Brasília: de Capital Modernista à Meta-Síntese de JK

SESSÂO: História e Teoria da Arquitetura e da Cidade EIXO TEMÁTICO: Teoria e Crítica da Arquitetura, do Urbanismo e da Cidade TEMA: Urbanismo, Arquitetura e Cidade Contemporânea

BRASÍLIA: DE CAPITAL MODERNISTA À META-SÍNTESE DE JK Izadora Carvalho Laner Mestranda, Universidade de Brasília, Brasília/DF, Brasil izalaner@gmail.com

BRASÍLIA: DE CAPITAL MODERNISTA À META-SÍNTESE DE JK RESUMO O Artigo busca circunscrever Brasília sob uma perspectiva de desenvolvimento nacional, explicitando quais os autores traçaram uma visão analítica que vai além do Projeto de Lúcio Costa e da idealização da construção de uma Capital como mito moderno, na tentativa de consolidar uma identidade de soberania nacional. Pretende-se então analisar a construção de Brasília não como projeto urbanístico, mas como decisão política, circunscrita ao desenvolvimento nacional. Brasília, ainda que não fizesse parte inicialmente do Plano de metas, é entendida como meta-síntese do Governo JK. Definida como ponto de germinação econômico por Lafer, a capital se torna agente promovedor de um grande investimento em infraestrutura básica e equipamentos sociais. Partindo do exposto, a decisão política de construção da cidade pode ser entendida, portanto, como o que orientaria a promoção do polo de desenvolvimento regional para o Centro-Oeste, inserida em um esforço desenvolvimentista semelhante a políticas regionais como a criação da SUDENE?

ABSTRACT This article circumscribes Brasilia under a national development perspective, explaining that the authors drew an analytical vision that goes beyond Costa's Project and the idealization of building a Capital as modern myth in an attempt to consolidate a national sovereignty identity. The aim is then to analyze the construction of Brasilia not as urban design, but as a political decision, limited to national development. Brasilia, although not part of the initial goals Plan is understood as meta-synthesis Government JK. Defined as a point of economic germination by Lafer, capital becomes a promoting agent of a large investment in basic infrastructure and social facilities. From the above, the construction of political decision of the city can be understood, so as to guide the promotion of regional development center for the Midwest, set in a developmental effort similar to regional policy and the creation of SUDENE?

PALAVRAS – CHAVE: Brasília, Governo JK, Políticas regionais, Sudene, Urbanização.

KEY WORDS: Brasília, Government JK, Regional Politics, Sudene, Urbanization.

BRASÍLIA: DE CAPITAL MODERNISTA À META-SÍNTESE DE JK

1. INTRODUÇÃO O anseio em transferir a capital para o interior do país tem suas origens ainda no século XIX, ocupando a agenda legislativa em 1822, bem como as constituições republicanas a partir de 1899. Durante o século XIX e início do XX, diversas motivações foram sendo construídas para justificar a transferência da capital do Brasil para uma cidade a ser construída no interior. Além da segurança, já que o litoral se mostrava mais vulnerável a ataques e invasões estrangeiras pelos portos, havia o anseio de se afirmar a identidade nacional a partir de um centro político autônomo, desvinculado da imagem de colônia portuguesa.

Apesar dos diversos fatores que expressavam a forte intenção de se construir uma nova capital no interior do país, Brasília só poderá ser consolidada de fato durante a presidência de Juscelino Kubitschek. A política nacional desenvolvimentista dos anos 50 tem seu ápice com o Programa de Metas do governo JK. O Estado assume o papel de maior investidor em infraestrutura, a fim de estimular o desenvolvimento industrial, objeto principal da estruturação econômica.

Desta forma, iniciou-se um contexto favorável à criação de políticas regionais de planejamento econômico e territorial. Ainda que buscassem um crescimento endógeno, voltadas para a resolução de seus problemas regionais, como é o caso da SUDENE i, criada em 1960 pelo economista Celso Furtado, acabavam integradas a nível nacional, num esforço de fortalecer o mercado interno e possibilitar a entrada de capital estrangeiro.

