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Belisa Dias Arimateia Bandeira* Jumária Fernandes R. Fonseca** A ALIENAÇÃO PARENTAL ANTES E DEPOIS DA LEI 12.318, DE 2010 ThE PARENTAL ALIENATION BEFORE AND AFTER LAW 12.318/2010 LA ENAJENACIÓN PARENTAL ANTES Y DESPUÉS DE LA LEY 12.318/2010

Resumo: Aborda-se acerca da alienação parental, conceituando o instituto família, sua evolução, e também como vem sendo abordado na legislação vigente. Trata, ainda, da historicidade do poder familiar, que no Código Civil de 1916 era denominado de pátrio poder. Busca-se elucidar pontos necessários para o entendimento do conceito de alienação parental, suas punições, bem como os aspectos legais, com base na recente Lei 12.318/2010. Parte-se do questionamento de quais são os motivos que levam a essa atitude. A alienação parental é um meio de vingança de um dos genitores por não aceitar o fim do relacionamento, por meio do qual se atinge o outro pela posse exclusiva dos filhos, que pode ter como resultado uma síndrome por ela causada. Abstract: This study focuses on parental alienation, renowned institute family, and their evolution, as also has been approached by law. Still dealing with, the historicity of family power, that the Civil Code of 1916 was called parental rights. Seeks to elucidate points needed for understanding the concept of parental alienation, their punishments, as well as the legal, based on the recent Law 12.318/2010. It starts with the question of what are the reasons that lead to this attitude. Graduando de Direito da Faculdade ESUP-GO. Mestre em Desenvolvimento e Planejamento Territorial pela PUC-GO. Graduada em Direito pela PUC-GO. Professora de Direito Constitucional na PUC-GO e ESUP. Advogada.

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The parental alienation is a means of revenge for a parent not to accept the end of the relationship, where it reaches the other through an exclusive possession of the children, which may result in a syndrome caused by it. Resumen: Este estudio se centra en la alienación parental, conceptualizado como el instituto de la familia, y, también, en la manera cómo ha sido abordado por la ley. Además, trata de la historicidad del poder familiar, que en el Código Civil de 1916 fue llamado de patria potestad. Por fin, busca dilucidar los puntos necesarios para la comprensión del concepto de alienación parental, sus penas, así como el marco jurídico, basado en la reciente Ley 12.318/2010. Se inicia con la pregunta de cuáles son las razones que llevan a esta actitud. La alienación parental es un medio de vengarse de uno de los padres por no aceptar el final de la relación, llegando al otro por la posesión exclusiva de los hijos, lo que puede dar lugar a un síndrome causada por ella. Palavras-chaves: Família, poder familiar, guarda, alienação parental, síndrome da alienação parental. Keywords: Family, family power, guard, parental alienation, parental alienation syndrome. Palabras clave: Familia, el poder familiar, guardia, alienación parental, el síndrome de alienación parental.

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa abordará o surgimento, o desenvolver e as consequências da prática da alienação, detalhando a Lei n. 12.318/2010, que visa a proteger a saúde psicológica e emocional dos menores que sofrem tal prática, além de trazer punições para o genitor alienante, diante do descumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar. Tratar-se-á sobre instituto da família e suas transformações, que tiveram uma importante evolução, de acordo com o espaço e o tempo. Na atualidade, o pai e a mãe têm igualdade de condições em relação ao exercício do poder familiar, cujas obrigações são referentes aos direitos e deveres dos pais quanto à pessoa do filho menor não emancipado. Isso, na constância do relacionamento conjugal, é um fato natural, o problema é o exercício do poder familiar, quando ocorre a ruptura do relacionamento mantido entre os pais. No momento em que os laços matrimoniais são desfeitos ocorre, na maioria das vezes, uma campanha de desqualificação da imagem de um dos genitores, objetivando a quebra dos laços afetivos entre um dos genitores e sua prole. Usar o filho como meio de vingança pelo fim do enlace matrimonial não é novidade, é um fato corriqueiro e antigo, que pode gerar como consequência um processo de destruição do afeto e problemas psicológicos na criança. O menor é direcionado para odiar e ter repulsa por um dos seus genitores, todos esses atos são chamados de Alienação Parental. A Lei n. 12.318/2010 surgiu como um instrumento para possibilitar a intervenção do Judiciário na vida familiar e tem como principal objetivo a prevenção, no sentido de elucidar para toda a sociedade que a prática da alienação parental é repreendida por lei. Diante do exposto, analisar-se-á que o valor da convivência familiar para a criança e o adolescente é muito importante e deve prevalecer no que tange à conservação dos vínculos familiares. Entretanto, tal direito se vê ameaçado pela violência familiar que provém da prática da alienação parental.

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EM BUSCA DE UM CONCEITO DE FAMÍLIA

