Volume 14 Série DRS

Page 24

SÉRIE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL

Políticas Públicas, Atores Sociais e Desenvolvimento Territorial no Brasil

Cazella (2007) aponta uma dimensão dos processos participativos fundamental para se pensar seus limites, próxima à apontada por Abramovay et al. (2006b), mas identificando que os atores ausentes do processo deliberativo são outros. O autor trabalha com a hipótese de que as instituições promotoras do desenvolvimento rural, as organizações não governamentais e os movimentos sociais e sindicais: [...] concentram suas ações de forma prioritária nas categorias de agricultores familiares classificados como de maior renda e de renda média (...). As duas outras categorias (renda baixa e quase sem renda), que totalizam, respectivamente, quase 830 mil (17%) e dois milhões (39,5%) de agricultores familiares brasileiros, constituem o grupo social que Graziano da Silva (1999) denomina, apropriadamente, de 'sem sem": sem renda, terra, educação, saúde, ONG, sindicato, movimento social (CAZELLA, 2007: 226/227).

Ou seja, as operações formais de desenvolvimento rural e as políticas públicas que as sustentavam não estão incorporando uma parcela importante das populações que aparecem, em tese, como seu"público alvo", chamando a atenção para o fato de que a participação política demanda recursos, capacidade organizativa e legitimação social. Sayago (2007) também aponta algumas fragilidades dos conselhos, dentre elas o fato de que eles foram criados muito mais para atender às exigências legais do repasse de verbas e definição de seu uso do que para se constituir em espaços de reflexão sobre as problemáticas e potencialidades locais. Segundo a autora, nos municípios rurais pobres e com baixa densidade populacional, pouco se conseguiu impulsionar transformações locais. Outro aspecto apontado por ela é que os conselhos mostram fragilidades na articulação com outras institucionalidades e com atores fundamentais para o desenvolvimento rural territorial, caracterizando o processo como não democrático, centralizador e, em alguns casos, como legitimador das relações de poder já existentes. Há outras preocupações ainda que emanam da literatura a respeito da participação nos conselhos e dos conselhos no desenho das políticas de desenvolvimento. Beduschi e Abramovay, por exemplo, mostram que os conselhos têm uma "função setorial específica de elaboração de reivindicações e controle na execução de seu atendimento. São mediadores entre recursos federais voltados a uma finalidade predeterminada e às populações beneficiadas"(BEDUSCHI & ABRAMOVAY, 2003: 17). Des- se ponto de vista, pode-se dizer que eles funcionam como instâncias importantes de elaboração de demandas, embora, como assinalado acima, muitas vezes voltadas para aspectos pontuais e que não implicam necessariamente ações capazes de impulsionar processo de desenvolvimento. Essas análises convergem na direção de apontar uma forte tensão no desenho da política, principalmente na arquitetura dos mecanismos pelos quais ocorreriam processos de governança. Alguns dos estudos analisados nos permitem afirmar que

22


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.