A presença de Furtado nas resoluções do Plano de Metas (1956 – 1961), bem como agente criador da SUDENE, acaba por contribuir para a definição de subdesenvolvimento a partir de um viés histórico e estruturalii. As políticas regionais no governo JK respondem, portanto, a necessidade de se modificar a base econômica regional para se alcançar o desenvolvimento.

A SUDENE, assim como Brasília, representaram políticas desenvolvimentistas regionais de desconcentração urbana, econômica e demográfica. Criou-se, com estas duas frentes de ação, uma infraestrutura básica que impulsionaria o desenvolvimento industrial e o fortalecimento de um mercado interno, a partir da integração entre as regiões, decorrente da expansão da rede rodoviária, dentre outros fatores. É atribuída maior importância à

industrialização e à modernização agrícola como caminhos para a resolução da desigualdade regional.

2. BRASÍLIA E A POLÍTICA DESENVOLVIMENTISTA DO GOVERNO JK A ideia de que a construção de cidades polos estimularia o desenvolvimento econômico e a expansão urbana a nível regional, ainda que só tenha se destacado no discurso de Furtado após 1967, reflete-se de forma incipiente na construção de Brasília, no final dos anos 50. A cidade acaba por justificar sua construção à medida que cumpre a função de agente catalisador do desenvolvimento, contribuindo para a expansão urbana e econômica das cidades já existentes em seu entorno. Favorece a criação de novas fronteiras agrícolas no centro-oeste, impulsionando um elevado fluxo migratório como contingente de mão-de-obra não só para a construção da cidade em si, como para o desenvolvimento de atividades econômicas. Brasília se transformou, então, na principal entrada de investimento de capital externo, como já foi dito anteriormente. Ainda que esse fato possa prejudicar a consolidação de um mercado nacional, é evidente que impulsionou o desenvolvimento centrado na produção de bens intermediários de consumo, além de expandir a indústria da construção civil nacional e consolidar um mercado interno para a indústria automobilística.

Octávio Ianni, ao tratar do Plano de Metas, atribui maior importância à criação da indústria automobilística no planejamento econômico do Governo JK, atraindo grande parte dos investimentos. Brasília acaba por contribuir para a consolidação de tal processo industrial, ambas sendo transformadas em símbolos do Governo Kubitschek. Aliando esse fator ao de integração nacional e ponto de germinação, percebe-se que, ainda que a construção da capital não fizesse parte das diretrizes do Plano de Metas, esta acaba por sintetizar o pensamento desenvolvimentista por trás da política governamental de “cinquenta anos em cinco”.

Talvez se possa dizer que a criação da indústria automobilística e a construção de Brasília transformaram-se nos símbolos do Governo Kubitschek e, ao mesmo tempo, do novo Brasil. Transformaram-se na prova concreta de que o governo estava, realmente, realizando as tarefas de ‘cinquenta anos em cinco’, como dizia um dos lemas da administração federal. (IANNI, 1996, p. 165)

A visão de Segre evidenciou ser contraditório o discurso da capital como reencontro nacional e o fato de ter se transformado na principal entrada de investimentos estrangeiros no país. Para Segre, não foi eficaz a tentativa de fortalecer o mercado interno e equilibrar a desigualdade regional entre o Nordeste e Centro-sul. O que ocorreu de fato foi o

favorecimento para que empresas estrangeiras pudessem investir em grandes áreas e se beneficiar da condição de impulso desenvolvimentista vivido no país. (SEGRE, 1977) Por lo tanto, ni existe el rencuentro nacional, ni la expansión geográfica coincide com el intento de equilibrar los desajustes existentes en el nordeste o en los centros urbanos de la costa, ya que ello benefició fundamentalmente a las corporaciones extranjeras que se apoderaron de extensas superficies para explotar sus riquezas. (SEGRE, 1977. p. 95)

Alguns autores como Freitag, contudo, se apoiam no pensamento de que Brasília pode ser entendida como uma ponte para a integração nacional, vinculada a políticas regionais de desenvolvimento do Centro-oeste. Isso não significa que teria sido concebida objetivando previamente se tornar o elemento-chave que desencadearia o processo de interiorização no centro oeste. Tal característica é atribuída à cidade, segundo Paulo Timm , como uma forma de justificar historicamente sua construção, em uma escala de política regional (FREITAG, 2012; TIMM, 1998).

