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Jornal de Estudo

Jornal Laboratório da Faculdade de Comunicação da UFJF | Juiz de Fora, Novembro de 2008 | Ano 43 | Nº 195

Política pág. 10

Conselhos Municipais se articulam para cobrar compromissos de Custódio Conselheiros exigem reunião com novo prefeito e estão prontos para cobrar a poromessa de maior participação popular na nova administração. A partir de 2009, a cultura também vai se juntar aos órgãos com representantes eleitos pela classe artística. Cláudia Oliveira

Esporte pág.10 Estádio de Juiz de Fora completa vinte anos Desde 1988 o campo de futebol é referência do esporte na cidade. Idealizadores e jornalistas da época contam um pouco dessa história e da trajetória do radialista Mário Helênio, que dá nome ao local.

Cultura pág.12 Cidade pág. 4 Liberação de 100 permissões podem acabar com a falta de táxi em JF

Eventos multiculturais invadem circuito artístico da cidade Grafite, moda, cinema, teatro, música, artes plásticas, fotografia e literatura se reúnem na noite de Juiz de Fora.

Especial pág. 6 e 7 Vivendo com a morte

Termo assinado entre o Ministério Público e a Prefeitura também estabelece novas regras relativas às condições dos veículos. As novas medidas já causam discussão entre a A rotina de quem trabalha com os mortos revela histórias Associação e o Sindicato dos Taxistas. curiosas e experiências surpreendentes.

Pesquisa pág. 8 Alunos do ensino médio estudam o bullying Apoiados pelo professor Anderson Ferrari, do Colégio João XXIII, os jovens pesquisadores elaboraram formas de avaliar a intensidade das agressões verbais sofridas no ambiente escolar. Bullying – O Desafio do Combate à Discriminação na Escola recebeu menção honrosa na 5ª Mostra Científica da UFJF.


2 Opinião

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Editorial

Artigo

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izem que a única certeza que temos na vida é a morte. Já que novembro é o mês em que celebramos o Dia de Finados, o Jornal de Estudo traz uma matéria especial sobre a morte e sobre como as pessoas lidam com esse momento difícil. Os planos funerários fazem de tudo para cativar clientes, que podem, inclusive, escolher seu próprio modelo de seu caixão. Histórias curiosas sobre esse assunto são muitas. O leitor ficará sabendo, por exemplo, como pode descobrir a sua data de falecimento. Fim das eleições municipais, Juiz de Fora conhece agora seu novo prefeito. Custódio Matos (PSDB) assumiu compromissos com várias lideranças e prometeu dar atenção à saúde com a construção de um hospital na Zona Norte. Nesse momento, Conselhos Municipais se organizam para cobrar do tucano seus acordos assumidos. A pesquisa se configura como grande preocupação da Universidade. Nessa edição apresentamos um estudo sobre bullying, desenvolvido por um professor da UFJF no Colégio de Aplicação João XXIII, com o objetivo de tolher práticas discriminatórias nos colégios. As humilhações sofridas pelos estudantes podem gerar traumas psicológicos. Um ponto polêmico na vida universitária é a fotocópia. Dúvidas relativas à legislação são muitas. A boa notícia é proposta inédita da Editora da UFJF em amenizar o problema enfrentado pelos estudantes. O debate inclui a disponibização gratuita de obras pelos autores na rede mundial de computadores. A edição de novembro também deixa o leitor por dentro das novas regras propostas pelo Ministério Público para aumentar e melhorar a frota de táxi na cidade. As mudanças dividem opiniões entre os taxistas. Outro destaque da edição são as festas multiculturais que acontecem na cidade e atraem muitos universitários. Além de músicas alternativas os eventos oferecem ambiente temático, que dão um ar único à noite. Mulheres no Volante, Quitanda Cultural e Vitrine Musical são alguns exemplos de festas que unem cultura e movimento social em uma mesma balada. Boa leitura.

Arte de Guilherme Fernandes sobre foto de Thais Torres

Expediente Jornal Laboratório da Faculdade de Comunicação Social da Universidade Federal de Juiz de Fora

No fundo das aparências

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Guilherme Fernandes

m face à sociedade do espetáculo em que estamos inseridos e à liquidez que tomou conta do mundo pós-moderno, as relações sociais estão cada vez mais frouxas. Os laços que unem uns aos outros são instáveis, fruto de uma relação de interesses unicamente pessoais. As pessoas se aproximam das outras para satisfazer seus desejos e desfalecer suas angústias. Essa tem sido uma das preocupações de grandes teóricos, entre eles o polonês Zygmunt Bauman. Para ele a modernidade líquida gera um medo, em que o ser humano não consegue mais acreditar no outro. Não existe, assim, confiança, característica fundamental para estabelecer laços afetivos. O ato de se apaixonar e se desapaixonar tornou-se efêmero, a tal ponto que não é mais possível estabelecer relações concretas e duradouras. O carinho, a compreensão e o respeito estão desaparecendo. As pessoas têm medo de amar, de lutar e de ser felizes. Escondem-se seus sentimentos através de uma máscara. A cada relação amorosa uma nova ferida emerge e a cicatrização é cada vez mais difícil. Surge, nesse ínterim, as novas tecnologias da comunicação e a internet faz-se presente, e o amor deixa de ser real e carnal e passa a ser virtual. A era tecnológica trouxe uma revolução nos meios de comunicação. Basta uma webcam ligada no espaço de bate papo virtual para podermos estabelecer contatos com o mundo todo, vendo e sendo visto. O sentimento pode ser projetado em uma tela de computador. Certamente, assim, restam menos feridas, as dores são menores e o sentimento se vai com um simples fechar de janela. Porém o virtual nem sempre consegue suprir as necessidades humanas. Assim, buscas desenfreadas por parceiros sexuais acontecem para a obtenção do prazer instantâneo. O suingue surge como alternativa para casais que querem enfrentar o espectro da incerteza e viver a inteireza da atividade sexual sem maiores preocupações morais. Afinal já que foi de comum acordo, o que há de errado nisso? O sociólogo polonês pondera que o homo sexualis está condenado a permanecer para sempre incompleto e irrealizado. Isso advém do fato da união de corpos hoje não significar compromisso, caracterizando um simples episódio. O físico não é caminho para a metafísica. E viver um amor espiritual tornou-se raro. Sem estabelecer juízo de valor, recorro aos clássicos da literatura. Quem nunca pensou em viver um amor descrito por Camões ou ser a Moreninha de Joaquim Manuel de Macedo? No entanto, o que se vê são Bentinhos de Machado de Assis, que não conseguem viver a inteireza do amor em virtude da desconfiança. Se ele estava certo ou errado não sabemos, mas, por vaidade ele fez com que sua vida ruísse. Um exemplo do século XIX para explicar a sociedade atual. Pode parecer estranho, porém o comportamento do personagem mostra claramente o amor na era líquida. Para Bauman, o convívio com o outro está destruído. Em virtude de uma identidade frágil e instável, em um fluxo de euforia intensa, fragmentada e desconexa na qual, o ser humano se desintegrou e ficou atado pela aparência pessoal. É assim que as relações amorosas são construídas e posteriormente destruídas, confirmando a liquidez e o jogo de interesses do mundo do espetáculo e da boa aparência. Porém nem tudo está perdido. Cabe a nós mudarmos isso. Se confiarmos em nós mesmos e não nos preocuparmos com o mundo das aparências, poderemos vencer a modernidade líquida. Voltar ao século XVI de Camões e ao início do século XIX de Joaquim Manuel de Macedo não é possível. Todavia, não precisamos adotar o comportamento de Bentinho em pleno século XXI. Cabe a nós perguntarmos se queremos continuar vivendo o amor líquido e aventurar-nos no jogo das aparências.

Publicação produzida pelos alunos do 6º período do curso diurno e do 8º período do curso noturno da disciplina Técnica de Produção em Jornalismo Impresso

Reitor: Prof. Dr. Henrique Duque de Miranda Chaves Filho Vice-Reitor: Prof. Dr. José Luiz Rezende Pereira Diretora da Faculdade de Comunicação: Profª. Drª. Marise Pimentel Mendes Vice-Diretor da Faculdade de Comunicação: Prof. Dr. Potiguara Mendes da Silveira Coordenador da Faculdade de Comunicação diurno: Prof. Ms. Álvaro Americano Coordenadora da Faculdade de Comunicação noturno: Profª. Drª. Maria Cristina Brandão Chefe do Dept. de Jornalismo: Profª. Drª. Iluska Maria da Silva Coutinho Professoras orientadoras: Profª. Ms. Alice Gonçalves Arcuri, Profª. Ms. Diana Souza, Profª Fernanda Pires Alvarenga Fernandes

Editores: Guilherme Fernandes e Rodrigo Pedrotti Projeto Gráfico: Karolina Vargas e Poliana Cabral Monitoria: Ana Carolina Serpa Reportagem e Diagramação: Álvaro Dyogo, Cláudia Oliveira, David Gomes, Diogo Mendes, Fabricio Werneck, Flaviane Paiva, Francislene de Paula, Gihana Fava, Gustavo Dore, Ivanna Aguiar de Castro, Jaqueline Harumi Ishikawa, Laila Hallack, Livia Mautoni, Ludyane Agostini, Marcelo Martins, Marcello Machado, Michelle Clara, Patrícia Mendes, Priscila Lima, Naissa Viana, Natália Rangel, Ranan Caixeiro, Thais Torres, Wagner Emerick. Tiragem: 1.000 exemplares Endereço: Campus Universitário de Martelos, s/n – Bairro Martelos 36036-900 Telefones: (32) 2102-3601 / 2102-3602

Rogério Terra


Campus 3

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PÓS-GRADUAÇÃO

Mais investimento permite novos rumos da pós na UFJF

Aumento do número de cursos e pesquisas traz visibilidade à instituição e oportunidades aos alunos Alexandre Dornellas

