Revista A Bordo - Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho - 4ª Edição

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Fundação Mamíferos Aquáticos | Patrocínio: Petrobras

EDIÇÃO 4

Sustentabilidade Socioambiental

FOTO ACERVO FMA

20 anos de Eco Oficina PEIXE-BOI & CIA

Robert Bonde fala sobre a conservação do manatee nos EUA

Os impactos antrópicos ainda representam uma grande ameaça ao peixe-boi marinho

Projeto forma rede de colaboradores em prol da conservação da espécie


Há 17 anos investindo esforços em prol da conservação do peixe-boi marinho.

FOTO LUCIANO CANDISANI


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CAPA 20 anos de Eco-Oficina Peixe-Boi & Cia.

10 EDUCAÇÃO AMBIENTAL PVPBM forma rede de colaboradores em prol da conservação da espécie

12 ESPECIAL Os impactos antrópicos ainda representam uma grande ameaça ao peixe-boi marinho

16 COLUNA CIENTÍFICA

20 PESQUISA Desenvolvimento local na Área de Proteção Ambiental (APA) da Barra do Rio Mamanguape - Rio Tinto/Paraíba

24 FMA

Monitoramento da biota marinha é realizado pela Fundação

27 GPS

29 FOTO REFLEXÃO

A conservação dos manatees nos EUA

18 DIÁRIO DE BORDO

30 ILUSTRAÇÃO

Gisela Sertório

REVISTA A BORDO

Jornalista responsável Karlilian Magalhães Design gráfico Giovanna Monteiro Revisão técnica João Carlos Gomes Borges e Maria Elisa Pitanga TAMBÉM COLABORARAM PARA ESTA EDIÇÃO:

Jornalismo Raquel Passos Coluna Científica Robert Bonde Diário de Bordo Gisela Sertório Resumo Científico Maíra Braga GPS Maria Elisa Pitanga e Larissa Molinari Jung

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EQUIPE PROJETO VIVA O PEIXE-BOI MARINHO

João Carlos Gomes Borges (Coordenador executivo do Projeto/ Diretor-presidente da FMA) Maria Elisa Pitanga (Coordenadora técnica do Projeto) Jociery Vergara-Parente (Coordenadora científica e Diretora vice-presidente da FMA) Daniela Araújo (Técnica de Inclusão Social) Maíra Braga (Assessora técnica de Inclusão Social) Gisela Sertório (Educadora ambiental) Jaqueline Said Said (Oceanógrafa) Larissa Molinari Jung (Médica veterinária do Projeto) Karlilian Magalhães (Jornalista) Giovanna Monteiro (Estagiária - Design Gráfico) Patrícia Menezes (Gerente Administrativa e Financeira) Genilson Geraldo (Agente de campo) Sebastião Silva (Colaborador - Ecólogo Universitário)


FOTO LUCIANO CANDISANI

EDITORIAL Caros leitores, chegamos à quarta edição da Revista A Bordo, um periódico criado cuidadosamente pelo Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho com o objetivo de levar informações e de sensibilizar o público sobre a importância da conservação do peixe-boi marinho, o mamífero aquático mais ameaçado de extinção no Brasil. Aqui, você pode acompanhar notícias sobre o meio ambiente, sobre a espécie em questão e sobre os esforços desenvolvidos em prol da sua conservação no Nordeste do país. Nesta edição, você vai conhecer um pouco da história da Eco-Oficina Peixe-Boi & Cia - uma ação de cunho socioambiental desenvolvida, desde 1994, pela FMA junto à comunidade da Barra de Mamanguape, com o objetivo de promover a geração de renda sustentável para mulheres da região a partir da produção de bonecos de pelúcia alusivos ao peixe-boi e outros mamíferos aquáticos. Você vai saber também como funciona a Rede de Colaboradores criada na Paraíba em prol da conservação da espécie. A Revista traz ainda uma matéria especial sobre a ameaça que os impactos antrópicos representam à saúde e à vida do peixe-boi marinho e um estudo interessante sobre desenvolvimento comunitário na Barra de Mamanguape. Traz, também, convidados especiais, como o pesquisador Robert Bonde, um dos maiores nomes quando se fala em conservação de Sirênios no mundo, que vai nos deixar informados sobre como anda a conservação dos manatees na Flórida (EUA). E na nossa seção ilustração, estamos recebendo o artista plástico ambiental Alexandre Huber. Esperamos que vocês gostem e que continuem refletindo sobre as questões ambientais e sobre a possibilidade de termos um mundo melhor, onde a natureza seja respeitada e onde os homens e os animais possam conviver harmonicamente. Boa leitura e até breve! João Carlos Borges Gomes, Diretor-presidente da Fundação Mamíferos Aquáticos Karlilian Magalhães, Assessora de Comunicação da Fundação Mamíferos Aquáticos

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CAPA

Eco Oficina Peixe-Boi & Cia completa 20 anos Linhas, olhos com travas, tecidos, fibras antialérgicas... Pelas mãos das costureiras e artesãs da Barra de Mamanguape (PB), os materiais vão se entrelaçando, ganhando corpo e se transformando em bonecos de pelúcia, de alta qualidade, alusivos ao peixe-boi marinho, peixe-boi amazônico e baleiafranca. Depois de prontos, eles viajam quilômetros para serem vendidos em pousadas, hotéis, lojas e instituições que de alguma forma se relacionam com as espécies. A iniciativa gera renda para a comunidade local e ajuda na sensibilização sobre a importância da conservação dos mamíferos aquáticos e do meio ambiente. A equipe de Inclusão Social do Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho - conduzido pela Fundação Mamíferos Aquáticos (FMA) e patrocinado pela PETROBRAS, através do Programa Petrobras Socioambiental - tem como um dos objetivos promover o desenvolvimento das mulheres da região, apoiando - com oficinas de capacitação, intercâmbios de vivências, acompanhamento técnico e logístico - a associação de mulheres responsáveis pela produção das pelúcias da marca Eco-Oficina Peixe- Boi & Cia, que agora está completando duas décadas de existência. “Acreditamos que este produto representa um esforço coletivo em prol da conservação das espécies e que cada pessoa que adquire um boneco é mais uma esperança nossa de ter um colaborador sensibilizado nessa luta para que o peixe-boi saia da lista de espécies ameaçadas de extinção”, diz Daniela Araújo, técnica de Inclusão Social do Projeto Viva o

