro de aldeia, no Drôme, cujas atribuições o obrigavam a uma volta diária de trinta quilómetros. Ao regressar, à noite, deixava-se submeter voluntariamente à sua visão, empreendendo a construção de um extraordinário monumento que, não tivesse sido erguido em local tão afastado da sua aldeia natal, Hauterives, podia muito bem terlhe valido reputação similar à desse outro naïf, Douanier Rousseau. – Achas? – Claro; e tu hás-de concordar. Vou-te contar mais coisas sobre ele e desencantar algumas fotografias que te darão uma ideia. É uma espécie de Gaudí — com um toque de fanatismo francês. – Um maníaco, queres tu dizer? – Não. Apenas um francês. Hei-de encontrar as fotografias. Fiel à sua palavra, na visita seguinte despejou, sobre a mesa que nos separava, diversos postais ilustrados desse estranho monumento. – Eh pá, é uma espécie de Albert Hall privativo – disse eu. – Só que tem, misturados, todos os estilos. Não é coerente com um só estilo ou influência. É a mistura sortida de todas as arquitecturas do mundo amassadas num bolo só. O Palácio Ideal do Carteiro Cheval foi começado em 1879 e acabado apenas em 1912, sem qualquer ajuda. As fotos que Lejoie me mostrou revelavam um dos monumentos mais esquisitos que alguma vez me foi dada a felicidade de ver — uma espécie de bolo de casamento gigante dos estilos e inspirações, amalgamados numa construção com vinte e seis metros de comprimento por catorze de largo; tinha cerca de doze metros de altura — a altura de uma vivenda moderna de dois andares.


Só uma inspiração lunática poderia aspirar a justapor e casar todos aqueles estilos diferentes numa obra singular — pelo menos é o que se sente ao olhar para as fotografias. A esta asserção Lejoie replicou: – Sim, mas existe algo mais que estas fotografias não captam completamente; elas apenas enfatizam a sua excentricidade aparente. Mas há mais do que isso. A coisa merece ser vista. Na verdade, ela fica na minha terra, no Drôme, e na infância passava as minhas férias a brincar no Palácio ideal do velho Carteiro — a sua Xanadu privada, poder-se-ia dizer. Deixou-me a mais estranha impressão. Sou, na realidade, remotamente aparentado com a família do carteiro — daí o subtil traço de fanatismo da minha própria máscara. Gostarias de lá ir num fim-de-semana e ver? Posso invocar outros motivos de interesse. A minha mãe vive lá, casada com Chabert, o grande chefe de cozinha. Gerem ambos um pequeníssimo hotel onde apenas são admitidos amigos interessados por – Não me digas; deixa-me adivinhar. Comida! – Para anglo-saxão não és, por vezes, completamente desprovido de discernimento. Sim, numa palavra: comida. E que comida! – Sou o homem de que precisas – disse eu com solenidade. Quando, naquela noite, me deixou, autorizou-me a guardar as estranhas fotografias assim como um pequeno fragmento de carácter autobiográfico escrito pelo Carteiro na sua velhice — documento quase tão estranho como as fotografias. Estava escrito num francês escolar que lhe dava um tom oracular, ao mesmo tempo tocante e peremptório. Constituía uma espécie de credo artístico — mas estranhamente emanado da visão de um


Blake. Li-o lentamente e com admiração crescente. «Filho de um camponês [começava ele], e por isso um camponês também, eu gostaria de viver e morrer de modo a conseguir provar que, mesmo ao meu nível, podem nascer e viver homens de génio. Sou carteiro da aldeia há vinte e nove anos. O trabalho tem sido a minha única glória, a honradez o meu único conforto. Eis a minha história, até hoje. Uma ocasião, em sonhos, concebi e construí um lugar, um castelo onde havia grutas… não sei como explicar… mas tão impressivo, tão pitoresco, que durante dez anos aquilo ficou-me gravado na memória. Não me consegui ver livre dele. Achei que era loucura ou mania. Para começar, não era pedreiro; nunca tinha pegado numa trolha. Em matéria de escultura, nunca tocara num cinzel. Em matéria de arquitectura — nem vale a pena falar — não sabia nada do assunto. Não me atrevi a murmurar sequer sobre o meu sonho a vivalma, com medo de ser troçado na aldeia. Para ser sincero, ri eu um pouco de mim próprio. Quinze anos depois, quando já quase tinha esquecido o longínquo sonho, uma escorregadela activou a minha memória. Ao tropeçar, caí sobre um objecto. Era uma pedra de forma tão bizarra que a enfiei no bolso, para a poder examinar com vagar. No dia seguinte voltei ao mesmo local e encontrei outras, mais bonitas até. A pedra tinha uma qualidade macia, profundamente trabalhada pela água do rio e, depois, endurecida pelo tempo; mas as formas — representavam uma espécie de escultura tão bizarra que duvidei que fosse possível a mão humana imitá-la. Estava cheia de diferentes géneros de animais, caricaturas humanas. Disse então para mim próprio: ‘Bom, se a natureza pode modelar tão facilmente, estou certo que conseguirei dominar a arte de arquitectar e construir.’ Ali estava o