Jaqueline Harumi Naissa Viana Marcelo Martins

Cultura de visibilidade

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os últimos dois anos, foram criados 28 cursos de pós-graduação na UFJF: seis doutorados, seis mestrados e 17 especializações. Com os novos cursos a universidade passa a ter nove programas de doutorado, 22 de mestrado e 55 de especialização. São o dobro de alunos e projetos de desenvolvimento à vista. Os resultados e perspectivas foram tema do I Seminário de Avaliação da Pós-Graduação ocorrido nos dias 6 e 7. O Pró-Reitor de Pós-Graduação, Luiz Carlos Ferreira, afirma ter tido condições de “ trabalhar neste sentido”. A coordenadora de Pós-Graduação Strictu Sensu, Maria Tereza Freitas, é adepta da premissa de que valorizar a pós só tem a trazer benefícios para a instituição. “É uma produção de conhecimento novo. Todo professor da pós-graduação precisa ser pesquisador, sem isso ele não pode pertencer à docência da pós. A Capes [Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior], que organiza e coordena os mestrados e doutorados, exige que mestrandos e doutorandos publiquem. A visibilidade que a universidade tem é possível à medida que esse conhecimento é divulgado”, explica. São muitas as exigências para a manutenção da pós-graduação. As pesquisas têm que estar ligadas a agências de fomento e seus pesquisadores devem apresentar produtos e relatórios, além de publicar, apresentar trabalhos e participar de eventos. Todos os anos, há uma avaliação dos Programas de Pós-Graduação (PPGs) e, de 3 em 3 anos, a Capes avalia a produtividade e a qualidade dos programas nas instituições (devendo variar de nível 3 a 7, só podendo ter doutorado quando acima de 4). Apesar dos requisitos, a universidade, que teve em 1989 o primeiro PPG, em menos de nove anos (19982007) elevou o número de dissertações e teses defendidas de 22 para 222. As previsões de crescimento na área não param por aí. Com o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), a UFJF expande as vagas docentes. Com mais professores, a pós também se beneficia. Além do quadro docente, o Reuni fornecerá bolsas para mestrandos e doutorandos. Novidades que afetarão positivamente a pós, segundo Maria Tereza. Um ‘up’ na graduação A geração de verba que a pós proporciona para a instituição é um fator relevante. As pesquisas são financiadas e os professores convertem esse capital em equipamentos e livros. O

Henrique Duque investe em pós-graduação, mas professores pedem mais investimento anual da UFJF destinado à pós-graduação é de R$ 1,01 milhão. Nos últimos três anos, a pós-graduação, através de bolsas de agências de fomento e projetos (aprovados, em execução e/ou término recente) de seus professores, obteve R$ 10 milhões. Além disso, a Capes dá bolsa para alunos e o Programa de Apoio a PósGraduação (Proap) ajuda a manter os cursos, investindo em infra-estrutura, trazendo professores de fora e financiando a participação em eventos. Maria Tereza deixa claro que esses investimentos são para a UFJF e “com certeza é um grande auxílio à instituição”. Pós como alternativa Ao concluir a graduação, mui-

tos temem o desemprego, alguns já têm trabalho garantido e outros decidem continuar no meio acadêmico. Sthéphanie Lyanie fez a última opção. “A pós-graduação traz novos conhecimentos de outras áreas que não tivemos oportunidade de ver na graduação”, explica. Formada em Comunicação Social pela UFJF, Stéphanie faz MBA em Administração de Marketing, na Escola de Negócios da Faculdade de Economia e Administração (FEA). Além das oportunidades no curso, ela já tem colhido os resultados no mercado de trabalho. “Minhas chances aumentaram muito nos processos trainees de grandes empresas brasileiras. De 11 que tentei, só quatro empresas rejeitaram meu currículo”, enfatiza.

Evolução da Pós-Graduação na UFJF

O I Seminário de Avaliação da PósGraduação mostra uma instituição que avançou, mas que precisa melhorar em alguns pontos: • ausência de fortalecimento dos cursos afeta a qualidade da graduação; • calendário (acadêmico e financeiro) não leva em consideração os PPGs; • promoção de relações internacionais, rotinas de gestão e registro acadêmico nasceram em função da graduação e ainda não desconsideram especificidades dos PPGs; • a universidade fecha durante o vestibular e o recesso e desconsidera prazos de titulação e Coleta-Capes. O apoio ao estudante de pós acaba incoerente (não há RU no período); • resoluções e portarias da UFJF desconsideram carga horária e alocação de vagas para os PPGs; • aposentadoria potencializa a carência de professores; • corpo de funcionários técnico-administrativos com pouco conhecimento sobre a pós; • ausência de mecanismo de suporte para eventos relacionados; • obsolescência da biblioteca; • Editora da UFJF não atende às demandas de publicação acadêmica; • baixa autonomia na gestão; • entrave na promoção de convênios; • difícil manutenção de professores visitantes no quadro docente; • falta de estímulo interno à produtividade docente e discente; • deficiência nos mecanismos de apoio ao registro de patentes.

EMPREENDEDORISMO

Semana Global em JF

Evento estimulou jovens a empreender com palestras e Desafio dos R$5 Jaqueline Harumi Marcelo Martins Alunos, funcionários e professores aprenderam como botar pra fazer, ouvindo empresários de sucesso da cidade nos dias 20 e 21. O evento fez parte da Semana Global do Empreendedorismo e aconteceu no Anfiteatro de Engenharia da UFJF. Outra atividade que estimulou o espírito empreendedor foi o Desafio dos R$5, que aconteceu no país todo. A coordenadora geral da Semana,

Tatiana de Paiva Maestri, falou com entusiasmo sobre o desafio. “Foi um primeiro contato com uma atividade que estimulou competências inerentes ao empreendedorismo. Ele motivou os participantes a levarem suas idéias adiante.” O Desafio dos R$5 consistiu em avaliar a criatividade e a inovação de cada equipe para ganhar muito mais. Sete equipes de até cinco universitários participaram da atividade. No Brasil, a Semana Global foi organizado pela Confederação Brasileira de Empresas Juniores e foi realizada nos estados: Bahia, Cea-

rá, Distrito Federal, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e São Paulo. Ela começou no dia 17 e terminou no dia 23. História da Semana A Semana Global do Empreededorismo começou na Inglaterra em 2004. Seu objetivo era desenvolver atividades que inspirassem as pessoas a ter mais atitude e serem protagonistas de suas histórias. Este ano, 60 países se sensibilizaram pela causa. Pela primeira vez, o evento aconteceu simultaneamente no mundo todo.


4 Cidade

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TRANSPORTE

Novas regras dividem taxistas Prefeitura analisa termo proposto pelo Ministério Público para aumentar e melhorar qualidade da frota Diogo Mendes Fabricio Werneck Diogo Mendes

Protesto promovido pelo Sindicato dos Taxistas contras as mudanças do TAC

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uizforanos reclamam da falta de táxi quando chove, em horários de pico ou quando algum grande evento chega à cidade. E isso tende a piorar com a proximidade do Natal e o aumento do número de passageiros. Outros reclamam das más condições dos veículos e das dificuldades para subir as ladeiras da cidade. Para tentar amenizar esses problemas, o Ministério Público Estadual (MPE) e a Prefeitura assinaram no dia 17 de novembro, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). O documento inclui a liberação de 100 novas permissões e regulamentações para os veículos. Porém, as duas entidades que representam a categoria na cidade, o Sindicato dos Taxistas e a Associação dos Taxistas, divergem entre si sobre diversos pontos do termo. A liberação das novas permissões vai aumentar o número de táxis nas ruas para 533, cumprindo a Lei 6.612/84 que estabelece a circulação

de um veículo para cada mil habitantes. Segundo o último levantamento do IBGE, Juiz de Fora tem, hoje, cerca de 520 mil habitantes. Desde 1982, não eram concedidas novas permissões. Novas exigências As novas regras para a categoria exigem veículos com quatro portas, porta-malas com capacidade mínima de 290 litros e potência mínima do motor de 1.6 cilindradas. Além disso, passa a ser exigido que todos os motoristas de táxi, utilizem uniforme padrão. O tempo de utilização de cada veículo também vai sofrer modificação. O TAC reduz a vida útil do carro de 13 para oito anos, com vistorias anuais durante os dois primeiros e semestrais em seguida. Os permissionários vão ter prazo improrrogável de um ano para se adequar às novas regras. A exceção contempla apenas aqueles que

receberam descontos em financiamentos e não podem vender o carro antes de dois anos. A fiscalização dos veículos será feita pela Gettran. O TAC prevê multa de R$ 1 mil reais para a Prefeitura por cada cláusula descumprida Mudança na lei Um projeto de lei, aprovado pela Câmara e promulgado no dia 28 de outubro, acirrou a discussão entre a associação e o sindicato. De autoria do vereador Luiz Otávio Fernandes Coelho (Pardal - PTB), o texto revoga o artigo 9º, inciso VIII, da Lei 6.612/84, que afirma que o permissionário que deixar de exercer, efetivamente, a atividade de taxista, pode perder a sua autorização. O vereador declara acompanhar a situação dos taxistas, além de ter recebido um pedido do sindicato para a criação da lei. “No meu bairro, um permissionário faleceu e sua esposa levou mais de um ano para transferir a permissão. Conseguiu apenas com um mandado judicial”, afirma. Pardal acredita que a revogação do artigo vai facilitar a transferência da permissão para cônjuges ou herdeiros, o que já é previsto pela Lei Municipal que regula a atividade. Porém, o art. 175 da Constituição de 1988 não permite a tranferência de permissões ou concessões sem que haja nova licitação. Logo, a Lei Orgância Municipal deve recepcionar o conteúdo da Carta Federal. Apenas o sindicato concorda com a proposta de Pardal. A associação declarou não ter sido ouvida em nenhum momento e que o projeto de lei incentiva a exploração dos auxiliares pelos donos das licenças. A instituição é a favor de que, em caso de morte ou

invalidez dos permissionários, ocorra novo concurso público para repassar as licenças, conforme determina a Constituição. O vereador afirmou que a Câmara não precisa ouvir nenhuma entidade para elaborar seus projetos e que a associação está pensando apenas no interesse dos auxiliares. O projeto de lei foi, inicialmente, apresentado à Câmara que aprovou o conteúdo. Porém, o prefeito José Eduardo Araújo (PR) vetou a proposta que retornou para análise do legislativo. Com maioria absoluta, os vereadores derrubaram o veto do executivo. A proposta ainda levanta a questão da formação de frotas, mas Pardal não acredita na possibilidade. “Se existe deve ser apurado. Cabe ao Executivo, através da Gettran, fiscalizar”, encerra.