O conceito de “família” não deve ser estudado apenas a partir da visão que se tem hoje em dia, é necessário retomar a períodos mais antigos e analisar o seu nascer e desenvolvimento ao longo de toda a história da humanidade. Família é a mais importante base de formação da sociedade, ao passo que evolui juntamente com esta. A família sempre está em contínua transformação. Para que se possa compreender melhor o que é família é necessário passar por alguns momentos históricos deste instituto. Desde a pré-história o homem sentiu a necessidade de se agrupar para que tivessem melhores condições de sobrevivência e proteção, surgindo então uma espécie de sociedade organizada. Ao longo da história, a família se consagrou como sendo a base da sociedade, passando a ser a primeira forma de união entre as pessoas. Ela se torna, então, uma sociedade de pessoas que são unidas por um laço de sangue, pois se tornam descendentes e, por afinidade, se unem a outra pessoa agregando a entidade familiar pelo casamento, Rodrigues (2004) se baseia nesse conceito abrangente de consanguinidade. Inicialmente a família tinha como base a figura do marido e da mulher, logo em seguida se ampliou com o surgimento dos filhos, sendo este o conceito de Pereira (2007). Este autor menciona que no seu sentido biológico e genérico o grupo familiar forma-se por um ancestral comum, e no sentido estrito se limita a um grupo formado pelos pais e filhos. Vale ressaltar que antigamente a mulher e os filhos não tinham direitos, devendo eles obedecer às ordens que eram estabelecidas pelo homem. O pai, portanto, desenvolvia um poder na vida dos filhos e da esposa, pois ela nunca tinha autonomia alguma, nem sobre os próprios filhos, era submetida apenas a satisfazer as vontades de seu marido, se dedicando somente aos afazeres domésticos. Segundo Dias (2010, p. 27), a família é um agrupamento “[...] informal de indivíduos que se unem por uma química biológica “[...]” que se forma espontaneamente no meio social, começando a

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ser estruturada pelo direito. A lei sempre surge depois de um fato, a ideia de família veio se modificando ao longo do tempo, e não há como esquivar-se de que a nova tendência da família moderna tem a sua estruturação disciplinada na afetividade, que surge pela convivência entre pessoas e pela correlação de sentimentos. Na esfera do Direito de Família a afetividade é princípio basilar, consolidado este no sentimento de proteção, dedicação, no amor, no carinho e no afeto, sentimentos estes que com o desgaste do relacionamento vão acabando com aquele instituto chamado família, cujas consequências podem ser, muitas vezes, as piores possíveis. Partindo desse princípio essencial não só para a formação da família, como também para a formação do cidadão, se viu a necessidade judiciária da intervenção do Estado para tentar sanar muitos problemas familiares. No Código Civil de 1916, família era aquela formada unicamente pelo casamento, sendo ela patriarcal e hierarquizada. Conforme Gonçalves (2005), ela era constituída unicamente pelo matrimônio, sua dissolução era impedida e existia ainda uma distinção e certa discriminação com as pessoas unidas sem casamento e também aos filhos havidos dessas relações. Com a intervenção do Estado no instituto familiar, esta seria uma forma de organizar os vínculos interpessoais, que, em determinado momento histórico, passaram a ser uma regra de conduta da família, impondo limites ao homem. Já Dias (2010, p. 28) reforça que [a] família tinha uma formação extensiva, verdadeira comunidade rural, integrada por todos os parentes, formando uma unidade de produção, com amplo incentivo à procriação. Sendo uma entidade patrimonializada, seus membros eram força de trabalho. O crescimento da família ensejava melhores condições de sobrevivência a todos. (.) Esse quadro não resistiu a revolução industrial, que fez aumentar a necessidade de mão-de-obra, principalmente nas atividades terciárias.

Para a mesma autora (2010), a família passa a ser o primeiro agente socializador do ser humano, deixando de existir a célula

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do Estado e passando para a célula da sociedade, a sua evolução acabou forçando sucessivas alterações na legislação. O legislador do Direito de Família se perde ao tentar acompanhar a evolução e as transformações da sociedade, elas trazem uma necessidade de evolução de leis, sendo uma tarefa árdua a de mudar as regras do direito das famílias. Com o surgimento da Constituição Federal de 1988 (CF/88), o seu art. 2261,caput, conceitua família como sendo a base da sociedade, tendo uma proteção especial do Estado, passando a ser reconhecida não só no casamento, mas também na união estável (§3º, art. 226, CF/882) e na família monoparental (§ 4º, art. 226, CF/883), aquela formada por qualquer dos pais e seus descendentes. Já o Código Civil (CC) de 2002 procurou atualizar os aspectos essenciais do Direito de Família, instituiu uma igualdade jurídica entre os homens e as mulheres, tanto na condição de cônjuges como na de companheiros. A família agora não se identifica mais como sendo uma simples celebração do casamento, ou a diferença de sexo do par, o elemento principal agora é o vínculo afetivo que une as pessoas, com um comprometimento mútuo, afastando cada vez mais a ideia de que esta deve ser constituída apenas com o casamento. A família passa a ser a grande patrocinadora da criação e educação de sua prole, sendo responsável por assegurar o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à sua profissionalização, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e também comunitária, conforme estabelece o artigo 2274, CF/88.

Art. 226, caput, da CF/88 – “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. 2 Art. 226 [...] § 3º da Constituição Federal – “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. 3 Art.226 [...] § 4º da Constituição Federal – “Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. 4 Art. 227 da Constituição Federal – “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. 1

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Do Poder de Família Poder familiar, no ordenamento jurídico brasileiro, é visto como uma união de direitos e responsabilidades envolvidos na relação entre pais e filhos. Decorre tanto da paternidade natural como da filiação legal ou socioafetiva, é imprescritível, uma vez que não decaem os genitores simplesmente por deixarem de exercê-lo; é intransferível, inalienável ou indisponível, não podendo ser transferido a outrem; e irrenunciável, pois os pais não podem abrir mão dele. Conforme os ensinamentos de Diniz (2010, p. 564): O poder familiar pode ser definido como um conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menos não emancipado, exercido em igualdade de condições, por ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do filho.