meu sonho, por fim. ‘Ao trabalho’, disse para comigo!» A partir desse momento o Carteiro Cheval estava completamente desperto para a sua verdadeira missão na vida. Um sonho tentava nascer e transformar-se em realidade. Começou, ao longo da sua volta de trinta quilómetros, a lançar um olhar atento em busca de pedras de aspecto curioso e raro — a matéria prima do Palácio Ideal. A sua visão aguçou-se, o apetite cresceu. Em breve, estes objectos de estimação encantadores começaram, durante o circuito, a pesar no saco do correio. É bom lembrar que o carteiro Cheval não entregava apenas cartas. Tinha várias outras árduas atribuições — pagar pensões, por exemplo, e recolher recibos. Não era trabalho leve, em particular quando, para além de carregar um saco com correio, uma pessoa se atulha de pedras. Começou também a alargar a extensão do circuito em busca de novas belezas. Leitos de rios, agora secos, valeram-lhe jóias maravilhosamente polidas, os sopés luxuriantes das altas colinas do Drôme, outros tesouros. Um artista japonês teria compreendido imediatamente o que acontecera ao Carteiro Cheval, porém, na aldeia, começou a falar-se à boca pequena de indícios de falta de sanidade. O diabo que os carregasse. Estava nas garras dessa estranha febre insaciável que só o artista conhece e reconhece. Por vezes juntava tantas pedras que se via forçado a deixá-las amontoadas à beira da estrada, estrategicamente prontas para serem carregadas. À noite, quando chegava a casa, pegava no seu velho carrinho de mão e voltava para buscá-las, à luz da lua, infatigável, soturno — absorvido pelo primeiro prazer estético que tinha alguma vez conhecido. Por vezes estava a pé até às duas ou três da manhã, a transportar pedras para o Palácio Ideal. Começa a


perceber-se o que o bom do Lejoie quer dizer quando fala de «fanatismo»... Mas não se pode agradar a toda a gente — nem mesmo que se tente construir Xanadu. A mulher do Carteiro começou a queixar-se amargamente da roupa quase esfarrapada pelo esforço e pelo transporte das pedras. Os bolsos estavam desfeitos e as calças sempre cobertas de lama. Às vezes, bastava a ponta de uma bela pedra chamar-lhe a atenção e, pura e simplesmente, tinha de ir lá escavar e tirá-la. Permaneceu soturno, surdo aos ralhos da família e ao diz-que-diz da aldeia. Mas não eram só as pedras; a sua pobre mulher, que via o Palácio Ideal crescer naquele desconcertante jardim junto ao rio, queixava-se da despesa. Cada tostão poupado era gasto em sacos de cimento e de cal. Como podia ser tudo isto pago com um ordenado de carteiro? É compreensível que, do ponto de vista dela, fosse tudo uma loucura grotesca, uma mania. Feitas as contas, o Palácio do Sonho custar-lhes-ia 3 500 sacos de cimento, que representavam 1 000 metros cúbicos de construção; na Fachada Oriental o velho Carteiro gravaria: «1879 - 1912 10 000 dias 93 000 horas 33 anos de trabalho árduo Se houver alguém mais obstinado do que eu, que o mostre». Era um credo magnífico e, com o passar do tempo, o sonho do Carteiro justificou todos aqueles esforços heróicos. Mas quê! Até me faz doer as costas só de pensar no carrego do homem até levar a cabo o seu projecto, sem falar no trabalho de construção.


