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Letícia da Veiga Jardim* A OUVIDORIA BRASILEIRA COMO INSTRUMENTO DE CIDADANIA A BRAZILIAN OMBUDSMAN AS A TOOL FOR CITIZENSHIP LA DEFENSORÍA DEL PUEBLO BRASILEÑO COMO HERRAMIENTA PARA LA CIUDADANÍA

Resumo: Falar de ouvidorias públicas no Brasil significa falar do processo de redemocratização e do novo modelo de Administração Pública. O processo democrático, legitimado pela Constituição Federal de 1988, garantiu a participação do cidadão na Administração Pública. A abertura política e econômica do país e o amadurecimento da consciência cidadã trouxeram a necessidade de o Estado adotar um modelo de administração mais coerente com a nova realidade. As ouvidorias se desenvolveram frente a esse novo cenário como resposta à necessidade de dar mais voz ao cidadão, construir uma democracia participativa e melhorar a qualidade do serviço público. Embora o surgimento das ouvidorias tenha sido a princípio fruto de diversas imposições normativas, o singular modelo brasileiro se tornou um importante instrumento de cidadania. Abstract: Talk about public ombudsman in Brazil means speaking of the democratization process and the new model of public administration. The democratic process, legitimized by the Constitution of 1988, guaranteed the participation of citizens in public administration. The political and economic opening of the country and the maturation of social consciousness brought the need for the state to adopt a more coherent with the new reality model of administration. The ombudsmen have Especialista em Comunicação em Marketing pela Faculdade Araguaia. Graduada em Relações Públicas pela UFG e em Tecnologia em Eventos pela PUC-GO. Graduanda no MBA em Liderança e Gestão Empresarial pelo IPOG. Formação em Professional and self coaching pelo IBC. Servidora do MP-GO.

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developed towards this new scenario with the need to give greater voice to citizens, build a participatory democracy and improve the quality of public service. While the emergence of ombudsman has been the principle result of various regulatory constraints, the unique Brazilian model has become an important instrument of citizenship. Resumen: Hablar sobre el ombudsman público en Brasil significa hablar del proceso de democratización y del nuevo modelo de acdministración pública. El proceso democrático, legitimado por la Constitución de 1988, garantiza la participación de los ciudadanos en la administración pública. La apertura política y económica del país y la maduración de la conciencia social trajeron la necesidad de que el Estado adopte un modelo de administración más coherente con la nueva realidad. Los órganos defensores del pueblo se han desarrollado hacia este nuevo escenario como respuesta a la necesidad de dar más voz a los ciudadanos, construir una democracia participativa y mejorar la calidad del servicio público. Si bien la aparición del ombudsman ha sido el resultado a principio de diversas limitaciones regulatorias, el modelo brasileño único se ha convertido en un instrumento importante de la ciudadanía. Palavras-chaves: Democracia, cidadania, participação, Ouvidoria. Keywords: Democracy, citizenship, participation, Ombudsman. Palabras clave: Democracia, ciudadanía, participación, órgano defensor del pueblo.

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INTRODUÇÃO A história das ouvidorias tem seu processo relacionado às mudanças ocorridas nas últimas décadas. As reformas administrativas pelas quais o Estado passou e a redemocratização do Estado Brasileiro, legitimada pela promulgação de uma nova Constituição Federativa, reformularam vários conceitos anteriormente aceitos e introduziram, em seu ordenamento, outros novos. O conceito de democracia participativa, por exemplo, constitui um desses novos conceitos, já que a participação era antes restringida, na sua forma indireta, ao poder de voto do cidadão na escolha de seus representantes e na sua forma direta ao referendo, ao plebiscito e à iniciativa popular. Assim previu a Constituição Federal de 1988 em seu artigo primeiro, deixando, contudo, expresso na forma de normas programáticas1, a obrigação futura de o Estado estabelecer novas formas de aumentar a participação do cidadão na Administração Pública. Ao alçar a cidadania na Constituição Federal como fundamento do Estado, o termo é utilizado em sentido abrangente, ou seja, não como uma simples atribuição formal de direitos políticos ativos e passivos, sendo necessário que o Poder Público atue concretamente, a fim de incentivar e oferecer condições propícias à efetiva participação política dos indivíduos na condução dos negócios do Estado. Assim, o cidadão fará valer os seus direitos, controlando os atos dos órgãos públicos, cobrando de seus representantes o cumprimento de compromissos assumidos em campanha eleitoral e assegurando garantias materiais para a sua efetiva integração na sociedade política organizada (PAULO; ALEXANDRINO, 2012). O objetivo deste artigo é entender o papel das ouvidorias como um instrumento de cidadania e participação, situando-a no contexto da reforma administrativa, mais precisamente no modelo de administração pública gerencial e no processo de redemocratização do país iniciado na década de 1980 do século XX.

Normas programáticas: segundo Silva (2001), são aquelas que traçam princípios a serem cumpridos pelos órgãos estatais (legislativo, executivo, judiciário e administrativo) visando à realização dos fins sociais do Estado.

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O DESENVOLVIMENTO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA E A PARTICIPAÇÃO CIDADÃ NO ESTADO DEMOCRÁTICO A Administração Pública brasileira teve no governo de Getúlio Vargas a sua primeira reforma administrativa, a chamada Reforma Burocrática2, que tinha como intuito combater as práticas patrimonialistas vigentes, como o nepotismo, o clientelismo e a corrupção. Como não havia na cultura patrimonialista uma distinção entre o patrimônio público e o privado, o interesse público dependia unicamente dos interesses pessoais dos detentores do poder; o direito da população de participar das decisões tomadas praticamente não existia (CHIAVENATO, 2012). O modelo de administração burocrática, baseado nos estudos de Max Weber (apud CHIAVENATO, 2012), objetivava, por meio de regras e normas, obter mais eficiência, dispendendo, para isso, um maior controle dos meios, dando mais ênfase aos procedimentos que aos resultados. O principal atributo desse tipo de administração era mesmo a sua eficiência no controle de abusos cometidos em relação à Administração Pública. Por outro lado, o principal defeito era o de ser autorreferente, ou seja, um Estado voltado para si mesmo, sem a preocupação com o cidadão usuário do serviço público. Em 1964, com a instalação da ditadura militar, a voz do cidadão foi ainda mais reduzida. Embora a primeira tentativa de se implantar uma reforma gerencial tenha ocorrido durante esse período, por meio do Decreto-Lei n. 200/1967, não houve mudança significativa no que se refere à participação popular e o que ainda se observava eram fortes características patrimonialistas vigentes. A ausência do Estado Democrático de Direito3 impossibilitava a participação do Modelo burocrático: sistema racional-legal, modelo de administração baseado nos estudos de Max Weber, do qual decorre a legalidade das normas e as leis racionais (CHIAVENATO, 2012). 3 O Estado Democrático de Direito, segundo Silva (2001), é a conjugação do Estado de Direito com o Estado Democrático, aliado a um componente revolucionário de transformação social, de mudança do status quo e de promoção da justiça social, que está inscrito no artigo 1º da Carta Magna de 1988. O Estado de Direito é aquele que impõe a todos os cidadãos, sejam administrados ou administradores, o respeito à lei, e, tomada em seu amplo espectro como norma de maior hierarquia, a Constituição Federal. Já o Estado Democrático traria outros temas de igual relevância e descritos na própria norma constitucional, como a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa 2