Já Dias (2010, p. 416) pontua que: O Código Civil de 1916 assegurava o pátrio poder exclusivamente ao marido, como cabeça do casal, como chefe da sociedade conjugal. Na falta ou impedimento do pai é que a chefia da sociedade conjugal passava à mulher e, somente assim, assumia ela o exercício do poder familiar com relação aos filhos. Tão perversa era a discriminação que, vindo à viúva a casar novamente, perdia o pátrio poder com relação aos filhos, independentemente da idade deles. Só quando enviuvava é que recuperava o pátrio poder (CC16 393). O Estatuto da Mulher Casada (L 4.121/62) assegurou o pátrio poder aos pais, sendo exercido pelo marido com a colaboração da mulher. No caso de divergência entre os genitores, prevalecia a vontade do pai, podendo a mãe socorrer-se da Justiça.

Esse código, como já dito pela autora, possibilitava ao marido o pátrio poder, por ser este considerado o chefe da casa, sendo a mulher vista apenas como submissa a ele, submetida somente aos afazeres domésticos e ao cuidado dos filhos. Diante disso, a esposa submetia-se a um exercício sucessivo, prevalecendo, em caso de desacordo entre o casal, a vontade do marido, salvo se houvesse abuso do direito. 279


Com o advento da Constituição Federal de 1988 e, por conseguinte, do Código Civil de 2002, além de várias jurisprudências, começou-se a entender que quando a temática se referia ao poder de educação e gerência sobre os filhos esta competência residia além do pai, isto é, destinava-se a um núcleo familiar. Em razão disso, o Código Civil alterou a expressão pátrio poder para a expressão poder familiar, deixando claro que o poderio exercido sobre os filhos não é apenas do pai, devendo a mãe exercê-lo conjuntamente. O art. 2295, CF/88, estabelece que os pais tem o dever de criar e educar os filhos menores. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em seu art. 216, prevê que o poder de família deve ser exercido em igualdade de condições pelo pai e pela mãe na forma que dispuser a legislação civil. O art. 1630, CC, afirma que os filhos menores estão sujeito a esse poder, ressaltando que o art. 2º 7, do ECA, chama de criança aqueles que tem até 12 (doze) anos incompletos e adolescentes aqueles entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos. Os incisos do art. 1634, CC, mencionam a competência dos pais quanto à pessoa dos filhos, devendo eles: I - dirigir-lhes a criação e educação; II - tê-los em sua companhia e guarda; III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; V - representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. Art. 229 da Constituição Federal – “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. 6 Art. 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente – “O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência”. 7 Art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente – “Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescentes aquele entre doze e dezoito anos de idade”. 5

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Na esfera patrimonial, os pais, ao exercerem o poder de família, devem ser usufrutuários dos bens dos filhos, cuidando da administração destes. É essencial salientar que dentre os principais objetivos a serem atingidos por meio da prática do poder familiar encontra-se o desenvolvimento equilibrado do menor por meio de uma exemplar formação, tanto no sentido do ensino formal obtido na escola quanto o da instrução humana adquirida em todos os grupos sociais que a criança ou adolescente participa, notadamente no seio familiar. O parágrafo 5º do art. 2268 da CF expõe que os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal devem ser exercidos igualmente pelo homem e pela mulher, ou seja, a autoridade familiar cabe a ambos. Segundo o art. 16329, CC, quando ocorre a dissolução da sociedade conjugal o poder de família não é modificado quanto à figura dos filhos, assim como a da união estável também nada se altera (art. 157910, CC). O poder familiar é imprescindível para o desenvolvimento e a execução do compromisso que os pais têm em relação aos filhos. Este não se exclui e nem se limita por não se conviver debaixo do mesmo teto, não ocorre uma limitação, mas sim certa restrição ao seu exercício. Em regra, enquanto um dos pais tem a guarda unilateral dos filhos resta ao outro o direito de visitas, permanecendo assim o poder de família intacto, pois, conforme o art. 1583, parágrafo 3º11, a guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses do filho. Os pais são direta e indiretamente responsáveis, e se presume a culpa dos deveres, vigilância ativa e educação, compreendida na formação de comportamentos e hábitos adequados para a convivência em sociedade do filho.

Art. 226 § 5º da Constituição Federal – “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”. 9 Art. 1.632 do Código Civil de 2002 – “A separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram as relações entre pais e filhos senão quanto ao direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua companhia os segundos”. 10 Art. 1.579 do Código Civil de 2002 – “O divórcio não modificará os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos”. 11 Art. 1583, § 3º, do Código Civil de 2002 – “A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos”. 8

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Da Suspensão, da Perda e da Extinção Familiar No interesse do filho os pais tem o dever de exercer o poder de família. A fim de defender os menores, o Estado vem se legitimando e se reservando o direito de fiscalizar tal encargo, podendo suspender ou até mesmo excluir o poder familiar. Quando um dos genitores deixa de cumprir seu papel dentro da família, o Estado tem o dever de interferir em favor da criança ou do adolescente, com a intenção de preservar a integridade física e psíquica desses seres indefesos, podendo vir até a afastá-los da convivência dos pais. As sanções aplicadas aos pais nessa interferência inerente ao poder de família são chamadas de destituição e suspensão. O intuito não é de punir, e sim de preservar a criança, evitando sequelas futuras que a perda do poder de família pode gerar. Acerca do conceito de suspensão, o art. 1637, do Código Civil, expõe o seguinte: Art. 1637 - Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.