– Na verdade não se trata de um edifício – disse Lejoie pacientemente – nem se pode dizer que seja uma escultura. Tratase de uma obra que cria a sua própria linguagem louca. Agora, na época que vivemos, é fácil reconhecer a força e o encanto do naïf, estamos treinados nisso. Mas este estranho mastronço foi concluído no ano das primeiras experiências cubistas de Picasso. É isso que é tão estranho. De qualquer modo, espera para veres. Por falar nisso, está tudo combinado. Partimos amanhã. Assim foi. Era sábado. Lejoie não tinha com que se preocupar. O grande chefe Chabert condescendera em deixar-nos pernoitar no hotel, depois de um inquérito minucioso para saber se eu seria digno da cozinha em que ele era mestre. Podíamos ir directamente para norte, visitar o Palácio Ideal, e voltar para Tain, que ficava apenas a meia hora de Hauterives. A primeira paragem estava prevista para algures perto de Perols, para onde estava planeada uma refeição que serviria, tanto quanto pude perceber, como uma espécie de rampa de lançamento espiritual para o nosso objectivo. Seguimos, assim, pela margem esquerda do Ródano, que estava relativamente desanuviada do trânsito de fim-de-semana, e, logo que entrámos na região de Ardèche, o meu amigo, como que para simbolizar o abandono das responsabilidades do seu estatuto, trocou o casaco e a gravata por um confortável corta-vento e um lenço. Não era mais o sério e responsável editor de um importante diário do sul, mas um veraneante como qualquer outro. Era apenas no departamento de Gard, onde nascera, que ousava ser mortalmente apedrejado por pintores ofendidos ou ficar de coração destroçado por causa de ministros sem nível, confundido pelas comunas ou apanhado (metaforicamente) com as calças na


mão por funcionários regionais. Aquele pequeno letreiro à beira da estrada «Chegaram ao Ardèche» dava-lhe a liberdade de se sentir, subitamente, à vontade, desrolhado e posto a arejar, como uma boa garrafa de vinho. Cantámos algumas canções, mas não tão alto que perturbássemos os rouxinóis que, reagindo aos ligeiros aguaceiros do dia anterior, se tinham decidido por uma rápida aparição diurna. Não, a nossa música, que talvez não fosse do agrado deles, era pelo menos inofensiva para homens ou animais. Aqui e ali, fingindo precisar de meter gasolina, entrámos em convidativas estalagens para viajantes, onde, no jardim solarengo, tomámos o pulso à província em grave e solene conversa com um vinho da região. Se Lejoie tinha, por assim dizer, tirado a pele do editor, eu, pela minha parte, estava pronto para tirar a pele do escritor e do pensador. Um toque de intelectual-cigano era o que a situação parecia exigir e foi isso que senti que lhe podia dar. Este fim-desemana, disse para comigo, quero estar livre para me dedicar a viver mais e pensar menos. E porque não? Por uma ou duas vezes, porém, pareceu-me captar a voz reprovadora do Carteiro Cavalo murmurando-me ao ouvido que aquele estado de ócio era muito bonito, mas, de facto, nada se conseguia sem trabalho danado. Tinha levado comigo, no bolso, a sua pequena autobiografia e tínhamos estado a discuti-la. «Não consigo explicar todos os pormenores», escreve o velho Carteiro, «nem descrever os trabalhos e canseiras que tive de suportar; seria cansativo. Na verdade, nem a minha pouca educação me permite exprimir tudo isso. Muito simplesmente, pois, tomei toda a carga sobre os meus ombros, trabalhando dia e noite, durante vinte e seis


anos, sem pausa nem paz. Os visitantes que agora chegam de outros países — e em número cada vez maior — têm dificuldade em acreditar no que os seus próprios olhos vêem; querem confirmar junto das pessoas que aqui vivem, antes de poderem acreditar que um único homem, sozinho, possa ter reunido a coragem e a força de vontade para construir tamanha obra-prima. Maravilhados, não param de dizer: ‘Não, não é possível’, ‘Não, é inacreditável’.» Eu sei que parece um pouco imoral, mas pensar em todo aquele trabalho brutal trouxe um certo prazer mental àqueles momentos de sol e descontracção — estávamos ambos sentados diante de uma taça de vinho, num porto ensolarado junto do velho Ródano. – Só que – disse Lejoie distendendo as mãos num gesto de quem pede desculpa – qualquer gastrónomo te dirá que comer e beber de forma criativa constitui também um trabalho. – Sim, e bastante agradável. – Além disso – acrescentou – transporta-se a matéria-prima desse tipo de trabalho dentro de nós e não às costas. – Graças a Deus. Mas algo não batia certo e eu disse-o. Enfrentámos a sombra invisível da reprovação do Carteiro e pedimos outra taça, antes de rodarmos para Tournon, a norte, em direcção à mesa do apaziguamento, sob um limoeiro do pomar, bordejada pela luz do sol. Pela minha parte, estava de alguma forma receoso do almoço, temendo sobretudo que, se abusasse, a minha sensibilidade estaria demasiadamente embotada para apreciar o Palácio Ideal; e, depois, que, à noite, ficasse impossibilitado de fazer justiça às criações de Chabert. Seria horrível ser expulso do hotel como hóspede