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cidadão na atividade administrativa, que, por sua vez, só foi possível ser traçada após a redemocratização do país, embora efetivamente consolidada somente após a promulgação da Constituição Federal. A abertura política e o processo de redemocratização no Brasil, legitimada pela Constituição de 1988, significou o produto de uma intensa mobilização popular contra o regime militar, que culminou com o movimento “Diretas Já”, em 1984. A Constituição Cidadã4, como ficou conhecida, estabeleceu várias previsões de participação do cidadão na Administração Pública brasileira, entre elas as principais: Art. 1º Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta constituição. [...] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […] LXXIII- qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência. (BRASIL, 1988)

A participação cidadã, direito garantido constitucionalmente, representa uma forma de compartilhar as decisões políticas e administrativas, é um direito que o cidadão tem de ter acolhida sua opinião e de participar da tomada das decisões, dependendo, para isso, do amadurecimento da consciência cidadã e da vinculação do governante aos ideais democráticos e à transparência na gestão pública, humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político, à todos conferindo efetiva participação da sociedade no trato da coisa pública. 4 Expressão cunhada pelo presidente da Assembleia Nacional Constituinte, deputado Ulisses Guimarães, ao promulgá-la em outubro de 1988. Constituição cidadã foi o título de discurso proferido por Ulysses Guimarães, na presidência da Assembleia Constituinte, em 27 de julho de 1988, onde afirmou: “Repito: essa será a Constituição cidadã, porque recuperará como cidadãos milhões de brasileiros, vítimas da pior das discriminações: a miséria”. Disponível em: http://www.fugpmdb.org.br/ frm_publ.htm. Acesso em: 4 out. 2012.

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isso significa verdadeiro exercício da democracia participativa5 (BRESSER PEREIRA, 1998). A Constituição Federal também deixou expressos, em seu texto, os princípios constitucionais básicos que toda Administração Pública deve seguir, são eles: a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a publicidade. Em 1998, a Emenda Constitucional de número 19 inseriu um princípio fundamental e basilar para a Administração Pública, o princípio da eficiência: Art. 37 A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. (BRASIL, 1998)

Não obstante as inovações trazidas pela Constituição Federal, cuja preocupação em trazer para o texto normas detalhadas acerca da organização, do funcionamento da Administração Pública e da conduta dos agentes públicos, observando-se um cuidado especial com a proteção jurídica da moralidade e da probidade administrativa, houve a necessidade de uma revolução na forma prática e concreta de administrar a máquina pública (BRESSER PEREIRA, 1998). A forma burocrática de administrar o Estado, surgida nos quadros do capitalismo liberal, e não da democracia, revelou-se lenta, cara, autorreferente, autoritária e pouco voltada para o atendimento dos cidadãos, tornando-se, assim, cada vez mais superada devido ao custo crescente da máquina estatal, da baixa qualidade e da ineficiência dos serviços sociais prestados ao cidadão (BRESSER PEREIRA, 1998). A consolidação do ajuste fiscal6 do Estado brasileiro e a existência de um serviço público moderno, profissional e eficiente e voltado para o atendimento das necessidades do cidadão tornou-se O termo democracia participativa é um termo formulado recentemente, cunhado no século XX, tendo surgido principalmente pelo desgaste da democracia representativa. Embora suas raízes remontam ao conceito de democracia direta clássica, praticada na Grécia antiga, é decorrente do princípio da participação popular estabelecido na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional. A democracia participativa é uma concepção que busca articular a democracia representativa com mecanismos de democracia direta. (NAVARRO, 2003). 6 Conjunto de medidas adotadas pela autoridade monetária visando atingir superávit, ou seja, gastar menos do que arrecada (BRESSER PEREIRA, 1998). 5

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objetivo primordial. O paradigma gerencial surge da necessidade de o Estado dar mais eficiência, de reduzir custos, aumentar a qualidade dos serviços prestados e olhar o cidadão como beneficiário dos serviços prestados (BRESSER PEREIRA, 1998). A reforma gerencial do Estado Segundo Pereira (1998), a Reforma Gerencial da Administração Pública brasileira, tendo seu auge na segunda metade da década de 1990, visa ao processo de fortalecimento da responsabilização e da autonomia dos níveis gerenciais e tenta implantar a gestão por resultados na Administração Pública Federal, tornando o Estado mais governável e com mais capacidade de governança7. A abertura econômica do país teve seus primeiros reflexos no governo de Fernando Collor de Mello, tomando forma no governo de Fernando Henrique Cardoso. O novo cenário que se desenvolvia seguia uma nova ordem mundial, que, entre várias outras exigências, obrigava os países a combaterem a corrupção, a obter mais transparência na Administração Pública e a propiciar mais participação do cidadão (BRESSER PEREIRA, 1998). A administração gerencial era o modelo que viabilizava o Brasil a se integrar a essa nova realidade mundial, já que o modelo burocrático não se adequava à nova configuração advinda da expansão das funções econômicas e sociais do Estado e do desenvolvimento tecnológico e econômico mundial. Ao contrário da burocracia, na qual o controle se fazia em relação aos meios, o modelo gerencial dava mais ênfase aos resultados, ou seja, ao próprio fim a que se destina a Administração Pública, que é o interesse público e o cidadão. O fato mais importante trazido pela Reforma do Aparelho do Estado, de 1995 a 1998, foi o de criar meios de se estabelecer uma maior participação do cidadão na atividade administrativa, criando o novo conceito de cidadão usuário do serviço público. Governança refere-se à forma adotada pelo Estado para implementar seus projetos, sendo os pré-requisitos institucionais para a otimização do desempenho administrativo. Já a governabilidade refere-se à capacidade do Estado de obter apoio e articular alianças entre os vários grupos sociais com o objetivo de viabilizar a implantação de seus projetos (BENTO, 2003).