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Peixe-Boi Marinho. Os produtos são feitos diariamente e também por encomenda, o que faz com que a produção varie de acordo com a demanda. “Já teve vez que a gente produziu 1500 bonecos de peixe-boi chaveirinho em um mês”, diz Maria José Brito, costureira. “É uma felicidade imensa quando vemos tudo prontinho para ser entregue, sabendo que as pelúcias vão para longe, fazer as pessoas felizes e ficarem sabendo dos produtos que a gente faz aqui”, complementa Ednalva Silva dos Santos, artesã local. Quem imaginaria que estas pelúcias seriam criadas há 20 anos, em um local isolado dos grandes centros urbanos, num cenário paradisíaco de praia, coqueiros, dunas, restingas e manguezal? A história começou em 1994, na comunidade da Barra de Mamanguape, litoral norte da Paraíba, onde a Fundação Mamíferos Aquáticos já atuava com atividades de pesquisa em prol da conservação do peixe-boi marinho. Apesar de muito bonito, o local oferecia poucas possibilidades de renda. O povoado era muito simples, a maioria dos homens trabalhava com pesca artesanal e as mulheres cuidavam dos filhos e ajudavam na renda familiar catando e vendendo marisco e trabalhando em casas de veraneio, realidade que dura até os dias atuais. Na época, notava-se que muitos jovens abandonavam a região para buscar emprego e melhorar de vida nas cidades grandes, sobretudo o Rio de Janeiro.


FOTO KARLILIAN MAGALHテウS

FOTO HENRIQUE PONTUAL

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FOTO ACERVO FMA

Foi então que a FMA percebeu que poderia contribuir com a comunidade promovendo uma atividade que ocupasse as jovens mulheres e que gerasse uma alternativa de renda para que elas não tivessem que abandonar o local de origem. O primeiro passo foi promover um curso de corte, costura e bordado. A partir deste curso, pôde-se perceber que as jovens tinham potencial para executar algo maior. Na época, a FMA tinha contato com uma fornecedora de bonecos de pelúcia que havia desenvolvido uma modelagem especial alusiva ao peixe-boi marinho. As jovens então começaram a confeccionar os bonecos a partir dessa modelagem. Todo o trabalho era feito dentro da estrutura do Projeto Peixe-Boi, onde a FMA atuava. Ao produto foi sendo então agregado um valor socioambiental - além de estar contribuindo com geração de renda local, de forma sustentável, ainda colaboraria na sensibilização para a conservação da espécie e do meio ambiente. Com o passar do tempo, os bonecos, de tão carismáticos, foram

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conquistando o público e gerando uma demanda crescente. Para poder ganhar um mercado, os produtos foram se qualificando cada vez mais, por meio de busca de parcerias com entidades como a Millenium e o SEBRAE e de conquistas como o selo de segurança, aprovação e qualificação do INMETRO. A iniciativa, chamada de Eco-Oficina Peixe-Boi & Cia, foi ganhando força e personalidade. Saiu das instalações do Projeto Peixe-Boi e passou a ter um espaço próprio. A FMA adquiriu um terreno e, com a ajuda da Fundação O Boticário, um espaço foi construído e equipado com máquinas de costura e material para a confecção dos bonecos. E é neste espaço que até hoje são produzidas as pelúcias, que ganharam as versões de peixe-boi marinho, peixe-boi amazônico e baleia-franca. Os bonecos variam em tamanhos grandes, médios e pequenos e em chaveiros, portamoedas e estojos de lápis.


FOTO KARLILIAN MAGALHÃES

Moradoras da Barra de Mamanguape na Oficina Mulher Empreendedora.

Com o amadurecimento da iniciativa, as jovens deste grupo produtivo, hoje mulheres adultas, criaram a Associação Eco-Oficina Mamíferos Aquáticos da Barra de Mamanguape, que atualmente, com a parceria e o apoio da FMA, é responsável pela produção das pelúcias da Eco-Oficina Peixe-Boi & Cia. A Associação tem um papel importante, na medida em que é um espaço para exercitar o empoderamento e a valorização da mulher no contexto local, e a autogestão de um negócio social. Por meio do Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho, a FMA está investindo esforços no desenvolvimento deste grupo, sobretudo na formulação participativa de um plano de gestão e de negócios que propicie a sustentabilidade dessa ação, além do apoio no acompanhamento técnico e logístico, incluindo compra de material, transporte e escoamento do produto.

da Paraíba. A segunda, intitulada ‘Oficina Desenvolvimento Comunitário’, foi mais longa e dividida em três módulos, e teve como facilitador o consultor Alexandre Botelho. A partir dessas oficinas, foi construído um plano de ação para o desenvolvimento comunitário da região. Atualmente, os moradores estão participando de rodas de conversa e orientação para colocar o plano em prática.

SERVIÇO Para adquirir as pelúcias Eco-Oficina Peixe-Boi & Cia, visite o site da Fundação Mamíferos Aquáticos (www.mamiferosaquaticos.org.br) ou entre em contato por telefone e por e-mail: Tel.: 081 3304.1443 e-mail: fma@mamiferosaquaticos.org.br

A equipe de Inclusão Social do Projeto percebeu que para promover o desenvolvimento sustentável da região (incluindo comunidades vizinhas da Barra), além de voltar a atenção para a Associação, teria também que haver uma articulação com outros moradores locais que realizam atividades produtivas e que também necessitavam de uma orientação para a construção de um plano de negócios. As oficinas de capacitação previstas para as mulheres da Associação foram ampliadas para que todos pudessem participar. A primeira capacitação reuniu as mulheres das comunidades na ‘Oficina Mulher Empreendedora – Fortalecendo a Identidade Feminina para os Negócios’, numa parceria com o SEBRAE

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EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Rede de colaboradores é criada na Paraíba em prol da conservação do peixe-boi marinho Formada durante as ações de campanha de sensibilização e informação do Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho, a rede de colaboradores já conta com 55 voluntários interessados em ajudar na conservação do mamífero aquático mais ameaçado de extinção no Brasil. São estudantes, pescadores, líderes comunitários, presidentes de colônia, polícia ambiental, secretários de Turismo e Meio Ambiente, donos de pousadas e restaurantes de nove municípios do litoral paraibano. A ideia é que eles fiquem atentos a qualquer ocorrência que envolva encalhes de mamíferos aquáticos ou situações que coloquem em risco a vida do peixe-boi marinho naquela região.