desprezível e sem princípios, desacreditando assim o meu amigo e patrocinador. Mas Lejoie fez estalar a língua negativamente quando dei voz a estes sentimentos. – Não temas – disse ele – encomendei uma refeição leve, pensada de modo a estimular a sensibilidade, sem enfartar ou sobrecarregar o fígado. Agiremos de acordo com uma escala que programei, cuidadosamente graduada. – Em calorias? – Não. Em sabores e aromas. Meu dito meu feito e, quando finalmente assentámos à mesa batida pelo sol, impecavelmente posta sobre uma toalha de xadrez, as minhas dúvidas começaram a esfumar-se; tinha sido, afinal, uma longa estirada, plena de conversação intelectual, o que esgota qualquer um. Para mais, os subtis odores da comida que, saindo da cozinha, se espalhavam pelo ar parado daquela tarde primaveril, eram altamente estimulantes. Uma matrona de seio largo tinha sido encarregada de nos servir; de faces rosadas e olhos azuis, inspirava uma confiança maternal. Uma figura de mãe, um colo para confidências — eis o que se sentia ao observá-la cirandando pelo quintal com uma cesta de pão. Não. Nada de mal nos poderia acontecer; estávamos entre gente que nunca nos deixaria voltar para a estrada aos ésses, de rosto vermelho, piscando os olhos congestionados. Almoçámos, de acordo com a rigorosa graduação da escala do meu amigo, tarte aux morilles, uma magnífica espécie de tarte de cogumelos, e truite aux amandes. Foram estes, pelo menos, os dois pilares principais de um almoço excelente. Se houve algum receio de que a truta, salpicada de amêndoas torradas, viesse a revelar-se um prato pesado demais para um esteta, rapidamente


se desvaneceu; conseguimos comer duas cada um com a maior das facilidades e natural sangue-frio. O vinho que o meu amigo desencantou para a ocasião foi um delicioso Chante-Alouette (um «Canto de Cotovia»), idealizado para fazer até cantar um morto. Assim permanecemos, tagarelando, até ao queijo e à fruta, para, por fim, nos refastelarmos a olhar o fumo azulado de um charuto a pairar ao sol sobre nós, misturando o seu aroma exótico com o dos limoeiros e o dos canteiros. Tínhamos esfolado metade do nosso coelho; estávamos a cerca de meia-hora de viagem da Xanadu do nosso Carteiro Cheval. O sol tinha passado há muito o zénite quando atravessámos o rio e rodámos para leste, cruzando as duas grande vias para Norte, com o seu trânsito apressado, e rumando a campos mais verdejantes, onde a aldeia de Hauterives se aninha no seu verde isolamento. A paisagem mudou suavemente à medida que seguíamos para Hauterives, tornando-se gradualmente mais verde e mais densamente florestada. As claras formações calcárias falavam-nos de rios subterrâneos, de giz e de solos ricos; as suaves colinas ostentavam altas cabeleiras verdes, por entre as quais espreitavam ameias de velhos castelos; as estradas começaram a dar voltas e reviravoltas, subindo e descendo como a batuta de um maestro. Era um desses recantos despojados da França, rico em quintas mas dispersamente povoado, onde o construtor pato-bravo e o industrial furioso não avistaram até ao momento nada que pudessem explorar, nada que pudessem estragar. Entrámos na aldeia descendo uma rampa e desembocámos na praça do mercado, surpreendidos pelo facto de o ruído do motor ter sido substituído apenas pelo arrulhar dos pombos e o zumbido das abelhas. Não se


via vivalma. – Daqui – disse Lejoie – andamos uns cem metros até Xanadu. Era o princípio da tarde. Na aldeia do Carteiro Cavalo quase não havia movimento. Uma outra vez, ouvimos um ruído de cântaros ou o som de alguém que alimentava um forno, mas, para dizer a verdade, as únicas pessoas que encontrámos foram algumas crianças a comer doces, falando em voz baixa. Tinham caído, aqui e ali, bocados do revestimento da parede de uma casa e fiquei a saber que tinha sido inteiramente construída com calhaus rolados do rio, aglutinados com cimento; pedras do tamanho de ovos de avestruz. Um homem desbastava descuidadamente árvores de fruto. O ruído do podão quebrava o silêncio. Por fim, contornámos um longo muro alto e batemos a um portal. Veio abrir uma rapariga morena, de aparência agradável, a quem Lejoie disse alguma coisa; desfez-se imediatamente em sorrisos, limpando as mãos ao avental. Eu já tinha avistado o Palácio Ideal, de que ela era a guardiã. Ali estava ele, dominador ainda que modestamente, de uma natureza incontornável, de aparência nem convidativa nem repulsiva. Os jardins à volta estavam cheios de grandes árvores. Exalavam paz, quietude e cheiro a verdura. Entrámos no pequeno cubículo para comprar os bilhetes e vi, com um sentimento próximo da irritação, que a rapariga — uma vulgar rapariga do campo, com um cerrado sotaque provinciano — estava a ler um livro sobre pintura abstracta. Jazia, aberto, de lombada para cima, no lugar onde ela o deixara quando tocámos. De facto, os Franceses enlouquecem-nos de angústia e frustração. Onde quer que se vá, quem quer que se encontre, damos com eles