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O modelo burocrático, inserido em uma democracia apenas representativa, limitava a participação do cidadão, já que a Administração Pública detinha um total desinteresse em relação aos anseios da população (BRESSER PEREIRA, 1998). As teorias sistêmicas tecnocráticas8, cuja referência principal é Parsons e Luhmann (apud BENTO, 2003), que justificam essa gerência silenciosa do Estado, afirmam que o papel da população na burocracia é aclamativo ou, no máximo, reativo, mas jamais, ou raramente, participativo. A gestão pela qualidade na Administração Pública tem sua primeira tentativa nas novas diretrizes traçadas pelo Plano Diretor9 da Reforma do Aparelho do Estado (1995), que tinha, entre outros objetivos, aumentar a governança do Estado, ou seja, sua capacidade administrativa de governar com efetividade e eficiência, voltando a ação dos serviços do Estado para o atendimento dos cidadãos (LIMA, 2007). 8 A teoria de sistemas, cujos primeiros enunciados datam de 1925, foi proposta em 1937 pelo biólogo Ludwig Von Bertalanffy, tendo alcançado o seu auge de divulgação na década de 1950. Sistema pode ser definido como um conjunto de elementos interdependentes que interagem com objetivos comuns formando um todo, e onde cada um dos elementos componentes comporta-se, por sua vez, como um sistema cujo resultado é maior do que o resultado que as unidades poderiam ter se funcionassem independentemente. Qualquer conjunto de partes unidas entre si pode ser considerado um sistema, desde que as relações entre as partes e o comportamento do todo sejam o foco de atenção (ALVAREZ, 1990). Já o termo “tecnocracia” significa poder da aptidão e foi inventado pelo engenheiro estadunidense William Henry Smith. Essa forma de governo atribuiria à ciência as diretrizes do governo, de tal forma que os profissionais tecnológicos estariam relacionados com a governabilidade, em função de seus respectivos conhecimentos e da habilidade conquistada com a experiência. Ou seja, o governo não seria gerido por políticos, economistas ou gestores administrativos, as decisões do Estado passariam por profissionais reconhecidos por suas qualidades acadêmicas e práticas exercidas nas suas respectivas áreas de atuação. A aplicação dos métodos tecnocráticos ao Estado gera alterações maiores do que simplesmente contar com especialistas nos cargos de governo. Os indivíduos escolhidos para os cargos não seriam mais escolhidos pelo voto direto característico das eleições com as quais convivemos, mas indicados e escolhidos por um processo burocrático e indireto que levasse em consideração o conhecimento e o desempenho profissional do candidato. Por esse motivo, muitas vezes a Tecnocracia é confundida com a Meritocracia (CABRAL, 2003). 9 O Plano Diretor da Reforma do Estado foi elaborado pelo Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado, aprovado pela Câmara da Reforma do Estado em sua reunião de 21 de setembro de 1995. Em seguida, foi submetido ao Presidente da República, que o aprovou na forma ora publicada. Disponível em: http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf. Acesso em: 12 out. 2012.

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O programa “Qualidade no Serviço Público”, traçado pelo então Ministro da Fazenda, Luiz Carlos Bresser Pereira, apresentavase no plano diretor como um instrumento capaz de conduzir cidadãos e agentes públicos ao exercício prático de uma Administração Pública participativa, transparente, orientada para resultados e preparada para responder às demandas sociais. Assim, os novos traços da Administração Pública foram identificados como princípios elementares dessa nova administração: eficiência, transparência e participação. Uma tentativa de buscar mais excelência na Administração Pública, além de uma governança mais eficiente e uma consequente melhora na governabilidade. Calame (apud BENTO, 2003) descreve as oito principais características da boa governança, como: participação; Estado de Direito; transparência, responsabilidade, orientação por consenso; igualdade e inclusividade; efetividade e eficiência; e prestação de contas, accountability10. Atualmente, novas ações estão sendo desenvolvidas, a fim de possibilitar que o cidadão cobre mais transparência11 no serviço público. É o caso, por exemplo, da nova lei de acesso à informação pública, Lei 12.527/201112, que obriga os órgãos públicos a divulgarem informações Accountability é um termo da língua inglesa sem tradução exata para o português que remete à obrigação dos agentes públicos de prestar contas a instâncias controladoras ou a seus representados. Há três tipos de accountability: o vertical, que são as atividades de fiscalização feitas pelos cidadãos e pela sociedade, procurando estabelecer formas de controle de baixo para cima, ocorre por meio de plebiscito, referendo e voto; a accountability horizontal é feita pelos mecanismos institucionalizados de controle e fiscalização, no formato de peso e contrapeso, abrangendo os Poderes e também as agências governamentais que tenham como finalidade a fiscalização do Poder Público e de outros órgãos estatais, como, por exemplo, os Tribunais de Contas; e o accountability social, que não está ligado ao cidadão e ao voto, mas às diversas entidades sociais, como associações, sindicatos, ONGs, mídia, etc., que investigam e denunciam abusos cometidos e cobram responsabilização (BENTO, 2003). 11 As novas regras de transparência com o dinheiro público estão na Lei Complementar 131, um adendo à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) aprovada pelo Congresso em 2009. Estados e municípios com mais de cem mil habitantes devem se adequar à lei, que torna obrigatória a divulgação de receitas e despesas na internet. Em obediência à lei, os órgãos estão lançando portais da transparência que prometem atender as exigências da nova legislação (DEBUS, 2000). 12 A Lei 12.527, de 18 de novembro de 2011, regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do artigo 5o, no inciso II do § 3o do artigo 37, e no § 2o do artigo 216 da Constituição Federal; altera a Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga 10

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sobre as ações administrativas, concretizando o direito constitucional de petição, consubstanciado no artigo 5º da Constituição Federal: Art. 5º. [...] XXXIII – todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.

A Lei 12.527/2011 representa mais uma forma legitimada de accountability, que, embora seja um termo de origem remota, passou a ser utilizado no Brasil a partir da redemocratização do país, anos 1980 e 1990 do século XX, representando uma forma de exigir mais transparência e ética na Administração Pública (BENTO, 2003). O objetivo fundamental dos regimes democráticos é aumentar a responsabilização (accountability) dos governantes, que devem estar permanentemente prestando contas aos cidadãos. Além de uma ferramenta de controle, o accountability estimula a participação do cidadão no controle e na avaliação da prestação dos serviços públicos, cabendo aos governos criarem meios para que o cidadão possa exercer esse tipo de controle, estruturando os órgãos com canais voltados especificamente para recebê-lo, atendendo de forma direta a suas queixas e fornecendo a ele as informações de que necessita. Nesse sentido, as ouvidorias representam um importante instrumento de cidadania e de accountability (BENTO, 2003).

OUVIDORIAS NO CONTEXTO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA GERENCIAL Segundo Oliveira (2005), conceitua-se ouvidoria como um canal de comunicação direta entre o cidadão e o Poder Público, representando a Lei no 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências. BRASIL, Lei 12.527 (2011).

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um órgão interlocutor da sociedade que recebe reclamações, denúncias, sugestões e elogios, estimulando a participação do cidadão no controle e na avaliação da prestação dos serviços públicos. As ouvidorias só surgiram no Brasil após a redemocratização do país e se desenvolveram apenas a partir da consolidação do modelo de administração pública gerencial. Enquanto o Estado vivia uma democracia apenas representativa e uma administração autorreferente, não havia o interesse do Estado em criar novos instrumentos de participação e de cidadania. As ouvidorias, como um instrumento capaz de dar voz ao cidadão, surgiram da necessidade de responder aos anseios democráticos e emancipatórios advindos dos movimentos sociais, da luta pelo direito à cidadania e da necessidade de o próprio Estado instrumentalizar a democracia participativa, levando o cidadão ao âmbito da gestão pública. A ouvidoria pública é o legítimo canal que viabiliza a comunicação entre o cidadão e o Poder Público (ORGANICOM, 2010). A partir do advento de uma administração mais voltada para os resultados, para a excelência e para a eficiência do serviço público passou-se a objetivar mais participação do cidadão usuário, estimulando-o a exercer a sua cidadania indo em busca do controle e da avaliação da prestação dos serviços públicos, além de objetivar também mais transparência na condução das práticas administrativas (BRESSER PEREIRA, 1998). Nesse sentido, as ouvidorias tornamse também um valioso instrumento de accountability, à medida que oferecem ao cidadão meios de fiscalizar a administração não só quanto aos gastos públicos e à alocação de recursos, mas quanto a uma maior efetividade na execução das políticas públicas. As ouvidorias foram constituídas, ademais, como uma ferramenta gerencial e estratégica para a melhoria do serviço público. Porém, assim como a administração gerencial, as ouvidorias ainda encontram-se em fase de consolidação. A constituição das ouvidorias decorreu, de modo geral, do cumprimento de uma obrigação legal, por meio de leis federais, estaduais, municipais e decretos sancionados em diversos estados e municípios, como é o exemplo da Emenda Constitucional n. 45/2004, conhecida como Reforma do Judiciário, que, objetivando contribuir para a melhoria dos padrões de transparência e presteza das atividades desenvolvidas, estabeleceu a obrigatoriedade da implantação 321


de ouvidorias em todos os órgãos do judiciário. Embora não haja previsão expressa da instituição das ouvidorias na Constituição Federal, sua criação é uma forma de regulamentar e viabilizar a exigência de participação prevista no artigo 37 da Constituição Federal, que descreve: Art. 37 – A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […] § 3º – A lei disciplinará as formas de participação do usuário na Administração Pública direta e indireta, regulando especialmente: I – as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços; II – o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII; III – a disciplina da representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na Administração Pública. (BRASIL, 1988)