Essa suspensão não tira do filho o direito de alimentos nem os coloca na situação de substituição familiar, passa a representar uma medida menos grave e facultativa ao juiz quando tem que aplicá-la, sujeitando-se a uma revisão. Caso sejam superadas as causas que a levou, o poder de família pode ser restituído. Vale lembrar que o art. 2312, do ECA, explica que a simples falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou para a suspensão do poder familiar. O art. 1635, CC, traz o conceito de extinção: Art. 1635 - Extingue-se o poder familiar: I - pela morte dos pais ou do filho; Art. 23 do Estatuto da Criança e do Adolescente – “A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar”.

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II - pela emancipação, nos termos do art. 5º, parágrafo único; III - pela maioridade; IV - pela adoção; V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.

Com a morte de um dos cônjuges, cai sobre o sobrevivente o encargo familiar. A emancipação é concedida por um dos pais, por meio de instrumento público; a adoção coloca fim ao parentesco original, ao poder familiar dos pais biológicos. A perda do poder de família por força do art. 1638, CC, se dá por ato judicial para o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho; II - deixar o filho em abandono; III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

A perda pode levar à extinção, ao término definitivo do poder de família, mas não pode implicar na extinção no sentido de afastamento definitivo ou impossibilidade permanente. A próxima seção abordará as consequências da suspensão do poder de família, pela ruptura conjugal, e suas formas de se manter um bom convívio mesmo que não seja dentro da mesma casa, com ambos os genitores, por meio da guarda.

OS REFLEXOS DA RUPTURA DA SOCIEDADE CONJUGAL QUANTO À PESSOA DOS FILHOS Nos tempos em que a sociedade era regida pelo Código Civil de 1916, não se permitia a dissolução da sociedade conjugal, existindo uma única possibilidade legal, o chamado desquite, e, à época, caso ele ocorresse, os filhos ficavam com o cônjuge que não teve culpa. hoje em dia, com o Código Civil de 2002, não é mais possível se ter uma visão idealizada da família sem a possibilidade do rompimento

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conjugal. A sociedade disponibiliza a todos o direito de buscar a felicidade, livre de vínculos afetivos que venham a se estabelecer. Segundo Trindade (2004, p.187), um processo de separação e divórcio sempre se inicia com uma crise conjugal na relação entre marido e mulher, em que a única alternativa é a ruptura judicial amigável ou litigiosa, podendo esta trazer consequências a outras pessoas, especialmente aos filhos, de modo que as adversidades se transformam em uma crise familiar. Da Guarda Após a dissolução do casamento, os genitores tem a responsabilidade da escolha da guarda dos filhos. Antes do rompimento a guarda era exercida por ambos dentro do poder de família, entretanto, quando ocorre a interrupção dos laços conjugais, quer seja pela separação de fato ou pelo divórcio, passa a ser necessário que se defina a quem incumbirá o exercício da guarda e que padrão ela seguirá. Segundo Dias (2010), o fim de um relacionamento dos pais não pode levar à inexistência dos direitos parentais, à cessação do vínculo familiar, não pode comprometer a convivência dos filhos com os genitores. Querendo ou não os filhos participam diretamente dos conflitos gerados no momento de se romper um laço de afetividade existente entre o pai e a mãe. Com a Emenda Constitucional 66/2010, o Código Civil passou a determinar regras referentes quanto à “Proteção da Pessoa dos Filhos”. O Código traz disposições importantes nos artigos 158313 Art. 1583 do Código Civil de 2002 – “A guarda será unilateral ou compartilhada: § 1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. § 2º A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores: I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; II – saúde e segurança; III – educação. § 3º A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos. § 4º (Vetado). (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).

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e 158414, nos quais o legislador passou a entender que a guarda será unilateral ou compartilhada. O art. 1583, em seus parágrafos, CC, explica o que vem a ser essa guarda unilateral e a compartilhada: § 1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5º) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. § 2º A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores: I - afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; II - saúde e segurança; III - educação. § 3º A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos.

A guarda dos filhos é tacitamente, conjunta, e ela só vai se individualizar quando ocorrer a separação de fato ou de direito do casal. Poderá ainda ser deferida a outra pessoa, de preferência a algum outro membro do convívio familiar da criança, com quem ela já tenha um vínculo de afinidade e afetividade. A esse respeito, Dias pontua (2010, p. 435) que Art. 1584 do Código Civil de 2002 – A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar; II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. § 1º Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas. § 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada. § 3º Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar. § 4º A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de guarda, unilateral ou compartilhada, poderá implicar a redução de prerrogativas atribuídas ao seu detentor, inclusive quanto ao número de horas de convivência com o filho.

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[o] estado de beligerância, que se estala com a separação, acaba, muitas vezes, refletindo-se nos próprios filhos, que são usados como instrumento de vingança pelas mágoas acumuladas durante o período da vida em como. Por isso é indispensável evitar a verdadeira disputa pelos filhos e a excessiva regulamentação de visitas, com a previsão de um calendário minucioso, exauriente e inflexível de dias, horários, datas e acontecimento.

É importante destacar a existência de três formas de guarda, que serão expostas a seguir. Compartilhada Quando ocorre o rompimento do convívio dos pais, a estrutura do que vinha a ser família passa a ficar abalada, desfazendose, assim, as funções parentais que eram exercidas em conjunto. Quando a criança passa a não conviver mais na companhia de ambos os genitores, acaba por acontecer um reestabelecimento de papéis, resultando na divisão de encargos das atribuições relacionadas ao filho, que irá conviver com ambos. Compartilhar a guarda é uma forma mais recomendável, pois há uma igualdade de direito dos pais diante das relações familiares. Nessa forma leva-se em conta a necessidade de dividir as atividades cotidianas de cuidado, afeto e responsabilidade parental. Passa-se essa modalidade de guarda a ser a regra. Dias (2010, p. 436) afirma que “[...] sua adoção não mais fica a mercê de acordos firmados entre os pais, sob pena de se tornar um instituto destituído de efetividade.”. O parágrafo 1º do art. 1583, CC, definiu guarda compartilhada como uma responsabilização em conjunto de direitos e deveres atinente ao poder de família, devendo ser fixada consensualmente ou até mesmo por determinação judicial. Para esta autora (2010, p. 438) “[...] guarda compartilhada significa ter dois lares, dupla residência, mais de um domicílio [...]”, “[...] fica o filho livre para transitar de uma residência para outra a seu bel-prazer”. § 5º Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade.”