empenhados em algum empreendimento intelectual, a ler livros remotos, a pintar, a cozinhar, a tocar harpa ou a escrever sonetos. Que se lixem!, é injusto que o país todo seja criativo, ou tente sê-lo; o raio da população inteira, sem observância do nível e da educação, é possuída pelo desejo obsessivo de produzir uma obra de arte. Ficamos absolutamente loucos de inveja quando pensamos na nossa própria nação, especada num torpor embrutecido, numa espécie de demência filistina. O que impede tais bestas quadradas de tirar partido do que realmente vale a pena? De uma forma qualquer, o Carteiro Cheval, cujo monumento se erguia lá fora à espera de ser examinado, aumentou os meus sentimentos de auto-condenação. Em silêncio, aproximámo-nos de Xanadu e Lejoie, com o seu tacto característico, afastou-se para um canto para que eu pudesse, lentamente, apreciar a coisa no seu todo. Bem, claro que não é verdadeiramente grande. Não é do tamanho do Parthénon; na verdade, diria que é mais ou menos do tamanho do Theseum. Mas reside nele um mistério que não tem nada a ver com a sua estranheza própria. É — e aqui estou eu a pesar as palavras — a mais inesperada das obras. É muito mais do que uma extravagância: tomei consciência, com alguma vergonha, que, apesar dos avisos de Lejoie, vinha preparado para admirar e desfrutar uma extravagância. Tão britânico! Tinha, na verdade, vindo a Hauterives armado em Betjman! E de repente encarava a luminosa visão blakeana de um carteiro iletrado, mas que era algo que respirava uma insólita e singular autenticidade. Mas onde residia ela? Antes de responder a esta pergunta devo, por assim dizer, abstrair o aspecto fantasioso — este monumento extraordinário,


apinhado de mil coisas diferentes como um templo hindu: bustos de mártires, soldados, macacos, palmeiras, pavões, palmeiras, Cruzados, Romanos, Gregos, Druídas, Persas... mas isto não era tudo; praticamente todos os géneros de arquitectura estavam representados de Stonehenge a Altamira, de Roma e Grécia à Babilónia, desde a Casa Branca a um chalé Suíço! Havia uma cascata, um labirinto, um túmulo mouro, um menir, uma mesquita, um campanário da Normandia, um labirinto, um... era uma espécie de dicionário de todos os estilos conhecidos. Compreendo agora porque os Surrealistas reclamaram o Carteiro Cheval como um dos seus (pelo menos Breton fê-lo, em nome deles): a justaposição de estilos e modos era fantástico e imprimia o indispensável choque surrealista. Mas isto não era tudo; havia alguma coisa mais, alguma coisa perturbante e excitante naquilo tudo, que não advinha desta miscelânea excêntrica de objectos e estilos diferentes. Apanhei Lejoie quando este subia a escada em caracol para o primeiro andar, se assim se pode chamar, e exprimi o meu entusiamo dizendo, enquanto lhe agarrava o braço: – Mas o raio da coisa tem uma coerência. Ele suspirou, aliviado, e permaneceu em silêncio. Subimos, a sorrir, a escada em espiral, observando um novo conjunto de frescos postos a descoberto pela luz do sol. Gárgulas de NôtreDame espetavam as línguas de pedra em caretas a Gorilas da Barbária; dois Cruzados enfrentavam a efígie de um sarcófago da época de Semíramis. Então, subitamente, compreendi porque é que a obra no seu todo tinha uma espécie de singular inteireza, a espécie de inteireza que