Protesto

Desde o dia 6 de novembro, alguns táxis da cidade circulam com uma fita preta na antena. Parte dos taxistas protestam contra a assinatura do TAC e a falta de diálogo com os taxistas. Outra causa da manifestação é uma mensagem do Executivo que tramita na Câmara e propõe alteração na lei que regulamenta a atividade na cidade. A proposta foi motivada pela Lei Federal 8.987/95 que determina que todas as permissões públicas sem validade determinada serão finalizadas em 31 de dezembro de 2010. Se aprovada pelos vereadores, todas as permissões existentes hoje no município permaneceriam em vigor até o mesmo prazo, sendo realizada licitação para nova outorga. Os taxistas temem não conseguir renovar suas licenças.

Sindicato e Associação dos Taxistas em lados opostos O Sindicato dos Taxistas possui cerca de cem afiliados, a maioria deles permissionários. Fundado na década de 70, o sindicato não concorda com o aumento da frota. Para Fagundes, as 100 novas permissões podem prejudicar a renda dos taxistas. “Estão exigindo maior qualidade e ao mesmo tempo, o maior número de carros pode diminuir nosso faturamento”, relata. Já a Associação dos Taxistas conta com 60 afiliados, a maioria auxiliares. Criada em 1997 após divergências dentro do sindicato, a instituição concorda com o aumento do número de táxis. A prefeitura dilvulgou, inicialmente, a liberação de 67 novas permissões e em seguida, elevou esse número para 100. “A concessão de mais permissões vai ser ainda melhor para diminuir a falta de táxis em alguns pontos da cidade”, garante. Para Nunes, o concurso público para entrega das licenças ainda deve garantir pontuação extra àqueles que já são auxiliares.

Divergências A discussão entre os dois órgãos que representam a classe se acentua quando o assunto é a conservação e a adequação dos carros. O sindicato discorda do aumento da potência do motor para 1.6 cilindradas. Fagundes acredita que os veículos novos 1.0 ou 1.4 conseguem subir os aclives da cidade. “Os veículos que não sobem as ladeiras são aqueles que possuem kitgás e os motoristas já estão deixando o equipamento de lado porque não é vantajoso”. Já a associação, é a favor do aumento da potência. O sindicato também é contra a redução da vida útil dos carros de 13 para oito anos. “Achamos que deve ser reduzido para dez anos, com vistoria anual durante os primeiros oito anos e trimestral durante os dois últimos”, opina Fagundes. Já para o presidente da associação, o taxista que não tiver como trocar de carro a cada oito anos tem que sair do ramo. “O motorista

tem que perceber que, trocando o carro a cada oito anos, seus gastos são menores”, diz Nunes. A associação defende a distribuição de um novo táxi para cada ponto da cidade. “Foi a associação que fez essa sugestão há mais de um ano ao Ministério Público”, afirma o presidente da entidade. Já o sindicato propõe outra divisão. “Entendemos que os novos carros deveriam ser colocados em novos pontos, ou ainda em bairros que possuam poucos táxis. Mas não na área central como foi proposto”, argumenta Aparecido. O sindicato ainda alega a falta de um estudo específico do trânsito de Juiz de Fora que sustente o aumento da frota e a distribuição dos novos veículos defendidos pela Prefeitura. Reajuste Tanto o Sindicato quanto a Associação concordam com a necessidade de aumento na tarifa. Como o TAC foi

proposto pela Promotoria de Defesa do Consumidor, o reajuste não entrou em pauta. “Não adianta exigirem qualidade do serviço se eu não tenho uma tarifa compatível para adequar o carro”, opina Fagundes a favor do aumento. A Promotoria declarou que o reajuste deve ser tratado entre a Prefeitura e as entidades. O presidente da associação também concorda que o valor cobrado está defasado. “Hoje, não temos uma tarifa suficiente para manter o táxi e realizar as alterações propostas. Para atender a estas necessidades, o reajuste teria que ser de no mínimo 12%”, acredita Nunes. O último reajuste na tarifa ocorreu em fevereiro de 2006. Na época, a tarifa subiu 9,5%. Segundo o sindicato, neste ano, três reivindicações de reajuste foram encaminhadas à Prefeitura, mas nenhum aumento foi concedido pelos técnicos da administração municipal que avaliaram os pedidos.


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DESAFIOS

Custódio diz que vai se espelhar na participação popular do PT Conselhos Municipais se organizam para cobrar compromissos e pretendem ampliar sua influência Gihana Fava Laila Hallack Ludyane Agostini

Acredito na proposta do PT de participação popular e de diminuição das desigualdades sociais. Quem acompanhou meu mandato sabe que procuro ter diálogo com todos, vou trabalhar mais essa questão.” A fala do novo prefeito em entrevista coletiva após sua vitória representa a típica disputa entre PSDB e PT. O tucano Custódio Mattos demonstra ter consciência do desafio que irá enfrentar, já que alguns setores da sociedade começaram a questionar como a próxima administração vai considerar as reinvidicações populares. Essa discussão ganhou espaço nos Conselhos Municipais desde o início da disputa eleitoral. Ainda no primeiro turno, os 12 conselhos de Juiz de Fora formularam um documento que foi assinado por todos os seis candidatos. O Termo de Compromisso em Defesa da Gestão Participativa das Políticas Públicas apresenta as principais demandas dos setores que os conselhos representam. Compromisso assumido Neste mês, os conselhos se reuniram pela primeira vez após as eleições. No dia 6, foi realizado um debate sobre como será feita a cobrança do compromisso assumido pelo prefeito eleito. O presidente do Conselho Municipal da Criança e do Adolescente, Lindomar José da Silva, acredita na influência do documento. “O acordo não está registrado em cartório, mas é um compromisso público.” Por outro lado, o cientista político, Cristiano Batista dos Santos, avalia de forma negativa o fato de Custódio ter assumido compromisso com muitos setores quando ainda era candidato. “Isso é o menos importante, o que ele realmente precisa é efetivamente dar uma resposta aos conselhos”, argumenta. Caso isso não aconteça, as estratégias para cobrá-lo já são preparadas. “Custódio pode até voltar atrás, mas temos a assinatura dele e não vai ficar bem romper com o que ele se comprometeu publicamente”, alerta Lindomar da Silva. Voz participativa Nos últimos quatro anos, os Conselhos Municipais eram submetidos ao poder executivo, por meio de representantes que estavam associados diretamente à Prefeitura. Atualmente, são realizadas conferências de cada conselho para que as pessoas ligadas à área em que eles atuam participem das discussões. “O próprio conselho é a participação popular, mas ele precisa

se articular para que possa fazer valer sua proposta”, defende a secretária do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, Valéria Andrade. De acordo com o representante do Conselho do Idoso, Webert Machado, a sociedade ainda não reconhece que os conselhos existem para fiscalizar e participar das políticas públicas do município. “A consciência tem que vir dos dois lados, tanto da população quanto dos líderes públicos.” Nesse sentido, Valéria aponta como solução o fortalecimento da união dos conselhos. “Sem ela não vamos conseguir ser ouvidos, nem conhecidos.” Expectativa Um dos maiores desafios para o próximo governo é elaborar um orçamento para o município, que conside-

re a dívida da Prefeitura e, ao mesmo tempo, atenda às demandas da cidade. Os conselhos terão papel fundamental no processo de aprovação do orçamento que será proposto. “Queremos que ele seja feito com nossa participação, mas minha preocupação é que entidades ou pessoas sejam privilegiadas para apoiar ações do governo”, teme Valéria. Além da expectativa sobre os rumos do dinheiro público, os conselheiros aguardam a definição dos nomes que assumirão cargos estratégicos. Para a maioria deles, a relação do órgão com a Prefeitura pode variar dependendo de quem estiver na administração. Por enquanto, apenas alguns rumores surgem. “Não assumi compromisso com nenhuma pessoa, não prometi nenhum cargo”, enfatiza

o prefeito eleito. Mas Cristiano Batista dos Santos aponta que se eleger com apoio de 11 partidos pode ser um problema para Custódio. “Qual foi a conversa com os partidos? Esse pessoal vai cobrar e isso pode representar um inchaço da máquina pública, o que agrava as dívidas”, prevê o cientista político. Os representantes dos conselhos admitem que a falta de recursos pode prejudicar o cumprimento de alguns pontos do acordo. Por isso, explica a presidente do Conselho de Combate à Fome, Bettina Koyro, estão se articulando para cobrar e acompanhar as medidas do novo prefeito. “Reconhecemos as dificuldades, mas como o Custódio foi Secretário de Políticas Sociais do estado, espero que tenha uma veia aberta para essas questões.” Laila Hallack

Em reunião, conselheiros assinaram documento exigindo encontro com o prefeito eleito para reavaliar pontos do acordo

Saúde é bandeira política da nova gestão Custódio Mattos dedicou boa parte de sua campanha à importância da construção de um hospital na Zona Norte da cidade, para o qual divulgou amplo apoio do Governo do Estado. Ao ser eleito, garantiu que a saúde será a área em que pretende investir primeiro. No Conselho Municipal de Saúde, agora a preocupação é de como será a destinação da verba existente. “Uma vez que o conselho se entende como autoridade consultiva e deliberativa, esperamos que o prefeito discuta todas as prioridades da área”, sustenta o presidente do Conselho, Petrônio Barros Ribeiro. Para o cientista político Cristiano Batista dos Santos, o problema de Custódio não será construir o prédio

que abrigará o futuro hospital da Zona Norte, mas sim, a compra de equipamentos especializados. “Esses equipamentos custam caro e não existe previsão orçamentária do estado para isso nos próximo três anos.” O presidente do conselho afirma que sua postura não é contrária à construção do hospital, mas que ainda não houve uma discussão do assunto com a entidade. Ao que tudo indica, este espaço vai ser exigido: “Queremos discutir com a comunidade, por exemplo, o local do hospital.” O prefeito não pode achar que a população se contentará apenas com o hospital. “Ele vai precisar atender anseios quanto à saúde, mas também em relação ao transporte coletivo. Caso contrário, vai ter grandes difi-

culdades nos próximos anos”, prevê o cientista político. Cobrança na cultura A partir do próximo ano, a nova gestão da Prefeitura vai lidar com mais um conselho, o de Cultura. Neste mês, a classe se reuniu para escolher os representantes eleitos para ocupar as 11 cadeiras, que incluem vários setores, de literatura e música a carnaval e etnias existentes no município. “Por enquanto não nos articulamos com outros conselhos, mas acreditamos que essa união nos dará força junto à nova Prefeitura”, afirma um dos integrantes da secretaria do novo órgão, Jefferson Lorentz, acrescentando que o processo encontra-se em fase de elaboração do regimento interno.