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Unilateral Nesta um dos genitores fica com a guarda e o outro tem a seu favor a regulamentação das visitas. Nessa modalidade ficam estipulados dias e horários de visitas, o que cria certo distanciamento entre o genitor e o filho; até se prevê este tipo de guarda, mas há preferência para a compartilhada, pois é menos sofrida para a criança. Dias (2010) afirma que o genitor não guardião passa a ter a obrigação de supervisionar os interesses do filho, tem o direito de fiscalizar a manutenção da educação. Alternada Esse modelo caracteriza-se pelo desempenho exclusivo alternado da guarda, acontecendo em período de tempo pré-determinado, que poderá ocorrer anual, semestral ou mensalmente. De certa forma é uma guarda unilateral, devido ao pequeno espaço de tempo que a detém. Essa modalidade é a menos recomendável, pois nela a criança permanece um tempo com a mãe e outro com o pai, sendo uma alternância periódica fixada entre eles. Tartuce (2013, p. 207) reforça: Essa forma de guarda não é recomendável, já que pode trazer confusões psicológicas à criança. Com tom didático, podemos dizer que essa é a guarda pingue-pongue, pois a criança permanece com cada um dos genitores por períodos interruptos. Alguns a denominam como guarda do mochileiro, pois o filho sempre deve arrumar sua malinha ou mochila e ir à outra casa.

Esse tipo de guarda pode trazer malefícios para a formação dos filhos, visto que não se tem uma constância de moradia, de hábitos alimentares, o que pode afetar seu equilíbrio físico e emocional, tornando-os confusos, podendo atrapalhar a interação constante com pessoas que fazem parte do seu dia-a-dia, como parentes, vizinhos e amigos. 287


Como se pode perceber dos três tipos anteriormente citados, a guarda compartilhada é a mais recomendável e a que facilita a responsabilidade do dia-a-dia, que deve ser dividida entre o pai e a mãe, tendo os mesmo direitos e deveres. Direito de Visita O direito de visitas não é um direito garantido apenas ao pai ou a mãe, mas principalmente ao filho, que deve ter garantido também a convivência familiar, mantendo vínculos afetivos. Dias (2010) opina que talvez fosse melhor chamá-lo de “direito de convivência”, que deve ser preservado mesmo não vivendo pais e filhos debaixo do mesmo teto. Direito este previsto no art. 1121, CC, em seu parágrafo 2º: Art 1121 [...] § 2º Entende-se por regime de visitas à forma pela qual os cônjuges ajustarão a permanência dos filhos em companhia daquele que não ficar com sua guarda, compreendendo encontros periódicos regularmente estabelecidos, repartição das férias escolares e dias festivos.

Mesmo não estando mais juntos pai e mãe, os filhos tem o direito de conviver com aquele genitor, que não obteve êxito sobre a guarda. Como analisado, a dissolução de uma relação conjugal pode trazer algumas mudanças com relação ao poder familiar. Muitas vezes acontece a não aceitação por um dos cônjuges, que começa a travar uma guerra com seu ex-parceiro. Começa um processo de vingança, no qual o filho é utilizado como escudo para atingir o outro, chamado de Alienação Parental. Em seguida se abordará essa consequência de um casamento mal resolvido.

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DA ALIENAÇÃO PARENTAL Com o rompimento do casamento ou simplesmente de um relacionamento conjugal, e quando não há um consenso entre o casal, podem surgir conflitos que abalam a convivência familiar. A não aprovação gera sentimentos como os de abandono, traição, começando, assim, um processo de vingança, no qual a criança se torna um instrumento, uma forma de atingir, de agredir o outro. Toda essa situação causa danos irreparáveis que ferem a Constituição Federal, que, em seu art. 227, dispõe: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Ou seja, a situação conflituosa gera uma desarmonia na convivência familiar, surgindo então um problema que não é nada velho e que vem angustiando a sociedade e despertando a atenção ao Poder Judiciário: a Alienação Parental. Os ensinamentos de Dias (2010, p. 455) favorecem uma melhor compreensão sobre a temática: Muitas vezes, quando da ruptura da vida conjugal, quando um dos cônjuges não consegue elaborar adequadamente o luto da separação e do sentimento de rejeição, de traição, surge um desejo de vingança, que desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, descrédito do ex-parceiro. Nada mais do que uma “lavagem cerebral” feita pelo guardião, de modo a comprometer a imagem do outro genitor, narrando maliciosamente fatos que não ocorreram ou que não aconteceram conforme descrição dada pelo alienador.