só as verdadeiras obras de arte possuem. O Carteiro não fora um louco, nem tentara exibir-se. Respondera honestamente à sua visão sagrada, era tudo; na realidade, reproduzira fielmente o seu sonho, confiando implicitamente que, sendo-lhe fiel, este o levaria até onde fosse necessário. Não havia, digamos, um pensamento desonesto, um elemento artificial, em todo o grotesco monumento. Poder-se-ia caracterizá-lo como uma obra «naturalista» — porque, do mesmo modo que o pintor naturalista reproduz a natureza tal como a vê, assim fez o Carteiro Cheval... Se tivesse sido um Surrealista, um artista provocador, um Dalí, alguma coisa de errado ressaltaria daquilo tudo. Tal como era tinha uma extraordinária perfeição, uma grande serenidade. O Palácio Ideal era de facto ideal — era o palácio do universo da infância, hábil e admiravelmente captado. Amargamente, desejei que os meus próprios filhos ali estivessem comigo a vê-lo; ter-lhes-ia dado uma estranha nostalgia dos seus próprios sonhos. Tê-lo-iam reconhecido intimamente como alguma coisa de longe mais verdadeira que qualquer fantasia Disney. Uma infância de verdade apenas harmoniza a realidade com visões, respeitando-as. Aqui estava a visão em pedra do Carteiro. Espalhados, aqui e ali, o velho Carteiro gravara aforismos, decerto para se encorajar a si próprio, para renovar as suas desgastadas energias. Alguns eram apenas os seus lemas favoritos, outros breves versos, alguns eram citações da Sagrada Escritura, outros poemas em verso livre. Era como folhear o caderno de apontamentos do artista ou espreitar por cima do seu ombro enquanto trabalhava.


Sob a custódia de gigantes Coloquei a epopeia dos humildes Curvado sobre o sulco da terra. A vida é um oceano de tempestades Entre a criança que acaba de nascer E o velho que vai desaparecer. Por fim, quando o trabalho ficou pronto até à última inscrição, construiu mesmo uma sepultura para o fiel carrinho de mão, seu companheiro de todos os instantes durante tantos anos. Mais do que isso, deu permissão ao próprio carrinho (que parecia ter sido dotado também de um espírito aforístico) para que escrevesse os seus próprios versos, o seu próprio epitáfio. Eis como se exprime: Sou o fiel companheiro Do trabalhador inteligente Que todos os dias no campo Procurava seu pequeno contingente Agora que a sua obra está terminada Desfruta em paz o seu labor E, em sua casa, eu, o seu humilde amigo, Ocupo o lugar de honra. Junto ao carro de mão, no seu quieto canto, jazem as ferramentas com que o Palácio Ideal foi construído. Mas os caminhos do génio nunca são pacíficos; ao completar a sua


obra imensa, o Carteiro Cavalo anunciou que desejava ser sepultado nela; preparara o seu próprio túmulo. Deparou então com a oposição da Igreja, que foi sempre contra a autorização de as pessoas serem sepultadas nos seus próprios jardins — nunca percebi bem porquê... Seguiu-se uma longa polémica, que a Igreja acabou por vencer. O Carteiro Cavalo devia ser enterrado no cemitério da aldeia como toda a gente. Apesar dos seus sentimentos, resignou-se a esta sentença e comprou o lugar previsto. Mas aí foi tomado pelos seus sentimentos artísticos. O indomável velho empenhou-se na construção do seu jazigo, que é uma espécie de réplica do Palácio Ideal, idêntico na inspiração e no estilo. Levou dez anos a concluí-lo, mas concluiu-o; e é lá que jaz, sob um singelo epitáfio que podia muito bem ter figurado no túmulo grego que guardasse os restos de um Heraclito ou de um Epicuro. O túmulo do silêncio e do repouso sem fim. Deslizámos lentamente para fora da bela aldeia de Hauterives por sobre a ponte que transpunha a corrente fremente de trutas, num agradável silêncio — o único tributo que é possível prestar à experiência artística. Ao longo das verdes áleas folharentas, parecia-me ver o pequeno carteiro a caminhar, acarretando as pedras que escolhera, tranquilamente falando com os seus botões enquanto andava. Um faisão anafado atravessou a estrada e Lejoie disse: – Chegaremos ao hotel de Chabert dentro de vinte e cinco minutos.


Era, afinal, apenas a mudança de uma forma de arte para outra, pois Chabert revelar-se-ia quase tão visionário como o velho carteiro. O pequeno hotel fica na rua principal de Tain l’Hermitage, que tem o ar de ser uma pequena cidade comercial em processo de urbanização. Como quase todos os lugares onde, em França, se come bem, não é reconhecível pelo aspecto exterior. Não passa de um simpático bar de outros tempos, anexo a um restaurante. O Hotel é privativo, dir-se-ia um mero apêndice, com os seus únicos sete quartos. Só lá se pode ficar se formos convidados pelo dono e ele apenas convida um certo tipo de pessoas — les gens qui vraiment aiment manger. Estou a vê-lo a estudar-me minuciosamente o rosto para ver se eu mereceria a sua hospitalidade. O grande Chabert era um homem pequeno e sólido, de cabelo grisalho e traços finos; dava uma sensação de serenidade e vagar, de doçura. Era, evidentemente, alguém que conseguia ficar a olhar uma panela a ferver sem se enervar; cada movimento das mãos era eloquente. Eram as mãos de um músico, de alguém seguro do que faz. Assim que chegámos houve, claro, uma boa dose de confusão, apresentações, explicações. A mãe de Lejoie estava contentíssima por vê-lo; já lá iam seis meses desde a última visita. Ele trouxera presentes muito particulares para ambos, sob a forma de um queijo raro da Gasconha e uma garrafa de licor. Enquanto descarregavam a bagagem, tomámos um copo para desentorpecer. Chabert entrava e saía da cozinha, onde meia dúzia de jovens de barrete branco se tinham de haver com tachos e panelas sob a sua meticulosa orientação. O prometido jantar estava já em preparação. Estaria


