Encarte Tendecias

Page 1

001.indd 1

11/26/08 10:00:05 PM

julio césar blanco francis paniego dani garcia teresa paim martín berasategui

pedro subijana frédéric bau claude troisgros helena rizzo mara salles pau arenós

josean martínez alija carlos alberto dória andoni luis aduriz christian escribà

sergio y javier torres nandu jubany belarmino iglesias juan mari arzak

angel léon marcos morán ferran adrià alex atala paco roncero joan roca rodrigo oliveira ana luiza trajano beto pimentel eduardo duó

parte integrante da edição nº 66 de Prazeres da Mesa, não pode ser vendido separadamente


Untitled-3 2

11/27/08 6:57:31 PM


online por Marco Merguizzo

prazeresdamesa.com.br

MESA TENDÊNCIAS 2008 Clique e acesse os vídeos exclusivos desse evento histórico, que complementam o conteúdo dessa edição especial de Prazeres da Mesa COZINHA TECNOEMOCIONAL: MITOS E VERDADES Acompanhe os melhores momentos do debate que reuniu ninguém menos que Ferran Adrià, o chef brasileiro Alex Atala, os jornalistas Josimar Melo, o espanhol Pau Arenós e Ricardo Castilho, diretor editorial de Prazeres da Mesa. Na pauta desse encontro de titãs, os inícios do movimento, o mito criado em torno da gastronomia molecular e os bastidores do Jantar do Século, entre outros temas suculentos. Um encontro histórico e imperdível para se ver uma, duas, muitas vezes e guardar na memória. CHEF-EMBAIXADOR DE QUATRO COSTADOS Ao lado da de Ferran Adrià, a apresentação do chef Alex Atala foi uma das mais aguardadas pelo público na edição deste ano do Mesa Tendências. O mais festejado chef do país – reverenciado pela trupe espanhola como “o maior embaixador da gastronomia brasileira” – desmistificou a glamourização da profissão, revalorizou os ingredientes brasileiros e compartilhou com a platéia momentos inesquecíveis, como o jantar que ofereceu aos colegas espa-nhóis em que serviu o turu, um ingrediente brasileiro pouco conhecido e que encantou seus ilustres convidados. REVOLUCIONÁRIO DOS SENTIDOS Uma superapresentação de Andoní Luis Aduriz, chef estrelado do restaurante Mugaritz, de Renteria, no País Basco. Com teses desafiadoras e preparações para comer e pensar, o chef aguçou a mente e o paladar do público do Mesa Tendências, durante sua elogiadíssima aula, que teve como tema Os Limites do Sabor. LIÇÕES DE UM VELHO MESTRE Uma das mais aplaudidas performances do Mesa Tendências 2008, o pai da moderna cozinha espanhola, o carimástico Juan Mari Arzak, do restaurante basco Arzak, três estrelas no Guia Michelin, hipnotizou a platéia com suas teses gastronômico-filosóficas e os comentários rascantes e bemhumorados. Um vídeo que surpreende e emo­cio­na – co­mo os ócu­los co­loridos mo­der­ninhos des­se ve­lho mes­tre e sua co­mida intrigan­te.

3

prazeres da mesa

Ok MT_online.indd 3

11/27/08 7:11:45 PM


giro

MT_gerais.indd 4

11/26/08 10:18:22 PM


Patrocinadores

Apoios

Apoio de mĂ­dia

Transportadora oficial

Apoio institucional

5

prazeres da mesa

MT_logos.indd 5

11/26/08 11:33:13 PM


a n o

6 u n

o

d e z e m b r o u 2 0 0 8 6 6 u t e n d ê n c i a s

10 CLAUDE TROISGROS

Uma cozinha franco-brasileira e humorística 12 DANI GARCÍA Contraposição de sabores e temperaturas 14 MARA SALLES Os sabores do Cerrado e da Amazônia 16 Debate Em defesa da cozinha tecnoemocional 20 Francis Paniego Tradição e inovação na Rioja 22 Martín Berasategui Culinária de raízes, mas sem fronteiras 24 Javier e Sergio Torres O uso de ingredientes brasileiros na Espanha 25 Pedro Subijana Receitas lúdicas e inesperadas 26 Feira de negócios De produtos a equipamentos, as novidades do mercado 30 Joan Roca A importância dos aromas voláteis no processo criativo 32 Rodrigo Oliveira e Ana Luiza Trajano Cozinha sertaneja e queijos brasileiros 34 Frédéric BaU De doces e salgados, as mil possibilidades do chocolate 36 Trabalhos acadêmicos Apresentação de estudos gastronômicos do Senac-SP 39 Homero Souza Óleo de palma: produção, características e curiosidades 40 Juan Mari Arzak Gastronomia, filosofia e globalização do paladar 43 Nandu Jubany Os aromas do bosque 44 Paco Roncero Propostas inusitadas para o azeite de oliva

6

sumário 45 Belarmino Iglesias Filho

Como montar um restaurante de sucesso 46 Juan fra Valiente

Técnicas para reconstruir iguarias 47 Josean Martínez Alija De volta à valorização do produto 48 Dolores Freixa e Guta Chaves Cozinha regional x alta gastronomia 49 Washington Oliveira A gestão dos negócios na área alimentar 50 Carlos Alberto Dória Reflexões sobre o conceito de culinária brasileira 52 Andoní Luis Aduriz Limites do sabor: para comer e pensar 55 Marcos Morán Por uma gastronomia sem desperdícios 56 Beto Pimentel e Tereza Paim O DNA da cozinha baiana 58 Ángel León Receitas inventivas: de peixes sem valor comercial a caroço de azeitona 59 Sabores da Andaluzia Más Que Tapas: chefs de todo o mundo interpretam, em livro, a rica região espanhola 60 Christian Escribà Show doce: a quebra de paradigmas da confeitaria clássica 62 Alex Atala Hora de reacender a chama dos ingredientes brasileiros 66 Ferran Adrià Desmitificando a cozinha do El Bulli 72 Helena Rizzo Terroir da memória: receitas que nascem do dia-a-dia e das lembranças

seções 7 Carta do editor 8 Carta ao leitor

prazeres da mesa

V2 Ok MT_Sumário 6

11/27/08 7:05:54 PM


editor SONHO REALIZADO Há três anos, conversando com o chef Alex Atala, eu falava da vontade e do sonho em fazer um grande evento de gastronomia no Brasil, com a presença dos grandes nomes mundiais. Vínhamos fazendo o Prazeres da Mesa Ao Vivo com muito êxito, mas faltava um evento que discutisse os rumos da culinária no país e mostrasse as tendências do mercado pelo mundo. Lembro que, à época, o olhar e as palavras do Atala não foram muito encorajadora, mas nossa conversa terminou com a seguinte frase: “É difícil, mas estou nessa”. Em 2008, o time de Prazeres da Mesa – não só com a colaboração do Atala, mas de diversas equipes, caso do Grup GSR e da Sibaris e, claro, com a boa vontade dos chefs espanhóis e brasileiros – conseguiu conceber e organizar o maior evento de gastronomia que já ocorreu na América Latina. Reunir, nessa segunda edição do Mesa Tendências, nomes como Ferran Adrià, Juan Mari Arzak, Martín Berasategui, Ana Luiza Trajano, Rodrigo Oliveira, Beto Pimentel e muitos outros, só foi possível graças à união dessas várias equipes. Também é im­por­tan­te é tam­bém fri­sar que a or­ga­ni­za­ção im­pe­cá­vel e a gran­de re­per­cus­são do even­to só fo­ram pos­sí­veis em razão do tra­ba­lho em con­jun­to que vem sen­do de­sen­vol­vi­do nos úl­ti­mos anos en­tre Praz­ er­ es da Mes­ a e Se­nac-SP, que, bri­lhan­te­men­te abri­gou o Mesa Tendências no Cen­tro Uni­ver­si­tá­rio do Cam­pus San­to Ama­ro. Das re­cep­cio­nis­tas, pas­san­do pe­los lo­cu­to­res, até che­gar aos con­sa­ gra­dos pa­les­tran­tes, to­dos de­ram o má­xi­mo pa­ra o êxi­to do Fó­rum. Nos­so próximo encontro já tem data marcada para acontecer. Portanto, se você não quer perder nenhum detalhe dessa festa da gastronomia, anote na sua agenda: entre os dias 26, 27, 28, 29 e 30 de outubro de 2009, o Mesa Tendências e o Prazeres da Mesa Ao Vivo estarão esperando por você. Forte abraço e até lá, Ri­car­do Cas­ti­lho, di­re­tor edi­to­ri­al rcas­ti­lho@pra­ze­res­da­me­sa.com.br

7

prazeres da mesa

Ok MT_carta editor 7

11/27/08 7:38:49 PM


palavra

ao leitor UM MARCO NA GAS­TRO­NO­MIA DO PAÍS É um gran­d e pra­z er com­p ar­t i­l har com vo­c ê, nes­t a edi­ç ão de de­z em­b ro, as de­l i­c io­s as sen­s a­ç ões e idéi­a s que agu­ç a­r am pa­l a­d a­r es e es­t i­m u­l a­r am men­t es du­r an­t e o Me­s a Ten­d ên­c ias – 2o Fó­rum In­ter­na­ci­o­nal de Gas­tro­no­mia de São Pau­lo, ocor­ rido nos di­as 4 a 6 de novembro. O fó­rum com­pôs a pro­gra­ma­ ção do Se­ma­na Me­sa SP, con­so­li­da­do co­mo o mai­or even­to gas­tro­nô­mi­co da Amé­ri­ca La­ti­na. A par­ce­ria de su­ces­so en­tre o Se­nac-SP e a re­vis­ta Praz­ er­ es da Mes ­ a tem da­do fru­tos. Nes­te ano, além da re­a­li­za­ção do fó­rum a e da 5 edi­ção do já tra­di­cio­nal Praz­ er­ es da Mes­ a Ao Vi­vo, uma ver­da­dei­ra cons­te­la­ção de 15 che­fes es­pa­nhóis veio ao Bra­sil pa­ra o be­ne­fi­cen­te Jan­tar do Sé­cu­lo que, co­mo o no­me diz, foi um mo­men­to me­mo­rá­vel, des­fru­ta­do por 80 pri­vi­le­gi­a­dos que ar­re­ma­ta­ ram os in­gres­sos em lei­lão. Com­pos­to por pro­fis­si­o­nais e gour­mands, um se­le­to pú­bli­co lo­tou, nos três di­as, o au­di­tó­rio do Cen­tro Uni­ver­si­tá­rio Se­nac – Cam­pus San­to Ama­ro, que tem ca­pa­ci­ da­de pa­ra 500 pes­so­as. Foi uma opor­tu­ni­da­de úni­ca de co­nhe­cer as ten­dên­cias do mer­ca­do e os con­cei­tos ino­va­do­res, pre­sen­ci­an­do de­mons­tra­ções de tec­no­lo­gi­as que va­lo­ri­zam e rein­ven­tam os sa­bo­res e as tex­tu­ras dos ali­men­tos, in­clu­si­ve com de­li­cio­ sas de­gus­ta­ções. A mis­são do even­to, de pro­por­ci­o­nar a tro­ca de ex­pe­ri­ên­cias en­tre es­pe­cia­lis­tas, pro­mo­ver dis­cus­sões so­bre pro­du­ções ci­en­tí­fi­cas e dis­se­mi­nar co­nhe­ci­ men­to, foi no­va­men­te atin­gi­da com lou­vor. A pre­sen­ça mar­can­te do chef es­pa­nhol Fer­ran Adrià, con­si­de­ra­do o me­lhor do mun­do, aju­dou a co­lo­car o even­to no cen­tro das aten­ções. Além dis­so, os bra­si­lei­ ros ti­ve­ram a chan­ce de con­vi­ver com pe­ri­tos co­mo Ju­an Ma­ri Ar­zak, Fré­dé­ric Bau, Mar­tín Be­ra­sa­te­gui, An­do­ní Lu­is Adu­riz, en­tre ou­tros. E os alu­nos do Se­nac, ao as­ses­ so­rá-los, pu­de­ram ex­pe­ri­men­tar a adre­na­li­na que con­ta­gia os bas­ti­do­res de um acon­ te­ci­men­to des­se por­te, vi­vên­cia que cer­ta­men­te en­ri­que­ce o apren­di­za­do e es­ti­mu­la o cres­ci­men­to na pro­fis­são. Pi­o­nei­ro na ca­pa­ci­ta­ção de pro­fis­si­o­nais pa­ra a área, o Se­nac tem tra­ba­lha­do nos úl­ti­mos anos pa­ra o de­sen­vol­vi­men­to de um pen­sar gas­tro­nô­mi­co que con­tri­bua com a con­so­li­da­ção ci­en­tí­fi­ca e aca­dê­mi­ca do seg­men­to de ali­men­ta­ção. Es­ses re­sul­ta­dos ex­tra­or­di­ná­rios au­xi­li­am o apri­mo­ra­men­to da cul­tu­ra gas­tro­nô­mi­ca no pa­ís e nos de­sa­fi­am a bus­car uma ex­ce­lên­cia cres­cen­te. A to­dos os par­ti­ci­pan­tes, pro­fis­si­o­nais, pa­tro­ci­na­do­res, apoi­a­do­res e par­cei­ros, nos­so agra­de­ci­men­to pe­la co­la­bo­ra­ção pre­ci­o­sa pa­ra cra­var es­se mar­co na his­tó­ria do se­tor no pa­ís. Fi­cam to­dos con­vi­da­dos, des­de já, pa­ra as pró­xi­mas vi­a­gens que va­ mos em­pre­en­der pe­los ter­ri­tó­rios do fa­zer e do fru­ir gas­tro­nô­mi­co. Cláu­dio Lu­iz de Sou­za Sil­va Ge­ren­te de De­sen­vol­vi­men­to do Se­nac São Pau­lo

8

prazeres da mesa

Ok MT_carta senac.indd 8

11/26/08 8:39:05 PM


dias 26, 27, 28, 29 e 30 de outubro

2009 realização

Untitled-3 1

11/26/08 10:32:03 PM


claudetroisgros

BEM-HUMORADOS ECOS DA NOUVELLE CUISINE Com os holofotes mundiais voltados para a cozinha tecnoemocional, o chef “franco-carioca” traça um paralelo com a gastronomia espanhola de vanguarda e apresenta sua “cozinha humorística”

C

om sim­pa­tia ­e bos­sa ti­pi­ca­men­ te ca­ri­o­cas, ­o ­chef “fran­co-bra­ si­lei­ro” Clau­de Trois­gros, ­do res­tau­ran­te ­Olympe, Rio de Janeiro, ­RJ, con­quis­tou ­o pú­bli­co ­do Me­sa Ten­dên­ci­ as, lo­go ­no pri­mei­ro ­dia ­do even­to. ­Com pia­das ­e pau­sas ­em tem­pos per­fei­tos, ha­ bi­li­da­de ­de ­quem ­está acos­tu­ma­do ­a con­ du­zir gran­des es­pe­tá­cu­los, ­o her­dei­ro ­da nou­vel­le cu­i­si­ne – re­vo­lu­ção gas­tro­nô­mi­ca

10

POR ROBERTA MALTA FOTO RICA­RDO D’ANGELO

pro­pos­ta ­por ­seu ­pai, Pi­er­re Trois­gros, ­e ­por ou­tros ­chefs fran­ce­ses co­mo Pa­ul Bo­ cu­se – ini­ci­ou s­ ua apre­sen­ta­ção, re­la­tan­ do ­a pri­mei­ra fa­se ­de ­seu tra­ba­lho, ­nos ­anos 80, quan­do havia recém-che­gado ­ao Bra­sil. “Na­que­le tem­po, ­a vi­da ­de to­do ­chef es­tran­gei­ro ­não ­era na­da fá­cil. Va­le lem­ brar ­que ­a im­por­ta­ção ­de pro­du­tos im­ por­ta­dos ­só ocor­re­ria dez ­anos de­pois”,

prazeres da mesa

OK MT_claude troisgros.indd 10

11/27/08 7:12:26 PM


PU­PU­NHA RE­CHE­A­DO ­DE ­FOIE ­GRAS

afir­mou. ­À épo­ca, Trois­gros co­me­çou ­a fre­qüen­tar fei­ras-li­vres ca­ri­o­cas ­e ­a ­se apai­ xo­nar pe­los pro­du­tos bra­si­lei­ros. ­Com is­so, ele mu­da­ria ­os ru­mos cu­li­ná­ri­os ­do pa­ís, ­ao tor­nar nos­sos le­gu­mes, ver­du­ras ­e fru­ tas pro­ta­go­nis­tas ­na co­zi­nha. ­Nos di­as ­de ho­je, pas­sa­das ­mais ­de du­as dé­ca­das, ­e ­com ­os ho­lo­fo­tes mun­di­ais vol­ta­dos pa­ra ­a co­ zi­nha tec­no­e­mo­cio­nal, ­o ­chef, ­ao tra­çar ­um pa­ra­le­lo à gas­tro­no­mia es­pa­nho­la ­de van­guar­da, apre­sen­ta ­a cha­ma­da “co­zi­nha hu­mo­rís­ti­ca”, co­mo de­fi­niu. ­A pro­pos­ta ­de Trois­gros é cri­ar no­vos pra­tos com base em for­ma­tos con­sa­gra­dos, vi­san­do não ­só ­a agu­çar ­os cin­co sen­ti­dos, ­mas, ­de acor­do ­com ­ele, “in­tro­du­zir ­um sex­to ­no ge­no­ma ­do ho­mem mo­der­no”: ­o hu­mor, in­gre­di­ en­te fun­da­men­tal ­na re­cei­ta ­de vi­da des­se ­chef fran­cês ­de al­ma bra­si­lei­ra. ­Com ­tal pro­pos­ta inu­si­ta­da, Trois­ gros, ­na com­pa­nhia ­de ­seu fi­lho Tho­mas, apre­sen­tou ­ao pú­bli­co qua­tro re­cei­tas. ­A pri­mei­ra de­las ­foi ­o ca­vi­ar ­de ta­pi­o­ca (bo­ li­nhas à ba­se ­de sa­gu, ­que ­são es­cu­re­ci­das

p­ or mo­lho ­de so­ja ­até ad­qui­ri­r a co­lo­ra­ção ­de ­ovas ­de es­tur­jão). ­O des­ta­que fi­cou ­por con­ta ­da em­ba­la­gem ­em ­que fo­ram ser­vi­ das: ­uma la­ta idên­ti­ca à ­de ca­vi­ar, ­com pei­ xi­nho pin­ta­do e­ tu­do! Ou­tra ­idéia bem-hu­mo­ra­da apre­sen­ta­ da ­por ­ele, ­e ­que tam­bém ­faz su­ces­so ­em ­seu res­tau­ran­te ­no ­Rio, brin­ca ­com ­as sen­ sa­ções ­do gour­met: ­“O gar­çom ra­la ­o pal­mi­ to so­bre o ri­so­to, ­num cor­ta­dor ­de tru­fas”, con­ta Clau­de à­s gar­ga­lha­das, ga­ran­tin­do ­que ­o efei­to vi­su­al é ­o mes­mo ­do re­qui­si­ ta­do ­e ca­rís­si­mo tar­tu­fo ­de Al­ba, ci­da­de pi­ e­mon­te­sa on­de es­sas jói­as ­são en­con­tra­das. ­A se­guir, ­o ­chef su­pre­en­deu ­a pla­téia ­com ­o cri­at­ i­vo pu­pu­nha re­che­ad­ o ­de ­foie ­gras ­e ­um pe­tit ­four fei­to à ba­se ­de cho­ co­la­te der­re­ti­do ­e pol­vi­lha­do ­de pro­sai­cos su­cri­lhos. ­“É per­fei­to pa­ra as­sis­tir ­o Fan­tás­ ti­co, do­min­go à noi­te”, brin­cou. Clau­de ­e Tho­mas, res­pec­ti­va­men­te ­a se­gun­da ­e a ter­cei­ra ge­ra­ções ­dos Trois­gros, dei­xa­ram ­o pal­co ­do au­di­tó­rio ­do Se­nac-SP ­sob aplau­ sos, c­ om o­ pú­bli­co pe­din­do b­ is. •

11

prazeres da mesa

OK MT_claude troisgros.indd 11

11/27/08 7:12:50 PM


danigarcia

TÉCNICAS DE VANGUARDA O chef Dani Garcia, do restaurante Calima, em Marbella, baseia sua cozinha na contraposição de sabores e temperaturas

C

on­si­de­ra­do uma das sen­sa­ções da no­va ge­ra­ção da gas­tro­no­mia es­pa­nho­la, o chef Da­ni Gar­cia, do res­tau­ran­te Ca­li­ma, em Mar­bel­la, já os­ten­ta uma es­tre­la no Guia Mi­che­lin. Seu tra­ba­lho se ba­seia na con­tra­po­si­ção de sa­ bo­res e tem­pe­ra­tu­ras, e uti­li­za téc­ni­cas de van­guar­da pa­ra res­ga­tar os sa­bo­res tra­di­ cio­nais da co­zi­nha an­da­lu­za. Es­se em­pre­ go de re­cur­sos mo­der­nos pa­ra re­cu­pe­rar sa­bo­res clás­si­cos po­de até pa­re­cer con­tra­ di­tó­rio. Mas ao de­mons­trar al­gu­mas de su­ as cri­a­ções, o jo­vem chef pro­vou que a gas­tro­no­mia tec­no­e­mo­cio­nal na­da mais é do que uma for­ma di­fe­ren­te de co­zi­nhar,

12

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTOS RICARDO D’ANGELO

uti­li­zan­do os prin­cí­pios e sa­bo­res da co­zi­ nha de sem­pre. O re­sul­ta­do são pra­tos des­ con­cer­tan­tes, co­mo o to­ma­te Raf re­che­a­ do com pi­pir­ra­na, que ele pre­pa­rou di­an­te de uma pla­téia cu­ri­o­sís­si­ma. A pro­pos­ta é re­cons­tru­ir o to­ma­te, a par­tir da pi­pir­ra­ na, sa­la­da es­pa­nho­la à ba­se de to­ma­tes e pi­men­tões ver­des, que, após ser pro­ces­ sa­da, ga­nha con­sis­tên­cia de me­ren­gue e for­ma­to re­don­do. Con­ge­la­da, a mas­sa é ba­nha­da em ni­tro­gê­nio e mer­gu­lha­da em um gel ob­ti­do da água do to­ma­te, pro­du­ zin­do uma ca­pa ru­bi-cin­ti­lan­te. Sur­pre­sa na pla­téia: o re­sul­ta­do é um to­ma­te que, ao to­que do gar­fo, ex­plo­de em mous­se.

prazeres da mesa

Ok MT_dani garcia.indd 12

11/27/08 7:16:50 PM


t

“O ni­tro­gê­nio nos per­mi­te so­nhar com pra­ tos e tor­ná-los re­al­i­da­de”, jus­ti­fi­cou. Se­guin­do a mes­ma pro­pos­ta, Da­ni Gar­ cia en­can­tou o pú­bli­co ao pre­pa­rar pi­po­cas de to­ma­te e azei­te de oli­va, com in­te­ri­or cre­mo­so, que der­re­tem na bo­ca. O pre­pa­ro é sim­ples: a mas­sa, à ba­se de ge­la­ti­na, to­ ma­te, água e azei­te de oli­va, é pro­ces­sa­da em um si­fão e mer­gu­lha­da em ni­tro­gê­nio lí­qui­do. Gar­cia quis fa­mi­lia­ri­zar a pla­téia com a uti­li­za­ção do ni­tro­gê­nio na gas­tro­ no­mia e der­ru­bar al­guns mi­tos que cer­cam es­sa prá­ti­ca. O chef cha­mou ao pal­co du­ as pes­so­as da pla­téia, pa­ra mer­gu­lha­rem a mão no pro­du­to. “Pa­re­cem bor­bu­lhas de água com gás”, dis­se um dos vo­lun­tá­rios. Na­da de gra­ve acon­te­ceu, co­mo era es­pe­ ra­do. As­sim, ele ex­pli­cou: “É pre­ci­so ter res­pei­to pe­lo ni­tro­gê­nio lí­qui­do, mas há pro­du­tos pre­sen­tes em nos­sa vi­da mui­to mais pe­ri­go­sos, co­mo o azei­te fer­ven­te”. E con­clu­iu: “Uma téc­ni­ca nun­ca po­de ser cri­a­da ape­nas pe­lo show. Ela pre­ci­sa es­tar sem­pre a ser­vi­ço do sa­bor”. •

13

prazeres da mesa

Ok MT_dani garcia.indd 13

11/27/08 7:17:30 PM


marasalles

SHOW DE AMAZÔNIA Comandante do paulista Tordesilhas, a chef Mara Salles deu uma palestra espetacular, na qual brilharam os aromas e sabores do Cerrado e da Amazônia

M

a­ra Sal­les ­foi re­ce­bi­da pe­la pla­téia ­com mui­tos aplau­sos, re­tri­bu­í­dos ­de for­ma des­con­ tra­í­da. “Pre­ci­so des­se ­apoio, gen­te, es­tou mui­to ner­vo­sa, ­mas ­vai pas­sar.” As­sim é ­o jei­to ­da ­chef ­que co­man­da ­o res­tau­ran­te Tor­de­si­lhas, ­em ­São Pau­lo, SP: es­pon­tâ­ neo, di­ver­ti­do, ca­ti­van­te. ­E ain­da ­que se con­fes­asse ten­sa, Ma­ra ­não de­mons­trou ­a me­nor di­fi­cul­da­de ­em dis­cor­rer, ­com hu­ mor, so­bre ­o ­que ­mais en­ten­de ­– ­os sa­bo­res ­e os aro­mas bra­si­lei­ros. Nes­se ca­so, es­pe­ ci­fi­ca­men­te, ­os do Cer­ra­do ­e ­os da Ama­ zô­nia. “Di­fe­ren­te­men­te ­da Ama­zô­nia, ­o Cer­ra­do é ca­la­do, ­uma á­rea ­de que ­você pre­ci­sa ter pa­ci­ên­cia pa­ra en­ten­dê-la.”