FOTO MARIA ELISA PITANGA

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A rede funciona desta forma: caso haja alguma eventualidade, os voluntários entram em contato com a equipe do Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho – conduzido pela Fundação Mamíferos Aquáticos e patrocinado pela PETROBRAS, através do Programa Petrobras Socioambiental – que se desloca até o local o mais rápido possível. Os voluntários também podem auxiliar com informações a respeito do animal, bem como no resgate e em atividades de sensibilização. As comunidades litorâneas envolvidas na rede vêm sendo abordadas pelo Projeto desde fevereiro deste ano, quando realizou campanhas, visitas técnicas e informativas, além de palestras eco educativas sobre aspectos biológicos, ameaças e status de conservação do peixe-boi marinho.

diz Gisela Sertório, educadora ambiental do Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho. Na Paraíba, a orientação para caso alguém encontre um peixe-boi marinho ou qualquer mamífero aquático encalhado (vivo ou morto), é comunicar primeiramente ao órgão ambiental atuante na região ou entrar em contato com a própria FMA, pelos telefones: (83) 9961-1338/ (83) 9961-1352/ (81) 3304-1443. Se o animal estiver vivo, siga as seguintes recomendações: 1- Se estiver exposto ao sol, proteja-o fazendo uma sombra; 2- Não o alimente e nem tente devolvê-lo à água; 3- Evite aglomeração a sua volta.

“A rede é de suma importância na luta pela conservação da espécie. Em casos de encalhe, por exemplo, quanto mais breve a nossa equipe souber do ocorrido, mais rápido ela chega ao local e mais chance de vida o animal tem. A rede também aproxima as comunidades do Projeto e, com isso, o nosso objetivo – de evitar a extinção do peixe-boi marinho no Nordeste do Brasil – ganha mais força e aliados”,

FOTO ACERVO FMA

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FOTO ACERVO FMA

ESPECIAL

Os impactos antrópicos ainda representam uma grande ameaça ao peixe-boi marinho Barra de Mamanguape, litoral norte da Paraíba, 14h do dia 16 de agosto de 2014: a equipe da Fundação Mamíferos Aquáticos (FMA) recebe a informação de que um peixe-boi marinho foi encontrado no rio da Guia, município de Lucena, com cortes originados por hélice de embarcação. Tratava-se de Puã, um animal reintroduzido, que hoje vive em ambiente natural e circula pelo estuário, braços de rios e por zonas litorâneas de toda a Área de Proteção Ambiental da Barra do Rio Mamanguape (PB). Assim que acionada pelos monitores da APA/ ICMBio, Larissa Molinari Jung, médica veterinária do Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho – que é conduzido pela FMA e patrocinado pela PETROBRAS, através do Programa Petrobras Socioambiental – foi em busca de Puã para examiná-lo. O animal recebeu o atendi-

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mento adequado, mas carregará cicatrizes na região dorsal pelo resto da vida. Infelizmente, casos como o de Puã estão aumentando no Brasil. Há registros de acidentes como este nos estados de Sergipe, Paraíba e Rio Grande do Norte. As hélices de embarcações são de fato grandes causadoras de ferimentos e mutilações em sirênios. O Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho alerta que em áreas de ocorrência da espécie – como estuário e mar, principalmente nas zonas de alimentação (onde há presença de macroalgas e capim agulha, por exemplo) –, é necessário que o condutor diminua a velocidade das embarcações e fique atento à presença dos animais.


FOTO KARLILIAN MAGALHÃES

FOTOS LARISSA MOLINARI JUNG

Da esquerda para direita, alguns dos impactos ambientais que ameaçam a vida dos peixes-bois marinhos: lixo jogado nas praias, mares e rios; construções desordenadas nas margens dos estuários. Abaixo, imagens dos ferimentos na região dorsal de Puã causadas por hélice de embarcação.

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“Com certeza ele escapou de algo que poderia ter sido muito maior. Os seus cortes não foram tão profundos, o que facilitou a sua cicatrização, além de estarem localizados em seu dorso, não comprometendo seu deslocamento, visão ou respiração. Observamos, no local, tanto pequenas canoas quanto embarcações motorizadas de maior porte e todas bem próximas a ele, porém não podemos afirmar em que localização exata do litoral este animal estava quando foi atingido. Infelizmente, mesmo em áreas protegidas, sem constantes fiscalizações, os riscos acabam existindo. O PVPBM continua com sua campanha de sensibilização efetiva no litoral paraibano, pois quanto mais a população conhecer o animal e os perigos que ele corre mais parceiros somos nesta proteção. Torcemos para que Puã não seja vitima novamente de nenhuma situação antrópica, afinal a casa é dele”, diz Larissa Molinari Jung. Outros fatores ocasionados por seres humanos também colocam em risco o ambiente, a saúde e a vida da espécie e contribuem para que o peixe-boi marinho ocupe o status de criticamente ameaçado de extinção no Brasil. Lixo, esgoto e substâncias tóxicas lançadas nos mares e nos rios, degradação dos manguezais, destruição da mata ciliar, construções desordenadas em praias e estuários, perda de habitat (estuários e áreas costeiras), captura acidental em redes de pesca.

Atitudes simples podem ajudar a reverter esta situação, como: - Não jogar lixo nas praias, pois o mesmo ocasiona a poluição do mar e estuário, acarretando danos diretos aos peixes-bois marinhos, que acabam confundido o lixo com comida, podendo ficar doentes e até morrer; - Não construir casas e estabelecimentos em áreas de manguezais, pois é lá que se concentram diversos nutrientes necessários para a alimentação do peixe-boi marinho, sendo ainda o local de reprodução e descanso da espécie; - Proteger as matas e os mangues. Ao conservar estas áreas, você evita o assoreamento dos estuários. Esse assoreamento impende a entrada das fêmeas que buscam o estuário e áreas protegidas para parir. Com o comprometimento destas áreas costeiras, muitas vezes as fêmeas se reproduzem em áreas desprotegidas, o que acaba favorecendo para o encalhe dos filhotes; - Ao utilizar embarcações motorizadas, ter especial atenção nas áreas de ocorrência da espécie, pois a hélice das embarcações podem ferir os animais; - Evitar ancorar embarcações nas áreas com bancos de corais, fanerógamas marinhas (capim-agulha) e algas-marinhas.

