95 Revista Croma, Estudos Artísticos. ISSN 2182-8547, e-ISSN 2182-8717. Vol. 1 (2): pp. 92-98.
geográfica, seu desaparecimento em uma dobra temporal. Por um lado, um hiato de sua presença, por outro, uma espécie de ubiqüidade no tempo, um tipo de morte. Na criação também temos essa presença que é um espalhamento, que permeia aquilo que não se vê, ou da qual assinalamos apenas seus vestígios. Em “O Globo da morte de tudo” (Figuras 3 e 4), Nuno Ramos e Eduardo Climachauska nos apresentam dois globos da morte — daqueles utilizados em espetáculos de circo — com uma interseção de 60 centímetros entre eles, formando, como explica Nuno, “um oito tombado, o símbolo do infinito.” Dentro de cada um, uma motocicleta. Enquanto um deles toca o chão da galeria, o outro eleva-se a aproximadamente dois metros de altura. Esses globos ocupam o interior de uma “arena” ou de uma grande estante, quatro paredes de prateleiras em aço, com seis metros de altura cada, que estão conectadas aos globos por estruturas tubulares e que formam como que uma sala de exposição dentro da original. As prateleiras exibem mais de 1.500 objetos diversos, comprados e coletados pelos artistas nos 6 meses que antecederam a exposição. Cada parede determina uma categoria e um líquido correspondente distribuído em copos, cálices, taças pelas prateleiras: “cerveja”, com objetos da vida cotidiana e um líquido amarelo; “nanquim”, objetos ligados à morte e um líquido preto; “porcelana”, objetos associados ao luxo e uma mistura de talco e água; e “cerâmica”, fazendo referência às coisas arcaicas e ancestrais, e barro diluído. Além disso, todas as prateleiras contam com lâminas de vidros, que apóiam ou equilibram os objetos e vice-versa, formando, como explicita o texto da galeria, “um frágil equilíbrio, em um forte contraste com a presença agressiva dos dois globos”. O trabalho tem, por assim dizer, seu primeiro momento. No entanto, e mais uma vez, as categorias precisam ser misturadas. As motocicletas encarnam esse papel de motor da mudança. A performance de profissionais circenses com as motocicletas no interior dos globos marca a passagem para o segundo momento do trabalho. Toda a ação é registrada em vídeo (Homem de Lata Filmes, 2012). Circundar o globo, mesmo que por dentro, é retomar o exercício de queda, de vertigem, de desorientação, de movimento perpétuo. Exercício esse que chacoalha todo o mundo conhecido, catalogado, enfileirado, distribuído, desmantelando as fronteiras entre categorias, materiais, cores, ritmos, etc. Novamente, diante de todo cálculo, é o imprevisível que toma o primeiro plano. Por menos de um minuto, toda estrutura torce e retorce cada vez mais com os giros das motos, como se ameaçasse ruir — oferecendo risco e danos reais às pessoas da restrita platéia como também ao prédio. Ao som de um apito — o sinal combinado — as motos cessam o frenesi, o