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Entrevista | João Baracho, Diretor Executivo do CDI Portugal

Grande Entrevista

João Baracho, Diretor Executivo do CDI Portugal

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O CDI (Center of Digital Inclusion) Portugal nasceu em 2013 com o objetivo de dinamizar a Inclusão e Inovação Social através da utilização da tecnologia. A ideia da sua criação deveu-se a um grupo de entidades – Fundação EDP, Fundação PT, SRS Advogados, Egon Zhender, Mckinsey e PwC - que sentindo a necessidade de uma urgente transição digital nas populações mais desfavorecidas, decidiu avançar juntando voluntários e entusiastas e trazendo um dos fundadores e atual presidente da associação, Rodrigo Baggio, um dos mais reconhecidos empreendedores sociais do Mundo.

Em que consiste a intervenção do CDI?

Promovemos a nossa missão através de uma metodologia a que chamamos CDI Comunidade, que consiste em trabalhar com grupos na definição dos problemas comuns e na criação de projetos tecnológicos que os possam resolver ou minimizar. O primeiro consiste no desenvolvimento de Apps para smartphones ou tablets que representem soluções para os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. No entanto, o verdadeiro objetivo do programa, é fazer evoluir o modelo educativo de forma a que inclua transversalmente a componente digital e que, além disso, permita que o professor seja mais facilitador do que líder, que os tempos expositivos sejam reduzidos e substituídos por trabalho colaborativo e que exista uma maior aproximação da realidade escolar ao mercado de trabalho. Criado no Reino Unido, o Apps for Good tem vindo a crescer. Em Portugal, já estamos na 8.ª Edição e, até ao momento, envolvemos mais de 13.000 alunos e creditámos mais de 1.300 professores, contando com cerca de 200 escolas anualmente.

A Equipa CDI Portugal

“Em 2020, o Apps for Good em Portugal ganhou o Prémio Unesco para a melhoria da eficiência dos professores e foi reconhecido pela União Europeia como uma prática inspiradora para a Educação do Futuro”

ganhou o Prémio Unesco para a melhoria da eficiência dos professores e foi reconhecido pela União Europeia como uma prática inspiradora para a Educação do Futuro. O primeiro, deveu-se essencialmente ao nosso trabalho na formação de professores, cujo objetivo não se reduz apenas a explicar a dinâmica do programa mas sim e, fundamentalmente, a dar a conhecer novas metodologias de ensino e atividades inovadoras a desenvolver, com alunos cada vez mais exigentes e conhecedores e com acesso imediato a uma informação/ conhecimento global e acessível. Estes reconhecimentos trouxeram uma maior notoriedade internacional e uma motivação extra para a nossa equipa, cujo trabalho é assim valorizado. Porém, estes prémios nem sempre correspondem à maior facilidade na angariação de fundos e muitas vezes geram nos financiadores a ideia de que a sua contribuição já não é necessária.

Que espera para 2022 e para os próximos anos?

Para o futuro, estamos em conversações com o Governo para avaliar a hipótese de chegar a todas as escolas do país, atingindo cerca de 180.000 alunos em 3.600 escolas e formando 7.200 professores. Internacionalmente, temos propostas para o desenvolvimento do nosso projeto alémfronteiras, mantendo o sonho de chegar aos PALOP’s e escolas em comunidades de emigrantes portugueses espalhadas pelo mundo.

Quer falar-nos mais detalhadamente dos projectos actuais?

Em Valongo, temos vindo a desenvolver os Centros de Cidadania Digital que evoluíram ao fim de 3 anos para o projeto Switch to Innovation. Este projeto pretende criar um ecossistema digital entre escolas, academia e comunidade através da gestão de dois Centros de Cidadania Digital, uma Casa do Conhecimento que integra a rede da Universidade do Minho e as escolas do concelho. Com o Switch to Innovation pretende-se atrair toda a comunidade para a utilização da tecnologia como forma de potenciar oportunidades e fornecer alternativas de vida. Os segmentos prioritários são os desempregados, pessoas excluídas digital ou socialmente, seniores e ainda os jovens à procura de alternativas

para o seu futuro. É neste tipo de projetos que o conceito das Smart and Human Cities torna-se verdadeiramente crucial permitindo aos municípios criar novas oportunidades para os seus habitantes, de forma a colaborarem ativamente na evolução da comunidade em que vivem. Os projetos desenvolvidos vão desde incubadoras tecnológicas a projetos de consultoria tecnológica no comércio local, entre outros, sendo desenvolvidos por recursos locais desempregados ou, por qualquer razão, excluídos do sistema formal.

Integrado neste projeto, desenvolvemos ainda a nossa plataforma de cursos gratuitos RECODE que permite a toda a comunidade que, de forma fácil, se atualize ou inicie nas ferramentas e conceitos tecnológicos. A grande novidade desta plataforma é o facto de incluir já conteúdos do Brasil, Portugal e Moçambique.