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FOTO FERNANDO CLARK

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COLUNA CIENTÍFICA

Manatee Research on the Florida Manatee: Four Decades and Continuing POR ROBERT BONDE

PhD, pesquisador do Sirenia Project do U.S. Geological Survey Estuda manatees (peixes-bois) há mais de 36 anos. FOTOS U.S. GEOLOGICAL SURVEY - SIRENIA PROJECT TRADUÇÃO: FMA

O mistério dos manatees (peixes-bois, em português) sempre intrigou as pessoas. Eles vivem literalmente em nossos quintais. Pelas regiões costeiras da Flórida, nós frequentemente podemos vê-los em canais e vias navegáveis, mas a população de manatees nem sempre foi tão abundante. A população do peixe-boi da Flórida foi provavelmente reduzida na virada do século, devido à caça ocasional. Quando as usinas foram inicialmente construídas em 1950 e 60, para atender às demandas de energia de uma população humana crescente, os manatees usavam a água quente gerada como refúgio do inverno e dos “stepping stones” para poderem migrar em direção ao norte. Os peixes-bois são fisiologicamente incapazes de sobreviver durante longos períodos, quando sujeitos a temperaturas frias de água abaixo de 20 ° C, e no inverno, o manatee deve procurar água quente para sobreviver. Eles encontram o calor em nascentes naturais artesianas, sistemas de bacias térmicas passivas e fontes artificiais, como as descargas industriais e usinas de energia. O fechamento inevitável de fontes artificiais de água quente no futuro (como as usinas) vai reduzir o número de refúgios de água quente disponível para os peixes-bois durante o inverno. Portanto, esforços foram direcionados na identificação de fontes naturais de água morna para os peixes-bois utilizarem. Atualmente, a população mínima de manatee é estimada em mais de 5.000 indivíduos.

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O número de mortes de peixe-boi tem continuado a aumentar anualmente desde que os registros começaram, há aproximadamente 50 anos. Embora o número registrado de mortes tenha aumentado a cada ano, o número de nascimentos é desconhecido. Como tem sido observado um aumento na população global dos peixes-bois da Flórida nas últimas décadas, o número de nascimentos, evidentemente, ultrapassou o número de mortes. Se esta tendência continuará ou não, vai depender de fatores ambientais e antrópicos. O USGS e parceiros vão continuar a acompanhar esta tendência. Os manatees são uma espécie protegida e toda a pesquisa só é possível com licenças adequadas. Essas licenças, quando concedidas, são necessárias para garantir que a pesquisa seja adequada e humanizada, e para evitar esforço duplicado. Licenças geralmente orientam projetos para tratar de questões específicas descritas no Manatee Recovery Plans (Plano de Recuperação de Manatee), que delineia as prioridades para a recuperação de peixes-boi das Índias Ocidentais na Flórida e Porto Rico. Os peixes-bois foram protegidos na Flórida por leis estaduais desde o início de 1900, e estão protegidos por leis federais sob a Lei das Espécies Ameaçadas de 1973 e da Lei de Proteção de Mamíferos Marinhos de 1972. A Lei Florida Manatee Sanctuary de 1978 também estabelece como necessário o habitat para ajudar a garantir a sua sobrevivência.


Antes de 1970, poucos estudos detalhados sobre peixes-bois foram realizados, enquanto que o maior impulso da pesquisa foi seguido ao de pesquisa federal em manatees iniciada em 1974, a qual foi realizada pelo U.S. Geological Survey’s Sirenia Project e anteriormente com U.S. Fish and Wildlife Service. A pesquisa do Sirenia Project tem crescido consideravelmente desde 1974, com contribuições significativas por parte da Florida Fish and Wildlife Conservation Commission, agências federais, estaduais e locais, instituições acadêmicas, oceanários e organizações sem fins lucrativos. Avanços foram feitos no desenvolvimento e aplicação de rádio marcação com posterior monitoramento, fornecendo extensos estudos de longo prazo por meio de foto-documentação dos indivíduos para estimar as taxas de reprodução e sobrevivência, observação direta do comportamento e de acontecimentos na história de vida, avaliação de habitat e mapeamento GIS (Sistema Geográfico de informação), nutrição e ecologia alimentar, fisiologia, genética e paleontologia. Grande parte dos dados recolhidos pelos pesquisadores é usada no desenvolvimento de modelos predefinidos para informar gestores sobre a tomada de decisões de recuperação. A pesquisa resultou em inúmeras publicações que têm sido valiosas para outros pesquisadores de todo o mundo. Este espírito de partilha de dados e informações tem sido parte integrante para o estabelecimento de uma estrutura de

linha de base para o desenvolvimento de planos de estudos regionais e locais em outros países. Muitos estudos sobre sirênios têm sido possíveis através da colaboração com parceiros internacionais na Austrália, Belize, Brasil, Colômbia, Cuba, México, Panamá, e diversos países na África. O público abraçou a conservação dos manatees, e essa ética elevou a consciência de que muitos fatores influenciam o nosso planeta hoje. As perspectivas a curto-prazo para o peixe-boi da Flórida são boas. No entanto, como o nosso planeta continua a mudar e a responder a essas mudanças, habitats e ecossistemas são continuamente desafiados. É difícil prever como essas mudanças vão afetar as populações Sirênias. Esperamos o melhor, e com proteções adequadas, estamos confiantes de que os manatees estão resistentes o suficiente para sobreviver bem até o futuro distante.

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Diário de Bordo POR GISELA SERTÓRIO

Educadora Ambiental do PVPBM Oceanógrafa

O peixe-boi marinho faz parte da minha história de vida há um bom tempo, desde quando era estudante de Oceanografia, há cerca de 10 anos. Foi devido ao encantamento por esta espécie, sua causa e problemática, que acabei tendo experiências de vida enriquecedoras, ao ir, por exemplo, fazer um estágio com os peixes-bois marinhos na Colômbia. Esta experiência foi um marco significativo, pois foi a primeira vez que encontrei o peixe-boi marinho na natureza, depois de anos me esforçando para a realização deste sonho. E a emoção de encontrá-lo e reintroduzi-lo na sua casa, o mar, contribuiu para meu envolvimento íntimo com a conservação e preservação da espécie. Para mim, é um animal de extrema importância para a natureza, tanto pelo seu valor intrínseco de vida, como pelo seu papel ecológico no habitat de auxiliar o equilíbrio da vida marinha. E quando olho para este mamífero aquático e penso na atual condição que ele se encontra hoje, criticamente ameaçado de extinção, vejo a oportunidade e responsabilidade que nós seres humanos temos de reverter esta situação e realmente transformar a maneira de nos relacionarmos com o meio ambiente.