É possível identificar, nesse inciso, algumas atribuições realizadas hoje pelas ouvidorias: receber reclamações relativas às prestações dos serviços públicos, avaliar e controlar a qualidade dos serviços, promover o acesso dos usuários aos registros públicos e representar contra condutas irregulares e funcionais de agentes e servidores públicos no desempenho de funções públicas. De acordo com esse dispositivo, a ouvidoria exerce as funções de receber reclamações e atender solicitações, dando ao cidadão o direito não só de receber as informações que necessita, mas de exercer o controle e exigir mais transparência na atividade administrativa. Segundo a definição de Iasbeck (2010, p. 16), as ouvidorias constituem um serviço especial prestado pelas organizações aos seus públicos. A essência desse serviço está apoiada no reconhecimento de que todo usuário de serviços públicos ou privados que eventualmente fica insatisfeito com o serviço recebido pode, portanto, reclamar, criticar, pedir reparação, sugerir novas formas de prestação 322


de serviço e, em alguns casos, pode até mesmo ficar tão satisfeito que necessite elogiar. As funções das ouvidorias ainda são confundidas com as funções das corregedorias13, já que o cidadão, muitas vezes, busca a ouvidoria para fazer reclamações a respeito de faltas funcionais de agentes públicos que exercem suas atividades no respectivo órgão. Embora as ouvidoras tenham a legitimidade para receber esse tipo de reclamação, não é atribuição dela resolver tais pendências, pois não podem instaurar processo administrativo disciplinar, tampouco aplicar penalidades. Porém, possuem a responsabilidade de encaminhar as reclamações ao órgão respectivo, cobrar providências e dar uma resposta ao cidadão (IASBECK, 2012). Há, ainda, certo receio das pessoas em procurar o órgão para fazer alguma reclamação ou denúncia devido à inexistência do conhecimento não só das atribuições das ouvidorias, mas também do conhecimento sobre a sua neutralidade, já que ela existe a fim de representar o cidadão diante da instituição de que faz parte. Assim, o cidadão ainda possui certa desconfiança de que as instituições públicas existem para lhe servir e que realmente solucionarão seus problemas. Tudo isso faz parte de um difícil e demorado processo de mudança de cultura que a Administração Pública brasileira vem sofrendo, e que ainda guarda resquícios de uma cultura burocrática e autorreferente que vigorou por vários anos e ainda persiste em muitos órgãos (BRAZ e VARÃO, 2012).

13 Ouvidoria, Controladoria e Corregedoria: A Ouvidoria é um órgão de uma empresa ou instituição responsável por receber manifestações, como reclamações, denúncias, elogios, criticas e sugestões dos cidadãos, instituições, entidades e agentes públicos quanto aos serviços e atendimentos prestados dentro da empresa ou instituição, se encarrega de levar adiante as manifestações e conseguir respostas adequadas, até mudanças nos procedimentos da organização. Por sua vez, a Controladoria, em uma empresa ou organização, representa um conjunto de mecanismos de coordenação e controle das relações contratuais, internas à empresa, ou entre a empresa e terceiros, incluindo contratos simples de fornecimento, ou complexos, atua como geradora de equilíbrio nas relações, sendo alimentada pelas informações providas pela Contabilidade. Já a corregedoria é um órgão dentro de uma organização, e serve para orientação e fiscalização das atividades funcionais e da conduta de seus membros, cabendo a ela realizar inspeções e emitir relatórios reservados. As corregedorias são órgãos que realizam atividades internas, sem contato com o público externo da organização. Disponível em: http://www.avozdocidadao.com.br/quintal_globo_43_a.asp. Acesso em: 12 out. 2012.

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As ouvidorias, no contexto da administração pública gerencial, funcionam como uma ferramenta de mediação, técnica não adversarial de resolução de conflitos pela qual o cidadão usuário do serviço público busca o auxílio de um órgão neutro e especializado, aliviando suas pressões e compreendendo melhor as reais circunstâncias do problema. A ouvidoria, como um espaço de produção de conhecimento e mudança, possibilita às partes transformarem seus problemas em oportunidades para a construção de soluções, antecipando a prevenção de conflitos. Ao ampliar o ouvir, expande-se também a capacidade de entendimento sobre a própria organização, sendo o ouvir essencial para o trabalho de relacionamento com os públicos à medida que posiciona a Administração Pública no seu papel de interlocutora. As ouvidorias produzem uma forma especial de interlocução e uma ferramenta de gestão estratégica de melhoria no serviço público (BASTOS, MARCHIORI e MORAES, 2012). As ouvidorias têm a possibilidade real de humanizar as relações organizacionais, o que as torna fundamentais na Administração Pública. O cidadão, ao buscar um canal aberto para o diálogo, vê a possibilidade de se sentir parte integrante do processo organizacional ao saber que seus problemas serão ouvidos e suas necessidades atendidas. É a caracterização da construção de um serviço público mais humanizado, capaz de estar mais próximo do cidadão (ROMAN, 2012). O ouvidor, de forma humanizada na relação administraçãocidadão, e como seu porta-voz, assume sua representação por meio das manifestações recebidas, transformando suas demandas em algo público e oficial. Com a publicidade de seus atos, relatórios e respostas, torna-se crescente, por parte da população, a credibilidade da Administração Pública (COELHO, 2012). É preciso enfatizar a ouvidoria como uma mídia organizacional e uma instância mediadora de comunicação entre organizações e públicos, cuja função primordial é curar vínculos estremecidos no relacionamento entre esses dois entes. Grande parte dos problemas recebidos pelas ouvidorias públicas são conflitos insolúveis de interesse entre cidadão e Estado, porém, não compete à ela, por sua natureza mediadora, julgar tais conflitos, mas sim intermediá-los, de modo a conduzi-los a uma solução possível. A mediação acontece entre os envolvidos e, portanto, a ouvidoria, embora represente o cidadão para 324


a organização e a organização para o cidadão, não pode assumir papéis de defesa nem de ataque (IASBECK, 2012). A ouvidoria é um legítimo canal de comunicação de fundamental importância para a estrutura organizacional, um instrumento de aprimoramento e avaliação permanente da instituição no serviço de informação, qualidade e controle eficaz. Nessa perspectiva, a ouvidoria representa: […] um serviço que auxilia o cidadão em suas relações com o Estado possibilitando-lhe exercer o controle de qualidade do serviço público. Fundamenta-se a Ouvidoria no tripé: qualidade, informação e controle, sendo, portanto, um canal legítimo para coparticipação do cidadão na gestão da Administração Pública. A ouvidoria tem por objetivo manter e aprimorar o canal de diálogo e o foco das atenções no cidadão usuário. O princípio fundamental da ouvidoria é a existência de um ouvidor, que funciona como representante dos clientes externos e internos da organização. (SEAS, 2007)