14

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICA­RDO D’ANGELO

Apai­xo­na­da ­por in­gre­di­en­tes bra­si­lei­ros, Ma­ra cres­ceu ­em Pe­ná­po­lis, ­no oes­te ­do Es­ta­do ­de ­São Pau­lo, “em ­uma á­rea ­de cer­ra­do, ­com ve­ge­ta­ção, ­pôr-do-sol ­e co­ qui­nhos”. ­Ela de­mons­tra mui­ta fa­mi­lia­ri­ da­de ­com es­se bi­o­ma in­ten­so, ­de árvo­res tor­tu­o­sas, ­que ­se es­for­çam pa­ra ­dar fru­tos. ­“Por is­so, ­eles ­são ex­tre­ma­men­te do­ces ou amar­gos, mui­to gor­du­ro­sos.” Den­tre ­os 58 fru­tos na­ti­vos, Ma­ra des­ta­cou ­o pe­qui co­mo ­o ­rei ­do cer­ra­do. “E­le é ­uma ale­gria, por­que é oca­si­o­nal, ­não ­dá du­ran­te to­do ­o ­ano. ­O ­bom pe­ qui ­cai, pre­ci­sa ­ser co­lhi­do ime­di­at­ a­men­ te”, ex­pli­cou. Pa­ra ­a ­chef, ­o fru­to ain­da é pou­co ex­plo­ra­do, es­pe­ci­al­men­te ­na con­

prazeres da mesa

Ok MT_mara salles.indd 14

11/27/08 7:18:25 PM


fei­ta­ria: “Ele po­de ­ser usa­do co­mo ­uma espécie ­de bau­ni­lha”, su­ge­riu. ­A ­chef ain­da ci­tou in­gre­di­en­tes co­mo ca­ju­zi­nho ­do cam­po, ba­ru, gua­ri­ro­ba ­e ju­ru­be­ba: ­uma fes­ta pro­por­cio­na­da pe­la bi­o­di­ver­si­ da­de ­do cer­ra­do. ­“São plan­ti­nhas mi­nús­ cu­las, di­fe­ren­tes en­tre ­si, flo­res, pé­ta­las, ­uma pro­fu­são in­crí­vel ­de ma­ti­zes.” ­À es­sa al­tu­ra, Ma­ra ­já es­ta­va bas­ tan­te tran­qüi­la ­e fa­mi­lia­ri­za­da ­com ­a pla­téia, ­que ­se mos­trou in­te­res­sa­dís­si­ ma ­no con­tra­pon­to à co­zi­nha ­de van­ guar­da: ­a ­chef ex­pôs ­uma co­mi­da sim­ ples ­e in­te­res­san­te, ­que tam­bém cau­sa sur­pre­sa, ­sem ne­ces­sa­ri­a­men­te pas­sar pe­las téc­ni­cas mo­der­nas. ­Foi quan­do ­o as­sun­to mu­dou pa­ra ­a Ama­zô­nia. ­“A pri­mei­ra ­vez ­que ­fui ­a Be­lém, ­o ­que ­me cha­mou aten­ção ­foi ­o ta­ma­nho ­dos pei­ xes”, re­lem­brou. ­Ela mos­trou à pla­téia vá­ri­as fo­tos ­de pei­xes ­da Ba­cia Ama­ zô­ni­ca, ­que, nor­mal­men­te, ­se ali­men­

tam ­de fru­tos ­que ca­em ­na á­gua. ­Na ban­ca­da, ­um fi­lho­te ­de pi­ra­ru­cu, ­com ­mais ­de ­1,50 me­tro, cha­ma­va aten­ção. “E­xis­te ­um pre­con­cei­to mui­to gran­de ­com re­la­ção ­aos pei­xes bra­si­lei­ros, ­mas ­eles ­são ex­tre­ma­men­te sa­bo­ro­sos”. ­A pro­du­ção ­de fa­ri­nha-d’á­gua, ­da man­di­o­ca-bra­va fer­men­ta­da tam­bém ­foi ci­ta­da du­ran­te ­a apre­sen­ta­ção. Ma­ra des­ ta­cou ­a co­zi­nha pa­ra­en­se, ge­nu­i­na­men­te bra­si­lei­ra, for­ma­da prin­ci­pal­men­te pe­la téc­ni­ca in­dí­ge­na ­e pe­la pre­sen­ça por­tu­ gue­sa, ­o ­que ­se evi­den­cia ­nos cal­dos, ­um de­les mui­to im­por­tan­te, ­o ta­cacá, à ba­se ­de go­ma ­de man­di­o­ca, tu­cu­pi ­e jam­bu, ver­du­ra ­que pro­vo­ca dor­mên­cia ­na bo­ca. ­A ­chef, ali­ás, le­vou mui­tas se­men­tes ­de jam­bu – ­mais po­ten­tes ­do ­que ­as fo­lhas – pa­ra ­a pla­téia ex­pe­ri­men­tar. ­E, ­com ­o ­bom hu­mor ­de sem­pre, ­ela acon­se­lhou: ­“Não fi­quem lou­cos, ­por fa­vor, pro­vem ­só ­um pou­qui­nho”. •

15

prazeres da mesa

Ok MT_mara salles.indd 15

11/27/08 7:18:47 PM


debate

NA ERA DO TECNOEMOCIONAL Tema dominante em todas as conversas do Mesa Tendências, Ferran Adrià, o seu criador e principal divulgador, falou sobre esta e outras questões que permeiam o mundo da gastronomia atual

N

o pal­co ­do au­di­tó­rio ­do Se­ nac-SP, ­uma me­sa ­de cra­ ques for­ma­da ­por Fer­ran ­Adrià, ­o ­chef bra­si­lei­ro ­Alex Ata­la ­e ­os jor­na­lis­tas Jo­si­mar Me­lo ­e ­o es­pa­nhol ­Pau Are­nós, me­di­a­do ­por Ri­car­do Cas­ ti­lho, di­re­tor edi­to­ri­al ­de Pra­ze­res ­da Me­sa. Are­nós ­abriu ­os di­ál­ o­gos con­tex­ tu­a­li­zan­do ­os 200 ­anos ­de do­mí­nio ­da

16

POR ROBERTA MALTA FOTO RICA­RDO D’ANGELO

cu­li­ná­ria fran­ce­sa ­no mun­do, abor­dou ­a nou­vel­le cu­i­si­ne (mo­vi­men­to cu­li­ná­rio ocor­ri­do ­nas dé­ca­das ­de 70 ­e 80, ­no ­qual o­ s co­zi­nhei­ros fran­ce­ses pas­sa­ram ­de me­ros re­pro­du­to­res ­de re­cei­tas ­a cri­a­do­ res) ­e ­a con­tri­bui­ção ­dos ­chefs es­pa­nhóis ­que, ­a par­tir ­da dé­ca­da ­de 90, lan­ça­ram no­vos con­cei­tos ­e téc­ni­cas ­que mu­da­ ram o­ fo­co d­ a gas­tro­no­mia mun­di­al.

prazeres da mesa

Ok MT_debate tecnoemocional.indd 16

11/27/08 7:22:23 PM


t

Are­nós res­sal­tou ain­da ­o tem­pe­ra­ men­to ir­re­qui­e­to ­dos ­chefs Pe­dro Su­ bi­ja­na ­e Ju­an Ma­ri Ar­zak, pa­tri­ar­cas ­da co­zi­nha es­pa­nho­la, ­que “a­bra­ça­ram ­a re­ no­va­ção, per­mi­tin­do-se ­a no­vos de­sa­fi­ os”, su­bli­nhou. ­“Não ­se con­ten­ta­ram ­em per­ma­ne­cer imó­veis, ­em ­seus pró­pri­os lou­ros”, dis­se pa­ra ­em se­gui­da acres­cen­ tar: “Co­mo ­na ar­te, ­o er­ro é ne­ces­sá­rio, ­pois ­ele pos­si­bi­li­ta ­a aber­tu­ra ­de no­vos ca­mi­nhos ­e des­co­ber­tas.” ­A se­guir, ­Adrià to­mou ­a pa­la­vra ­e fa­lou so­bre ­a ori­gem ­do no­me ­do ­seu res­tau­ran­te -- ­o ­El Bul­li: ­“Um no­me, ape­nas ­um no­me”, dis­se. Des­mis­ti­fi­cou tam­bém ­a gas­tro­no­mia mo­le­cu­lar, cu­nha­da pe­la mí­dia in­ter­na­ ci­o­nal pa­ra de­no­mi­nar ­sua co­zi­nha. “­Não sa­bí­a­mos co­mo cha­mar ­a co­zi­nha cri­a­ti­ va es­pa­nho­la, ­até ­que pas­sa­mos ­a de­fi­nila co­mo Co­zi­nha Tec­no­e­mo­cio­nal”, afir­ mou. ­A mu­dan­ça pro­põe ­a de­sas­so­cia­ção ­da ima­gem ­que ­a gas­tro­no­mia es­pa­nho­la cri­ou: ­a ­de ­um pro­ces­so uni­ca­men­te ci­ en­tí­fi­co, re­ple­to ­de en­ge­nho­cas tec­no­ló­ gi­cas, ­em ­que ­a emo­ção é sub­tra­í­da. ­O ­mais fa­mo­so ­chef ­da atu­a­li­da­de, po­rém, ­se cur­vou an­te ­a im­por­tân­cia ­da Fran­ça nes­te ce­ná­rio: ­“A mi­nha dú­vi­da é ­em ­que me­di­da ­o ­que fa­ze­mos é ­uma rup­tu­ra ­com ­a nou­vel­le cu­i­si­ne ­ou ­uma evo­lu­ção de­la?”, in­da­gou, to­man­do co­mo exem­plo ­as ar­tes plás­ti­cas: ­“O cu­bis­mo ­de Pi­cas­so ­não é gra­tui­to, ­ele ­saiu ­de al­gum lu­gar”, com­ple­tou. ­No ­fim, ­o de­sa­ba­fo: “Quan­do fa­lam ­do ­El Bul­li, pa­re­ce ­que es­sa van­ guar­da ­tem cin­co ­ou ­seis ­anos. ­O ­que es­ tá­va­mos fa­zen­do, en­tão, ­em 1994, quan­ do ­o inau­gu­ra­mos?”, de­sa­fi­ou.

17

prazeres da mesa

Ok MT_debate tecnoemocional.indd 17

11/27/08 7:20:25 PM


debate

Ul­tra-a­ten­ta, ­a pla­téia ou­viu emo­cio­ na­da es­tas pa­la­vras ­do mi­to ­Adriá. ­Alex Ata­la com­ple­tou ­a ca­tar­se: “Vo­cês es­tão ven­do ­quem ­está fa­lan­do is­so? ­E ­quem ­está sen­ta­do lo­go ­aí em­bai­xo? Ar­zak, ­de ­um la­do, ­e Clau­de Trois­gros, ­de ou­tro”, pro­vo­cou. ­O ­mais fes­te­ja­do ­chef bra­si­ lei­ro fa­lou da­que­le mo­men­to his­tó­ri­co ­e ­a re­vo­lu­ção ­que ­a pla­téia es­ta­va pre­sen­ cian­do. ­No fi­nal, re­ve­lou ­os bas­ti­do­res ­do Jan­tar ­do Sé­cu­lo. ­“Lá, ­não ti­nha ­um lí­der ­e, ­sim, ­uma equi­pe tra­ba­lhan­do. É is­so ­que ­os es­pa­nhóis ­nos en­si­na­ram ­e ­o exem­plo ­que ­o Bra­sil de­ve se­guir”, afir­mou. ­O de­sen­vol­vi­men­to tec­no­ló­gi­co, ou­ tra con­tri­bui­ção es­pa­nho­la, ­foi abor­da­do ­por Jo­si­mar Me­lo. “Te­mos ­que fu­gir des­ se es­tig­ma ­de su­per­va­lo­ri­zar ­os apa­re­lhos. ­O ­que é fun­da­men­tal é ­a vi­são ­de mun­do ­que ca­da ­um ­tem, ­e ­não im­por­ta ­se is­to é tra­du­zi­do ­por ­um si­fão ­ou ­uma fa­ca”, dis­se. ­“Na equa­ção tec­no­e­mo­cio­nal, ­o ter­mo “tec­no” ­tem ­que ­ser co­ad­ju­van­te ­do emo­cio­nal. ­Se ­não ­for ­uma pro­du­ção au­tên­ti­ca, po­de ­usar ­a má­qui­na ­que ­for ­que ­vai ­ser ­um fra­cas­so!”, ob­ser­vou. ­O de­ba­te pros­se­guiu. ­Adrià cha­mou ­seus pa­res ­ao pal­co. ­Um ­a ­um, ­os ­chefs saí­ram ­em de­fe­sa ­da Co­zi­nha Tec­no­e­ mo­cio­nal, ­que ­não dei­xa ­de re­pre­sen­tar ­as raí­zes ­de to­dos ­eles. ­No fi­nal, Clau­de Trois­gros, ­o her­dei­ro ­da nou­vel­le cu­i­si­ne, fes­te­ja­dís­si­mo pe­la en­tou­ra­ge es­pa­nho­ la, su­biu ­ao pal­co. Emo­cio­na­do, ­o ­“chef fran­co-ca­ri­o­ca” en­gros­sou ­o co­ro ­e ­deu ­a úl­ti­ma pa­la­vra: “O­bri­ga­do, ­Alex, ­por ­me cha­mar ­de bra­si­lei­ro”. ­A pla­téia con­sen­ tiu ­e ­o aplau­diu du­ran­te vá­ri­os mi­nu­tos.

18

prazeres da mesa

Ok MT_debate tecnoemocional.indd 18

11/27/08 7:20:57 PM


Untitled-3 19

11/27/08 6:58:19 PM


francispaniego

RESGATE DE SABORES Primeiro chef da região da Rioja a conquistar uma estrela do Guia Michelin, Francis Paniego mostrou que tradição e inovação podem caminhar juntos sempre

F

rancis Paniego afirmou sentirse em uma posição difícil, ao se apresentar logo após o debate sobre a Cozinha Tecnoemocional, com Ferran Adrià, Alex Atala e os jornalistas Pau Arenós e Josimar Melo. Mas dar prosseguimento a trabalhos de peso nunca foi dificuldade para esse representante de uma verdadeira dinastia gastronômica. Primeiro chef de La Rioja a receber uma estrela no Michelin, Paniego é filho de Ma-

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICA­RDO D’ANGELO

risa Sánchez, que já faturou, na Espanha, o prêmio nacional de gastronomia de melhor chef em 1987. Foi dela que ele herdou a paixão pela cozinha. São seis gerações dedicadas à gastronomia. O orgulho de pertencer à família ficou evidente logo no início da palestra, quando ele mostrou ao público várias fotos do hotel-restaurante Echaurren, fundado pelos antepassados em 1898, em Ezcaray. O lugar abriga dois restaurantes – Echaur-

CA­VI­AR À BA­SE ­DE VI­NHO TIN­TO, ­COM ­AGAR-AGAR E ÓLEO DE GIRASSOL

20

prazeres da mesa

Ok MT_francis paniego.indd 20

11/27/08 7:25:09 PM


ren, que representa a tradição, e El Por­tal, a mo­der­ni­da­de. Am­bos sin­te­ti­zam a fi­lo­ so­fia de­fen­di­da por Pa­ni­e­go: a co­zi­nha de van­guar­da de­ve res­ga­tar os sa­bo­res da me­ mó­ria. “É pre­ci­so agre­gar va­lor à co­zi­nha tra­di­cio­nal”, in­sis­tiu. Nes­sa bus­ca pe­lo sa­bor, ­ele apro­vei­ta pro­du­tos me­di­ter­râ­ne­os ­de for­ma ino­va­ do­ra ­e uti­li­za ele­men­tos ­da na­tu­re­za, co­mo ­a ma­dei­ra, pa­ra de­fu­mar in­gre­di­en­tes co­ mo ­o azei­te ­de oli­va, tra­zen­do ­mais vi­gor ­a car­nes ­e ­a pes­ca­dos. ­O ­chef mos­trou ­o pre­pa­ro ­da mer­lu­za, ­um clás­si­co ­da co­zi­ nha es­pa­nho­la, “pra­to con­si­de­ra­do in­sí­pi­ do, ­mas ­com mui­ta tex­tu­ra”. Pa­ra ga­nhar sa­bor, ­ela é se­la­da ­em ó­leo ­de oli­va pu­ro, ­a 180 º­C ­e, ime­di­a­ta­men­te ­após, imer­sa ­em azei­te de­fu­ma­do, ­por 7 mi­nu­tos, ­a 45 º­C. ­A par­te in­ter­na ­se man­tém ­em 37 º­C. “Pa­ re­ce ­frio, ­mas ­não é. ­A car­ne fi­ca su­cu­len­ ta ­e sa­bo­ro­sa ­e nun­ca nin­guém de­vol­veu es­se pra­to”, brin­cou. ­O ­chef tam­bém ­foi me­ti­cu­lo­so ­ao de­ mons­trar ­sua for­ma ­de pre­pa­rar ­um ca­vi­ar à ba­se ­de vi­nho tin­to, ­com ­agar-agar e óleo de girassol. Utilizando uma seringa, ele criou bolinhas de vinho ao pingá-las sobre o óleo, obtendo uma solidificação imediata. O caviar, coado e seco em pa­ pel ab­sor­ven­te, é ser­vi­do com uma co­a­ lha­da de foie gras, pre­pa­ra­da com cre­me de lei­te, ge­la­ti­na e re­du­ção de vi­nho tin­ to. E, pe­la pri­mei­ra vez no even­to, ou­viuse da pla­téia: “Bra­vo!”.

21

prazeres da mesa

Ok MT_francis paniego.indd 21

11/27/08 7:25:29 PM


martínberasategui

BUSCA DA ESSÊNCIA Ao definir seu trabalho como “uma gastronomia na qual não há fronteiras e, sim, raízes”, o estrelado chef basco defendeu a pesquisa de ingredientes e a importância do Brasil nesse contexto e na cena gastronômica mundial

A

pa­les­tra do di­plo­má­ti­co Mar­tín Be­ra­sa­te­gui, do res­ tau­ran­te bas­co que le­va seu no­me, três es­tre­las no Guia Mi­che­lin, na ci­da­de de La­sar­te, foi per­me­a­da de elo­gi­os ao Bra­sil. Se­gun­do ele, o gru­ po de chefs que veio es­pe­ci­al­men­te da Es­pa­nha te­ria co­men­ta­do, na vés­pe­ra, que vol­ta­ria ao pa­ís “mui­tas e mui­tas ve­zes”. A de­cla­ra­ção foi su­fi­ci­en­te pa­ra ar­re­ba­tar a sim­pa­tia da pla­téia que as­ sis­tiu com in­te­res­se ex­tra a seus ví­de­os e ex­p la­n a­ç ões so­b re o te­m a A Com­ ple­x i­d a­d e da Per­f ei­ç ão – A Pai­s a­g em Le­v a­d a à Má­x i­m a Ex­c e­l ên­c ia Cu­l i­n á­ ria Con­tem­p o­râ­n ea.

22

POR ROBERTA MALTA FOTO ANDRÉ PENICHE

Be­ra­sa­te­gui de­fi­niu seu tra­ba­lho co­mo “uma gas­tro­no­mia na qual não há fron­tei­ras e, sim, raí­zes”. Is­so fi­cou ex­plí­ci­to, não só por meio das ima­gens exi­bi­das em um ví­deo so­bre San Se­bas­ ti­an – a ci­da­de de sua in­fân­cia e ado­ les­cên­cia, lo­ca­li­za­da a pou­cos mi­nu­tos de seu res­tau­ran­te – co­mo na pro­por­ ção da ca­sa que co­man­da: dos 500 me­ tros qua­dra­dos de área útil, 350 metros quadrados são ocu­pa­dos por uma es­pa­ ço­sa e ul­tra-equi­pa­da co­zi­nha. E o que pa­ra mui­tos po­de­ria ser um des­pro­pó­ si­to, pa­ra o es­tre­la­do chef é ab­so­lu­ta­ men­te na­tu­ral. “Pas­so mui­tos di­as do ano lá den­tro”, jus­ti­fi­cou.

prazeres da mesa

Ok MT_martin berasategui.indd 22

11/27/08 7:26:06 PM


Com me­di­das pre­ci­sas, su­as re­cei­tas fo­ ram, na mai­o­ria, apre­sen­ta­das no gran­de te­lão do au­di­tó­rio do Se­nac-SP. De­ta­lhes co­mo “a tem­pe­ra­tu­ra de 38 oC é im­por­tan­te pa­ra man­ter o sa­bor da er­va-do­ce” eram su­ ce­di­dos por co­men­tá­rios e ex­pli­ca­ções des­ mis­ti­fi­ca­do­ras: “Aqui, não há má­gi­ca. Tu­do é re­sul­ta­do da in­te­li­gên­cia e do co­nhe­ci­ men­to dos in­gre­di­en­tes”, afir­mou. Ape­sar de to­da a pes­qui­sa, Mar­tín Be­ra­sa­te­gui su­ bli­nhou que em sua cu­li­ná­ria “a mai­o­ria dos pra­tos tem co­mo pon­to de par­ti­da cal­dos, ce­bo­la e alho pi­ca­di­nho”. Por­tan­to, na­da mui­to di­fe­ren­te das re­cei­tas de to­da do­nade-ca­sa bra­si­lei­ra – uma li­ção pre­ci­o­sa, de sim­pli­ci­da­de, do chef es­pa­nhol.

O pon­to al­to de sua pa­les­tra fi­cou por con­ta do fi­lé de sal­mo­ne­te que vi­a­jou 12000 qui­lô­me­tros até che­gar ao pal­co do Me­sa Ten­dên­cias. Ape­nas com ge­ne­ro­sas con­chas de azei­te quen­te co­a­das nu­ma pe­ nei­ra, o chef dei­xou o pei­xe com as es­ca­mas eri­ça­das, for­man­do cris­tais co­mes­tí­veis, co­ mo num ver­da­dei­ro ri­tu­al de ma­gia. “Es­se pro­ces­so pro­por­ci­o­na um sa­bor ma­ra­vi­lho­ so de io­do”, re­la­tou o “ma­go” a um pú­bli­co de olhos vi­dra­dos e água na bo­ca. Co­mo úl­ti­ma li­ção, o co­zi­nhei­ro de­cla­rou: “Se res­pei­ta­rem os in­gre­di­en­tes que vo­cês têm à mão, o Bra­sil te­rá, em pou­co tem­po, a me­ lhor co­zi­nha e a me­lhor sa­ú­de do mun­do. E to­dos po­de­rão des­fru­tar is­so”.