FOTO MARIA ELISA PITANGA

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Cheguei ao Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho por meio do edital lançado pela Fundação Mamíferos Aquáticos, porém fui chamada para substituir a antiga educadora ambiental. Lembro da minha chegada à Barra de Mamanguape, quando, no carro, conversando com as pessoas da equipe, uma delas me chamou a atenção para perceber como as casas das comunidades que integram a APA da Barra do Rio Mamanguape são coloridas e tem flores no quintal. Isso me deu uma sensação alegre de boasvindas. Aqui na Barra é muito fácil se sentir bem com o cenário natural, que mistura coqueiros com um estuário lindo cheio de barcos artesanais, em um ritmo de vida simples. Para mim, estar aqui é realmente concretizar um sonho de vida e profissional, pois sempre lia sobre a história da conservação do peixe-boi marinho que está tão ligada com a história deste local e das pessoas que aqui vivem. Ser educadora ambiental do PVPBM, neste momento de minha vida, é o maior aprendizado que tenho, pois me faz perceber, por exemplo, como muitas vezes pequenas ações de mobilização social fazem uma diferença imensa na vida das pessoas, e isso contribui muitas vezes pra qualidade de vida da comunidade. Percebo também a forte relação que existe na problemática das questões socioambientais com as habilidades que necessitamos desenvolver para trabalhar coletivamente no mesmo caminho. As atividades de educação ambiental são sempre um pouco desafiadoras, já que é uma ferramenta de intervenção socioambiental e tem uma perspectiva interdependente sempre vale a pena refletir sobre os passos que estamos dando para conseguir enxergar com clareza onde realmente queremos chegar. Dentre as atividades que excuto, tem as campanhas de sensibilização e informação do peixe-boi marinho nas praias da Paraíba, nas quais sempre é necessário um esforço de toda a equipe. Saímos bem cedo aqui da Barra para uma praia, que, na maioria das vezes, não conhecemos. Vamos aos locais com uma visão das prioridades que temos que fazer, mas cada comunidade tem sua peculiaridade, as pessoas que se interagem conosco fazem toda a diferença para a dinâmica de sensibilização de cada município. Também faz parte da minha rotina de trabalho estar incentivando as atividades dos agentes ambientais formados pelo PVPBM, e isso abre a possibilidade

de trabalhar de uma maneira mais engajada com os jovens da comunidade. Nestas ações, eles são sempre estimulados a estarem ativos em todas as partes do processo. Acompanho também as atividades desenvolvidas pela linha do desenvolvimento comunitário, pois são duas linhas de ações que caminham bem juntas no sentido de estar aproximando cada vez mais a comunidade com as atividades do projeto. Trabalhar num projeto de conservação do peixe-boi marinho é primeiramente a concretização de um sonho antigo. Isso me dá um contentamento interno e energia para ir adiante com as minhas atividades, ou mesmo com desafios que tenho que enfrentar, pois sei que o propósito que o projeto traz é de grande valor. Os desafios do trabalho variam conforme o momento. Algumas vezes, a condição de se morar bastante afastado da cidade se torna um desafio, a condição de trabalhar em um grupo pequeno faz com que a convivência muitas vezes também se torne um desafio, pois cada pessoa tem seu jeito de lidar com a vida. Morar longe de casa é sempre um crescimento pessoal, uma maneira de sair da zona de conforto e ir realmente atrás do que se deseja. Sempre que me mudo para um novo local é uma nova oportunidade de refazer a vida. Novos laços são feitos, novos costumes são integrados à rotina e assim as experiências de vida vão ficando mais ricas, com novas histórias pra contar. Neste período de atuação do projeto, vários momentos foram marcantes... Um, em especial, me deixou muito emocionada... Foi no Forró do Peixe-Boi, evento promovido no mês de janeiro, aqui na Barra de Mamanguape. A atividade demandou muito esforço da equipe toda e estávamos bastante ansiosos para que todos os detalhes desse certo. Dentro das atividades do evento, uma das mais esperadas foi a Regata do Peixe-Boi. Lembro quando estava ajudando na organização, via fotos das edições antigas e me recordava que antes de trabalhar no projeto já tinha muito desejo em presenciar esse evento. E quando vi as jangadas todas no estuário saindo, com a cor da água que estava linda, um esverdeado bem claro, fiquei muito emocionada e todo esforço que tinha realizado até aquele momento fez todo sentido.

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PESQUISA A cada edição, a Revista A Bordo trará artigos e resumos científicos relacionados à conservação do peixe-boi marinho e seus habitats. Confira agora o resumo científico elaborado por Maíra Batista Braga, mestranda do Programa de Desenvolvimento de Meio Ambiente da Universidade Federal de Pernambuco e pesquisadora associada da Fundação Mamíferos Aquáticos, e coautores.

DESENVOLVIMENTO LOCAL NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL (APA) DA BARRA DO RIO MAMANGUAPE RIO TINTO / PARAÍBA Área temática: Desenvolvimento Local e Identidade. Autores: Maíra Batista Braga (maira@mamiferosaquaticos.org.br, FMA e PRODEMA/UFPE); Vanice Santiago Fragoso Selva (vanice.selva@gmail.com, PRODEMA/UFPE); Alexandre Botelho (alexandremerrem@gmail.com, FMA); Daniela Araújo (daniela.araujo@mamiferosaquaticos.org.br, FMA). Palavras-chaves: Desenvolvimento local; economia solidária; APA de Mamanguape.

INTRODUÇÃO O trabalho ora apresentado relata a experiência de desenvolvimento local que está sendo desenvolvida na região da APA da Barra do Rio Mamanguape, no município de Rio Tinto, litoral norte da Paraíba, por meio das ações do Projeto Viva do Peixe-Boi Marinho, no âmbito da Fundação Mamíferos Aquáticos (FMA). A APA, Unidade de Conservação Federal criada em 1993, situa-se numa região das mais importantes e conservadas áreas naturais do Nordeste brasileiro, com presença de Mata Atlântica, manguezais, restinga, dunas, falésias e arrecifes, além da ocorrência de peixes-bois marinhos, mamífero aquático mais ameaçado de extinção do Brasil. (Paludo, D; Klonowski, V. S, 1999). A 70 Km de João Pessoa, as comunidades envolvidas neste processo de desenvolvimento comunitário situam-se numa região relativamente isolada, com acesso apenas por estrada de barro em área canavieira, a uma distância média de 32 Km, tanto da BR

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101, quanto da sede de Rio Tinto. Ali as possibilidades de renda são escassas. Como atividade econômica, predomina a pesca artesanal, com alguma representatividade do corte da cana e pequenos serviços. Desta forma, a falta de oportunidade de trabalho e renda é uma problemática local. O trabalho objetiva relatar a experiência do processo de capacitação em desenvolvimento local realizado junto às comunidades da Barra de Mamanguape, Lagoa de Praia, Praia de Campina e Saco, que vivenciam realidades semelhantes, em perfil social, econômico, cultural e territorial. METODOLOGIA A capacitação visou articular a comunidade para o desenvolvimento local e ampliação das perspectivas de trabalho e renda, reunindo moradores num reconhecimento e resgate da identidade e valorização das potencialidades da região. Foram realizadas três oficinas de Desenvolvimento Comunitário, nos períodos de 25 e 26 de fevereiro,