No dicionário pode-se encontrar como significado para “alienar”: ocasionar a separação, afastar ou afastar-se; e “parental” significa: relativo a pai e mãe; portanto, chega-se à conclusão de que

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Alienação Parental é a separação da mãe ou do pai. Consiste este ato em uma manipulação dos filhos por um de seus genitores, contra o outro, é a implantação de falsas memórias a fim de romper os laços afetivos entre filhos e pai ou mãe, com o intuito de agredir e prejudicar a convivência familiar. Esse termo foi proposto pelo psiquiatra americano Richard Gardner, em 1985, em artigo intitulado: “O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental (SAP)”, com tradução realizada por Rita Rafaeli15. Para ele, a alienação parental pode ser entendida como [...] um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a “lavagem cerebral, programação, doutrinação”) e contribuições da própria criança para caluniar o genitoralvo. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável.

Quando acontece a separação geralmente a guarda dos filhos fica com a mãe, tendo o pai apenas o direito de visitas. A mulher que não aceita a separação se sente abandonada e traída e considera que tem direitos exclusivos sobre a criança. A detentora da guarda, e agora alienadora, passa a ter controle total do tempo e dos sentimentos de sua prole, passando esta a ser programada para odiarem o pai, gerando uma confusão de sentimentos, que aos poucos destrói o vínculo que ainda existe entre eles. Muitas vezes a alienação parental toma proporções que fogem totalmente da realidade. A alienadora faz com que a criança acredite que seu pai não se importa, não gosta dela, a ideia é criar uma imagem ruim do ex-companheiro. Como uma forma de vingança, começa a criar histórias, que não são verdadeiras, podendo vir até a inventar um abuso 15 Disponível em: <http://www.alienacaoparental.com.br/textos-sobre-sap-1/o-dsm-iv-temequivalente> Acesso em: 07 de set. de 2013.

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sexual que não ocorreu, passando a tornar a situação mais séria do que se imaginava. Tudo é dito com tanta convicção que o filho passa a repetir a história que lhe foi contada de forma reiterada. A alienação parental pode acontecer não só com os genitores, como também com os avós ou qualquer outra pessoa que detenha a guarda da criança. Da Síndrome da Alienação Parental Como dito anteriormente, a alienação parental foi um tema proposto nos Estados Unidos pelo psiquiatra Richard Gardner na década de 1980, como sendo um fenômeno que começa a ser desenvolvido em um processo de separação de uma relação conjugal. Pereira (2013) explica que ela tem três fases: na primeira, começa uma desmoralização discreta, passando o alienador, na segunda fase, a a contar com a participação dos filhos, que estão sob sua influência, a fim de denegrir a imagem do outro genitor. A última e a mais grave é aquela em que os filhos começam a entrar em pânico por terem que conviver com a imagem daquele pai criada pela mãe, surgindo então uma consequência da alienação parental, a Síndrome da Alienação Parental (SAP). Trindade (2013, p. 22) a conceitua da seguinte forma: A Síndrome da Alienação Parental é um transtorno psicológico que se caracteriza por um conjunto de sintomas pelos quais um genitor, denominado cônjuge alienador, transforma a consciência de seus filhos, mediante diferentes formas e estratégias de atuação, com o objetivo de impedir, obstaculizar ou destruir seus vínculos com o outro genitor, denominado cônjuge alienado, sem que existam motivos reais que justifiquem essa condição.

A SAP é uma marca deixada pela alienação parental e conceitua-se como sendo um forma abusiva de maus-tratos contra a criança, que aparentemente é um ser que está fragilizado devido à situação conflituosa que está passando. Ela envolve totalmente o psicológico não só dos filhos, mas também da pessoa que está sendo alienada, na qual se cria situações de vingança utilizando-se da prole para atacar o outro. 291


Síndrome da Alienação Parental, Alienação parental e Implantação de Falsas Memórias são expressões sinônimas desse problema tão sério que vem atingindo cada vez mais a sociedade. Para a psicóloga Sousa (2010, p. 99), a SAP “[m]anifestase por meio de uma campanha de difamação que a criança realiza contra um dos genitores, sem que haja qualquer justificativa para isso”. Ela (idem, ibidem) ainda complementa: A SAP é mais do que uma lavagem cerebral, pois inclui fatores consciente e inconscientes que motivariam um genitor a conduzir seu(s) filho(s) ao desenvolvimento dessa síndrome, além, da contribuição ativa desse(s) na difamação do outro responsável.

A síndrome nada mais é do que o estágio mais avançado da alienação parental, em que cada sujeito a desenvolve e sofre suas consequências de uma maneira diferente. Dos Sujeitos A pesquisa até aqui desenvolvida demonstra a conduta da SAP, que começa o seu desenvolvimento dentro do âmbito familiar, contando então com a participação da mãe, do pai e dos filhos, na qual cada um desenvolve um comportamento diferente, que serão analisados a seguir.

Alienador O alienador é aquele que inicia o ato da alienação parental. Trindade (2013, p. 25) tentou estabelecer um rol de possíveis comportamentos e traços de personalidades denotativos de alienação: Dependência; baixa autoestima; condutas de desrespeito a regras; hábito contumaz de atacar as decisões judiciais; litigância como forma de manter aceso o conflito familiar e de negar a perda; sedução; manipulação; dominância e imposição; queixumes; histórias de desamparo ou, ao contrário, de vitórias afetivas; resistência a ser avaliado; recusa, ou falso interesse pelo tratamento.