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FINADOS

Quando a morte vira rotina Limpar túmulos, cavar sepulturas, vender caixões, preparar o cadáver: esse é o dia-a-dia de profissionais que lidam com a morte

Francislene de Paula Gustavo Dore Marcello Machado Thais Torres

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Thais Torres

elo menos uma vez por ano, duas primas se reúnem. E não é casamento, aniversário, Natal. É o Dia de Finados. Sônia Ramos visita seus familiares falecidos há mais de 30 anos e tem o túmulo de sua mãe, no Cemitério Municipal de Juiz de Fora, como ponto de encontro. Lá, revê a prima Geralda Roux, que mora em Petrópolis e viaja todos os anos para cumprir a promessa feita à mãe, morta em 1975. “Quando era viva, minha mãe dizia que queria saber quem lhe levaria flores depois que morresse.” Assim como as primas, no dia 2 de novembro, milhares de pessoas prestam homenagem aos entes mortos. Segundo a tradição cristã, a prática é realizada desde o século II, quando fiéis visitavam os túmulos dos mártires para orar pelos que

haviam morrido. “Minha mãe me ensinou esse costume de visitar mortos. Se eu não vier, sinto remorso”, revela a aposentada Lúcia Ferreira, que com 70 anos leva flores para enfeitar o túmulo de seus pais e irmãos. Atmosfera Não sabemos se a morte tem uma cara ou uma identidade. Mas, que ela tem representação, tem. Em Juiz de Fora, o Cemitério Municipal talvez seja a melhor “face” da morte: túmulos grandes, mausoléus, jazigos perpétuos, lápides saudosas, flores, silêncio, essas são as características do maior cemitério da cidade, que pode ser visto de muitos lugares. Localizado no Bairro Poço Rico, o cemitério foi construído para acabar com os sepultamentos que aconteciam ao redor da Igreja Matriz, hoje, a Ca-

tedral Metropolitana. As epidemias de cólera e febre amarela que atingiram a cidade em 1850 foram os principais motivos para que os sepultamentos fossem realizados em um terreno longe das áreas urbanas. Assim, a partir de 1864, os enterros passaram a ser feitos no cemitério público. “Existem cerca de 250 mil pessoas sepultadas no Municipal”, contabiliza o encarregado do Cemitério, Iury Pavão, que trabalha no local há três anos. Iury explica que não há mais venda de jazigos por falta de espaço. “Trabalhamos com as sepulturas rotativas, ou seja, passados cinco anos do sepultamento, os restos mortais são retirados da sepultura e outra pessoa é enterrada no local. Se a família optar, pode comprar um ossário, que custa em torno de R$ 150”, afirma. Mas nem sempre foi assim. QuanFrancislene de Paula

Jazigo no Cemitério Municipal de Juiz de Fora

do havia espaço para todos, as famílias compravam jazigos perpétuos e faziam obras faraônicas. Parte do cemitério é formada por esses túmulos, em geral feitos de mármore, com lugar para vários entes da mesma família. O maior mausoléu tem 16 gavetas subterrâneas. As construções refletiam a riqueza da família e são alvos de histórias que, em sua maioria, não podem ser confirmadas. “Conta-se que em um dos mausoléus, as pessoas estão enterradas com as jóias que pertenciam a elas”, especula o encarregado, Iury. Além do Municipal, a cidade tem outros três cemitérios. O do Bairro São Pedro foi construído em 1886 e é administrado pela paróquia local. Com 1.297 túmulos, o cemitério particular pode alugar suas sepulturas durante cinco anos (por R$ 370) ou vendê-las, cobrando taxa anual de R$ 69. O cemitério Nossa Senhora da Glória existe desde de 1856 e também é coordenado pela paróquia local. São 1.737 túmulos e não há vagas para aluguel ou para compra até fevereiro, devido a mudanças administrativas. A taxa anual para manutenção é de R$ 90. Já o Parque da Saudade, foi fundado em 1976 e hoje possui 23 mil túmulos, com capacidade de expansão. Um jazigo pode ser adquirido por R$ 4.400. Normal, mas nem tanto Mesmo com as lendas e histórias que rodeiam os cemitérios, os funcionários do Municipal afirmam que o serviço é um emprego qualquer. “No começo é meio estranho, mas agora já me acostumei”, afirma Iury, que já foi vigia do cemitério. Nessa época, ele tinha que fazer rondas noturnas e conta que uma vez viu algo estranho. “Estávamos eu e um colega fazendo a ronda, quando eu vi passar na minha frente uma mulher vestida de branco. Resolvi não falar nada, para não sugestionar o companheiro. Mas, ele me perguntou se eu também tinha visto a mulher”, narra Iury. Será que era um fantasma? “Não posso afirmar que tenha sido um espírito, pois pode ter sido fruto da minha imaginação. Trabalhando em um cemitério, você fica sugestionado a ver e ouvir coisas”, acredita o encarregado. História parecida viveu o ex-coveiro José Reginaldo. O aposentado, que trabalhou no Municipal durante 30 anos, estava fazendo a ronda, quando passou por um túmulo e julgou ter ouvido um barulho estranho dentro dele. “Fiquei com muito medo, imaginando que o falecido estava vivo. Como era noite, nem pensei duas vezes antes de sair correndo”, lembra José. No outro dia, movido pela incredulidade e também pela curiosidade, o ex-coveiro voltou ao túmulo e com alívio e muitas gargalhadas descobriu que, na verdade, o barulho vinha de uma colméia que estava sendo formada ali. A filha de José, Cláudia Reginaldo,


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trabalha no cemitério, limpando túmulos. “Não é um trabalho fácil, mas estamos acostumados. Já vi muitas pessoas não agüentarem e entrarem em depressão ou no vício da bebida”, afirma Cláudia. A autônoma diz que perdeu as contas de quantos túmulos tem sob sua responsabilidade e afirma que consegue complementar a renda familiar com a atividade. As dificuldades citadas por Cláudia aparecem também na fala de José Geraldo da Silva, que foi coveiro durante 13 anos. Silva afirma que o trabalho é um serviço comum, mas difícil principalmente quando envolve crianças. “Talvez o mais difícil seja enterrar uma pessoa com uma criança do lado pedindo pra você não fazer isso. Já vi também um rapaz pular em cima do caixão e os familiares terem que segurá-lo para que o enterro pudesse ser feito”, diz Silva, que atualmente trabalha para a Secretaria de Política Urbana da Prefeitura de Juiz de Fora. “Teve uma ocasião em que o coveiro, por estar alcoolizado, não prendeu o caixão direito e a mulher caiu dentro da cova. Quase apanhamos da família”, narra. Menos preocupações para os vivos Alguns fazem sinal da cruz só de passar pelo passeio de uma funerária, mas são muitos os que optam por fazer um plano funerário. Os planos cabem em todos os bolsos: variam de R$ 4,80 a R$ 12 por mês. A maioria estende os benefícios aos filhos solteiros e esposa ou marido. No caso de óbito, a família aciona a agência funerária que a orienta e toma as providências até que o corpo seja levado ao cemitério escolhido. “A maioria das pessoas que buscam planos funerários tem alguém doente ou idosos na família, mas isso não quer dizer que os jovens não procuram. Eles fazem planos para os pais e avós”, explica a gerente da agência funerária Pax Homini, Edelvais Teixeira. Os profissionais da área afirmam que a praticidade de ter um plano funerário na hora que precisa também atrai as pessoas. “As vezes a pessoa vivenciou o caso de um amigo ou vizinho numa hora de falecimento e viu como é melhor para a família”, acrescenta Edelvais. Em Juiz de Fora, cada funerária faz uma média de 150 velórios por mês. Um caixão pode variar de R$ 140 a R$ 5 mil, a diferença está no tipo de madeira usada e no acabamento. Os planos funerários não prevêem o local de sepultamento. O corpo pode ser enterrado nas sepulturas rotativas do Cemitério Municipal ou no jazigo da família. Em cemitérios particulares, caso a família não tenha terminado de pagar a sepultura e ocorra o óbito, o pagamento deve ser quitado. Quando não há condições de pagar a dívida, já existe um jeitinho brasileiro. Existem pessoas

Dá para prever? Se você quer saber quando vai morrer, existem sites que prevêem a data da morte, como o www.mdig.com.br, desenvolvido pelo enegenheiro eletrônico Luis Silva, de Joinville. “A idéia surgiu em um velório onde eu e alguns amigos discutíamos que a hora do morto já havia chegado”, conta. Segundo ele, os cálculos estão embasados em informações estatísticas dos sites do IBGE e do Ministério da Saúde. Em média, 35 mil internautas por dia fazem o teste. “Apesar de saberem que é uma brincadeira, o comentário mais comum é que somente Deus pode prever o dia da morte, e já xingaram até a minha terceira geração”, diverte-se Luis.