23

prazeres da mesa

Ok MT_martin berasategui.indd 23

11/27/08 7:26:35 PM


javiertorres

CONQUISTA PELAS RAÍZES Javier Torres, um dos comandantes do Eñe, em São Paulo, mostrou sua paixão pela mandioquinha e como as raízes brasileiras estão conquistando a Espanha

“Q

uan­do co­nhe­ci a man­ dio­qui­nha, fi­quei apa­ vo­ra­do. Nun­ca ti­nha vis­to na­da tão aro­má­ti­co. Sem­pre que vol­to à Es­pa­nha, le­vo uma ma­la cheia des­sa ra­iz.” A afir­ma­ção, de Ja­vi­er Tor­ res, do res­tau­ran­te Eñe, em São Pau­lo, tra­duz o fas­cí­nio co­mum aos chefs van­ guar­dis­tas pe­los in­gre­di­en­tes bra­si­lei­ros. Ele abor­dou a adap­ta­ção des­ses pro­du­tos à co­zi­nha es­pa­nho­ la e de­mons­trou ao pú­bli­co a uti­li­za­ção, na prá­ti­ca, da Gas­ tro­vac – fer­ra­men­ta com­pac­ta que per­mi­te a coc­ção a vá­cuo, de­sen­vol­vi­da por ele e o ir­mão, Sér­gio, em par­ce­ria com a Uni­ ver­si­dad Po­li­téc­ni­ca de Va­lên­ cia, na Es­pa­nha. Ja­vi­er ex­pli­cou que o prin­ ci­pal mé­ri­to do equi­pa­men­to é res­pei­tar o pro­du­to e su­as pro­ pri­e­da­des: vi­ta­mi­nas, pro­teí­ nas, es­tru­tu­ra e con­sis­tê­ncia. ­Tal fa­ça­nha é ob­ti­da gra­ças ­ao vá­cuo, ­que re­duz ­a pres­são ­e per­mi­te coc­ções ­em bai­xas tem­pe­ra­tu­ras, ­a ­no má­xi­mo 60 º­C. “Sa­ be­mos ­que ­o ex­ces­so ­de ca­lor pre­ju­di­ca ­o in­gre­di­en­te ­e, co­zi­do des­sa for­ma, ­ele ­fi­ca ­mais ­pró­xi­mo ­de ­su­as ­ca­rac­te­rís­ti­cas ori­gi­nais.” O chef lem­brou, tam­bém, que até mes­mo o azei­te, quan­do uti­li­za­do na

24

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICA­RDO D’ANGELO

Gas­tro­vac pa­ra fri­tar ali­men­tos, man­tém su­as pro­pri­e­da­des. Com o equi­pa­men­to, ele pre­pa­rou um agu­lhão, pei­xe co­mum no Bra­sil e na Es­ pa­nha, mas com ca­rac­te­rís­ti­cas di­fe­ren­tes nos dois paí­ses. “É cu­ri­o­so ter­mos pro­du­ tos apa­ren­te­men­te igua­is, mas o At­lân­ ti­co e o Me­di­ter­râ­neo con­fe­rem sa­bo­res e aro­mas dis­tin­tos a pei­xes idênticos.” Ao pre­pa­rar o pes­ca­do, Ja­vi­er cha­mou a aten­ção pa­ra o re­sul­ta­do da coc­ção: a di­fe­ren­ça de cor e tex­tu­ra en­tre o agu­ lhão em seu es­ta­do ori­gi­nal e já co­zi­do é mí­ni­ma. Co­mo acom­pa­nha­men­to, ele usou ou­tro in­gre­di­en­te pro­du­zi­do no Bra­ sil, o ar­roz ne­gro, pe­lo qual se de­cla­rou um apai­xo­na­do. “Tem uma tex­tu­ra boa e sa­bor in­ten­so, com aro­ma es­pe­ta­cu­lar. É um pro­du­to sur­pre­en­den­te.” Ain­da so­bre os pro­du­tos bra­si­lei­ros, Ja­vi­er de­mons­ trou o pre­pa­ro de um cre­me à ba­se de raí­ zes, “com tex­tu­ra e cre­mo­si­da­de im­pres­ sio­nan­tes”. O pra­to, se­gun­do o chef, faz su­ces­so na Es­pa­nha, por ter “o aro­ma da man­dio­qui­nha, a cre­mo­si­da­de do ca­rá e um le­ve acen­to ado­ci­ca­do, con­fe­ri­do pe­ la ba­ta­ta-do­ce”. In­ha­me e ba­ta­ta tam­bém in­te­gram a re­cei­ta, além de man­tei­ga e cre­me de lei­te. Os in­gre­di­en­tes ga­nham tex­tu­ra de cre­me após se­rem pro­ces­sa­dos em ter­mo­mix. Pa­ra fi­na­li­zar, ca­vi­ar de sa­ gu e azei­te de oli­va. Um be­lo exem­plo da tec­no­lo­gia uti­li­za­da a ser­vi­ço do sa­bor.

prazeres da mesa

OK MT_javier_torres.indd 24

11/27/08 7:27:13 PM


pedrosubijana

SURPREENDER O COMENSAL Em vídeo, o chef Pedro Subijana se desculpa por não estar presente, e encanta com preparações de ostra e lagosta na cafeteira

A

guar­da­do pa­ra abor­dar ­o te­ma Ma­ni­pu­la­ções ­e Es­pe­lhis­mos ­de Ca­rá­ter Lú­di­co ­e Ines­pe­ra­do, ­o ­chef bas­co Pe­dro Su­bi­ja­na, ­do res­tau­ran­ te Ake­lar­re, ­em ­San Se­bas­ti­án, ­não pô­de com­pa­re­cer ­ao Me­sa Ten­dên­ci­as. ­Mas ­nem ­por is­so dei­xou ­de sur­pre­en­der. La­ men­tan­do ­a au­sên­cia, ­ele gra­vou ­um ví­ deo, ­que ­foi exi­bi­do ­a ­uma pla­téia aten­ta, “u­ma amos­tra ­do ­que ­eu ha­via pre­pa­ra­ do”. Apai­xo­na­do ­por os­tras, “pre­pa­ra­das ­a qual­quer ho­ra ­e ­por qual­quer mo­ti­vo”, ­o ­chef cri­ou ­uma ver­são ­do mo­lus­co, ­que ex­plo­de ­na bo­ca. ­As “os­tras ­que ­se co­mem ­com ­a cas­ca” ­são ex­traí­das ­da con­cha ­e ma­ri­na­das ­no pró­prio su­co – á­gua ­do ­mar fil­tra­da. Uti­li­zan­do in­gre­di­en­tes tí­pi­cos pa­ra ba­nhá-las, co­mo ce­bo­la quei­ma­da, ­pão ne­gro tos­ta­do ­e man­tei­ga ­de ca­cau, é cri­a­da pa­ra ­o mo­lus­co ­uma no­va cas­ca, ­de tex­tu­ra cro­can­te ­e ­cor es­cu­ra. ­“A sur­pre­ sa é co­lo­car ­a os­tra in­tei­ra ­na bo­ca, ­sem mor­dê-la, pa­ra ­que ­se des­fru­te to­tal­men­te ­o sa­bor, ­até ­que acon­te­ça ­uma ex­plo­são ­de ­mar ­em ­sua bo­ca.” Su­bi­ja­na ­tem pa­ra ­si ­que ­sua mis­são é en­con­trar sa­bo­res ­e tex­tu­ras ori­gi­nais. De­fen­de ­que ­os cli­en­tes ­não ­vão ­a ­um

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICARDO D’ANGELO

res­tau­ran­te pa­ra sim­ples­men­te co­mer, que­rem ­ser sur­pre­en­di­dos. ­E, nes­sa bus­ ca, ­ele ­cria pra­tos co­mo ­a inu­si­ta­da la­ gos­ta co­zi­da ­em ca­fe­tei­ra glo­bi­nho, cu­ja apre­sen­ta­ção ca­ti­vou ­a pla­téia. ­A la­gos­ ta, ain­da vi­va, ­tem ­a car­ne ex­tra­í­da ­da pró­pria cas­ca ­por in­tei­ro. É cor­ta­da ­crua, ­em me­da­lhões, ­e dis­pos­ta ­no com­par­ti­ men­to ­de ci­ma ­da ca­fe­tei­ra, acom­pa­nha­ da ­por in­gre­di­en­tes aro­má­ti­cos, co­mo as­par­gos sel­va­gens, man­je­ri­cão, ce­bo­la ­e pé­ta­las ­de flo­res co­mes­tí­veis, ­que dei­ xam ­a apre­sen­ta­ção ain­da ­mais bo­ni­ta. ­No glo­bo in­fe­ri­or, ­vai ­um cal­do vi­go­ro­ so, ob­ti­do ­da ca­be­ça ­do crus­tá­ceo. As­sim ­que ­o lí­qui­do so­be, ­o ca­lor co­zi­nha ­a la­ gos­ta, ­de for­ma per­fei­ta. ­O ­chef tam­bém ex­pli­cou co­mo é fei­ ­ en­te to ­o ser­vi­ço: à me­sa, ­o cal­do, pre­vi­am aque­ci­do, é co­lo­ca­do ­na ba­se ­da ca­fe­tei­ra, pa­ra ­que su­ba ra­pi­da­men­te, co­zen­do ­a la­ gos­ta di­an­te ­do cli­en­te. ­Um pro­ce­di­men­ to di­ver­ti­do, ­que per­mi­te sen­tir ­o sa­bor na­tu­ral ­e ver­da­dei­ro ­da la­gos­ta. ­“É pre­ci­ so per­ce­ber ­que quan­do va­mos em­bo­ra, ­o ­que fi­ca ­na men­te é ­uma for­te lem­bran­ça”, con­clu­iu ­o ­chef, ­que é mes­tre ­em pro­vo­car es­sa fa­ça­nha. •

25

prazeres da mesa

014_pedro subijana.indd 25

11/27/08 7:16:08 PM


produtos

AO ALCANCE DOS OLHOS E DO PALADAR Os produtos, equipamentos e comidinhas que fizeram sucesso entre os gourmets, chefs de cozinha e participantes do Mesa Tendências de va­lên­cia pa­ra o bra­sil Os re­pre­sen­tan­tes do Ins­ti­tu­to Va­len­cia­ no da Ex­por­ta­ção (Ivex) mar­ca­ram pre­sen­ça no Me­sa Ten­dên­cias pa­ra di­ vul­gar os pro­du­tos e a cul­ tu­ra da re­gi­ão es­pa­nho­la de Va­lên­cia. Cho­co­la­tes de al­tís­si­ma qua­li­da­de e tor­ro­nes de sa­bor ir­re­sis­ tí­vel, ar­roz e tem­pe­ri­nhos – fo­ram al­guns dos des­ta­ ques das em­pre­sas da­que­ la par­te da Es­pa­nha que bus­cam es­pa­ço no mer­ ca­do na­ci­o­nal e no co­ ra­ção dos con­su­mi­do­res bra­si­lei­ros. Den­tre eles, o sal de ro­sa de Hi­ma­laia e flor de sal com wa­sa­bi. Al­ guns pro­du­tos já es­tão nas pra­te­lei­ras bra­si­lei­ras. O Ivex, que tem 28 es­cri­tó­rios es­pa­lha­dos por vá­rios paí­ ses, in­clu­in­do o Bra­sil, é res­pon­sá­vel por pro­mo­ver a in­ter­na­cio­na­li­za­ção da eco­ no­mia va­len­cia­na, ofe­re­cen­do ser­vi­ços, pro­gra­mas e fer­ra­men­tas que aju­dam a le­var as em­pre­sas da re­gi­ão pa­ra o mer­ ca­do ex­ter­no.

26

POR JULIA ZILLIG FOTO CAROL GHERARDI

com a gri­fe adrià Pres­tes a de­sem­bar­car no Bra­sil, a em­ pre­sa es­pa­nho­la So­lé Gra­ells (www.so­ le­gra­ells.com) re­pre­sen­ta os pro­du­tos que le­vam a as­si­na­tu­ra de Fer­ran Adrià. São du­as li­nhas que in­clu­em pro­du­tos pa­ra fa­zer ge­la­ti­nas quen­tes, ca­vi­ar de me­lão, ra­vi­ó­lis es­fé­ri­cos, en­tre mui­tos. A li­nha Tex­tu­ras é com­pos­ta por três su­bli­nhas: emul­si­fi­ca­ção, es­te­ri­fi­ca­ção e ge­li­fi­ca­ção. A pri­mei­ra, por exem­plo, res­pon­sá­vel por cri­ar as es­pu­mas, traz o Le­ci­te, res­pon­sá­ vel por es­se pro­ces­so. Já o kit Ge­li­fi­ca­ção, in­clui os pro­du­tos Gel­lan, Kap­pa, Io­ta e Agar, pa­ra fa­zer ge­la­ti­nas com con­sis­tên­ cia fir­me e elás­ti­ca.

prazeres da mesa

Ok MT_standes.indd 26

11/27/08 7:27:57 PM


Ou­tra li­nha que se des­ta­ca é a Lyo Sa­bo­res, as­si­na­da tam­bém pe­lo pas­te­ lei­ro Al­bert Adrià, ir­mão de Fer­ran, com­pos­ta por pro­du­tos lio­fi­li­za­dos, sem água, que man­tém o sa­bor, aro­ma e co­ res ori­gi­nais. Es­tá dis­po­ní­vel em seis ti­ pos: man­ga, mo­ran­go, aba­ca­xi, gro­se­lha, pês­se­go e fram­bo­e­sa. Po­dem ser usa­dos em pra­tos do­ces e sal­ga­dos – sa­la­das, sor­ ve­tes e so­bre­me­sas. Tam­bém com a gri­fe da du­pla, o Cro­quan­ter traz um jo­go de mo­de­los pa­ra cri­ar lâ­mi­nas de di­ver­sas for­mas, com base em cre­mes de fru­tas, ver­du­ras, fru­tas se­cas, en­tre ou­tros in­ gre­di­en­tes, dan­do um aca­ba­men­to di­fe­ ren­ci­a­do a qual­quer ti­po de pra­to.

ja­mon, azei­tes e vi­na­gre de je­rez A Agên­c ia da An­d a­l u­z ia de Co­m ér­c io Ex­t e­r i­o r, Ex­t en­d a (www.ex­t en­d a.es), trou­x e al­g uns pro­d u­t os de em­p re­s as es­p a­n ho­l as que já con­t am com dis­t ri­ bu­i ­d o­r es no pa­í s. É o ca­so da Bo­d e­g a San­chez Ro­m a­te, que pro­d uz o vi­n a­ gre de Je­r ez, e da Ar­b e­q ui­n o An­d a­l uz, com seus apre­c i­a ­d os azei­t es de oli­v a. Mas a es­t re­l a do es­t an­d e foi o Ja­m on, pre­sun­to cu­r a­d o fei­t o pe­l a San­c hez Ro­me­ro Car­v a­j al, e que ho­j e é im­p or­ ta­do pe­l a Mi­o ­l o. O pro­d u­t o, ex­t ra­í­d o da par­te tra­s ei­r a – per­n a e co­x a – do cer­do 100% ibé­ri­c o pu­ro, ren­d e um pre­sun­to ar­t e­s a­n al, com sa­b or, aro­m a e tex­tu­ras di­f e­r en­c i­a­d os. Além dis­s o, pos­sui gor­d u­ra sem co­l es­te­rol.

27

prazeres da mesa

Ok MT_standes.indd 27

11/27/08 7:28:27 PM


produtos

rá­pi­dos e ver­sá­te­is Os for­nos de al­ta ve­lo­ci­da­de da fa­bri­can­te ame­ri­ca­na Tur­ bo­Chef fo­ram os des­ta­ques do es­tan­de da Em­pla­rel (em­ pla­rel.com.br). Os mo­de­los i5, C3 e El Tor­na­do, com­bi­nam ra­pi­dez, ver­sa­ti­li­da­de e ren­di­ men­to. Gra­ças ao sis­te­ma de mi­cro­on­das ins­ta­la­do em sua ca­vi­da­de in­te­ri­or, o i5 é com­ pa­tí­vel com ban­de­jas me­tá­li­ cas de apro­xi­ma­da­men­te 15 centímetros de pro­fun­di­da­ de. Além dis­so, pos­sui um sis­te­ma de au­to­diag­nós­ti­co in­te­gra­do pa­ra con­tro­lar o ren­di­men­to do for­no e um car­dá­pio in­te­li­gen­te com ca­ pa­ci­da­de de ar­ma­ze­na­men­to de até 200 re­cei­tas. O mo­de­lo C3 as­sa ali­men­tos com até dez ve­zes mais ra­pi­dez e qua­li­da­ de su­pe­ri­or ao pro­ces­so por ou­tros ti­pos de for­no. Tem um sis­te­ma in­te­gra­do de re­cir­ cu­la­ção de ar com con­ver­sor ca­ta­lí­ti­co e es­pa­ço pa­ra gra­var 128 re­cei­tas. O for­no El Tor­na­do dou­ra e tos­ta ali­men­tos de ma­ nei­ra uni­for­me e cons­tan­te, 12 ve­zes mais rá­pi­do do que os mé­to­dos tra­di­cio­nais de coc­ção, ge­ran­do al­to ní­vel de pro­du­ti­vi­da­ de sem com­pro­me­ter a qua­li­da­de. Tem sis­ te­mas di­fe­ren­ci­ad­ os de coc­ção, dou­ra­dor com con­tro­le in­de­pen­den­te, en­tre ou­tras ca­rac­te­rís­ti­cas. co­mi­da quen­te, pa­ne­la fria Es­pe­cia­li­za­da em equi­pa­men­tos pro­fis­si­ o­nais pa­ra co­zi­nhas, a em­pre­sa bra­si­lei­ ra En­ge­fo­od es­tá tra­zen­do da Ale­ma­nha uma li­nha de pro­du­tos de in­du­ção tér­ mi­ca da mar­ca Ri­e­ber. Ape­sar de ser al­go

28

prazeres da mesa

Ok MT_standes.indd 28

11/27/08 7:28:55 PM


no­vo no Bra­sil, a in­du­ção já é uti­li­za­da na Eu­ro­pa em co­zi­nhas de bis­trôs. No co­zi­ men­to fei­to por in­du­ção, ape­nas a pa­ne­ la e a co­mi­da são aque­ci­das. Mas quan­do ela é re­mo­vi­da do fo­gão, o equi­pa­men­to se tor­na pra­ti­ca­men­te frio ao to­que. O fo­gão por in­du­ção atin­ge a tem­pe­ra­tu­ra de­se­ja­da em me­nos tem­po, ou se­ja, ocu­ pa so­men­te 10% do tem­po uti­li­za­do por uma bo­ca de fo­gão con­ven­cio­nal.

pra­ti­ci­da­de em al­ta Na mes­ma li­nha de equi­pa­men­tos de co­zi­men­to por in­du­ção, a Mal­lory e a hol­ding es­pa­nho­la Tau­rus apre­sen­ta­ram o equi­pa­men­to My Co­ok. Pro­ces­sa­dor de ali­men­tos de al­ta ve­lo­ci­da­de, co­zi­ nha por in­du­ção e agre­ga o con­cei­to de co­zi­nha fá­cil, sub­sti­tuin­do vá­rios ou­tros uten­sí­li­os. Pos­sui ba­lan­ça in­te­gra­da e três ve­lo­ci­da­des: amas­sar, re­fo­gar e tur­ bo. Co­zi­nha ao va­por, pre­pa­ra cal­dos e so­pas, co­zi­nha ma­car­rão, pi­ca, tri­tu­ra, mói, prepara mas­sas, re­fo­ga, en­gros­sa min­gaus e cre­mes, ba­te cla­ras em ne­ve e ain­da ra­la quei­jo. Vem acom­pa­nha­do de um li­vro com 230 re­cei­tas pa­ra se­r fei­tas com o equi­pa­men­to. pa­ra os olhos Apro­vei­tan­do a vin­da do chef es­pa­nhol Mar­cos Mo­rán ao Bra­sil, o Prin­ci­pa­do de As­tú­ri­as apre­sen­tou um pou­co de su­ as ri­que­zas em vá­ri­as pu­bli­ca­ções, den­tre elas o Guia Me­sas de As­tu­ri­as – Ex­ce­lên­ cia Gas­tro­nô­mi­ca (in­fo­as­tu­ri­as.com), que re­la­ta um pou­co das tra­di­ções da ci­da­ de e seus pro­du­tos co­mo car­nes, fa­vas, quei­jos, em­bu­ti­dos. A pu­bli­ca­ção, nos idio­mas es­pa­nhol e in­glês. traz ain­da um ro­tei­ro com os prin­ci­pa­is res­tau­ran­tes de al­ta gas­tro­no­mia da re­gi­ão.

bo­lhas com so­ta­que O Ins­ti­tut del Ca­va, que reú­ne os pro­ du­to­res do es­pu­man­te es­pa­nhol, veio ao Bra­sil com o in­tui­to de es­trei­tar seu re­la­ci­o­na­men­to com em­pre­sas bra­si­lei­ ras e fa­zer um tra­ba­lho no pa­ís pa­ra di­ vul­gar a be­bi­da. A idéia é am­pli­ar sua pre­sen­ça no mer­ca­do, já que a ven­da de ca­vas vem au­men­tan­do sig­ni­fi­ca­ ti­va­men­te entre os con­su­mi­do­res bra­ si­lei­ros. Na oca­si­ão, o Ins­ti­tut del Ca­va mos­trou os pro­du­tos de al­gu­mas vi­ní­co­las que ain­da não es­tão nos ca­tá­lo­gos das im­ por­ta­do­ras e nas pra­te­lei­ras dos su­per­mer­ca­dos ao la­do de ou­tras já co­nhe­ci­das, co­mo é o ca­so da Ra­ven­tós Ro­sell (Gran He­re­tat), Gra­mo­na (Gra­mo­na Im­pe­ri­al Gran Re­ser­va Brut), Pe­re Ven­ tu­ra (Tré­sor Brut Na­tu­re), Ju­vé y Camps (Gran Ju­vé y Camps Brut), Pi­nord (Pi­nord Mar­ru­ga Grand Re­ser­ve Brut Na­tu­re) e Co­dor­niu, com des­ta­que pa­ra a Co­dor­niu Pi­not Noir Brut.