19 e 20 de março e 15 e 16 de abril de 2014, no Centro Comunitário de Lagoa de Praia, totalizando 36 horas de trabalho presencial com o mesmo grupo, formado por 22 pessoas das quatro comunidades citadas. Os participantes eram lideranças comunitárias, artesãos, pescadores, educadores, agentes de saúde, agentes ambientais e donas de casa. Todo o processo de capacitação foi desenvolvido de forma participativa. Atividades lúdicas, dinâmicas, desenhos, mapas-falados, vídeos, contações de histórias, cantos e danças circulares foram bastante utilizadas para provocar reflexões, debates e construções de conhecimentos, que partiam da realidade local e das falas dos participantes para formulações coletivas compartilhadas. Na primeira oficina os principais temas trabalhados foram o reconhecimento das identidades individuais, grupais e territoriais; e economia solidária. O resgate das identidades individuais foi feito a partir de desenhos e socialização sobre as atividades desenvolvidas por cada um; a identidade do grupo foi obtida a partir das motivações de cada um em estar participando da oficina, as quais foram agrupadas, sendo possível observar objetivos comuns; e a identidade territorial foi percebida a partir de mapas-falados, que evidenciaram, por meio de desenhos e exposições orais, as características de cada comunidade. Na sequência, o grupo foi provocado a explicitar as relações que se estabelecem entre as quatro comunidades: relações de trocas, compras, serviços, usufruto de espaços, estruturas, recursos naturais, entre outros. Daí foi possível observar que as relações de troca são muito presentes, sendo possível trabalhar o tema economia solidária, construindo-se coletivamente o entendimento sobre o conceito e as práticas possíveis. Uma pergunta que ajudou neste entendimento, quando do cruzamento dos mapas, foi: quais são as coisas que se tem na sua comunidade que necessitam de dinheiro e as que não necessitam de dinheiro para se ter? Além dos desenhos e debates, foi também exibido um vídeo mostrando uma experiência de economia solidária.

A segunda oficina teve como principais temas: gestão de organizações comunitárias; produção e comercialização. Para o primeiro tema foi feito um levantamento das organizações comunitárias das quatro comunidades, incluindo as diversas formas de organizações sociais, como grupos de lazer, religiosos, produtivos e de representação do lugar. A partir daí foi discutido sobre as características de gestão de cada grupo, como necessidade ou não de formalização e os perfis de atividades e formas de cuidar das organizações. Para trabalhar o tema produção e comercialização, artesãos descreveram quanto tempo demoraram para produzir uma de suas peças, os materiais utilizados e suas procedências, custos de produção. Com isso foi possível discutir referências para a formatação de preços de produtos e serviços. Um outro exercício para esse tema e complementar ao tema economia solidária, foi a realização de uma feira de trocas. Todos os participantes levaram objetos e dispuseram de serviços para trocar e neste momento exercitaram as estratégias de divulgação, definição de preço justo (neste caso, troca justa) e, ao mesmo tempo, exercitaram a relação de solidariedade numa dinâmica de obtenção de bens e serviços numa lógica não capitalista, onde o dinheiro não precisou existir. Na terceira oficina foi trabalhado um planejamento participativo para a organização do grupo para as ações futuras. Para o entendimento da necessidade de se traçar planos para alcançar objetivos e visando a sensibilização para que os participantes se vejam e se coloquem dentro do plano a ser traçado coletivamente, foi feita uma dinâmica que iniciou com o resgate individual de sonhos realizados e das estratégias traçadas por cada um para a realização desses sonhos. Depois, pensando nas atividades produtivas realizadas pelas pessoas do grupo, provocou-se a reflexão sobre o que é necessário para desenvolver melhor aquilo que fazem, o que é preciso fazer para conseguir isso e em que o grupo pode ajudar a alcançar estes objetivos. A partir destas perguntas eles foram provocados a dizer se querem se constituir como um grupo e se querem fazer um plano para definir ações e estratégias deste grupo.

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FOTOS KARLILIAN MAGALHÃES

Com base nas respostas dadas à questão “para que este grupo deve existir”, foi elaborada a missão do grupo; e com referência nas necessidades apontadas por eles, foram tiradas algumas palavras-chaves para a formulação de objetivos e macro estratégias, como: capacitação, matérias-primas, espaço, recursos, trabalho conjunto, divulgação, comercialização. Por fim, discutiu-se ainda o entendimento sobre desenvolvimento local sustentável e a diferença entre desenvolvimento e crescimento. Vale aqui destacar a consonância da estratégia metodológica do trabalho realizado com a base conceitual do desenvolvimento local, que diz que “os três eixos do desenvolvimento local - formação do capital humano e social, o desenvolvimento produtivo do território e a concertação para a gestão participativa, nas suas interdependências e complementariedades – devem favorecer a visão de futuro dos atores locais.” (BNDES, p. 43). RESULTADOS E DISCUSSÕES O resgate das atividades desenvolvidas nas comu-

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nidades aponta para: (1) Produtos de artesanatos: cipó, bambu, sisal, pelúcia, fuxico, quenga de coco, pinturas, mosaico, tecidos, bordados, conchas de marisco, bijuterias, sandálias, fibra de coco; (2) Alimentos: dindim, mousse, beiju, tapioca, bolo, cocada e refeições; (3) Serviços de turismo e lazer: condutor local de trilhas, aluguel de bicicletas e caiaque, passeio de barco, bares e restaurantes; (4) Outros serviços: reparos elétricos e eletrônicos, faxina, cuidador de cachorros, jardinagem e pintura. A partir da identificação das atividades produtivas, características da localidade e desejos da comunidade é que foi elaborado, de forma participativa, o Plano de Desenvolvimento Local, buscando ampliar as oportunidades de trabalho e renda de forma sustentável, promovendo assim o fortalecimento da comunidade. Além do Plano, apontam-se como principais resultados qualitativos desse processo: conhecimento e união entre as comunidades, valorização e fortalecimento de identidades e laços, entusiasmo e abertura de novos horizontes.