que alugam sua sepultura até que o pagamento seja concluído. O mercado Juiz de Fora possui quatro funerárias, e não é nada fácil divulgar o negócio num ramo tão delicado. As agências funerárias distribuem panfletos, cartões, veiculam propaganda em rádio, mas os convênios são o atrativo principal. Descontos em médicos, dentistas e advogados têm atraído até o público mais jovem. As inovações também fazem parte do mercado fúnebre. Urnas de times de futebol, com formato de avião e até as que abrem com controle remoto são alguns lançamentos. “Em São Paulo o mercado é muito avançado, aqui ainda é muito conservador. Há resistência a mudanças, a cidade preserva uma cultura mais an-

tiga”, comenta o motorista de funerária Fernando Rinco. Segundo ele, até mesmo o uso de flores artificiais, com cheiro mais agradável, ainda é visto com desconfiança. A profissão A morte talvez seja o maior enigma da humanidade, e lidar com ela de perto não é para qualquer pessoa. Na hora de preparar o corpo para o velório, os motoristas de funerária buscam atender a todos os pedidos da família. “Já preparei o corpo de uma adolescente e a mãe pediu que ela fosse arrumada com os ursinhos de pelúcia”, revela o motorista Marcelo Alves. Para ele, o segredo é não se deixar envolver com o sentimento da família, mas isso fica complicado no caso de crianças. Paulo Rinco, motorista há 18 anos,

tem orgulho da profissão. “A gente tem que gostar do que faz. Procuro ajudar muito as pessoas e também aprendo com elas. Morrer é o destino, a gente tem que passar por isso”. Paulo conta que a principal preocupação da sua família é o risco de contaminação. Lidar com imprevistos é normal nessa profissão. “Já cheguei no necrotério do hospital para arrumar o corpo e a esposa estava com o atestado de óbito na mão. Foi quando a amante apareceu e queria tomar frente da situação. As duas começaram a brigar e eu fiquei esperando”, conta Alves. Outro caso é o do filho que foi reconhecer o corpo da mãe mas estava embriagado. Quando o corpo chegou na cidadezinha para o velório, os outros irmãos viram que não era o corpo certo e até a polícia foi envolvida no caso.

Com a morte nas mãos O cadáver está sendo examinado: cor dos olhos, cabelo, cicatrizes, feridas, última roupa que usou em vida. Todas as características externas que definem o morto são descritas. Em seguida, o corpo é submetido ao exame interno: tórax, coração, pulmão e crânio, por exemplo, são verificados com a atenção de quem nunca lidou tanto com a morte como agora, na profissão que exerce. Apesar de parecer a sinopse do seriado policial norte-americano “CSI: Crime Scene Investigation”, essa é a rotina da médica legista Isabelle Castro, que trabalha há um ano no Instituto Médico Legal (IML) de Juiz de Fora. Isabelle, que também é cirurgiã vascular, fez curso de formação policial e especialização em Medicina Legal, ao prestar concurso para atuar na área. “Os legistas são policiais civis”, esclarece ao afirmar que o IML é um órgão subordinado à Secretaria de Estado da Segurança Pública. Quanto à comparação de sua profissão com seriados como o “CSI”, a legista contrasta a encenação glamourosa da série com a realidade diária. “Ao contrário do seriado, em que há aparatos adequados, enfrentamos dificuldades como a falta de materiais e papel para a declaração de óbito.” Depois do óbito Segundo a médica, as vítimas de morte violenta ou suspeita devem

ser encaminhadas ao IML para o exame de necropsia, como nos casos de homicídio, suicídio, acidente e óbito sem causa aparente. Se necessário, os legistas colhem amostras de sangue ou vísceras e as enviam ao instituto de Belo Horizonte, para exames que Gustavo Dore

Isabelle: lidar com o morto é pensar na vida

possam constatar a existência de álcool, drogas ou veneno no organismo do cadáver. Depois da necropsia, os legistas emitem o laudo e o corpo é liberado para a funerária preparar o velório e o sepultamento. Trabalho pesado Para Isabelle, seu trabalho apresenta situações desconfortáveis. “Examinar o morto é algo pesado, difícil, que requer mecanismos de defesa para não levar situações pra casa”, diz. Além da necropsia, o IML pode realizar o exame de exumação, em

corpos já enterrados, mediante solicitação da autoridade legal. “Os piores casos são de corpos em decomposição, que cheiram mal e podem conter larvas”, declara. Por outro lado, a legista pondera que, no aspecto médico, sua área é menos difícil que outras especializações da medicina que têm responsabilidade pela vida e pela saúde do paciente. “Lido com algo que já aconteceu e está acabado. Me sinto como ‘perito’, minha preocupação é com a qualidade da perícia e do laudo”, explica. Isabelle afirma ainda gostar de sua profissão. “Lidar com a morte me traz a sensação de vida e muito aprendizado, porque me faz perceber o quanto a vida é frágil e o quanto temos que valorizar cada momento”, revela ao lamentar motivos fúteis que geram tragédias, como a imprudência no trânsito. Inaugurado em 1999, o IML da cidade funciona com plantão de 24 horas e possui duas unidades: uma que faz exames no cadáver, localizada no Bairro Granbery (com média de 30 necropsias mensais), e outra que examina os vivos, situada no Bairro Santa Terezinha (com cerca de 300 atendimentos por mês). No segundo caso, o posto realiza exames diversos, como de lesão corporal, embriaguez, violência sexual e sanidade física.


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EXCLUSÃO

Humilhação em escolas é tema de pesquisa em Juiz de Fora Professor da UFJF estuda discriminação com alunos do Colégio de Aplicação João XXIII Álvaro Dyogo Flaviane Paiva Michelle Clara

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ordinha, baixinho, puxa-saco, feio, Olívia Palito, girafa, quatro-olhos... Quem já não ouviu esses tipos de apelido? Nas escolas é muito comum ver esse tratamento entre alunos. Porém, se utilizado de forma insistente, ele se torna uma agressão. A essa violência dá-se o nome de bullying. O tema parece banal, porém foi objeto de uma pesquisa que recebeu menção honrosa na Mostra de Iniciação Científica da Universidade Federal de Juiz de Fora, em 2008. Bullying – O Desafio do Combate à Discriminação na Escola envolve alunos do ensino médio, orientados pelo professor Anderson Ferrari. Pensando nos estudantes que sofriam violência, recorriam às escolas e não encontravam ajuda, Ferrari, que é doutor em educação, decidiu desenvolver a pesquisa. O objetivo era detectar como essa violência ocorre e como é vista nas instituições de ensino. O estudioso diz que a idéia do projeto surgiu quando ele, em uma de suas aulas, presenciou uma ação agressiva de um aluno com uma colega de classe. “Eu queria saber o que leva a esse tipo de agressão, o motivo. Isso me mobilizou. Acho que a escola não tem somente a função de apresentar conteúdo. Ela deve discutir outras questões”, afirma. O envolvimento da escola Ferrari propôs um projeto coletivo no Colégio de Aplicação João XXIII. Com inter-relação entre disciplinas e discussão com os alunos, a pesquisa se tornou atrativa para os estudantes. Eles passaram a observar as atitudes entre amigos, perceber e relatar os casos. Segundo Ferrari, os alunos começaram a denunciar abusos, o que antes não acontecia. Para ele, o bullying era tratado como algo

natural na adolescência. “Não adianta você brigar por isso. Eles mesmos começaram a detectar que isso não é assim”, relata. No primeiro ano do projeto, a pesquisa identificou que os alunos sofriam agressões repetitivas dentro do ambiente da escola, porém longe do olhar de um adulto. Também foi observado que os estudantes deixavam de denunciar os abusos por não reconhecerem na escola a autoridade para resolver determinado assunto. Sem o apoio da instituição, o estudante agredido buscava soluções por conta própria, se isolava dos demais ou se negava a freqüentar as aulas. A partir desse quadro, o professor Anderson Ferrari buscou modificar a realidade da escola esclarecendo os professores quanto à gravidade dessas situações. A conscientização dos alunos também foi fundamental para atingir resultados. Uma bolsa de iniciação científica júnior (BIC Jr.) foi oferecida para os alunos de sexto ano. O critério de avaliação era uma redação e posterior entrevista. O projeto mobilizou toda a escola. A aluna selecionada, Isabela Dutra, produziu os questionários, aplicou em uma turma piloto e corrigiu as falhas. Depois as perguntas foram aplicadas no colégio. No segundo ano da pesquisa, o professor selecionou outro aluno, Dartagnan Abdias Silva. O estudante de 17 anos ajudou a adequar os questionários para alunos do ensino médio. Dartagnan apresentou os resultados do ano anterior na 5ª Mostra de Ciências da UFJF. Depois disso, a pesquisa chamou a atenção dos professores da Universidade. O projeto continuou com a intenção de ser ampliado para o ensino fundamental e foram abertas duas novas bolsas. Marcella Leonel Mirandela dos Santos, 16 e Aline Ferreira Mayrink, do Instituto de Educação foram selecionadas para participar. Vítimas do bullying, Dartagnan Michelle Clara

Anderson Ferrari orienta os alunos na coordenação do ensino fundamental

Dartagnan e Marcella completam a pesquisa na biblioteca do Colégio João XXIII e Marcella relatam que ter passado por essa experiência os ajuda a se aproximar das vítimas. Dessa forma, identificar os agressores, ajudar os alunos que também sofreram violência e tirar conclusões torna-se mais fácil. Marcella afirma que teve muito apoio de sua família para superar a fase de agressões. “Agora eu vejo de uma forma diferente. Sou mais segura. Antes tinha medo de falar. Eu tinha medo de estar errada”, afirma a estudante. Desfecho inesperado Os dados apontaram que dois terços dos alunos que participaram da pesquisa já presenciaram casos de bullying na escola. Porém, a porcentagem cai para um terço quando a pergunta se refere ao fato de o estudante haver sofrido a agressão. Os pesquisadores concluíram que declarar ser vítima também é uma forma de reviver a situação.