29

prazeres da mesa

Ok MT_standes.indd 29

11/27/08 7:29:21 PM


joanroca

DESTILADOR DE AROMAS Joan Roca contou alguns dos segredos que fazem El Celler de Can Roca um dos melhores restaurantes do mundo

J

o­an Ro­ca é ­um in­can­sá­vel ­na bus­ca ­por cri­ar es­ta­dos ­de âni­mo ­que res­ga­tem vi­vên­ci­as pes­so­ais ­e re­cor­da­ções ­de in­fân­cia. Jun­to ­aos ir­ mãos, Jo­sep ­e Jor­di, ­o ­chef ca­ta­lão re­a­ li­za ­um tra­ba­lho ­de in­ves­ti­ga­ção ­– ­com des­ti­la­dos, vi­nhos, fu­mo ­e ­até per­fu­mes ­– ­que ga­ran­tiu ­a El Cel­ler ­de ­Can Ro­ca, ­em Gi­ro­na, du­as es­tre­las ­no Mi­che­lin ­e ­a 11a po­si­ção ­no ­ranking ­dos me­lho­res res­tau­ ran­tes ­do mun­do, pu­bli­ca­do anual­men­te pe­la re­vis­ta bri­tâ­ni­ca Res­tau­rant Ma­ga­ zi­ne. Ro­ca ­se ­apóia ­na im­por­tân­cia ­dos aro­mas vo­lá­te­is ­e uti­li­za téc­ni­cas sur­pre­ en­den­tes, co­mo ­a ob­ten­ção ­de des­ti­la­dos, que per­mi­te, ­por exem­plo, le­var ­ao pra­to aro­mas naturais, co­mo ­o de ter­ra. Po­de

30

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTOS ANDRÉ PENICHE E RICARDO D’ANGELO

a­ té so­ar es­tra­nho, ­mas du­ran­te ­a apre­sen­ ta­ção, ­ele con­se­guiu des­per­tar ­o fas­cí­nio ­da pla­téia ­com ­os fun­da­men­tos ­de ­sua téc­ ni­ca. ­“O mun­do ­dos des­ti­la­dos co­me­çou ­com ­o de­se­jo ­de cap­tar ­os aro­mas ­que ­se des­pren­dem, pa­ra trans­for­má-los ­em mo­ lhos ­que tra­zem di­ver­si­da­de ­ao pra­to.” ­A ­idéia ­da des­ti­la­ção é se­pa­rar “o cor­ po ­e a al­ma” ­dos in­gre­di­en­tes. ­O ­chef de­ mons­trou ­o pro­ce­di­men­to pa­ra ­se ob­ter ­um ­de ­seus prin­ci­pa­is des­ti­la­dos: á­gua ­e ter­ra fi­cam ­em in­fu­são ­por 24 ho­ras ­e se­ guem pa­ra ­o des­ti­la­dor ­a vá­cuo ­a 45 ºC. ­A ebu­li­ção ­em bai­xa tem­pe­ra­tu­ra so­fre ­um pro­ces­so mí­ni­mo ­de coc­ção ­e, des­sa for­ ma, ­o des­ti­la­do ob­ti­do con­cen­tra ­os aro­ mas ­da ter­ra. ­A ­ele ­se adi­ci­o­na ­a xan­ta­na

prazeres da mesa

Ok MT Joan Roca.indd 30

11/27/08 7:29:56 PM


t

(es­pes­san­te ­em go­ma ­que ­não mo­di­fi­ca ­o sa­bor ­do in­gre­di­en­te), ob­ten­do-se ­um mo­lho ­com sa­bor ­de ter­ra, ­mais lím­pi­do ­do ­que ­se fos­se ob­ti­do ­em al­ta tem­pe­ra­ tu­ra. ­A téc­ni­ca é uti­li­za­da ­em su­ges­tões re­ve­ren­cia­das mun­do afo­ra, co­mo ­a os­tra ­ao Cha­blis. ­No pra­to, ­não ­há ter­ra, ­mas ­o aro­ma ­está pre­sen­te ­e fi­el no ­gel ­que en­ vol­ve ­o mo­lus­co. ­“É in­te­res­san­te che­gar ­ao sa­bor ­de ter­ra, co­mo ­um pas­seio ­por ­um bos­que úmi­do. ­Foi ­a ma­nei­ra ­de le­var esse sa­bor a­ o pra­to”, ex­pli­cou. Ou­tra de­mons­tra­ção in­te­res­san­te fo­ ram ­as os­tras ­ao Ca­va. “Pro­cu­ra­mos fa­ zer ­um pra­to ­sem ­ter de re­du­zir ­a be­bi­da, ­o ­que pro­vo­ca­ria ­a per­da ­de vá­ri­as ca­rac­ te­rís­ti­cas ori­gi­nais.” A so­lu­ção ­foi in­cor­ po­rar xan­ta­na di­re­ta­men­te ao Ca­va, ain­ da ­na gar­ra­fa, ­na fa­se fi­nal ­da ela­bo­ra­ção ­da be­bi­da. ­O es­pu­man­te é des­pe­ja­do so­ bre ­o pra­to, ­já ­com con­sis­tên­cia es­pes­sa, pre­ser­van­do su­as pro­pri­e­da­des, in­clu­si­ve ­o ­gás car­bô­ni­co. ­A van­ta­gem: “Quan­do ­se be­be o Ca­va, ­o pra­zer é ins­tantâneo, ­mas ­com ­a tex­tu­ra, ­ela po­de ­ser apre­ci­a­ da ­mais len­ta­men­te”. ­Por ­fim, Ro­ca apre­sen­tou ­seu tra­ba­ lho ­com per­fu­mes ­em for­ma ­de so­bre­ me­sa. ­Não ­se tra­ta ­de uti­li­zar es­sên­cias fa­mo­sas ­nos pra­tos. ­A in­ten­ção é cap­tar ­o aro­ma vo­lá­til ­do per­fu­me, ten­do co­mo pon­to ­de par­ti­da ­as no­tas ­que for­mam ­a es­sên­cia. Pa­ra exem­pli­fi­car, ­o ­chef to­mou por ba­se ­o per­f u­me ­Eau ­de ­Té ­Blanc, ­de Bvlga­ri, ­com no­tas ­de ­chá, aça­frão ­e la­van­da. ­O aça­frão ­foi des­ti­la­do, ­com ­a téc­ni­ca ­já apre­sen­ta­da, ­e con­ver­ti­do ­em mo­lho. Uti­li­zou-se, tam­bém, ­uma in­f u­ são ­de ­chá bran­co ­e azei­te, pa­ra bus­car con­tras­te. ­E ­viu-se, por­tan­to, ­que ­o pro­ ce­di­men­to na­da ­mais é que ­uma adap­ta­ ção pa­ra ­que ­o co­men­sal bus­que, ­na me­ mó­ria, ­o aro­ma ­do per­f u­me. ­Com is­so, Ro­ca fez ­a pla­téia extasiar-se. prazeres da mesa

Ok MT Joan Roca.indd 31

31

11/27/08 7:30:18 PM


analuizatrajanoerodrigooliveira

O QUEIJO NA “ALTA COZINHA SERTANEJA” Ana Luiza Trajano e Rodrigo Oliveira, dois profissionais brasileiros que resgatam e valorizam cada vez mais os produtos de nosso país, deram um show com nossos queijos

POR ROBERTA MALTA FOTOS ANDRÉ PENICHE E RICARDO D’ANGELO

O

du­e­to for­ma­do ­por ­Ana Lui­za Tra­ja­no ­e Ro­dri­go Oli­vei­ra, ­dos res­tau­ran­ tes pau­lis­ta­nos Bra­sil ­a Gos­to ­e Mo­cotó, res­pec­ti­va­men­te, ­se de­bru­ça­ram so­bre ­o te­ma “Quei­jos Bra­si­lei­ros” ­em ­sua apre­sen­ta­ção ­no Me­sa Ten­dên­ ci­as. ­A du­pla, cu­jo tra­ba­lho ­tem co­mo fo­co prin­ci­pal ­a co­zi­nha na­ci­o­nal ­de ra­iz, ­faz su­ces­so in­ves­tin­do ­na sim­pli­ci­da­de que, de tão sutil, vira so­fis­ti­ca­ção à me­sa. Quan­do re­ce­be­ram ­o de­sa­fio ­de fa­lar ­ao pú­bli­co, ­no ­ano ­em ­que ­a van­guar­da es­pa­nho­la li­de­ra­ da ­por Fer­ran ­Adrià gal­va­ni­za­va to­das ­as aten­ções, ­os ­dois tra­ta­ram ­de ­se apro­fun­dar ­no as­sun­to. “Trou­xe­mos, ­aqui, pa­ra vo­cês ­a ‘al­ta gas­tro­no­mia ser­ta­ne­ja’”, brin­cou ­Ana Luiza, lo­go ­no iní­cio ­dos tra­ba­lhos.

32

prazeres da mesa

036a037_rodrigo.indd 32

11/27/08 7:32:17 PM


­A jo­vem ­chef ex­pli­cou ­em se­gui­da, eta­pa ­por eta­pa, to­da ­a pro­du­ção ­do quei­jo ar­te­ sa­nal. “Pa­ra ­se ­ter qua­li­da­de, é de­ter­mi­nan­te ­que ­se ob­ser­ve des­de ­a ra­ça ­do ga­do ­até os fa­to­res am­bien­tais ­que in­flu­en­ci­am ­a pro­du­ção ­de lei­te”, en­fa­ti­zou. ­Além dis­so, le­van­tou ­a ban­dei­ra ­da qua­li­da­de ­do lei­te ­cru – ­o ti­po não-pas­teu­ri­za­do –, ­que, se­gun­do ­ela, é res­ pon­sá­vel ­por quei­jos ­mais ri­cos ­em tex­tu­ra ­e com­ple­xi­da­de. ­“Mas sua co­mer­cia­li­za­ção é di­fi­cul­ta­da ­por ques­tões bu­ro­crá­ti­cas, ­que ­o tor­nam in­vi­á­vel”, re­cla­mou. “Es­sa ques­tão de­ve­ria con­tar ­com ­o ­apoio ­das au­to­ri­da­des. Pre­ci­sa­mos va­lo­ri­zar ­mais nos­sos in­gre­di­en­ tes”, bra­dou ­com ­a for­ça ­e pai­xão ­de ­sua ju­ven­tu­de. ­Em su­as pes­qui­sas, ­Ana Luiza Tra­ja­no des­co­briu, ­por exem­plo, ­que, quase ­um úni­co Es­ta­do bra­si­lei­ro, Mi­nas Ge­ra­is, é res­pon­sá­vel ­por 90% ­da pro­du­ção na­ci­o­nal, ­e ­que pra­ ti­ca­men­te ­está ­nas ­mãos ­de pe­que­nos pro­du­to­res. ­Sua dis­tri­bui­ção, pre­cá­ria ­na mai­o­ria ­das ve­zes, ­mais ­as bar­rei­ras im­pos­tas pe­la le­gis­la­ção ­do se­tor, di­fi­cul­tam ­que essas igua­rias che­guem ­aos con­su­mi­do­res ­de ou­tras re­gi­ões ­do pa­ís. Is­so ­fez ­com ­que ­a du­pla mo­bi­li­zas­se es­for­ços ­e ener­gi­as ­em ­prol ­de ­um pro­je­to pe­la pre­ser­va­ção ­do quei­jo ar­te­sa­nal, ­e ­no ­qual es­tão atu­al­men­te em­pe­nha­dos. ­O ob­je­ti­vo ­de am­bos é ca­ta­lo­gar to­dos ­os quei­jos pro­du­zi­dos ­no pa­ís, con­tri­buin­do pa­ra dis­se­mi­ nar ­seu con­su­mo. ­“As ­leis ­que re­gem ­o se­tor ­são ­o mai­or im­pe­di­ti­vo. ­Elas de­ter­mi­nam 60 di­as ­de ma­tu­ra­ção, ­mas ­três se­ma­nas ­são tem­po su­fi­ci­en­te pa­ra ­se ga­ran­tir ­sua qua­ li­da­de”, afir­mou. ­A se­guir, ­a ­chef ex­pli­cou ­as ca­rac­te­rís­ti­cas ­e ­as pe­cu­li­ar­ i­da­des ­dos ti­pos ho­je pro­du­ zi­dos ­no pa­ís, co­mo ­o quei­jo de co­a­lho, queijo man­tei­ga, ca­nas­tra, en­tre ou­tros. Ro­dri­go Oli­vei­ra ­fez co­ro à­s pa­la­vras ­da co­le­ga ­e pre­pa­rou ­uma re­cei­ta ­com fa­ro­fa ­que le­va quei­jo man­tei­ga. ­Após ­a apre­sen­ta­ção, ­a du­pla, ­que cu­nhou ­a ex­pres­são “al­ta co­zi­nha ser­ta­ne­ja”, ­saiu aplau­di­da, an­ga­ri­an­do sim­pa­ti­zan­tes pa­ra sua cau­sa. •

33

prazeres da mesa

036a037_rodrigo.indd 33

11/27/08 7:32:42 PM


frédéricbau

ALQUIMISTA DO CHOCOLATE A iguaria feita de cacau é a estrela em pratos doces e salgados na mão do francês Fréderic Bau

F

a­zer do cho­co­la­te a es­tre­la de um pra­to não é ta­re­fa das mais com­pli­ca­das quan­do o as­sun­to é so­bre­me­sa. Mas tra­tá-lo co­mo pro­ta­go­nis­ ta em pra­tos prin­ci­pa­is ain­da é um de­sa­fio. Ter­ri­nes, car­nes, pei­xes, mo­lhos e vá­ri­as ou­tras es­pe­cia­li­da­des po­dem ga­nhar tex­ tu­ras, aro­mas e sa­bo­res com a pre­sen­ça do ca­cau. Que­brar es­se ta­bu e des­co­brir as pos­si­bi­li­da­des gas­tro­nô­mi­cas dos cho­co­la­ tes de al­ta qua­li­da­de faz par­te do tra­ba­lho do fran­cês Fré­dé­ric Bau, di­re­tor da L’Éco­ le du Grand Cho­co­lat Valrho­na, em Tain l’Her­mi­ta­ge, na Fran­ça. Em sua apre­sen­ta­

34

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICARDO D’ANGELO

ção, o chef de­mons­trou vá­ri­as for­mas de apli­ca­ção des­se in­gre­di­en­te à co­zi­nha de van­guar­da. “Po­de­mos ir mais lon­ge com o cho­co­la­te do que cos­tu­ma­mos ir co­mo con­fei­tei­ros”, ga­ran­tiu. Com base nes­se con­cei­to, Bau exe­cu­ tou du­as re­cei­tas: a pri­mei­ra, um tor­ro­ne de foie gras, em que ele uti­li­za, co­mo ba­se, o cho­co­la­te Ara­gua­ni (Valrho­na, com 72% de ca­cau). Pa­ra trans­for­mar o in­gre­di­en­te, Bau em­pre­ga uma téc­ni­ca fun­da­men­tal da con­fei­ta­ria, a emul­são, “o úni­co ca­mi­nho pa­ra se ad­qui­rir tex­tu­ras mui­to fi­nas, com to­que de se­da”.

prazeres da mesa

Ok MT_frederic_bau.indd 34

11/27/08 7:33:49 PM


Nes­se ca­so, o foie gras as­su­me o pa­pel da man­tei­ga pa­ra bai­xar o pon­to de fu­são (tem­pe­ra­tu­ra em que um só­li­do se trans­for­ ma em lí­qui­do), sem pre­ju­di­car a emul­são. Ao fi­nal, foie gras e cho­co­la­te ad­qui­rem a mes­ma tex­tu­ra. A re­cei­ta é um exem­plo de co­mo o cho­co­la­te atua pa­ra abri­lhan­tar uma comida, sem so­bre­por o pró­prio sa­bor aos de­mais in­gre­di­en­tes. “Os cli­en­tes fi­cam sur­pre­sos: se fe­char­mos os olhos, não se po­ de no­tar a pre­sen­ça do cho­co­la­te.” A se­gun­da re­cei­ta te­ve um to­que de hu­mor: um bom­bom de ga­li­nha-d’an­go­la. O ob­je­ti­vo é re­pro­du­zir, com o cho­co­la­te,

a tex­tu­ra do chaud-froid – mo­lho be­cha­ mel ao qual se acres­cen­ta ge­la­ti­na de car­ ne. Bau pre­pa­rou bom­bons com su­prê­me de ga­li­nha, aro­ma­ti­za­dos com bau­ni­lha e en­dro. Es­pe­ta­dos em um pa­li­to e mer­gu­ lha­dos em cho­co­la­te, eles re­sul­tam em um ape­ri­ti­vo inu­si­ta­do. No en­tan­to, por mais ino­va­do­ras que pos­sam pa­re­cer as re­cei­tas, o chef de­mons­trou um apu­ro téc­ni­co im­pe­cá­vel, re­f le­xo de sua fi­lo­so­ fia, que va­lo­ri­za as ba­ses clás­si­cas da gas­ tro­no­mia. “Pa­ra mim, é mui­to im­por­tan­ te ir lon­ge, mas sem es­que­cer os pas­sos fun­da­men­tais da co­zi­n ha.”

35

prazeres da mesa

Ok MT_frederic_bau.indd 35

11/27/08 7:34:00 PM


senac

O TRABALHO DOS ACADÊMICOS Os alunos do curso de vivências culturais do Senac apresentaram bons trabalhos na Semana Mesa São Paulo

POR WANESSA ASFORA FOTO RICARDO D’ANGELO

A

Isa­be­la Fa­bre

36

s pes­qui­sas de­sen­vol­vi­das nos cur­sos de pós-gra­du­a­ç ão la­to sen­su da área de Gas­tro­no­mia do Se­nac abor­dam di­fe­ren­tes te­má­ti­cas re­la­ci­o­na­das à ali­men­ta­ ção e à gas­tro­no­mia. Os tra­ba­lhos preparados pelos alu­nos do cur­so e que fo­ram apre­sen­ta­dos no Me­sa Ten­dên­cias: Gas­tro­no­mia – Vi­vên­cias Cul­tu­ra­is pro­cu­ram, de ma­nei­ra ge­ral, com­pre­ en­der cer­tos fe­nô­me­nos do uni­ver­so ali­men­tar na sua re­la­ç ão com a es­pe­ci­fi­ci­da­de dos con­tex­ tos so­ciocul­tu­ra­is his­tó­ri­cos aos qua­is se acham atre­la­dos. É o ca­so, por exem­plo, de Os Mo­ vi­men­tos Gas­tro­nô­mi­cos a Par­tir da Se­gun­da Me­ta­de do Sé­cu­lo XX, de Pau­la de Pai­va Do­ min­gues, que dis­cu­te co­mo as trans­for­ma­ç ões so­ci­ais da­que­le pe­rí­o­do, na ver­da­de, um con­ ti­nu­um his­tó­ri­co do pa­no­ra­ma das re­vo­lu­ç ões in­dus­tri­al e tec­noci­en­tí­fi­ca do sé­cu­lo XIX, pos­ su­em es­trei­tas li­ga­ç ões com os no­vos po­si­cio­ na­men­tos dian­te da ali­men­ta­ç ão. Re­f le­tin­do es­pe­ci­fi­ca­men­te so­bre a Eu­ro­pa, Pau­la de­di­ca es­pe­ci­al aten­ç ão ao apa­re­ci­men­to do mo­vi­men­ to Slow Fo­od, mos­tran­do co­mo é ne­ces­sá­rio en­ ten­der que ele se ins­tau­ra co­mo re­a­ç ão não só a uma ali­men­ta­ç ão com­pos­ta es­sen­cial­men­te por itens in­dus­tri­a­li­za­dos, o fast fo­od, mas prin­ci­ pal­men­te a um mo­do de vi­ver e con­su­mir fast bas­tan­te pró­prio das so­ci­e­da­des ca­pi­ta­lis­tas. O tra­ba­lho de Isa­be­la Fa­bre, Da Ali­men­ta­ç ão no Mun­do Con­tem­po­râ­neo ao Re­tor­no das Cul­ tu­ras do Cam­po, in­se­re-se no mes­mo ce­ná­rio es­tu­da­do por Pau­la. A pre­o­cu­pa­ç ão, no en­tan­ to, é mos­trar o pro­ces­so pe­lo qual as prá­ti­cas ali­men­ta­res fo­ram trans­for­ma­das a par­tir da in­

prazeres da mesa

Ok MT_senac.indd 36

11/27/08 7:34:51 PM


dus­tri­a­li­za­ç ão e da cres­cen­te ur­ba­ni­za­ç ão do sé­cu­lo XIX em di­an­te. Pa­ra a au­to­ra, a in­dús­tria tem um pa­pel sig­ni­fi­ca­ti­vo em pro­por às po­pu­la­ç ões uma ali­men­ta­ç ão que ho­mo­ge­nei­za há­bi­tos so­ci­ais e cul­tu­ ra­is. A con­tra­po­si­ç ão ao apa­ga­men­to das iden­ti­da­des pro­mo­vi­do por es­sa ali­men­ ta­ç ão in­dus­tri­a­li­za­da es­taria, de acor­do com o es­tu­do, na re­vi­vi­fi­ca­ç ão da cha­ ma­da cul­tu­ra do cam­po. A ques­tão da iden­ti­da­de exa­mi­na­da sob a pers­pec­ti­va de ca­sos bra­si­lei­ros per­ me­a­rá ou­tros tra­ba­lhos. Vâ­nia Her­me­to, ­em ­A Es­té­ti­ca ­e ­o Con­for­to ­da ­Co­zi­nha Mi­nei­ra na Obra de Pe­dro Na­va, pro­cu­ ra de­mons­trar co­mo o uso re­cor­ren­te de des­cri­ç ões dos sa­bo­res e odo­res de co­mi­ das da in­fân­cia pe­lo me­mo­ri­a­lis­ta do mo­ der­nis­mo exer­cem pa­pel im­por­tan­te na cir­cun­scri­ç ão de su­as me­mó­ri­as ao ter­ ri­tó­rio das Ge­ra­is e, con­se­qüen­te­men­te, na cons­tru­ç ão de uma idéia de “mi­nei­ ri­da­de”. Vâ­nia Herme­to op­ta por tra­ba­ lhar com o con­cei­to de con­fort fo­od que, em­bo­ra cu­nha­do pos­te­rior­men­te à épo­ca de Pe­dro Na­va (1903-1984), ofe­re­ce um ca­mi­nho in­te­res­san­te pa­ra tor­nar mais in­te­li­gí­vel a com­pre­en­são do pro­ces­so de apro­xi­ma­ç ão do au­tor mi­nei­ro com a co­ mi­da. Por sua vez, Re­gi­a­ne Apa­re­ci­da da Sil­va, em Iden­ti­da­de Cul­tu­ral Ali­men­tar Bra­si­lei­ra, dis­cu­te ­a per­ti­nên­cia ­da re­la­ ção en­tre iden­ti­da­de cul­tu­ral ali­men­tar ­de ­um pa­ís ­e ­a elei­ç ão ­de pra­tos na­ci­o­ nais ­ou re­gi­o­nais. Apon­tan­do ­a di­fi­cul­ da­de des­sa for­ma ­de tra­tar ­a ques­tão, es­ tu­da ca­sos ­nos qua­is ­a co­zi­nha na­ci­o­nal ­e ­a co­zi­nha re­gi­o­nal cons­ti­tu­em cons­tru­ ções so­cio cul­tu­ra­is his­to­ri­ca­men­te re­fe­ ren­da­das ­e ­não, co­mo ­se po­de­ria pen­sar, as­pec­tos uni­ver­sais ­e imu­tá­veis. ­A ­re­f le­xão ­so­bre ­as ­im­pli­ca­ç ões ­de ­trans­for­ma­ç ões ­his­tó­ri­cas na ali­men­ ta­ç ão de ho­mens e mu­lhe­res do nos­so

Vâ­nia Her­me­to

Re­gi­a­ne Apa­re­ci­da da Sil­va

Eduardo Duó

tem­po é pre­o­cu­pa­ç ão ain­da de ou­tros dois tra­ba­lhos. O pro­ble­ma é exa­mi­na­do de ma­nei­ra mais ge­ral em Ali­men­ta­ç ão e Com­por­ta­men­to, de Bi­an­ca Da­má­sio No­na­to. A au­to­ra pro­cu­ra mos­trar co­ mo a idéia de tra­di­ç ão ali­men­tar es­tá re­la­ci­o­na­da a pro­ces­sos so­ciocul­tu­ra­is de es­co­lha e des­car­te de cer­tos ti­pos de ali­men­to. Além dis­so, avan­ç a no de­sen­ vol­vi­men­to do te­ma, mos­tran­do co­mo, com o ad­ven­to dos tran­spor­tes e das cir­ cu­la­ç ões glo­ba­li­za­das, al­gu­mas tra­di­ç ões ali­men­ta­res an­tes res­tri­tas a de­ter­mi­na­ das lo­ca­li­da­des ou re­gi­ões são aco­lhi­das em ter­ri­tó­rios dis­tin­tos de seus ori­gi­nais e po­dem trans­for­mar os pa­drões de con­ su­mo ali­men­tar. Ao pensar­ em uma ques­tão mais es­ pe­cí­fi­ca, Eduar­do Duó, em A Guer­ra Con­tra a ‘Glo­be­si­da­de’: as Ci­fras Que Es­tão Mo­vi­men­tan­do a Lu­ta con­tra a Epi­de­mia Glo­bal de Obe­si­da­de, mos­tra que in­ci­dem so­bre o tra­ta­men­to da­do ao pro­ble­ma da obe­si­da­de as­pec­tos que não es­tão ne­ces­sa­ria­men­te li­ga­dos a pre­o­cu­ pa­ções com sa­ú­de ou es­té­ti­ca, mas sim fi­nan­cei­ros. A pes­qui­sa re­a­li­za­da pe­lo au­ tor apon­ta que nos paí­ses de­sen­vol­vi­dos as ini­ci­a­ti­vas de con­sci­en­ti­za­ção acer­ca dos ma­les cau­sa­dos pe­la obe­si­da­de – que,

37

prazeres da mesa

Ok MT_senac.indd 37

11/27/08 7:35:17 PM


senac

Re­na­ta Zam­bon Mon­tei­ro

Ni­val­do Apa­re­ci­do Mon­tei­ro

Ta­ti­a­ne dos San­tos

na atu­a­li­da­de, atin­ge me­ta­de da po­pu­ la­ção do pla­ne­ta – apa­re­cem bas­tan­te li­ga­das aos in­te­res­ses dos go­ver­nos e das se­gu­ra­do­ras de sa­ú­de que gas­tam ca­da vez mais di­nhei­ro pa­ra com­ba­ter o pro­ble­ma, bem co­mo das in­dús­tri­as ali­men­tí­cias que co­me­çam a en­fren­tar ba­ta­lhas ju­di­ci­ais con­tra pro­ces­sos em di­ver­sos paí­ses. Fi­nal­men­te, o cur­so pro­pi­ciou a pro­ du­ç ão de dois es­tu­dos que pro­põ­em a in­ves­ti­ga­ç ão de ma­ni­fes­ta­ç ões bas­tan­te par­ti­cu­la­res do uni­ver­so bra­si­lei­ro, em es­pe­ci­al o pau­lis­ta­no. Ali­ne Lui­za Al­ ves, em Gas­tro­no­mia em Jor­nais, Re­ vis­tas e Rá­di­os de São Pau­lo, apre­sen­ta um pa­no­ra­ma de três ve­í­cu­los da mí­dia gas­tro­nô­mi­ca (jor­nais, re­vis­tas e rá­dio), des­cre­ven­do e ana­li­san­do su­as prin­ci­pa­is pu­bli­ca­ç ões e qua­dros. A au­to­ra re­f le­te so­bre o en­ra­i­za­men­to do in­te­res­se pe­la gas­tro­no­mia e as­sun­tos afins na so­ci­e­da­ de bra­si­lei­ra, com con­tor­nos es­pe­cí­fi­cos na ci­da­de de São Pau­lo, e o apa­re­ci­men­ to de uma ­mídia es­pe­cia­li­za­da, te­cen­do con­si­de­ra­ç ões acer­ca do cres­ci­men­to de sua atu­a­ç ão e co­ber­tu­ra. E Car­men Lú­cia Sai­to Lel­li, em No­ vas Ten­dên­cias Gas­tro­nô­mi­cas Apli­ ca­das a Res­tau­ran­tes de Co­le­ti­vi­da­de, ofe­re­ce uma ou­tra pers­pec­ti­va do mer­ ca­do gas­tro­nô­mi­co bra­si­lei­ro ao es­tu­dar