Em 2021, o Switch to Innovation culminou numa montra que reuniu todos os projetos do município, envolvendo Cidadania e Tecnologia e a que demos o nome de Switch to Innovation Summit. O impacto do evento foi tão grande que está já em estudo uma próxima edição em 2022, que se pretende poder ser estendida a toda a área metropolitana do Porto.

Para o CDI Portugal, a Inclusão e Inovação Social e Digital não consistem apenas na introdução da tecnologia nas nossas vidas. A formação nas ferramentas digitais é inútil se não for aplicada às motivações dos seus utilizadores. Os atuais modelos social, económico e político estão obviamente esgotados, não correspondendo já às expectativas e necessidades de uma “franja” crescente da população. Necessitamos de maior ligação da escola à vida real, de abandonar sistemas obsoletos de educação maioritariamente expositivos, de maior participação cívica e, fundamentalmente, de permitir aos jovens evoluir de acordo com as suas motivações e características pessoais. Tudo isto, independentemente do seu grau de formação académica, onde os preconceitos são hoje um dos principais fatores de exclusão ou geração da crescente percentagem de jovens que não estão categorizados. Estes últimos são os jovens que não têm lugar em qualquer estatística porque nem são empregados, nem desempregados, nem estão a estudar e, na maior parte das vezes, não pertencem a famílias com dificuldades financeiras nem têm baixo nível de formação académica. Só não se “encaixam” no sistema formal.

Já há progressos e resultados?

O CDI Portugal vai a caminho de fazer 9 anos de vida e, até ao momento, vemos com satisfação que a Inovação Social e Sustentabilidade tem vindo a ocupar um espaço cada vez maior na preocupação das empresas. De facto, as novas gerações assim obrigam: os jovens começam a preferir trabalhar em empresas que se “preocupam” e a optar por comprar a empresas com demonstrada responsabilidade social.

Um dos principais fatores determinantes na nossa caminhada desde 2013 foi, sem dúvida, o tipo de parcerias conseguidas. Apesar do apoio financeiro ser obviamente fundamental, o alinhamento de estratégias, o envolvimento das equipas e o trabalho colaborativo e complementar, são características essenciais para um bom resultado da parceria. Desta forma, é também importante que os parceiros tenham contrapartidas dessa colaboração, seja através do envolvimento dos seus colaboradores e da sensibilização dos mesmos, da extensão das suas próprias ações, ou de outros benefícios, sejam

“Os atuais modelos social, económico e político estão obviamente esgotados, não correspondendo já às expectativas e necessidades de uma “franja” crescente da população.”

eles internos ou externos. Esta é uma área que tem vindo a evoluir muito positivamente nas empresas e que se nota pelo crescente empenho na qualidade da colaboração e na preocupação com a medição do impacto conseguido. No caso específico da PwC, em que a parceria se traduz na auditoria aos nossos resultados financeiros, os resultados obtidos superam provavelmente a perceção que os seus próprios colaboradores têm do impacto da sua colaboração. De facto, e como exemplo, o Relatório Simplificado que apresentamos, facilita na maior parte das vezes as candidaturas a financiamentos internacionais, obrigando ainda a organização ao cumprimento escrupuloso das regras, garantindo externamente a credibilidade e clareza de que tanto nos orgulhamos.

“Enquanto houver estrada para andar, nós vamos continuar”. Para além de replicar e ampliar o que fazemos, estamos já a estudar novos caminhos dentro da nossa missão. A pandemia trouxe a emergência climática e o wellbeing como temas urgentes a incluir nos primeiros anos de escola. Por isso, já estamos a fazer no Apps for Good o piloto do novo curso nestas áreas em 6 escolas, juntamente com o programa especialmente dedicado aos alunos com necessidades especiais, que

Evento Apps for Good

têm ocupado já uma quota relevante no programa atual. Por outro lado, a evolução tecnológica, abrindo caminho para uma maior democratização do conhecimento, gera perigos que queremos minimizar. Entre estes, a evolução da inteligência artificial exige uma educação cuidada onde conceitos éticos e de cidadania têm um lugar obrigatório nos primeiros anos de escolaridade, e eventuais dificuldades de acesso poderão causar desigualdades inesperadas.

Previsões para os próximos anos?

Em Valongo, e no próximo ano, contamos abrir novos laboratórios tecnológicos acessíveis à comunidade, que incluem desde a impressão 3D às Tecnologias Imersivas, e que se destinam a permitir que todos os munícipes possam contribuir com ideias e soluções para melhorar a sua comunidade. Mas esta nossa missão e ambição só faz sentido com os parceiros certos, e temos um grande orgulho em continuar a contar com a PwC, um dos nossos parceiros fundadores e, portanto, co-responsável por “tudo isto”.

“Os atuais modelos social, económico e político estão obviamente esgotados, não correspondendo já às expectativas e necessidades de uma “franja” crescente da população. “n

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