A consolidação da escala regional de Brasília é uma consequência da construção da cidade e um imperativo para que ela se justifique historicamente como o vértice da interiorização. Brasília está para o CentroOeste como a SUDENE para o Nordeste ou a Suframa para a Amazônia. É a ponta de lança para a ocupação do centro-oeste, no âmbito da busca de um novo modelo autossustentável de desenvolvimento. (TIMM, 1998. p. 55)

A nova capital assume, com o tempo, o papel de polo de desenvolvimento econômico, em que irradiaria a modernização, o crescimento urbano e econômico para a região. Isso ocorreu pelo fato de que sua implantação necessitou da consolidação de significativa infraestrutura urbana e equipamentos sociais, o que possibilita a Lafer denominar Brasília como ponto de germinação. Tal conceito parte da ideia de que a oferta de infraestrutura provocaria o desenvolvimento de atividades econômicas produtivas. A conceituação de Brasília como ponto de germinação surge, portanto, à medida que a execução da capital contribui para a eliminação de grande parte dos pontos de estrangulamento econômicos em todos os setores do Plano de Metas.

O conceito de ponto de germinação, também elaborado pela comissão mista Brasil-EUA – e que era basicamente o oposto do conceito de ponto de estrangulamento, pois partia do pressuposto de que a oferta de infraestrutura provocaria atividades produtivas – justificou a meta de Brasília, que não fazia, inicialmente, parte do plano de metas. (LAFER, 1970. p. 35)

Kubitschek utiliza-se da ideia de Brasília como Meta-Síntese para justificar sua construção como sendo a maior representação de seu programa de governo. A Capital seria a síntese dos 30 itens que compõe seu plano de metas.

Por que denominei ‘Meta-Síntese’ à construção de Brasília? Os 30 itens do Programa de Metas eram específicos, e cada um objetivava a solução de um determinado problema nacional. Ao lado do Programa, mas representando sua implicação de maior relevância, figuraria, pois, a interiorização da sede do Governo. (KUBITSCHEK, 1975. p. 105)

A capital se transformou desta forma, no centro de reencontro nacional, desencadeando um processo de infra estruturação da região Centro-Oeste, refletindo em seu desenvolvimento econômico. Somado a esse fator, seu caráter de centro político e administrativo nacional levou a consolidação de uma rede rodoviária nacional, com o objetivo de integrar todas as regiões do país, tendo Brasília como ponto de equilíbrio territorial.

Além disso, a expansão rodoviária contribuiu para a criação de um mercado interno para a indústria automobilística, crescente no país. Durante a execução do Plano de Metas, foram pavimentados 6202 km de rodovias, o que corresponde a 207% da meta inicial, fixada em 3000 km. Foram construídos 14970 km de trechos de novas rodovias, representando 150% da meta inicial, fixada em 10000 km. (LAFER, 1970) É importante destacar que a configuração urbana de Brasília favorece o maior uso de automóveis particulares pelos moradores. Seu sistema viário é estruturado por meio de eixos de vias largas com várias faixas, de trânsito rápido e sem cruzamentos em nível. Seu crescimento de forma dispersa e espraiada, em conjunto com a setorização de usos e a valorização imobiliária leva o morador a percorrer grandes distâncias cotidianas.