Dartagnan destaca que o mais interessante foi descobrir que o bullying ocorre muito antes do que se pensa, ainda no ensino fundamental. “Percebi que a agressão no ensino fundamental é pública e que não tem a pretensão de ser escondida. Ela tem a intenção de intimidar a vítima porque os agressores sabem que não vão ser punidos. E aí começa a ser muito mais forte porque passa a envolver a sexualidade, o jeito de ser. Passa a ser uma questão de competição, quem humilha mais”, aponta. De acordo com o professor Ferrari o maior desafio no desenvolvimento dessa pesquisa foi adequar as cobranças aos pesquisadores juniores. “Eu nunca tinha orientado alunos de ensino médio. Oriento adultos graduados e com um grau de exigência maior. Me adaptar e adequar a metodologia da pesquisa foi um processo construído passo a passo. Foi um aprendizado muito grande”, relata.

Práticas anti-bullying podem evitar tratamento A vítima de bullying vê sua autoestima ser agredida todos os dias. “Isso faz com que alguns deles pensem que mereçam as agressões que recebem”, alerta a psicóloga e terapeuta familiar Ana Stuart. Normalmente são jovens que apresentam forte insegurança. Na visão de Ana, eles acreditam não dispor de recursos ou status para reagir. “Esses jovens se julgam excluídos do grupo, e não vêem possibilidade de fazer parte dele”, diz. Em situações mais graves, esse tipo de violência pode levar à comorbidade, doença que gera fobia social devido à depressão. Nesses casos, o tratamento clínico é mais severo. “A comorbidade é diagnosticada e tratada, até mesmo com auxílio de

remédios antidepressivos”, explica Ana. Ela afirma que o tratamento é importante e que há casos em que a vítima toma atitudes drásticas não apenas contra aqueles que praticavam o bullying, mas contra todos os que ela considera terem se omitido diante de seu sofrimento. A psicóloga acredita que estabelecer convivência entre os estudantes fora da sala de aula e em conjunto com os educadores pode ser uma forma de se combater a prática. “Numa dinâmica de grupo, por exemplo, os professores poderão detectar sinais dos alunos que possivelmente sofrem e dos que praticam bullying, para tomar as providências necessárias”, considera.


Saúde 9

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DIA MUNDIAL DE COMBATE À AIDS

Homens acima dos 50 anos são alvo da campanha 2008 Estudo do Ministério da Saúde mostra o crescimento da doença a partir da meia-idade Lívia Mautoni Priscila Lima

Sexo não tem idade. Proteção também não”. Este é o tema do dia Mundial de Combate à Aids este ano, que tem como foco de sua campanha os homens acima dos 50 anos de idade. Devido ao crescimento da epidemia nesse segmento da população revelado por um estudo do Ministério da Saúde. O Dia Mundial de Combate à Aids (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) que é comemorado em 1º de dezembro foi instituído pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1988 para mobilizar pessoas no mundo inteiro na luta contra a doença. O coordenador do Programa Municipal DST/Aids, Rodrigo Almeida, diz que os homens acima dos 50 anos estão mais ativos sexualmente, devido ao surgimento, nos últimos anos, de remédios estimulantes sexuais. A novidade possibilitaria uma vida sexual mais intensa para esses homens que não fazem parte da “geração camisinha”. O hábito de não usar preservativo nas relações sexuai é apontado como o grande responsável pelo avanço da doença. O programa da Prefeitura existe desde 1996 dando assistência a pessoas que vivem com Aids e outras Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs) na cidade e na região. Hoje, 915 soropositivos estão em tratamento em Juiz de Fora. Avanço da doença O desafio que tem sido enfrentado pela saúde pública vai além desses homens com mais de 50 anos. Nesta faixa etária, a maioria é casada e as relações extraconjugais sem camisinha representam ameaça para as esposas. Indicadores do Ministério da Saúde relacionados ao uso de preservativo

mostram que aproximadamente 38% da população sexualmente ativa usou camisinha na última relação sexual, independentemente da parceria. Número muito pequeno quando se trata de uma doença que não tem cura. A sexóloga Elisângela Pereira da Silva lembra que ainda é tabu para as mulheres pedir ao parceiro que use preservativo. Seja para não demonstrar que desconfiam do marido ou para que este não passe a suspeitar da esposa. Além do fato de que o preservativo feminino tem se mostrado pouco prático e desconfortável, sendo pouco usado pelas mulheres. Dados da Vigilância Epidemiológica de Juiz de Fora mostram que entre pessoas mais velhas a Aids tem atingindo tanto homens quanto mulheres (ver quadro). Sexo em todas as idades É errado pensar que as pessoas depois de certa idade não são mais ativas sexualmente. O idoso de hoje não tem o mesmo perfil daquele de anos atrás. Com taxas de expectativa de vida cada vez mais altas no Brasil, depois da aposentadoria é hora de desfrutar a vida. Porém nessa faixa etária, segundo Elisângela, existe o mito de que “Eu não precisei de camisinha antes, porque eu preciso disso agora?” Eles se esquecem de que na época em que eram jovens as únicas DSTs que existiam são curáveis, como a sífilis e a candidíase, por exemplo. Por isso é mais difícil convencer os mais velhos a usar preservativo. Já a Aids não tem cura nem vacina preventiva. É uma doença resultante da infecção pelo vírus HIV (Vírus da Imunodeficiência Adquirida) que ataca e destrói as defesas do corpo humano. O organismo fica vulnerável a infecções oportunistas e tumores que podem levar à morte. O controle da HIV é feito por meio do coquetel antiAids, para diminuir a carga de vírus

Incidência da Aids em Juiz de Fora: a. 50 a 64 anos - 121 homens e 35 mulheres b. 65 a 79 anos - 16 homens e 12 mulheres c. 80 em diante - 0 homens e 1 mulher

Novos casos em pessoas acima dos 50 anos: 2006 – 6 homens e 3 mulheres 2007 – 12 homens e 1 mulher 2008 – 6 homens e 4 mulheres Fonte: Vigilância epidemiológica de Juiz de Fora ( dados apurados até 17/10/08)

e aumentar a longevidade e qualidade de vida do paciente. É um tratamento caro, em média R$3mil a R$5 mil reais por mês. O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece em todo o país o tratamento de forma inteiramente gratuita para os soropositivos. O temor que a doença desperta nas pessoas é acompanhado de muito preconceito. A sexóloga con-

sidera que apesar de já estarmos em 2008 a sociedade brasileira é muito machista. “Muita coisa modernizou nesses últimos anos, como a inserção das mulheres no mercado de trabalho, mas quando o assunto é sexo as pessoas ainda são muito tradicionais. A visão preconceituosa de que a Aids é uma doença de homossexuais e prostitutas ainda persiste.” Lívia Mautoni

Em reunião no HU, assistentes sociais idealizam evento na Halfeld

Juiz de Fora contra a AIDS Quando o assunto é Aids, informação não falta. Apesar das campanhas educativas, especialistas na área alertam que não basta informação para que as pessoas mudem seus hábitos. É preciso haver conscientização, que passa pela ampla discussão do problema. Não basta ter a camisinha na carteira, mas usá-la. O Hospital Universitário (HU) tem atuado na busca dessa conscientização da sociedade, através de encontros para discutir ações a serem tomadas para conter o avanço da doença. No último dia 3 de novembro aconteceu no HU uma reunião para planejar as atividades a serem realizadas em Juiz de Fora no dia 1º de dezembro. O evento contou com a participação de assistentes sociais do HU, representantes do Pró-Idoso e do Pólo do Envelhecimento, além das ONGs Grupo Casa, Grupo Espírita de Apoio a Enfermos (GEDAE) e ConvHIVendo e Aprendendo. O objetivo foi organizar eventos no Calçadão da Halfeld e no Parque Halfeld, com palestras, apresentações teatrais, baile, realização de atividades físicas e distribuição de informativos e preservativos. Convivendo com a doença M. J.,de 69 anos de idade, revela que foi contaminada pelo HIV atra-

vés de seu companheiro que a traía e com quem morava junto há quatro anos. Aos 54 anos, recebeu o diagnóstico: “É o tipo de coisa que a gente pensa que nunca vai ter, no começo fiz tratamento psicológico para lidar com a doença.” O companheiro descobriu a doença ao doar sangue, e não contou para ninguém. Em seguida, sugeriu que a mulher também fizesse a doação, assim a doença foi descoberta. Até hoje M. J. não sabe se seu companheiro realmente só descobriu que era soropositivo ao doar sangue ou se escondeu por mais tempo que tinha Aids. Vê-lo morrer cinco meses depois foi muito difícil para ela. Hoje M. J. vive muito bem. Nunca foi internada, toma o coquetel duas vezes ao dia e vai ao médico para fazer o controle da doença a cada semestre. O vírus está sob controle. O mais difícil é enfrentar o preconceito de vizinhos e pessoas que ela achava serem suas amigas. “Perceber as pessoas se afastarem de mim me fez, cada vez mais, ficar em casa e deixar de freqüentar lugares como festas e praia.” No entanto ela mostra-se muito bem disposta, principalmente devido ao apoio que tem da família. Esta oportunidade seu companheiro não teve, pois seus parentes o isolaram em um quarto úmido.


10 Esporte

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COMEMORAÇÃO

Estádio completa duas décadas Grandes nomes do esporte de Juiz de Fora celebram a data relembrando a trajetória do Mário Helênio Cláudia Oliveira Natália Rangel Renan Caixeiro

O

ano era 1988. Juiz de Fora se destacava no esporte, principalmente no futebol. Tupi e Sport Club estavam na primeira divisão do Campeonato Mineiro, mas faltava uma peça importante para o desenvolvimento. “Quando eu ia a jogos em estádios, como os do Sport, às vezes não cabiam todos os torcedores, e, quando eu passava, o povo gritava e pedia um estádio municipal”, recorda Tarcísio Delgado, ex-prefeito da cidade. “Antes só havia o estádio do Sport para jogos importantes. Os do Tupi e do Tupynambás eram muito pequenos e da década de 40”, explica Fernando Paranhos, vereador da cidade no final da década de 80. A idéia de ter um estádio municipal não era nova. “Em 1958, quando Tupi e Olimpic disputaram o título regional, o número de pessoas fora do campo do Sport era maior do que dentro, o que deu aos desportistas a certeza de que tínhamos que ter um estádio”, afirma o jornalista Geraldo Magela.