Na perspectiva de promover o desenvolvimento que privilegie a comunidade, com participação coletiva e respeito ao ambiente, as abordagens realizadas fizeram o grupo refletir sobre uma nova forma de economia e desenvolvimento, ao trabalhar, por exemplo, a compreensão sobre a economia solidária. De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego, economia solidária é “um jeito diferente de produzir, vender, comprar e trocar o que é preciso para viver sem explorar os outros, sem querer levar vantagem, sem destruir o ambiente, cooperando, fortalecendo o grupo, cada um pensando no bem de todos e no próprio bem”. Alinhar o entendimento de desenvolvimento local ao modo de produção vigente é contrapor à lógica do capital, que é de acumulação de renda através da exploração. Segundo Boff, a economia hoje não condiz com seu objetivo primário, “a economia tinha por objetivo atender satisfatoriamente as carências da casa, que tanto podia ser a moradia mesmo, a cidade, o país, quanto a casa comum, a Terra”. Na reestruturação paradigmática dos processos de desenvolvimento com sustentabilidade, devemos ter em conta os seguintes aspectos: democracia, participação, justiça social, informação, controle e gestão social, investimentos sociais e desenvolvimento socioterritorial. (BNDES, 2000) CONSIDERAÇÕES FINAIS Os objetivos do processo de capacitação foram alcançados, tendo sido cumpridos todos os passos previstos, atingida a quantidade e perfil desejado dos participantes e mantido o envolvimento do grupo. Foi possível perceber que a comunidade está motivada em realizar ações conjuntas e colaborativas, a partir dos objetivos comuns. Durante as oficinas foi também fortalecida a compreensão de que este é um Plano da comunidade, em que a Fundação é parceira, mas que há muitas coisas que podem ser feitas a partir de articulações e iniciativas da própria comunidade, sem necessariamente depender de recursos financeiros significativos. A partir do Plano elaborado, foi estabelecida uma agenda de novos encontros entre os integrantes das comunidades – encontros estes que estão ocorren-

do ao menos uma ou duas vezes por mês, com o objetivo de detalhar as ações e estratégias apontadas no Plano e começar a colocá-las em prática. Neste momento posterior às oficinas a Fundação continua dando apoio ao desenvolvimento comunitário, inclusive agregando a parceria do SEBRAE-PB, que passou a atuar junto à comunidade no sentido de discutir junto a eles um possível modelo de negócios e de gestão comunitária deste grupo produtivo. Assim, entende-se que foi dado um importante passo para o desenvolvimento local sustentável nesta região da APA de Mamanguape e espera-se que, com as comunidades mais integradas e empoderadas, sejam possíveis novas iniciativas comunitárias também no aspecto de geração de trabalho e renda, contribuindo para a amenização desta problemática, a partir das potencialidades locais. Para a Fundação, este processo representou significativo ganho na relação com a comunidade e no amadurecimento de sua forma de trabalho. Esse ganho se expressa pela quantidade de pessoas envolvidas, pela representatividade das comunidades e, sobretudo, pela qualidade da relação, em função do aumento do conhecimento mútuo e do fortalecimento da relação de parceria e confiança.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BNDES – Desenvolvimento Local. Zapata, Tânia (coord.). Cooperação Técnica do PNUD. Gestão Participativa para o Desenvolvimento Local. Recife, 2000. BOFF, Leonardo. O pecado maior do capitalismo: o risco do ecocídio e biocídio. http://www.leonardoboff.com/site/vista/outros/o-pecado.htm. Acesso em 28/04/14. Ministério do Trabalho e Emprego. O que é Economia Solidária http://www2.mte.gov.br/ecosolidaria/ecosolidaria_ oque.asp. Acesso em 28/04/14. Paludo, D; Klonowski, V. S. Estudo do impacto do uso de madeira de manguezal pela população extrativista e da possibilidade de reflorestamento e manejo dos recursos madeireiros. Barra de Mamanguape-PB. Caderno Nº. 16 - Série Recuperação, RBMA, 1999.

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FMA

FOTOS ACERVO FMA

Monitoramento da biota marinha é realizado pela FMA POR RAQUEL PASSOS

Com o propósito de melhor compreender as variáveis obtidas pelos monitoramentos ambientais e as relações com as atividades humanas, e assim poder estabelecer ações em prol da conservação e do desenvolvimento sustentável, a Fundação Mamíferos Aquáticos (FMA) criou o Núcleo de Estudo dos Efeitos Antropogênicos nos Recursos Marinhos (NEARM), que atualmente está situado em Aracaju (SE). Inserido no seu escopo de atuação está o Programa de Monitoramento de Biota, que inclui atividades como avistagem de biota e monitoramento de praias. No que tange às atividades de Monitoramento da Biota, desde 2013, a Fundação executa a Observação de Biota Marinha em uma parceria com o

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Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello (CENPES) da Petrobras no âmbito dos Projetos de Caracterização Regional da Bacia do Espírito Santo e norte da Bacia de Campos (PCR-ES/AMBES) e da Bacia de Sergipe-Alagoas (PCR-SEAL/MARSEAL). Em 2014, a FMA firmou convênio com o Instituto de Tecnologia e Pesquisa (ITP), denominado MAR, com o intuito de somar esforços em prol do desenvolvimento de ações ligadas ao monitoramento ambiental com tecnologia e alta qualidade. Assim, passa a também atuar nas atividades de caracterização ambiental da Unidade de Operações de Exploração e Produção de Sergipe e Alagoas (UO-SEAL) da Petrobras, desenvolvendo as observações de biota a bordo das sondas da referida Unidade.


Segundo a coordenadora técnica do Programa de Monitoramento da Biota Marinha, a bióloga Renata Guedes, trata-se de uma atividade que aprimora a coleta das informações da biota marinha associada às atividades de exploração e produção de óleo e gás natural. Além disso, o Programa promove o conhecimento técnico-científico nas produções de pesquisas multidisciplinares. “Essa atividade tem sua importância não só relacionada aos dados obtidos, os quais serão utilizados para pesquisas em prol da conservação, mas também no aperfeiçoamento de metodologias, para que possam ser replicadas e padronizadas, melhorando a qualidade das atividades”, coloca a coordenadora. O trabalho acontece diariamente. A bordo de sondas de perfuração em alto-mar, há uma equipe composta por profissionais do segmento ambiental, seja de Ciências Biológicas ou Oceanografia, que se tornam observadores e revezam a jornada de trabalho entre si. Eles realizam a atividade das 6h às 17h, por um período de 14 dias consecutivos e precisam ter experiência nos grupos biológicos a serem monitorados – aves, peixes, tartarugas e mamíferos marinhos. Além disso, também são registradas embarcações de pesca que utilizam as proximidades das sondas para suas atividades.