Ocorre que o deslocamento da Capital Federal para o centro do território nacional, objetivando a interiorização do capitalismo e ampliação do mercado interno, a partir da qual se irradiaria o desenvolvimento para áreas em processo de estagnação, teve efeito reverso. As rodovias construídas para dinamizar o centro do território nacional e possibilitar o escoamento da produção paulista pelo país, apresentaram-se como importante elemento para a rápida e intensa expansão urbana de Brasília, ao possibilitar o trânsito de fluxos migratórios provenientes de várias regiões do país.

(FREITAG, 2012. p. 57)

Quanto à ideia de Brasília como polo de desenvolvimento regional, Freitag chama a atenção para o que denomina como Dicotomia entre Brasília e Centro-oeste. Tal conceito pode ser entendido pela contradição entre o atraso na região, caracterizado por uma região de baixa ocupação e produção econômica, e o desenvolvimento esperado com a construção da nova capital. O nível de desenvolvimento alcançado pelo centro-oeste se mostra insuficiente para fazer com que a região acompanhe o ritmo de crescimento induzido no Distrito Federal, com a construção de Brasília. “Construíra-se um oásis num deserto de pobreza, um emirado sem fronteiras no seio de uma região ainda não alcançada pelos reflexos do desenvolvimento econômico nacional” (BRASIL, 1981. APUD: FREITAG, 2012. p. 86)

3. BRASÍLIA POLO DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL E CENTRO DE INTEGRAÇÃO NACIONAL O contexto de desenvolvimento da região centro-oeste, até a segunda metade do século XX, configurava-se como fronteira agrícola não ocupada. Para efetivar a ocupação do centro-oeste, era necessário abarcar mão-de-obra excedente de outras regiões. Esse fluxo migratório viria principalmente do Nordeste, considerando a necessidade de diminuir o inchaço demográfico em tal região para facilitar o controle da situação emergencial da seca de 1958. Ambas as regiões acabaram de tal forma interligadas pela construção de uma expressiva rede rodoviária, onde se intencionava formar um mercado consumidor para o Sudeste.

Em outras palavras, Brasília e seu entorno regional constituir-se-iam no verdadeiro trampolim do Sudeste industrial para a expansão da fronteira agrícola em direção ao centro-oeste e norte do Brasil. (FARRET, 1985. In: PAVIANI, 1985. p. 25)

Durante a primeira metade do século XX, o Nordeste situava-se como a região-problema do Brasil, caracterizado por expressivo atraso em seu desenvolvimento. A região semiárida, considerada a mais subdesenvolvida, mantinha uma economia frágil, baseada na produção agrícola de grandes latifúndios, onde os trabalhadores rurais não eram integralmente assalariados. Em troca da força de trabalho, recebiam a possibilidade do sus tento por meio da agricultura de subsistência dentro do próprio latifúndio, em terras destinadas a tal função.

O fenômeno da seca de 1958, considerada a mais expressiva desde o início do século XX, gerou impactos sociais catastróficos, agravados pela estrutura econômica regional. Grande parte da população de menor renda se viu obrigada a migrar para outras regiões em busca de melhores condições de vida. O principal destino deste fluxo migratório acabou sendo o Centro-oeste, predominantemente a nova capital, visto que, em tal período, se configurava como o maior canteiro de obras do país. Segawa aponta Brasília como epicentro do movimento migratório da segunda metade do século XX: Ao se caracterizar como ponto de articulação entre regiões desiguais, Brasília tornou-se local atrativo para as enormes correntes migratórias campesinas que fugiam das regiões mais pobres rumo ao sudeste ou às novas frentes de ocupação do Norte e Centro-Oeste. Tornou-se o epicentro do fenômeno. (SEGAWA, 1998. p. 126)

Além de tal fator, Freitag caracteriza o contexto de urbanização brasileira pela incapacidade das cidades em lidar com o crescimento demográfico, em termos de infraestrutura. A insuficiente atenção dada pelo Estado às áreas rurais teria resultado na proletarização do

trabalhador rural, caracterizando um grande fluxo migratório para os centros urbanos.

