jornal de abrantes

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PRODUTOS REGIONAIS 10 ESPECIAL RIOS

NOVEMBRO FEVEREIRO 2012 2013

RESPONSÁVEL PELA GESTÃO DOS RECURSOS DO TEJO DEFENDE QUE OS RIOS SÃO UM ENORME FATOR DE DESENVOLVIMENTO

“O Tejo tem uma alma que é preciso saber ler, compreender e viver”

Como é que vê o rio Tejo? É um recurso imenso, multivariado em várias áreas, quer como recurso natural, quer como recurso em termos imateriais (humanos, sociológicos, históricos). Se observarmos e se lermos este rio em todas as suas dimensões percebemos que própria história da região que o Tejo atravessa está relacionada com o rio e vice-versa, faz parte das pessoas. Sou geólogo de formação de base e compreendo o rio como um sistema vivo, dinâmico, que tem um substrato em que se instala, mas que, mais do que isso, tem uma alma que é preciso saber ler, compreender e viver. As comunidades têm sabido interpretar essas mensagens do Tejo? Neste momento começa a esbater-se alguma distração que possa ter havido e as pessoas começam a virar-se para aquilo que têm, que é muito. O rio Tejo tem um grande potencial que é incontornável: o próprio carácter das pessoas está moldado à existência deste rio. As povoações ribeirinhas, as atividades económicas, as atividades cul-

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turais… tudo isto tem a ver com a tal alma. Cada vez mais, como no passado, as pessoas vão-se lembrar de muita coisa que tinham esquecido. No nosso relacionamento com os rios, neste caso com o Tejo, isto é cada vez vai ser mais verdade. Economicamente, como é que se pode potenciar o rio Tejo? Tudo aquilo que foi feito (e foi feito muito, por exemplo ao nível do tratamento da água) foi no sentido de valorizar um recurso que é o rio. Agora percebeu-se que temos que repensar algumas coisas, porque o rio é um brutal fator de desenvolvimento, desde logo para as pessoas que vivem junto a ele. De uma maneira muito simples, um rio serve para pescar, nadar e navegar. Se conseguirmos fazer as duas coisas, estamos seguros. Se pescamos, é porque há recursos (pesca, rega, extração de inertes, etc). Se pescamos e nadamos, significa que a água tem boa qualidade. E há todo um investimento que foi feito do ponto de vista lúdico. Por esse Tejo fora há praias fluviais e infraestruturas ribeirinhas que têm uma importância económica e social muito grande. Proporcionam às populações, nomeadamente as menos favorecidas, condições de lazer que de outra forma não teriam. Ao nível agrícola, o que temos assistido é que todas as concessões estão feitas e assumidas com associações de regantes, coisa que não existia até há muito pouco tempo. Há essa partilha de responsabilidades: os recursos estão na mão de quem os utiliza, tendo nós um papel regulador. Há todas as condições para que possa haver desenvolvimento. Ao nível turístico, há todo um enorme potencial que começa a ter alguns resultados. Que tipo de impacto é que

Hália Costa Santos

Carlos Cupeto, doutorado em Hidrogeologia Ambiental com mais de 20 anos de experiência em temas hidrogeológicos e ambientais, é atualmente diretor do Departamento de Recursos Hídricos Interiores da Administração da Região Hidrográfica do Tejo, integrada na Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. Responsável por atividades de licenciamento, fiscalização, gestão de empreendimentos e infraestruturas e apoio técnico às atividades de gestão de recursos hídricos, nomeadamente no Tejo, fala sobre todo o potencial que este rio tem. Aponta o turismo, a rega, a extração de inertes e a navegabilidade como atividades que estão em desenvolvimento.

Carlos Cupeto evidencia o envolvimento dos municípios, das associações e das comunidades locais na busca de estratégias para potenciar o Tejo

várias atividades de divulgação têm tido junto das populações ribeirinhas e de outras que não têm contacto direto com o Tejo? Essas pessoas que vivem os locais ribeirinhos são as mais fáceis de fazer regressar ao rio, porque têm as memórias dos antepassados e têm essa cultura, está-lhes no sangue. Essas facilmente são despertas para uma realidade que estava esquecida. Ao nível do turismo, o interessante será começar a olhar para outros grupos. Um património natural e cultural como o Tejo, desde a parte biofísica até à etnográfica, passando pela arqueológica e outras, tem um potencial que ainda falta gerir e descobrir. Estou por exemplo a pensar no turista que vem visitar Lisboa... Vai a Sintra, Fátima, Tomar ou a outros locais. Mas também pode ir ao Estuário do Tejo! Se elegermos os 10 ou 15 locais mais importantes ao nível do mundo para a nidificação de aves, entre eles está o Estuário do Tejo. Há muitas espé-

cies de aves que sem o Estuário do Tejo já não existiam. Ao nível do turismo de natureza, isto tem um potencial sem limite e nós só estamos a explorar uma ínfima parte. Não tenho dúvidas de que as populações locais, até pelas infraestruturas que as autarquias têm feito, se viram cada vez mais para o rio. Com diferentes escalas, isso passa-se em vários contextos locais. À parte deste interesse, há um grande potencial num ‘target’ de turistas que vêm a Lisboa e a quem se pode oferecer um produto que se chama Tejo, nas suas diferentes vertentes: o maior Estuário da Europa; a Lezíria; o Médio e o Alto Tejo, com o Parque Natural do Tejo Internacional, que são coisas únicas, com um património imenso. Qual é a mais valia de se conhecer o Tejo a pé? Não estamos a descobrir nada de novo. Antigamente era assim que as populações se deslocavam. O turismo pedestre envolve milhões de

pessoas em todo o mundo, incluindo na Europa. Quem experimenta fica contagiado. As pessoas sabem que a melhor forma de se conhecer um país, uma região, um rio, é a pé. Como só se valoriza aquilo que se conhece, os passeios pedestres são também uma forma de proteger os rios. Com uma infraestrutura simples, barata, convida-se as pessoas a uma atividade salutar e de bem estar. Há estudos que nos dizem que o contacto com a natureza nos predispõe bem. Se tivermos estruturas pedonais ao longo do rio, onde possamos andar com segurança e com paisagens únicas, estamos a seguir também os conselhos médicos e os estudos que apresentam as vantagens de andar a pé. O projeto Tejo a Pé tem sido agarrado por vários municípios, incluindo o de Abrantes, e neste momento já há largos troços que as pessoas podem percorrer. Como é que a navegabilidade entre neste processo?

A navegabilidade de um rio é fundamental. Na ARH organizámos várias sessões temáticas com especialistas e fizemos uma sobre a navegabilidade do rio Tejo em parceria com a Associação Portuguesa de Recursos Hídricos e com o LNEC. Os agentes económicos estão atentos e começam a pensar nesta possibilidade como uma grande oportunidade. As vantagens do transporte marítimo são brutalmente óbvias. Há várias propostas em cima da mesa no sentido dessa navegabilidade começar a ser uma realidade. Claro que é preciso investir em infraestruturas, que são mais complicadas do que fazer um trilho para as pessoas andarem, mas que estão a ser equacionadas e mesmo aprovadas. Em breve essa questão vai ser uma realidade e, na região de Lisboa, vai tirar muitos camiões das estradas. As pessoas fazem contas e a navegabilidade fluvial é vantajosa, sobretudo num rio como este, à beira da capital. Hália Costa Santos


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