Até então, outras tentativas de construir um estádio municipal haviam falhado. De acordo com Tarcísio, a pressão era cada vez maior devido ao grande número de desportistas da cidade e às promessas não concretizadas anteriormente. “Um dia eu estava olhando umas obras no Bairro Aeroporto com um engenheiro da Prefeitura, e ao vermos um terreno vazio, logo pensamos a mesma coisa. Lá poderia ser o estádio municipal.” Segundo o ex-prefeito, as verbas eram municipais e a dificuldade era a inflação da época. “O projeto saiu como foi o programado. Algumas modificações aconteceram, pois faltou a iluminação, que foi colocada no meu outro mandato.” Em 30 de outubro de 1988 era inaugurado o Estádio Regional de Juiz de Fora, com um custo de aproximadamente CZ$ 29 milhões, correspondente a R$ 400 mil. Inaguração O jogo inicial foi Tupi contra Sport, um dos grandes clássicos da cidade, que terminou em 2 x 1 para o Periquito. Em seguida, a grande atração do dia: Flamengo e Argentino Juniors. Cerca de 50 mil pessoas

Cláudia Oliveira

Cidade hoje tem porte para receber jogos decisivos como a Semifinal do Mineiro 2008 assistiram a vitória do rubro-negro também por 2 x 1. “Foi talvez a mais bonita e concorrida festa pública da cidade. O Flamengo era o time com a maior torcida do Brasil”, afirma Tarcísio. O nome atual só viria em 1996, ano seguinte à morte do jornalista Mário Helênio Lery Santos, “um dos maiores ícones e incentivadores do nosso jornalismo esportivo”, nas

palavras do jornalista e coordenador de esportes da Rádio Globo de Juiz de Fora, Ricardo Wagner. Para Ricardo, Mario Helênio incentivava o bairrismo saudável e se dedicava ao esporte amador. “Ele não deixava de falar do Rio, do Campeonato Brasileiro, mas não abria mão de falar dos jogos intercolegiais e das diversas competições locais e jogos da cidade.”

“Ouvintes, iniciando está o programa Giro da Bola...” Em seus anos mágicos na década de 50, o rádio contribuiu de forma expressiva para a divulgação do esporte local e para a participação do público de Juiz de Fora e região, nas práticas esportivas. Um célebre representante da classe foi Mário Helênio de Lery Santos. Mário dedicou mais de 50 anos aos noticiários esportivos escrito e falado da cidade. Ele escrevia para reconhecidos jornais da época e comandava programas na rádio de grande audiência, como o “Giro da Bola” pela antiga Rádio Sociedade. Era sempre iniciado com a fala: “Alô, rádio-ouvintes desportistas, inciando está o programa ‘Giro da Bola’.” Foi talvez um dos programas de maior audiência da história da rádio em Juiz de Fora, segundo o jornalista e colega de Mário, Geraldo Magela. Além da transmissão das partidas de futebol, Mário Helênio fazia questão de divulgar até campeonatos de buraco, por exemplo, numa tentativa de prestigiar e incentivar o esporte amador local. Quem confirma a defesa de Mário pelo localismo é o jornalista e professor da Faculdade de Comunicação Social da UFJF, Márcio de Oliveira Guerra: “ Um defensor intransigente do esporte local. Esse era o Mário Helênio.” Márcio trabalhou durante muitos anos ao lado do radialista e o descreveu como um “flamenguista apaixonado, divertido,

dinâmico e por vezes irônico com as manchetes estranhas e exageradas”. O jornalista e coordenador de esportes da Rádio Globo de Juiz de Fora, Ricardo Wagner, afirmou ao Jornal de Estudos que o maior legado de Mário Helênio foi a valorização do potencial esportivo de Juiz de Fora. O idealismo do radialista era tanto que a lei municipal de incentivo ao esporte, que tramita na Câmara desde 2004, leva seu nome. “Já temos o comprometimento do prefeito eleito de, em

breve, colocar a lei em prática com a regulamentação por meio de decreto. Ela é um instrumento importante pra alavancar vários projetos esportivos da cidade”, diz Ricardo. Com a morte de Mário, no Natal de 1995, a cidade perdeu um de seus maiores expoentes do esporte local. No ano de 96, um grupo de amigos do radialista organizou um movimento que deu origem a um projeto de lei na Câmara para que o Estádio Municipal, como era chamado até Reprodução: Diário Mercantil 18-09-1958

Mário Helênio (de óculos) sendo homenageado pela Liga Universitária de JF

então, recebesse o nome de Estádio Municipal Radialista Mário Helênio. “Todos que trabalhavam com esporte na cidade aprovaram o novo nome, já que Mário era a maior referência do jornalismo esportivo da cidade. Foi uma homenagem nada mais que justa”, disse ao JE, o ex-vereador e grande amigo de Mário Helênio, Fernando Paranhos.

Presente e Futuro O prefeito José Eduardo Araújo anunciou neste mês que a comemoração do aniversário do estádio vai ser feita com reformas. As alterações incluem um placar eletrônico, finalização da pintura e mudanças nas arquibancadas. Para os torcedores visitantes será criado um setor de 3.800 lugares atrás de uma das áreas. Além da construção de cobertura sobre as arquibancadas. Outra novidade é a criação de uma galeria de fotos para homenagear grandes nomes do cenário esportivo da cidade. Da imprensa aos jogadores, passando por Tupi, Sport e Tupynambás, a galeria contará também com imagens de Pelé e Zico, que vão dar nome aos vestiários do municipal.


Comportamento 11

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Vida universitária

Xerox ocupa lugar de livros Preço de originais leva à opção pela cópia; Editora UFJF planeja medidas para reduzir ilegalidade David Gomes Patrícia Mendes

“Na verdade o estudante tem que ter critério e saber comprar aqueles livros que serão importantes para sua biblioteca no futuro”, pondera.

David Gomes

A

fotocópia, também conhecida como xerox no meio estudantil, principalmente no universitário, gera polêmica há algum tempo. De acordo com a lei de direitos autorais (9.610/98) é crime a cópia de livro. Porém, a prática de xerox continua sendo um fato corriqueiro dentro das universidades. A própria lei que deveria regulamentar esse setor é confusa e abre espaços para diversas contestações. Atualmente, existem duas correntes de interpretação da lei. Uma delas acredita que não constitui dano ao direito autoral a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado, sem intuito de lucro. Em contrapartida, o artigo 5º, inciso XXVII da mesma lei, estabelece apenas aos autores o direito exclusivo à utilização, publicação e reprodução de suas obras. A partir dessa realidade, surge o questionamento quanto à possibilidade completar a faculdade sem infringir a lei, ainda mais sabendo que quase todos os universitários tiram cópias de livros. É possível entender a lei? Para a advogada Camila do Bem essa confusão ocorre porque mesmo a cópia sendo considerada crime pela lei que regulamenta o direito autoral, pode-se alegar que ela também tem a função social, de levar conhecimento ao cidadão, e este faz uso do seu direito à informação. No entanto, a integrante do Comitê de Documentação da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) Anamaria da Costa Cruz afirma que as cópias são sim uma prática criminosa. “Mesmo o autor autorizando a cópia, ela é proibida. O autor pode vir a processar quem fez a reprodução num momento futuro, pois não há respaldo jurídico”, afirma Anamaria. O estudante do segundo período de pedagogia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Danilo Oliveira, costuma suprir sua necessidade de material didático com livros xerocados. A grande diferença de preços entre cópias e originais é o que leva Danilo e muitos outros estudantes da UFJF a optarem pelo xerox como principal meio de estudo. Luz no fim do túnel A Editora da UFJF busca caminhos alternativos para que os alunos não gastem dinheiro com xerox e nem com

Movimentação no xerox do ICH garante lucro de 30 % a 40% por folha duplicada livros muito caros. A Diretora Executiva da instituição, Nelma Fróes, busca junto às faculdades a adesão para a implantação do Caderno de Graduação. O caderno seria constituído do material didático produzido pelos professores para as aulas. “Isso já acontece com a Faculdade de Odontologia da UFJF e com a maioria em Viçosa”, compara a diretora. O conteúdo é de autoria do professor e não pode conter partes de livros, apenas citações, se necessário. Entre as novas propostas está a compra consignada de livros junto a outras editoras universitárias. O professor adotaria determinado livro e a Editora da UFJF os compraria em grande quantidade por preço muito inferior ao mercado, repassando-os aos alunos. Nelma enfatiza que todas essas ações da Editora são sem fins lucrativos, “a única coisa que esperamos é ganhar visibilidade e não o lucro. A UFJF é um órgão público e não uma empresa, por isso temos que servir à Universidade.” A intenção é dar acesso, fazer com que os alunos se acostumem cada vez mais com o livro. O acordo também seria viável com algumas editoras comerciais. A proposta da Editora da UFJF atenderia alunos com o perfil do estudante Danilo, que opta por comprar o original quando acha que o livro será útil novamente em um momento futuro. “Já até comprei original de livro que tinha em xerox, como o ‘Uma Introdução aos Estudos de Psicologia’”, afirma. Biblioteca versus livraria Stefanie Stopato é aluna do sétimo período de Medicina da UFJF, ela costuma gastar cerca de R$40 só na semana de prova com cópias. “Xerocava muito no início do período e não dava

Copyright - É usado para indicar que uma obra está sujeita aos direitos de autor. Significa dizer que “a cópia pertence a”. Exemplo: © José da Silva, significa que a cópia atual pertence a José da Silva. Ou que os direitos autorais estão nas mãos do José da Silva. Copyleft - É um tipo de licença para documentos que permite a sua reprodução livre e, ao mesmo tempo, garante ao autor o reconhecimento e prestígio da sua realização. Conteúdos copyleft não podem ser convertidos em conteúdos copyright. A idéia por detrás do copyleft é que o conhecimento como tal não pertence a ninguém. Qualquer conhecimento vem de outros conhecimentos anteriores e é uma cópia em maior ou menor grau de outras idéias. Portanto, limitar a cópia não faz sentido e faz mais difícil a geração de novos conhecimentos.

tempo de ler tudo”, afirma a estudante. Atualmente ela utiliza a internet como principal fonte de estudo, e tira menos xerox. “Não importo se o livro tem figura, eles são muito caros e geralmente não preciso dele completo, mas às vezes compro alguns”, diz a estudante. Hugo Bonfatti, estudante do sétimo período de Comunicação da UFJF, não costuma ir muitas vezes à biblioteca, mas diz saber da dificuldade em se encontrar alguns volumes. O estudante costuma tirar cópias dos textos pedidos pelos professores que, segundo ele, são apenas fragmentos de livros. A proprietária da livraria Terceira Margem, Isaura Rocha, diz que não tem como avaliar se a utilização do xerox por estudantes chega a atrapalhar seu negócio. Isaura acredita que as cópias ajudam os alunos que não têm condição de adquirir todos os livros da bibliografia dos cursos, sendo que muitos livros são utilizados para apenas um trabalho.