(FREITAG, 2012) É importante destacar a função do Estado como maior proprietário ou detentor das terras em Brasília, que acabou estimulando um intenso processo de especulaç ão imobiliária, refletindo em sua configuração territorial. O poder público poderia regular a ocupação residencial de forma a propiciar uma diversidade de moradores, no que tange a classe social e econômica. Contudo, assim como na maior parte dos centros urbanos, permitiu-se a valorização exacerbada das áreas de localização privilegiada em relação ao Plano Piloto, resultando em uma expansão baseada na segregação sócio espacial. Tal fator levou a construção das cidades-satélites em locais distantes do centro, a fim de abrigar a população de menor renda. Utilizou-se da distância para disfarçar os problemas de exclusão social e periferização da cidade.

Apesar de previsível o crescente fluxo migratório, ainda assim propagou-se o pensamento de que tal população migrante de regiões precárias voltaria para suas cidades de origem após a conclusão das obras do Plano Piloto, o que de fato não ocorreu. Brasília se tornou o principal centro de oportunidades do País, e dificilmente uma população que vivia em situação de miséria, buscando melhores condições de vida, retornaria ao seu local de origem. Contudo, Lúcio Costa aponta a permanência dos migrantes como causa de um crescimento anômalo de Brasília, desvirtuando o seu plano inicial.

O crescimento da cidade é que ocorreu de forma anômala. Houve uma inversão que todos conhecem, porque o plano estabelecido era para que Brasília se mantivesse dentro dos limites para os quais foi planejada, de 500 a 700 mil habitantes. Ao aproximar-se desses limites, então, é que seriam planejadas as cidades-satélites, para que essas se expandissem ordenadamente, racionalmente projetadas, arquitetonicamente definidas.

Esse era o plano proposto, mas ocorreu a inversão, porque a população a que nos referimos (os candangos) aqui ficou, e surgiu o problema de onde localizá-la (...). Daí a criação dos núcleos periféricos, para transferir as populações, dando terreno para que se instalassem de uma forma ou de outra. Como consequência, os núcleos transformam-se em verdadeiras cidades, as chamadas cidades-satélites, que tomaram o lugar das cidadessatélites que deveriam ocorrer. Assim, as cidades -satélites anteciparam-se à cidade inconclusa, cidade ainda arquipélago, como estava – agora já mais adensada mas ainda não-concluída. A cidade ainda está oca. Entretanto, dois terços da população de Brasília mora nessa periferia, o que foi, naturalmente, desvirtuamento. (COSTA, 1987. p. 26)

Ainda que Brasília possa ser entendida como um dos maiores polos de desenvolvimento crescente no país durante seu período de construção, demonstrou-se incapaz de acolher seus migrantes, no que tange a infraestrutura de serviços e habitação. Assim sendo, a capital nasceu sob um processo de segregação espacial (de certa forma, irremediável) sem precedentes, onde a maioria da população reside a mais de 20 km do Plano Piloto. Para

Gutierrez, Brasília configurou-se uma cidade classista e elitista, que expulsa sua população de menor renda para áreas distantes do centro, demonstrando certa preocupação com a proximidade entre as cidades satélites que abrigavam a classe trabalhadora e o Plano Piloto, configurado essencialmente por uma classe de maior renda.

Brasilia, elitista desde su inicio, se hizo clasista por simple decantación; era aséptica y despersonalizante desde su idea rectora y deriva en inhumana como lógica repuesta. En esta concepción de espacio totalitário el resultado fue la monumentalidad escenográfica del fascismo. (GUTIERREZ, 1983. p.

701)

A busca de uma justificativa para a construção de Brasília a fim de torná-la símbolo do desenvolvimento e modernidade no Brasil resultou na idealização de uma cidade democrática, de reencontro nacional, podendo modificar as relações de desigualdade social.