“Já a equipe em terra, além da formação acadêmica em diversas áreas, tais como Medicina Veterinária, Geoprocessamento, Gerenciamento, ainda conta com especialistas nos grupos biológicos, garantindo, assim, a qualidade dos dados gerados”, conclui Guedes. Ao passar por treinamentos básicos de segurança em plataforma e utilizar todos os Equipamentos de Proteção Individual (EPI) necessários (protetor solar, óculos de proteção, capacete, macacão, bota e protetor auricular), o observador de bordo fica apto a trabalhar embarcado. Em sua rotina, ele usa ferramentas como binóculo para auxiliar a detectar a espécie avistada, realiza registros de comportamento dos animais com máquina fotográfica e, por fim, preenche planilha de campo. É este documento que servirá para atualizar os dados a respeito da biota marinha frente à presença de sondas em atividade de perfuração para exploração de óleo e gás.

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De acordo com a diretora vice-presidente da FMA e coordenadora técnico-científica do ITP, Jociery Vergara-Parente, a precisão do trabalho impacta no desempenho de futuras produções. “Os resultados do Projeto de Avistagem da Biota Marinha geram conhecimento técnico-científico, produzindo informações para o aprimoramento dos processos de monitoramento, e ainda promove o controle e prevenção de possíveis impactos negativos decorrentes das atividades”, avalia Vergara-Parente. Ela completa que, por meio de publicações científicas, é possível implantar ações que visem a conservação não só das espécies monitoradas, mas também da fauna associada a elas. ALGUMAS ESPÉCIES ENCONTRADAS Até o momento, já foram registradas pela equipe espécies migratórias, como a ave bobo-pequeno (Puffinus puffinus) e a baleia-jubarte (Megaptera novaeangliae); também alguns organismos classificados segundo algum grau de ameaça, como as tartarugas marinhas e o albatroz-de-nariz-amarelo (Thalassarche chlororhynchos); espécies de rara ocorrência na região, como o tubarão baleia (Rhincodon typus); e outras cujo status de ameaça é insuficientemente conhecido, como o golfinhorotador (Stenella longirostris). Dentre os dados obtidos, a coordenadora do Projeto, Renata Guedes, destaca o lixo como fator relevante de degradação da biota marinha. “Encontramos sacola plástica na boca de uma espécie de um golfinho, conhecido como cabeça-de-melão (Peponocephala electra) e plásticos amarrados em patas de aves marinhas. Por isso que reforçamos a importância de ações que envolvam a problemática do lixo marinho”, finaliza.

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GPS

INDICAÇÕES TRATADO DE ANIMAIS SELVAGENS Esta obra é imprescindível não apenas ao médico veterinário que se dedica a essa especialidade, mas também ao clínico de pequenos animais que atende pacientes exóticos, como hamsters, papagaios, periquitos e tartarugas. Reúne informações inéditas e exclusivas, compartilhadas por 88 especialistas brasileiros e quatro convidados estrangeiros. O livro também é útil para epidemiologistas, microbiologistas e médicos veterinários sanitaristas, no contexto da compreensão do envolvimento dos animais selvagens no ciclo de zoonoses e doenças emergentes.

Autores: Catão-Dias, José Luiz; Cubas, Zalmir Silvino; Silva, Jean Carlos Ramos

FUNDAMENTOS DE OCEANOGRAFIA O livro aborda as principais questões relacionadas às Ciências do Mar, fornecendo base conceitual a diversas áreas do conhecimento. Os capítulos tratam, de modo independente, da história das Ciências do Mar, da estrutura e da dinâmica da Terra, além de temas relacionados à circulação atmosférica, oceanografia física clássica e processos litorâneos. Analisa os problemas e os benefícios das formas de vida no mar, discute a produção e o consumo de alimentos de origem marinha e traz uma abordagem ecológica sobre os organismos marinhos. O último capítulo versa sobre recursos marinhos e preocupações com o meio ambiente. Trata-se de uma obra interdisciplinar, organizada para estabelecer ligações entre os inúmeros campos de estudo relacionados, para enfatizar os principais conceitos das Ciências do Mar e, principalmente, destacar a importância do desenvolvimento de tais ciências para a manutenção da vida na Terra Autor: Tom Garrison

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eventos Programe-se para os eventos técnico-científicos previstos para 2014 nas áreas de Medicina Veterinária, Biologia, Ciências Biológicas, Ecologia e campos afins:

XI CONGRESO LATINOAMERICANO DE BOTÁNICA /LXV CONGRESSO NACIONAL DE BOTÂNICA Data: 19 a 24 de outubro de 2014 Local: Salvador (BA) www.65cnbot.com.br IV CONGRESSO BRASILEIRO DE OCEANOGRAFIA (CBO) Data: 25 a 29 de outubro de 2014 Local: Itajaí (SC) www.cbo2014.com/site A CONFERÊNCIA DA TERRA: FÓRUM INTERNACIONAL DO MEIO AMBIENTE Data: 12 a 15 de novembro de 2014 Local: João Pessoa (PB) www.conferenciadaterra.com IV CONGRESSO COLOMBIANO DE ZOOLOGIA Data: 01 a 05 de dezembro de 2014 Local: Colômbia www.congresocolombianozoologia.org/ 1º CONGRESSO BRASILEIRO DE DIREITO DO MAR Data: 03 a 05 de dezembro de 2014 Local: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo www.direitointernacional.org

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FOTO REFLEXÃO

FOTO U.S. GEOLOGICAL SURVEY - SIRENIA PROJECT Imagem enviada por Robert Bonde

O peixe-boi tem características peculiares quanto à procriação. Uma fêmea tem uma gestação que dura 13 meses. O período de amamentação é de cerca de dois anos. Ou seja, é preciso três a quatro anos para gerar uma nova vida, o que torna ainda mais delicado o trabalho de conservação da espécie. Neste processo da relação mãe-filhote, é preciso bastante atenção. O ambiente ideal para que a fêmea cuide do filho é aquele que tenha água calma e alimentos ricos em nutrientes que sejam de fácil acesso, ou seja, os estuários e regiões costeiras protegidas. É lá que elas buscam se reproduzir, parir e descansar. A conservação destas áreas costeiras é muito importante para a proteção da espécie.

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ILUSTRAÇÃO A cada edição, a Revista A Bordo traz ilustrações que abordem o universo do peixe-boi marinho e de seu habitat, como forma de reflexão sobre a importância da conservação do meio ambiente. Aproveite! Arte gentilmente cedida pelo artista plástico ambiental Alexandre Huber.

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FUNDAÇÃO MAMÍFEROS AQUÁTICOS Av. 17 de Agosto - 2001/1º andar Casa Forte - Recife - PE +55 (81) 3304 1443 | fma@mamiferosaquaticos.org.br www.mamiferosaquaticos.org.br | www.vivaopeixeboimarinho.org


Para saber mais sobre o Projeto Viva o Peixe-Boi Marinho, acesse: www.vivaopeixeboimarinho.org

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