38

o es­prai­a­men­to das pro­pos­tas e téc­ni­cas da gas­tro­no­mia pa­ra o mun­do dos res­tau­ ran­tes de co­le­ti­vi­da­de. Par­tin­do da pre­ mis­sa de que se tra­ta de um te­ma no­vo no pa­ís, Car­men iden­ti­fi­ca e ana­li­sa as di­fi­cul­da­des da im­plan­ta­ç ão das ten­dên­ cias gas­tro­nô­mi­cas em es­pa­ç os co­mer­ ci­ais que ser­vem um gran­de nú­me­ro de pes­so­as, bem co­mo apre­sen­ta ca­sos nos qua­is al­gum su­ces­so nes­se sen­ti­do po­de ser ve­ri­fi­ca­do. Vin­cu­la­das aos cur­sos Ges­tão de Ne­ gó­ci­os em Ser­vi­ç os de Ali­men­ta­ç ão e Do­cên­cia pa­ra o En­si­no Su­pe­ri­or com ên­fa­se em gas­tro­no­mia, tu­ris­mo e ho­te­ la­ria, fo­ram re­a­li­za­das pes­qui­sas acer­ca de as­pec­tos mer­ca­do­ló­gi­cos do ne­gó­cio gas­tro­nô­mi­co. Ta­ti­a­ne dos San­tos, em As­pec­tos De­ter­mi­nan­tes na Es­co­lha de Ali­men­tos, apre­sen­ta son­da­gem re­a­li­ za­da com alu­nos do cur­so de fo­no­au­di­ o­lo­gia e bi­o­me­di­ci­na da Umesp so­bre a im­por­tân­cia de as­pec­tos co­mo sa­bor, con­sis­tên­cia, cor e apre­sen­ta­ç ão dos ali­ men­tos nos pra­tos, no pro­ces­so de es­ co­lha e con­su­mo ali­men­tar. O tra­ba­lho não se re­su­me à di­vul­ga­ç ão de da­dos es­ ta­tís­ti­cos, a au­to­ra dis­cu­te e ana­li­sa os re­ sul­ta­dos da in­ves­ti­ga­ç ão à luz de as­pec­tos fi­si­o­ló­gi­cos, psi­co­ló­gi­cos e so­ciocul­tu­ra­is. E Ni­val­do Apa­re­ci­do Mon­tei­ro e Re­na­ta Zam­bon Mon­tei­ro apre­sen­tam, em Tec­ no­lo­gia em Equi­pa­men­tos pa­ra Co­zi­nhas Pro­fis­si­o­nais, um pa­no­ra­ma do pro­ces­so de cri­a­ç ão e trans­for­ma­ç ão dos equi­pa­ men­tos de co­zi­nha através dos tem­pos, des­ta­can­do sua im­por­tân­cia na qua­li­ da­de dos ser­vi­ç os pres­ta­dos na área de pre­pa­ro de ali­men­tos. É pre­o­cu­pa­ç ão dos au­to­res mos­trar co­mo o co­nhe­ci­men­to so­bre equi­pa­men­tos, di­men­si­o­na­men­to e fun­ç ão é in­dis­pen­sá­vel pa­ra a área de gas­tro­no­mia, co­mo se apre­sen­ta con­fi­gu­ ra­da na atu­a­li­da­de.

prazeres da mesa

Ok MT_senac.indd 38

11/27/08 7:37:14 PM


homerosouza

O MAIS CONSUMIDO Você sabia que o óleo de palma é o mais consumido do mundo? Descubra outros segredos desse produto peculiar

O

ó­leo ­de Pal­ma é ­o ó­leo ve­ge­tal ­mais pro­du­zi­do ­e con­su­mi­do ­no mun­do. ­Sua com­po­si­ção pe­cu­li­ar per­mi­te ­a apli­ca­ção ­nos ­mais di­ver­sos se­to­res ­da pro­du­ção ­de ali­men­ tos. Es­se pro­du­to dis­ pen­sa ­o pro­ces­so ­de hi­dro­ge­na­ção, sen­do des­sa for­ma li­vre ­de áci­dos gra­xos ­trans ­tão ma­lé­fi­cos à sa­ú­de. ­A Agro­pal­ma, ­o mai­ or pro­du­tor ­de ó­leo ­de pal­ma ­do Bra­sil, ga­ran­te ­a pro­du­ção ­de óle­os ­e gor­du­ras ­de pal­ma ­da ­mais al­ ta qua­li­da­de, ­com ex­ Homero Souza ce­len­te es­ta­bi­li­da­de oxi­da­ti­va. ­São pro­du­tos li­vres ­de or­ga­nis­ mos ge­ne­ti­ca­men­te mo­di­fi­ca­dos. ­A em­

POR HOMERO SOUZA FOTO RICARDO D’ANGELO

pre­sa man­tém ­uma pro­du­ção res­pon­sá­vel, res­pei­tan­do ­o ­meio am­bi­en­te ­e cu­i­dan­do ­da sa­ú­de ­e se­gu­ran­ça ­do ­ser hu­ma­no. ­Da pal­ma ­se ob­têm ­dois ti­pos ­de ó­leo: ­o ­da pal­ma (ex­tra­í­do ­da pol­pa) ­e ­o ­de pal­mis­te (ex­tra­í­do ­da amên­doa), am­bos ­com com­po­ si­ções quí­mi­cas ­e ca­rac­te­rís­ti­cas fí­si­cas di­fe­ ren­tes. O ­ ­de pal­ma é ­o me­lhor. Co­mo é pos­ sí­vel di­vi­di-lo ­em ­uma va­ri­e­da­de ­de fra­ções, ­sua uti­li­za­ção po­de acon­te­cer ­em di­ver­sos ali­men­tos, ­tais co­mo mar­ga­ri­nas, mas­sas ­de sor­ve­tes, acho­co­la­ta­dos, gor­du­ras pa­ra fri­tu­ ras, pa­ni­fi­ca­ção, bis­coi­tos, en­tre ou­tros. Va­le ­­lem­bra­r ­­tam­b é­m, ­­qu­e, ­­co­m­o ­­um­a ­­da­s ­­fon­te­s ­­mai­s ­­ri­c a­s ­­e­m ­­vi­t a­mi­n ­a ­­­E, ­­­a ­­pal­m ­a é ­ti­d a ­co­mo um ali­men­to fun­cio­n al, pois per­mi­te a re­du­ç ão do co­les­te­rol cir­cu­lan­te e con­t ri­bui pa­r a man­ter a sa­ú­de da pe­le e dos ca­b e­los, as­se­g u­r an­do a pro­pri­e­d a­de de cres­ci­ men­to e per­mi­tin­do ao cor­p o me­l ho­r ar a ab­sor­ç ão de vi­t a­mi­n as.

39

prazeres da mesa

Ok MT_homero souza.indd 39

11/27/08 7:48:02 PM


Realização

Organização Espanha

Colaboração

Patrocínios Espanha

Apoios Espanha

4

prazeres da mesa

MT_logos3.indd 2

12/1/08 7:09:18 PM


Patrocinadores

Apoio especial

Apoio de mídia

Serviço médico oficial

Transportadora oficial

Apoio institucional

5

prazeres da mesa

MT_logos3.indd 3

12/1/08 7:09:33 PM


juanmariarzak

O PAI DE TODOS Carismático, genial, desassombrado, o patriarca da moderna cozinha espanhola critica a globalização do paladar, defende a “cozinha de raiz” feita para os sentidos e arrebata a platéia, com suas teses gastronômico-filosóficas

A

ima­gem que se faz de um gê­ nio pou­cas ve­zes cor­res­pon­de à re­a­li­da­de. As­sim acon­te­ceu com Ju­an Ma­ri Ar­zak, que fe­chou com cha­ve de ou­ro o se­gun­do dia de de­ba­tes

40

POR ROBERTA MALTA FOTOS ANDRÉ PENICHE

do Me­sa Ten­dên­cias. Quem es­pe­ra­va um se­nhor ar­ro­gan­te, ou um ho­mem ex­cên­ tri­co, se sur­pre­en­deu com o ca­ris­má­ti­co e atra­pa­lha­do co­zi­nhei­ro de ócu­los co­lo­ ri­dos mo­der­ni­nhos e hu­mor pul­san­te. O

prazeres da mesa

Ok MT_Arzak.indd 40

11/27/08 7:40:41 PM


ga­ro­tos no mer­ca­do. “É im­por­tan­te ver o mun­do com olhos de co­zi­nhei­ro e ter a ca­pa­ci­da­de de se sur­pre­en­der com o olhar de cri­an­ça”, en­si­nou. Em seu res­tau­ran­te, no Pa­ís Bas­co, é pos­sí­vel de­gus­tar des­de pra­tos fei­tos com ar­gi­la bran­ca até re­cei­tas tra­di­cio­nais da­ que­la re­gi­ão. “Co­zi­nha de ra­iz, mes­mo, e con­trá­ria à on­da glo­ba­li­zan­te dos sa­bo­ res”, de­fi­niu. Ar­zak acre­di­ta que o fast fo­od sub­sti­tu­iu nos di­as de ho­je a co­mi­da da mãe: “A gen­te co­me por­que tem de co­ mer”, la­men­tou. Con­tra es­sa cor­ren­te, o mes­tre es­pa­nhol pro­põe uma ali­men­ta­ção cal­ca­da em con­cei­tos e idéi­as: “Quan­do va­mos a um res­tau­ran­te ho­je de­pa­ra­mos com as es­pu­mas. São bo­ba­gens? Não, elas

t

co­man­dan­te do Ar­zak, de co­zi­nha bas­ca – pri­mei­ro res­tau­ran­te es­pa­nhol a ga­nhar três es­tre­las do ri­go­ro­so Guia Mi­che­lin –, dis­cor­reu so­bre ques­tões gas­tro­nô­mi­cas, fi­lo­só­fi­cas e so­bre a vi­da, en­fim, ca­ti­van­ do de ime­di­a­to o pú­bli­co. Na pri­mei­ra fi­la do au­di­tó­rio do Se­ nac-SP, sor­ri­so es­tam­pa­do no ros­to e aten­ção ab­so­lu­ta, nin­guém me­nos que Fer­ran Adrià, dis­cí­pu­lo e mes­tre a um só tem­po do pa­tri­ar­ca da mo­der­na cu­ li­ná­ria es­pa­nho­la. “Sem Adrià eu não te­ria vo­a­do tan­to”, re­ve­ren­ciou mo­ des­ta­men­te o gê­nio do El Bul­li. Pa­ra ele, a prin­ci­pal pre­mis­sa da cri­a­ção é sa­ir pa­ra per­ce­ber a vi­da, em que tu­do po­de ser su­ges­ti­vo: al­dei­as, ta­ber­nas,

41

prazeres da mesa

Ok MT_Arzak.indd 41

11/27/08 7:41:52 PM


juanmariarzak

MERLUZA NA ARGILA BRANCA

42

re­pre­sen­tam idéi­as e sem elas não te­rí­a­ mos na­da”, ob­ser­vou en­fá­ti­co. Pa­ra ele, o pra­to tem de es­tar sa­bo­ro­so, mas se ti­ver ma­gia e di­ver­são fi­ca­rá ain­da me­lhor. É nes­se con­tex­to que en­tram os de­ mais sen­ti­dos: além do as­pec­to vi­su­al e gus­ta­ti­vo, Ar­zak afir­mou bus­car per­ ma­nen­te­men­te a aci­dez, o amar­gor e a tex­tu­ra em su­as re­cei­tas. Qua­se no fi­nal ­da apre­sen­ta­ção, ­o co­zi­nhei­ro ­se ­deu con­ta de que ha­via per­di­do os pa­ péis em que delineara o con­te­ú­do da pa­les­tra. Des­pre­o­cu­pa­da­men­te, Ar­zak con­ti­nuou a fa­lar, en­quan­to a pla­téia se di­ver­tia. Quan­do en­fim os en­con­ trou, Adrià le­van­tou-se e, às gar­ga­ lha­das, pu­xou uma sal­va de pal­mas da pla­téia, que mal acre­di­ta­va ser tes­te­ mu­nha des­se mo­men­to de des­con­tra­ ção dos dois mai­o­res íco­nes da atu­al gas­tro­no­mia mun­di­al. Pron­ta­men­te, Ar­zak per­ce­be­ra que não pre­ci­sa­va de pa­pel al­gum – su­as idéi­as es­ta­vam ex­tre­ma­men­te cla­ras e ali­nha­das. Tu­do ha­via si­do di­to e com­pre­en­di­do. Os aplau­sos, ul­tra­ca­lo­ ro­sos, eco­a­ram na­que­la noi­te ines­que­ cí­vel, pa­ra fo­ra do au­di­tó­rio e por to­do o cam­pus do Se­nac-SP. •

prazeres da mesa

Ok MT_Arzak.indd 42

11/27/08 7:42:24 PM


nandujubany

O MAIS CLÁSSICO ENTRE OS MODERNOS Além da hereança gastronômica do avô, Nandu Jubany se formou com feras como Arzak e Berasategui e mostrou os aromas e os sabores do bosque

N

an­du Ju­bany re­pre­sen­ta ­a ter­ cei­ra ge­ra­ção ­de co­zi­nhei­ros ­da fa­mí­lia ­– ­uma tra­je­tó­ria ini­ci­a­da por ­seu ­avô ­em 1946, ­no Ma­ sia ­del ­Solà ­de Mo­nis­trol, ­em Cal­ders. Ju­bany, “ca­ta­lão, ­mas es­pa­nhol pri­mei­ ro”, cres­ceu pas­se­an­do ­de bi­ci­cle­ta pe­la co­zi­nha ­dos pa­is, tra­ba­lhou co­mo aju­ dan­te ­no res­tau­ran­te ­do ­avô, apren­deu téc­ni­cas cu­li­ná­rias ­com ­a ­tia ­e re­cei­tas, ­com ­a ­mãe. ­À he­ran­ça gas­tro­nô­mi­ca, ­foi so­m a­d a ­a ex­p e­r i­ê n­ cia ­c om Ar­z ak, Be­ ra­s a­t e­g ui e­ Car­l es Ga­i g. Atu­a l­m en­t e, ­e le co­m an­d a ­o pró­ prio res­t au­r an­t e, ­o ­Can Ju­b any, aber­ to ­e m 1995, ­q ue os­t en­t a ­u ma es­t re­ la ­n o Mi­c he­lin. Lo­go ­no iní­cio ­da apre­sen­ta­ção, ­o jo­vem ­chef ­quis tran­spor­tar ­o pú­bli­ co ­ao ­Can Ju­bany: ­uma ca­sa res­tau­ra­da, ­com de­co­ra­ção ele­ gan­te, lo­ca­li­za­da ­em Callde­te­nes. “Es­ta­ mos ­no in­te­ri­or, ­em ­uma re­gi­ão on­de ­o ve­rão é mui­to quen­te ­e ­o in­ver­no, mui­to fri­o”. ­As con­di­ções cli­má­ti­cas, ali­ás, fo­ ram de­ter­mi­nan­tes pa­ra ­que Ju­bany op­ tas­se pe­lo ca­mi­nho ­da al­ta gas­tro­no­mia

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICARDO D’ANGELO

tra­di­cio­nal, uti­li­zan­do pro­du­tos lo­ca­is. ­No ca­lor, quan­do ­a ofer­ta ­de in­gre­di­en­ tes ­não é ­tão pró­di­ga, ­ele con­se­gue ex­tra­ir ao má­xi­mo os sa­bo­res ­dos pes­ca­dos ­e ­das fru­tas re­gi­o­nais. ­Mas é du­ran­te ­o in­ver­no ­que ­a co­zi­nha ­de Ju­bany en­con­tra ­seu es­ plen­dor, ­“a su­bli­ma­ção ­dos pro­du­tos ­do bos­que”, quan­do co­me­çam ­a apa­re­cer ­os pri­mei­ros co­gu­me­los, ­as tru­fas, ­as car­nes ­de ca­ça, es­pe­ci­al­men­te ­a le­bre, ­“um ­de nos­sos man­ja­res ­mais au­tên­ti­cos”. ­Em ví­deo, ­o ­chef de­mons­trou co­mo lim­pá-la. ­“É ­um ani­mal ­do ­qual ­se apro­ vei­ta ­o san­gue, ­os pul­mões, ­o co­ra­çã­o.” O pro­ce­di­men­to re­sul­tou ­em ­uma ter­ri­ne ­de le­bre, ob­ti­da co­mo ­se fos­se ­de ­foie ­gras. ­No pre­pa­ro, en­tra­ram, tam­bém, ver­du­ ras flam­ba­das. ­Por ­fim, ­um mo­lho den­ so, pre­pa­ra­do ­com ­o san­gue ­do ani­mal ­e vi­nho. ­“Um pra­to tra­ba­lho­so, ­mas mui­to fá­cil ­de fa­zer.” ­As tru­fas, ou­tra es­pe­cia­li­da­de ­do ­Can Ju­bany, tam­bém me­re­ce­ram des­ta­que, pre­pa­ra­das e­ m pa­pil­lo­te, ­com “trin­xat” – uma com­bi­na­ção ­de le­gu­mes ­com ba­ta­ta, amas­sa­dos – ­e pan­cet­ta ­“um ­dos nos­sos pi­la­res”. ­E, no­va­men­te, uti­li­zan­do téc­ni­ cas tra­di­ci­o­nais, ­ele ­se pro­pôs ­a ex­plo­rar ­ao má­xi­mo ­o sa­bor ­dos in­gre­di­en­tes ­do bos­que. ­Uma co­zi­nha hu­ma­na, an­co­ra­da ­nas raí­zes ­da re­gi­ão, ­que ren­deu ­a Ju­bany ­o re­co­nhe­ci­men­to co­mo ­“o ­mais clás­si­co en­tre ­os c­ hefs mo­der­nos es­pa­nhóis”.

43

prazeres da mesa

Ok MT_nandu jubany.indd 43

11/27/08 7:43:49 PM


pacoroncero

MUITO ALÉM DA SALADA

o

Uma esfera esfumaçante de azeite com água de tomate e parmesão. Um soba japonês. Essas foram algumas das inusitadas aplicações do azeite de oliva propostas pelo chef madrilenho Paco Roncero

es­pa­nhol Pa­co Ron­ce­ro, ­do res­tau­ran­te Ter­ra­za ­del Ca­ si­no, ­em Ma­dri, trou­xe ­com ­ex­clu­si­vi­da­de pa­ra o pú­bli­co do Me­sa Ten­dên­cias seu es­tu­do ino­va­dor so­bre azei­tes. A pro­pos­ta do chef, uma es­tre­ la ­no ­Guia Mi­che­lin, é fa­zer ­com ­que ­as ­pes­so­as se de­bru­cem mais so­bre o óleo de oli­va e su­as pe­cu­li­a­ri­da­des. “Que­ro de­ sen­vol­ver ­a ­idéia ­de ­que ­o azei­te ­não é ­só pa­ra tem­pe­rar e fri­tar”, afir­mou, lem­ bran­do que ha­bi­tu­al­men­te es­ta­mos acos­ tu­ma­dos a fa­zer co­men­tá­rios quan­to à pu­re­za do pro­du­to (que de­ter­mi­na se ele é vir­gem, ex­travir­gem ou co­mum) mas não nos pre­o­cu­pa­mos com o ti­po de azei­ to­na com o qual ele foi fei­to. Ron­ce­ro pro­pôs pra­tos di­ver­ti­dos, nos qua­is o pro­du­to mi­le­nar en­tra co­mo pro­ta­go­nis­ta e in­gre­di­en­te de­fi­ni­ti­vo. Exem­plo dis­so foi a ex­pe­ri­ên­cia que pre­ pa­rou com o so­ba ja­po­nês: no co­nhe­ci­do pro­ces­so tec­noemo­cio­nal, que ca­rac­te­ri­ za a co­zi­nha es­pa­nho­la de van­guar­da, ele cri­ou um ma­car­rão que é ser­vi­do ao cli­ en­te den­tro de uma se­rin­ga, cu­jo lí­qui­do, à ba­se de me­til­ce­lu­lo­se emul­si­o­na­da com azei­te, é in­je­ta­do no pra­to que con­tém um cal­do fu­me­gan­te. Ao che­gar à me­sa, dis­pa­ra-se a in­je­ção e o lí­qui­do se ge­li­fi­ca com a tem­pe­ra­tu­ra da so­pa, trans­for­man­ do-se num lá­men per­fei­to.