Contudo, contrapondo-se a tal discurso, Brasília reproduz, desde o início de sua construção, problemas urbanos característicos da concentração de renda, não se preocupando em solucionar as questões de desigualdade social que se refletiam nos grandes centros urbanos desde o processo de urbanização no início do século XX.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Parte da historiografia sobre Brasília tem como objeto o Plano Urbanístico e sua construção, analisados como instrumento da consolidação do mito moderno no cenário mundial. A partir dessa visão, a cidade destacou-se como propaganda da maioridade atingida por um país subdesenvolvido. Afirma, portanto, uma autonomia dos arquitetos urbanistas em construir uma cidade símbolo do Modernismo Brasileiro sem necessitar de profissionais estrangeiros, consolidando um forte campo de atuação nacional.

A ideia da Brasília Capital não visa à representação da cidade como política regional frente ao governo JK. Consolida, em contraposição, uma cidade utópica, alheia as condições econômicas, sociais e políticas do desenvolvimentismo. Ao se focar no debate proposto pelos CIAM’s iii e na representação que a cidade poderia adquirir em contexto internacional, não aborda questões que a situam como polo de desenvolvimento regional, integração nacional e industrialização.

A Brasília Polo de desenvolvimento sugere um sentido de crescimento econômico e urbano.

Constrói-se uma cidade privilegiada por um aparato infraestrutural, tornando-se agente do desenvolvimento econômico para amenizar os desequilíbrios regionais. A partir dessa visão, Brasília é entendida no contexto de esforço de interiorização e integração do país, em que a prioridade, diferentemente da ideia de mito moderno, corresponde à expansão urbana, ao

progresso econômico ligado a industrialização e ao crescimento demográfico, atuando como fator de desconcentração urbana inter-regional.

5. REFERÊNCIAS COSTA, Lúcio. Considerações em torno do Plano Piloto de Brasília. I Seminário de Estudos Urbanos de Brasília. Brasília, 1974.

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GUTIERREZ, Ramon. Arquitectura y urbanismo en iberoamérica. Madrid: Cátedra, 1983.

IANNI, Octávio. Estado e planejamento econômico no Brasil (1930/1970). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971.

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SEGRE, Roberto. Las estructuras ambientales de a América Latina. México: Siglo Veintiuno Editores, 1977.

TIMM, Paulo. Brasilianas. Brasília: Paralelo 15, 1998.

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Superintendência de desenvolvimento do Nordeste. Criada em 1960, a partir do Plano de Ação contido no Relatório do Grupo de Trabalho do Nordeste, também sob o encargo de Celso Furtado. O documento, intitulado “Uma política de desenvolvimento econômico para o Nordeste”, foi elaborado em 1959. Trata-se de um diagnóstico da estrutura econômica do Nordeste, apontando diretrizes para alcançar o desenvolvimento, a partir da modernização agrícola e industrialização. ii Furtado pode ser visto como uma ponte de diálogo entre o Governo JK e as formulações da CEPAL, visto que trabalhou com Raúl Prebisch no órgão entre 1949 e 1957. A participação do economista nas políticas de desenvolvimento de JK, c omo responsável em criar uma política regional para o desenvolvimento do Nordeste, possibilitou adaptar o conceito cepalino de centro/periferia (dualismo estrutural) para a realidade econômica brasileira, principalmente no que tange ao Nordeste. O dualismo estrutural prevê uma relação de dependência entre o centro e a periferia, em que a periferia (Nordeste) é mantida sob um nível de atraso para que seja possível alcançar o desenvolvimento do centro (Centro-sul). O desenvolvimento do centro, contudo, depende do fornecimento de mão-de-obra barata e matéria-prima pela periferia, bem como da formação de um mercado consumidor. iii Congresso Internacional da Arquitetura Moderna. Ao todo foram 10 congressos, ocorridos no período de 1928 a 1956. O IV CIAM, realizado na cidade de Atenas, em 1933, culminou com a publicação da Carta de Atenas.