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Para esse pesquisador, o comportamento de um alienador pode ser muito criativo, na sua sede de vingança começa a interromper qualquer meio de comunicação entre o alienado e o filho, não deixa que eles se falem por telefone, cartas, e-mails, recados, desqualifica-o perante a criança, ameaça muitas vezes puni-la caso se aproxime do outro genitor, mantém todo o seu tempo ocupado com alguma atividade. O sentimento identificado nessa pessoa é de ódio, raiva, ciúmes, superproteção dos filhos, medo, incapacidade de gratidão perante a vida, onipotência, dentre outros. Dos Agentes Alienados Já quem sofre com toda essa agressão é chamado de alienado, no caso o outro genitor e a criança. Os filhos são os que mais vão sofrer as consequências futuramente, um ato de alienação pode deixar sequelas para o resto da vida. O documentário “A Morte Inventada” (2009) retrata muito bem a situação, por meio de relatos de pais e filhos que tiveram seus elos rompidos por uma separação conjugal mal resolvida e que passaram a ser vítimas da alienação parental. Alguns pais relatam, nesse documentário, que por conta de tamanha pressão por parte do alienador resolveram se afastar da situação e esperar que na fase adulta de sua prole eles pudessem tentar uma reaproximação, na qual seria menos doloroso o entendimento de tamanho egoísmo. Das Consequências e Sequelas A síndrome da alienação parental começa de forma silenciosa, com a transformação da mente da criança, produzindo consequências nocivas para todos os envolvidos, recaindo os efeitos mais dramáticos sobre os filhos. Por um amor egoísta, a primeira consequência é a ruptura do vínculo da parentalidade, o filho acredita fielmente na difamação feita do outro genitor. Cria-se a figura de um mostro na mente da 293


criança, algo que pode aterrorizá-la para o resto da vida. Esse filho alienado cresce com uma revolta muito grande em seu ser, por ter tido um pai ou uma mãe que era um monstro, que não tinha sentimento algum e que nunca se importou com a vida de sua prole, sendo esta uma situação implantada em sua mente. A alienação parental traz principalmente para a criança uma confusão mental, depressão, um sentimento de desprezo, falta de amor, sentimentos que se não forem tratados a tempo podem fazer com que esse filho se transforme em um adulto totalmente frustrado. Trindade (2013, p. 29) menciona que o alienador é visto como um abusador, “[...] um ladrão de infância, que utiliza a inocência de uma criança, para desconstituir o outro”. Alienação Parental no Ordenamento Jurídico Brasileiro A alienação parental não é uma situação nova, é uma prática antiga agregada às famílias em conflito. No entanto, surgiram dificuldades para se detectar a ocorrência e como agir quando ocorre. Em razão disso, criou-se uma proteção específica por meio da Lei 12.318/2010, que alterou o antigo art. 236 do Estatuto da Criança e Adolescente, que procura identificar e punir a prática da alienação parental. O jurista Perez (2013, p. 43) explica que: Não se espera da Lei, evidendemente, o efeito de remédio que leve à mágica transformação de costumes ou eliminação de dificuldades inerentes a complexos processos de alienação parental. Razoável é considerá-la como mais um ingrediente no contexto de redefinição de papéis parentais, mais uma ferramenta para assegurar maior expectativa de efetividade na eventual busca de adequada atuação do Poder Judiciário, em casos envolvendo alienação parental.

A Lei, em seu art. 2º, define alienação parental como sendo: [...] a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie o genitor ou que

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cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

A busca pelo Poder Judiciário para a solução desse problema tem sido cada vez maior, dentro do próprio processo de separação já se começa a discutir a questão da alienação parental, mas ela é mais frequente em processos de guarda e de regulamentação de visitas, em que, na maioria das vezes, o pai ingressa com uma ação, pois está sendo alienado e tem seu próprio filho contra ele. A justiça conta com a ajuda de psicólogos e psiquiatras, os chamados “auxiliares da justiça”, que se encarregam de fazer estudos e laudos, onde discorrem sobre a situação da alienação. Da Lei 12.318/2010 Diante da necessidade da intervenção do Estado nesse problema, em 26 de agosto de 2010 foi sancionada a Lei 12.318, chamada também de Lei da Alienação Parental. Antes da existência dessa legislação essa situação era tratada como um simples conflito advindo de uma separação, só que com o passar do tempo tudo foi ficando cada vez mais complicado, passando o Poder Judiciário a se preocupar em evitar e solucionar essa situação. Segundo Perez (2013), de início a lei tinha a pretensão de definir juridicamente a alienação parental, não apenas afastando a sua interpretação de que ela não existe sob o aspecto jurídico, induziu-se assim um exame mais aprofundado para permitir maior grau de segurança para operadores do Direito na caracterização de tal fenômeno. O art. 2º da lei caracteriza o que vem a ser a alienação, o seu parágrafo único mostra algumas formas além das que são declaradas pelo juiz ou das que são constatadas em perícias. São elas: I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; II - dificultar o exercício da autoridade parental; III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;

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V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

Nos incisos anteriormente transcritos foram demonstradas as principais formas que o alienador utiliza para afastar a criança daquele a quem pretende se vingar. Desqualificar o outro genitor a fim de demonstrar que ele não tem condição nenhuma de exercer a paternidade ou maternidade desautoriza-o diante de determinadas condutas, tirando a sua autoridade parental, começa a dificultar o contato entre o filho e o alienado, impede que a criança atenda a ligações do pai, liga várias vezes para ela quando ela está na companhia do outro genitor, dizendo se sentir abandonada. Começa muitas vezes a querer fazer os programas preferidos da criança exatamente no dia em que era para ela estar como o pai, faz também falsas denúncias contra parentes próximos, dificultando assim a convivência familiar e fazendo com que eles se afastem. O alienante começa também a omitir informações do filho para o alienado, não avisa de reuniões na escola, não fala sobre a saúde da criança, festas, e depois começa a inventar para a prole que o pai não se importa com ele. Em algumas situações a mãe até muda de cidade, de estado e até mesmo de país a fim de separar de vez a criança do pai, para vê-lo sofrer. Essas formas apresentadas são meios de vingança, em que a pessoa se utiliza de um ser humano para atingir o outro. O art. 3º é um meio de proteção ao Princípio da Dignidade da Pessoa humana: Art. 3º - A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o

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adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.