44

POR ROBERTA MALTA FOTO ANDRÉ PENICHE

A per­for­man­ce de Ron­ce­ro emo­cio­ nou a pla­téia que sus­pi­rou so­no­ra­men­te. Mas, ape­sar da mo­der­ni­da­de das re­cei­tas, o chef mos­trou-se mui­to mais se­gu­ro com o uso das mãos do que com o de apa­re­ lhos: “Sou pés­si­mo pa­ra is­so, su­perde­sa­ jei­ta­do”, con­fes­sou hu­mil­de, en­quan­to se en­ten­dia com um si­fão. Já com as pa­ne­las e os bowls, o ma­ne­jo era tão li­gei­ro quan­ to um li­qui­di­fi­ca­dor. Na re­cri­a­ção da tra­di­cio­nal so­pa de alho es­pa­nho­la cha­mou a aten­ção do pú­bli­co o uso de um in­gre­di­en­te ti­pi­ca­ men­te bra­si­lei­ro: a ta­pi­o­ca, que ser­viu de li­ga a um cal­do de pre­sun­to. Ne­le fo­ram adi­cio­na­dos pe­que­nos nho­ques fri­tos, fei­tos de pão, fa­ri­nha, azei­te e água. Na fi­na­li­za­ção, to­ques de ge­ma de ovo, pá­pri­ca, alho ne­gro e com­ple­ tan­do o pra­to, flor de alho. Ou­tro mo­men­to que en­can­tou a pla­téia foi quan­do a es­fe­ra de azei­te com água de to­ma­te e par­me­são, fei­ ta den­tro de um ba­lão, pas­sou pe­la pla­téia. Os cu­ri­o­sos não re­sis­ti­ram, e quem con­se­guiu che­gar ao pal­co ga­ ran­tiu uma pro­vi­nha da bo­la bran­ca es­fu­ma­çan­te que se abria, re­ve­lan­do seu re­cheio. Pa­ra mui­tos dos pre­sen­ tes, a igua­ria va­leu co­mo um man­jar, que me­re­ce­ria es­tar en­tre as re­cei­tas do Jan­tar do Sé­cu­lo.

prazeres da mesa

Ok MT_paco roncero.indd 44

11/27/08 7:46:28 PM


belarminoiglecias

SUCESSO, DE GERAÇÃO EM GERAÇÃO Conhecimento do negócio, administração moderna e trabalho duro são a receita para fidelizar os cada vez mais exigentes clientes de restaurante

C

o­mo Mon­tar ­um Res­tau­ran­te ­de Su­ces­so ­foi ­o te­ma ­da apre­sen­ta­ ção ­de Be­lar­mi­no Igle­sias Fi­lho, ­da re­de pau­lis­ta ­de res­tau­ran­tes ­da gri­fe Ru­baiyat. ­O em­pre­sá­rio, ­que cres­ceu den­ tro ­da pri­mei­ra ca­sa mon­ta­da pe­lo ­pai, ­o imi­gran­te es­pa­nhol Be­lar­mi­no Fer­nan­dez Igle­sias, her­dou ­as ré­de­as ­do ne­gó­cio, po­ rém ­não dor­miu ­um mi­nu­to se­quer so­bre ­os lou­ros ­do pa­tri­ar­ca. Ho­je, co­man­da qua­tro es­ta­be­le­ci­men­tos ­em ­São Pau­lo, ­dois ­na Es­pa­nha ­e ­um sé­ti­mo, ­na ca­pi­tal ar­gen­ti­ na. ­“A ge­ni­a­li­da­de é 1% ­de ins­pi­ra­ção ­e 99% ­de tran­spi­ra­çã­o.” Es­ta fra­se, cu­nha­ da pe­lo in­ven­tor ­da lâm­pa­da, ­o ame­ri­ca­ no Tho­mas Ed­son, con­du­ziu to­da ­a li­nha ­de pen­sa­men­to ­do res­tau­ra­teur pau­lis­ta­no. “Nos­so ne­gó­cio é di­fe­ren­te ­do dos ou­tros, te­mos ­uma in­dús­tria di­men­si­o­na­da pa­ra pi­cos. Pa­ra ­se al­can­çar ­o su­ces­so é pre­ci­so pen­sar al­to”, en­fa­ti­zou Igle­sias Fi­lho. Tu­ do is­so, cla­ro, ­sem es­que­cer ­os de­ta­lhes ­e a pa­dro­ni­za­ção ­que, pa­ra Igle­sias, ­são fa­to­res fun­da­men­tais pa­ra fi­de­li­zar o­ cli­en­te. ­“O guar­da­na­po ­de to­das ­as nos­sas ca­sas é ­de li­nho ­e me­de 70 ­por 70 ­cm. ­A fa­ca pe­sa 125 gra­mas ­e ­não po­de ­ser ­de ser­ra, ­mas ­de lâ­mi­na”, in­for­mou à pla­téia. Is­so é ­tão rí­gi­do ­que ­a clien­te­la ­mais fi­el ­da re­de con­se­gue iden­ti­fi­car es­sa ca­rac­te­rís­ti­ca ­em to­dos ­os ­seus se­te res­tau­ran­tes. Pa­ra ilus­ trar ­sua te­se, Igle­sias re­la­tou ­que ­um ca­sal bra­si­lei­ro ­em vi­si­ta ­ao Ca­ba­ña ­Las Li­las,

POR ROBERTA MALTA FOTO RICARDO D’ANGELO

e­ m Bu­e­nos Ai­res, ­que per­ten­ce ­ao gru­po, te­ ria fei­to ­o se­guin­te co­ men­tá­rio à me­sa: ­“Foi da­qui ­que co­pi­a­ram tu­ do: é igual­zi­nho ­ao Ru­ baiyat ­de ­São Pau­lo”, con­tou, di­ver­tin­do-se ­com ­o fa­to. Pa­ra ex­pli­car ­o “es­ ti­lo Ru­baiyat” ­de tra­ ba­lho, Igle­sias Fi­lho ­usou ­a ima­gem ­da Ma­ tri­uska, ­a bo­ne­qui­nha rus­sa ­de ma­dei­ra ­na ­qual ­há sem­pre ou­tra me­nor den­tro ­de ­uma mai­or, ­e as­sim ­por di­an­te. “Fa­ze­mos exa­ta­ men­te is­so: so­mos ver­ti­ca­li­za­dos. Pro­du­zi­ mos nos­sos pã­es e do­ces ­e gran­de par­te ­das car­nes pro­vêm ­de nos­sa fa­zen­da em Ma­to Gros­so ­do ­Sul.” Pa­ra Igle­sias Fi­lho, ­o gran­de de­sa­fio é fa­zer to­da es­sa me­gaes­tru­tu­ra fun­cio­nar ­– mes­mo ­que ele ­não es­teja pre­sen­te. “Co­mo ad­mi­nis­tro si­mul­ta­ne­a­men­te to­dos ­os res­ tau­ran­tes, ­não es­tou ­em ne­nhum co­mo do­ no”, afir­mou. ­Mas ­qual en­tão se­ria ­o pu­lo ­do ga­to ­de Igle­sias? ­O res­tau­ra­teur pre­pa­ra ge­ren­tes ­e maî­tres, dan­do-lhes au­to­no­mia pa­ra ­que atu­em co­mo ­seus só­ci­os ­no ne­gó­ cio. To­da essa en­gre­na­gem ga­ran­te ­o su­ ces­so ­de sua re­de. •

45

prazeres da mesa

Ok MT_belarmino.indd 45

11/27/08 7:52:21 PM


juanfravaliente

RECONSTRUIR IGUARIAS Juan Fra Valiente, chef do El Poblet, mostrou que as aparências enganam e ensinou suas técnicas de “construir iguarias”

C

i­da­de ­de Dè­nia, Es­pa­nha. ­À me­sa, ­no res­tau­ran­te ­El Po­blet, ­o co­men­sal aguar­da ­o me­nude­gus­ta­ção. Pa­ra ­seu es­pan­to, ­a se­qüên­ cia ­de pra­tos é ini­ci­a­da ­com ­um ­trio ­de tru­fas bran­cas. ­Ele co­me­mo­ra ­a pró­pria sor­te: tru­fas, abrin­do ­o me­nu! ­Mal ima­ gi­na ­que ­a sur­pre­sa mai­or ­vem lo­go ­em se­gui­da: ­ao to­car ­as igua­rias, des­co­bre ­que ­elas ­são cons­tru­í­das ­com ba­se ­num cre­me ­de quei­jo par­me­são, ge­la­ ti­na ­e cre­me ­de lei­te fres­co, imer­ so ­em ni­tro­gê­nio lí­qui­do ­e co­ran­te. ­O aro­ma é con­ fe­ri­do ­por azei­te tru­fa­do ­e ­a fi­na­li­ za­ção é da­da ­com ­um ­pó ­de fung­hi por­ci­ni, tri­tu­ra­do ­em ter­mo­mix, ­que en­vol­ve ­as “tru­ fas” ­e ­dá ­a ­elas ­um acen­to ter­ro­so. ­“É nos­so pra­to ­mais de­c ep­c io­n a n­t e. ­Não pe­lo sa­bor, ­mas sim­ples­men­ te por­que ­não ­são tru­fas”, brin­cou ­o ­chef cri­a­ti­vo ­do ­El Po­blet, Ju­an ­Fra Va­li­en­te, ­que re­pre­sen­tou ­o ­chef Qui­que Da­cos­ta ­no even­to. ­O as­sun­to di­ver­tiu ­o pú­bli­co, sur­pre­so c­ om ­a apa­rên­cia fi­el ­das tru­fas fal­sas, cu­jo pre­pa­ro ­foi de­mons­tra­do ­por

46

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICA­RDO D’ANGELO

Va­li­en­te. ­O pra­to é ­um mar­co ­na his­tó­ ria ­do ­El Po­blet, por­que re­pre­sen­ta ­o iní­ cio ­do de­sen­vol­vi­men­to ­de ­um con­cei­to. “Des­co­bri­mos co­mo é im­por­tan­te ­a su­ ges­tão ­por ­meio ­do aro­ma”, ex­pli­cou. ­Mas ­nem ­só igua­rias ­são re­cons­tru­í­das ­com ­o in­tui­to ­de emo­cio­nar ­o co­men­sal. ­A cons­tru­ção mi­ni­ma­lis­ta, mar­ca for­te ­do tra­ba­lho ­de Da­cos­ta, é uti­li­za­da pa­ra re­cri­ar, tam­bém, ­a na­tu­re­za, ­por ­meio ­de tran­spa­rên­cia, ­gel ­e ter­ro­si­da­de. ­E, den­tro des­sa pro­pos­ta, ­ele ­cria ver­da­dei­ras pai­sa­ gens co­mes­tí­veis: in­gre­di­en­tes co­mo co­ gu­me­los, tru­fas ­e er­vas ­são uti­li­za­dos pa­ra re­pro­du­zir tex­tu­ras ­e acen­tu­ar aro­mas ­de ele­men­tos co­mo ­areia ­e ter­ra. ­As pre­pa­ ra­ções ­são ul­tra-e­la­bo­ra­das ­e pro­du­zem ­um re­sul­ta­do sur­pre­en­den­te, co­mo ­se ­vê ­no bos­que ani­ma­do, ou­tro pra­to em­ble­ má­ti­co ­do ­El Po­blet ­– exi­bi­do ­ao pú­bli­co ­em ví­deo ­–, ­que re­pro­duz ­“um pas­seio ­por to­dos ­os aro­mas en­con­tra­dos ­no bos­que”. Atu­al­men­te, ­­­a ­du­pla ­tra­ba­lha ­­co­m ­­um­a ­gran­de ­va­ri­e­da­de ­­d­e ­al­gas, ­­­o ­­qu­e ­­s­e ­evi­den­cia ­­n­o ­pra­to ­“Ro­cha 2008­­­”. ­­­A ­­idéi­a é ­re­pre­sen­tar ­­u­m ­mo­lus­co ­den­tro ­­d­e ­­se­u ­há­bi­tat, ­­um­a ­ro­cha. ­­N­a ­re­cei­ta, en­tram in­gre­di­en­tes co­mo crus­tá­ce­os ­e me­xi­ lhões co­zi­dos, di­fe­ren­tes ti­pos ­de al­ga, ­gel ­de água ­de os­tras ­e tin­tu­ra ­de lu­la. ­O con­ jun­to é co­ber­to ­por ­uma cú­pu­la con­ge­ la­da – efei­to ob­ti­do ­ao ­se mer­gu­lhar ­uma con­cha ­de co­zi­nha ­em ni­tro­gê­nio lí­qui­ do. ­Ao to­que ­do gar­fo, ­a ro­cha ­se rom­pe ­e ­dá ­o efei­to ­de li­be­rar á­gua ­do ­mar, pro­e­za ­que sur­pre­en­deu ­o au­di­tó­rio ­do Se­nac. •

prazeres da mesa

Ok MT_juan fra.indd 46

11/27/08 8:03:52 PM


joseanmartínezalija

A SOFISTICAÇÃO DO SIMPLES Abrigado em um dos museus mais arrojados do mundo – o Guggenheim, de Bilbao –, o chef basco defendeu receitas descomplicadas e a revalorização dos ingredientes, em especial legumes e verduras. “Esse será o futuro”, previu

P

ara melhor explicar sua proposta de cozinha, Josean Martínez Alija, do restaurante Guggenheim Bilbao, em Bilbao (uma estrela Michelin), propôs ao público do Mesa Tendências uma viagem rumo ao passado. Um tempo, aliás, que está cada vez mais presente na alta gastronomia mundial: a revalorização dos produtos, em que o sabor e a qualidade são essenciais. Chef de vanguarda, Alija perpetra, por exemplo, uma salada cuja base, ultra-sofisticada, necessita de 6 horas para estar pronta e, ao mesmo tempo, pratica uma cozinha baseada em sucos e caldos, por mais paradoxal que isso possa pa­re­cer. Uma fra­se de­le de­fi­ne bem es­sa carac­te­rís­ti­ca: “Tu­do o que fa­ze­mos é sim­ples, com uma com­ pli­ca­ç ão an­te­ri­or”. Não por acaso seu requisitado restaurante está abrigado num dos museus de arte contemporânea mais arrojados do mundo: o Guggenheim. “A existência desse espaço gerou um momento de mudança e provocação na cidade – o que tem muito a ver com a cozinha que procuro fazer”, disse o chef, que pre­fe­re tra­ba­lhar com ver­du­ras e le­gu­mes a usar car­nes e pei­xes. “Acre­di­ to que o fu­tu­ro es­tá mais as­so­cia­do a es­ses in­gre­di­en­tes. Pe­lo me­nos é com os que eu sem­pre mais me iden­ti­fi­quei”, re­ve­lou.

POR ROBERTA MALTA FOTO RICA­RDO D’ANGELO

Exem­plo des­sa es­co­lha ­de Ali­ja é ­a re­ cei­ta ­em ­que ­ele des­cons­trói ­uma er­vi­lha pa­ra de­pois re­mon­tá-la ­em ­seu for­ma­to ori­gi­nal. Se­gun­do ­o ­chef, es­se co­nhe­ci­do ve­ge­tal é ­um ­dos pro­du­tos ­mais va­lo­ri­ za­dos ­no Pa­ís Bas­co ­– ­e ­a re­cei­ta ­por ­ele apre­sen­ta­da pro­pôs ­que ­ela fos­se de­gus­ta­ da ­com ­as ­mãos. ­“É ­uma vol­ta ­no tem­po. Ex­pli­co: ­o sen­ti­do tá­til, ­ao con­trá­rio ­dos ta­lhe­res ­que ho­je uti­ li­za­mos, am­plia ­a sen­sa­ção da­qui­lo ­que es­ta­mos co­men­do”, afir­mou. Ali­ja acre­di­ ta ­que ­com is­so ­a pu­ re­za ­dos in­gre­di­en­tes pos­sa ­ser me­lhor per­ ce­bi­da quan­do ­a co­ mi­da é le­va­da à bo­ca. ­“É pre­ci­so tra­ba­lhar ­o in­gre­di­en­te ­com in­te­li­gên­cia, res­pei­ tan­do ­e res­sal­tan­do ­na re­cei­ta su­as vir­tu­ des cu­li­ná­rias ­e gas­ tro­nô­mi­cas”, en­fa­ti­ zou ain­da. ­Não ­por aca­so, ­na co­zi­n ha des­se ­chef bas­co ­a tex­tu­ra ­dos pro­du­tos ga­n ha, ­além ­de ­seus aro­mas ­e sa­bo­res, des­ta­que to­do es­pe­ci­al. •

47

prazeres da mesa

Ok MT_juan fra.indd 47

11/27/08 8:04:33 PM


doloresfreixaegutachaves

COZINHA REGIONAL

X

ALTA GASTRONOMIA

As lembranças do paladar estão impregnadas na nossa memória e é por isso que os chefs as resgatam na criação de seus pratos

S

eja a Cozinha Tecnoemocional ou aquela de outras tendências contemporâneas, no fundo, os chefs estão sempre buscando suas ori­ gens. Quem esteve Semana Mesa SP e ouviu o depoimento de grandes che­ fs espanhóis, entre eles, Ferran Adrià e Juan Mari Arzak, pode perceber que todos ressaltam ­as co­zi­nhas re­gi­o­nais e va­lo­ri­zam seus pro­du­tos. Mes­mo que se ren­dam tam­bém à di­ver­si­da­de e aos in­ gre­di­en­tes úni­cos do Brasil. ­Uma ­das for­mas ­de ­se co­nhe­cer ­a al­ma ­e ­a cul­tu­ra ­de ­um po­vo é ­por ­sua gas­tro­no­mia. Co­mo ­já ob­ser­va­va ­o es­cri­tor ­e gour­met fran­cês Bril­ lat-Sa­va­rin, ­em ­seu li­vro Fi­si­o­lo­gia ­do Gos­to, ­no co­me­ço ­do sé­cu­lo ­XIX. As­sim, ­a gas­tro­no­mia é ­um pa­tri­mô­nio cul­tu­ral ­que ­se ex­pres­sa ­por ­meio Dolores Freixa Guta Chaves ­dos há­bi­tos ali­men­ta­ res ­de ca­da po­vo, le­ga­do ­que pas­sa ­de ge­ra­ção ­em ge­ra­ção des­de ­a Pré-His­tó­ria. Des­de ­os tem­pos re­mo­tos, nos­sos an­ces­tra­is fo­ram se­le­cio­nan­do in­ gre­di­en­tes, de­sen­vol­ven­do téc­ni­cas, cri­ an­do as­sim su­as co­zi­nhas, cu­ja es­co­lha ­de ali­men­tos ­era di­ta­da pe­la tra­di­ção ­e pe­la

48

POR DOLORES FREIXA E GUTA CHAVES* FOTO RICARDO D’ANGELO

cul­tu­ra ­de ca­da co­mu­ni­da­de. ­No Mé­xi­ co, ­por exem­plo, ­a tor­til­la fei­ta ­de mi­lho, con­su­mi­da ­até ho­je, ­era ­um ­dos pra­tos ­mais re­pre­sen­ta­ti­vos ­das ci­vi­li­za­ções PréCo­lom­bi­a­nas Mai­as e­ As­te­cas. ­No Bra­sil, ­a man­di­o­ca, tão fundamen­ tal na nossa alimentação, vem carregada de simbologia e de mitos preservados pelos indígenas muito antes de Cabral aportar por aqui. Atualmente, temos várias iniciativas no sen­ti­do de pre­ser­var as tra­di­ções ali­ men­ta­res do Bra­sil, co­mo a ati­tu­de do Ins­ ti­tu­to do Pa­tri­mô­nio His­tó­ri­co e Ar­tís­ti­co Na­ci­on ­ al (Ip­han), que nomeou quitutes como o acarajé, o bolo-de-rolo, o bolo Souza Leão e o queijo-de-minas como pa­ trimônios culturais e imateriais. Para preservar nossa memória e iden­ tidade gastronômicas, precisamos nos predispor a conhecê-la a fundo, inves­ tindo em pesquisas e transmitindo esse conhecimento adquirido. E aos amantes e profissionais da boa comida, é impor­ tante abrir o coração para deixar entrar em suas cozinhas essa imensidão de pro­ dutos brasileiros carregados de múltiplas tradições culturais. * Dolores Freixa é historiadora e guia de turismo cultural; e Guta Chaves é jornalista gastronômica, criadora do site gutachaves.com.br

prazeres da mesa

Ok MT_guta chaves.indd 48

11/27/08 8:05:19 PM


washingtonoliveira

SEGREDOS PARA O SUCESSO Montar e gerir um restaurante, bar, enfim, qualquer negócio na área de alimentação, requer ainda mais atenção do empreendedor

A

ges­tão equi­li­bra­da do ne­gó­cio é o cami­nho pa­ra o su­ces­so. O em­pre­en­dedor ex­plo­ra um ta­ len­to ou ex­pe­ri­ên­cia an­te­ri­or pa­ra abrir um ne­gó­cio pró­prio. Es­se ta­len­to, ou ex­pe­ri­ên­cia, es­tá li­ga­do às áreas de pro­ du­ção, co­mer­cial ou de re­cur­sos hu­ma­ nos e, por is­so, re­ce­be aten­ção fre­qüen­ te. Com a evo­lu­ção da ope­ra­ção se tor­na im­pres­cin­dí­vel a apli­ca­ção das fer­ra­men­ tas de ges­tão fi­nan­cei­ra. O co­mér­cio de ali­men­ta­ção so­fre cons­tan­te pres­são com o cres­ci­men­to da con­cor­rên­cia e o au­men­to dos cus­tos; em de­cor­rên­cia, as mar­gens de lu­cro ten­dem a di­mi­nu­ir. Os pro­ble­mas mais fre­qüen­tes, ho­je, nos res­tau­ ran­tes são: a fal­ta de fi­cha téc­ni­ca (85% não a usam); a con­cor­rên­cia; a for­ma­ção er­ ra­da de pre­ço (90% se ba­sei­ am ape­nas nos pre­ços dos con­cor­ren­tes); cus­tos fo­ra de con­tro­le; fal­ta de ca­pi­tal de gi­ro; mão-de-obra em de­sa­cor­do com as ne­ces­si­da­des e com pou­ca qua­li­fi­ca­ção. Além de tor­na­rem a ope­ra­ção mais di­fí­cil de ad­mi­nis­trar, es­ses pro­ble­mas são fon­tes de pre­ju­í­zo. Com a ro­ti­na di­á­ria da ope­ra­ção, o em­ pre­sá­rio dei­xa de re­gis­trar re­gu­lar­men­te to­dos os da­dos e in­for­ma­ções fi­nan­cei­ras,

POR WASHINGTON OLIVEIRA*

ven­do-se em di­fi­cul­da­des quan­do ne­ces­si­ ta ob­ter um em­prés­ti­mo, em fis­ca­li­za­ção, na ava­li­a­ção pa­ra a ven­da da em­pre­sa e, o mais im­por­tan­te, para sa­ber qual o ob­je­ti­ vo es­tra­té­gi­co a ser per­se­gui­do. Pa­ra os em­pre­sá­rios, es­pe­ci­al­men­te pa­ra os do seg­men­to de ali­men­ta­ção, re­ co­men­do se­gui­rem o pas­so-a-pas­so abai­xo pa­ra a im­plan­ta­ção e ma­nu­ten­ção da ges­ tão fi­nan­cei­ra. • Aqui­si­ção de um softwa­re de con­tro­le fi­nan­cei­ro pa­ra re­gis­trar as en­ tra­das e as saí­das de va­lo­res. • Acom­pa­nhar os pre­ços de ven­da. • Man­ter os re­cur­sos da em­ pre­sa em cons­tan­te ob­ser­va­ ção. Ela­bo­rar flu­xo de cai­xa de 90 di­as. • Cri­ar um pla­ne­ja­men­to or­ ça­men­tá­rio men­sal e com­pa­ rar o re­a­li­za­do e o pro­je­ta­do. • Ana­li­sar a lu­cra­ti­vi­da­de. • Oti­mi­zar os re­cur­sos. • Evi­tar o che­que es­pe­ci­al. Com a apli­ca­ção de to­das es­sas fer­ra­ men­tas, os em­pre­sá­rios po­de­rão to­mar de­ ci­sões de qua­li­da­de e se­gu­ras, con­fi­an­tes quan­to ao fu­tu­ro de seu ne­gó­cio. * É con­s ul­t or da Med­z o Con­s ul­t o­r ia Em­p re­s a­r i­a l, tel. (11) 2772-8455; was­hing­ton@med­zo.com.br

49

prazeres da mesa

v1 Ok MT_washington.indd 49

11/27/08 8:34:13 PM


carlosalbertodória

OLHAR ATENTO AO PRESENTE O professor Carlos Alberto Dória faz uma reflexão sobre o conceito da culinária brasileira

F

a­lar so­bre co­mi­da não é so­men­ te tra­tar de re­cei­tas e téc­ni­cas. O pro­fes­sor Car­los Al­ber­to Dó­ria, es­tu­di­os­ o da ci­ên­cia e da cul­tu­ra da ali­men­ta­ção, abriu o ter­cei­ro dia do Me­sa Ten­dên­cias fa­zen­do uma re­fle­xão so­bre co­mo se for­ma o con­cei­to de cu­li­ ná­ria bra­si­lei­ra. Se­gun­do Dó­ria, que tam­ bém é au­tor de vá­rios li­vros, en­tre eles Com Unhas, Den­tes & Cu­ca (Se­nac, SP, 2008), com Alex Ata­la, há vá­ri­as in­con­

50

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICARDO D’ANGELO

sis­tên­cias na cons­tru­ção his­tó­ri­ca do ma­ pa da cu­li­ná­ria re­gi­o­nal, di­vi­di­do em três mo­men­tos: • Séculos XVI a XIX, com a for­te tran­ sa­ção in­ter­na­ci­o­nal de es­pé­ci­es na­ti­vas en­tre os con­ti­nen­tes. • Séculos XIX e XX, quan­do se ela­bo­ra a idéia de uma co­zi­nha na­ci­o­nal mis­ci­ ge­na­da, for­ma­da pe­las con­tri­bui­ções de ín­di­os, ne­gros e bran­cos. • Século XXI, em que as re­fe­rên­cias são

prazeres da mesa

Ok MT_carlos alberto doria.indd 50

11/27/08 8:06:18 PM


glo­ba­li­za­das e en­fa­ti­zam in­gre­di­en­tes e pro­du­tos, com a ado­ção de téc­ni­cas in­ ter­na­cio­nais e mo­der­nas. De acor­do com Dó­ria, pa­ra en­ten­ der co­mo se de­ram os en­ra­iz­ a­men­tos da co­zi­nha bra­si­lei­ra, é pre­ci­so con­si­de­rar tam­bém: • O pe­rí­o­do an­te­ri­or à co­lo­ni­za­ção, com a par­ti­da dos ín­di­os da Ama­zô­nia em di­re­ção ao sul do pa­ís, por­tan­do a mandi­o­ca pe­las fron­tei­ras oes­te e in­ cor­po­ran­do a cul­tu­ra do mi­lho, in­flu­ en­cia­dos pe­los ín­di­os da cor­di­lhei­ra. • A am­pli­a­ção das tro­cas, pro­por­ci­o­na­ da pe­la co­lo­ni­za­ção, que trou­xe cen­ te­nas de es­pé­ci­es – prin­ci­pal­men­te as bo­tâ­ni­cas – de Ín­dia, Chi­na, Eu­ro­pa, Áfri­ca, An­ti­lhas e Ca­ri­be. • Os mo­vi­men­tos de ban­dei­ran­tes e tro­ pei­ros, que su­pri­am os en­ge­nhos e as mi­nas de man­ti­men­tos e ocu­pa­ram o Bra­sil cen­tral, di­fun­din­do pra­tos à ba­ se de mi­lho. O re­sul­ta­do des­se lon­go pro­ces­so, de acor­do com o pro­fes­sor, foi um mo­sai­ co cu­li­ná­rio tra­ça­do por pro­du­tos co­mo mi­lho, man­di­o­ca, char­que, er­va- ma­te e co­co. Com is­so, o flu­xo de in­gre­di­en­ tes tor­na-se fun­da­men­tal pa­ra a com­ pre­en­são dos en­ra­i­za­men­tos da co­zi­nha bra­si­lei­ra. Quan­to ao fu­tu­ro, ele ain­da es­tá apoi­a­do em um re­per­tó­rio na­ci­o­nal pou­ co ex­plo­ra­do, es­pe­ci­al­men­te na Ama­ zô­nia. De acor­do com Dó­ria, pa­ra que o Bra­sil se tor­ne, de fa­to, uma re­fe­rên­cia gas­tro­nô­mi­ca, é pre­ci­so um olhar mais aten­to ao pre­sen­te do que à his­tó­ria. De­ ve-se, por­tan­to, aban­do­nar o con­cei­to de co­zi­nha bra­si­lei­ra ba­se­a­do em tra­ços ét­ni­cos. “O que eu pro­po­nho é en­ca­rar o de­sen­vol­vi­men­to da ali­men­ta­ção co­ mo um cam­po de tran­sa­ções glo­bais que nun­ca ter­mi­na”, con­clu­iu. • prazeres da mesa

Ok MT_carlos alberto doria.indd 51

51

11/27/08 8:06:49 PM


andoniluisaduriz

REVOLUÇÃO DOS SENTIDOS Com teses desafiadoras e preparações para comer e pensar, o chef basco do estrelado restaurante Mugaritz, de Renteria, aguçou a mente – e o paladar – do público do Mesa Tendências POR ROBERTA MALTA FOTOS ANDRÉ PENICHE

“O

s li­mi­tes do sa­bor.” Com es­se te­ma de­sa­ fi­a­dor, o chef bas­co An­do­ní Lu­is Adu­riz, do res­tau­ran­te Mu­ga­ritz, du­as es­tre­las Mi­che­lin, agu­ çou a men­te do pú­bli­co do Me­sa Ten­ dên­cias. Sua cu­ri­o­si­da­de em es­miu­çar o as­sun­to sur­giu quan­do um jor­na­lis­ ta gas­tro­nô­mi­co clas­si­fi­cou a co­zi­nha es­pa­nho­la de “in­sos­sa”. O chef foi ao di­ci­o­ná­rio e achou os si­nô­ni­mos: “in­ sí­pi­do; aqui­lo que não tem sa­bor; de­ sin­te­res­san­te; mo­nó­to­no; te­di­o­so”. A par­tir da­li, An­do­ní tra­çou o ca­mi­nho que pas­saria a nor­te­ar seu tra­ba­lho: “Quan­do vo­cê faz o que sen­te e não se trai, há um sex­to sen­ti­do que apon­ta o ru­mo cor­re­to a ser se­gui­do”. Mais: tal pen­sa­men­to tor­nou-se a mo­la pro­pul­ so­ra de seu es­tu­do cu­li­ná­rio.