Pela implantação de ouvidorias públicas, amplia-se o mecanismo de controle social, permitindo mais transparência na Gestão Pública, promovendo a democracia e fortalecendo a cidadania. Desenvolvimento das ouvidorias no Brasil Apesar da figura do ouvidor ser conhecida no Brasil desde o período colonial, quando, em 1549, Tomé de Sousa nomeou o primeiro Ouvidor-Geral do Brasil, Pero Borges, as atribuições diferenciam-se das atuais. A função do ouvidor da colônia era a de representar a administração da justiça real portuguesa, atuando como um juiz e em nome do rei (ORGANICOM, 2010). As ouvidorias, como instrumento democrático capaz de estabelecer um canal eficaz de comunicação entre o cidadão e a administração, só foi possível após a abertura democrática do país, já que o simples debate a respeito da criação de canais de comunicação entre a estrutura de poder e a população tomou firmeza somente em 1983, quando gradualmente ressurgiram os primeiros sinais de abertura democrática Assim, em 1986, por meio do Decreto-Lei n. 215/1986, foi criada a primeira Ouvidoria Pública no recém-democratizado Brasil, na 325


cidade de Curitiba. A partir da criação desta, foram instituídas ouvidorias em todo o Brasil em âmbito nacional e estadual, tendo o auge acontecido na década de 1990. Em 1999, o estado de São Paulo promulgou a lei de proteção ao usuário do serviço público e determinou a criação de ouvidorias em todos os órgãos, conforme o decreto estadual 10.294/1999 (BASTOS, 2007). De acordo com a Legislação Federal, tem-se: - A lei n. 8.490/1992 previu a criação de uma Ouvidoria-Geral da República na estrutura organizacional do Ministério da Justiça; - A lei n. 9.649/1998, dispondo igualmente sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, manteve no âmbito do Ministério da Justiça a atribuição de Ouvidoria-Geral; - O decreto n. 4.118/2002, com redação dada pelo Decreto n. 4.177/2002, delimitou à competência do Ministério da Justiça a função de Ouvidoria-Geral de Direitos Humanos e Ouvidorias das Polícias Federais, e inseriu na competência da Controladoria-Geral da União a função de Ouvidoria-geral do Poder Executivo Federal; - A lei n. 10.683/2003 e o Decreto n. 4.785/2003 atribuem à Controladoria Geral da União (CGU), além das funções de correição, de controle interno e de auditoria pública, a função de Ouvidoria-Geral no âmbito do Poder Executivo Federal. - A lei n. 10.689/2004 ajusta a denominação de Ouvidoria-Geral da República para Ouvidoria-Geral da União, que, pelo Decreto n. 4.785/2003, tem, entre outras, a competência de coordenar tecnicamente o segmento de ouvidorias do Poder Executivo Federal. As ouvidorias públicas, implantadas inicialmente por determinação legal, foram instituídas sem que tal iniciativa fosse necessariamente precedida pela preparação espontânea ou sistemática de seus servidores para esse novo tipo de atividade. No entanto, isso não impediu que se proliferassem, cada qual buscando modelos e capacitações adequadas para responder às suas necessidades. Algumas instituições foram criadas para congregar as ouvidorias por área de afinidade ou natureza de atuação, tais como a Associação Brasileira de Ouvidorias (ABO), a Ouvidoria-Geral da União (OGU), vinculada à Controladoria Geral da União, a Associação Nacional de Ouvidorias Públicas (ANOP), dentre outras. Essas instâncias organizadoras 326


rapidamente se estruturaram em torno de normas, regras, códigos de procedimento e conduta como forma de disciplinar, enquadrar modelos espontâneos de ouvidorias que surgiam de forma cada vez mais acelerada, tornando-se também pontos de apoio e orientação (IASBECK, 2012). Um marco significativo para a evolução das ouvidorias se dá no início da década de 90 do século XX, com a introdução da lei n. 8.078/1990, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Com a instituição da Lei, proliferaram o número de Serviço de Atendimento ao Consumidor (SACs) e a adoção, por parte das empresas de sistemas de individualização de atendimentos, como é o caso do Customer Relationship Management (CRM), técnica que consiste em montar um banco de dados cadastrais de consumidores a fim de gerar informações que subsidiam contatos comerciais individualizados. Apesar de o CRM ficar restrito apenas às organizações privadas, o serviço público foi atingido pelo reflexo dessa nova cultura de marketing one to one14, já que a novidade sensibilizou positivamente os consumidores, que passaram a enxergar uma nova oportunidade de exigirem mais qualidade na produção de bens e serviços (IASBECK, 2012). Sem dúvida alguma as ouvidorias públicas ganharam, com o Código de Defesa do Consumidor, uma grande repercussão, amparadas pela Constituição Federal de 1988. Sabendo que o código não abrange somente relações privadas de consumo, o serviço público é também objeto de regulamentação, prescrevendo a este melhoria contínua e serviços de qualidade. É o caso da relação entre o cidadão e as instituições públicas que exercem atividades lucrativas ou remuneradas, como as concessionárias e as empresas públicas, podendo estas ser acionadas judicialmente caso haja falha na execução dos O marketing One to One é uma das mais emergentes ferramentas de marketing que surgiram com a nova economia, consistindo em contatos diretos que ocorrem individualmente entre a empresa e um cliente (ou grupo de clientes com necessidades idênticas), deve ser utilizado para conseguir uma relação personalizada, de forma a conhecer o cliente de modo suficiente para poder oferecer a cada categoria os bens e serviços mais adequados. Essa ferramenta é fundamental na fidelização dos clientes, contribuindo para a maximização da receita média por cliente. As ações desenvolvidas nesse âmbito visam a satisfação das necessidades do consumidor, constituindo a base para a criação de uma relação duradoura, na conquista da sua confiança e lealdade à marca (PEPPERS e ROGERS, 2001).