pronto dentro de uma hora. Mas primeiro, disse Chabert, ele gostaria de nos proporcionar alguma informação geral sobre os vinhos da região e com esse objectivo poderíamos matar o tempo com proveito, antes do jantar, combinando informação e prazer. Chapoutier? Onde ouvira eu já esse nome? De facto encontra-se escrito, no meio da colina, bem lá no alto, atrás de Tain l’Hermitage; pode ler-se cinco quilómetros em redor. Indica o nome do proprietário das melhores vinhas da região. Enquanto descíamos a rua, ao cair da tarde, Lejoie refrescou-me a memória neste particular. Ficava apenas a duas ruas de distância do hotel. Chapoutier, ele mesmo, estava à nossa espera sentado à secretária no imponente escritório da sede da empresa; diante dele estava uma garrafa de litro e meio de champanhe. De vez em quando tocava-lhe e girava-a no seu suporte, com ar de médico a tomar-lhe o pulso. Era um homem novo, jovial e espirituoso, que se tornara especialista em vinhos. As chaves da grande adega jaziam diante dele. Lejoie era, claro, um velho amigo, o que proporcionou um alegre início de conversa. Ao servi-lo, Chapoutier disse depreciativamente que o champanhe não era para ser levado a sério; não passava de um rince-bouche, um lava-bocas, servia apenas para limpar o palato antes de provar os vinhos na adega. Tentei considerá-lo desse modo, mas não conseguir deixar de o apreciar. Tinha um gosto requintado. Para dizer a verdade poderia ter ficado o resto da noite a limpar o palato com aquele admirável néctar. Por fim a garrafa acabou e Chapoutier, declarando-nos convenientemente preparados, agarrou num copo alongado, de pé


alto, em cada mão e, pegando nas chaves e numa pipeta, guiou-nos através da rua escura até às grandes caves. A noite estava límpida e clara; as caves, profundas, imensas e secretas. As luzes, à medida que aqui e ali se acendiam, revelavam depósitos de garrafas, barris e toneaux por todo o lado, penetrando na escuridão à nossa volta, traçando perspectivas simétricas em direcção ao infinito. Despertos e de palato limpo, seguimos lentamente o nosso anfitrião de barril em barril, aceitando um escorropicho da sua pipeta hospitaleira de cada uma das colheitas, sentando-nos a saboreá-lo sobre a pipa mais próxima. Não é preciso entrar em detalhes sobre tudo o que provámos. O vinho de Chapoutier é suficientemente bem conhecido e tem sido objecto de inúmeros ensaios e estudos. É, porém, importante lembrar que a sua conversa é tão cintilante como o mais brilhante dos seus vinhos. Até porque o que justifica o bom vinho é, sempre foi, a boa conversa. O décimo-primeiro mandamento foi sempre: «Bebei bem, para bem conversardes.» Naquelas caves cavernosas, de paredes cobertas de um bolor esverdeado e profundo — do género do que podemos encontrar numa pera apodrecida —, na semiobscuridade, as vozes abafadas pelas grossas paredes medievais, deixámos a conversa ganhar asas. Quando tínhamos abordado já o décimo-segundo barril de branco e o quarto de tinto, tínhamos discutido sobre e brindado a Rabelais, Mallarmé e Stendhal; tínhamos mandado os Marxistas à sua vida, descrido dos preconceitos religiosos, deplorado a Revolução Francesa, denunciado os Bourbons e os Jesuítas, desafiado abertamente a física nuclear, bazofiado sobre Byron, Poe e Rimbaud, desfeito em Henry James e cantado umas estrofes de