52

prazeres da mesa

Ok MT_Andoni.indd 52

11/27/08 8:07:49 PM


A se­guir, o chef bas­co fa­lou ao pú­ bli­co so­bre a im­por­tân­cia da vi­são, co­mo um dos cin­co sen­ti­dos que in­ flu­en­ciam a per­cep­ção de pra­zer ao se co­mer al­go. E exem­pli­fi­cou, ci­tan­do o jan­tar da vés­pe­ra, no qual Alex Ata­ la ser­viu tu­ru à tru­pe es­pa­nho­la. O in­gre­di­en­te des­co­nhe­ci­do con­quis­tou o pa­la­dar e a apro­va­ção de to­dos. Só no fim da noi­te, o chef bra­si­lei­ro te­ria aber­to um tron­co no meio do sa­lão do res­tau­ran­te, de on­de saí­ram os tu­rus, ver­mes as­se­me­lha­dos a mi­nho­cas. “Se a pri­mei­ra men­sa­gem ti­ves­se si­do vi­su­ al, e não de gos­to, não te­rí­a­mos co­mi­ do”, pon­de­rou An­do­ní. “O sa­bor da ma­çã es­tá no con­ta­to com o pa­la­dar”, dis­se o chef es­pa­nhol, re­pro­du­zin­do a fra­se do es­cri­tor ar­gen­ ti­no Jor­ge Lu­iz Bor­ges. A me­tá­fo­ra su­ ge­re que o sen­ti­do do ta­to nos in­te­gra à ex­pe­ri­ên­cia, uma vez que a fru­ta sem sa­bor per­de a ra­zão de ser. “Quan­do fa­lo do in­sos­so, es­tou rei­vin­di­can­do o ta­to”, en­fa­ti­zou, de­fen­den­do pro­du­tos co­mo a mer­lu­za, mais atra­en­tes por sua tex­tu­ra do que pe­lo sa­bor. “A au­sên­cia de gos­to pos­si­bi­li­ta a per­cep­ção de ou­ tros sen­ti­dos”, emen­dou. So­bre o ol­fa­to, de­no­mi­na­do por An­do­ní co­mo “o ta­to da bo­ca”, o chef quei­xou-se de que atu­al­men­te há mui­ tos ele­men­tos in­ter­me­di­á­rios que nos afas­tam das ex­pe­ri­ên­cias ol­fa­ti­vas. Ou se­ja, te­mos pu­dor em chei­rar pra­tos ou mes­mo em co­mer com as mãos. Pa­ra ilus­trar sua te­o­ria, o chef bas­co apre­ sen­tou, den­tre ou­tras cri­a­ções in­tri­

53

prazeres da mesa

Ok MT_Andoni.indd 53

11/27/08 8:08:09 PM


andoniluisaduriz

REQUEIJÃO DE LEITE DE OVELHA E FENO TEMPERADO COM FOLHAS DEFUMADAS DE SAMAMBAIA E ABÓBORA EM CALDA NÃ DOCE

54

gan­tes, bo­lhas de mel pro­du­zi­das com o me­ca­nis­mo de um mo­tor­zi­nho de aquá­rio. A car­ne de vi­te­la e gris­si­ni de apa­rên­cia car­bo­ni­za­da. E o car­pac­cio de me­lan­cia, ser­vi­do com ex­clu­si­vi­da­ de aos pri­vi­le­gi­a­dos par­ti­ci­pan­tes do Jan­tar do Sé­cu­lo (leia a re­por­ta­gem em Praz­ er­ es da Mes­ a). Nes­te úl­ti­mo pra­to, a fru­ta ga­nhou pro­po­si­ta­da­men­te a apa­rên­cia de car­ne bo­vi­na, nu­ma ten­ta­ti­va de An­do­ní de mu­dar a per­cep­ção que se tem do pro­ du­to. O gri­to re­vo­lu­ci­o­ná­rio do chef veio lo­go a se­guir: “Por que não usa­ mos fru­tas no re­fo­ga­do de alho-po­ró? Por que não bus­ca­mos fa­zer di­fe­ren­te? Por que não mu­da­mos o mun­do?”, de­ sa­fi­ou, pa­ra em se­gui­da des­pe­dir-se. “A fron­tei­ra en­tre Bra­sil e Es­pa­nha se rom­peu – e não ape­nas nes­tes pou­cos di­as. Nós nos sen­ti­mos co­mo ir­mãos. A par­tir de ago­ra, es­ta­re­mos sem­pre jun­tos”, dis­se ao fi­nal, emo­cio­nan­do o pú­bli­co, que o aplau­diu efu­si­va­men­te.

prazeres da mesa

Ok MT_Andoni.indd 54

11/27/08 8:08:41 PM


marcosmorán

MIÚDOS DE PEIXES COMO IGUARIAS Marcos Morán, da centenária Casa Gerardo, em Prendes, mostra como fazer uma culinária rica e sem desperdícios

U

ma gastronomia sem desper­ dícios. E, nem por isso, com menos sabor. O conceito do trash cooking, que utiliza partes de pes­ cados normalmente não aproveitadas, foi um dos destaques da apresentação do chef espanhol Marcos Morán, da cente­ nária Casa Gerardo, em Prendes – uma estrela no Guia Michelin. Descendente de uma família de cozinheiros e apaixo­ nado pela cozinha enraizada nos sabores das Astúrias, Marcos vem sendo treinado pelo pai, Pedro Morán, para assumir o co­ mando do res­tau­ran­te. O chef pro­vou ser pos­sí­vel fa­zer um apro­vei­ta­men­to eru­di­to dos mi­ú­dos dos pei­xes, com no­vos sa­bo­ res e tex­tu­ras. Em ou­tras pa­la­vras, o que se­ria con­si­de­ra­do dis­pen­sá­vel pas­sa a ser útil co­mo po­ten­ci­a­li­za­dor de sa­bor. A utilização de miúdos de pescados na cozinha não é uma prática nova, mas seu estudo vem se intensificando nos últimos anos, principalmente com relação ao uso desses ingredientes na alta gastronomia. “Espinha, escamas, cabeça, bochechas, pescoço e bexiga acabam ficando com o peixeiro”, explicou Morán. Para modi­ ficar essa realidade, é preciso um olhar mais generoso às partes consideradas me­ nos nobres. Como exemplo, o chef esco­ lheu os chamados pescados azuis – que apresentam maior porcentagem de gor­ dura. No preparo do robalo, ele empre­ gou as bochechas e as tripas do peixe. Do

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICARDO D’ANGELO

bonito, aproveitou o fígado, “que deve ser grelhado como se fosse de pato”, e o san­ gue do peixe, “para intensificar o sabor”. E perguntou à platéia: “Alguém quer comer o coração do bonito?” Não faltaram vo­ luntários. O resultado foi aprovado. A gordura presente nos pescados também tem muito sabor e rende óti­ mos efeitos, “principalmente a parte pe­ gada à pele”. A das sardinhas, segundo o chef, é um dos melhores exemplos. Com elas, Morán preparou um prato utilizan­ do café e queijo curado. Como finaliza­ ção, usou um ponto de espuma de leite queimado. O peixe, escaldado em óleo de girassol aquecido a 60 ºC, ganha sa­ bor mais intenso e textura leve, a ponto de poder ser degustado com a colher. Nome do prato: sardinhas nos novos horizontes do café. E, dessa forma, além de mais sabor, a simples sardinha ga­ nhou ares de alta gastronomia.

55

prazeres da mesa

Ok MT_marcos moran.indd 55

11/27/08 8:09:43 PM


betopimenteleterezapaim

MISCIGENAÇÃO DE TEMPEROS O hibridismo da população baiana foi crucial no DNA da culinária desse Estado nordestino, ao misturar aromas e sabores do Velho Continente e da mamma África

56

POR ROBERTA MALTA FOTOS ANDRÉ PENICHE E RICARDO D’ANGELO

N

in­guém me­lhor do que a in­ can­sá­vel du­pla ba­i­a­na Be­to Pi­men­tel e Te­re­za Paim pa­ra le­var os sa­bo­res e o axé da Boa Ter­ra pa­ra o pú­bli­co gour­met. A pa­les­tra da du­pla foi uma das mais aplau­di­das e dei­xou aque­le gos­ti­nho de que­ro mais. Os res­pec­ti­vos chefs dos res­tau­ran­tes Pa­ra­í­so Tro­pi­cal, em Sal­va­dor, e Ter­rei­ro Ba­hia, na Praia do For­te, sur­pre­en­de­ram a pla­téia lo­go na aber­tu­ra, ofe­re­cen­do fras­cos de den­dê e fi­ tas do Se­nhor do Bon­fim. A dublê de chef e agitadora gastro­ nômica destacou o apelo cultural que a comida regional representa para o povo baiano. De acordo com ela, as in­flu­ên­cias re­li­gi­o­sas do can­dom­blé, por exem­plo, de­ mons­tra­das por meio de tem­pe­ros e co­res tí­pi­cos da mam­ma Áfri­ca, dão o tom da cu­li­ná­ria lo­cal. A chef acre­di­ta que o hi­ bri­dis­mo da po­pu­la­ção, que in­clui a for­te pre­sen­ça dos co­lo­ni­za­do­res por­tu­gues­es, que, à épo­ca do des­co­bri­men­to, de­sem­ bar­ca­ram no pa­ís pe­la Ba­hia, jun­ta­men­te com ju­deus e afri­ca­nos, foi de­ter­mi­nan­te na for­ma­ção da et­nia mis­ci­ge­na­da, pre­ sen­te na­que­le Es­ta­do bra­si­lei­ro, acen­tu­ an­do a pre­di­le­ção do ba­i­a­no por mis­tu­rar à me­sa aro­mas e sa­bo­res. Be­to Pi­men­tel re­la­tou a se­guir que to­ do ri­tu­al de pu­ri­fi­ca­ção tem na co­mi­da um de seus prin­ci­pa­is itens. E mais: que ca­da san­to tem seu pró­prio pra­to e res­tri­ções ali­men­ta­res. Sem con­tar, ain­da, a in­flu­ ên­cia eu­ro­péia pre­sen­te nas 365 igre­jas ca­tó­li­cas de Sal­va­dor, que se mis­tu­ra à tra­ di­ção dos ori­xás. “Pro­va dis­so é que no dia

prazeres da mesa

Ok MT_beto pimentel.indd 56

11/27/08 8:10:53 PM


t

de São Lá­za­ro, se ben­ze com pi­po­ca e no de São Cos­me e Da­mi­ão, com ca­ru­ ru – re­cei­ta tí­pi­ca do can­dom­blé, que é ser­vi­da nas ru­as em cli­ma de fes­ta”, diz Pi­men­tel. “Pa­ra nós, o pon­to de coc­ção é o chei­ro”, com­ple­tou Te­re­za Paim, de­ mons­tran­do a li­ga­ção ins­tin­ti­va do ba­i­ a­no com a cu­li­ná­ria. A chef apro­vei­tou a as­sis­tên­cia e a gran­de ex­po­si­ção do even­to pa­ra fa­zer uma de­nún­cia: “A Pe­tro­brás ins­ta­lou uma in­dús­tria de bi­o­di­es­el na me­lhor área pa­ra o plan­tio do den­dê. A em­pre­ sa es­tá com­pran­do as ter­ras de pe­que­nos pro­du­to­res pa­ra fa­zer o com­bus­tí­vel. Is­so es­tá ge­ran­do na­que­la re­gi­ão um pro­ble­ma so­ci­al gra­vís­si­mo: o al­co­o­lis­mo en­tre os pe­que­nos pro­du­to­res que, em tro­ca de al­ guns tro­ca­dos, aca­bam aban­do­nan­do su­as ter­ras e per­den­do seu sus­ten­to”, pro­tes­ tou. “Não se pro­duz ener­gia al­ter­na­ti­va em um lu­gar em que se pro­duzem ali­men­ tos!”, rei­te­rou Te­re­za. Ho­je, a Ma­lá­sia li­de­ra o mer­ca­do mun­di­al de dendê. No Brasil, o Pará é nosso maior produtor. “O dendezeiro da Bahia produz muito pouco, porque não tem pro­ces­so de ma­ne­jo. Mas te­mos o me­lhor ter­roir do mun­do pa­ra is­ so”, de­fen­deu Te­re­za. Beto Pimentel fez coro com a chef, e, ao encerrar os trabalhos, recordou os tempos em que morava na Pauli­ céia: “Enquanto Gilberto Gil diz que a Bahia deu a ele régua e compasso, eu digo que São Paulo me deu a bússola, a direção”, poetizou o bem-humorado chef baiano. •

57

prazeres da mesa

Ok MT_beto pimentel.indd 57

11/27/08 8:11:13 PM


angelleón

UM CERTO “CHEF-PESCADOR” O cozinheiro do restaurante espanhol Aponiente declarou seu amor ao mar e defendeu uma linha de trabalho que resgata os peixes de descarte e sem valor comercial

D

u­ran­te ­a me­ni­ni­ce, ­o pro­gra­ ma pre­di­le­to ­de An­gel Le­ón, ­do res­tau­ran­te es­pa­nhol Apo­ ni­en­te, ­em Pu­er­to ­Sta. Ma­ria, ­era sa­ir pa­ra pes­car ­com ­o ­pai. ­O ­hobby des­per­tou ­no ga­ro­to ­a pai­xão pe­lo ­mar ­e pe­las di­fe­ren­tes es­pé­ci­es ­de pes­ca­do. ­No pal­co ­do Me­sa Ten­dên­ci­as, ­o “chefpes­ca­dor” re­la­tou ­um pou­co de su­as vi­ a­gens ­e co­mo uti­li­za de­ter­mi­na­dos pei­xes ­e fru­tos ­do ­mar, ­por ve­zes des­pre­za­dos, ­em re­cei­tas in­ven­ ti­vas ­e chei­as ­de sa­ bor, e­ ­nas quais ­até ­o ca­ro­ço ­da azei­to­na ­tem ­um pa­pel, vital, a­ de­sem­pe­nhar. Pa­ra fa­zer ­o pú­bli­co navegar (li­te­ral­ men­te) nes­se oce­a­no ­de sen­sa­ções, ­o ­chef le­vou ­um ví­deo so­bre ­uma ­de su­as saí­das ­a bor­do ­de ­seu bar­co. ­O ro­tei­ro co­me­ça ce­do: ­a tri­pu­la­ção par­te ru­mo ­ao ­mar à­s 3­h30 ­da ma­dru­ga­da, ­e ­só à­s 6, quan­do ­o ­sol sur­ge ­no ho­ri­zon­te, ele lan­ça ­a pri­mei­ ra re­de. Nes­sa le­va ini­ci­al, ­há ­de tu­do, ­mas ­a aten­ção ­do co­zi­nhei­ro con­cen­tra-se ­nos pei­xes ­de des­car­te, ­sem va­lor co­mer­cial. ­“Em mi­nha co­zi­nha, bus­co pri­vi­le­gi­ar es­se ti­po ­de pes­ca­do, pou­quís­si­mo co­nhe­ci­do e

58

POR ROBERTA MALTA FOTO RICA­RDO D’ANGELO

menos va­lo­ri­za­do. ­O ma­ri­nhei­ro ­o de­vol­ve ­ao ­mar, ­pois ­com ­ele ­não po­derá sus­ten­tar ­sua fa­mí­lia”, ­diz. An­gel Le­ón, po­rém, ­não es­mo­re­ceu di­an­te ­da di­fi­cul­da­de ­e aca­bou en­con­tran­do ­uma ma­nei­ra de con­se­guir tra­ba­lhar ­com es­ses in­gre­di­en­tes: ­fez ­um acor­do ­com al­guns bar­cos ­de ­sua ci­da­de ­e, ho­je, re­ce­be ­os pro­du­tos re­gu­lar­men­te ­e sem­pre fres­cos. Le­ón de­mons­trou ­ao pú­bli­co, ­em ­sua pa­les­tra, co­mo ela­bo­ra ­uma mas­sa ho­mo­ gê­nea ­com vá­ri­os ti­pos ­de pei­xe ­e al­gi­na­to ­de al­ga. ­A mis­tu­ra pa­re­ce vi­rar ­um ­só in­ gre­di­en­te, co­mo ­num pas­se ­de má­gi­ca. Pa­ ra con­fe­rir aro­ma ­de azei­te ­ao pra­to, ­uma no­vi­da­de inu­si­ta­da: ­em ­vez ­de ­usar car­vão pa­ra as­sar ­o ali­men­to, ­o co­zi­nhei­ro lan­çou ­mão ­de ca­ro­ços ­de azei­to­na. ­“É ­uma téc­ni­ ca sim­ples, ­que tra­duz ­o ­que de­fen­de­mos, ­já q­ ue bus­ca­mos ­ver ­as coi­sas ­de ­um pon­to ­de vis­ta di­fe­ren­te”, afir­mou. ­Com ­a tran­qüi­li­da­de ­de ­quem ­está ­em per­fei­ta har­mo­nia ­com ­a na­tu­re­za, Le­ón de­mons­trou ain­da, ­com ­uma fra­ se con­tem­pla­ti­va, ­sua de­vo­ç ão à cau­sa ­dos pei­xes me­nos­pre­za­dos pe­las ­“leis ­de mer­ca­do” e pe­los co­zi­n hei­ros ­e con­su­mi­ do­res: ­“Meu me­lhor mes­tre é ­o ­mar. ­Eu gos­ta­ria ­de ­ser ­uma gai­vo­ta, ­mas ­a mu­ ta­ç ão ­está ain­da distante ­e sou sim­ples­ men­te ­um ho­mem”, fi­na­li­zou ­o chef-pes­ ca­dor, c­ om al­ma ­de po­et­ a. •

prazeres da mesa

Ok MT_angel e mas que tapas.indd 58

11/27/08 8:18:09 PM


PRODUTOS DA ANDALUZIA Em livro luxuoso, 30 chefs de várias partes do mundo, incluindo o brasileiro Alex Atala, interpretam receitas com ingredientes andaluzes

U

m li­v ro de cu­li­ná­ria com sa­ bor an­da­luz. Azei­te de oli­va, vi­n hos, quei­jos, fru­tas se­cas, azei­to­nas e mais uma in­fi­ni­da­de de pro­ du­tos que ins­ti­gam o pa­la­dar for­mam a lis­ta de in­g re­di­en­tes de re­cei­tas iné­di­ tas, as­si­na­das por chefs in­ter­na­cio­nais. O re­sul­ta­do es­tá no li­v ro Más que Ta­pas – Los Gran­d es In­t er­n a­c io­n a­les in­t er­p re­ ten An­d a­lu­c ia, pu­bli­ca­do em es­pa­n hol e em in­glês, que foi lan­ç a­do no Bra­sil du­ ran­te o Me­sa Ten­dên­cias, pe­la Ex­ten­da, a Agên­cia An­da­lu­za de Pro­mo­ç ão Ex­te­ ri­or. Par­ti­ci­pam do pro­je­to 30 chefs, que so­mam na­da me­nos que 43 es­tre­las no Mi­che­lin. O pre­fá­cio é as­si­na­do pe­lo ca­ ta­lão Fer­ran Adrià. “É um ins­tru­men­to sem pre­ce­den­tes na li­te­ra­t u­ra gas­tro­nô­ mi­ca, uma fu­são per­fei­ta en­tre o me­l hor da gas­tro­no­mia mun­di­al e o me­l hor de nos­sa ofer­ta agroali­men­tar”, afir­mou Te­re­sa Sá­ez, di­re­to­ra-ge­ral da Ex­ten­da.

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICA­RDO D’ANGELO

Te­re­sa lem­brou que o Bra­sil é o se­g un­do mai­or des­ti­no pa­ra os pro­du­tos an­da­ lu­zes na Amé­ri­ca La­ti­na, uma re­la­ç ão que vem se for­ta­le­cen­do a ca­da ano. “O vo­lu­me de ex­por­ta­ç ões agroali­men­ta­res an­da­lu­zas pa­ra o mer­ca­do bra­si­lei­ro do­ brou en­tre 2003 e 2007”, co­me­mo­rou. On­ze paí­ses es­tão re­pre­sen­ta­dos no li­v ro: Ar­gen­ti­na, Chi­le, Ja­pão, Chi­na, Ale­ma­n ha, Rei­no Uni­do, Fran­ç a, Bél­ gi­ca, Es­ta­dos Uni­dos, Mé­xi­co e Bra­sil, por Alex Ata­la. “Quan­do vo­cê tem a pos­si­bi­li­da­de de es­tar em um li­v ro acom­pa­n ha­do de gran­des pes­so­a s, vo­cê eter­ni­za sua obra e me­l ho­ra sua au­to-es­ ti­ma, e tal­vez a do seu pa­ís”, dis­se o chef do D.O.M., que cri­ou pa­ra o pro­je­to um pra­to que com­bi­na os sa­bo­res exó­ti­cos da Ama­zô­nia e os pro­du­tos an­da­lu­zes: quei­jo de cas­ta­n has-do-pa­rá com so­pa de vi­n ho olo­ro­so de Cór­do­ba e uvaspas­sas de Má­la­ga. •

59

prazeres da mesa

Ok MT_angel e mas que tapas.indd 59

11/27/08 8:18:34 PM


christianescribà

O ARTISTA DO DOCE A paixão pelo açúcar está no sangue de Christian Escribà. O chef catalão representa a quarta geração de uma dinastia de confeiteiros. O pai, Antoni Escribà, é considerado um mago do chocolate. O avô, o francês Etienne Tholoniat, foi outra grande referência no mundo do açúcar

C

hristian Escribà tomou para si a missão de romper com todos os padrões do que se conhece por confeitaria. E criou verdadeiros espetáculos açucarados, com idéias que transcendem o sabor. “Não só fazemos bolos, criamos ilusões”, diz o lema da Confeitaria Escribà, fundada em 1820, em Barcelona. Nessa onda, ele já vestiu noivas com doces, pintou murais com paisagens de açú-

60

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTO RICARDO D’ANGELO

car, ergueu coberturas de bolos com balões de gás. “O doce vira tecido, presente, o que você imaginar”, provoca. O espírito revolucionário do chef veio à tona logo no início da apresentação. Ele entra com um bolo enorme, decorado de glacê azul e verde, e diz que tem uma surpresa para o auditório. Mas, antes, exibe à platéia um vídeo em que tortas e doces explodem. Entre o público, fica a pergunta:

prazeres da mesa

Ok MT_christian escriba.indd 60

11/27/08 8:19:37 PM


o que vai acontecer com o bolo do palco? Escribà sabe que já gerou suspense. E diz: “Mudei de idéia, depois eu faço isso”. O público prende o fôlego e assiste, atento, às explicações do confeiteiro, que trouxe, como assistente, seu filho, a quinta gera­ ção de uma saga dedicada ao açúcar. Au­tor de bo­los gi­gan­tes­cos, Chris­ti­ an afir­ma que, na con­fei­ta­ria, ta­ma­nho é o que me­nos im­por­ta. Ele lan­ça uma ques­tão: por que dar de pre­sen­te 1 qui­lo de bom­bons, quan­do se po­de im­pres­sio­ nar com ape­nas um? Foi as­sim que sur­ giu a idéia de de­sen­vol­ver uma con­fei­ta­ ria vol­ta­da ao mer­ca­do de pre­sen­tes. Ele mos­trou um exem­plo à pla­téia: um mi­ crobo­lo co­lo­ri­do, em for­ma de anel, com di­rei­to a velinha. “É só soprar e fazer um pedido.” Impossível não se deixar surpre­ ender pela idéia. Há também sapatos de chocolate, jóias de caramelo, objetos de decoração confeccionados de cristal de açúcar e mais um mundo de “regalos”.