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serviços, já que, como para qualquer outro serviço, o código também estabelece as mesmas regras e obrigações. Portanto, para o fornecimento público de gás, telefone, saneamento básico e demais serviços pagos pelos consumidores há também a obrigatoriedade de oferecer um serviço de qualidade, podendo o consumidor ser restituído pelo serviço não prestado e até mesmo ser indenizado por algum dano sofrido por conta de um serviço mal prestado (IASBECK, 2012). O CDC contempla a responsabilidade do Estado na prestação de serviços públicos, refletindo em uma das razões para que as organizações governamentais cumpram suas obrigações contratuais, explícitas ou implícitas, e busquem padrões de qualidade compatíveis com as exigências dos clientes, usuários, cidadãos e da sociedade. Embora os Órgãos de Proteção ao Consumidor (PROCONs) sejam as instituições responsáveis pela mediação de conflitos15 relacionados ao consumo de bens e serviços, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) recomenda que, a princípio, o consumidor contate formalmente a instituição responsável pelo fornecimento do serviço. As ouvidorias, quando presentes nesses órgãos, são as responsáveis por receber as reclamações e providenciar as devidas soluções para o problema. É o caso da Agência Reguladora de Serviço de Abastecimento de Água e Esgoto do estado de Minas Gerais, que possui uma ouvidoria para receber reclamações e solucionar os problemas de fornecimento: A Ouvidoria da ARSAE-MG deverá ser procurada sempre que, após os atendimentos registrados pelas Concessionárias (telefônicos, eletrônicos, presenciais ou por carta), permanecerem as seguintes questões: - O usuário dos serviços públicos de abastecimento de água ou de esgotamento sanitário necessite de orientação quanto à legislação, serviços e procedimentos envolvidos na prestação de serviços O Procon, presente nos estados e municípios brasileiros, com personalidade jurídica de direito público, tem como objetivo elaborar e executar a política estadual de proteção e defesa do consumidor. Ele funciona como um órgão auxiliar do Poder Judiciário, tentando solucionar previamente os conflitos entre o consumidor e a empresa que vende um produto ou presta um serviço, e, quando não há acordo, encaminha o caso para o Juizado Especial Cível com jurisdição sobre o local. O Procon pode ser estadual ou municipal, e, segundo o artigo 105 da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), é parte integrante do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SOBRINHO e SILVA, 2010).

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públicos de abastecimento de água e de esgotamento sanitário no Estado de Minas Gerais. - O usuário, ao registrar uma reclamação no serviço de atendimento, não for atendido; - O usuário obtiver uma resposta precária ou não satisfatória por parte da concessionária; - A concessionária não solucionar o problema registrado de maneira adequada. Disponível em: www.arsae.mg.gov.br. Acesso em: 4 out. 2012.

Com as novas tecnologias, as ouvidorias têm conseguido alcançar suas funções com mais eficácia por meio da utilização de ferramentas como a internet, que possibilita mais proximidade com o usuário da instituição. Atualmente bastante utilizada nas ouvidorias, especialmente por meio do correio eletrônico e do sistema “fale conosco”16, a ferramenta possibilita ao cidadão encontrar mais agilidade no fluxo da informação, evitando a morosidade que porventura acontece nos atendimentos pessoais ou por telefone (IASBECK, 2012). As novas tecnologias de comunicação e informação estão mudando o relacionamento entre as instituições e seus diferentes públicos, sejam eles internos ou externos. Podemos destacar, principalmente a internet (IASBECK, 2012). A internet vem demonstrando ser mesmo uma poderosa ferramenta capaz de proporcionar mais transparência e agilidade nos sistemas de comunicação das instituições. Por meio dos Portais de Transparência17, que estão sendo implantados em diversos sites de O Sistema “fale conosco” é um sistema de acompanhamento online disponível ao usuário, que geralmente funciona como um link que o usuário pode acionar em um site, efetuando um cadastro que será formalizado, gerando um número de solicitação pelo qual poderá acompanhar o andamento de sua manifestação. As reclamações podem ser respondidas por meio de e-mail, telefone ou por acompanhamento no próprio site. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) já trabalha com esse instrumento. Disponível em http://www2.anac.gov.br/arquivos/pdf/ sistemaFaleConosco.pdf. Acesso em: 15 outubro 2012. 17 O Portal da Transparência do Governo Federal é uma iniciativa da ControladoriaGeral da União (CGU), lançada em novembro de 2004, para assegurar a boa e correta aplicação dos recursos públicos. O objetivo é aumentar a transparência da gestão pública, permitindo que o cidadão acompanhe como o dinheiro público está sendo utilizado e ajude a fiscalizar. O Governo brasileiro acredita que a transparência é o melhor antídoto contra corrupção, dado que ela é mais um mecanismo indutor de que os gestores públicos ajam com responsabilidade e permite que a sociedade, com informações, colabore com o controle das ações de seus governantes, no intuito 16

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instituições públicas, principalmente no poder executivo, embora cumprindo imposições legais, amplia-se ainda mais as formas de controle social. O uso da internet nas ouvidorias como ferramenta eficaz de comunicação é uma consequência do surgimento da nova sociedade em rede18, mais aberta e interativa, e a consequente formação do Estado em rede. Ouvidorias públicas brasileiras como modelo único Apesar de poucas décadas de existência no Brasil, as ouvidorias adquiriram uma personalidade própria, evoluindo de acordo com nossas peculiaridades políticas, legais e históricas, além de nossas diversidades culturais e regionais, apresentando-se, assim, como um modelo de recepção comum, simples, original e de fácil acessibilidade. O modelo de ouvidoria brasileiro corresponde a um modelo único que em muito difere do modelo clássico do ombudsman19, desenvolvido na Suécia e presente em vários países europeus. Apesar

de checar se os recursos públicos estão sendo usados como deveriam (BRASIL, Portal da Transparência do Governo Federal (2012). Disponível em: http://www.portaltransparencia.gov.br. Acesso em: 04 out. 2012. 18 O sistema de rede refere-se não somente às tecnologias e à internet, mas também ao modelo de Estado em rede inserido no contexto do novo conceito de sociedade em rede, uma conjugação de esforços com obrigações recíprocas dos partícipes de colaboração para a adequada prestação de serviços públicos. O Estado em rede, por sua vez, indica o Estado não mais como organização inteiramente hierarquizada e uniforme, mas com estrutura de rede com uma multiplicidade de poderes públicos que se interconectam sem haver necessariamente uma hierarquização, mas sim uma interdependência. A noção de Estado em rede implica a integração dos diversos entes integrantes da estrutura político-administrativa do Estado em outros entes, nacionais e internacionais, públicos ou privados, construindo os mecanismos de realização das tarefas públicas por intermédio de redes de cooperação de interesses abrangidos pelo conceito amplo de interesse publico. Uma consequência desse novo modelo de Estado-Administração será o compartilhamento da autoridade do Estado, que não mais se impõe exclusivamente em razão de uma relação de poder da ênfase e do caráter vertical da relação de administração Estado-cidadão, mas observa um abrandamento da ideia e da subordinação do indivíduo em relação ao Estado (PAULA, 2005). 19 Ombudsman é uma palavra de origem sueca que surgiu em 1809 quando o Parlamento da Suécia decidiu ter um representante do cidadão no Parlamento. “Ombuds” quer dizer representante e “man” cidadão, ou seja, “ombudsman” quer dizer “representante do cidadão” ( LYRA, 2000)