O comércio do xerox Paulo Martins é sócio do xerox mais movimentado da UFJF, localizado no Instituto de Ciências Humanas (ICH). Martins diz que a demanda sempre é alta, principalmente no início dos períodos. A grande parte do conteúdo deixado pelos professores é fragmentos de texto. Martins afirma que nunca teve problema com autor referente à reprodução de livros. “Não faço pirataria, não reproduzo em série, apenas duplico”, defende-se quando questionado sobre autorização jurídica do estabelecimento. Fazer cópias é muito lucrativo segundo Martins. O lucro por folha xerocada é de 30% a 40%, dependendo se é frente-verso. O sócio do xerox acha que não está fazendo nada ilegal, acredita até estar ajudando os estudantes. “Hoje a biblioteca não tem como atender a demanda, tem apenas um livro para quase cinco mil alunos. Tem que tirar cópia mesmo, fazer o quê?”. Mesmo tirando cópias a universitária Mariana Souza, do terceiro período de pedagogia da UFJF, chega a gastar cerca de R$ 20 por mês em material didático. “Eu compraria até um xerox já utilizado por outro estudante para ficar ainda mais barato,” diz a estudante. Já Lucas Tavares, que está no quinto período de Comunicação na UFJF, diz que não compartilha da mesma opinião de Mariana. “Eu não compraria, nem venderia. Se fosse fazer alguma coisa com meus xerox, eu daria.”

Autores buscam soluções Professores universitários muitas vezes também publicam livros e ficam no centro dessa polêmica. Como colocar o livro de um colega para ser xerocado pelos alunos e defender os direitos do seu? A professora da Faculdade de Comunicação da UFJF, Christina Musse acredita que, no Brasil, deveríamos ter uma legislação capaz de exercer maior controle sobre as cópias. Mas, ao mesmo tempo, reconhece que as bibliotecas não têm como suprir a demanda dos alunos e que as bibliotecas virtuais ainda apresentam muitas falhas. Musse diz que prefere não colocar obras inteiras para serem xerocadas por seus alunos, “somente em casos onde o livro é realmente muito caro, ou quando já está esgotado, peço aos alunos para fazerem cópias. Mas em geral procuro utilizar apenas uma parte dos livros”, afirma. No caso do seu livro mais recente, “Imprensa, Cultura e Imaginário Urbano – exercício de memória sobre os anos 60/70 em Juiz de Fora”, que foi lançado com apoio da Lei Murilo

Mendes, Musse espera que a Funalfa distribua as 300 cópias a que tem direito nas bibliotecas da cidade, facilitando o acesso de estudantes que quiserem utilizá-las em suas pesquisas. Esse pode Alguns autores estão disponibilizando suas obras através da internet para que elas sejam lidas, reproduzidas, mas não comercializadas. Esses autores usam as licenças Creative Commons. Essas licenças utilizam o principio do copyleft (ver quadro), e podem ser de diversos tipos. Mudam a nomenclatura e o tipo de reprodução que autorizam. A licença de Atribuição, por exemplo, permite que outras pessoas copiem, distribuam e executem sua obra, protegida por direitos autorais, mas somente se for dado crédito da maneira que o autor estabeleceu. A licença de Uso não comercial permite que outras pessoas copiem, distribuam e executem sua obra mas somente para fins não comerciais. Informações sobre as outras licenças Creative Commons, no site: www. creativecommons.org.br.


12 Cultura

Jornal de Estudo

novembro de 2008

MULTICULTURAL

Nem só em museu vive a arte Cidade é palco de festas que levam diferentes manifestações artísticas aonde as pessoas se divertem Ivanna Aguiar e Wagner Emerich

Ivanna Aguiar Wagner Emerich

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eunir artistas e públicos de diferentes manifestações culturais em um mesmo espaço é o principal objetivo dos eventos multiculturais, que têm se tornado cada vez mais freqüentes na cidade. Inspirados em propostas como a da Babilônia Feira Hype, no Rio de Janeiro, e a do Mundo Mix, em São Paulo, os produtores de eventos locais perceberam que é possível juntar festa e cultura. No caso de Rio e São Paulo, a idéia surgiu em função do mercado da moda e, com o tempo, as atividades foram expandidas, tendo novas modalidades artísticas agregadas. O ambiente cultural de Juiz de Fora aderiu a esse movimento em julho de 2007, na primeira edição do festival Mulheres no Volante. Música, poesia, moda e um estande de divulgação do coletivo feminista Maria Maria Mulheres em Movimento foram algumas das atrações. Em 2008, festas como Quitanda Cultural, Vitrine Café e Mulheres no Volante 2.0 já movimentaram a cidade. Outros eventos multiculturais já estão programados para dezembro, mostrando que essa modalidade tem se firmado como uma opção cultural em Juiz de Fora. Nos dias 6 e 7 de dezembro, a +Soma +Fábrica das Artes levará para o Bar da Fábrica artistas locais e de outras cidades, tendo como novidade a gastronomia. No mesmo final de semana, acontecerá o Rawa Arts Festival 2008, na fazenda do grupo espiritual Ananda Marga, em Belmiro Braga, levando a tendência para além dos bares e espaços urbanos. A Quitanda é o único evento multicultural na cidade que tem periodi-

Mosaico artístico: Quitanda Cultural reúne artes visuais, música, cinema, teatro, moda e literatura nos mais variados estilos cidade regular, sendo realizada mensalmente na Casa de Cultura da UFJF. Em suas sete edições, a Quitanda Cultural foi iniciada com uma sessão de cinema, seguida de apresentações de teatro, dança contemporânea, recital de poesia, exposição de fotos, artes plásticas, moda e, ao final, um show de música ao vivo. A produtora do evento, Cibele Lopes, 27, acredita que a música é o chamariz da festa, por isso é sempre a última atração. Apesar disso, a idéia do evento é ser um espaço igual para todos, não favorecendo nenhuma atração ou artista específicos. O mesmo cuidado foi utilizado no Vitrine Café. O produtor da festa, Eduardo Vanini, 22, explica que desde a divulgação, não houve destaque para um artista ou uma manifesDivulgação/ Paula Velloso

O grafite de Gramboy onde nunca esteve: nas paredes do Café Acústico

tação. O evento foi realizado no dia 17 de outubro, no bar Café Acústico e teve um caráter um pouco diferente da proposta da Quitanda.“O Vitrine pode ser definido como uma balada com atmosfera cultural”, explica Vanini. Já para Cibele, a Quitanda não se encaixa no quesito festa, mas sim como um evento cultural, com um clima de happy hour. As festas se assemelham pelo fato de proporcionarem ao público, de forma simultânea, o contato com várias linguagens artísticas. Ganha o público A diversidade de atividades reflete no público. As festas são frequentadas por pessoas de diferentes idades e preferências culturais, embora a principal parcela seja formada por

estudantes e intelectuais, ressalta a produtora da Quitanda Cultural. E o público é um atrativo a mais das festas multiculturais. “Freqüento esse tipo de evento motivado por meu interesse pessoal pela cultura e por saber que lá vou encontrar pessoas com gostos diversos”, afirma o estudante do curso de Artes e Design da UFJF, Yan Queiroz, 19. Yan admite que apesar de gostar de ver os trabalhos dos artistas expostos nas festas, não iria ao evento se entre essas modalidades artísticas não estivesse presente a música. Também atraída pelos shows, a estudante de Comunicação Social da UFJF, Gabriela Praça, 20, acrescenta que as outras linguagens artísticas presentes na festa enriquecem o ambiente, conferindo um caráter cultural à noite.

Abertura para o diálogo O movimento é visto com entusiasmo pelos artistas locais, principalmente pela possibilidade de divulgação e contato com outros artistas e com o público. O Vitrine Café, por exemplo, surgiu da vontade da estilista Renata Oliveira, , em divulgar a sua marca. Sabendo das dificuldades em realizar um evento exclusivo para o seu trabalho, Renata procurou Eduardo Vanini, que fez o convite aos outros artistas participantes. A escolha dos expositores geralmente é feita dessa forma, por meio de convites e dos contatos dos artistas e produtores. A produtora da Quitanda diz que tem critérios pessoais de seleção, já que os interessados em participar do evento são muitos. As artistas plásticas Paula Velloso, ,e Tainá Novellino, ,montaram uma instalação no Vitrine Café. Para Velloso, essas festas ajudam a criar

uma rede de contatos entre os artistas da cidade e os produtores culturais. Além disso, ela tem a possibilidade de dialogar com o público e apresentar suas idéias. A estilista Maria Hallack, ,participou do Vitrine e do Mulheres no Volante sem o propósito de vendas, mas com o objetivo de expor seu trabalho. “O público nunca vai com o intuito de comprar”, enfatiza a estilista. O objetivo dos eventos multiculturais não é atingir diretamente a esfera comercial. De acordo com Cibele, “a Quitanda busca, ainda que gradativamente, plantar a semente da cultura na cidade”. A artista plástica Paula Velloso acredita que os eventos multiculturais seriam uma nova opção para a arte, “um novo lugar para ela habitar”. Infiltrar a cultura no cotidiano das pessoas é o diferencial desse tipo de festa.


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