Em vídeo, Escribà também mostrou que o serviço é parte fundamental desse tra­ balho: exibiu trechos de performances encenadas por atores e, o mais emocio­ nante, a reação dos convidados em bo­ das e festas, diante dos doces-surpresa. “Somos transmissores de sentimentos, é preciso chegar a um final feliz.” Mas para sustentar criações tão inu­ sitadas, é fundamental contar com prá­ tica apuradíssima. “O inimigo número 1 do chocolate é o calor. O do caramelo, a umidade.” E driblar as adversidades é tarefa simples para Escribà, para quem técnica, arte e emoção caminham lado a lado. Ao fim da apresentação, ele retoma a surpresa para o público, o bolo gigante. Música de suspense. Há quem tampe os ouvidos. Não, o bolo não explode, tratase de uma pegadinha. Mas todos ali en­ tendem que a gran­de sur­pre­sa já ha­via acon­te­ci­do: co­nhe­cer a ex­plo­são de ge­ni­ a­li­da­de im­pres­sa no tra­ba­lho de Es­cri­bà.

61

prazeres da mesa

Ok MT_christian escriba.indd 61

11/27/08 8:20:17 PM


alexatala

SUCESSO FORJADO À FACA O mais festejado chef do país destacou a hierarquia e a disciplina na cozinha, revalorizou os ingredientes brasileiros e compartilhou com a platéia o lado menos glamouroso da profissão POR ROBERTA MALTA FOTOS ANTÓNIO RODRIGUES

N

o úl­ti­mo ­dia ­do Me­sa Ten­dên­ci­as, ­com ­o au­di­tó­rio to­tal­men­te to­ma­do ­por ­chefs ta­ rim­ba­dos, es­tu­dan­tes ­de gas­tro­no­mia, co­zi­ nhei­ros ini­ci­an­tes ­e im­pren­sa – ­o ­chef ­Alex Ata­la, ­do res­tau­ran­te ­D.O.M., de ­São Pau­lo, SP, ­foi lo­go ­ao pon­ to: ­a bus­ca ­do su­ces­so ­e ­da fa­ma ­na pro­fis­são. “Mui­tos fa­ zem, pou­cos re­ce­bem lu­zes”, dis­se. Pa­ra ­ele, lim­par ­bem ­uma co­zi­nha ­e des­fo­lhar ­um mo­lho ­de sal­si­nha ­com ­as ­mãos ­não é pre­ci­o­sis­mo, ­mas ­uma dis­ci­pli­na fun­da­men­ tal ­e hi­e­rár­qui­ca. ­“Sem ­uma gran­de ba­se, ­não ­há ­uma gran­de cons­tru­çã­o”, en­si­nou. So­bre ­o pre­ten­so gla­mour ­que en­vol­ve ­nos di­as ­de ho­je ­a pro­fis­são, ­foi ca­te­gó­ri­co: ­“Chefs ­são for­ja­dos co­mo ­uma fa­ca: à pan­ca­da, fo­go ­e á­gua”, des­mis­ti­fi­cou. In­ter­rom­peu ­os aplau­sos, co­men­tan­do ­que, ­ao con­ trá­rio ­do ­que vi­ven­ciou ­em ­sua car­rei­ra, ­na ­qual ­a in­ ten­sa com­pe­ti­ção ­e ­a in­tri­ga ­por ve­zes ­se tor­na­ram im­ pe­ra­ti­vas, ­o Jan­tar ­do Sé­cu­lo, ­do ­qual par­ti­ci­pou ­ao la­do ­de ­Adrià, Ar­zak & cia. ­– es­tre­la­dís­si­ma, di­ga-se –, ­foi pa­ra ­ele ­uma ver­da­dei­ra li­ção ­de vi­da. “É­ra­mos 15 co­ zi­nhei­ros tra­ba­lhan­do jun­tos, ­com ­o mes­mo ob­je­ti­vo”,

62

prazeres da mesa

068a071_atala.indd 62

11/27/08 8:21:47 PM


t

con­tou, elo­gi­an­do ­a ati­tu­de ge­ne­ro­sa “des­ses ho­mens ­que co­lo­cam ­sua mis­são, ­­seu pa­ís, sua ban­dei­ra aci­ma ­de qual­quer coi­sa”. ­Ao po­lê­mi­co con­fron­to ­que San­ti San­ta­ma­ria de­cla­rou a Fer­ran ­Adrià, ­o ­chef pau­lis­ta­ no al­fi­ne­tou ­o pri­mei­ro: “Po­de ­uma pes­soa es­tar cer­ta ­e ­o mun­do er­ra­do?”, ques­ti­o­nou, afir­man­do ­sem ci­tar no­mes ­que ­“os re­a­ci­o­ná­ri­os ­não ti­rem ­só es­pu­mas ­e pro­du­tos quí­mi­cos ­de su­a vi­da ­– ­mas tam­bém os te­le­ fo­nes ce­lu­la­res”. Âni­mos ­e emo­ções con­tro­la­dos, vol­tou à gas­tro­ no­mia bra­si­lei­ra, con­vo­can­do ­os pro­fis­si­o­nais ­de co­ zi­nha ­a re­a­cen­der ­a cha­ma ­em fa­vor ­dos in­gre­di­en­tes ­de nos­sa ter­ra, ain­da pou­co co­nhe­ci­dos ­do gran­de pú­bli­co. ­“Em 1994, ­não con­se­guia ven­der shi­i­take, cor­dei­ro, ma­gret ­de pra­to ­– is­so tu­do ho­je é lu­garco­mum”, des­ta­cou, de­mons­tran­do ­a evo­lu­ção ­do pa­ la­dar ­do con­su­mi­dor bra­si­lei­ro. ­“Em pou­co tem­po, es­ta­re­mos co­men­do tu­ru, pri­pri­o­ca ­e jam­bu ­com ­a mes­ma na­tu­ra­li­da­de”, pro­fe­ti­zou, emo­cio­nan­do-se ­e ­ao pú­bli­co, ­que ­o ova­ci­o­nou ­uma ­vez ­mais.

63

prazeres da mesa

068a071_atala.indd 63

11/27/08 8:22:22 PM


alexatala

64

prazeres da mesa

068a071_atala.indd 64

11/27/08 8:22:41 PM


­Não ­sem ra­zão, ­a de­fe­sa ­e ­a va­lo­ri­za­ção q­ ue ­vem fa­zen­do ­dos pro­du­tos bra­si­lei­ros ­lá fo­ra, con­fe­rem ho­je ­a Ata­la – ­de fa­to ­e ­de di­rei­to – ­o tí­tu­lo ­de em­bai­xa­dor ­da gas­tro­no­mia bra­si­lei­ra. ­A re­fe­rên­cia re­ quer ­uma sé­rie ­de qua­li­fi­ca­ções, ­e ­o ­chef pau­lis­ta pro­vou es­tar to­tal­men­te pre­pa­ra­ do pa­ra ­a me­re­ci­da hon­ra­ria, ­ao cha­mar ­a aten­ção ­da pro­fis­são ­de co­zi­nhei­ro co­ mo fa­tor ­de in­clu­são so­ci­al. Pa­ra ilus­trar ­sua te­se ci­tou seu atu­al subche­fe, ­o ba­i­a­no Ge­o­va­ne Car­nei­ro, ­que co­me­çou ­na co­ zi­nha co­mo la­va­dor ­de pra­tos. ­“No iní­cio ­do ­ano 2000, ­ele pe­diu de­mis­são por­que acre­di­ta­va ­que ­o mun­do ­iria aca­bar ­e ele que­ria mor­rer ­ao la­do ­da mã­e”, re­la­tou. ­De vol­ta tem­pos de­pois, Ge­o­va­ne se­ria re­in­te­gra­do à equi­pe ­de co­zi­nha ­e gal­ga­ ria pos­to ­a pos­to até ­se tor­nar ­o pri­mei­ro subche­fe ­de Ata­la. ­“No jan­tar ­que pre­pa­ ra­mos ­no ­D.O.M. pa­ra ­os ­chefs es­pa­nhóis, Ge­o­va­ne co­zi­nhou ­com a se­re­ni­da­de ­que ­me fal­ta­va”, elo­gi­ou. En­tre fi­lo­so­fi­as ­e re­cei­tas ­que en­chi­am ­os ­olhos ­do pú­bli­co, co­mo ­a ­de ­um ri­ so­to lí­qui­do ­e ­um pu­dim ­com pri­pri­o­ca, Ata­la en­cer­rou ­os tra­ba­lhos, ­com ­uma ou­tra li­ção pre­ci­o­sa: “Se­jam exi­gen­tes ­com ­chefs, gar­çons, res­tau­ran­tes ­e, prin­ ci­pal­men­te, ­com vo­cês. É mui­to sim­ples co­zi­nhar”, afir­mou ­no fi­nal. •

65

prazeres da mesa

068a071_atala.indd 65

11/27/08 8:25:02 PM


ferranadriĂ

66

prazeres da mesa

Ok MT ferran adrià.indd 66

11/27/08 8:26:07 PM


O MITO DESCONSTRÓI SEUS MITOS Considerado por muitos como o melhor chef da atualidade, Ferran Adrià encantou o público e mostrou que é muito mais do que apenas um profissional tecnológico

POR LUCIANA LANCELLOTTI FOTOS ANTÓNIO RODRIGUES E ANDRÉ PENICHE

F

oi a palestra mais aguardada do evento. Com auditório completamente tomado pelo público, Ferran Adrià subiu ao palco para encerrar o Mesa Tendências. Falou por 1h30. Durante toda a apresentação, era claro o desejo ­de fa­zer ­a pla­téia ­se apro­xi­mar ­de ­seu tra­ba­lho. Pa­ra is­so, ­ele uti­li­zou di­ver­sos ví­de­os. ­O pri­mei­ro ­foi uma viagem ao El Bulli: com imagens em preto-e-branco, aparece a cozinha do restaurante, na região da Catalunha. Nada de trilha sonora, apenas o burburinho do ambiente. Vê-se uma equipe trabalhando em perfeita cooperação. Cada prato recebe a atenção de vários cozinheiros, do preparo à finalização. Adrià prova e aprova cada um deles. Dali saem espumas, texturas, flores delicadas, formas inusitadas. Silêncio. Aplausos. E Ferran derruba o primeiro mito: “Vocês podem ver que é a cozinha mais artesanal do mundo: são 45 cozinheiros para 50 comensais. E a equipe só utiliza as mãos”.

67

prazeres da mesa

Ok MT ferran adrià.indd 67

11/27/08 8:26:37 PM


ferranadrià

Lo­go em se­gui­da, ele exi­be ou­tro fil­ me, in­ti­tu­la­do Uma Co­mi­da Ines­que­cí­vel. Ten­do os Be­at­les co­mo tri­lha, um ca­sal, sen­ta­do à me­sa do El Bul­li, co­me­ça a ser ser­vi­do. A du­pla se olha com cum­pli­ci­ da­de. E têm iní­cio as re­a­ções: ri­sos in­ con­ti­dos, olhos que se re­vi­ram, sus­tos, in­cre­du­li­da­de, di­ver­são. Uma se­qüên­cia de emo­ções me­ti­cu­lo­sa­men­te pla­ne­ja­da por Adrià. A es­sa al­tu­ra, a pla­téia já es­ tá com­ple­ta­men­te en­vol­vi­da com o ca­ sal – to­dos de­se­jam es­tar àque­la me­sa. Mais aplau­sos. Ele ar­re­ma­ta: “El Bul­li é pai­xão. A gas­tro­no­mia, pa­ra mim, é fei­ta com a ca­be­ça e com a al­ma”. E dis­pa­ra: “A co­zi­nha cri­a­ti­va pre­ci­sa ser tra­ta­da com res­pei­to e con­cen­tra­ção”. O chef mais aclamado do mundo comentou a linguagem que define suas técnicas, o alfabeto que ele criou. Mas deixou claro que seu trabalho vai muito

68

prazeres da mesa

Ok MT ferran adrià.indd 68

11/27/08 8:27:07 PM


além das denominações dos procedimentos vanguardistas. Tudo é emoção, já que “na vida, é preciso ter provocações”. Começou, então, a demonstrar vários processos, como a esferificação, criada para reter líquidos com sabores diversos, em esferas tênues que explodem ao toque. Ele também apresentou a esferificação inversa, em que um líquido com cálcio é submergido em um banho de alginato. E admitiu: “Existem quatro tipos de esferificação. Para os entender, precisamos de dois dias, porque é um assunto muito complexo”. Sim, é ciência pura. Mas Adrià lembrou que a ciência está em tudo, até mesmo na paella e no churrasco. Foi quando derrubou o maior mito de todos: “Eu uso a ciência e dizem que faço gastronomia molecular. Eu nunca utilizei esse termo ”. Nem todas as técnicas são ultramodernas.

69

prazeres da mesa

Ok MT ferran adrià.indd 69

11/27/08 8:27:48 PM


ferranadrià

O chef ca­ta­lão, mais uma vez, des­mi­ti­ fi­cou seu tra­ba­lho: “Co­men­ta-se que só uti­li­zo a al­ta tec­no­lo­gia em meus pra­tos, mas uso bas­tan­te o si­fão e o mi­cro­on­ das, am­bos in­ven­ta­dos há mui­tos anos”. E, va­len­do-se dos dois equi­pa­men­tos, ele pre­pa­rou um pão-de-ló de ger­ge­lim ne­ gro e mi­so, “o bo­lo mais le­ve do mun­do”, que tem a tex­tu­ra de uma es­pon­ja. Vol­tam os vídeos: na primeira técni­ ca, morangos são mimetizados com base numa gelatina feita com o próprio suco da fruta. O líquido é enformado, em um processo semelhante ao dos bombons e a finalização ganha sorbet de morango. O re­sul­ta­do é sur­pre­en­den­te­men­te na­ tu­ral. Em se­gui­da, ele apre­sen­ta a úl­ti­ ma no­vi­da­de do El Bul­li – a sé­rie cri­a­da pe­lo ir­mão Al­bert Adrià, que ga­nhou o no­me de Na­tu­ra, com so­bre­me­sas ins­ pi­ra­das nas co­res e nos sa­bo­res da na­ tu­re­za. Fo­lhas se­cas, ter­ra, flo­res, fru­tas e se­men­tes re­pro­du­zem pai­sa­gens com um re­a­lis­mo im­pres­sio­nan­te, apoi­a­do em tons pas­tel, co­res in­ten­sas e for­mas har­mo­ni­os­ as. A pla­téia fi­ca ex­ta­si­ad­ a di­an­te de tan­ta be­le­za. Adrià deixou claro que seus métodos, formadores do que conhecemos hoje por cozinha de vanguarda, ou tecnoemocio­ nal, são um capítulo no desenvolvimen­ to da gastronomia. “Se eu não observar meu passado, não consigo ir para a fren­ te.” Ele recordou o início da década de 1990, um momento em que sua proposta ainda era incompreendida. “Foram anos difíceis, mas continuamos acreditando em nosso trabalho.” E, do alto de sua ge­ nialidade, deixou uma mensagem para os jovens. “Vocês não precisam correr. As coisas acontecem pouco a pouco. É pre­ ciso digeri-las. Quando o sucesso chegar, vocês estarão prontos.” E ele foi ovacionado.

70

prazeres da mesa

Ok MT ferran adrià.indd 70

11/27/08 8:28:38 PM


Untitled-3 71

11/27/08 6:59:48 PM


helenarizzo

FÉRTIL TERROIR DE IDÉIAS E MEMÓRIAS A chef gaúcha do restaurante Maní, de São Paulo, SP, cativou o público com sua filosofia de trabalho e preparações originais e instigantes

A

72

emo­ç ão ­e ­o ­f rio ­n a bar­r i­g a con­fes­s os ­de He­le­n a Riz­z o, ­do res­t au­r an­te ­Maní, ­SP, ­ao su­bir ­ao pal­c o ­do Me­s a Ten­dên­ci­ as ­em na­d a com­pro­me­teu ­o de­s em­p e­ nho des­s a ­chef ­– com­pro­va­d a­men­te ­u ma es­t re­l a ­em as­c en­s ão ­no ce­n á­r io ­d a gas­t ro­no­m ia pau­lis­t a ­e bra­si­lei­r a. Par­ti­cu­l ar­men­te co­mo­v i­d a ­c om ­a pre­ sen­ç a ­n a pri­mei­r a fi­l a ­do au­d i­tó­r io ­do Se­n ac-SP ­de Jo­a n Ro­c a, ­do ­El Cel­ler ­de ­C an Ro­c a, ­s eu mes­t re ­e ins­pi­r a­dor, e­ la de­cla­rou: ­“A Es­pa­n ha ­me ­abriu no­ vos ho­r i­z on­tes ­e ­u ma aqua­re­l a ­de co­res ­e sa­b o­res”, afir­mou mi­r an­do ­s eu ído­lo. Além des­s as in­f lu­ên­ci­a s, ­a ­chef en­fa­ ti­z ou ­que seu tra­b a­l ho é per­me­a­do ­de lem­bran­ç as, pre­fe­rên­ci­a s ­ou mes­mo ­de

POR ROBERTA MALTA FOTOS ANDRÉ PENICHE E RICARDO D’ANGELO

s­ ua la­bu­t a di­á ­r ia. “Ca­vo sa­b o­res ­que apa­re­c em ­num ce­n á­r io ­ou de­ter­m i­n a­ do cli­m a. Cha­mo is­s o ­de ter­roir ­d a me­ mó­r i­a”, cu­n hou ­em ­tom re­ci­t a­ti­vo. ­Ao pú­bli­c o, He­le­n a apre­s en­tou ­u ma re­lei­t u­r a ­d a fa­mo­s a sa­l a­d a Wal­ dorf, pra­to q­ ue sa­b o­re­a­va ­n a ca­s a ­dos ­avós, quan­do ­era cri­a n­ç a. A ­chef jus­ti­ fi­c ou ­s ua es­c o­l ha: “Es­s es in­g re­d i­en­tes fa­z em par­te ­d a mi­n ha in­fân­ci­a”, con­ tou de­fen­den­do ­a bra­si­li­d a­de ­d a re­c ei­ ta, ­em ­que pe­s e seu so­bre­no­me ale­m ão: “Es­t a ­n ão é ­u ma co­m i­d a tí­pi­c a ­do nos­ so pa­í s, ­m as co­mo ­faz par­te ­d a mi­n ha vi­d a ­n ão con­si­go en­xer­g á-la ­de ou­t ra for­m a”. Na ver­s ão ­de He­le­n a, ­a ­m açã ­e ­o ai­p o apa­re­c em ­num as­pic ­e ­a s no­z es, ca­r a­me­li­z a­d as, as­s e­me­l ham-se àque­les

prazeres da mesa

Ok MT_ helena rizzo.indd 72

11/27/08 8:39:34 PM


t

pe­d a­ci­n hos ­de co­c o fres­c o, ven­d i­dos ­em por­t a ­de ci­ne­m a. Le­ve­z a ­e sim­pli­ci­d a­de tam­b ém de­ ram ­o ­tom ­a ­sua pa­les­t ra. ­To­do o tem­ po, ­a ­chef fa­l ava bai­xo ­e sor­r ia, ca­ti­ van­do ­o pú­bli­c o pre­s en­te. Até mes­mo quan­do ­ela ­s e atra­pa­l hou ­c om ­a cen­ trí­f u­ga ­e ar­r is­c ou con­c ei­t u­a r ­s eu es­ti­lo ­de tra­b a­l ho. “Ho­je, in­te­res­s a-me pas­ se­a r li­v re­men­te ­p or idéi­a s ­e fi­lo­s o­f i­a s. ­Não acre­d i­to ­em ver­d a­des pron­t as. ­O im­p or­t an­te é es­t ar ­n a vi­d a acom­pa­ nhan­do ­a s mo­d i­f i­c a­ç ões ­do mun­do, ­d a na­t u­re­z a”, fi­lo­s o­fou. En­quan­to ­a ­m açã vi­r a­va con­s omê, ­a ­chef gaúcha ­leu pa­r a ­a pla­téia O ­Ato Cri­a ­d or, tex­to ­do cé­le­bre ar­tis­t a plás­

ti­c o fran­c ês Mi­chel Du­champ, cu­jo mo­te en­fa­ti­z a ­“a ne­c es­si­d a­de ­de ­o ar­ tis­t a ­­ser im­pre­ci­s o ­em re­l a­ç ão ­aos ca­ mi­n hos es­c o­l hi­dos, ­em ­prol ­d a li­b er­ da­de ­e flu­ên­cia ­d a cri­a­ç ão”. Se­g un­do He­le­n a Riz­z o, ­t al pen­s a­men­to ­foi de­ ter­m i­n an­te ­ao con­c e­b er ­s eu es­ti­lo ­de co­zi­n ha. “Gos­to ­de par­tir ­de ­u ma téc­ ni­c a, ­u m prin­cí­pio, ­s em sa­b er on­de ­vai ter­m i­n ar”, dis­s e ­ela, ­que ar­re­b a­tou ­o s olha­res ­e ­a apro­va­ç ão ­de Fer­r an ­Adrià ­e Ju­a n Ma­r i Ar­z ak. ­A ­chef fi­n a­li­z ou ­s ua apre­s en­t a­ç ão, sal­pi­c an­do al­g u­m as er­vas aro­m á­ti­c as ­e bro­tos ­em ­u ma sa­ la­d a es­ti­li­z a­d a. ­E ­c om ­o mes­mo fres­c or ­e gra­ç a ­de ­s ua cri­a­ç ão, dei­xou ­o pal­c o mui­to aplau­d i­d a. •

73

prazeres da mesa

Ok MT_ helena rizzo.indd 73

11/27/08 8:40:02 PM


giro

MT_gerais.indd 14

11/27/08 8:46:11 PM


MT_gerais.indd 15

11/27/08 8:47:40 PM


Ultra-rรกpido ... "Uร WF[FT NBJT Sร QJEP EP RVF PT GPSOPT DPOWFODJPOBJT

t +BUPT EF BS DPN WFMPDJEBEF EF BUร ,N I t .JDSPPOEBT XBUUT EF QPUร ODJB t #BJYP DPOTVNP EF FOFSHJB t 3ร QJEP F WFSTร UJM VTB CBOEFKBT NFUร MJDBT (/ t QSPHSBNBT USBOTGFSร ODJB EF EBEPT QPS TNBSUDBSE PV 64# t %JTQFOTB P VTP EF DPJGBT PV FYBVTUร P

5PSOBEP

)JHI I $

7FOIB DPOIFDFS B ร MUJNB QBMBWSB FN GPSOPT VMUSB Sร QJEPT -JHVF QBSB Oร T PV DIFGT!FNQMBSFM DPN CS

Anรบncio Emplarel Untitled-3 76 - Mesa.indd 1

24/11/2008 23:27:49 11/27/08 7:00:32 PM


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.