Portanto, em 1341 a Ordem comprometeu-se a voltar a dar aos pescadores a redízima, como já era costume antigo. Mas a expressão Corpo Santo só em 1415 está documentada em Setúbal (FONSECA, 2012: 122). É o hospital do Corpo Santo, que nesse ano solicita ao rei confirmação de uma carta de 11.2.1397 que concedera privilégios aos mareantes de Setúbal.6 A confraria do Corpo Santo, com este nome, só está documentada ainda mais tarde. Portanto, a confraria não existia em 1274, nem teve compromisso em 1340. O que existia era um colectivo, “os pescadores” ou “os mareantes” de Setúbal, a quem o rei reconhecia categoria jurídica, porque lhe enviava diplomas legislativos e concedia privilégios. Uma confraria pode viver muito tempo sem estatutos aprovados. Nos últimos anos do séc. XV ou nos primeiros do XVI, os pescadores dos acedares de Setúbal separaram-se da confraria do Corpo Santo e formaram uma confraria própria, a de Santo Estêvão. Nos primeiros anos do séc. XVI já a de Santo Estêvão se sentiu tão importante que suscitou um conflito de precedências. Em 22.6.1510 D. Jorge, Mestre de Santiago, sentenciou um pleito entre os mordomos e confrades do Corpo Santo e os mordomos e confrades de Santo Estêvão, sobre qual das confrarias teria precedência nas procissões.7 Segundo a visitação efectuada a Setúbal em 1552, pelo prior-mor do convento de Palmela e da Ordem de Santiago, a confraria do Corpo Santo não tinha compromisso.8 A de Santo Estêvão não tinha compromisso, nem livro de contas, nem livro de confrades.9 Conclusão
Os pescadores de Sesimbra construíram, entre 1488 e 1492, o seu hospital do Espírito Santo, com uma capela anexa, e nesse hospital tinham, segundo a Visitação de 1516, uma confraria do Corpo Santo. O regimento de 1563 sugere que haveria três confrarias marítimas: Corpo Santo, Espírito Santo e Corpo de Deus. A do Corpo de Deus não voltou a estar documentada. A confraria dos pescadores e mareantes de Sesimbra é dita, na documentação posterior, indiferentemente, do Corpo Santo ou do Espírito Santo, e acabará por prevalecer a invocação do Espírito Santo. Para interpretar o regimento de 1563 torna-se necessário recorrer a documentos de outras povoações marítimas, com confrarias semelhantes. Estes mostram que havia apenas uma, principal, a do Corpo Santo, que tinha um hospital, do Espírito Santo, com confraria própria. A do Corpo de Deus seria também organizada dentro da confraria do Corpo Santo para tratar da festa do Corpo de Deus. A confraria do Corpo Santo tinha um hospital com invocação diferente (Espírito Santo), o que é muito raro; em quase todas as povoações marítimas a invocação era a mesma. Como já havia junto ao castelo uma albergaria do Espírito Santo e uma confraria do Espírito Santo, os pescadores deram o mesmo nome ao seu hospital. A confraria dos pescadores e mareantes de Sesimbra, que se julga datar de finais do séc. XV, pode ser muito mais antiga. Em todas as povoações marítimas, antes de aparecerem as confrarias legalizadas, com estatutos aprovados, já existia um colectivo, por vezes chamado “Común” em Espanha e “Prud’homie” em