Georges Brassens. Intelectualmente falando, não deixámos nenhum copo por beber. Ao sair, voltando a penetrar na noite, um pouco sebentos mais ainda despertos e ardentes de fervor intelectual, sentia-me como se andasse sobre patins. O ar da noite estava fresco, bom para refrescar as nossas cabeças febris, porém, se as línguas se tinham soltado com a prova dos excelentes vinhos, elas estavam ainda presas ao cérebro. De qualquer modo, era essa a impressão que dava. Abraçámo-nos efusivamente, sob um candeeiro da rua, como generais franceses impondo condecorações uns aos outros, fazendo juras e propondo pactos de sangue para todo o sempre. – Voltem – gritou Chapoutier calorosamente. – Sempre que quiserem. É um prazer ter uma boa conversa. Quando chegámos ao Hotel a mesa fora posta num canto confortável do restaurante e, ao entrarmos, o chefe observou-nos com olho clínico. – Ah, estão mesmo no ponto – disse aprovativamente. – Muitos regressam tocados da visita à adega e corre-se o risco de não apreciarem o jantar. Nesses casos tenho de os fazer esperar mais meia-hora — e assim ponho em causa a qualidade do jantar. É tudo muito rigorosamente previsto, em França — de acordo com uma escala graduada. E assim começou um dos célebres jantares de Chabert, insinuando-se lentamente como uma fuga de Bach, percorrendo o seu caminho escala após escala, figura após figura, o denso contraponto oscilando, indo e vindo, deixando e retomando. E tudo sem qualquer pompa; tranquilo, atento, o grande Chefe vigiava


pessoalmente cada prato, levantando-se da mesa para tratar, ele próprio, de algum pormenor, voltando a sentar-se e, serenamente, recordar o seu início de vida na marinha francesa. Começara, aos treze anos, como cozinheiro no mar; devagar, ascendera até àquilo em que se tornara, um Chefe de cozinha, um artista. A sua mulher sorria enquanto ouvia, o queixo repousando sobre a mão, aquelas aventuras remotas, falando por sua vez sobre o carteiro Cheval, que tinha chegado a ver em pequena. – Um homenzinho irascível, temperamental – disse, acenando em assentimento com o rosto moreno e mediterrânico, enquanto sorria. – Estava sempre na defensiva, pois todos diziam que era doido. Sustentou o seu génio até à morte. – E com razão – aprovou Chabert. – E com razão – disse Lejoie. – E com razão – disse eu. Enquanto isso o memorável jantar fluía, ganhava ritmo e corpo. Mais tarde, nessa noite, a caminho da cama, pedi a Chabert para me escrever tudo pelo seu próprio punho. Queria um autógrafo, tanto como o Menu. É perfeitamente inútil descrever boa comida. É qualquer coisa de indizível, tal como a poesia e, na verdade, como toda a arte. Aqui fica, então, o que Chabert escreveu na sua caligrafia nervosa. Les Quenelles de brochet à ma façon Le vin St. Joseph Rouge Côtes Rôties 1952 Pâté de Canard truffé avec des petits oignons à la Grecque et à la mode de chez-moi


Pintadeaux nouveaux aux bananes (Sauces avec Madère, Porto, Crème, Glace de Viande, etc.) Petits Chèvres de Chantemerle Coupe de Fraises Melba O leitor terá notado as frases «à ma façon» e «à la mode de chezmoi» e imaginará que, como todos os grandes Chefes de cozinha, Chabert pretende guardar para si próprio os seus segredos culinários. Não é o caso; é simplesmente a modéstia que o impede de dar o seu nome ao prato, como teria todo o direito de fazer — como, em França, fazem todos os Chefes criadores. Deplora esse hábito e diz que lhe cheira a pretensiosismo. No que lhe diz respeito, acredita que um chefe que se preze deve fazer bem de tudo e fazer superlativamente algumas coisas de sua eleição. – Vês? É outro fanático – dissera Lejoie a sorrir, quando ouviu. Estávamos todos sentados em conjunto a beber um cálice de brandy, ouvindo o bater da meia-noite. Em breve estaria confortavelmente aconchegado na cama, com o meu entorpecido cérebro cheio das fascinantes impressões da visita, tentando em vão pô-las em ordem. – Espero que venhas a escrever alguma coisa sobre isto – disse Lejoie de súbito, quando todos nos despedíamos. – Sentiria que a visita tinha valido a pena. Demorámo-nos escada acima, arrastando a conversa até à escuridão do primeiro andar. – Supondo que escrevia, que título lhe deveria dar? – disse eu.


– ‘Em Louvor dos Fanáticos’, claro — disse Lejoie. Assim fiz.

Tradução de Jorge Colaço NOTA: In Praise of Fanatics foi publicado pela primeira vez em Holiday (Filadélfia, 1962) e incluído no volume Spirit of Place. Letters and Essays on Travel (Faber and Faber, Londres, 1969).



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