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LIBERDADE ILUSÓRIA Para o psiquiatra Daniel, deixamos de viver uma era Edipiana, do “faço ou não faço”, para a Shakespeariana, na qual o maior conflito é o “ser ou não ser”. “Na adolescência, temos duas grandes fontes ansiogênicas: a sexualidade e a agressividade. Na fase adulta lidamos com outros fatores, como a independência emocional e financeira, a construção de uma família e a carreira. E a tendência é tentar achar a resposta fora, e não dentro de nós”, diz o médico. Todos esses aspectos apontados por Daniel foram e ainda são causas de grande angústia para Géssica Leonardo. A publicitária acredita que a ansiedade patológica é um elemento presente na sua atual geração. “É a forma que nos colocamos perante as nossas conquistas. Antes, a preocupação que tirava o sono eram as boas notas, depois passou a ser a aparência, hoje são as responsabilidades. A cobrança pessoal é muito grande para conquistar coisas que, na minha cabeça, todos os outros já alcançaram”, relata. A pressão imposta para atingir a perfeição não vem apenas da sociedade, mas internamente. Quando se vive na era da exposição, em que as mídias sociais estão constantemente escancarando os êxitos, mas nada das perdas, a grama do vizinho é sempre mais verde. “Se antigamente bastava uma faculdade, hoje você tem que ser o melhor aluno da melhor faculdade. Ao mesmo tempo em que estamos livres, somos muito cobrados para nos posicionarmos de determinadas maneiras. É uma liberdade ilusória. Se para ser livre eu ‘tenho que ser livre’, já deixa de ser liberdade. O correto é ‘eu quero ser’ e não ‘eu tenho que ser’”, observa a psicóloga Cláudia. Sair de casa, casar, ter filhos, fazer uma especialização, viajar para outros países, são alguns dos feitos que, comumente, significam sucesso. E a cobrança para a obtenção dessas proezas gera uma ansiedade muito grande. “Muitas pessoas não conseguem admitir que sofrem com isso. A ansiedade é tratada como frescura, não se entende como isso influencia a nossa vida, tanto física como psicologicamente. E como eu gostaria de agir diferente. A ansiedade é vista como uma característica da pessoa e não um problema”, lamenta Géssica. Hoje, a publicitária diz lidar muito bem com a sua condição, principalmente pelo autoconhecimento que possui. Isso não significa que deixou de ter suas noites de insônia ou suas preocupações exacerbadas perante novos desafios e decisões, mas procura seu ponto de equilíbrio em uma busca constante. “Aceito meu corpo, meu peso e me sinto bela assim. Como uma mulher feminista, minhas preocupações agora são outras, e me cobro muito para me posicionar desta forma”. A primeira etapa foi concluída: permitir-se olhar para si mesma, conforme orienta Cláudia. “Primeiramente, é importante entender que se amar, se respeitar e se colocar em primeiro lugar não é egoísmo. Eu posso ser livre e não preciso aceitar tudo o que estão me impondo”, aconselha a psicóloga.

ESPECIAL

Apesar da grande evolução na medicina, ainda falta um olhar mais delicado para os transtornos mentais. Um bom exemplo aconteceu com Géssica que, na infância, tinha verdadeiro pavor em dias de prova. Não dormia, sentia palpitações, não conseguia se concentrar, tudo tratado como mera desatenção e nervosismo. Até uma professora identificar que poderia ser algo mais. “Ela chamou minha mãe e disse que eu entendia todo o conteúdo, executava em sala de aula, mas na hora da prova, não conseguia resolver as questões. Foi quando comecei com a psicoterapia”, recorda.

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