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de os dois modelos terem adotado conceitos parecidos nas suas ações operacionais, não podem ser considerados instituições iguais. O principal diferencial é o de que o ombudsman clássico transita do lado externo da administração, sendo uma figura individual, autônoma, com independência plena e autonomia em suas ações, escolhido por meio de eleição ou nomeada pelo Parlamento para um mandato fixado com a função de defender os interesses e os direitos dos cidadãos. Já o nosso modelo tem uma configuração diferente, ao contrário do ombudsman, a maioria das ouvidorias brasileiras tem como característica principal o fato de serem órgãos integrantes da Administração Pública, exercendo suas ações de modo individual como um Ouvidor ou então como um sistema em rede, usando a reclamação como forma de controle interno das instituições e sistematizando a representação do cidadão usuário na qualidade de destinatário do serviço público. O ouvidor assume, assim, seu papel de representante do cidadão, transformando uma simples reclamação em algo público e oficial (OLIVEIRA, 2010). O Brasil não possui um modelo de ombudsman nacional devido, principalmente, às características do nosso sistema federativo, sendo este modelo clássico substituído, de certa forma, pelas atribuições funcionais do Ministério Público20, que exerce papel semelhante ao do ombudsman no parlamento sueco. Como defensor constitucional dos direitos e com poder de independência adquiridos após a promulgação da Constituição Federal de 1988, o Ministério Público brasileiro aproxima-se da figura do ombudsman clássico escandinavo, diferindo deste apenas por não recepcionar reclamações Ministério Público responsável pela defesa dos direitos sociais e individuais indisponíveis, direitos dos quais a pessoa não pode abrir mão, como o direito à vida, à liberdade, à saúde, à ordem jurídica e ao regime democrático. As funções do Ministério Público incluem também a fiscalização da aplicação das leis, a defesa do patrimônio público e o zelo pelo efetivo respeito dos poderes públicos aos direitos assegurados na Constituição. O Ministério Público tem autonomia na estrutura do Estado: não pode ser extinto ou ter atribuições repassadas a outra instituição. Seus membros (procuradores e promotores) têm liberdade para atuar segundo suas convicções, com base na lei. São as chamadas “autonomia institucional“ e “independência funcional“ do Ministério Público, asseguradas pela Constituição. As atribuições e os instrumentos de atuação do Ministério Público estão previstos no artigo 129 da Constituição Federal, no capítulo “Das funções essenciais à Justiça“. As funções e as atribuições do MPU estão dispostas na Lei Complementar n. 75/1993 (BRASIL, Ministério Público Federal, 2012).

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estritamente individuais, já que este órgão atua na defesa de direitos difusos21 e coletivos (LYRA, 2010). O nosso modelo particular de ouvidoria, situado no seio da Administração Pública, mesmo com falhas nas suas condições de independência funcional, representa hoje um canal eficiente de diálogo com a população, uma porta aberta para a participação popular que, ao ouvir as reivindicações e reclamações populares, torna-se um celeiro de recomendações para a melhoria do serviço público. Apesar de ter sofrido inicialmente diversas críticas e se defendido destas como o mais adequado à nossa realidade política e socioeconômica, bem como em relação ao nível de participação popular, nos últimos dez anos se transformou em um modelo de inspiração (OLIVEIRA, 2010). Com a evolução das instituições e da consciência dos cidadãos sobre seus direitos, diversos países começaram a deixar de lado o pesado modelo do ombudsman clássico para repensar um modelo setorizado e especializado, assim como os modelos presentes no Brasil. Canadá, Estados Unidos, Inglaterra e Austrália são alguns exemplos de países que resolveram se inspirar nas ouvidorias brasileiras, instalando modelos similares (OLIVEIRA, 2010). A ouvidoria brasileira constitui um canal de diálogo com a população, uma porta aberta para a participação popular, sempre pronta para ouvir as reivindicações, reclamações e recomendações para a melhoria do serviço público. Um modelo autêntico, democrático e uma mídia capaz de conciliar conflitos e agilizar soluções. Porém, segundo João Elias de Oliveira, pioneiro na implantação de ouvidorias públicas no país, ao fundar a primeira ouvidoria na cidade de Curitiba, o modelo de ouvidoria brasileiro não está pronto e talvez nunca possa se dar por resolvido e acabado, pois, tendo passado por diversas dificuldades na sua implantação, imposta por decretos e leis, ainda sofre dificuldades e diversos desvios. Os direitos difusos e coletivos encontram equivalência apenas com relação à natureza indivisível do bem jurídico, ou seja, seu objeto. Isso significa que não é possível satisfazer apenas um dos titulares dos interesses difusos ou coletivos. A satisfação de um implica necessariamente na satisfação de todos. A primeira diferença entre estes interesses reside na titularidade. Os interesses difusos têm como seus titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato, enquanto os interesses coletivos têm como titulares as pessoas integrantes de um determinado grupo, categoria ou classe (BASTOS, 1999).

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Ao serem criadas por imposição firmada em leis ou decretos, algumas ouvidorias apenas cumprem a obrigação legal, não se importando se serão competentes, eficientes ou eficazes, mostrando uma falsa transparência à administração. Nota-se, principalmente no Governo Federal, uma fixação pelo Poder Público brasileiro em se querer elencar como sinônimo de competência, uma disseminação indiscriminada de ouvidorias pelo Poder Público brasileiro em órgãos que sequer possuem uma demanda significativa por reclamações que justifique a existência de uma ouvidoria. Não se verifica, portanto, na sua instituição, os critérios de economicidade e de eficácia (OLIVEIRA, 2010). Outra crítica feita por Oliveira (2010) é a de que, diferentemente do ombudsman clássico, as ouvidorias no serviço público brasileiro são majoritariamente comandadas por pessoas indicadas politicamente, e o perfil de um órgão de controle interno, sem a devida autonomia e independência, faz com que seus dirigentes atuem muitas vezes como instrumento de defesa dos seus órgãos, em vez de representantes dos cidadãos, de modo a não ferir a suscetibilidades daqueles que os indicaram. Outro problema que surgiu ainda na origem das ouvidorias é o da falta de capacitação, já que, ao terem sua instituição imposta, encontraram os agentes públicos e políticos despreparados, não dando a eles o tempo necessário para o estudo de sua implantação e nem mesmo para a capacitação adequada dos servidores. Ainda hoje muitas funcionam sob o remanejamento de pessoal disponível ou dispensável em outras áreas ou setores, e em muitos casos sem uma infraestrutura mínima para exercer um trabalho de qualidade. A necessidade de criar e desenvolver competências específicas para o trabalho das ouvidorias resulta de uma conscientização crescente na área e se prende não apenas à necessidade de melhorar a produtividade, mas sim à qualidade do atendimento e das respostas, a fim de gerar satisfação para o cidadão (OLIVEIRA, 2010). Ainda, segundo Oliveira (2010), existem no Brasil poucas, porém produtivas ouvidorias, que mereçam respeito pela sua atuação qualitativa. É o caso, por exemplo, das ouvidorias do sistema financeiro, criadas por meio de resolução do Banco Central22, que, A resolução n. 3.849, de 25 de março de 2010, dispõe sobre a organização de ouvidorias pelas instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil. Disponível em: https://www3.bcb.gov.br/normativo/detalharNormativo.do?method=detalharNormativo&N=110024658. Acesso em: 12 out. 2012.