Conforme Dias (2010), o princípio da dignidade da pessoa humana é o maior fundante do Estado Democrático de Direito, podendo ser localizado já no 1º artigo da Constituição Federal de 1988. O legislador consagrou esse princípio como um valor nuclear da ordem constitucional, afirmando que é uma manifestação primeira dos valores constitucionais carregada de sentimentos e emoções. Querer afastar o genitor do convívio do menor ataca de forma direta esse princípio basilar, fere um direito fundamental da criança, direito descrito no art. 227 da CF e no art. 16, V, do ECA (DIAS, 2010). Quando o ato da alienação parental é levado a um processo e é declarado perante a justiça, o juiz deve de imediato determinar algumas medidas provisórias necessárias a fim de se preservar a integridade psicológica da criança envolvida, viabilizando uma reaproximação entre ela e o genitor alienado, é o que diz o art. 4º da lei, e o seu parágrafo único assegura que o genitor tenha, nem que seja mínima, a garantia de visitação assistida, com exceção das situações em que haja a possibilidade de prejudicar a integridade física e psicológica do menor, algo que deve ser atestado por um profissional designado pelo juiz. O art. 5º menciona que, quando há indícios de que a alienação parental está acontecendo, é necessário que o juiz determine que seja feita uma perícia psicológica ou biopsicossocial. Seus parágrafos explicam como deve ser feito o laudo. Art. 5º [...] § 1o O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor. § 2o A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitado, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.

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§ 3o O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.

Uma vez que a perícia é determinada, deve ser feita uma análise minuciosa, com riqueza de detalhes, sobre o que está sendo alegado pelo genitor alienador e alienado. O art. 6º começa a trazer algumas soluções para a alienação parental. O juiz, de acordo com informações dos profissionais da perícia, se utiliza de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso: I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; III - estipular multa ao alienador; IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; VII - declarar a suspensão da autoridade parental.

Com esses meios de solução, o juiz faz uma tentativa de afastar a ingerência que o alienador tem sobre a criança, como um meio de reparar os efeitos da alienação sofrida. O art. 7º instiga o princípio do melhor interesse do menor, que deve prevalecer no caso de alienação parental Já o art. 8º fala da alteração de competência para julgamento das ações que envolvem alienação parental, que deve estar relacionada às ações fundadas em direito de convivência familiar, com a exceção quando houver consenso entre os genitores ou decisão judicial. Os artigos 9º e 10º foram vetados parcialmente, por contrariedade ao interesse público A presente lei comentada tem o objetivo de trazer uma segurança jurídica para as partes envolvidas quando há alegação da existência de alienação parental, ela busca inibir seus atos. Veio em auxílio daqueles que sofrem com esse problema e também tem a intenção de evitá-lo antes mesmo de seu início. 298


CONCLUSÃO Com essa pesquisa foi possível concluir que o processo da alienação parental tem como consequência a síndrome da alienação parental, e que é uma prática antiga agregada às famílias em conflito. Ressaltou-se, neste estudo, que a Alienação Parental e a Síndrome da Alienação Parental se complementam e não se confundem. Assim, a Alienação Parental é a ação, enquanto a Síndrome de Alienação Parental é seu resultado. Com foi descrito, a alienação parental é um meio de vingança de um dos genitores por não aceitar o fim do relacionamento, na qual se atinge o outro por meio da posse exclusiva dos filhos. Antes do surgimento da aludida lei era difícil detectar a ocorrência e como agir quando detectada a prática de alienação parental. Entretanto, recentemente o problema teve uma solução: a alienação parental tornou-se objeto legislativo e foi tratada e regulamentada na Lei 12.318/2010 (Lei da alienação parenta), que alterou o artigo 236 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Essa alienação causa o afastamento físico de um dos genitores, provoca o estreitamento de dependência do menor em relação ao genitor alienado. O guardião tem por objetivo eliminar o outro da vida do filho, e isso torna os efeitos da repulsa quase irreversíveis para a criança ou adolescente. A proteção contra a alienação parental, dentro da organização social, alude à defesa prioritária dos direitos fundamentais da criança, dentre os quais está a convivência com ambos os cônjuges e a formação de um cidadão concretizado e livre de abusos que atrapalham seu desenvolvimento físico e mental, sempre tendo como finalidade o melhor interesse da criança e do adolescente e a sua dignidade. Diante do apresentado no presente trabalho, conclui-se que os motivos que levam à posse exclusiva dos filhos são a solidão, o isolamento, a inconformidade. Ao dar fim a um relacionamento as pessoas confundem a relação do casal com a relação dos filhos, casamento pode não ser para sempre, mas filhos é algo eterno, e, como forma de penalizar aquele que está saindo da relação, o outro aos poucos faz com que os filhos passem também a odiar o pai, ou 299


a mãe. A Lei se tornou uma forma de conter os atos alienatórios, trazendo condições mínimas de combater esse problema. Ela veio socorrer pais e filhos dessa situação desagradável que pode trazer sérias consequências para ambos. É uma forma de proteção, é a luz que todos os envolvidos esperam ver, pois nessa situação se sentem perdidos, sem saber o que fazer para resolver tal problema.

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