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não obstante o fato de terem sido criadas por determinação normativa, assimilaram facilmente sua natureza representativa do cidadão, tendo realizado suas atividades com serenidade e eficácia, sendo a capacitação condição preliminar para se obter resultados satisfatórios nas ouvidorias nessas instituições. Entretanto, outras experiências nas quais redes e sistemas de ouvidorias públicas foram criadas por meio de obrigação legal não tiveram o resultado esperado. Felizmente, muitas ouvidorias públicas tem buscado uma melhor capacitação, participando de cursos de formação em instituições como o Instituto Nacional de Capacitação (INC), que desde 2004 oferece cursos de aperfeiçoamento em Gestão de Ouvidorias no Distrito Federal, tendo como público principal servidores de órgãos públicos federais, especialmente autarquias do poder Executivo, além de concessionárias de serviços públicos (IASBECK, 2012). Atualmente, segundo Oliveira (2010), algumas ouvidorias públicas vem assumindo uma postura mais proativa. Nosso modelo hoje é também único no contexto do sistema de ouvidorias setorizados, das ouvidorias temáticas e do ouvidor atuando como um ente que recomenda modificações dos procedimentos da Administração Pública, no seu papel de representante do cidadão. As ouvidorias podem funcionar melhor como ouvidorias regionalizadas ou individualizadas, à medida em que operam com objetivos comuns e afins, independentemente de sua localização geográfica ou inserção em organogramas governamentais. Em 2011, foi realizado, pela Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), o 1° Encontro das Ouvidorias Públicas que trabalham com temas sociais voltados à mulher, objetivando, também, promover a integração entre a Controladoria Geral da União (CGU) e as ouvidorias que tratam desses temas. A diretriz da CGU é realizar um trabalho de integração com as ouvidorias que tratam de pautas sociais23. As ouvidorias temáticas são resultado da dinâmica do processo evolutivo da ouvidoria brasileira. Trabalhando de forma independente e sem ligação com outras estruturas, tem demonstrado pela sua experiência uma forma de dar solução a diversos problemas específicos do Primeiro Encontro das Ouvidorias Públicas que trabalham com temas sociais. Disponível em: http://www.sepm.gov.br/noticias/ultimas_noticias/2011/05/1b0-encontro-das-ouvidorias-publicas-que-trabalham-com-temas-sociais/?searchterm=ouvidor . Acesso em: 15 set. 2012. 23

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país, como saúde, pobreza e educação, representando uma forma de estar mais perto dos problemas da população, oferecendo um canal direto para ouvir suas reivindicações e cobrar soluções para a melhoria da condição de vida das pessoas mais necessitadas (OLIVEIRA, 2010). Outra nova configuração das ouvidorias públicas que vem sendo formada no Brasil, mostrando-se bastante eficiente em suas formas e ações, é o sistema em redes de ouvidorias, constituído em torno de uma ideia de unidade, fortalecendo o trabalho das ouvidorias. O sistema de ouvidorias em rede funciona por meio da emissão de relatórios gerenciais encaminhados mensalmente para os Governos e Secretarias de Estado, auxiliando a gestão da tomada de decisões. Além dos relatórios gerenciais, as informações são sistematizadas em torno da atuação dos órgãos no que se refere às perspectivas das ouvidorias, utilizando, para isso, o monitoramento e a avaliação de indicadores de desempenho. Há, também, um intercâmbio entre as instituições públicas do Estado, no que se refere às ações de ouvidorias, possibilitando uma maior eficiência na atuação das ouvidorias públicas (OLIVEIRA, 2010). Dois sistemas de ouvidorias em rede vem se destacando no Brasil. O primeiro é o sistema de ouvidoria em Rede do estado de Pernambuco, que, pelo Decreto n. 32.476/2008, foi instituído com a finalidade de coordenar a Rede de Ouvidores Públicos por meio de um sistema integrado que possibilitará receber reclamações, solicitações, informações, denúncias, sugestões e elogios sobre o desempenho de órgãos e entidades do Poder Executivo, visando contribuir para o fortalecimento da cidadania e a melhoria da qualidade dos serviços prestados pelas instituições. O segundo é o Sistema de Rede de Ouvidorias do estado do Paraná, sistema de ouvidorias integrado em rede que une todas as ouvidorias do Poder Executivo do estado em um único banco de dados, contribuindo para a promoção da democracia e o fortalecimento da cidadania.

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CONCLUSÕES O trabalho das ouvidorias brasileiras, executado, seja em torno de temas específicos, seja por meio de um sistema integrado em redes, apresenta-se de forma proativa por iniciativas que contribuem de forma legítima e intensa como instrumento fortalecedor da participação do cidadão na gestão. O sistema de ouvidoria brasileiro tornou-se, devido à criatividade e à proatividade de suas iniciativas, um modelo único, com a importante missão de assegurar um canal eficaz de comunicação e representação dos interesses dos cidadãos frente à Administração Pública, que, além da resolução ágil das questões apresentadas, está se mostrando um verdadeiro exemplo de como promover a cidadania e a melhoria da gestão pública. Na medida em que o cidadão busca esse canal para combater os abusos, os erros e as omissões do ente público, ele passa a exercer uma verdadeira cidadania ativa. A participação das ouvidorias públicas não só teve, mas ainda continua tendo, fundamental importância no processo de modernização do serviço público. Ao valorizar a imagem da Administração Pública e potencializar o canal de comunicação entre a Administração Pública e o cidadão, há uma melhora na confiança da população em relação à Administração Pública, facilitando a integração entre os dois entes e tornando a Administração Pública mais acessível e direta. As ouvidorias públicas brasileiras têm como principal papel estimular a cidadania e exercer o controle social pela participação do cidadão, sendo a sua missão garantir a manifestação do cidadão usuário sobre os serviços prestados pelo governo, de forma ágil e não burocrática, das questões apresentadas. Ao adotar formas peculiares de atuação, as ouvidorias brasileiras desenvolveram um modelo único e diferente dos modelos existentes em outros países por ser este o que mais possibilitava o exercício da democracia e da cidadania. Entretanto, após tantos questionamentos, serve hoje de inspiração para a implantação de projetos semelhantes em diversos países. As formas particulares de atuação das ouvidorias são características e compatíveis com a nossa realidade política, social e cultural. Não se contentando com formas passivas de atuação, são 336


adotadas posturas mais proativas de atuação por meio de ações que vão até o cidadão a fim de ouvir suas necessidades, ao invés de somente receber e atender o cidadão em suas solicitações. Divulgando os seus serviços pelos meios de comunicação de massa, criando canais de comunicação mais acessíveis que facilitem o acesso e sensibilizando a população de que é preciso participar, as ouvidorias favorecem o controle social do Poder Público e exercem a verdadeira cidadania, estimulando a eficiência, a qualidade no atendimento dos serviços e a satisfação do cidadão. Promovem, assim, a transparência, a sustentabilidade da democracia, a melhoria contínua dos serviços e o melhor controle da atividade administrativa. O ouvidor representa o cidadão perante a instituição, propondo a inclusão de novos procedimentos, funcionando como articulador da participação social e um mediador de conflitos, auxiliando na busca de soluções e garantindo a defesa dos direitos do cidadão. Cabe às ouvidorias atuarem com transparência, defendendo o interesse da sociedade como um todo, buscando zelar pela eficiência organizacional e pelo acesso livre e desburocratizado do serviço público, dando publicidade a este instrumento democrático para que o cidadão possa compreender o seu real papel. Em face à necessidade de o Estado adotar novas formas administrativas, inclusive diminuindo as queixas em relação ao serviço público, a ouvidoria brasileira veio justamente inovar e somar esforços, promovendo mudanças e formando um elo entre cidadão e instituição capaz de reforçar o sentimento de coletividade. Um indispensável instrumento de democracia e cidadania que fez surgir uma sociedade mais atuante e participativa.

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